Designa-se por Trovadorismo o período que engloba a produção literária de Portugal durante seus primeiros séculos de existência (séc. XII ao XV). Durante essa época a poesia alcançou grande popularidade, não somente entre os nobres da corte mas também entre as pessoas comuns do povo. Os poemas eram cantados e acompanhados de instrumentos musicais e danças, por causa disso, foram denominados cantigas. Momento final da Idade Média na Península Ibérica, onde a cultura apresenta a religiosidade como elemento marcante. A vida do homem medieval é totalmente norteada pelos valores religiosos e para a salvação da alma. São comuns procissões, romarias, construção de templos religiosos, missas etc. A arte reflete, então, esse sentimento religioso em que tudo gira em torno de Deus. Por isso, essa época é chamada de Teocêntrica. As relações sociais estão baseadas também na submissão aos senhores feudais. Estes eram os detentores da posse da terra, habitavam castelos e exerciam o poder absoluto sobre seus servos ou vassalos. Há bastante distanciamento entre as classes sociais, marcando bem a superioridade de uma sobre a outra. O marco inicial do Trovadorismo data da primeira cantiga feita por Paio Soares Taveirós, provavelmente em 1198, entitulada Cantiga da Ribeirinha. A poesia desta época compõe-se basicamente de cantigas, geralmente com acompanhamento de instrumentos (alaúde, flauta, viola, gaita etc.). Os autores dessas cantigas eram chamados de trovadores. Esses poetas faziam parte da nobreza ou do clero e, além da letra, criavam a música das composições que eram executadas nas cortes. Já nas camadas populares, quem cantava e executava as canções, mas não as criava, eram os jograis. Mais tarde, as cantigas foram copiladas em Cancioneiros. Os mais importantes Cancioneiros desta época são o da Ajuda, o da Biblioteca Nacional e o da Vaticana. As cantigas eram cantadas no idioma galegoportuguês e dividem-se em dois tipos: →líricas (de amor e de amigo); → satíricas (de escárnio e mal-dizer). Do ponto de vista literário, as cantigas líricas apresentam maior potencial pois formam a base da poesia lírica portuguesa e até brasileira. Já as cantigas satíricas, geralmente, tratavam de personalidades da época, numa linguagem popular e muitas vezes obscena. Origem em Provença, região da França. Trazidas através dos eventos religiosos e contatos entre as cortes. Tratam, geralmente, de um relacionamento amoroso, em que o trovador canta seu amor a uma dama, normalmente de posição social superior, inatingível. Refletindo a relação social de servidão, o trovador roga a dama que aceite sua dedicação e submissão. Eu-lírico - masculino Perguntar-vos quero por Deus Senhor fremosa, que vos fez mesurada e de bon prez, que pecados foron os meus que nunca tevestes por ben de nunca mi fazerdes ben. Pero sempre vos soub'amar des aquel dia que vos vi, mays que os meus olhos en mi, e assy o quis Deus guisar, que nunca tevestes por ben de nunca mi fazerdes ben. Des que vos vi, sempr'o maior ben que vos podia querer vos quigi, a todo meu poder, e pero quis Nostro Senhor que nunca tevestes por ben de nunca mi fazerdes ben. Mays, senhor, ainda con ben se cobraria ben por ben. (Don Dinis, rei de Portugal que viveu entre 1261 – 1325) Este tipo de texto apresenta um eulírico feminino. O trovador compõe a cantiga, mas o ponto de vista é feminino. Tem como tema o sofrimento da mulher à espera do namorado (chamado "amigo"), a dor do amor não correspondido, as saudades, os ciúmes, as confissões da mulher a suas amigas, etc. Os elementos da natureza estão sempre presentes, além de pessoas do ambiente familiar, evidenciando o caráter popular da cantiga de amigo. Eu-lírico - feminino Ondas do mar de Vigo, se vistes meu amigo! E ai Deus, se verrá cedo! Ondas do mar levado, se vistes meu amado! E ai Deus, se verrá cedo! Se vistes meu amigo, o por que eu sospiro! E ai Deus, se verrá cedo! Se vistes meu amado, por que hei gran cuidado! E ai Deus, se verrá cedo! Martin Codax Nessas cantigas os trovadores preocupavam-se em denunciar os falsos valores morais vigentes, atingindo todas as classes sociais: senhores feudais, clérigos, povo e até eles próprios. Dividem-se em: Cantigas de escárnio crítica indireta e irônica Cantigas crítica grosseira de maldizer direta e mais Ai, dona fea, foste-vos queixar que vos nunca louv[o] em meu cantar; mais ora quero fazer um cantar em que vos loarei toda via; e vedes como vos quero loar: dona fea, velha e sandia!... Dona fea, se Deus me perdon, pois avedes [a] tan gran coraçon que vos eu loe, en esta razon vos quero já loar toda via; e vedes qual será a loaçon: dona fea, velha e sandia! Dona fea, nunca vos eu loei en meu trobar, pero muito trobei; mais ora já un bon cantar farei, en que vos loarei toda via; e direi-vos como vos loarei: dona fea, velha e sandia! Joan Garcia de Guilhade Maria Peres se mãefestou noutro dia, ca por pecador se sentiu, e log' a Nostro Senhor prometeu, pelo mal em que andou, que tevess' um clérig' a seu poder, polos pecados que lhi faz fazer o demo, com que x'ela sempr'andou. Mãefestou-se, ca diz que s'achou pecador mui't, porém, rogador foi log' a Deus, ca teve por melhor de guardar a El ca o que a guardou E mentre viva diz que quer teer um clérigo, com que se defender possa do demo, que sempre guardou E pois que bem seus pecados catou de sa mor' ouv ela gram pavor e d'esmolar ouv' ela gram sabor E logo entom um clérico filhou e deu-lhe a cama em que sol jazer E diz que o terrá mentre viver e esta fará; todo por Deus filhou. E pois que s'este preito começou, antr'eles ambos ouve grand'amor. Antr'el á sempr'o demo maior atá que se Balteira confessou. Mais pois que viu o clérigo caer, antre'eles ambos ouv'i a perder o demo, dês que (desde que) s'ela confessou. (Fernando Velho) TEXTO 1: Mina do Condomínio Seu Jorge Tô namorando aquela mina Mas não sei se ela me namora Mina maneira do condomínio Lá do bairro onde eu moro Seu cabelo me alucina Sua boca me devora Sua voz me ilumina Seu olhar me apavora Me perdi no seu sorriso Nem preciso me encontrar Não me mostre o paraíso Que se eu for, não vou voltar Pois eu vou Eu digo “oi” ela nem nada Passa na minha calçada Dou bom dia ela nem liga Se ela chega eu paro tudo Se ela passa eu fico doido Se vem vindo eu faço figa eu mando beijo ela não pega pisco olho ela se nega Faço pose ela não vê Jogo charme ela ignora Chego junto ela sai fora Eu escrevo ela não lê Minha mina Minha amiga Minha namorada Minha gata Minha sina Do meu condomínio Minha musa Minha Monalisa Minha Vênus Minha deusa Quero seu fascínio TEXTO 2: Atrás da porta Chico Buarque Quando olhaste bem nos olhos meus E o teu olhar era de adeus Juro que não acreditei Eu te estranhei Me debrucei sobre o teu corpo E duvidei E me arrastei e te arranhei E me agarrei nos teus cabelos Nos teus pelos Teu pijama Nos teus pés Ao pé da cama Sem carinho, sem coberta No tapete atrás da porta Reclamei baixinho Dei pra maldizer o nosso lar Pra sujar teu nome, te humilhar E me vingar a qualquer preço Te adorando pelo avesso Pra mostrar que ainda sou tua Só pra mostrar que ainda sou tua... Relacionando as canções Mina do condomínio e Atrás da porta com as cantigas medievais, como você as classificaria? Justifique a resposta.