FORMAÇÃO CONTINUADA E ASSESSORIA PEDAGÓGICA COMO PRÁTICA DA
CONSTRUÇÃO DA DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA
Marly Therezinha Mallmann – UNISINOS
[email protected]
Resumo: O texto aponta a experiência, os aspectos teórico-metodológicos e conclusões construídas
por docentes universitários que passaram por uma experiência de constituição de saberes pedagógicos
no uso de um ambiente virtual de aprendizagem. A partir de curso, na modalidade b-learning, ao
mesmo tempo em que eram alunos, iam trabalhando em suas turmas, construindo e estabelecendo
ampliação de aprendizagens. Entre as conclusões destaca-se a importância da instituição de programas
e de processos formativos para a constituição da docência universitária alicerçada em pesquisa e em
assessoria pedagógica.
Palavras-chave: formação continuada; ensino superior; constituição da docência universitária.
A experiência de que trata o presente texto é resultado de minha pesquisa e da
construção de minha tese de doutoramento (MALLMANN, 2005). O texto aponta a
experiência, os aspectos teórico-metodológicos e conclusões construídas por docentes
universitários que passaram por uma experiência de constituição de saberes pedagógicos no
uso de um ambiente virtual de aprendizagem.
Com o intuito de propiciar aos professores universitários um espaço de discussão e de
aprendizagem para a qualificação da docência, a Universidade estabeleceu, a partir de edital
interno, um programa de capacitação para professores com projetos de apoio ao ensino
presencial, que privilegiassem a cooperação entre disciplinas e ou professores e priorizassem
a docência na graduação. O trabalho teve o acompanhamento do então Núcleo de Apoio
Pedagógico da Universidade (NAP), denotando claramente o lugar e a importância da
assessoria didático-epistemológica como lócus de construção docente. O curso de formação,
na modalidade B-learning, em um Ambiente Virtual de Aprendizagem – AVA, desenvolveuse em duas etapas: (1) os professores aprendiam a interagir no ambiente e com os colegas,
envolvendo a metodologia e construindo suas próprias comunidades; e (2) trabalhavam com
seus alunos, sendo assessorados de forma presencial e a distância pela equipe pedagógica. A
metodologia da capacitação privilegiou o estabelecimento de Projetos de Aprendizagem e de
Resolução de Problemas e uma avaliação continuada do processo da aprendizagem que se
efetivava.
Os docentes que participaram da experiência já tinham na formação continuada um
espaço de uso recorrente e instigador de novas formas de ensinar e de aprender. Para eles,
continuar a estudar, a procurar ampliar seus horizontes em relação a espaços, a compreensões
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e a formas de ensinar era uma busca constante. Apontaram que o ambiente e o seu projeto
pedagógico-comunicacional, a implementação de processos de acompanhamento permanente,
por pesquisa ou assessoria didático-pedagógica eram a inovação que lhes dava suporte para a
ação docente que estavam empreendendo. A metodologia de projetos, o respeito aos
diferentes tempos de aprendizagem e a apropriação dos aspectos metodológicos a par dos
técnicos acrescentaram, ao espaço do ensino que envidavam na formação que construíam com
o curso, importantes saberes aos processos particulares de docência.
O docente de nível universitário traz, geralmente, a formação realizada em sua
graduação como suporte para a docência na universidade. No entanto, a resignificação da
formação docente deste nível de ensino vai para além da necessária preparação do campo
específico do conhecimento. Exige a inclusão de saberes do campo pedagógico e o uso de
diferentes formas de aproximação e relação com e entre os sujeitos concernidos no ato do
ensinar e do aprender.
A formação continuada como espaço de profissionalização, de incentivo à inovação e
de construção da docência universitária tem sido o modo preferencial da formação e da
capacitação para atender aos desafios que a docência exige. Esses processos são utilizados,
pelos estabelecimentos de ensino superior, como forma de ajudar aos professores a
qualificarem a docência e ampliarem sua compreensão e relação com seus alunos.
As universidades têm usado diferentes mecanismos e iniciativas para instituir e
desenvolver a formação continuada de seus docentes. Além do financiamento e da facilitação
ao acesso a cursos de mestrado e doutorado, do incentivo a participação em eventos nacionais
e internacionais, algumas têm incluído a assessoria e acompanhamento didático-pedagógico
como espaços de formação e incitamento à inovação. São formas de possibilitar a construção
da profissionalidade docente e de uma didática universitária.
No Brasil, a formação do docente universitário é tratada como preparação e
transferida para cursos de pós-graduação strictu-senso nos seus diversos níveis, priorizando os
aspectos da produção intelectual. A formação didático-pedagógica às vezes se resume à oferta
de disciplinas de Metodologia ou Didática como integrante dos currículos acadêmicos.
Algumas universidades favorecem ações de acompanhamento didático-pedagógico,
especialmente aos professores novos.
A profissão docente como ação educativa, exige revisão do seu significado no cenário
da transição paradigmática que vivenciamos. A influência
das novas configurações do
trabalho e da sociedade em geral, as demandas referentes à qualidade da educação, o ensino
presencial e a distância, a inclusão das tecnologias de comunicação e informação (TICs) e a
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redução da empregabilidade, entre outros motivos, já seriam suficientes para intensificar os
estudos e propor ações que dêem maior suporte e condições de exercício da profissão e
formação docente, especialmente para o ensino superior. As temáticas da inovação, do
rompimento com os cânones da razão instrumental e da necessidade de incentivar
investigações sobre os processos de ensino e de aprendizagem que acontecem na aula
universitária têm se imposto como formas de ultrapassar o status quo e construir meios de
reflexão e possibilidade de avanços.
Estudos realizados por Cunha (1990; 1998; 2004) e Lucarelli (2000), entre outros,
reconhecem a pedagogia universitária e a ação do assessor pedagógico como fundamentais na
constituição da profissão docente da educação superior. Apesar de se constituir em campo de
pesquisa recente, o campo da pedagogia universitária já traz importantes contribuições à
formação dos professores, estabelecendo-se em importante instância de produção de
conhecimento na área da educação e na relação desta com os demais campos do
conhecimento. Ações que propiciam interação, cooperação e construção coletiva, em que a
articulação da teoria e da prática são o eixo principal que, cada vez mais, têm sido
implementadas nos processos formativos das universidades. A compreensão de que a
profissão e os processos de profissionalização docente, especialmente quando a pesquisa se dá
a partir da própria ótica e prática dos professores, têm se constituído como extraordinários
meios de avanço na construção da docência de qualidade e de emancipação.
A questão dos saberes pedagógicos se inscreve como espaço privilegiado, nesse
contexto. Percebe-se, cada vez mais, que a formação para o exercício da profissão docente se
dá num continuum que vai se constituindo na trajetória dos professores. A profissão docente,
se constrói ao longo da história de vida do professor e, muitas vezes, baseada em exemplos de
seus professores e na partilha com colegas no espaço universitário. No entanto, a pedagogia
não se restringe a uma visão de método e de técnicas de ensinar, mas inclui a compreensão de
um movimento que extrapola a sala de aula, e se inscreve numa perspectiva das ações
educativas da sociedade em geral. Nessa condição, o professor acompanha os movimentos da
cultura em que estão inseridos seus alunos, tendo que estar atento para incluir e desvendar os
dispositivos que garantem a distribuição do conhecimento.
A par da preocupação com o espaço didático-epistemológico da formação e com o
trabalho docente, a inclusão das tecnologias educacionais, as práticas e os artefatos culturais
também têm produzido inúmeros estudos e pesquisas. A divulgação e aproveitamento dos
mesmos têm propiciado oportunidades de aprofundamento e de apoio à formação docente em
todos os níveis da educação nacional.
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Os ambientes virtuais de aprendizagem têm se constituído em recursos e espaços para
aprender. A disseminação dos aparatos tecnológicos que ampliam a circulação do
conhecimento tem tido significativo impacto na universidade. Tanto os processos
administrativos e de funcionamento da instituição como os processos pedagógicos que nela se
desenvolvem têm sido atingidos pela chamada “revolução tecnológica” que incide sobre a
formação. Essa condição envolve os professores porque estimulam a necessidade de rupturas
nas formas tradicionais de ensinar e de aprender. Entretanto, estará o professor apto a
enfrentar esse desafio? Que saberes terá ele de mobilizar para incluir essa nova cultura em seu
cotidiano profissional? Saberá interpretar essa possibilidade como uma alternativa de ruptura
epistemológica?
O PROCESSO DA CONSTRUÇÃO DA DOCÊNCIA IMPLICA (RE)CONSTRUÇÃO
PERMANENTE, CONTINUADA E VAI ALÉM DE MERO CAMPO DISCIPLINAR
A aprendizagem continuada é uma exigência que decorre da explosão da informação e
do questionamento sobre as históricas verdades, coloca em suspeição a mera reprodução do
conhecimento, exige novas formas e alternativas para a construção do conhecimento.
A capacitação de professores inclui nesse contexto a inclusão do uso das Tecnologias
de Informação e Comunicação (TICs). Que, além de permitir acesso instantâneo a múltiplas e
diferentes informações, favorece novas compreensões, instiga constantes análises críticas e
reflexão sobre o fazer docente. Passa a exigir, também, de acordo com Alcântara e Behrens
(2002), a escolha de estratégias que favoreçam uma prática pedagógica identificada com a
produção do conhecimento. A demanda da formação sofre uma transformação qualitativa na
forma de pensar e de agir, podendo ter a prática social humanizadora como referente. Desta
forma, a inclusão de metodologias e de tecnologias educacionais deverão ter como
pressuposto levar os educandos a aprender e a desenvolver suas capacidades para privilegiar a
construção do conhecimento. Quando alcança essa perspectiva, o uso das TICs se inscreve
como um meio para ampliar o processo de construção do conhecimento e não como um fim
em si mesmo.
Conforme Fagundes (2004) e Albero (2004) a presença de ambientes que permitam o
uso da informática e da telemática podem enriquecer e ampliar os processos cognitivos, sócioafetivos, a conscientização do sujeito que aprende, ultrapassam a lógica neo-taylorista de
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aprendizagem, demandando esforços para a emancipação dos sujeitos, contribuindo, dessa
forma, para uma sociedade democrática e cidadã.
Compreendendo a importância da inclusão digital, a Universidade tomou a iniciativa
da construção de um Ambiente Virtual de Aprendizagem – AVA, para dar suporte ao
trabalho da formação e acompanhamento dos professores. Em 1999, três professoras do Curso
de Pedagogia e integrantes do NAP, junto com os webmasters do então Centro de Ciências
Humanas, construíram o AVA 1.0. A plataforma foi elaborada
levando em conta os
princípios de numa concepção didático-epistemológica interacionista-construtivista, com a
possibilidade de trabalhar com comunidades de aprendizagem, comprometidas com o fazer
docente numa perspectiva crítico-humanizadora. A partir dos resultados obtidos e do impacto
produzido na comunidade acadêmica, o AVA foi ampliado por uma equipe interdisciplinar e
institucionalizado na versão 2.0. contando com recursos da Fundação de Apoio à Pesquisa do
Rio Grande do Sul – FAPERGS.
Permitindo interação síncrona e assíncrona, possibilitou o uso de metodologias que
privilegiam a construção do conhecimento, tais como Projeto de Aprendizagem, Identificação
e Resolução de Problemas, Proposição de Desafios e Estudo de Caso, o ambiente passou a
apoiar atividades de ensino, de pesquisa, de extensão e de serviços da Universidade. Ampliou
espaços de convivência e privilegiou atividades de cunho cooperativo na construção do
conhecimento. Construído para suportar e possibilitar uma rede de convivência incluiu a
constituição de micro-comunidades para atividades de pequenos grupos da comunidade que se
instituiu.
A capacitação docente para o uso didático-pedagógico do AVA, numa acepção de
construção do conhecimento em comunidades de aprendizagem, passou a acontecer na
Comunidade Projetos-Piloto em Ação, criada para tal finalidade e que permitia a professores
de diferentes áreas do conhecimento entrarem em relação e construírem sua própria formação
docente. O Curso de Formação incluía atividades presenciais físicas e presenciais virtuais
digitais. Constituía-se de um momento em que os docentes aprendiam a interagir no ambiente,
desenvolvendo a metodologia e construindo suas próprias comunidades. Enquanto interagiam
e aprendiam, trabalhavam com seus alunos, sendo assessorados de forma presencial física e de
forma presencial virtual digital pela equipe pedagógica. Ao mesmo tempo em que aprendiam,
ensinavam e aprendiam, ampliando sua reflexão e construindo seus saberes didáticopedagógico-epistemológicos. Desta forma iam ampliando a sua formação, e tecendo seu
processo de docência com a inovação proposta.
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A metodologia da capacitação privilegiava especialmente o desenvolvimento de
Projetos de Aprendizagem e de Resolução de Problemas. O desenvolvimento dos projetos, a
escolha e o uso das ferramentas foram sendo ancorados nas discussões sobre o Projeto
Político Pedagógico do próprio AVA. As experiências particulares e dos grupos de
professores eram trazidas, partilhadas e sofriam uma análise e reflexão individual e grupal
enquanto ocorria a experimentação. Havia uma análise constante sobre a metodologia e suas
possibilidades, o próprio processo de aprendizagem que se construía, a forma de atuação de
todos os envolvidos e a relação entre a vivência no curso e a prática empreendida pelos
docentes em suas turmas. De acordo com o processo de coleta dos dados durante e após o
processo
de
capacitação,
levantados
especialmente
pelos
seis
docentes
que
se
disponibilizaram a participar da pesquisa, esse era o ponto relevante da formação que estavam
construindo.
Conforme Schlemmer (2002), o paradigma da aprendizagem cooperativa traduz a
perspectiva da inteligência coletiva no domínio educativo. A escolha metodológica e os
princípios construídos tanto para o próprio AVA quanto para o desenvolvimento da
capacitação, a metodologia de Projetos de Aprendizagem Baseados em Problemas, se
evidenciava como escolha acertada e própria para subsidiar práticas pedagógicas inovadoras
que se estabeleciam na comunidade. Isso se manifestava nas relações que estabeleciam, e
confirmava a tese de que a constituição de comunidades virtuais de aprendizagem no
paradigma da Sociedade em Rede amplia e favorece a aprendizagem em todos os níveis de
ensino. Essa metodologia tem como base uma concepção epistemológica interacionista/
construtivista/sistêmica, em que estudos como os de Maturana e Varela (1997), Castells
(1999), Levy (1998, 2000), Fagundes (1999), Hernandez (1998) e outros são referência. O
trabalho por Projetos de Aprendizagem, inicialmente desenvolvido por Fagundes, Sato e
Maçado, (1999) para a Educação Básica, foi adaptado para o Ensino Superior. Uma das
características que dá destaque ao processo vivenciado é a possibilidade dos sujeitos da
comunidade em relação, além de serem protagonistas, especialistas em suas áreas de
conhecimento, também são aprendizes e ativadores da própria aprendizagem e a dos demais,
passam a ser articuladores da prática em movimento na comunidade e ainda são orientadores
dos projetos de seus alunos.
O destaque dado pelos investigados à metodologia do curso constituía a principal
inovação, conforme relato exposto na avaliação escrita sobre o processo, lê-se nos
depoimentos dos integrantes da comunidade que “o ponto forte da experiência piloto foi sem
dúvida a metodologia AVA. Segundo a avaliação dos próprios alunos ela "vira de ponta
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cabeça" a forma que tradicionalmente eles são treinados no processo projetual nas disciplinas
de projeto arquitetônico e urbanístico” (arquitetura),
e que “o aprendizado foi sendo
construído em conjunto, para mim isso é uma prova que realmente ocorreu cooperação.
Alguns sabiam mais, outros menos, mas o grupo foi se ajudando e crescendo junto. Na
comunidade piloto isso ocorreu e nas comunidades que orientamos também. Houve muita
troca de experiências, o que favoreceu no crescimento de todos” (engenharia).
A avaliação continuada do processo em construção, tanto da capacitação quanto da
aprendizagem que se efetivava no curso, tinha o intuito de desenvolver a co-responsabilidade
e a superação do paradigma de implementação de um ambiente pronto, acabado. Isso foi
favorecendo a construção de referências de um trabalho baseado na parceria, na partilha de
inseguranças e alegrias, estabelecendo um forte vínculo que se apoiava em uma concepção
construtivista-interacionista.
A concepção da pedagogia e da didática enquanto campo teórico da prática
educacional já não se restringe mais ao espaço da sala de aula, mas se faz presente nas ações
educativas da sociedade em geral. A partir da inclusão das tecnologias de informação e
comunicação (TICs), mais uma vez se impõe o desafio de revisar o que se entende por
saberes, especialmente os pedagógicos, para a construção e o desenvolvimento da profissão
docente em qualquer nível e, especialmente, no do ensino superior.
A formação e a assessoria pedagógica se afirmavam como processo desejado e
necessário para a apropriação dos saberes didático-epistemológicos dos sujeitos que haviam
se submetido à inovação em desenvolvimento. De acordo com uma das entrevistadas “as
relações criadas no ambiente AVA, são ótimas, tanto entre componentes dentro de uma
comunidade, como entre componentes de outras comunidades (orientadores de comunidades).
Nos encontros presenciais com as orientadoras e o restante do grupo (comunidade piloto)
ocorreu uma grande interação e cooperação, fomos aprendendo juntos e resolvendo os
problemas com o grupo todo, com isso muitas vezes diminuindo o percurso para se chegar a
solução” (engenharia). Os conflitos e desafios iam sendo administrados e a concepção de
partilha e cooperação era aprendida e exercitada constantemente: “posso criticar e ser
criticado sem que isso seja levado para o pessoal. Reflito e ajo e reflito de novo. Isso tem me
deixado mais autêntico nas relações que estabeleço em relação ao convívio e à aprendizagem”
(administração).
Estudos como os de Fernández (2000), Lucarelli (2000), Ramal (2002), Kenski
(2003), Broilo (2004) entre outros, apontam para a crescente importância do trabalho
pedagógico como auxílio na construção da docência universitária. Assessoramento
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pedagógico, segundo Fernández (2000) sugere parceria entre docentes e assessor pedagógico,
vai além da compreensão e ação de conhecimento disciplinar, não é destituído de mecanismos
de reprodução e de reforço de contradições. Exige, no entanto, ruptura da representação
diretiva de como se tem constituído a assessoria pedagógica, para ser possível instaurar uma
ação de interação entre pares; construir, conscientemente, a partir da ação coletiva, saberes
legítimos e necessários para a ação docente e para a própria pedagogia universitária. A
assessoria pedagógica traz, nesta visão, usando a pesquisa, a problematização e a reflexão
como meios de estabelecer respostas, e, talvez, novas interrogações, a possibilidade de uma
construção de saberes mais adequados para os envolvidos no processo educativo, bem como
para o próprio campo da didática universitária.
Considerar esta implicação sugere, que o assessoramento pedagógico impinge aos
envolvidos, processos de exposição pessoal; instituição de espaços de pesquisa e de grupos de
trabalho que permitam reflexão e construção de saberes que dêem suporte à prática e essa, por
sua vez, impulsione novos saberes utilizando a teoria como explicação e ultrapassagem do
status quo.
Várias são as designações e as compreensões estabelecidas para o que se entende por
formação docente. Pode ser demarcada por educação, ensino e treino. Aqui entendemos
formação no sentido de abarcar a concepção técnica, a dimensão pessoal de desenvolvimento
humano em interface com a técnica, e a dimensão do desejo e da vontade de aprender com os
outros, na busca de aperfeiçoamento pessoal e profissional. Conforme García (1999) a
docência se constitui em uma profissão que, “tal como noutras profissões, [é necessário]
assegurar que as pessoas que a exercem tenham um domínio adequado da ciência, técnica e
arte da mesma, ou seja, possuam competência profissional” (p. 22). Essas dimensões incluem
considerar os processos histórico-culturais e legais da vivência e da formação docente. A
formação precisa ser entendida como uma atividade intencional para instituir a
profissionalização. Constitui-se num encontro de pessoas adultas que mobilizam várias
dimensões para aprender e, então, ensinar. É preciso compreender a formação como atividade
humana inteligente que implica atividade relacional. A formação, vista do ponto de vista da
docência inclui três dimensões principais: formação acadêmica, formação pedagógica e
formação profissional (formação de formadores).
A concepção, o paradigma didático-epistemológico, a visão de homem, de sociedade e
de mundo são importantes para a constituição do processo a ser instituído e compõem o
espectro da necessária clareza e da intenção da formação. O protagonismo, a pesquisa como
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espaço de compreensão e elaboração do conhecimento, deverão ser vistos como um processo
sistemático e continuado de qualificação de professores.
CONSIDERAÇÕES RELEVANTES SOBRE A EXPERIÊNCIA CONSTRUÍDA
A vivência em grupo, a interlocução em rede, ensaiando uma metodologia de
problematização junto ao uso de um ambiente virtual de aprendizagem foram desafios
importantes e impulsionadores de um processo de construção de um conhecimentoemancipação. Construir saberes pedagógicos, para os investigados, é um processo
permanente, implica desejo, disponibilidade de tempo, gosto em aprender e enfrentar desafios.
O processo empreendido com os alunos, e a pesquisa de que participaram, mostraram-se
lugares de aprendizagem e ampliação dos conhecimentos. O processo de aprendizagem
empreendido na formação realizada pelos professores que se dispuseram a participar da
experiência mostrou a importância da instituição de programas e de processos formativos,
alicerçados à pesquisa e assessoria pedagógica como um mecanismo de qualificação e de
apropriação da docência no ensino superior.
A disposição e disponibilidade dos docentes, pouco preocupados em correr riscos,
desvendando suas contradições e crenças, num movimento constante de novas compreensões
e possibilidades e construção de saberes, foi de extrema relevância para a pesquisa. O
processo de escolha e convencimento dos sujeitos da pesquisa implicou no consentimento e
no desejo de participar, de se envolver e de estabelecer co-responsabilidades recíprocas. O
convencimento, segundo Santos (1999), se constitui de um processo de adesão e de uma
possibilidade de um intercâmbio verdadeiro e continuado, a partir de um processo dialógico
que produz participação, autoconhecimento e solidariedade. O contrato inicial estabelecido
por um termo de consentimento e comprometimento com o processo, construiu a base da
disponibilidade de todos os envolvidos para a revisão e complementação de dados e inclusão
de outros processos, se mostravam importantes e necessários para a pesquisa e o estudo que se
instituía. Apesar da reiterada falta de espaço nas agendas dos envolvidos, o processo de coleta
e análise dos dados a partir do próprio AVA, da construção de narrativas orais e escritas, da
resposta às entrevistas semi-estruturadas, da reunião coletiva foram constituindo importantes
espaços de formação e de assessoria pedagógica, complementando a formação do próprio
curso para todos os envolvidos na pesquisa.
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Os docentes que vivenciaram a experiência com o AVA demonstraram que já tinham
um valor estabelecido e desenvolvido para uma qualificação de sua profissão. A formação
continuada constituiu-se em um empenho pessoal e um desejo permanente, um espaço de uso
recorrente, um instigador de novas formas de ensinar e de aprender.
O Ambiente por si só não constituía para eles inovação, mas a compreensão de seu
projeto pedagógico-comunicacional e a implementação de processos de acompanhamento
permanente, seja por pesquisa ou assessoria didático-pedagógica, foram apontados como
imprescindíveis.
A metodologia de projetos constituiu-se grande novidade. O respeito aos diferentes
tempos de aprendizagem e a apropriação dos aspectos metodológicos a par dos técnicos
acrescentaram importantes saberes aos processos particulares de docência.
A vivência em grupo, a interlocução em rede, ensaiando uma metodologia de
problematização junto ao uso de um ambiente virtual de aprendizagem foram desafios
importantes e impulsionadores de um processo de construção de um conhecimentoemancipação.
Construir saberes pedagógicos para eles é um processo permanente, implica desejo,
disponibilidade de tempo, gosto em aprender e enfrentar desafios. O processo empreendido
tanto na capacitação, na implementação com os alunos e no momento da pesquisa mostrou-se
como lugar de aprendizagem e ampliação dos conhecimentos.
Ter clareza que as diferentes dimensões de ordem técnica, informacional,
metodológica, social, cognitiva, metacognitiva e psico-afetiva, para os docentes entrevistados,
é fundamental em qualquer projeto educacional, quanto mais em projetos que incluem as
TICs, obriga a consideração dos desafios que essa formação implica.
O processo de aprendizagem empreendido na formação realizada pelos professores
que se dispuseram a participar da experiência mostrou como um mecanismo de qualificação e
de apropriação da docência no ensino superior. Em relação à capacitação continuada como
forma de aperfeiçoamento pedagógico, uma das entrevistadas destaca, que a mesma “passa a
ser uma exigência, porque cada vez mais, em função do excesso de informação, a gente não
tem mais os filtros de análise e de seleção” (engenharia). No entanto, ainda segundo essa
interlocutora, é preciso pensar para além da formatação, fragmentação e da grade curricular,
vendo a formação continuada para a docência “dentro dum outro registro, [...] de troca, de
construção de outros filtros. E, a assessoria, passa a ser chave porque faz uma ligação com a
realidade. E te exige uma adequação ao que está acontecendo nos espaços fora da
Universidade, fora da sala” (op cit). Todos os entrevistados entenderam que os espaços de
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formação continuada ou de acompanhamento pedagógico em que tenham participado
constituíram importante contribuição para seus processos de desenvolvimento docente. Não
lembravam de algum desses eventos que pudesse ter se revelado como perda de tempo, ao
contrário, sempre foram de grande valia. Alguns lamentam a falta de tempo e recursos para
participarem mais em congressos e eventos da própria área.
Os momentos considerados importantes no curso, de acordo com os relatos obtidos,
foram, entre outros, as experiências partilhadas com a especial oportunidade de trocas entre
sujeitos de diferentes áreas do conhecimento. Ressaltaram, também, as diferentes formas de
agir e compreender o processo educativo, as discussões realizadas, a possibilidade de contar
com a experiência das pedagogas da equipe do AVA, com seus estudos, pesquisas e
experiências na área das TICs. De seguidores de modelos tradicionais, copiados geralmente
de professores que consideravam bem sucedidos, passaram a compor um jeito próprio de ser
professor. De aulas meramente expositivas, foram ousando metodologias interativas e
experienciando a dialogicidade como movimentos de ensinar para contribuir com a
aprendizagem de seus alunos. A interação é reiteradamente apontada como ponto-chave para
a aprendizagem significativa. A menor ou maior interferência das áreas de conhecimento, dos
colegiados e colegas de curso no processo do ensino tem acontecido de acordo com o maior
ou menor grau de formação e envolvimento didático-epistemológico dos sujeitos. Os
conteúdos já não são o centro da ação docente, mas não perderam a importância junto aos
demais integrantes do processo de ensinar. Reputam o NAP como sendo um dos principais
responsáveis pela mudança de compreensão e implementação de ações docentes voltadas para
a aprendizagem. Acrescentam a esse processo a implantação dos programas de pósgraduação, que, com seu espírito questionador e investigativo, tem contribuído para a
formação das diversas áreas do conhecimento.
Além de romper com um paradigma de aulas expositivas ou simples coleta de
material para incrementar informações, o processo exigia compreender a virtualidade, pensar
novas formas de agir, extrapolando ao ensino presencial físico. A inovação estava colocada
em outro patamar. Não se tratava mais de tecnologia como extensão de braços ou facilidade
de imagem e informação, mas requeria uma compreensão do espaço e das diferentes formas
de exercitar a docência. Implicava apropriar-se de uma tecnologia que havia sido criada a
partir de uma concepção construtivista-interacionista. Invertia o processo normalmente
empregado que constrói a tecnologia para depois ver quais as formas didático-epistemológicas
para poder conduzir o processo.
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Entre as considerações apontadas sobre o curso encontra-se a prerrogativa de a
Universidade continuar a oferecer oportunidades de qualificação e de (re)instituir processos
de acompanhamento pedagógico para a melhoria da docência que estavam construindo.
Iniciativas, como as da formação experienciada com o AVA,
podem qualificar a ação
docente e estimular os participantes a crescer e ajudar no crescimento de seus pares. Assim, a
formação continuada se mostrou como um dos lugares fundamentais para a constituição da
docência universitária desde que seja acompanhada de um competente assessoramento
didático-pedagógico. Impõe-se, no entanto, questionar, sendo fiel aos dados coletados e à
própria compreensão da construção de saberes pedagógicos e qualificação da docência, como
conseguir dar continuidade a um processo de capacitação permanente? Como reinstituir
espaços eminentemente pedagógicos, nomeados como extraordinários no acompanhamento e
construção de saberes? Que políticas são necessárias para apoiar e ampliar os processos que
implicam a emancipação dos envolvidos na aprendizagem necessária a esses tempos? Quando
a continuidade de processos de formação, que se mostraram efetivos, terão continuidade, sem
sofrer solução de continuidade? Como aproveitar o desejo e o envolvimento de sujeitos que
sozinhos não conseguem estabelecer espaços e tempos de formação?
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