DOMINGO DE PENTECOSTES Evangelho - Jo 20,19-23 Assim como o Pai me enviou também eu vos envio: Recebei o Espírito Santo! Ir. Florinda Dias Nunes Os discípulos se alegraram por verem o Senhor... Recebei o Espírito Santo! Nos últimos domingos a liturgia vinha nos preparando para este fato histórico, a vinda do Espírito Santo sobre os apóstolos e discípulos. Com a Ascensão de Jesus ao céu, terminou o período pascal, porém, a comunidade precisa ainda esperar a força que vem de Deus para ser testemunha corajosa. O próprio Jesus ao se despedir convida os seus a permanecerem em Jerusalém até que a promessa do Pai se concretize. De fato, Jesus prometera que eles seriam recobertos com a força do Alto, o Consolador que o Pai enviaria para que pudessem continuar a missão de testemunhas. Esta é também a semana de oração pela unidade dos cristãos, organizada pelo Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC). O conteúdo para a oração foi preparado pelas mulheres Cristãs da Índia. O tema é: “O que Deus exige de nós?”, baseado em Mq 8,6-8. Participemos destes encontros colaborando na construção desta unidade. Conteúdo e contexto O Evangelho deste domingo é Jo 20,19-23. O texto está situado na tarde do domingo de Páscoa. Que para os judeus já era um novo dia, mas para o evangelista ainda é o mesmo dia da ressurreição, a nova era inaugurada pela vitória de Jesus sobre a morte. Jesus se manifesta aos discípulos reunidos e lhes concede o Espírito Santo como tinha prometido, enquanto estava com eles. No IV Evangelho, tudo o que acontece depois da ressurreição de Jesus se insere num “dia pascal” que não tem fim. Jesus é o centro e a razão de ser da comunidade. Sua saudação é a mesma de quando se despediu (cf. 14,27). Fazendo coincidir Páscoa e efusão do Espírito no mesmo dia, o evangelista quer sublinhar a continuidade entre Jesus e seus discípulos sem pausas ou interrupções. Já para Lucas, a vinda do Espírito Santo, coincide com a festa judaica de Pentecostes, cinqüenta dias após a Páscoa. Mesmo com perspectivas diferentes, a finalidade deste fato é a mesma. O que importa para ambos é mostrar que o mesmo Espírito Santo que sustentou a luta de Jesus para realizar o projeto do Pai, anima agora, a luta das comunidades cristãs. Com a vinda do Espírito Santo, a Comunidade messiânica é criada e fortalecida. Podemos perceber duas cenas no texto: 20,19-20: Jesus volta para os seus. 20,21-23: Doação do Espírito e missão. 20,19-20: Jesus volta para os seus. Na primeira cena Jesus se apresenta no meio da comunidade. Ele é o centro da mesma, e deseja-lhe a paz. Esta é uma paz que contém a plenitude dos bens messiânicos. Os discípulos estão com medo, por isso estão com as portas fechadas, ainda não possuem o Espírito de Jesus. Sem sua presença e sem a força do seu Espírito as comunidades se fecham atrás de paredes, impossibilitando a vitória da vida sobre a morte. O medo a freia na realização da missão de testemunhar o Cristo Ressuscitado. Quem irá transformar toda esta situação e fazer os discípulos capazes de anunciarem a vitória sobre a morte é o próprio Jesus. Ao vê-lo, eles ficam alegres. É uma alegria que ninguém poderá tirar deles. A referência à tarde do domingo mostra que as primeiras comunidades tinham o costume se reunirem na tarde do domingo para celebrarem a vitória de Jesus sobre a morte. Todavia, a reunião era feita a portas fechadas por medo das autoridades dos judeus (20,19a). Jesus não tem barreiras: “entrou e pondo-se no meio deles, disse: 'A paz esteja convosco'” (20,19b). É a mesma saudação da despedida (cf. 14,27). Por sua morte e ressurreição venceu o “mundo”. É o Cordeiro vencedor que traz em si os sinais da vitória, as marcas nas mãos e no lado (20,20a). A vitória de Jesus não nos permite esquecer o sistema injusto que o matou. É a saudação do Cordeiro do qual a comunidade irá alimentar-se. 20,21-23: Doação do Espírito e missão. Na segunda cena, a comunidade continua a missão de Jesus. Agora, fortificada pela presença de Jesus e pela força do Espírito Santo, o medo desaparece e o grupo de discípulos e discípulas anunciam a vitória com palavras e com a vida. A morte já não tem mais seu domínio e corajosamente saem do anonimato para testemunharem que a Vida venceu. Retomando um pouco o texto, Jesus, depois da saudação sopra sobre eles, dizendo: “'Recebei o Espírito Santo” (v. 22b). O sopro de Jesus é a nova criação que está surgindo. O texto retoma a primeira criação, quando o Senhor Deus ao criar o ser humano soprou sobre ele dando-lhe vida (cf. Gn 2,7). Com o sopro de Jesus, nasce a comunidade messiânica. De agora em diante, batizados no Espírito Santo como Jesus, os cristãos têm o encargo de continuarem o projeto de Deus. Este projeto consiste no perdão dos pecados. Mas o que é pecado para o evangelista? É o compromisso com a ordem injusta que levou Jesus à morte e que continua eliminando vidas. Quem se compromete com a injustiça continua condenando Jesus na pessoa dos pobres e marginalizados. Perguntemo-nos: de que lado nós estamos? Se quisermos ser fiéis aos compromissos batismais precisamos nos aliar aos que defende a construção de uma sociedade mais justa e fraterna. A vida da comunidade está no Espírito que Jesus comunica; o mesmo Espírito que esteve sempre presente nele, levando-o a recriar a humanidade (cf. Jo 1,33). A comunidade, impulsionada pelo Espírito de Jesus, é a nova humanidade encarregada de continuar o projeto de Deus, ou seja, mostrar, pela palavra e pela ação, que aquele que se fechou ao projeto de Deus permanece em seu pecado (cf. 9,41). Enfim, sua ação, como a de Jesus, é manifestar, em atos concretos, o amor gratuito e generoso do Pai (9,4). Diante desse testemunho, acontecerá o mesmo que aconteceu com Jesus: haverá quem o aceite e quem endureça numa atitude hostil ao homem, rejeitando o amor e se voltando contra ele, chegando inclusive a perseguir e matar os discípulos em nome de Deus (15,18-21; 16,1-4). Concluindo Não é missão da comunidade, como não era a de Jesus, julgar os homens (3,17; 12,47). Seu julgamento, como o de Jesus, não é senão o de constatar e confirmar o juízo que o homem faz de si próprio. A nova criação, portanto, é a luta pela justiça, permitindo que todos tenham acesso à vida. Jesus sabe da fraqueza de seus discípulos e também da nossa, sabe que por nós mesmos nunca levaríamos à frente a missão recebida, por isto promete o Consolador que irá iluminar, orientar e acompanhar-nos na missão. Diante do projeto de Deus. Deixemos que o Evangelho nos oriente e nos conduza. (Joan Mateos-Joan Barreto, O Evangelho de São João - análise linguística e comentário exegético, Paulus, São Paulo, 1989, 829-841; Xavier Léon Dufour, Leitura do Evangelho segundo João, IV, São Paulo, Loyola, 1996,165-174; José Bortolini, Com ler o Evangelho de João, o caminho da vida. São Paulo, Paulus, 1994,194-197).