UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS
UNIDADE UNIVERSITÁRIA DE CIÊNCIAS SÓCIO-ECONÔMICAS E HUMANAS
CURSO DE PEDAGOGIA
VANESSA SIQUEIRA DE MELO
A PRÁTICA DA LITERATURA INFANTIL NA FORMAÇÃO DO LEITOR LITERÁRIO DO
ENSINO FUNDAMENTAL
ANÁPOLIS- GO
2009
VANESSA SIQUEIRA DE MELO
A PRÁTICA DA LITERATURA INFANTIL NA FORMAÇÃO DO LEITOR LITERÁRIO DO
ENSINO FUNDAMENTAL
Monografia desenvolvida sob orientação da Prof.
Ms. Eliane Gonçalves Costa Anderi como requisito
para aprovação e obtenção do título de
Licenciatura em Pedagogia na Universidade
Estadual de Goiás.
ANÁPOLIS- GO
2009
VANESSA SIQUEIRA DE MELO
A PRÁTICA DA LITERATURA INFANTIL NA FORMAÇÃO DO LEITOR LITERÁRIO DO
ENSINO FUNDAMENTAL
Monografia desenvolvida sob orientação da Prof.
Ms. Eliane Gonçalves Costa Anderi como requisito
para aprovação e obtenção do título de
Licenciatura em Pedagogia na Universidade
Estadual de Goiás.
Banca Avaliadora
Prof. Ms. Eliane Gonçalves Costa Anderi
(Orientadora)
______________________________________________________________________
Prof. Ms. Keila Matida de Melo Costa
(Leitora)
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, pelo seu infinito amor. Por me dar a graça de poder
estar realizando esta grande vitória em minha vida e por tudo que tenho e que sou.
Aos meus amados pais, Claudiomar e Vanderlucia, por todo amor e carinho, por
acreditarem em mim e por serem exemplos de pai e de mãe.
Aos meus queridos irmãos, Claudimiro e Dayane, por serem os melhores irmãos do
mundo.
A duas pessoas em especial, minha avó Izabel e minha tia Maria, por toda dedicação e
amor.
Ao meu namorado Junior, que sempre me apoiou na construção desse sonho.
A toda minha família, que tanto me ajudaram e incentivaram.
As minhas amigas Carine, Deise, Fabiana e Flaviana , por me mostrarem o valor de
uma verdadeira amizade.
A minha orientadora Eliane Anderi, por toda sua dedicação e por ser um exemplo de
professora.
A professora Keila, pela sua dedicação e carinho com que trata as pessoas.
E a todos os professores da Universidade Estadual de Goiás, pela contribuição dada a
minha formação.
“O leitor tem o dever de emprestar voz às letras
silenciosas”
Alberto Manguel
RESUMO
O trabalho em estudo tem como finalidade demonstrar como vem sendo trabalhada a
prática da literatura infantil na formação do leitor literário, pois a questão da formação
inicial do leitor é um dos elementos de grande preocupação no processo de ensinoaprendizagem. O objetivo geral do estudo e conhecer e compreender a prática da
leitura literária no processo de formação do leitor das séries iniciais do ensino
fundamental. Para a execução do presente estudo, foi utilizada a pesquisa bibliográfica,
análise documental (Projeto Político Pedagógico, plano anual, plano de aula e matrizes
de habilidades), conversas informais como os professores e com a auxiliar
administrativa, e coleta de dados (questionários para professores do 3 ao 5 ano, os
quais classificados em PI, PII e PIII), como também observações para verificar o acervo
literário da escola. Esses procedimentos foram analisados, aplicados e realizados em
uma escola da rede pública da cidade de Vianópolis-GO. O trabalho desenvolvido
possibilitou-nos compreender que na escola, na qual foi realizada a pesquisa, ocorre
uma pedagogização da literatura infantil, sendo a mesma deturpada em sua prática,
servindo a vários propósitos, menos ao que se refere à formação do leitor literário.
Palavras-chave: Leitura. Literatura infantil. Formação do leitor literário
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.................................................................................................................
7
....
1 A IMPORTÂNCIA DA LEITURA E A FORMAÇÃO DO LEITOR LITERÁRIO...........
9
12
1.1 A importância da leitura e as características do ato de ler.....................................
15
1.2 O papel do professor na formação do leitor literário..............................................
2 CARACTERÍSTICAS DA LITERATURA INFANTIL E SUA PRÁTICA NO AMBIENTE 20
ESCOLAR..
23
2.1 Literatura infantil e instituição escolar....................................................................
2.2 O espaço da leitura na escola................................................................................
3 A PRÁTICA DA LITERATURA INFANTIL NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO
27
28
FUNDAMENTAL...........................................................................................................
29
3.1 A questão da literatura infantil nos procedimentos didáticos................................
3.2 A literatura infantil na sala de aula.........................................................................
31
33
3.3 Observando o ambiente literário...........................................................................
CONSIDERAÇÕES FINAIS.........................................................................................
REFERÊNCIAS ...........................................................................................
APÊNDICE…………………………………………………………………………………
36
37
39
40
ANEXOS………………………………………………………………………………………
INTRODUÇÃO
No presente estudo pretendemos verificar como vem sendo trabalhada a
leitura de obras de literatura infantil na formação do leitor literário, pois a questão da
formação inicial do leitor é um dos elementos de grande preocupação no processo de
ensino-aprendizagem. Tendo em vista esse aspecto, sentimos a necessidade, o
interesse, e ao mesmo tempo a curiosidade em analisar a prática da literatura infantil na
formação inicial do leitor. Isso justifica o motivo pelo qual escolhemos esse objeto de
estudo. O objetivo geral da pesquisa é conhecer e compreender a prática da leitura
literária no processo de formação do leitor das séries iniciais do ensino fundamental.
O estudo em questão é relevante porque vem mostrar a importância que a
leitura possui, pois é por meio dela que nos apropriamos dos conhecimentos presentes
em nosso meio. A leitura não deve ser realizada de forma mecânica, ou seja, apenas
como decodificação do código escrito, mas durante o ato da leitura é necessário que
haja a compreensão do material lido como também a interação entre o leitor e o texto.
Outro aspecto em destaque, refere-se à importância em utilizar a literatura infantil no
processo de ensino-aprendizagem no que se refere à formação do leitor, isso porque
esta possui elementos capazes, como em nenhum outro, de despertar na criança o
interesse/gosto pela leitura, transformando-a em um leitor crítico, consciente e
autônomo, capaz de converter o ato de ler em prática social.
O presente estudo fornecera informações relevantes e necessárias que
ajudarão tantos os professores como todos os envolvidos no processo de educação a
rever a questão do uso da literatura infantil como ferramenta importante para a
formação do leitor, e o uso adequado da obra literária na formação desse leitor.
Para a execução do presente estudo foi utilizada a pesquisa bibliográfica,
análise documental (Projeto Político Pedagógico, plano anual, plano de aula e matrizes
de habilidades), conversas informais com os professores a com auxiliar administrativa e
coleta de dados (questionários, para professores do 3º ao 5º anos, os quais
classificados em PI, PII e PIII), como também observações. Esses procedimentos foram
analisados, aplicados e realizados em uma escola da rede publica da cidade de
Vianópolis-GO. A pesquisa bibliográfica é necessária, pois e a base teórica para efetuar
8
a pesquisa, assim como a análise documental, a coleta de dados e as observações.
Esses elementos nos possibilitaram conhecer a prática da literatura infantil naquela
instituição.
O trabalho está dividido em três capítulos, no primeiro discuti-se a
importância da leitura, as características do ato de ler e o papel do professor na
formação do leitor literário. No segundo capítulo aborda as características da literatura
infantil, sua prática no ambiente escolar e o espaço destinado à leitura nesse ambiente.
E, no terceiro serão expostas as análises e as observações realizadas na instituição
escolar.
Procuraremos durante a elaboração do estudo, identificar os mecanismos de
incentivo da prática da literatura infantil empregados pelos professores; identificar os
objetivos que os professores dizem ter ao trabalhar com a literatura infantil, como
também, identificar o nível de interesse dos alunos quando se trabalha com a literatura
infantil.
CAPITULO I: A IMPORTÂNCIA DA LEITURA E A FORMAÇÃO DO LEITOR
LITERÁRIO
No presente capítulo apresentaremos um estudo bibliográfico sobre a
evolução das práticas de leitura de antigamente até o momento atual. Destacaremos
também as características do ato de ler e o papel do professor no processo de
formação do leitor literário.
A leitura, desde o seu surgimento, passou por grandes transformações as
quais influenciaram na concepção de leitura que temos atualmente.
Na Idade Media a leitura era privilégio de poucos, pois “tal prática era restrita
ao clero e a nobreza, o que já evidenciava, na época, a necessidade de controle da
leitura e seu poder subversivo” (PAULINO, 2001, p.15). Isso Indicava a existência de
uma preocupação em controlar a leitura, já que ela oferecia/oferece, ao indivíduo,
subsídios que podem mudar sua visão de mundo, ampliando sua ação enquanto um
cidadão crítico.
O ato de ler era realizado em uma espécie de rolo, “uma longa faixa de
papiro ou de pergaminho que o leitor deve segurar com as duas mãos para poder
desenrolá-la” (CHARTIER, 1999, p. 24). Assim, esse leitor não poderia escrever ao
mesmo tempo em que lia, impossibilitando a realização desses dois atos (ler e
escrever), ou seja, de transcrever para o texto as suas impressões pessoais.
Posteriormente, surgiu o texto em códice o qual proporcionava ao leitor uma
maior habilidade com o texto. “O códice [...] permitia que o leitor pulasse rapidamente
para outras páginas e assim retivesse um sentimento da totalidade- sentimento
composto pelo fato de que em geral o texto inteiro permanecia nas mãos dele durante
toda a leitura” (MANGUEL, 1997, p. 151).
Um aspecto importante que merece destaque está relacionado ao fato de
que, devido às mudanças ocorridas nas formas de leitura, houve também mudanças
relacionadas com a escrita:
Como a leitura era feita em voz alta, muitos elementos da escrita só surgiram a
partir do momento em que surge a leitura silenciosa, como a separação em
palavras e frases; sinais de pontuação e a distinção de letras maiúsculas e
minúsculas(CONCEIÇÃO, 2007, p.26).
10
Antes a leitura era realizada em voz alta e havia a função de um leitor para o
desenvolvimento de tal ação, pois “a maioria das pessoas não sabiam ler e, portanto,
era necessário que houvesse alguém que fizesse a leitura” (CONCEIÇÃO, 2007, p. 26).
Essa leitura em voz alta exigia-se certos procedimentos “porque ler em voz
alta não é um ato privado, a escolha do material de leitura deve ser socialmente
aceitável tanto para o leitor como para o público” (MANGUEL, 1997, p. 145).
A leitura em voz alta, por ser um ato social, privava o seu ouvinte/leitor, já
que o ouvinte de certa forma também era um leitor, de certos elementos durante o ato
da leitura. O que informa Manguel:
Permitir que alguém pronuncie as palavras de uma página para nós é uma
experiência muito menos pessoal do que segurar o livro e seguir o texto com
nossos próprios olhos. Render-se à voz do leitor [...], retira nossa capacidade de
estabelecer um certo ritmo para o livro, um tom, uma entonação que é exclusiva
de cada um. O ouvido é condenado à língua de outra pessoa, e nesse ato
estabelece-se uma hierarquia (às vezes tornadas aparente pela posição
privilegiada do leitor, numa cadeira separada ou num pódio) que coloca o
ouvinte nas mãos do leitor (MANGUEL, 1997, p. 146).
Nesse sentido pode-se notar que a leitura feita por outra pessoa não tem o
mesmo significado do que quando feita por nos mesmos, pois estar em contato com o
material a ser lido faz toda diferença.
A leitura silenciosa foi um grande avanço em relação à leitura oralizada, esta
que se constitui, de acordo com Manguel (1997), essa nova forma de ler possibilitava
ao leitor o estabelecimento de uma relação sem restrições com o livro e as palavras.
A leitura silenciosa permitia ao leitor uma maior intimidade com o texto, ou
seja, ele começa a estabelecer relações até antes não realizadas, e a mudança do
portador de texto, do pergaminho para o códice, foi outro fator que possibilitou ao leitor
ter um maior contato com esse tipo de material impresso:
O leitor tinha tempo para considerar e reconsiderar as preciosas palavras cujos
sons - ele sabia agora – podiam ecoar tanto dentro como fora. E o próprio texto,
protegido de estranhos por suas capas, tornava-se posse do leitor,
conhecimento íntimo do leitor, fosse na azáfama do scriptorium, no mercado ou
em casa (MANGUEL, 1997, p. 68) .
11
Esse modo de leitura amplia a autonomia do leitor perante o texto, o que
constitui um marco muito importante no campo da leitura, e de acordo com Conceição
(2007), o leitor lendo com os próprios olhos, reconstrói, seleciona o material lido de
acordo com os seus próprios caminhos.
A leitura realizada tanto em voz alta como a realizada em silêncio, segundo
Chartier (1999), possuíam lugares próprios/determinados para serem realizadas. A
primeira era executada em lugares institucionais (universidades, igrejas, no tribunal).
“Os salões de leitura e as academias no século XVIII são outro bom exemplo de rituais
coletivos de leitura”. (PAULINO, 2001, p.18). Já a segunda (leitura silenciosa), era feita
em local público ou privado como na biblioteca, no trem, entre outros locais. Sobre isto
o lugar destinado à realização da leitura, destaca Manguel:
O lugar da leitura é importante não só porque proporciona um cenário físico
para o texto que está sendo lido, mas também porque sugere, ao se justapor ao
lugar na página, que ambos partilham da mesma qualidade hermenêutica e
tentam o leitor com o desafio da elucidação (MANGUEL,1997, p. 194).
A leitura com o passar dos tempos, devido às mudanças ocorridas na
organização social, foi se tornando um bem comum a todos os indivíduos.
A democratização da leitura só vai ocorrer com o advento da sociedade
burguesa, quando uma maior parcela da população foi alfabetizada e pode ter
acesso a livros, jornais e outros impressos como objetos de consumo. Na
verdade, tratava-se também de uma necessidade de se ampliar o mercado, o
que implicava preparar novos leitores (PAULINO, 2001, p.18).
Deste modo, sendo possível a prática da leitura entre todos os indivíduos, e
também podendo ela ser realizada de forma silenciosa, são alternativas que
proporcionam ao leitor um poder muito grande. E dentro dessa circunstância, o livro
passa a ser um elemento de grande destaque, isso porque, “através do livro, o leitor
teria acesso não apenas a informações revolucionárias, mas a idéias revolucionárias
construídas por esse leitor.” (CONCEIÇÃO, 2007, p. 29). Devido a grande importância
que o livro assumiu, ser visto como dono de livros ou como leitor, naquela época,
12
tornou-se sinal de status. E sobre o poder que o livro possuía (e ainda possui), Chartier
destaca que:
O livro indicava autoridade, uma autoridade que decorria, até na esfera política,
do saber que ele carregava. [...] Pela representação do livro, o poder funda-se
sobre a referência do saber. Assim ele se mostra 'esclarecido' (CHARTIER,
1999, p. 84, grifos do autor).
As mudanças ocorridas, tanto da maneira de ler como também nos
portadores de texto, são elementos que influenciam nos diferentes modos de leitura.
Modos estes que, segundo Chartier (1999), mudam segundo os tempos, lugares,
objetos lidos e razões de ler. Novas atitudes surgem enquanto outras se extinguem.
Também para Conceição (2007) o modo de concepção da leitura sofre variações que
são decorrentes do espaço e do tempo histórico em que a leitura ocorre, como
também, dos suportes e do tipo de texto. Em relação às mudanças ocorridas ao longo
dos tempos, Chartier revela que:
Do rolo antigo ao códice medieval, do livro impresso ao texto eletrônico, várias
rupturas maiores dividem a longa história das maneiras de ler. Elas colocam em
jogo a relação entre o corpo e o livro, os possíveis usos da escrita e as
categorias intelectuais que asseguram sua compreensão (CHARTIER, 1999, p.
77).
Várias foram às mudanças ocorridas, e em cada etapa destas exigia-se do
leitor uma postura diferentes perante o texto, para a sua devida compreensão.
1.1 A importância da leitura e as características do ato de ler
Atualmente, por vivermos em uma sociedade que faz uso da escrita em
praticamente todas as atividades cotidianas, a prática da leitura se coloca como um
elemento indispensável para a inserção do indivíduo nas práticas sociais, pois é por
meio da leitura que o sujeito se apropria dos conhecimentos que circulam em nosso
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meio. “O ato de ler funciona então como uma etapa intermediária e instrumental que
leva ao conhecimento.” (AGUIAR, 1988, p. 32).
A leitura é considerada um instrumento que possui grande poder, isso porque
ela faz parte do processo de construção da cidadania. O que afirma Almeida:
Ler é, acima de tudo, ação cidadã. Quando o indivíduo aprende o processo de
leitura ele pode desencadear leituras do mundo, seja pela sua experiência, seja
por sua percepção, ou por sua formação. Ler o mundo é compará-lo,
desconstruí-lo e reinventá-lo o seu modo (ALMEIDA, 2008, p. 39).
A leitura é um dos meios que os indivíduos têm de conhecer e modificar a
sua própria realidade e o meio em que vivem. “A leitura (...), passa a ser, então uma via
de acesso à participação do homem nas sociedades letradas” (SILVA, 2005, p. 64). E
desta forma, pode-se desenvolver no indivíduo uma postura crítica, já que a leitura, de
acordo com Evangelista (1989), possibilita uma compreensão mais crítica da realidade.
A leitura possui uma enorme importância. E a respeito dessa importância
nos revela o autor Manguel:
Não podemos deixar de ler. Ler, é quase como respirar, é nossa função
essencial. [...] Talvez pudesse viver sem escrever, mas não creio que pudesse
viver sem ler. Ler- descobrir- vem antes de escrever. Uma sociedade pode
existir- existem muitas, de fato- sem escrever, mas nenhuma sociedade pode
existir sem ler (MANGUEL, 1997, p. 20).
A leitura é considerada como um instrumento libertador, já que por seu
intermédio, a sociedade de uma forma geral, e os indivíduos de uma forma específica,
tem subsídios para compreender e transformar a sua realidade. “Ao aprender a ler ou a
ler para aprender, o indivíduo executa um ato de conhecer e compreender as relações
humanas registradas através da leitura” (SILVA, 2005, p. 42).
Para que a pratica da leitura aconteça e necessário que haja não somente a
decodificação do texto, mas também a compreensão do mesmo, isso porque ambos
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procedimentos se completam. “Decodificar sem compreender é inútil; compreender
sem decodificar, impossível. Há que se pensar a questão dialeticamente” (MARTINS,
1994, p.32).
Quando o leitor tem uma visão diferente sobre a leitura, considerando-a não
apenas como decifração do código escrito, ele (o leitor) passa então a ter um
conhecimento diferenciado, a observar que a leitura pode levá-lo a inúmeras
experiências. Para Martins (1994) ler significa inteirar-se do mundo, uma forma de
conquistar autonomia, de deixar de ler pelos olhos de outrem. Nesse sentido, o
indivíduo pode ver na leitura um meio que o possibilitará interagir com o mundo,
procurando assim compreendê-lo e até mesmo modificá-lo.
Diante disso, ler significa muito mais que decodificar signos, ler significa, a
partir de então, interagir com um mundo novo, repleto de descobertas, repleto
de situações novas e desconfortantes que, muitas vezes, serão pontes entre um
mundo e outro. Ler é viagem. Ler é travessia. Ler é caminhar. Ler é um esforço,
de onde advém o prazer, muitas vezes, reconfortantes e garantidor da
continuidade do processo. (ALMEIDA, 2008, p. 39).
Nessas circunstâncias, podemos observar o grande poder que a leitura
possui, porque esta possibilita ao seu leitor a aquisição de uma vasta área de
conhecimentos. “A leitura é o clube dos clubes, a única possibilidade de muitas
experiências de aprendizado” (SMITH, 1989, p. 212).
A leitura é uma interação estabelecida entre o texto e o leitor, já que ambos
são partes integrantes e indispensáveis, porque “a leitura é uma interação entre o leitor
e o texto” (SMITH, 1989, p.86). Esse fato proporciona ao leitor uma liberdade muito
grande, permitindo-o viajar pelo texto. E sobre esse fato afirma Certeaul (1994 apud
PAULINO 2001, p. 13):
Bem longe de serem escritores, fundadores de um lugar próprio, herdeiros dos
lavradores de antanho- mas, sobre o solo da linguagem, cavadores de poços e
construtores de poços e construtores de casas- , os leitores são viajantes; eles
circulam sobre as terras de outrem, caçam, furtivamente, como nômades
através de campos que não escreveram, arrebatam os bens do Egito para com
eles se regalar.
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O leitor ao interagir-se com o texto estabelece uma relação muito íntima com
este, o que leva a ter uma liberdade de compreensão, isso porque “a leitura é sempre
apropriação, invenção, produção de significados [...]. Toda história da leitura supõe, em
seu princípio, esta liberdade do leitor que desloca e subverte aquilo que o livro lhe
pretende impor” (CHARTIER, 1999, p. 77).
O leitor transfere para o texto as suas impressões pessoais, e isso
dependerá de inúmeros fatores (sociais, econômicos, culturais...), os quais influenciarão
na concepção de leitura por parte do leitor. “A leitura não pode ser compreendida sem
levar em consideração os fatores perceptivos, cognitivos, lingüísticos e sociais, não
somente da leitura, mas do pensamento e aprendizado em geral” (SMITH, 1989, p.43).
Nessa perspectiva, verifica-se que a compreensão de um mesmo texto
pode possuir inúmeros sentidos, variando de leitor para leitor. “Como um texto possui
múltiplos leitores, ainda assim, não há garantias de que haverá apenas um sentido, já
que as vivências são diferentes, sendo assim, está entregue também a uma liberdade
de significação.” (CONCEIÇÃO, 2007, p. 20). Desta forma, um mesmo texto pode gerar
inúmeras interpretações e isso se dará por meio das interações de leitura depositadas
pelo leitor perante o texto.
O ato de ler exige do leitor interação , já que esse e levado a preencher as
várias lacunas existentes no interior do texto:
Ler é processo diário de construção em que o leitor é colocado frente aos
espaços em branco deixados pelos textos, diante das mais variadas entregas e
das mais complexas situações e perante qualquer um destes fatos, o texto lhe
cobrara uma atitude. Portanto, a leitura não é passiva, nem pacifica (ALMEIDA,
2008, p.39).
Diante desse fato, cabe ao leitor assumir uma postura perante o texto, ou
seja, ele deve, de acordo com Alliende (2008), estabelecer relações entre os seus
conhecimentos prévios e a nova informação apresentada pelo texto, estabelecer
comparações, como também formular perguntas relacionadas com o conteúdo com a
realidade social.
16
1.2 O papel do professor na formação do leitor literário
O professor exerce uma função muito importante no processo de formação
da leitura literária em seus alunos, pois ele é “responsável pela mediação entre o livro
de literatura e o aluno leitor” (FREITAS, 2002, p.72).
Um fato relevante que merece destaque é a prática de leitura dos
professores, já que são esses os quais vão ser, em grande parte, os principais
responsáveis entre o aluno e a obra literária, isso porque, de acordo com Evangelista
(2003), é na escola o único local em que algumas crianças terão contato com o texto
literário. Para formar leitores o professor necessita também ser atraído pela leitura, ou
seja, como afirma Kleimam (2000), os professores devem ter verdadeiramente paixão
por ela, porque assim compreenderão o valor que a leitura possui, tanto como prática
social, quanto como atributo pessoal, reconhecendo desta forma que a leitura significa
muito mais do que decifração de palavras.
Uma das deficiências ligadas à questão da formação do leitor literário, está
no fato de que “há falta de leitura entre os professores de leitura e de
literatura” (ALMEIDA, 2008, p.12). Questão muito séria, porque o professor como
profissional da educação deve “ter uma prática de leitura fundamentada no gosto, e na
apreciação estética” (FREITAS, 2002, p.134). Caso isso não ocorra, o professor
transmitirá aos seus alunos uma prática equivocada da leitura literária, desvirtuando
assim o sentido da mesma, pois esta possui suas características próprias, que a difere
dos demais tipos de leitura. E se o professor não reconhecer esse aspecto, ele irá, em
sua prática escolar, desvirtuar o sentido real da literatura, transformando-a em objeto
pedagógico:
Em outras palavras, professores de português temos nos debatidos com esse
pressuposto da dificuldade de trabalhar textos literários na escola, de promover
a leitura de livros, de contribuir para que os alunos se tornem leitores
voluntários e autônomos, acrescentando-se o fato de que a necessidade
escolar de avaliação de leitura tem se transformado em cobranças, com todas
as ameaças que esta traz e, por isso mesmo, em vez de aproximação e
identificação, tais praticas têm causado repulsa ao objeto, desgosto no ato de
ler e afastamento das praticas sociais de leitura próprias do contexto dos
leitores ( EVANGELISTA, 2003, p.11).
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Nota-se que adotando a pratica de cobrança, o professor causará no aluno
certa repulsa frente à leitura literária, e esse fato é preocupante, já que “o
desenvolvimento do prazer pela leitura é uma das principais condições que o texto
literário desencadeia” (ALMEIDA, 2008, p.52).
Para que a leitura literária desenvolva no aluno a apreciação por esta, e os
levem a si tornarem leitores críticos e autônomos, porque de acordo com Silva (2005),
ler é participar crítica e ativamente da comunidade humana, o professor necessita
desenvolver certas atitudes ao se trabalhar com a obra literária em sala de aula, isso
porque “muitas vezes, o texto pode até ser bom do ponto de vista literário, mas se o
trabalho for equivocado, os resultados se perdem” (AGUIAR, 2001, p.147).
Primeiramente deve-se levar em conta as experiências dos alunos, aquilo que eles
trazem consigo, pois antes de se ingressarem no ambiente escolar a criança já possui
uma vida social, e é exatamente desse ponto que se deve partir, ou seja, “fazer
predições baseadas no conhecimento prévio, (...) constituindo um procedimento eficaz
de abordagem do texto”(Kleimam, 2000, p.56).
É essencial que o professor valorize a autonomia do aluno frente à obra
literária, tanto no que diz respeito à escolha, como no modo de interpretação da
mesma, caso contrário, ocorre o que afirma a autora Paulino:
A escola, aparentemente espaço de incentivo para a leitura de livros, ao impedir
que os objetivos, iniciativas e estratégias de leitura sejam dos próprios
leitores/alunos, pode afastá-los do processo de produção de sentido e,
conseqüentemente, do universo dos livros (2001, p.27).
Verificamos assim, que a liberdade do aluno é um elemento importante e
necessário no processo de formação do leitor, e isso tem que ser valorizado pelo
professor.
É necessário também o professor utilize uma variedade de obras literárias
infantis em sua sala de aula, o que segundo Evangelista (2003), é um critério que se
deve adotar, e a não realização desse procedimento terá por conseqüência, uma
escolarização inadequada da literatura infantil.
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Constitui-se como prática necessária na formação do leitor literário, a
motivação que o professor transmite para seus educandos no contato com o material
literário, isso porque “o sucesso inicial do encontro do leitor com a obra literária
depende de boa motivação” (COSSON, 2006, p.54).
A seleção dos livros literários é outra questão que merece atenção por parte
dos profissionais da educação, pois:
Faz-se necessária uma adaptação de assunto, estilo, forma e meio a cada obra
produzida para o pequeno leitor. Adaptar o assunto significa escolher temas,
histórias, fatos que estejam de acordo com os seus interesses a sua
capacidade de compreensão. Já a adaptação do estilo diz respeito ao uso de
uma linguagem coerente com o nível da criança, com sua criatividade e com
sua criatividade e com seu estagio de desenvolvimento (AGUIAR, 2001, p.63).
A interação entre o professor e o aluno também representa um ponto
necessário na formação do leitor:
Sabe-se que [...], que é durante a interação que o leitor mais inexperiente
compreende o texto, [...]. Muitos aspectos que o aluno sequer percebeu ficam
salientes nessa conversa, muitos pontos que ficaram obscuros são iluminados
na construção conjunta da compreensão (KLEIMAM, 2004, p.24, grifos do
autor).
Nota-se mais uma vez a importância da mediação do professor na
construção, e no ato da leitura de seus alunos.
Formar um leitor literário é uma tarefa que requer dedicação do professor,
pois esse tipo de leitor si difere dos demais, possuindo características próprias:
O leitor literário ganha um traço distintivo: o do sujeito que busca no livro um
modelo de construção de sentidos, e nele encontra também um refugio. Porque
leitura requer isolamento e certa forma de solidão para construir a subjetividade
(CADERMATORI, 2009, p.25).
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A leitura literária oferece ao aluno a oportunidade de adquirir novas
experiências. O que afirma Saraiva:
A leitura das obras literárias possibilita ao jovem leitor vivenciar o prazer
estético que, por forca do imaginário, o libera da realidade cotidiana e lhe
permite, a partir de sinais lingüísticos, constituir uma no gestalt. Dela decorrem
a apreensão, a compreensão e o julgamento do mundo e a motivação para
alterar práticas sociais (SARAIVA, 2006, p.40, grifos do autor).
Diante disso, cabe ao professor oferecer a oportunidade para que seus
alunos possam usufruir da obra literária tudo aquilo que ela pode oferecer para a
construção de um leitor crítico e autônomo.
CAPÍTULO II CARACTERÍSTICAS DA LITERATURA INFANTIL E SUA
PRÁTICA NO AMBIENTE ESCOLAR
O universo infantil é dotado de características que o difere do mundo do
adulto. E diante disso é necessário enxergar “que esse universo possui características
próprias” (AGUIAR, 2001, p.62). A imaginação, a fantasia, o colorido e também as
imagens são aspectos presentes no meio infantil que fazem toda diferença para as
crianças, e todas essas características podem ser encontradas nas obras literárias
infantis. De acordo com Cunha (2003), as obras literárias devem possuir determinadas
características importantes para o espírito infantil.
Um dos aspectos é o fato de elas despertarem a atenção das crianças é a
questão da imaginação. “Parece também agradar de modo especial à criança a obra
que apresente imaginação" (CUNHA, 2003, p.73). E de acordo com Saraiva (2006),
assim como a arte, a literatura infantil caracteriza-se pela presença da fantasia e pelo
apelo ao imaginário.
Apesar de a obra literária apresentar a imaginação e a ficção como
elementos marcantes de suas características, a mesma também relata fatos de nossa
realidade. O que afirma o autor Saraiva:
Embora seja fictício, o texto literário estabelece correspondência com a
realidade factual e a produção artística, retomando o passado, antecipando o
futuro, explorando a herança literária para transformá-la pela ação criadora,
visto que as representações poéticas trazem fragmentos da realidade, além de
dialogarem com a tradução estética (2006, p.29).
A literatura infantil tem o poder de levar seu leitor a penetrar no texto,
despertando a imaginação de quem a lê. Ela tem a capacidade de relacionar o
imaginário com o real, proporcionando à sua leitura um momento de prazer e
aprendizado. “Adquirindo o hábito da leitura, a criança passa a escrever melhor e a
dispor de um repertório mais amplo de informações” (CADEMARTORI, 1986, p.19).
Ela possui características próprias que a diferencia de outros tipos de textos.
Aceitamos, com facilidade talvez excessiva, a idéia de que o texto literário tem
características – o mais das vezes entendidas como essencialmente formais –
21
diferentes das demais (PAIVA, 2003, p.128, grifos do autor). Por meio dela, o leitor é
levado a vivenciar múltiplas experiências e sentimentos, a viajar pelos seus sonhos e
fantasias. Durante a leitura literária, tudo é permitido ao seu leitor.
Uma das características marcantes da literatura é a capacidade de agregar
inúmeras interpretações:
Ao possibilitar inúmeras leituras, a ambigüidade é fator de enriquecimento
semântico que abre o texto várias interpretações e que lhe garante sua
permanência ou a atemporalidade não introduz, ao contrário do que ocorre em
outros contextos discursivos, 'um elemento perturbador do processo
comunicativo, mas antes um desafio à capacidade do leitor para apreender, no
discurso literário, efeitos surpreendentes e sentidos múltiplos' (REIS 2003, apud
SARAIVA 2006, p. 30, grifos do autor).
O texto literário exige de seu leitor, de acordo com Saraiva (2006), uma
fidelidade à intenção do texto, o qual determina o ponto de partida das interpretações,
porém, deixando uma margem para a imprevisibilidade. Verifica-se assim, que
comportamentos antagônicos são atinentes ao texto literário. Podem-se atribuir também
à obra literária a capacidade de despertar em seus leitores inúmeros comportamentos,
os quais contribuirão para a sua formação pessoal, e conseqüentemente, o
desenvolvimento de seu senso crítico. Em relação a esse aspecto, afirma Cademartori:
A literatura, por sua vez, propicia uma reorganização das percepções do mundo
e, desse modo, possibilita uma nova ordenação das experiências existentes da
criança. A convivência com textos literários provoca a formação de novos
padrões e o desenvolvimento do senso crítico (CADEMARTORI, 1986, p.18).
A literatura infantil é um meio eficaz de levar o aluno a desenvolver a sua
criticidade, pois a mesma:
Ajuda a nos compreender e a compreender os demais; proporciona diferentes
perspectivas para examinar nossos pensamentos, sentimentos crenças,
preconceitos e ações; ensina que há múltiplas possibilidades, muitas verdades
e nenhuma resolução definitiva (ALLIENDE, 2005, p.182).
A obra literária é um meio pelo qual o indivíduo descobre sua
individualidade, e isso ocorre porque é atribuído ao texto literário “a oportunidade de o
22
ser humano se voltar para si mesmo, de refletir sobre si e se descobrir pessoa que
sente que pensa que se alegra e que se entristece” (ECKER apud SARAIVA 2006, p.
39). Para Aguiar (2001), a obra infantil é aquela que enquanto diverte o leitor, favorece
o desenvolvimento de sua personalidade.
Ela também permite ao seu leitor libertar-se de sua realidade cotidiana. ”É
por ser múltipla que a literatura oferece um espaço de liberdade” (CADEMARTORI,
2009, p.50). Fazendo seu leitor viajar pelo imaginário, além de possibilitar a
compreensão do mundo, oferecendo estímulos para compreendê-lo e modificá-lo.
O universo da obra literária é tão fascinante que podemos fazer a sua leitura
diversas vezes, que sempre iremos nos deparar com descobertas diferentes, pois “o
modelo fica para sempre inacabado. A isso se deve o caráter instigante de certas obras
que, não importa quantas vezes tenhamos lido, podemos retomar a elas e encontrar
surpresas” (CADEMARTORI, 2009, p.49). E sobre esse aspecto da obra literária, o
autor Evangelista relata:
Como a obra literária é simbólica, ela permite leituras plurais, dando-se a
interpretação sempre de um modo novo, pelas possibilidades de combinações
dos signos. Por essas vias, o leitor pode ter suas expectativas atendidas ou
contrariadas, em maior ou menor grau. Mas o certo e que ele não continuara
igual depois da leitura, uma vez que seu horizonte estará modificado pela
interação com o texto (EVANGELISTA, 2003, p.249).
A compreensão da leitura literária varia de leitor para leitor. “O significado que
se constrói a partir de um mesmo texto pode variar consideravelmente entre um leitor e
outro” (ALLIENDE, 2005, p.111). Não há uma compreensão única e universal, já que
esta dependerá das expectativas do leitor em relação ao texto lido. “O caráter individual
do ato de ler em nossa sociedade constitui de fato, um componente fundamental do
processo e não uma mera circunstância dele” (PAULINO, 2001, p. 22).
Segundo Cadermatori (1986), devido aos vazios existentes na obra literária,
nós leitores podemos exercer a nossa experiência, nossa capacidade e nossa
imaginação. E o que afirma Aguiar:
Isso ocorre porque o escritor não explicita tudo o que tema dizer, deixando
espaços em branco para o leitor completar. Por exemplo, ao narrar uma
historia, não anuncia todos os passos das personagens, dá saltos no tempo e
23
no espaço e não descreve completamente as criaturas que inventa. Cabe ao
leitor construir as imagens mentais e ir acrescentando dados de acordo com
suas vivencias, suas leituras, enfim, sua compreensão do mundo. Só assim a
leitura adquire um sentido (AGUIAR, 2001, p. 148).
Desta maneira notamos a importância do leitor literário ao fazer sua leitura,
completar os espaços em brancos deixados pela obra.
2.1 Literatura infantil e instituição escolar
A relação entre a literatura infantil e a instituição escolar é um assunto de
muitas discussões nos últimos tempos. Esta relação deve-se ao fato de se “atribuir à
literatura infantil (como também a juvenil) um caráter educativo, formador, por isso ela
quase sempre se vincula à escola, a instituição, por excelência educativa e formadora
de crianças e jovens”. (EVANGELISTA, 2003, p.19). E de acordo com Cademartori
(1986 ), o carater formador que a literatura possui, vinculou-a desde sua origem a
questões/ objetivos pedagógicos.
Ela desempenha um papel muito importante no ambiente escolar no que se
refere à formação do leitor, fato esse que deve ser reconhecido pelos professores:
Os professores dos primeiros anos da escola fundamental devem trabalhar
diariamente com a literatura, pois esta se constitui em um material
indispensável, que aflora a criatividade infantil e desperta as veias artísticas da
criança. Nessa faixa etária,os livros de literatura devem ser oferecidos às
crianças, através de uma espécie de caleidoscópio de sentimentos e emoções
que favorecem a proliferação do gosto pela literatura, enquanto forma de lazer e
diversão (PIRES, 2000, on-line).
De acordo com Martins (1994), a instituição escolar é o local em que a
grande parte das crianças vão ter os primeiros contatos com a leitura, ou seja, livros e
obras literárias. É importante, e ao mesmo tempo necessário, que ela use a literatura
infantil como um meio de despertar na criança o gosto pela leitura, pois a obra literária
possui características que motivam e possibilitam o interesse pela leitura, formando
leitores que sejam capazes de se interagirem com o texto o qual leem. “A literatura
24
deve circular na escola, pois urge formar um leitor sensível e crítico, que percebe o
sentido do ritual, faça parte dele sem se submeter cegamente” (EVANGELISTA, 1989,
p. 54).
A maior preocupação em relação à literatura infantil, está no fato de que com
sua escolarização, ela perde suas características próprias, passando a ser utilizada
para atender objetivos que não são próprios do texto literário. A autora Evangelista
destaca que:
[...] os exercícios que, em geral, são propostos aos alunos sobre textos da
literatura infantil não conduzem à analise do que é essencial neles, isto é, à
percepção de sua literalidade, dos recursos de expressão, do uso estético da
linguagem; centram-se nos conteúdos, e não na recriação que deles faz a
literatura (EVANGELISTA, 1989, p.43).
A literatura infantil é vista pela instituição escolar como um recurso que é
usado para desenvolver nos alunos o domínio linguístico:
A educação formal voltou-se ao texto infantil despertada por interesses mais
imediatos. Sendo inegável o abalo do ensino da lingua portuguesa, a literatura
infantil passou a ser vista como instrumento de uma possível expansão do
escasso domínio linguístico dos alunos (CADEMARTORI, 1986, p.19).
A literatura infantil não pode servir de pretexto para se trabalhar com a
gramática e com a transmissao de valores morais de bom comportamento:
É impossível afastar uma série de equívocos que costumam estar presentes na
escola em relação aos textos litarários, ou seja, tratá-los como expedientes para
servir ao ensino das boas maneiras, dos hábitos de higiene, dos deveres do
cidadão, dos tópicos gramaticais, das receitas desgastantas do ‘ prazer do
texto’, etc. Postos de forma descontextualizada, tais procedimentos pouco ou
nada contribuem para aformação de leitoras capazes de responder assutilezas,
as particularidades, os sentidos, a extensão e a profundidade das construções
literárias (PCN, 1997, p.37, grifos do autor).
A leitura literária, dentro da instituição escolar, muitas vezes é controlada,
direcionada, fragmentada, tratada como um dever escolar e não como um momento de
prazer e descobertas. O aluno não tem autônomia própria para escolher o que deseja
ler, pois tudo lhe é imposto, até mesmo a maneira/posição correta de se ler. “Na
25
verdade, a sociedade tenta impor regras que controlam o corpo do leitor, determinandolhe um espaço adequado e posições corretas o que se relaciona com o próprio controle
de produção de sentido” (PAULINO, 2001, p. 23). Segundo Manguel (1997), o conforto
corporal do leitor influencia no prazer da leitura.
As práticas docentes que vem sendo adotadas na escola em relação ao texto
literário tem como consequência a desmotivação pela leitura. Para a autora Kleiman:
[...] a leitura e cobrada mediante resumos, relatórios, e preenchimentos de
fichas é uma redução da atividade a uma avaliação desmotivadora. A
inssistência no controle diminui a semelhança entre a leitura espontânea, do
cotidiano, e a leitura escolar, ajudando na construção de associações desta
última como o dever e não com o prazer (KLEIMAN, 2000, p.23).
A desmotivação pela leitura da obra literária ocorre muitas vezes não pela
dificuldade em decodificar o código escrito, mas sim,pela maneira em que e
direcionada a leitura, impedindo que o aluno possa interagir, da sua maneira, com o
texto
literário.
“
A
leitura
pode
tornar-se
uma
atividade
desejada
ou
indesejada” (SMITH, 1989, p. 212).
A maneira inadequada da utilização da literatura infantil na escola se deve ao
fato de que sua escolarização leva à fragmentação da obra literária, o que se pode
verificar nos livros didáticos, geralmente a única ferramenta de trabalho dos
professores.” O livro didático não funciona em sala de aula como um instrumento
auxiliar para conduzir o processo de ensino e transmissao de conhecimento, mas
como o modelo- padrão, autoridade absoluta, o critério último de verdade”( FREITAS,
1989, p.111). E de acordo com Paulino (2001), o uso incorreto de textos fragmentados,
manipulados, acaba por ocasionar uma subordinação do leitor ao jugo escolar.
Os textos apresentados nas instituições escolares não possuem uma
sequência lógica, o que ocasiona o não entendimento do texto ou até mesmo o
desinteresse pelo mesmo. “Assim, ao ser transferido do livro de literatura infantil para o
livro escolar, o texto literário deixa de ser um texto para emocionar, para divertir, para
dar prazer e tornar-se um texto para ser estudado.” (EVANGELISTA, 1989, p. 43,
grifos do autor). Dentro dessas circunstâncias, nota-se que a literatura é usada apenas
como um suporte para diversas atividades, geralmente relacionadas à metalinguagem
26
(gramática, ortografia). “O texto literário é um objeto de estudo antes de ser objeto de
uma experiência pessoal e intransferível” (SARAIVA, 2006, p. 28).
Segundo Evangelista (2003), ao ser tranportada a obra literária para o livro
didático, verifica-se que inevitavelmente ocorre uma modificação da mesma, já que
passou-se de um suporte para outro, mas é essencial que ao ser transferida para o
livro didático, a obra literária conserve suas caracteíisticas essenciais, e que de forma
alguma sejam alterados os elementos que constituem a literariedade do texto.
A inadequada escolarização da literatura infantil também está relacionada à
questão da seleção de autores e obras, pois:
Há uma grande recorrência dos mesmos autores e das mesmas obras nas
coleções didáticas para as quatro primeiras séries do primeiro grau. Poemas
são repetidamente buscados [...]. A mesma recorrência de autores e obras na
seleção de textos narrativos [...]. Oferece-se à criança uma gama restrita de
autores e obras, quanto a literatura infantil, em prosa e em verso, é bastante
rica e diversificada (EVANGELISTA, 2003, p.27).
A presença de uma grande diversidade de livros literários na sala de aula é
muito importante, oferecendo assim ao aluno a possibilidade de contato com variadas
obras.
Existe uma outra preocupação em relação a literatura infantil, que é a
desvalorização desta pela instituição escolar, porque a leitura de textos literários não
possui um espaço próprio, muitas vezes , nem mesmo dentro das propostas políticas
pedagógicas das escolas.” O que fazer com ou do texto literário em sala de aula fundase, ou deveria fundar-se, em uma concepção de literatura muitas vezes deixada de lado
em discussões pedagógicas” (LAJOLO, 2007, p.11, grifos do autor). Para Saraiva
(2006), as escolas demonstram sua desvalorização frente à obra literária pela pouca
importância que lhe é dispensada nas atividades de escolares.
Portanto,é possível notar que a obra literária constitui-se como um material
que engloba os elementos necessários para despertar o interesse pela leitura nas
criancas, mas que é preciso haver uma mudança em relação à sua utilização no
ambiente escolar.
27
2.2 O espaço da leitura na escola
A questão do espaço destinado à leitura de obras literárias infantil na escola é
um assunto que merece muita atenção. E segundo Abramovich (1997), é necessário
reconhecer a importância e a necessidade desse local no ambiente escolar.
A biblioteca é dos principais locais destinados à leitura na escola. E ela possui
um valor muito grande no processo de ensino-aprendizagem, e consequentemente na
formação do leitor. Cabe a ela, atuar como propulsora do conhecimento e da leitura,
contribuindo assim, com a formação do indivíduo.
Segundo Freitas (2002), a biblioteca escolar tem que ser um ambiente
propício e confortável para que os alunos se entreguem ao ato de ler, e para que isso
ocorra, é necessário também que a biblioteca possua um grande acervo de livros. Isso
porque “ o fato de incluir obras diversas ( boas, médias, pessímas), permite que se
desenvolva a fundo o senso crítico do aluno” (ABRAMOVICH, 1997, p.159).
Voltando a realidade das bibliotecas escolares no Estado de Goiás, devido às
suas precárias condições, o governo do Estado de Goias, no ano de 2000, lançou o
Programa Cantinho da Leitura, enviando livros infantins as instituiçoes escolares. O
Cantinho da Leitura é um espaço localizado dentro das salas de aulas, para comportar
livros de literatura infantil, destinados a alunos da 1 a 4 séries.
Desse modo, notamos que as escolas possuem incentivos, os quais
constituem-se em elementos importantes que auxiliam as instituições escolares no
processo de formação de leitores. E cabe às escolas
contribuições que recebem.
fazerem bom uso das
CAPÍTULO III A PRÁTICA DA LITERATURA INFANTIL NOS ANOS
INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL
O presente capítulo destina-se a reconhecer como a prática da literatura
infantil está sendo trabalhada no ambiente escolar. Para isso foram analisados os
seguintes documentos: Projeto Político Pedagógico (doravente PPP), plano anual e
plano dos professores de uma escola da rede pública, aplicou-se questionários para os
professores, entrevistas informais com estes e com a auxiliar administrativa da escola,
também foram realizadas observações para verificar o acervo literário.
A escola estadual “Ensino Aprendizagem” (nome fictício), fica localizada no
setor urbano da cidade de Vianópolis, no Estado de Goiás. Nela é oferecido os anos
iniciais do Ensino Fundamental (1º ao 5º anos), em dois turnos, matutino e vespertino,
possuindo um total de 270 alunos matriculados.
Consta no PPP que a escola possui: cinco salas de aulas, sendo
uma
27 de
adaptada, secretaria, cantina, sala dos professores, almoxarifado, banheiros
professores e alunos, bebedouros e uma quadra de esportes.
No PPP consta que, sendo a clientela da escola de classe popular, a maioria
dos pais são trabalhadores braçais ou funcionários públicos, os alunos não possuem
um acompanhamento em casa das atividades escolares. “A maioria só tem contato com
material escrito e literatura na escola, retardando assim, seu processo de
desenvolvimento cognitivo” (PPP, 2009, p. 8). Certamente é na escola que, de acordo
com Martins (1994), grande parte das crianças vão ter os primeiros contatos com a
linguagem escrita. Sobre isso esse trecho do PPP não se equivoca, mas sim quando
expõe que por serem os alunos filhos de trabalhadores braçais e funcionários públicos,
estes não recebem um acompanhamento escolar em casa. Segundo Aguiar (1984)
deve-se levar em conta as experiências dos alunos, aquilo que eles trazem consigo,
pois antes deles ingressarem no ambiente escolar a criança já possui uma vida social,
e é exatamente desse ponto que se deve partir, ou seja, valorizar aquilo que o aluno
tem conhecimento. Sendo os estudantes oriundos de um grupo social menos
favorecido, não quer dizer que eles sejam destituídos de um saber, ou que isto os torne
incapazes de seguir aprendendo. Apenas indica que essa escola deve utilizar dessas
29
informações para organizar o seu processo didático pedagógico de modo a fazer com
que esses estudantes apropriem do saber sistematizado.
Em relação aos recursos materiais da escola, o PPP descreve que a escola
possui um total de 288 materiais e equipamentos didáticos pedagógicos. Todavia não
foi identificado, na relação desses materiais, a existência de um acervo literário, de
livros e dicionários. Indicando assim, a pouca importância dada, pela escola, a leitura
no ambiente escolar.
A escola possui 08 professores, 03 deles estão cursando o curso de
Pedagogia; 03 concluíram o de Letras, somente 01 concluiu o curso de Pedagogia e 01
possui o magistério em nível médio. Dentre os oito professores somente 01 possui
curso de especialização.
O corpo administrativo é formado por 01 diretora formada em Letras com
especialização em Psicopedagogia; 01 vice-diretora, formada em pedagogia e com
especialização em Administração Educacional; 01 secretária geral formada em Letras;
01 coordenadora da merenda que possui o nível médio e 01 coordenadora pedagógica,
formada em Letras com especialização em Psicopedagogia.
Ao se analisar a formação do quadro docente e da equipe de gestores da
escola, evidencia-se a grande presença de professores formados no curso de Letras. E
nos chama mais atenção no PPP, quando este apresenta dados da realidade, nos
quais são altas as taxas de reprovação, segundo os registros: “os índices de
reprovação e maior nas disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática” (2009, p.8).
O que nos leva a identificar uma contradição, pois mesmo com um numero
de professores com formação em nível superior no curso de Letras, ou seja, dedicados
especificamente ao ensino da língua materna, a escola apresenta problemas de
reprovação na disciplina de Língua Portuguesa.
3.1 A questão da literatura infantil nos procedimentos didáticos
As matrizes de habilidades de Língua Portuguesa* já vem prontas da
Secretaria Estadual da Educação de Goiás, para serem desenvolvidas no 1º, 2º, 3º e 4º
30
bimestres do ano letivo e estão divididas em dois eixos: prática escrita, produção de
texto e língua.
Analisando essas matrizes, observamos apenas um aspecto relacionado com
a literatura infantil, que é, mais uma vez, a localização de informações em textos
poéticos, ou seja, a pedagogização da obra literária. O autor Saraiva destaca que:
O docente substitui a leitura como prática significante por exercícios centrados no
reconhecimento de informações, impedindo, assim, que os alunos participem da
descoberta do real que o poder imagético do texto desencadeia e do prazer da
exploração dos recursos da linguagem que todo texto estético mobiliza
(SARAIVA, 2006, p.27).
Neste sentido, aponta para um uso indevido da literatura infantil, e, segundo
as informações obtidas nos documentos, essa ação ocorre sob orientação da
Secretaria Estadual da Educação, demonstrando o tipo de importância dada as praticas
de leitura literária. Podemos observar ainda, em relação as matrizes curriculares, a
imagem que se tem construída do professor, na escola e na Secretaria de Educação,
considerando que o professor e apenas um executor de coisas pensadas por outros, ou
seja, um cumpridor de ordens e não um intelectual capaz de pensar sua ação e
responder sobre ela:
Observando os planos anuais dos professores, verifica-se uma distorção
quanto ao uso da obra literária infantil. Todos os três planos (3,4 e 5 anos), se referem
ao trabalho com textos literários da seguinte forma: “ Literários infantis; Filmes;
Musicas; Contos; Poesias” ( plano anual dos professores). Os planos anuais
encontram-se dessa forma igualmente nos três anos (3, 4 e 5), o que podemos analisar
um planejamento inadequado em relação ao trabalho com a literatura infantil. Já que
“um plano didático adequado deve possuir coerência e unidade, continuidade e
seqüência, flexibilidade, objetividade e funcionalidade, precisão e clareza, elementos
esses indispensáveis” (HAIDT, 2003, p.104)
*Refere-se a competências e habilidades que serão desenvolvidas pelo aluno durante sua vida escola
31
Nos planos anuais não encontramos nenhum relato de trabalhos específicos
sobre as obras literárias, nem mesmo o numero de obras previstas para se trabalhar no
presente ano letivo. Perante essas analises observamos que:
O que se pode criticar [...], e a inadequada, erronia, a imprópria escolarização
da literatura, que se traduz em sua deturpação, falsificação, distorção, como
resultado de uma padagogização, ou uma didatização mal compreendidas que,
ao transformar o literário em escolar, desfigura-o, desvirtua-o, falseia-o
(EVANGELISTA, 2003, p. 22).
Ocorre deste modo uma desvalorização da obra literária nos planos anuais,
pois os professores não adotam, como foi possível verificar, os critérios necessários
para se com trabalhar com a literatura infantil na sala de aula.
Em uma conversa informal com os professores sobre os planos de aula, eles
alegaram que estes são elaborados igualmente, mostrando um exemplo no qual a
literatura infantil aparece e no “Momento de acolhida”, em que é escolhido um aluno
para fazer a leitura da obra para toda a sala.
3.2 A literatura infantil na sala de aula
Como o intuito de compreender a prática da literatura infantil no Ensino
Fundamental foi aplicado também um questionário (Apêndice 1) para os professores do
3º, 4º e 5º anos, a fim de verificar o tratamento que eles dão às obras literárias em sua
sala de aula.
Ao responder o questionário todos os professores afirmaram que utilizam à
leitura de livros de literatura infantil.
Quando perguntados sobre a quantidade de tempo e com que freqüência eles
destinavam a leitura de obras literárias infantis, os professores P II e P III, responderam
que destinam de 10 a 30 minutos de sua aula para a leitura de obras literárias,
realizadas todos os dias. Somente 01 professor, aqui denominado P I, afirmou que
destina de 31 minutos à 1 hora de sua aula a leitura de obras infantis, toda semana. A
quantidade de tempo dedicada à leitura das obras literárias, para esse grupo
32
específicos de crianças, e um tempo adequado ou não? E possível formar leitor literário
com essa freqüência de leitura?
Ao serem perguntados sobre a existência ou não de livros literários na
escola, todos foram unânimes em afirmar que a escola possui livros literários, aspecto
esse muito importante já que, de acordo com Saraiva (2006), deve existir a relação
entre escola e literatura. Os livros são de uso de ambos (professores e alunos).
Foi solicitado, também aos professores que descrevessem como é trabalhada
a literatura infantil em sua sala de aula.
Ao analisar as respostas dadas pelos professores, verificamos – que o modo
como a literatura infantil é trabalhada em sala de aula não condiz com o que realmente
é proposto para o trabalho com a mesma. Para Evangelista:
A literatura se apresenta na escola sob a forma de fragmentos que devem
ser lidos, compreendidos, interpretados. Certamente é nesta instância que
a escolarização da literatura é mais intensa, e é também nesta instância
que ela tem sido mais inadequada (EVANGELISTA, 2003, p. 25).
Nas respostas dadas pelos professores foi possível concluir que os alunos
não possuem autonomia frente à obra literária (P II-todos os dias ao entrar em sal de
aula, iniciemos com o momento de leitura, no qual escolhemos um aluno para fazer a
mesma). E de acordo com Cunha (1984) é importante que as crianças estejam em
contato com os mais variados tipos de obras literárias e que façam as suas opções,
tendo assim autonomia para escolherem o que desejam ler. Observando esse aspecto,
podemos notar uma contradição entre o que se afirma o PPP e o que ocorre na sala de
aula, pois segundo o mesmo, “a escola busca a formação integral do aluno, para tornálo um ser ativo e autônomo” (2009, p. 5). O que se verifica é que o aluno não tem
autonomia nem para escolher o que deseja ler.
Aparece também nas respostas dos professores a pedagogização da
literatura infantil, quando esta se transforma em material de interpretação (PIII- leitura e
interpretação). Segundo Evangelista (2003), a escola toma para si a literatura infantil, a
pedagogiza para atender a seus próprios fins, fazendo da obra literária, uma literatura
escolarizada.
33
Deste modo o tratamento que os professores dão à obra literária infantil,
transforma-a em um elemento de pouca importância no processo de ensino –
aprendizagem, o que deveria ser totalmente o contrário.
3.3 Observando o ambiente literário
Foi realizada uma observação para analisar o acervo de obras literárias, e
o espaço destinado a essas obras no ambiente escolar. Para a realização da
observação contamos com a ajuda da auxiliar administrativa da escola, a qual durante
as observações relatou alguns fatos e permitiu que os mesmos fossem colocados no
trabalho.
Durante as observações foi possível verificar que a escola não possui uma
biblioteca, e segundo a auxiliar administrativa a sala destinada a biblioteca nunca
funcionou e que agora será sala de computação, fato esse que foi possível verificar
durante as observações, pois as mesas e cadeiras já se encontravam no local.
Existe na escola uma sala denominada como sala da leitura, mas a mesma
é utilizada pelos professores do turno matutino para ministrarem aulas de reforço, as
quais terminam as 15 hs, e depois esta sala permanece fechada, como se pode
verificar. É nesta que ficam grande parte do acervo literário. No armário encontram-se
uma série de obras literárias que, segundo a auxiliar administrativa, é patrimônio
(Anexo 1) da escola. Tais obras podem ser utilizadas pelos professores e alunos,
somente em sala de aula, mas muitos professores não as utilizam.
Encontra-se também nesta mesma sala, dentro do armário, em duas caixas
de papel, os livros literários destinados ao Cantinho da Leitura (Anexo 2). Esses são os
livros que os alunos podem levar para casa, e quem faz o registro dos livros
emprestados é a própria auxiliar administrativa. Para formar leitores os livros deveriam
ficar expostos ao olhar das crianças, pois “o livro nem sempre convence por si só. Sua
aparência também impressiona, bem ou mal” (MARTINS, 1994, p.47).
34
Nas salas de aula existe também o Cantinho da Leitura, mas as obras
literárias encontram-se do mesmo modo que na sala da leitura, estão dentro de uma
caixa de papel, localizada dentro de um armário.
Um elemento interessante encontrado foi uma biblioteca móvel, que conta
com um acervo de livros literários. Ela é feita de metal, com vários repartimentos e e
bem chamativa, devido a sua decoração. Esta fica escondida em uma sala, na qual
somente os professores têm acesso, e de acordo com a auxiliar administrativa, os
professores não a utilizam devido à dificuldade em transportá-la, ou seja, devido aos “
sobes e desces”.
A Escola “Ensino e Aprendizagem” possui um número considerável de
obras literárias, as quais são de autores consagrados da literatura infantil, como
Monteiro Lobato, Vinicius de Moraes, Cecília Meireles, Ana Maria Machado, Ruth
Rocha, Ziraldo, Lígia Bojunga, Sylvia Orthof, entre muitos outros, possuindo um acervo
variado de obras e autores, aspecto
importante, pois as escolas devem ter essa
variedade, caso contrário, nos afirma Evangelista:
Uma seleção limitada de autores e obras resulta em uma escolarização
inadequada, sobretudo porque se forma o conceito de que literatura são
certos autores e certos textos, a tal ponto que se pode vir a considerar
como uma deficiência da escolarização o desconhecimento, pela criança,
daqueles autores e obras que a escola privilegia [...], quando talvez o que
se devesse pretender seria não o conhecimento de certos autores e obras,
mas a compreensão do literário e o gosto pela leitura literária
(EVANGELISTA, 2003, p.28).
Os livros literários infantis que a escola possui, grande parte deles se
encontram em bom estado de conservação, os livros de conservação inferior estão nos
Cantinhos de Leitura nas salas de aula.
A maioria das obras literárias pertence à coleção Literatura em minha casa,
um projeto do Programa Nacional Biblioteca na Escola (PNBE), vinculados ao MEC e
distribuídos pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento de Educação (FNDE), que tem
como
objetivo
fortalecer
das
bibliotecas
escolares.
Esse
programa
distribui
gratuitamente obras literárias infantis para as escolas publicas do Pais para todos os
níveis.
35
Durante as observações foi possível ter acesso à lista dos livros literários
advindos desse projeto (anexo 3), que conta com um total de 111 obras literárias
infantis. Destaca-se que mesmo tendo evidenciado no PPP da escola a indicação de
que esta conta com recursos vindos do PNDE, não se evidenciou, na relação do
patrimônio, a presença dos livros literários, como se eles não existissem na escola.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho em questão possibilitou-nos compreender que na Escola “Ensino
e Aprendizagem”, ocorre uma pedagogização da literatura infantil, sendo a mesma
deturpada em sua prática, servindo a vários propósitos, menos no que refere à
formação do leitor literário.
‘Verificamos que os mecanismos de incentivo a prática da literatura infantil
empregados pelos professores não levam os alunos a si interessarem pela leitura
literária, pois está é apresentada na sala de aula como um objeto de interpretações, e
quando ocorre o momento de sua leitura, o professor é quem distribui os livros às
crianças, não dando autonomia para o aluno, nem mesmo para escolher o que deseja
ler. Não possível aplicar técnicas para identificar o nível de interesse dos alunos quando
se trabalha com a literatura infantil, no entanto, há indícios de que esse nível não é
muito significativo, devido ao modo como é desenvolvido o trabalho com literatura.
Durante as observações realizadas, foi possível comprovar a existência de
um variado acervo de obras literárias, enviadas por meio dos programas
governamentais (PNDE), para incentivo ao desenvolvimento das habilidades de leitura
entre os estudantes das escolas da rede pública de ensino. Desta forma, notamos que
o Governo de uma alguma forma está incentivando a prática da leitura literária, mas o
que ainda constitui-se como problema do uso da literatura infantil no ambiente escolar é
o fato de que sua importância não é reconhecida no processo de ensino-aprendizagem,
isso porque a obra literária sequer é considerada pelos gestores educacionais quando
elaboram o Projeto Político Pedagógico, e muito menos pelos professores que não
incorporam estas obras em seus planos de ensino.
Diante das análises realizadas, cabe-nos perguntar, por que mesmo a escola
possuindo um variado acervo de obras literárias infantis não reconhece a sua
importância e não as incorporam devidamente no processo de ensino-aprendizagem
para a formação do leitor literário?
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a pesquisa, assim como a análise documental, a coleta de dados e