Artigo
original
Caracterização das ações de regulação assistencial
articulada à Atenção Primária à Saúde em municípios
do Sul e Nordeste do Brasil: 2001 a 2004*
doi: 10.5123/S1679-49742013000400009
Characterization of care coordination actions articulated to Primary Health Care in cities in
South and Northeast Brazil: 2001-2004
Marcos Aurélio Matos Lemões
Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas-RS, Brasil
Elaine Thumé
Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas-RS, Brasil
Elaine Tomasi
Programa de Pós-Graduação em Epidemiologia, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas-RS, Brasil
Alitéia Santiago Dilélio
Programa de Pós-Graduação em Epidemiologia, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas-RS, Brasil
Carla Luciane dos Santos Borges
Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas-RS, Brasil
Luiz Augusto Facchini
Programa de Pós-Graduação em Epidemiologia, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas-RS, Brasil
Resumo
Objetivo: descrever as ações de regulação assistencial em 41 municípios com mais de 100 mil habitantes de sete estados
das regiões Sul e Nordeste do Brasil. Métodos: foi realizado estudo descritivo com dados coletados por meio de questionários
dirigidos aos secretários de saúde e trabalhadores de saúde e de formulários sobre estrutura e processo de trabalho preenchidos pelas equipes de saúde, analisados por região, entre 2001 e 2004. Resultados: encontrou-se articulação da atenção
primária à saúde com serviços de maior complexidade tecnológica em 7/21 municípios na região Sul e em 11/20 na região
Nordeste; as centrais de regulação enfrentavam problemas na adequação da estrutura física e tecnológica; o tempo médio para
atendimento especializado variou de nove a 127 dias na região Sul e de 11 a 42 dias na Nordeste. Conclusão: foram reveladas fragilidades na regulação assistencial, contribuindo para a discussão sobre a qualificação da rede de serviços no Brasil.
Palavras-chave: Regulação e Fiscalização em Saúde; Planejamento em Saúde; Atenção Primária à Saúde; Descentralização; Epidemiologia Descritiva.
Abstract
Objective: describe care coordination in 41 cities with over 100,000 inhabitants in seven states in South and
Northeast Brazil. Methods: this is a descriptive study. Data were collected through questionnaires applied to health
secretaries and health workers and also through questionnaires about work structure and processes filled in by health
teams. Data were from 2001-2004 and were analyzed by region. Results: primary health care articulation with services
of higher complexity was found in 7 cities in the South and 11 in the Northeast. Care coordination units faced physical
structure and technology problems. Average waiting time for specialized appointments ranged from 9 to 127 days in
the South and 11 to 42 days in the Northeast. Conclusion: the study exposes weaknesses in healthcare coordination
and contributes to the discussion about qualifying Brazil’s public health service network.
Key words: Health Care Coordination and Monitoring; Health Planning; Primary Health Care; Decentralization;
Epidemiology, Descriptive.
* Artigo extraído da dissertação de Mestrado em Enfermagem ‘Avaliação das ações de regulação da assistência à saúde em
municípios da região Sul e Nordeste do Brasil’, apresentada à Universidade Federal de Pelotas – UFPel – no ano de 2011.
Endereço para correspondência:
Marcos Aurélio Matos Lemões – Rua João Moreira, no 672, Bairro Vila da Quinta, Rio Grande, RS, Brasil. CEP: 96222-000
E-mail: [email protected]
Epidemiol. Serv. Saúde, Brasília, 22(4):631-640, out-dez 2013
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Regulação assistencial articulada à Atenção Primária à Saúde
Introdução
O processo regulatório em saúde tem por objetivo
promover o acesso e o fluxo dos cidadãos aos serviços, coordenar a oferta e subsidiar o controle sobre
os prestadores de serviços, assinalando os gargalos
assistenciais e administrando conflitos entre serviços
públicos e privados.1 Esse processo regulatório visa
à racionalização de custos, utilização de fontes de
financiamento e controle dos mercados de saúde para,
dessa forma, ampliar ou remanejar a oferta programada da assistência.2,3,4
No contexto mundial, a regulação teve início nas
áreas econômica e social, acompanhada pelo desenvolvimento de agências para monitoramento e coerção do
comércio e a criação de instituições de proteção social.2
Inicialmente balizada por deliberações governamentais
dirigidas ao controle de mercado, ela expandiu sua
atuação para novas áreas, entre elas a da Saúde.5,6
A regulação assistencial cresceu mais rapidamente
em países com sistemas privados de saúde, como por
exemplo, os Estados Unidos da América. Apesar disso,
as complexidades da regulação da cobertura de saúde
ainda eram pouco conhecidas da população norteamericana ao final do século XX.7
No Brasil, a regulação assistencial é um tema
novo e pouco estudado, especialmente em avaliações
abrangentes e articuladas à Atenção Primária à Saúde. Estudo realizado em quatro capitais brasileiras
(Florianópolis-SC, Aracaju-SE, Belo Horizonte-MG e
Vitória-ES)8 aponta que estratégias municipais para a
regulação da assistência são recentes, com deficiências
principalmente na regulação de leitos e internações.
Entretanto, destaca-se a expansão de cobertura da
Estratégia Saúde da Família como importante impulsionadora da implantação de estruturas de regulação
nos municípios brasileiros.
Destaca-se a expansão de cobertura
da Estratégia Saúde da Família
como importante impulsionadora
da implantação de estruturas de
regulação nos municípios brasileiros.
É escasso o conhecimento sobre as ações de regulação no que concerne à implantação das distintas
centrais de regulação existentes e suas estratégias de
trabalho, à efetivação da assistência mediante esse
632
recurso logístico, à articulação da Atenção Primária à Saúde com serviços de maior complexidade
tecnológica e ao tempo de espera para atendimento
especializado.
Buscando reduzir as lacunas nesse conhecimento,
este artigo tem por objetivo caracterizar as ações de
regulação assistencial em 41 municípios com mais de
100 mil habitantes, pertencentes a sete estados das
regiões Sul e Nordeste do Brasil.
Métodos
Este trabalho integra o Estudo de Linha de Base
do Projeto de Expansão e Consolidação da Estratégia
Saúde da Família (ELB-Proesf), conduzido pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) com lotes designados pelo Ministério da Saúde para essa instituição,
nas regiões Sul e Nordeste do Brasil, no período de
março a agosto de 2005, com o objetivo de avaliar o
desempenho da Atenção Básica em municípios com
mais de 100 mil habitantes.9,10
Trata-se de um estudo descritivo. A amostra do
ELB-Proesf foi constituída por 41 municípios: 21
municípios em dois estados das regiões Sul (Rio
Grande do Sul e Santa Catarina); e 20 municípios em
cinco estados da região Nordeste (Alagoas, Paraíba,
Pernambuco, Piauí e Rio Grande do Norte).
Em cada município, foi solicitado aos gestores
municipais (Secretários Municipais de Saúde e Coordenadores da Atenção Básica) o preenchimento de
instrumentos com informações específicas sobre as
questões de regulação. Também em cada município, foi
selecionada uma amostra de unidades básicas de saúde
(UBS) proporcional ao tamanho da rede básica, na
razão de duas unidades de Saúde da Família para uma
unidade básica de saúde tradicional, totalizando 240
UBS.11 As características metodológicas do ELB-Proesf/
UFPel estão apresentadas em outras publicações.9,11
Para estudar a regulação assistencial e sua articulação com a Atenção Primária à Saúde, realizou-se uma
avaliação no âmbito da gestão municipal e dos serviços
de atenção básica à saúde na forma de entrevista, também denominada ‘análise de papel’, de cunho teórico
sobre as organizações.12 Os dados coletados referem-se
ao período de 2001 a 2004.
Os dados da gestão municipal foram coletados
por meio de um questionário individual enviado ao
secretário municipal de saúde, que apontou as portas
Epidemiol. Serv. Saúde, Brasília, 22(4):631-640, out-dez 2013
Marcos Aurélio Matos Lemões e colaboradores
de entrada no sistema de saúde, facilidades e dificuldades nos setores de controle, avaliação, auditoria e
regulação, e articulação com os serviços de maior
complexidade.
Utilizou-se um formulário destinado a captar dados
de fonte documental (Pacto da Atenção Básica e Indicadores de Monitoramento da Expansão do PSF em
Grandes Centros Urbanos), que abalizou a implantação
e as consultas efetivadas a partir das centrais, os serviços para acolhimento de reclamações dos usuários e
o tempo médio de espera (em dias) para atendimento
em serviços especializados e para recursos diagnósticos e terapêuticos.
Os dados referentes às UBS foram coletados por
meio de um formulário sobre a estrutura e o processo de trabalho, preenchido pela equipe de saúde
em reuniões, a partir de discussões no grupo sobre
os aspectos pertinentes às questões, gerando dados
relativos à informatização da rede básica, formas de
agendamento – pelo município ou por usuários – para
acessar os serviços de maior complexidade, apoio
diagnóstico e terapêutico.
Os dados referentes aos trabalhadores de saúde
foram obtidos por meio de um questionário individual
auto aplicado, que originou informações sobre a utilização de computadores para auxiliar a organização
do trabalho.10 Todos os instrumentos estão disponíveis
na página eletrônica http://www.epidemio-ufpel.org.
br/proesf/index.htm
Os recursos diagnósticos e terapêuticos especializados foram classificados segundo média e alta complexidade tecnológica. O acesso à média complexidade
foi avaliado pela disponibilidade de profissionais
especializados, exames laboratoriais e de imagem. A
alta complexidade foi avaliada pelo acesso aos exames
de imagem, tratamento para pacientes renais crônicos
e oncológicos.13
A análise do sistema de acesso regulado da atenção
à saúde foi realizada em consonância com os critérios
propostos pela Organização Panamericana da Saúde14 e
incluem: existência de sistema eletrônico (informatização das UBS, utilização de computadores nas atividades
profissionais e acesso à internet); tipos de centrais
implantadas (regulação assistencial, de urgências e
emergências; leitos hospitalares; consultas e exames
especializados); participação da atenção primária à
saúde no agendamento direto para os demais níveis de
atenção; além da opinião dos gestores e das equipes
de saúde sobre as centrais de regulação.
Para as questões fechadas (pré-codificadas), foram
criados bancos de dados usando-se o programa Epi
Info 6.04b.15 As questões abertas que identificaram
a implementação do setor de Controle, Avaliação,
Auditoria e Regulação e a adequação das centrais
para acolhimento e ordenação das necessidades de
saúde do município pelos gestores, foram digitadas em
programa de edição de textos. A partir das respostas
obtidas, foram identificadas unidades de informação
contendo as facilidades e dificuldades descritas, para
análise descritivo-exploratória.16
A região (Sul ou Nordeste) foi utilizada como variável de estratificação. As análises descritivas incluíram
a distribuição das proporções e médias.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de Pelotas, sob o número 045/2004,
em 13 de setembro de 2004.
Resultados
Participaram do estudo 4.749 trabalhadores de
saúde, 1.730 no Sul e 3.019 no Nordeste.
A totalidade dos gestores identificou os serviços de
Atenção Primária à Saúde como porta de entrada de
usuários no Sistema Único de Saúde (SUS), independentemente do modelo assistencial. Os serviços de
pronto-atendimento, urgência e emergência também
foram identificados como porta de entrada no sistema
de saúde por 13 dos gestores na região Sul e dez na
região Nordeste. Além desses serviços, o uso dos ambulatórios distritais de especialidades foi referido por
dez dos gestores no Sul e dez no Nordeste. Em ambas
as regiões, oito dos gestores identificaram como porta
de entrada, os ambulatórios localizados em hospitais.
A disponibilidade de centrais de leitos para acolher
e ordenar as necessidades de saúde dos usuários foi
informada por 28 gestores (Sul=12; Nordeste=16);
três dos municípios na região Sul e cinco na região
Nordeste haviam instalado esse serviço. A existência
de centrais de consultas especializadas foi informada
por 32 gestores (Sul=16; Nordeste=16) e sua presença
alcançava 15 dos municípios na região Sul e 12 na
região Nordeste. A implantação de centrais de exames
foi informada por 30 gestores (Sul=14; Nordeste=16),
com presença em 12 dos municípios na região Sul e
nove na região Nordeste. A questão sobre centrais do
Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) foi
Epidemiol. Serv. Saúde, Brasília, 22(4):631-640, out-dez 2013
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Regulação assistencial articulada à Atenção Primária à Saúde
respondida por 27 gestores (Sul=12; Nordeste=15) e
sua existência foi identificada em três dos municípios
na região Sul e em sete na região Nordeste.
Sobre a informatização da rede básica (Sul=113
UBS; Nordeste=115 UBS), foi identificada a disponibilidade e a utilização de tecnologia de informação para
auxiliar na organização do trabalho. Um terço (34%)
das UBS possuía, no mínimo, um computador, sendo
a proporção maior nas UBS da região Sul (Sul=40%;
Nordeste=29%). Apenas 25% das UBS possuíam
impressora (Sul=32%; Nordeste=18%). A conexão
com a internet foi identificada em apenas 11% das
UBS, com maior proporção na região Sul (Sul=17%;
Nordeste=5%).
Do total de trabalhadores de saúde (n=4.749),
apenas 22% referiram o uso de computadores para
apoiar a prática profissional, com diferenças regionais
(Sul=31%; Nordeste=16%). Ao investigar o local de
uso do computador, foi verificado que 13% dos trabalhadores utilizavam esses equipamentos somente
em casa (Sul=18%; Nordeste=11%), 6% somente na
UBS (Sul=9%; Nordeste=4%) e 2% em casa e na UBS
(Sul=4%; Nordeste=1%).
Em relação à existência de serviços para acolhimento de reclamações dos usuários, identificou-se que os
serviços de ouvidoria ou similar estavam disponíveis
nas secretarias municipais de saúde (Sul=11 municípios; Nordeste= oito municípios). A participação
do Conselho Municipal de Saúde no acolhimento
de reclamações foi referida por quatro dos gestores
na região Sul e seis na região Nordeste. Além disso,
dois dos municípios da região Sul e dois da região
Nordeste não possuíam qualquer tipo de serviço com
essa finalidade.
A proporção de consultas efetivadas por central de
agendamento no total de 15 municípios (seis municípios no Sul e nove no Nordeste) atingiu, na amostra
do Sul, 15% das consultas em 2001, chegando a 28%
em 2004. Nos municípios do Nordeste, 75% das consultas foram agendadas a partir das centrais, em 2001,
diminuindo para 70% em 2004.
Nos 28 municípios respondentes para essa questão
(12 no Sul e 16 no Nordeste), não foram relatadas
internações efetivadas a partir das centrais de leitos nos
municípios do Sul, tanto em 2001 como em 2004. Nos
municípios do Nordeste, 30% das hospitalizações de
2001 foram realizadas a partir das centrais de leitos,
aumentando para 48% em 2004.
634
Na região Sul, sete do total de 21 gestores confirmaram a existência de articulação da Atenção Primária à
Saúde com os serviços de maior complexidade. Essa
proporção foi de 11 entre o total de 20 gestores na
região Nordeste.
O agendamento para os serviços de maior complexidade foi comentado por 31 gestores (Sul=15;
Nordeste=16), sendo confirmado por 15 dos gestores
no Sul e 15 no Nordeste. O agendamento realizado a
partir da UBS foi uma realidade para 11 dos municípios
da região Sul e oito da região Nordeste.
A responsabilidade pelo agendamento estava a
cargo dos profissionais da ESF (Sul= cinco; Nordeste=
dez) ou do próprio usuário, diretamente no setor de
interesse (Sul= sete; Nordeste= dez) ou através de
telefone (Sul= um; Nordeste= dois).
Entre as estratégias utilizadas, foram citadas: fila
única, conforme data de registro da demanda (Sul=
oito; Nordeste= oito); protocolos para acolhimento de
urgências (Sul= sete; Nordeste= três); e protocolos
para cuidado de demanda mais prevalente (Sul= três;
Nordeste= dois).
O tempo médio de espera para atendimento médico
especializado variou de nove a 127 dias na região Sul
e, na região Nordeste, de 11 a 42 dias. Na região Sul, o
tempo médio de espera inferior a 14 dias foi observado
para as especialidades de pediatria e odontologia; e
entre 15 e 30 dias, para as especialidades de ginecoobstetrícia e nutrição. Para as demais especialidades,
o tempo médio de espera foi superior a 30 dias. Os
principais gargalos foram as áreas de neurologia,
nefrologia, angiologia e fisioterapia (Figura 1).
Na região Nordeste, o tempo médio de espera inferior a 14 dias foi referido para as especialidades de
pediatria, gineco-obstetrícia, nefrologia, odontologia
e nutrição; e entre 15 e 30 dias, para cardiologia, gastroenterologia, cirurgia geral, angiologia, oftalmologia,
otorrinolaringologia, fisioterapia e psiquiatria. O maior
tempo de espera foi na área de neurologia, com média
de 42 dias para atendimento (Figura 1).
Na região Sul, o tempo médio de espera para recursos de média e alta complexidade variou de dez a 122
dias e, na região Nordeste, de sete a 67 dias.
O tempo médio de espera inferior a 14 dias foi
referido para a realização de radioimunoensaio, hemodiálise, quimioterapia e radioterapia, em ambas as
macrorregiões. O acesso à hemodinâmica na região
Nordeste também foi inferior a 14 dias (Figura 2).
Epidemiol. Serv. Saúde, Brasília, 22(4):631-640, out-dez 2013
Marcos Aurélio Matos Lemões e colaboradores
Na região Sul, o tempo médio de espera para a realização de eletrocardiograma e exames de análise clínica
variou de 15 a 30 dias, situação igual para a região
Nordeste. Os demais exames e recursos terapêuticos
apresentaram um tempo médio de espera superior a 30
dias, sendo que para a realização de ecocardiografia,
ressonância magnética e tomografia, o tempo médio
foi superior a 60 dias (Figura 2).
140
120
Dias em espera (média)
100
80
Sul
60
Nordeste
40
20
Fis
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ote
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log
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ia
ia
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Nota: Estudo de Linha de Base do Projeto de Expansão e Consolidação da Estratégia Saúde da Família (ELB-Proesf), 2001-2004
Figura 1 – Tempo médio de espera (em dias) por atendimento especializado nas macrorregiões Sul e Nordeste.
Brasil, 2001 a 2004
Dias em espera (média)
150
Procedimento de média
complexidade
120
Procedimento de alta
complexidade
90
60
30
Sul
Nordeste
fia
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Nota: Estudo de Linha de Base do Projeto de Expansão e Consolidação da Estratégia Saúde da Família (ELB-Proesf), 2001-2004
Figura 2 – Tempo médio de espera (em dias) pelo acesso a recursos de média e alta complexidade nas
macrorregiões Sul e Nordeste. Brasil, 2001 a 2004
Epidemiol. Serv. Saúde, Brasília, 22(4):631-640, out-dez 2013
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Regulação assistencial articulada à Atenção Primária à Saúde
Na região Nordeste, os exames radiológicos, de
ultrassonografia, eletrocardiografia, ecografia e
ecocardiografia apresentaram um tempo médio de
espera entre 15 e 30 dias; e em torno de 60 dias, para
a realização de tomografia e ressonância magnética
(Figura 2).
Considerando-se a adequação das centrais para
acolhimento e ordenação das necessidades de saúde
do município, os gestores da região Sul reconheceram
a necessidade de investimentos na informatização, na
contratação de profissionais e na adequação da área
física. Foram mencionados entraves no funcionamento das centrais, falhas nos planos de regionalização,
fluxos precários nas referências, agendamento centralizado em coordenações regionais de saúde sob
responsabilidade do usuário e demora na marcação
de consultas, que resultavam em baixa efetividade da
regulação e gargalos assistenciais.
No Nordeste, os gestores identificaram que as
centrais para acolhimento e ordenação facilitavam a
realização do atendimento humanizado, com redução
das filas de espera para o agendamento, e favoreciam
os usuários da área rural. A falta de informatização
das UBS e das centrais dificultava o fluxo de usuários,
a organização da assistência e o reconhecimento da
rede assistencial disponível. Os gestores também
destacaram a disponibilidade de profissional capacitado para realizar encaminhamentos, a utilização
de protocolos assistenciais e a garantia de translado
aos serviços de referência como facilitadores na
regulação.
No Sul, em relação ao setor de Controle, Avaliação,
Auditoria e Regulação, os gestores identificaram como
facilidades a centralização das atividades em um setor,
a maior colaboração entre a rede de saúde e a gestão
para o adequado funcionamento dos serviços. Entre
as dificuldades, os gestores indicaram a implantação
incipiente desse setor, ocasionando problemas no
controle, ausência de auditoria, uso limitado de
técnicas e tecnologias de informação e deficiências
na capacitação específica dos trabalhadores para as
atividades do setor.
No Nordeste, os gestores identificaram como
facilidades o funcionamento satisfatório do setor, a
capacitação e experiência do pessoal, a gestão democrática e a articulação com os diversos serviços de
saúde. Entre as dificuldades, houve destaque para a
escassez de recursos humanos com dedicação integral,
636
inadequação de estrutura física, recursos materiais e
capacitação para as atividades do setor.
Discussão
O artigo descreve as ações de regulação assistencial
em 41 municípios com mais de 100 mil habitantes,
situados em sete estados das regiões Sul e Nordeste do
Brasil. Apesar de sua relevância para o ordenamento
do acesso aos serviços, a regulação assistencial ainda
era incipiente nos municípios estudados, especialmente na Região Sul. O estudo aponta a existência
de gargalos assistenciais a envolver as consultas com
especialidades médicas e exames de média e alta complexidade tecnológica, podendo expressar a grande
dificuldade enfrentada pelos municípios em contratualizar e desenvolver sua rede de serviços ofertados
pelo SUS, resultando em maior tempo de espera dos
usuários pelas consultas necessárias, possível agravamento de suas patologias e internações, e mais ônus
ao sistema público de saúde.
Os gestores municipais identificaram os serviços de
atenção primária à saúde, de pronto-atendimento e de
urgência e emergência como porta de entrada no SUS,
corroborando os resultados de outros estudos.6,17,18
Entretanto, os gestores de 57% dos municípios de ambas as regiões também mencionaram o acesso direto
ao SUS por meio de ambulatórios localizados em hospitais e de ambulatórios regionais de especialidades.
Este achado evidencia a dificuldade dos municípios em
realizar uma regulação criteriosa de modo a organizar
a rede assistencial orientada pela Atenção Primária
à Saúde, conforme preconiza a Política Nacional de
Atenção Básica.6,19
Diante da hierarquização e orientação dos fluxos
assistenciais, a diversidade de portas de entrada fragiliza os sistemas municipais, dificultando a regulação
do cuidado dispensado à população.18 No Decreto
Presidencial no 7508, de 28 de junho de 2011, que
regulamenta a Lei no 8080, de 19 de setembro de
1990, são apresentados diversos serviços como porta
de entrada, embora seu artigo 11 afirme que o acesso
universal e igualitário às ações e aos serviços de saúde
será ordenado pela atenção primária.20
Os achados também evidenciaram que o processo
de implantação de centrais de regulação era todavia
incipiente em ambas as regiões, além de enfrentar
problemas na adequação da estrutura física e tec-
Epidemiol. Serv. Saúde, Brasília, 22(4):631-640, out-dez 2013
Marcos Aurélio Matos Lemões e colaboradores
nológica. A implantação de centrais de regulação
é um dos componentes destacados no processo de
gestão descentralizada, pois possibilita a organização
de demandas de usuários e a alocação de recursos
necessários para favorecer o acesso aos serviços.21
A escassa regulação na oferta de leitos em hospitais contratados pelo sistema público, que também
atendem os usuários de planos de saúde e privados,
favorece a ineficiência e irracionalidade no uso dos
serviços. Um mesmo usuário hospitalizado pode ser
fonte de receita para o hospital via SUS, plano de
saúde e desembolso direto de recurso, o que poderia
explicar, ainda que parcialmente, a dificuldade de
implantação e efetividade das centrais de regulação
de leitos nos municípios estudados.22
As centrais de consultas especializadas estavam implantadas em 15 municípios da região Sul e em 12 municípios da região Nordeste, seguidas das centrais para
realização de exames, instaladas em 12 municípios da
região Sul e em 9 municípios da região Nordeste. Apesar disso, as ações de regulação não foram suficientes
para resolver os gargalos assistenciais, decorrentes da
escassa oferta pública em algumas especialidades e da
resistência dos prestadores de serviços privados de
saúde, contratados pelo SUS, a se submeterem a um
controle de sua atuação.19
No período de 2001 a 2004, observou-se um aumento no percentual de consultas realizadas a partir
de centrais de agendamento. Este achado coincide
com um período de reorganização do SUS, marcado
por expansão dos municípios em gestão plena do
sistema municipal e implementação das normas operacionais de assistência à saúde. Em termos práticos,
seus resultados foram a organização de serviços de
regulação em saúde, criação das macrorregionais de
saúde, definição dos municípios-polo e pactuações
entre gestores municipais para ordenar a oferta de
serviços de média e alta complexidade nas regiões,
entre outros aspectos.23
A precariedade na informatização dos serviços de
Atenção Primária à Saúde, agravada pelo baixo percentual de UBS com acesso à internet, é um problema a
ser enfrentado para a efetiva organização da regulação
assistencial. Além de comprometer a articulação das
UBS com os serviços de maior complexidade, essa
situação reforça o isolamento dos serviços de atenção
primária nos sistemas municipais/regionais; e afeta a
capacidade de coordenar o fluxo dos usuários na rede
de assistência, principalmente se considerarmos que a
maioria dos municípios estudados constituem referência para os municípios de pequeno e médio porte.6,17,19
Portanto, recomenda-se o investimento em tecnologias e capacitação que fortaleçam a habilidade
coordenadora da Atenção Primária à Saúde, com
ferramentas renovadas de regulação e instrumentos
gerenciais adequados, para garantir a continuidade
da atenção.24
A maioria dos gestores referiu a existência de fila
única para organizar o acesso, desconsiderando a
singularidade de cada caso. Na região Sul, o agendamento a partir da UBS foi observado em 71% dos
casos, enquanto na região Nordeste, essa proporção
foi de 53%. Entretanto, se considerarmos o modelo
assistencial da Estratégia Saúde da Família, essa
proporção cai para 31% na região Sul e se eleva a
64% na região Nordeste, destacando a participação
deste modelo no encaminhamento para serviços de
maior complexidade. Independentemente da macrorregião, os usuários tiveram papel ativo na busca da
integralidade da assistência. Mesmo em municípios
com agendamento centralizado, ainda há necessidade
de ajustes para conceber uma ordem adequada de
prioridades das solicitações recorrentes às agendas
disponíveis.25
Na maioria das especialidades investigadas, o tempo
de espera dos usuários foi superior na região Sul, em
comparação à região Nordeste. O menor tempo de
espera foi para as especialidades de pediatra, ginecoobstetrícia e odontologia. O acesso a neurologistas foi
destaque negativo em ambas as regiões. O tempo é
um componente importante para verificar a adequada
estruturação do sistema frente às necessidades de
referenciamento para um nível especializado: a espera
prolongada compromete a integralidade da assistência.26 No SUS, o longo tempo de espera, mesmo para
demandas frequentes, tende a imprimir uma imagem
depreciativa do atendimento oferecido à população
que utiliza seus serviços,27 ao desconsiderar o perfil
epidemiológico, o “tempo oportuno”28 e o manejo
adequado dos problemas de saúde.29
A região Nordeste apresentava maior agilidade no
acesso a recursos diagnósticos e terapêuticos especializados, em alguns casos quatro vezes mais rapidamente
que na região Sul, como por exemplo, nos exames de
ecocardiografia e hemodinâmica. Este achado precisaria ser melhor explorado, considerando-se a relação
Epidemiol. Serv. Saúde, Brasília, 22(4):631-640, out-dez 2013
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Regulação assistencial articulada à Atenção Primária à Saúde
entre a oferta de serviços e a densidade demográfica,
o perfil epidemiológico e os recursos disponíveis em
cada macrorregião.5
O tempo de espera para a realização de exames
ou procedimentos terapêuticos indica mais sobre a
remuneração dos procedimentos e do interesse dos
prestadores, do que sobre as necessidades de saúde
dos usuários do sistema. Um exemplo disso é o menor
tempo médio de espera para procedimentos considerados de alta complexidade tecnológica.6,19
Outra evidência da limitação dos municípios na
regulação dos serviços é a falta de estruturas e estratégias efetivas para acolhimento e encaminhamento das
demandas dos usuários. Geralmente, esses dispositivos
eram centralizados em secretarias municipais de saúde
e nos conselhos municipais de saúde, limitando as possibilidades de colaboração dos usuários na avaliação
dos serviços disponíveis, seja por ter que se deslocar
ao setor, seja por desconhecimento das formas de
controle social e sua importância no SUS.
Os achados do presente estudo reforçam a necessidade de investimentos na estrutura e no processo
de trabalho. São questões importantes no momento
em que se amplia, no Brasil, a discussão sobre a qualificação da rede de serviços prestados à população.
A baixa proporção de respostas dos gestores sobre
o tema da regulação assistencial e o ano de coleta de
dados constituem limitações do presente estudo, motivo pelo qual foram pesquisados todos os municípios
referentes à amostra do ELB-Proesf, para a geração de
dados consistentes.
A utilização de tecnologias de informação e uso
da internet nas ações dos trabalhadores das UBS são
questões que podem ter sofrido mudanças consideráveis, dada a redução dos valores de mercado de
algumas tecnologias. Frente aos resultados encontrados neste estudo, espera-se que os investimentos
feitos nos últimos anos tenham minimizado a fragilidade na regulação do acesso ao sistema de saúde,
ampliando as centrais com densidade tecnológica
adequada e a articulação das UBS com os serviços
da rede assistencial.
Ainda assim, há necessidade de fortalecer os investimentos em todos os níveis do sistema de regulação
assistencial, incluindo a adequação da estrutura física, equipamentos, recursos humanos e participação
dos profissionais da Atenção Primária à Saúde nas
capacitações.28 Uma resposta governamental a essa
638
deficiência pode estar no Programa Mais Saúde, que
propõe complexos reguladores para garantir o acesso
equitativo aos serviços de saúde em municípios com
mais de 100 mil habitantes. A utilização do sistema de
regulação informatizado (SISREG) e a implantação
do Cartão Nacional de Saúde poderão subsidiar a
avaliação das políticas públicas e qualificar o acesso
aos serviços, garantindo a integralidade da atenção em
tempo oportuno.28
Ao caracterizar as ações de regulação assistencial
articulada à Atenção Primária à Saúde, é possível
identificar fragilidades na implantação e ampliação
das centrais de regulação – não obstante os investimentos feitos na qualificação, adequação e articulação das Centrais de Regulação às redes de saúde. O
processo regulatório descrito demonstrou deficiências no âmbito de sua organização, comprometendo
a resolubilidade de sua demanda e a resolução dos
casos de forma eficiente, ao desconsiderar a rede
assistencial e a dificuldade dos trabalhadores da
Saúde em identificar as necessidades mais amplas
de saúde da população.
Apesar do tempo transcorrido entre a coleta de
dados e a redação do manuscrito, percebe-se a relação, com os resultados deste estudo, dos recursos
de regulação assistencial descritos na Portaria GM/
MS nº 1.559 – de instituição da Política Nacional de
Regulação do Sistema Único de Saúde, SUS –, que só
foi publicada em 1º de agosto de 2008.29
Estudo mais recente30 aponta alguns dados semelhantes aos apresentados neste artigo. Entre eles, a
ausência de regulação e de fluxos de usuários no SUS,
um importante entrave à garantia de cuidado integral
e completitude do processo de integração da rede
assistencial.
Recomenda-se que futuros estudos, à semelhança
do Estudo de Linha de Base do Projeto de Expansão e
Consolidação da Estratégia Saúde da Família – ELBProesf –, investiguem a situação atual da regulação
assistencial diante da expansão da Estratégia Saúde
da Família e da tentativa de organização da rede
de serviços, coordenadas pela Atenção Primária
à Saúde, incluindo municípios de todos os portes
populacionais, em todas as regiões do país. Esses
estudos poderão identificar as possíveis inovações
surgidas durante a implementação de políticas de
organização dos fluxos de usuários do SUS, além de
apontar as dificuldades enfrentadas por gestores na
Epidemiol. Serv. Saúde, Brasília, 22(4):631-640, out-dez 2013
Marcos Aurélio Matos Lemões e colaboradores
regionalização da saúde, na adequação entre oferta
e demanda de serviços e na ordenação de usuários
dentro da rede assistencial.
Agradecimentos
Ao Ministério da Saúde, Banco Mundial e Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq – Edital 23/2006, processo no 409463/2006-0),
pelo apoio financeiro.
Contribuição dos autores
Lemões MAM, Facchini LA, Thumé E e Dilélio AS
contribuíram na concepção do artigo, análise e interpretação de dados.
Tomasi E e Borges CLS contribuíram na redação
final do artigo.
Todos os autores aprovaram a versão final do
manuscrito e são responsáveis por todos os aspectos
do trabalho, incluindo a garantia de sua precisão e
integridade.
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Recebido em 26/02/2013
Aprovado em 11/11/2013
Epidemiol. Serv. Saúde, Brasília, 22(4):631-640, out-dez 2013
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