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UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO
RIO GRANDE DO SUL
DHE – DEPARTAMENTO DE HUMANIDADES E EDUCAÇÃO
CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS – LÍNGUA INGLESA
E RESPECTIVAS LITERATURAS
“O PROCESSO DE AQUISIÇÃO E APRENDIZAGEM
DE LÍNGUAS E O BILINGUISMO”
CELINA ELIANE FRIZZO
Ijuí – RS
2013
1
CELINA ELIANE FRIZZO
“O PROCESSO DE AQUISIÇÃO E APRENDIZAGEM
DE LÍNGUAS E O BILINGUISMO”
Monografia apresentada à Universidade
Regional do Noroeste do Estado do Rio
Grande do Sul, como requisito parcial
para obtenção do Grau de Licenciatura
em Letras – Língua Inglesa e Respectivas
Literaturas.
Orientadora: Taíse Neves Possani
Ijuí – RS
2013
2
AGRADECIMENTOS
Agradeço a ajuda da minha querida professora e
orientadora Taíse, pela dedicação ao meu trabalho,
pela paciência e por sempre ter me incentivado a
fazer um bom trabalho.
Agradeço aos demais professore, a meus familiares
pela compreensão que tiveram durante o período ao
qual me dediquei a este trabalho e o apoio que me
deram durante os anos da faculdade. Aos meus
colegas que foram um apoio e motivação para todas
as horas; e a Deus por ter me dado forças para
nunca desistir. Dedico a todos esta conquista com
muita gratidão.
3
RESUMO
A busca pelo domínio de uma segunda língua por parte de adultos e crianças vem
aumentando cada vez mais. O domínio de uma segunda língua leva o indivíduo a se
tornar um indivíduo bilíngue. Com base nisso, o objetivo deste estudo é apresentar
as principais teorias de aquisição de língua e conceituar o termo bilíngue, bem como
esclarecer outros aspectos que englobem o tema como educação bilíngue e o
possível desenvolvimento cognitivo e cerebral de uma pessoa que se comunica e
domina mais de uma língua. Para tanto será feito um estudo bibliográfico com os
principais autores sobre o tema. Assim, ao explanarmos as teorias de aquisição de
língua constatamos que a teoria de Stephen Krashen e suas cinco hipóteses é a
teoria que melhor nos explica o processo de aquisição e aprendizagem de línguas,
processos esses que são conceituadas e diferenciadas pelo autor. Já no que diz
respeito ao bilinguismo, relatamos sua origem e expomos seus vários conceitos,
chegando à conclusão de que um indivíduo bilíngue é aquele que consegue
comunicar-se em mais de uma língua, dentro ou fora de sua comunidade linguística.
E finalizando, encontramos pesquisas e evidencias que nos mostram que existem de
fato vantagens cognitivas e cerebrais em indivíduos que são bilíngues. Desta forma,
contribuímos para o estudo sobre segunda língua e o recente estudo sobre
bilinguismo.
Palavras-chave: aquisição; aprendizagem; bilinguismo; cognição; segunda língua.
4
ABSTRACT
The search by dominance of a second language by adults and children has
increasing more and more. The dominance of a second language carries the
individual to become bilingual individual. Basing on this, the goal of this study is to
present the main theories of language acquisition and to conceptualize the bilingual
term, as well as clarify the other aspects that encompass the theme as bilingual
teaching and the possible cognitive and cerebral development of a person that
communicates and domains more than one language. For both it will be done a
bibliographic study with the main authors of the theme. Thus, explaining the theories
of language acquisition we find that the theory of Stephen Krashen and his five
hypotheses is the theory that better explains the language learning and acquisition
process, which are reputable and differentiated by the author. Yet what talks about
bilingualism, we relate its origin and shows its several concepts, drawing conclusion
that a bilingual individual is the one who can communicate in more than one
language, inside or outside his/her linguistic community. And ending, we find
researches and evidence which show us that there are in fact cerebral and cognitive
advantages in bilingual individuals. So we contribute for the study about second
language and the recent study about bilingualism.
Keywords: acquisition, learning, bilingualism, cognition; second language.
5
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 6
1 AQUISIÇÃO E APRENDIZAGEM DE LÍNGUA ESTRANGEIRA:
CONCEPÇÕES TEÓRICAS ....................................................................................... 9
1.1 CONSIDERAÇÕES IMPORTANTES A RESPEITO DA SEGUNDA LÍNGUA ...... 10
1.2 BEHAVIORISMO ................................................................................................ 12
1.3 INATISMO ........................................................................................................... 13
1.4 INTERACIONISMO ............................................................................................. 14
1.5 TEORIA STEPHEN KRASHEN ........................................................................... 17
1.5.1 A Distinção entre Aquisição e Aprendizagem .............................................. 18
1.5.2 Da Ordem Natural ........................................................................................... 20
1.5.3 Do Input .......................................................................................................... 21
1.5.3.1 Características de um Ótimo Input ................................................................ 22
1.5.4 Do Monitor ...................................................................................................... 23
1.5.5 Do Filtro Afetivo ............................................................................................. 24
1.5.6 Demais Aspectos Importantes da Teoria de Krashen ................................. 25
2 O BILINGUISMO ................................................................................................... 27
2.1 ORIGEM DO BILINGUISMO ............................................................................... 27
2.2 DEFINIÇÃO DO TERMO BILÍNGUE ................................................................... 31
2.3 EDUCAÇÃO BILÍNGUE ...................................................................................... 37
3 O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO E CEREBRAL DE UM INDIVÍDUO
BILÍNGUE ................................................................................................................. 41
3.1 DESENVOLVIMENTO COGNITIVO.................................................................... 41
3.2 DESENVOLVIMENTO CEREBRAL .................................................................... 44
CONCLUSÃO ........................................................................................................... 50
REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 52
6
INTRODUÇÃO
O ser humano nasce depois de aproximadamente 36 semanas de gestação.
Este recém-nascido necessita de muitos cuidados por parte de um indivíduo adulto,
pois diferentemente dos animais, que nascem de forma acabada, o ser humano
nasce de forma a ser desenvolvida. Muitas são as necessidades deste novo “ser”,
muitos são os aspectos a serem desenvolvidos, como aprender a gatinhar, caminhar
e desenvolver uma linguagem. Para o desenvolvimento desta linguagem, que se
realizará ao longo de sua vida, é necessário aprender a usar os signos linguísticos 1
da sociedade a qual pertence, podendo assim comunicar-se com os demais
indivíduos.
De acordo com Vygotsky (2009, p. 63) “... a função primordial da linguagem
é comunicar, relacionar socialmente, influenciar os circundantes tanto do lado dos
adultos quanto do lado da criança”. Assim, a linguagem nos dá o poder de trocar
ideias, histórias, fatos e relatar nossos acontecimentos sem ter a necessidade da
presença do objeto ou pessoa da qual estamos falando. Para este autor a função
que a linguagem exerce é que nos distancia da forma animal e o que nos torna
superiores em relação às demais espécies do reino, embora saibamos que existam
formas de comunicação entre alguns animais, como, por exemplo, as abelhas, as
formigas e podemos até dizer que um deles, o macaco 2, se parece muito conosco,
porém nenhum deles desenvolve o signo linguístico como a espécie humana, ou
seja, a linguagem é aquilo que nos torna humano, uma atividade só do homem, que
o auxilia na organização de seu mundo.
1
O signo linguístico é a união do significado a um significante.
Na obra A construção do pensamento e da linguagem (2009) de Vygotsky, podemos encontrar
pesquisas feitas com chimpanzés em relação ao desenvolvimento da linguagem.
2
7
A linguagem nos faz interagir, é utilizada para comparar, lembrar-se de algo.
Segundo Cagliari (2006), a função comunicativa da linguagem nem sempre será
comunicar, podemos apenas informar. Ainda, segundo este autor, a linguagem pode
ser usada como maneira de omitir uma verdade, ela pode dar informações errôneas,
e pode ofender uma pessoa. Assim, é seu usuário que retêm poder sobre seu uso e
fazendo dela ferramenta para determinados fins. A linguagem pode inclusive,
estabelecer relações de poder.
Segundo Cagliari (2006), a linguística “está voltada para a explicação de
como a linguagem humana funciona e de como são as línguas em particular...”. Ela
pode, segundo ele, realizar um trabalho descritivo ou pode contribuir com outras
áreas, como ciências e artes. A Linguística se volta mais ao uso da língua pelo
falante e seus demais aspectos.
Desta maneira percebemos que a linguagem é algo extremamente
importante na vida humana, uma necessidade sem a qual não saberíamos dizer
como seria nossa vida, nossa sociedade. De acordo com Vygotsky (2009), pensando
em fatores de necessidade, do que parte da linguagem e pensando nos dias atuais,
o que percebemos acerca da linguagem é a questão do domínio de uma segunda
língua. Atualmente a busca pelo domínio de uma segunda língua vem apresentando
um grande crescimento. Mas qual seria o motivo disso? Como vimos a função da
linguagem é a comunicação, assim se ao dominarmos nossa língua materna nos
comunicamos com que a sociedade a qual pertencemos, uma segunda língua fará
com nossa comunicação se amplie para sociedades além da qual estamos inseridos.
Podemos também afirmar, que outro motivo que influencia a busca por uma
língua estrangeira é a globalização. Com certeza, a comunicação mundial através da
internet, as novas tecnologias, a facilidade de acesso a outras nações, tem causado
essa necessidade. A população tem percebido que o domínio de uma língua franca,
estreita relações, sejam elas de amizade com o intuito de conhecer novas pessoas,
seja para ter relações comerciais internacionais, do que, como percebemos através
de notícias e situações diárias, veem crescendo muito.
A pessoa que domina uma segunda língua vem sendo muito mais valorizada
e requisitada quando falamos em empregos. Ter no currículo o domínio de uma
segunda língua já não é algo a mais e sim uma exigência. Devido a tudo que
falamos até agora, a língua estrangeira é oferta obrigatória nas escolas, em todo o
território brasileiro, segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
8
(LDB), ou seja, está presente em praticamente todas as salas de aula, pois é
evidente que preparar o aluno para atuar na sociedade, é, além de ensinar-lhe
conteúdos como matemática, português, é ensinar lhe uma segunda língua.
Quando falamos em ensino de língua estrangeiras remetemos nossos
pensamentos ao que fora dito até então. Porém o que nos instiga são outros
aspectos, aspectos mais profundos, com vistas no processo de aprendizagem de
uma segunda língua e o que este desencadeia no indivíduo bilíngue.
Nosso
principal
objetivo
é
verificar
qual
é
o
processo
de
aquisição/aprendizagem de uma segunda língua e quais os principais aspectos
referentes ao bilinguismo (processo consequente da aprendizagem de mais de uma
língua), como expor sua origem, seu conceito, e se existem benefícios cognitivos e
cerebrais. Para isso, faremos uso de uma pesquisa bibliográfica, buscando trazer os
principais autores relacionados ao tema deste trabalho.
9
1 AQUISIÇÃO E APRENDIZAGEM DE LÍNGUA ESTRANGEIRA: CONCEPÇÕES
TEÓRICAS
Como já fora dito, a linguagem possui um papel importante em nossas vidas.
Muitos estudos já foram realizados nesta área, e o que trataremos neste capítulo,
são as teorias sobre o aprendizado de línguas que foram elaboradas e propostas ao
longo do tempo, influenciadas pela linguística, ciência que como já sabemos se
ocupa de estudar a linguagem, e pela psicologia. De acordo com Schütz (2007) “as
abordagens ao ensino de línguas se sucedem ao sabor das tendências de cada
época.” Nosso olhar se dará com mais ênfase no que tange ao ensino de uma
segunda língua, visto que, nosso objetivo maior é entender como que aprendemos
uma segunda língua.
Segundo Ligthbown & Spada (1999, p. 13) “in fact, one of the significant
findings of second language acquisition research has been that there are important
similarities between first and second language acquisition3.” (grifos nossos)
Dessa maneira não teríamos como falar em aquisição de segunda língua, sem falar
desse processo em primeira língua, visto que são muito parecidos.
Em relação às diversas abordagens 4 elaboradas até então, Chomsky (1998,
p. 20) nos diz que “essas abordagens não se conflitam, elas se beneficiam
mutuamente”. Cada abordagem define seu objeto de estudo e suas necessidades de
pesquisa, e acrescenta-se do estudo de outras abordagens.
Nosso estudo se deterá a falar sobre algumas abordagens: Behaviorismo,
Inatismo e Interacionismo. Complementando o que já fora dito,
Há diversas perspectivas sob as quais o aprendizado de uma língua seja
ela a língua nativa ou a estrangeira, tem sido observada. As investigações
de cunho linguístico tendem a escudar os mecanismos genéticos para a
aquisição da linguagem (denominados “Gramática Universal”). As teorias
comportamentais argumentam que a associação, a repetição e a imitação
são fatores que viabilizam a aquisição da língua, e, portanto, se voltam para
observações que deem conta da implementação de tais fatores como forma
de provar suas crenças. As teorias cognitivistas, por sua vez, ressaltam a
aquisição de esquemas, regras estruturais e significados são as
características que definem o aprendizado de uma língua. (GALEFFI, 2003,
p. 37).
3
As traduções serão feitas pela autora ao longo do texto (TP): "Na verdade, um das significativas
descobertas da pesquisa em aquisição de segunda língua tem sido de que há semelhanças
importantes entre aquisição da primeira e de segunda”.
4
O termo teoria é aqui substituído pelo termo abordagem, podendo usar hora um, hora outro.
10
Ainda, para além das teorias já referidas, trabalharemos com a teoria de
Krashen, para a qual daremos maior ênfase, pois, acreditamos que esta nos explica
mais detalhadamente esse processo, e por estar mais voltado à aquisição de
segunda língua. Este estudo será baseado principalmente na perspectiva da obra
How Languages are Larned de Ligthbown & Spada (1999).
1.1 CONSIDERAÇÕES IMPORTANTES A RESPEITO DA SEGUNDA LÍNGUA
Existem muitos casos de pessoas que, já na infância, aprenderam duas
línguas, algumas inclusive, aprendem duas línguas ao mesmo tempo. Muitas
pessoas acreditavam que isso não seria bom para as crianças, pois isso faria com
que a criança confundisse as línguas, ou que não conseguiria aprofundar seus
conhecimentos em nenhuma delas. Até hoje, existem pessoas que pensam assim.
Devido a isso achamos importante esclarecer alguns desses equívocos, e baseados
no estudo e na própria colocação de Ligthbown & Spada (1999).
Em relação ao fato de se aprender duas línguas em um mesmo tempo as
autoras defendem a ideia de que:
The evidence suggests that, when simultaneous bilinguals are in contact
with both languages in a variety of settings, there is every reason to expect
that they will progress in their development of both languages at a rate and
in a manner which are not different from those of monolingual children 5.
(LIGTHBOWN & SPADA, 1999, p. 03).
Assim, não há motivos para não desafiar e não encorajar uma criança a falar
duas línguas. As autoras ainda expõem questões que afirmam isso ainda mais. Para
elas quando uma criança aprende uma língua em seu ambiente familiar, e é por
meio desta que sabe se comunicar, ao frequentar uma escola onde se fala outra
língua, a criança recebe um “corte” em sua primeira língua. Isso fará com que ela
perca a linguagem da família sem tê-la dominado. Desta forma, ela não estará
dominando a segunda língua e não continuará a desenvolver a primeira.
5
TP: A evidência sugere que, quando bilingues simultâneos estão em contacto com ambos os idiomas
em uma variedade de configurações, existe muitas razões para esperar que eles irão avançar no
desenvolvimento de ambas as línguas, a um ritmo e de um modo que não são diferentes das crianças
monilingues.
11
Por parte da escola, ainda será pedido que os pais parem de falar a língua
que falam em casa e se concentrem na “nova língua” desta criança, que é a
majoritária. Nestes casos, porém, é importante que a família continue falando entre
si a língua materna6, para pelo menos a criança manter a compreensão da mesma.
Não há evidências de que o cérebro infantil tenha capacidades ilimitadas, de
forma que o conhecimento de uma língua não diminuiria a aprendizagem de uma
nova língua, ou seja, nem a criança, nem o adulto, esqueceriam os conhecimentos
que já adquiriu em uma língua ao aprender outra. Crianças que têm oportunidades
de aprender múltiplas línguas e mantê-las em suas vidas devem ser encorajadas a
aprendê-las, sendo o mesmo caso para adultos.
A aprendizagem entre crianças e adultos difere em alguns pontos, pois
crianças normalmente aprendem sem objetivos, sem benefícios e sem os
conhecimentos sobre a língua que um adulto já possui. Além disso, crianças não
apresentam nervosismo ao tentarem usar a nova língua e não se preocupam com os
erros ocorridos. Já adultos e adolescentes consideram a tentativa de fala, muitas
vezes, uma ação estressante quando não conseguem proferir sentenças claras e
corretas. Crianças tendem a se “arriscar” mais na nova língua, enquanto aprendizes
mais velhos tendem a permanecer por um tempo em silêncio até terem de ser
forçados a falar. (Ligthbown & Spada, 1999).
As autoras alertam que para se desenvolver uma nova língua, é necessário
já ter pelo menos adquirido uma língua. Este prévio conhecimento pode ser
vantajoso em matéria de que o aprendiz já sabe como uma língua funciona. Por
outro lado, deve-se perceber que o conhecimento de outra língua pode conduzir os
aprendizes a fazer suposições incorretas sobre como a segunda língua funciona.
Contudo, de acordo com Ligthbown & Spada (1999, p. 03) “there seems to
be little support for the myth that learning more one language in early childhood
slows down the child’s linguistic or cognitive development.7” Estas informações foram
aqui colocadas para situar o leitor sobre o que o acontece com indivíduos que
aprendem duas línguas e, já de antemão, esclarecer que a aprendizagem de mais
de uma língua não é de forma alguma prejudicial a este ser.
6
Também chamada língua familiar.
"Parece haver pouco apoio para o mito de que aprender mais um idioma na primeira infância retarda
o desenvolvimento linguístico e cognitivo da criança."
7
12
A seguir serão abordadas as três principais teorias de aquisição da
linguagem. Segundo Schütz (2007), “muitas teorias sobre aprendizado de línguas já
foram propostas, sempre diretamente influenciadas por duas ciências: a da
linguística e a psicologia.” Essas abordagens atendem as especificidades da época
em que foram elaboradas. Serão descritas as seguintes teorias: o Behaviorismo, o
Inatismo e o Interacionismo.
1.2 BEHAVIORISMO
Em meados da década de 40 e 50 surge principalmente nos Estados
Unidos, o behaviorismo, tendo como seu maior representante Skinner. Essa teoria
afirmava que a aprendizagem de uma língua é o resultado de imitação (Ligthbown &
Spada, 1999). Para os behavioristas qualquer aprendizagem é resultado da
formação de hábitos, e isso acorre através de estímulo – resposta – reforço (ou a
equação E  R  R). Para eles, o indivíduo recebe um estímulo do meio (de outro
falante, por exemplo). Este estímulo faz com que haja uma resposta, se esta
resposta estiver correta o indivíduo é encorajado a repeti-la até que a domine. Caso
o indivíduo produza um erro ao invés do acerto, este será corrigido. Segundo a obra
Abordagens,
Métodos
e
Perspectivas
Sócio
Interacionistas
do
curso
de
Especialização para o quadro do Magistério da SEESP de São Paulo, o aprendizado
linguístico, para essa teoria, é análogo a qualquer outro aprendizagem que o
indivíduo necessite.
Assim, pela paráfrase do exemplo da obra Abordagens, Métodos e
Perspectivas, podemos entender que se uma criança em processo de aprendizagem
de uma língua dizer “mamam” e o adulto lhe trouxer um prato com comida ela
aprenderá que toda vez que quiser comer terá que dizer “mamam”. A isto se
compara então, ao estímulo, resposta e reforço. Já se ela ao se referir ao “dvd”, no
caso ao disco de vídeo, e ela falar “cvd” será corrigida, por dar como resposta um
erro, não recebendo o reforço. De acordo com Ligthbown & Spada “... when parents
do correct errors, children often ignore the correction, continuing to use their own
ways of saying things8.”
8
TP: “... quando os pais corrigem os erros, as crianças frequentemente ignoram a correção,
continuando a usar sua própria maneira de falar as coisas”.
13
Para essa teoria segundo as mesmas autoras, Ligthbown & Spada, é mais
fácil de aprender uma segunda língua que seja semelhante à língua materna. Do
mesmo modo quando uma língua apresenta muitas diferenças, o aprendiz
encontrará maior dificuldade em aprendê-la.
Segundo Figueiredo (1995, p. 48) esta abordagem pode usar de técnicas de
repetição exaustivas e intensivas de estruturas e exercícios de substituição, que
promovem o estabelecimento de novos hábitos necessários para se aprender uma
segunda língua. É através dessas incansáveis repetições que o aprendiz deixa de
produzir erros. Esse tipo de exercício aparece até hoje em livros de aprendizagem
de línguas, acreditando-se ainda que é a repetição que fará o indivíduo a aprender
uma nova língua.
Contudo, essa abordagem é uma explicação incompleta da aquisição da
segunda língua e mesmo da aquisição da língua materna. (Lightbown & Spada,
1994, p. 25 apud Figueiredo, 1995, p.48). O aluno, segundo Figueiredo (1995, p. 48)
“aprende com a experiência, mas não somente da experiência, como comprovam
tantas outras teorias” as quais veremos mais adiante. Além do que fora citado, o que
mais deixa a desejar nesta abordagem é o fato de que, como um indivíduo é capaz
de elaborar ou produzir, sentenças que nunca ouviu antes. Se um aprendiz falasse
somente o que é repetido, a aprendizagem de uma nova língua seria um processo
muito mais longo que o habitual.
Ainda, nesta abordagem, o professor é o centro da aprendizagem, não
interessa a história, a cultura, os hábitos e os conhecimentos que o aprendiz já
adquiriu anteriormente. Tudo que o professor diz está correto, e não há possibilidade
de críticas ou reflexões.
1.3 INATISMO
Noam Chomsky afirma, segundo Ligthbown & Spada, (1999, p. 15) “... that
children are biologically programmed for language develops in the child in just the
same way that other biological functions developed 9.” O ato de desenvolver uma
língua é para ele como o ato de aprender a caminhar, tendo para isso um período 10
9
“... que as crianças são biologicamente programadas para desenvolver uma língua na infância da
mesma maneira que o desenvolvimento de outra função biológica...”.
10
Período que Chomsky nomeia como “critical period”.
14
determinado para acontecer. Para Chomsky, a aquisição de uma língua é inato ao
aprendiz, o qual nasce pré-disposto a adquirir uma língua. Porém é necessário que o
ambiente em que este aprendiz está situado lhe dê base e condições, ai sim este
desenvolverá uma língua. (Ligthbown & Spada, 1999, p. 16)
O linguista em sua abordagem concebe a Gramática Universal (G.U), que
seria uma pré-programação presente em um lugar no cérebro, com princípios que
são comuns à linguagem. De acordo com Galeffi (2003, p. 43) é graças a G.U que
“as crianças são capazes de criar representações mentais que ultrapassam o
discurso que ouvem, e se assemelham muito às representações dos falantes da
mesma língua.” É devido a isso, que as crianças produzem enunciados que nunca
ouviram.
Chomsky (1998) considera a linguagem como um “órgão da linguagem”, ou
seja, assim como o ser humano nasce com demais órgãos que são fundamentais
para sua existência, assim ocorra com a linguagem. Este órgão para ele, não
poderia ser removido de um corpo.
De acordo com Ligthbown & Spada, (1999) a teoria inatista não faz
especificações claras a cerca da aprendizagem de uma segunda língua. Contudo,
muitos linguistas explicam que a G.U é a melhor perspectiva para a aquisição de
uma segunda língua. Já outros, afirmam que a G.U não guiaria a aquisição em
indivíduos que passaram do período crítico para esta aquisição.
Os inatistas, não veem o erro como um benefício. Para eles, na
aprendizagem de uma segunda língua, a correção dos erros e informações
metalinguísticas não mudariam e não afetariam profundamente o conhecimento
sistemático da língua.
1.4 INTERACIONISMO
A terceira teoria é representada pelo filósofo e psicólogo suíço Jean Piaget
(1896 - 1980). Ele procurou observar crianças e lactentes 11 em suas brincadeiras e
interações com adultos. Ele traçou o desenvolvimento cognitivo compreendendo as
coisas como permanência do objeto. Os interacionistas se preocupam mais com o
11
Crianças que já não são recém-nascidos,
http://www.dicionarioinformal.com.br/lactente/
com
até
dois
anos
de
idade.
Fonte:
15
ambiente do que os inatistas, ambiente que forneça amostras da língua que se vai
aprender.
Para os interacionistas “... language acquisition focusses on the role of the
linguistic environment in interaction with the child’s innate capacities in determining
language development.12” (Ligthbown & Spada, 1999, p. 22). Assim, o que esta
teoria nos diz é que o desenvolvimento da linguagem está voltado ao ambiente. Em
suma, a linguagem é o resultado de uma ação complexa entre exclusivamente as
características humanas e o ambiente em que ela se desenvolve.
Piaget, de acordo com Ligthbown & Spada (1999), não via a língua como
base num módulo na mente como Chomsky. Para ele a linguagem se desenvolve na
infância e pode ser usada para representar o conhecimento que a criança tem
adquirido com a interação física no seu ambiente. Constatamos isso na afirmação
“the developing cognitive understanding is built on the interaction between the child
and the things which can observed, touched and manipulated 13” feita por Ligthbown
& Spada (1999, p. 23).
Essa teoria anos mais tarde, ganha a contribuição de Lew Vygotsky (18961934), intelectual russo, que trabalhou na União Soviética, o qual possuía um amplo
e diversificado conhecimento, atuando em áreas da psicologia, educação, medicina,
direito, filosofia entre outras. Sua teoria também pode ser encontrada como teoria
socioconstrutivista, sociointeracionismo entre outros.
Segundo Ligthbown & Spada (1999, p. 23), “... Vygostky’s view differs from
Piaget.”14 Piaget admitiu a hipótese do desenvolvimento da língua como um sistema
de símbolos para expressar o conhecimento adquirido através da interação com o
mundo do físico. Já para Vygotsky o pensamento era essencialmente o discurso
internalizado, e esse discurso emerge com a interação social. Devido a isso,
podemos dizer que Vygotsky conclui que, o desenvolvimento da linguagem dá-se na
interação social. Em outras palavras, ele estruturou um sistema de pensamento
tendo como base o desenvolvimento do indivíduo como resultado de um processo
sócio histórico, enfatizando o papel da linguagem e da aprendizagem nesse
desenvolvimento.
12
TP: "... aquisição da linguagem enfoca o papel do ambiente linguístico em interação com
capacidades inatas da criança para determinar o desenvolvimento da linguagem”.
13
“a compreensão cognitiva do desenvolvimento baseia-se na interação entre a criança e as coisas
que pode ser observado, tocado e manipulado.”
14
TP: “... a visão de Vygotsky difere de Piaget”.
16
Vygotsky referred to what the child could do in a supportive interactive
environment, the child is able to advance to a higher level of knowledge and
performance than he or she would be capable of independently. Vygotsky
referred to what the child could do in interaction with another, but not alone,
as the child’s zone of proximal development. He observed the importance of
conversations which children have with adults and with other children and
saw in these conversations the origins of both language and thought 15
(Ligthbown & Spada, 1999, p. 23)
O que fora dito acima reforça o que vinha sendo mostrado e nos fala ainda
sobre a Zona de Desenvolvimento Proximal que como fora dito é o intervalo entre o
que a criança consegue fazer sozinha e o que ela faz com a ajuda de outro
indivíduo. É nesse espaço que o professor atua, criando situações para que a
criança avance em seus conhecimentos permitindo que ela faça sozinha, o que
antes só conseguiria fazer com a ajuda de um adulto.
Um
fato
interessante
é
citado
na
obra
Abordagens,
Métodos
e
Perspectivas16:
Piaget e Vygotsky convergem em vários aspectos de seus estudos. Como
Vygotsky teve uma morte prematura e sua obra foi traduzida para o mundo
ocidental tardiamente, Piaget somente leu os estudos de Vygotsky muito
depois da morte desse estudioso. Tal fato não ocorreu com Vygotsky, que
conheceu e leu a obra de Piaget.
Por isso que, o que fora dito por Vygotsky em relação ao Piaget era uma
correção do que este último havia postulado. Desta forma, resumidamente, a teoria
sociocultural de Vygotsky assume que a aquisição ocorre na interação do aprendiz e
do interlocutor, ao passo que outros modelos interacionistas assumem que a entrada
(input) modificada, fornece ao aprendiz materiais linguísticos que são processados
internamente e invisivelmente (Ligthbown & Spada, 1999, p. 44).
15
TP: "Vygotsky se refere ao que a criança poderia fazer em um ambiente interativo de apoio, a
criança é capaz de avançar para um nível mais elevado de conhecimento e desempenho do que ele
ou ela seria capaz de forma independente. Vygotsky se refere ao que a criança pode fazer na
interação com o outro, mas não só, como zona de desenvolvimento proximal da criança. Ele observou
a importância das conversas que as crianças têm com os adultos e com outras crianças e viu nessas
conversas as origens da língua e pensamento”.
16
Livro do curso de Especialização para o quadro do Magistério da SEESP de São Paulo.
17
1.5 TEORIA STEPHEN KRASHEN
Por volta da década de 80, o norte americano Stephen Krashen traz ao
ensino de línguas, contribuições muito significativas e que mostram uma nova forma
de pensar como um indivíduo aprende ou adquire uma língua. Como já fora dito,
este estudo buscará detalhar esta teoria, visto que, nos dias atuais é ela que melhor
define e elabora o estudo de aquisição e aprendizagem de uma segunda língua.
Antes de iniciarmos a explanação desta teoria, gostaríamos de relatar duas histórias
que Schütz (2007) nos conta sobre a aprendizagem de línguas e que nos mostrará a
linha de pensamento de Krashen.
A primeira delas17 nos conta a história de François Gouin, homem de meia
idade que resolve aprender a falar alemão. Ele vai passar um período em
Hamburgo, onde reside por um ano. Para aprender a nova língua, François se
aprofunda numa série de tentativas de dominar o idioma através do estudo de
gramáticas e decoreba.
Chegando a Hamburgo, para sua decepção, François não entendia uma
palavra que lhe era dirigida. De volta aos estudos, ele decora ainda mais listas de
verbos e palavras, faz inúmeras traduções, porém, em nova tentativa, o resultado
fora o mesmo. Assim, ele aceita o fracasso de um ano de estudo e retorna para
casa. Contudo, ao retornar, ele descobre que seu sobrinho de três anos, durante o
período que esteve fora, havia aprendido a falar, deixando de ser um neném sem
expressão verbal. François questiona-se então: como seria isso possível?
O segundo relato, muitos leitores que pesquisam sobre o tema de aquisição
de língua já devem ter ouvido. Duas pessoas com as mesmas características
(mesma idade, motivação, prévio conhecimento de língua...) resolvem aprender um
novo idioma, o inglês. Uma delas se matriculou em um renomado cursinho de
idiomas, e a outra foi morar com uma família para lá se envolver com alguma
atividade. Passado algum tempo, as pessoas são questionadas a respeito de como
anda o novo idioma. A resposta que temos do primeiro é de que o curso é bom, já
avançou alguns níveis, aprendeu palavras e regras, mas na hora de produzir
enunciados, sente-se trancado e limitado.
17
História que o autor traduz da Obra The Art of Learning and Studying Foregn Languages, de Brown,
1880, p. 43).
18
Já a segunda pessoa, depois de cerca de seis a doze meses de convívio, dá
a seguinte resposta a mesma pergunta: de que desenvolveu uma boa fluência,
pensa em inglês e se sente a vontade na presença de estrangeiros. Não reconhece,
contudo, as regras do Perfect Tense, mas consegue usá-lo em suas conversas.
Essas histórias como essas, é que embasam os estudos de Krashen. A bibliografia
deste linguista compreende cerca de 350 trabalhos e livros publicados. Tornou-se
mundialmente conhecido por formular a teoria de Aquisição de Segunda Língua, a
qual de acordo com Ligthbown & Spada (1999), tem tido uma boa influência na
prática de ensino de língua estrangeira. Segundo este mesmo autor, Krashen
reivindica que sua pesquisa encontra um número diferente de domínios que
constituem suas hipóteses, que são as seguintes; a primeira “a distinção entre
aquisição e aprendizagem”, a segunda, “da ordem natural”, a terceira, “do
input”, a quarta hipótese, “do monitor”, e a última hipótese, “do filtro afetivo”. A
popularidade de seu trabalho faz com que muitos teóricos tomem o seu modelo
como base para suas teorias e a criação de métodos e abordagens mais eficazes.
(Oliveira, 2011, p. 336)
A seguir iremos apresentar cada uma delas. Para esta apresentação, nos
guiaremos, novamente, pela obra How Languages are Larned de Ligthbown &
Spada (1999), além do trabalho de tradução do livro Principles and Practice in
Second Language Acquisition? de Stephen D. Krashen, feito por Dr. José Carlos
Paes de Almeida Filho18; obra de José Quaresma de Figueiredo19, e do trabalho de
Marília Oliveira Varques Calegari20, além de outros trabalhos realizados nesta área.
1.5.1 A Distinção entre Aquisição e Aprendizagem
Para Krashen há duas maneiras para o aprendiz desenvolver o
conhecimento em língua estrangeira: a aquisição e a aprendizagem (Ligthbown &
Spada, 1999). Essa hipótese baseia-se na ideia de que aquisição e aprendizagem
são dois fenômenos diferentes de origem e com finalidades diferentes, podendo
18
Livre docente – IEL – Unicamp – Campinas – SP. Texto disponível em:
http://www.doneforyou.com.br/padrao.aspx?texto.aspx?idcontent=240&idContentSection=1836
19
Mestre em linguística pela Universidade Federal de Goiás. Professor assistente do departamento de
letras da UFG. Texto disponível em: www.revistas.ufg.br/index.php/sig/article/viewFile/7380/5246.
20
Texto disponível em: http://www.iel.unicamp.br/revista/index.php/tla/article/view/1962/1536
19
ocorrer simultaneamente (Almeida Filho, 2011), porém a aprendizagem não gera
aquisição. A aquisição segundo Almeida Filho,
... É um processo que ocorre a nível do subconsciente, funcionando pôr
força de necessidade de comunicação enquanto impulso vital, uma função
que o cérebro não pode evitar de cumprir ao ser exposto aos impulsos
auditivos identificados como mensagem codificada em língua.
A aquisição da segunda língua para Ligthbown & Spada (1999) dá-se da
mesma maneira que adquirimos a primeira língua, e para isso é necessário amostras
da língua que entendemos. Já aprendizagem, de acordo com Almeida Filho,
“significa saber as regras, ter consciência delas, poder falar sobre elas, exigindo,
portanto, um esforço consciente.” Desta forma, a aquisição tem haver em “saber”
usar a língua enquanto a aprendizagem fala “sobre” a língua. Krashen considera a
aquisição como um processo mais importante, pois para ele somente adquirindo
uma língua é que teremos fluência nela. (Ligthbown & Spada, 1999)
Assim, a aquisição se daria em um ambiente de imersão do sujeito que
deseja desenvolver uma nova língua. Seria o caso de pessoas que buscam por
experiências fora do seu país de origem. A aprendizagem, por sua vez, é o processo
que se dá dentro de uma sala de aula, onde se tem pequenas amostras da língua e
mais ênfase em regras gramaticais.
Por isso que existem indivíduos que dominam uma segunda língua sem
conhecerem nenhuma regra gramatical, enquanto existem outros que conhecem e
dominam essas regras, mas não conseguem expressar-se, pois se preocupam muito
em usar corretamente as regras que aprenderam.
Existem teorias que propõe que somente crianças seriam capazes de
adquirir uma nova língua, mas para a hipótese em questão, um indivíduo adulto é
capaz de adquirir uma língua assim como uma criança, e são capazes de se
tornarem fluentes como nativos, sem nenhum conhecimento sobre regras. Para isso,
seria então o caso de imersão. Contudo, para Krashen é possível que mesmo dentro
da sala de aula o professor proporcione e trabalhe de maneira que o aluno adquira a
língua.
Desta maneira, a distinção entre aquisição e aprendizagem faz-nos
compreender as demais hipóteses, que se relacionam com estes dois importantes
20
processos, os completam e tornam seu entendimento mais claro. (Oliveira, 2011, p.
338)
1.5.2 Da Ordem Natural
Está hipótese está ligada de forma mais direta à aquisição e não à
aprendizagem. Vários estudos antecedem, corroboram e apoiam esta hipótese.
Segundo Krashen citado por Almeida Filho, “a ordem natural, previsível, em que
adquirimos as regras da língua materna também é seguida na aquisição da segunda
língua”. Esta ordem parece não ter haver com o grau de complexidade das
estruturas.
Todavia, Krashen (1982, p. 13 apud Figueiredo 1995, p. 49-50) observa que
a ordem de aquisição para uma segunda língua não segue a mesma ordem que a
aquisição para a língua materna, deste modo, segundo Figueiredo (1995, p. 50) na
aquisição de segunda língua, a ordem natural é diferente da observada na aquisição
da mesma língua por falantes nativos.
Tomamos o exemplo dado por Almeida Filho (2011), para melhor
entendimento do que fora dito acima:
... estudos da aquisição de inglês como Segunda língua revelaram que as
regras tais como o do auxiliar (be) no progressivo (He is going ) e a cópula
(be) são adquiridos mais cedo em inglês como Segunda língua
enquanto que são mais tardios na aquisição de inglês como primeira
língua. Mas em ambos os casos, o passado dos verbos irregulares
(contrariando a ordem de ensino) precede o dos verbos regulares e os
morfemas de 3ª pessoa singular e do possessivo são bem mais tardios.
(grifos nossos).
Ainda, é importante lembrar o que diz Callegari (2006, p. 92): “a ordem de
aquisição de morfemas pode variar de acordo com a língua materna de cada
aprendiz, dependendo do grau de diferenças entre a língua materna e a língua
estrangeira que está sendo aprendida”. Ou seja, muito vai influenciar o grau de
semelhança entre a língua que o aprendiz já sabe, para a que ele vai adquirir.
21
1.5.3 Do Input
Esta hipótese baseia-se principalmente em observações do processo de
aquisição. De acordo com Krashen em Figueiredo (1995) só adquirimos uma língua
se tivermos amostras desta língua (Callegari, 2006) e se entendermos estruturas
que estejam em um nível um pouco além do que já sabemos. Ou seja, a aquisição
da língua ocorre, segundo esta hipótese, de forma gradual. Desta forma, para que a
aquisição se processe é preciso que o input esteja um pouco além de estágio atual
em que o indivíduo se encontra, quando adquire uma língua (Almeida Filho).
Desta forma se a competência atual na língua é i, o input deverá conter
informações linguísticas que estejam um pouco acima ou além do estágio em que se
encontra o indivíduo, i + l. Será a compreensão destas mensagens novas, ainda não
adquiridas que permitirão o crescimento linguístico do aprendiz (Almeida Filho). Por
outro lado, essas informações serão compreendidas graças ao conhecimento de
mundo, o conhecimento linguístico e ao contexto de situação que o aprendiz está
inserido.
Almeida Filho, afirma que:
A força da hipótese do input está em que o foco deve ser na mensagem, na
comunicação que se quer obter. O indivíduo que está adquirindo uma língua
não está preocupado ou atento a forma ou estrutura da língua, o que quer
dizer e sim, no uso que está fazendo dela o “o que” dizer.
Para este mesmo autor, está é a explicação para a grande falha no ensino
de línguas, uma vez que está centrado apenas na forma consciente de aprender
uma língua, e em exercícios gramaticais exaustivos. Para ele, está forma errônea de
ensinar, não levará o indivíduo à comunicação ou ao uso da língua em situações
reais.
Está hipótese do input postula que a fluência na fala não pode ser ensinada.
O indivíduo deve estar apto, preparado para falar, se não estiver ele repetirá frases
mecanicamente sem se comunicar. De acordo com Almeida Filho, “a incorreção na
produção linguística é característica dos primeiros estágios”. Quanto maior e melhor
for o input, e quanto mais exposição e mais correto for este input recebido, melhor
será a produção linguística, o que consequentemente irá gerar a correção por parte
22
do indivíduo. Assim a melhor maneira de se adquirir uma língua é recebendo um
input suficiente (Almeida Filho).
1.5.3.1 Características de um Ótimo Input
Almeida Filho em seu trabalho, fala a respeito das características de um bom
input, onde este nos coloca que primeiramente o input deve ser compreensível, pois
se não tivermos compreensão do input, não haverá aquisição. Algo muito
interessante que Almeida Filho nos fala em relação à compreensibilidade do input
diz respeito à conversação livre, aonde mesmo que seja sobre assuntos conhecidos
do ouvinte, não proporciona a aquisição.
Krashen nos explica isto melhor com o caso de crianças que não adquirem
uma língua falada em família, como foi o caso do próprio linguista. Seus pais
falavam o yiddish entre si e com seus avós, mas não lhe endereçavam nesta língua.
O resultado foi que ele aprendeu apenas umas palavras e expressões, isso sim,
porque a língua não foi facilitada nem tornada relevante. Por isso, que se faz
necessário tornar a mensagem acessível, auxiliando a compreensibilidade do input.
(Almeida Filho, 2011).
Já vimos que a qualidade fundamental do bom professor de língua é a
capacidade de este fornecer input em boa quantidade e compreensibilidade.
Almeida Filho coloca alguns recursos que podem ajudar o professor a incrementar o
input. Seriam elas:
1) falar mais devagar, articulando melhor cada palavra, o que ajuda quem
está aprendendo a identificar os limites das palavras e permite mais tempo
para que o adquirente processo as informações transmitidas;
2) usar palavras mais comuns, mais frequentes, evitar usar expressões
idiomáticas ou gíria, visando a quantidade de input compreensível ;
3) usar estruturas sintáticas mais simples, sentenças mais curtas. Na
aquisição de língua materna, foi observado que à medida que o adquirente
revela maior competência na língua, o input fornecido vai se tornando mais
complexo e fluente.
Almeida Filho ainda nos coloca que para auxiliar ainda mais a
compreensibilidade do input, o professor pode contar com o auxílio de materiais de
apoio durante as aulas. Apresentar aos alunos, jornais, revistas, vídeos, músicas
torna as situações linguísticas mais reais, o que desperta o interesse no aluno.
23
O input deve ser inclusive, interessante. De acordo com Krashen citado por
Almeida Filho, o input ideal é aquele que faz com que o adquirente esqueça que
está recebendo uma mensagem em outra língua. Krashen deixa claro que dadas às
situações de grande número de alunos em sala de aula, será muito difícil o professor
agradar a todos quando proporcionar materiais de apoio, devido a isso, o professor
deve procurar utilizar um bom material e evitar causar o desinteresse no aluno.
O input deve ser suficiente. O que se percebe até então, no resultado de
pesquisas, é de que a quantidade de input vem sendo subestimada. O input não
deve ser dosado ou sequenciado, assim consegue-se alcançar todos os alunos de
uma turma heterogênea, pois em algum momento o input chegará até o aluno.
Para finalizar, um ótimo input não é sequenciado gramaticalmente. Para
Krashen a tentativa de sequenciamento gramatical falhará, pois pensar que em uma
turma todos conhecem e sabem as mesmas regras gramaticais, e que adquirem as
estruturas ao mesmo tempo é ilusão. Inicialmente Krashen era favorável ao
sequenciamento gramatical desde que a ordem natural fosse seguida. Porém,
atualmente ele é contra a essa tentativa. Essas implicações decorrem, inclusive,
dessa realidade que temos salas de aula heterogêneas, ou seja, é difícil seguir uma
sequência ou sequenciar os conteúdos, uma vez que pode acontecer de alguns
alunos já dominarem determinado assunto e que, o tempo de aprender não é o
mesmo para cada aluno21.
1.5.4 Do Monitor
A capacidade ou habilidade em produzir sentenças em língua estrangeira é
resultado da competência adquirida. Por outro lado, o conhecimento consciente das
regras gramaticais (a aprendizagem), tem uma e única função: atuar na produção de
enunciados como um monitor, modificando-as caso não estejam de acordo com as
regras aprendidas (Callegari, 2006, p. 90).
Corroborando a isto, Ligthbown & Spada (1999) afirmam que o sistema de
aquisição atua na iniciação da dicção do falante e é responsável pela fluência e
julgamentos intuitivos sobre correção. O sistema de aprendizagem, por outro lado,
21
O que fora dito neste subtema baseia-se na obra de Almeida Filho.
24
atua como um editor ou “monitor” fazendo pequenas mudanças e policiamento que o
sistema adquirido tem produzido.
Segundo Krashen em Ligthbown & Spada (1999) os aprendizes usam o
modelo somente quando estão focados em ser corretos, o que contribuiria para a
escrita e não para a fala. Desta forma, saber as regras só ajudaria a melhorar o que
foi adquirido.
Krashen (1982) citado por Figueiredo (1995, p. 51) aponta que o monitor só
é posto em prática, se três formas forem cumpridas: tempo, para que o indivíduo
possa pensar sobre as regras conscientemente e usá-las de maneira efetiva; foco na
forma, para que o monitor seja usado de melhor maneira possível o tempo por si só
não é suficiente, é necessário concentrar-se na forma ou correção e por terceiro,
conhecimento de regras, que de acordo com Krashen citado em Figueiredo (1995, p.
51), “esta pode ser uma exigência terrível”, pois os alunos nem sempre aprendem
todas as regras gramaticais existentes na segunda língua.
1.5.5 Do Filtro Afetivo
Já vimos que para adquirir uma língua é necessário receber um input
compreensível. Porém, para adquirir uma língua, mais um fator é necessário. É o
que Krashen chama de filtro afetivo. Filtro afetivo “é um bloqueio mental que impede
os indivíduos de utilizarem totalmente o input compreensível que eles recebem para
a aquisição da língua” (KRASHEN, 1985, p. 3 apud FIGUEIREDO, 1995, p. 52).
Nesta hipótese Krashen leva em consideração fatores externos ao
dispositivo de aquisição, mas que possuem grande importância para esse
processo. São fatores emocionais e atitudinais como motivação intrínseca,
ansiedade e autoconfiança que podem contribuir para a aquisição.
(OLIVEIRA, 2011, p. 340).
Desta forma, quando um indivíduo encontra-se desmotivado, irritado, tenso
ou chateado, ele apresentará um filtro afetivo alto 22 e consequentemente a aquisição
será ineficaz. Por outro lado quando a situação é contrária e o aprendiz encontra-se
22
O que Ligthbown & Spada (1999) chamam de filtro up.
25
motivado, relaxado e autoconfiante, o filtro afetivo estará baixo 23 e a aquisição será
eficaz. (Ligthbown & Spada, 1999, p. 39/40).
É por esta hipótese que o professor pode compreender como que alunos
que recebem o mesmo input, com as mesmas oportunidades, não adquirem a língua
da mesma maneira. Ou seja, as condições ideias para que ocorra aquisição seria
diminuir barreiras psicológicas como ansiedade, preocupação, falta de confiança.
Desta forma, o aprendiz motivado e autoconfiante recebe e busca maior input.
Segundo Almeida Filho,
Krashen conclui que, tanto em Segunda língua, como em língua materna,
aquisição é mais importante que aprendizagem, e que as duas condições
essenciais para aquisição são: 1ª) Exposição suficiente a input
compreensível, contendo i + 1, isto é, estruturas um grau além do nível
atual; 2ª) uma situação psicológica favorável, um baixo filtro afetivo que
permita a assimilação do input compreendido.
Existem ainda os fatores que eram julgados fundamentais e que passam a
partir desta hipótese a assumir um papel secundário. São eles, condições de
exposição à segunda língua, idade e aculturação. Muitos tabus, inclusive, são
quebrados ao reduzir-se toda a força destas variáveis, unicamente à sua maior ou
menor contribuição para obtenção de input compreensível com baixo filtro afetivo.
(Almeida Filho, 2011).
1.5.6 Demais Aspectos Importantes da Teoria de Krashen
Faz-se necessário a exposição de alguns pontos importantes na teoria de
Krashen. O primeiro é a cerca do papel da gramática. Apesar da ênfase dada à
aquisição o estudo sistemático tem lugar na teoria de Krashen. Apesar de ser
limitado, afinal nem todos os aprendizes empregam a hipótese monitor, e quando o
fazem, fazem por tempo determinado. De acordo com Almeida Filho,
A objeção de Krashen contra o ensino de gramática é a ênfase dada ao
ensino de itens não essenciais a comunicação (itens que são adquiridos
mais tardiamente) a estudantes em fase inicial de aprendizagem, os quais
são incapazes de entender a mais simples mensagem transmitida na
23
O que Ligthbown & Spada (1999) chamam de filtro down.
26
Segunda língua. É um total desperdício de esforço e tempo de ambas as
partes, professor e aluno.
Assim, já é cabível falar a respeito do sequenciamento de regras inclusive.
Quando o objetivo é a aquisição, o sequenciamento é indesejado, porém quando
falamos em aprendizagem, faz-se necessário trabalhar com uma regra cada vez. O
estudo do sequenciamento é algo novo e acredita-se que muitas pesquisas deverão
ser feitas nesta área para maiores descobertas.
Algo também muito importante é o que Krashen fala sobre a correção dos
erros. Para ele “a correção de erros é uma forma de ajudar o aluno a reformular a
sua apresentação mental de uma regra que ainda não foi aprendida ou que foi
aprendida de forma errada” (Almeida Filho, 2011). A correção é importante quando
se trata da aprendizagem, pois é inútil na aquisição. Ou seja, os erros devem ser
corrigidos quando o foco está na estrutura e não quando o foco é na mensagem. É
importante salientar que para Krashen, o importante é corrigir erros que já foram
ensinados, mas que foram aprendidos de forma errada. Em relação aos erros ainda,
durante exercícios de conversação não é indicado que se corrija o aprendiz. A
correção, nestes casos, deve ser feita por meio de exercícios gramaticais, feitos
como tema de casa. (Almeida Filho, 2011).
Desta forma, percebemos que de fato a teoria de Krashen, que inicialmente
define o que é aprendizagem e o que é aquisição, está mais esmiuçada em relação
às outras teorias de aprendizagem/aquisição de línguas. Estes detalhes que
Krashen propõe torna o assunto de segunda língua mais claro, e nos faz
compreender melhor este assunto.
Após concluirmos e identificarmos algumas teorias de aquisição de línguas,
partimos para o resultado delas, que é o bilinguismo. No próximo capítulo veremos
como o bilinguismo surgiu no mundo (principais motivos); a definição do termo, ou
seja, o que é ser bilíngue; ainda, aspectos referentes à educação bilíngue e
finalizando, trataremos das vantagens e desvantagens em ser bilíngue.
27
2 O BILINGUISMO
Falar em bilinguismo é arriscar-se em algo muito novo e um tanto
desconhecido, de muita importância, devido à busca, nos últimos anos, pela
sociedade em geral, em dominar uma segunda língua. Os estudos sobre este tema
tem principalmente origem em países como Canadá e Estados Unidos. No Brasil é
algo muito recente e tentaremos aqui contribuir para o desenvolvimento deste tema.
2.1 ORIGEM DO BILINGUISMO
Muitos grupos tornaram-se bilíngues por algumas razões: o movimento de
pessoas, o nacionalismo e federalismo político, educação e cultura e algumas outras
razões. (Mackey 1967, 1976 apud Grosjean, 1982). Iremos discutir e descrever
esses fatores que vem sendo descoberta por linguistas como Mackey (1967, 1976
apud Grosjean, 1982). Assim baseados na obra de Grosjean (1982) encontramos e
descrevemos os seguintes fatores:
Movimento de Pessoas: mesmo sendo numerosos os motivos para a
migração24
(como
militares,
educacionais,
religiosos,
catástrofes
mundiais)
geralmente o bilinguismo desenvolve-se quando um grupo tem contato com pessoas
que vivem em áreas de migração. Desta forma, muitas maneiras de bilinguismo
podem se desenvolver, uma delas seria cada grupo aprender a língua do outro
grupo. Servem aqui de exemplo os colonizadores e os índios Guaranis no Paraguai,
onde espanhóis aprenderam o guarani e os guaranis aprenderam o espanhol.
(Grosjean, 1982, p.31) Assim, a comunicação ocorreria em duas línguas, sendo
tanto de um dos grupos, como do outro.
Também, outro modo de surgimento de uma nova língua, seria quando um
grupo passa a desenvolver a língua da nova área em que se estabelece, é o caso
dos imigrantes25 dos Estados Unidos que tem de aprender o inglês. Neste caso, ao
encontrar uma nova localização para se estabelecer, e já tendo neste local um
idioma, os indivíduos se submetem a aprender o idioma que já existente neste local.
24
Definição de migração: deslocação de populações de uma região para outra ou de um país para
outro. Disponível na http://www.infopedia.pt/lingua-portuguesa/migra%C3%A7%C3%A3o;jsessionid=L
4UaWivd1c1dzkj1xOLrPw__
25
Definição de imigrante para fins de evitar mal entendimento: visitante permanente ou temporário a
outro país que não é sua nação. Disponível em: http://www.dicionarioinformal.com.br/imigrante
28
Neste caso, a língua nativa pode com o passar das gerações, se perder e deixar de
ser usada. Qualquer que seja a maneira, o fator mais importante para o
estabelecimento do bilinguismo é a migração. (Grosjean, 1982)
Um tipo de movimento que estava ligado de maneira importante no século
passado era as invasões militares e a posterior colonização. Essas invasões fizeram
com que as línguas se espalhassem pelos locais conquistados. No século XIX, por
exemplo, tanto ingleses como franceses colonizaram uma extensa região na África e
na Ásia (Grosjean, 1982). Segundo Brosnahan (1963) e Cooper (1978), citado em
Grosjean (1982) a língua se espalharia e o bilinguismo aconteceria graças ao
estabelecimento da língua dos invasores ou colonizadores nas novas terras, que
propagavam estas línguas, que resultava no bilinguismo. Assim,
The area of conquest should be multilingual so that the invader’s language
will be used as a lingua franca, especially in urban areas; and the use of the
invader’s language should be enhance the inhabitants’ social, political,
educational or commercial opportunities26. (GROSJEAN, 1982, p. 31)
Um fato da história interessante é o que Lewis (1976 apud Grosjean, 1982)
relata que, quando os Romanos invadiram a Grã-Bretanha (que tinha como língua
materna a língua celta) muitos bretões capturados foram para Roma, e passaram a
usar o latim, que era usado na administração do país, no exército, nos negócios e
comércio entre romanos e bretões, e inclusive, em outras partes do império. O uso
do latim permitia que os bretões adquirissem várias vantagens na sociedade romana
como escolas, mercados, banheiros públicos entre outros. O latim não era imposto
às pessoas do reino, aprender era um privilégio que tornava os bretões nativos mais
membros do império.
Migrações por motivos sociais ou econômicos também levam ao bilinguismo.
A história é repleta de casos de movimento de grupos que saíram de seus lares em
busca de outras áreas, regiões ou países em busca de trabalho, comida, água e
melhores condições de vida. Atualmente, um dos motivos que levam as pessoas a
deixar seus países e irem para outros, são trabalhadores que vão para outro país em
busca de empregos melhores (Grosjean, 1982, p. 32).
26
TP: A área de conquista deve ser multilingue para que a língua do invasor seja utilizada como
língua franca, especialmente em áreas urbanas, e o uso da linguagem do invasor deve ser aumentar
as oportunidades sociais, políticas, educacionais ou comerciais dos habitantes.
29
O que acontece com essas pessoas, ou com esses trabalhadores, é que
muitas vezes mudam-se levando junto de si suas famílias (Grosjean, 1982, p. 32).
Este trabalhador continua usando a língua mãe em casa com esposa, filhos e
amigos, mas no emprego precisa dominar a segunda língua que é exigida no local
de trabalho. Esse é o tipo de razão que mais leva ao bilinguismo atualmente. Este é
um caso que pode ser comparado aos brasileiros que vão, principalmente, para os
Estados Unidos, em busca de melhores condições em suas profissões. Os Estados
Unidos é um dos países que mais recebe migrantes em busca de vagas de trabalho,
tanto que, atualmente, passa por uma reavaliação em seu modo de migração, pois
estes trabalhadores acabam ficando de forma ilegal no país, o que está gerando
problemas ao governo e população norte-americana.
Outra razão para o bilinguismo abrange questões de negócios e comércio.
Pessoas que lidam com esse tipo de atividade, necessitam viajar para lugares onde
precisam dominar uma língua franca, assim como suas línguas nativas (Grosjean,
1982, p.32). A maneira de negociar do século atual, permite que se faça negócios
com pessoas de lugares distantes onde se fala outra língua. Devido a isso,
empresários buscam aprender novas línguas, o inglês, por exemplo, para negociar
com estrangeiros. Uma língua que vem ganhando destaque dentro do meio
econômico é o mandarim27, devido à ascensão econômica da China nos últimos
anos.
Razões políticas e religiosas também levam ao bilinguismo, uma vez que
muitas razões políticas fazem o povo à buscar novos locais de vida, é o caso da
saída dos Cubanos para os Estado Unidos, depois que Fidel Castro assumiu o
poder do país. No que diz respeito a motivos religiosos um bom exemplo são os
judeus russos, que normalmente são monolíngues (falam russo), e acabam
migrando para Israel e também Estados Unidos (Grosjean, 1982, p. 33).
Nacionalismo e Federalismo Político: esta é outra razão para o bilinguismo.
O Nacionalismo tem tido um grande impacto na propagação de línguas nacionais e
consequentemente, no grau de bilinguismo em muitos países (Grosjean, 1982, p.33).
Davies apud Grosjean (1982) diz que “a people without a language of its own is only
27
Língua falada na China.
30
half a nation. A nation should guard its language more than its territories 28.” Por isso
que uma nação só é nação quando esta tem uma língua estabelecida.
A consequência do nacionalismo, é que a língua regional desenvolve-se
fazendo com que muitos habitantes falem a língua nativa, ou seja, a língua da
região, assim como falem a língua nacional, forma esta que leva ao bilinguismo.
Porém em alguns lugares a língua regional é proibida pela política do governo, em
escolas e locais públicos. Contudo, se a mesma política é mais moderada, onde a
língua regional é permitida, temos uma política federalista, onde o uso de duas
línguas é aceito pela lei, podendo ser utilizado em todos os locais. Nações modernas
da África são exemplos de política federalista onde o bilinguismo é norma, desta
forma mantem-se a essência das línguas regionais. Há muitos locais (regiões
geográficas) que estão divididos por muitos países e que os grupos destes locais
possuem uma língua regional ou nativa e uma língua nacional, ocorrendo assim o
bilinguismo (Grosjean, 1982, p. 33 e 34).
Educação e Cultura: outra causa do bilinguismo é educação e cultura. No
império Romano o idioma grego era o idioma da educação e cultura. Quase toda a
educação romana era bilíngue em latim e grego. Pessoas de classes mais elevadas
davam este tipo de educação para seus filhos (Grosjean, 1982, p. 34). Esta é uma
causa que se mantêm, pois em muitos países, como o Brasil, uma segunda língua
só é aprendida por quem tem maiores condições financeiras. Condições estas que
proporcionam uma busca por cursos de idiomas e escolas particulares de alto nível
onde o idioma é ensinado.
A busca por um novo idioma vem ganhando grandes proporções em nosso
país. Com a criação do programa Ciências sem Fronteiras29 do governo federal
brasileiro, que leva estudantes para outros países, muitos estudantes estão
buscando aprender uma nova língua para poderem ser aprovados no programa.
Porém este programa mostrou uma triste realidade, que é a falta de domínio dos
alunos em outras línguas. Os alunos que possuem o domínio de segunda língua são
aqueles que estudaram em escolas particulares e/ou buscaram um curso de idiomas
para aprender uma nova língua. A escola pública brasileira não vem apresentando
28
TP: um povo sem uma linguagem própria é apenas metade de uma nação. A nação deve proteger
sua língua mais do que os seus territórios.
29
Mais informações a respeito do programa ver: http://www.cienciasemfronteiras.gov.br/web/csf
31
bons resultados em relação ao ensino de línguas, mas esta é uma questão que não
detalharemos neste trabalho.
Outras Razões: a industrialização e a urbanização são consideradas como
outras causas do bilinguismo. Uma está ligada a outra, a industrialização,
principalmente com as multinacionais, onde em muitos setores faz-se necessário
que o trabalhador use muito uma língua franca, seja para manter contato com filiais
em outros países, receber instruções entre outras (Grosjean, 1982, p 35).
No Brasil existem várias multinacionais como a JBS, maior processadora de
carnes do mundo; a Gerdau, uma empresa siderúrgica; Metalfrio, fabricante de
refrigeradores; Tigre Tubos e conexões, fabricante de tubos para construções entre
outras. Estas empresas estão presentes no mundo todo e se interligam,
necessitando assim o domínio, de uma língua franca.
Outra razão que Grosjean coloca é a religião, mas nós a vemos como um
fator um pouco mais fraco, pois o que o autor nos coloca, já não é como ele
descreve, pois, o cristianismo já não é mais proferido em latim, isso faz parte do
passado. Então, em tempos passados foi uma causa de bilinguismo, mas hoje em
dia já não poderia ser considerado. O autor também cita o Islã como forma de
propagar a língua árabe.
Grosjean (1982, p. 36) esclarece que todas as causas citadas acima não são
raramente permanentes. Ou seja, podem variar dependendo do período histórico e
das necessidades da humanidade.
2.2 DEFINIÇÃO DO TERMO BILÍNGUE
Na procura pelo conceito de bilíngue, o que encontramos a princípio são
termos como complexidade, ampla, difícil, variação, relevante, entre outros. De fato,
o que ocorre com o bilinguismo é que não existe uma definição única para o termo
bilíngue, pois este processo sofre influências de fatores que o modificam. De acordo
com Grosjean (1982, p. 230) “fluency in two languages has often been proposed as
the main criterion30…” Assim, a fluência é um dos fatores que tem um peso muito
maior do que outros fatores, como o uso regular de duas línguas, domínios de uso,
30
TP: fluência em duas línguas tem sido frequentemente proposta como critério principal...
32
habilidades (ler e escrever, por exemplo) desenvolvidas em outra língua (Grosjean,
1982).
Quando falamos em bilíngue, com pessoas que não tem conhecimento a
respeito disso, muitas entendem o bilíngue como uma pessoa que fala duas línguas.
Para Bloomfiel (1933 apud Grosjean, 1982), “bilingualism, [the] native-like control of
two languages31”. Thiery, (1978, p. 146) em Grosjean (1982, p. 232) por sua vez,
afirma que, “a true bilingual is someone who is taken to be one of themselves by the
members of two different linguistic communities, at roughly the same social and
cultural level32”. Ou seja, para Thiery, o verdadeiro bilíngue é aquele que está
inserido em duas comunidades linguísticas diferentes e é reconhecido participante
delas pelos demais membros.
Grosjean (1982, p. 232) expõe que Macnamara (1967a) considera um
indivíduo bilíngue, aquele que possui ao menos uma habilidade linguística (ler,
escrever, ouvir e falar) no menor grau que seja na segunda língua. O que
Macnamara considera como bilíngue, envolve aquelas pessoas que muitas vezes
sabem falar uma segunda língua, porém não tem a habilidade de escrever nesta
língua. Por outro lado existem outros, que conseguem ler perfeitamente em uma
segunda língua, mas não conseguem expressar-se na mesma.
Grosjean (2010, apud Limberguer, 2012, p. 69), por sua vez, define que
“bilíngues são aqueles que usam uma ou mais línguas (ou também dialetos) nas
suas vidas”. Percebemos com essas várias definições que, algumas delas são mais
inclusas, aceitam que o indivíduo consiga apenas se comunicar em outra língua que
não a materna, como as definições citadas a cima, de Bloomfield e Grosjean. Já
outras são mais exigentes, como a de Macnamara e Thiery, que levam em
consideração as formas de uso, e uso de todas as habilidades linguísticas.
Partindo da definição mais simples de que bilíngues são indivíduos que
falam duas línguas, como podemos então classificar pessoas que apenas falam uma
segunda língua, e que não possui a habilidade de ler ou escrever nesta mesma
língua? Ou ainda, aquele que entende uma segunda língua perfeitamente, mas não
sabe se expressar oralmente (Megale, 2005, p.2)? Para essas respostas, Li Wei
(2010 apud Megale, 2005, p. 2),
31
TP: Bilinguismo é o controle nativo de duas línguas.
TP: um verdadeiro bilíngüe é alguém que é considerado um dos “seus”, pelos membros de duas
comunidades lingüísticas diferentes, mais ou menos no mesmo nível social e cultural.
32
33
...argumenta que o termo bilíngue basicamente pode definir indivíduos que
possuem duas línguas. Mas, deve-se incluir entre estes, indivíduos com
diferentes graus de proficiência nessas línguas e que muitas vezes fazem
uso de três, quatro ou mais línguas.
Harmes e Blanc (2000 apud Megale, 2005) afirmam que o bilinguismo é um
fenômeno multidimensional33 e que devemos considerar seis dimensões ao definir
bilinguismo. Baseados no trabalho de Megale (2005, p. 3), iremos descrevê-los. São
as seguintes:
- Competência Relativa, que enfatiza a relação entre duas competências.
Temos a partir disto o bilinguismo balanceado, onde o indivíduo possui a mesma
competência linguística em ambas as línguas. Salientamos que, dentro deste
conceito, não importa o alto grau de competência nas duas línguas, mas sim se este
alcançou um grau equivalente em ambas às línguas. E temos o bilinguismo
dominante, que é aquele em que apresenta maior competência em uma das línguas,
normalmente na língua nativa.
- Organização Cognitiva, onde temos o conceito de bilíngue composto, que
seria aquele que mostra uma única representação cognitiva para duas traduções
iguais; e o conceito de bilíngue coordenado, seria aquele que mostra representações
distintas para duas traduções iguais. Segundo Grosjean (1982) a distinção de
bilíngue composto e coordenado é feita pelos psicolinguístas. Acrescenta ainda que
para os psicolinguístas o bilíngue composto desenvolve-se através de experiências
em contextos fundidos, e o bilíngue coordenado é desenvolvido através de
experiências em contextos diferentes.
- Idade da Aquisição, onde de acordo com a idade em que se dá a aquisição
da língua temos o bilinguismo infantil, adolescente ou adulto. O bilinguismo infantil
divide-se em bilinguismo simultâneo, onde desde o nascimento a criança é exposta
a duas línguas e a adquire ao mesmo tempo; e bilinguismo consecutivo, onde após
ter adquirido as bases linguísticas da língua materna, ela adquire, ainda na infância
a segunda língua. Quando a aquisição da segunda língua ocorre na adolescência,
denominamos este como bilinguismo adolescente, e quando o indivíduo adquire a
língua em fase adulta, chamamos este de bilinguismo adulto.
33
Algumas concepções são unidimensionais, que definem o indivíduo bilíngue apenas em termos de
competência linguística, ignorando outras dimensões. (HARMES E BLANC, 2000 apud MEGALE,
2005, p.6).
34
- Presença ou não de Indivíduos Falantes da L2, e acordo com esta,
classificamos o bilinguismo endógeno ou exógeno. Por bilinguismo endógeno
entendemos que ambas as línguas são utilizadas como nativas na comunidade,
podendo ou não ser utilizados para fins institucionais. Já por bilinguismo exógeno,
temos a ausência da segunda língua dentro da comunidade.
- Status, atribuído à língua, pode desenvolver no indivíduo formas
diferenciadas de bilinguismo. Temos então o bilinguismo aditivo, onde as duas
línguas são valorizadas no desenvolvimento cognitivo da criança, e a aquisição da
segunda língua dá-se sem perda ou prejuízo a língua materna; e o bilinguismo
subtrativo, onde a primeira língua é desvalorizada, originando desvantagens
cognitivas no desenvolvimento da criança e ocorrendo perda ou prejuízo na língua
materna.
- Identidade Cultural, onde temos bilíngues biculturais, monoculturais,
aculturais e desculturais. Como bilinguismo bicultural, entende-se o indivíduo que se
identifica de forma positiva com os dois grupos culturais e é reconhecido por cada
um dos grupos. Os monoculturais são aqueles que se identificam e é reconhecido
por apenas um dos grupos culturais. O bilíngue acultural é aquele que adota valores
culturais ligados ao grupo de falantes da segunda língua e renuncia a identidade
cultural relacionada à sua língua materna. E finalmente o bilinguismo descultural,
identifica-se quando o indivíduo desiste de sua identidade cultural, mas não obtêm
sucesso ao tentar adotar aspectos culturais do grupo de falantes da segunda língua.
Assim, de forma esquemática temos a tabela:
35
Tabela 1 – Dimensões do bilinguismo de Harmes (apud Megale) 34
Dimensões
Competência Relativa
Organização Cognitiva
Idade de Aquisição
Presença da L2
Status das línguas
Identidade Cultural
Denominação
Bilinguismo Balanceado
Bilinguismo Dominante
Bilinguismo Composto
Bilinguismo Coordenado
Bilinguismo Infantil:
Simultâneo
Consecutivo
Definição
L1=L2
L1>L2 ou L1<L2
1 representação para 2 traduções
2 representações para 2 traduções
L2 adquirida antes dos 10/11 anos
L1e L2 adquiridas ao mesmo
tempo
L2 adquirida posteriormente a L1
Bilinguismo Adolescente
L2 adquirida entre 11 e 17 anos
Bilinguismo Adulto
L2 adquirida após 17 anos
Bilinguismo Endógeno
Bilinguismo Exógeno
Bilinguismo Aditivo
Bilinguismo Subtrativo
Bilinguismo Bicultural
Presença da L2 na comunidade
Ausência da L2 na comunidade
Não há perda ou prejuízo da L1
Perda ou prejuízo da L1
Identificação positiva com os dois
grupos
Identidade cultural referente a L1
ou a L2
Identidade cultural referente
apenas a L2
Sem identidade cultural
Bilinguismo Monocultural
Bilinguismo Acultural
Bilinguismo Descultural
Assim, concepções multidimensionais levam em consideração noções
oriundas de diversas disciplinas: psicologia, sociolinguística, sociologia e linguística
(MEGALE, 2005, p.7). “Bilinguismo é um fenômeno complexo e deve ser estudado
como tal, levando em consideração variados níveis de análises: individual,
interpessoal, intergrupal e social” (HARMES & BLANC, 2000, apud MEGALE, 2005,
p.7).
Desta forma, a classificação de bilíngues em várias dimensões, facilita o
entendimento do bilíngue de acordo com as peculiaridades. Ou seja, nenhum
indivíduo terá as mesmas características quanto à forma como adquiriu a segunda
língua, a forma como utiliza a língua, entre outras. Mesmo sendo o conceito de
bilinguismo ou de bilíngue, muito amplo acreditamos que, as dimensões que
descrevemos acima, clareiam o entendimento de cada caso de bilíngue que esteja
em questão.
Contribuindo ao que já fora dito até aqui, Grosjean em 1982 já considerava
que para uma descrição do bilíngue em um tempo particular, podemos adicionar
algumas informações acerca da linguagem história de uma pessoa. Considerava
34
Disponível também no site: http://kauverdianu.blogspot.com.br/2011_04_01_archive.html Acessado
dia: 27/10/2013.
36
ainda, que existiam fatores que conduziam para o bilinguismo, (fatores estes que
enraízam a descrição das dimensões que citamos a cima) e a respeito disso nos diz
que, algumas pessoas aprendem duas línguas em seu lar e podem falar ambas
fluentemente, mas são capazes de ler e escrever em apenas uma delas; outras
aprendem e usam a segunda língua na escola e se saem melhor ao ler e escrever
do que ao falar. Trabalhadores imigrantes geralmente aprendem suas segundas
línguas no trabalho e podem nunca aprender a ler e a escrever com elas, contudo,
diplomatas e homens de negócios internacionais frequentemente necessitam ser
altamente alfabetizados em duas línguas.
Com o tempo, o nível de fluência em cada habilidade linguística reflete a
necessidade do falante em determinada língua. Frequentemente, muitas pessoas
deixam de falar uma de suas línguas (no caso do sujeito bilíngue), ou por que deseja
ou por motivos que tornam o uso da língua desnecessária, como a mudança para
longe de pais, parentes... Grosjean (1982) chama isso de esquecimento da língua,
um acontecimento que exige atenção e ocorre principalmente em adultos. As
principais características desse fenômeno é que mesmo entendo tudo que lhe é dito,
o falante em esquecimento da língua, começa a procurar pela palavra certa, torna
sua fala excitante, tem a pronúncia afetada e perde completamente a expressão da
fala.
Este é um processo que acontece de forma vagarosa, porém o falante
percebe que está perdendo a forma falada da língua, quando usa essa língua
esporadicamente. Muito interessante à colocação de Grosjean (1982) quando este
diz que este fenômeno de esquecimento mostra que a sociedade permite que você
aprenda uma língua, mas não a esqueça. Embora o indivíduo perca a fluência ou a
forma de falar, ou seja, tenha esquecido a língua, ele jamais deixará de entender. E
caso, volte a usar a língua, este rapidamente voltará a ter o domínio sobre a língua
que tinha anteriormente. Pessoas que passam por esse processo Grosjean (1982)
chama de “dormant bilingual”
35
. É como se a língua, que não vem sendo utilizada,
estivesse em estado de dormência, podendo “acordar” a qualquer momento, se for
necessário.
35
TP: bilíngue adormecido.
37
O que descrevemos aqui corrobora com o que vínhamos afirmando de que
descrever o que é ser bilíngue não é uma tarefa fácil. Como diz Grosjean não é só a
fluência que importa, mas toda a construção histórica desse sujeito bilíngue.
2.3 EDUCAÇÃO BILÍNGUE
Falar sobre educação bilíngue é uma tarefa tão complexa quanto falar em
bilinguismo. Os conceitos de educação bilíngue se tornam complexas, pois as suas
características vão além dos limites escolares e inclui família, vizinhos, os meios de
comunicação (Akkari, 1998 apud Mello, 2010, p.118). Anos atrás a educação
bilíngue era procurada por diplomatas, políticos, imigrantes que desejavam que seus
filhos não deixassem de viver suas culturas, ou imigrantes que viviam por um tempo
no Brasil e depois de um período voltariam para seu país de origem (Flory, 2009,
p.26). O objetivo destas famílias era, ou manter uma língua ou aprender e dominar
uma língua franca.
Quando pensamos em escola bilíngue, remetemos nossa ideia a escolas
que ensinam seus alunos em duas línguas. Porém se refletirmos um pouco mais
além, algumas dúvidas surgirão, dúvidas como: “mas afinal, as duas línguas são
usadas juntas dentro da sala de aula ou são alternadas? A aula de língua materna é
proferida em segunda língua?” entre outras. São questões que existem e as
respostas poderão ser dadas, dependendo da forma como a escola trabalha essa
forma de ensino bilíngue.
O que se percebe é que não existe algo que se aplique a todas as escolas
bilíngues, pois cada um tem seus objetivos, suas metodologias e até mesmo a
própria maneira de trabalhar com a aprendizagem da segunda língua. Atualmente,
essas escolas vêm recebendo cada vez mais alunos, com o objetivo de aprender
uma segunda língua de forma perfeita, porém, o objetivo é o de dominar uma
segunda língua para prosseguir os estudos fora do país.
Segundo Mello (2010, p.121),
Tecnicamente, a educação bilíngue corresponde àquela “em que duas
línguas são usadas como meio de instrução” (HORNBERGER, 1991, p.
217) ou, nas palavras de Genesee (1987, p. 1), “educação bilíngue de
verdade [grifo nosso] é a instrução que ocorre na escola em pelo menos
duas línguas”.
38
Contudo, existem muitas variações dentro de cada ensino bilíngue. Alguns
programas oferecem a instrução inicial em língua materna e inserem aos poucos a
segunda língua, até a criança dominá-la e depois de adquirir as habilidades
acadêmicas, as aulas são dadas em segunda língua. Outros programas já têm seus
objetivos voltados para a manutenção da segunda língua. E ainda, há programas em
que o tempo é dividido para que metade do tempo se tenha instruções em uma
língua e metade do tempo em outra (Mello, 2010).
Dessa forma, a expressão educação bilíngue tem sido frequentemente
usada na sua acepção mais abrangente para incluir todas as situações em
que duas ou mais línguas estão em contato, fazendo-se a distinção entre as
suas diversas tipologias somente quando o contexto ou a situação requer
um maior detalhamento técnico. De maneira semelhante, quando se usam
as expressões escola bilíngue e/ou sala de aula bilíngue, faz-se referência à
possibilidade de ocorrência de uso de mais de uma língua nesses
contextos, mesmo quando se espera que uma única língua seja usada na
maior parte das interações que ocorrem nesses contextos. (MELLO, 2010,
p.122)
Segundo Mello (2010), o contexto social do indivíduo é um dos fatores que
abrem caminhos para uma educação bilíngue. Em vistas a isso, baseando-se nas
ideias e no trabalho de Mello (2010) iremos a partir de agora relatar brevemente a
história da educação bilíngue nos países dos Estados Unidos, Canadá e Brasil. Nos
dois primeiros, as pesquisas em relação ao bilinguismo estão mais adiantadas em
relação ao nosso país (Mello, 2010).
Como sabemos, os Estados Unidos foi um país que recebeu um forte
número de imigrantes de diversas partes do mundo. Quando os filhos desses
imigrantes entravam nas escolas sem dominar o inglês, apresentavam baixo
rendimento escolar. Muitos programas foram criados com o intuito de auxiliar essas
crianças a adquirirem o idioma. Depois de muitos anos de discussão, mudança de
leis e pesquisas, ainda existem polêmicas em torno da educação bilíngue.
Muitas pessoas são a favor do ensino de uma única língua nas escolas, o
inglês. Pesquisas na área do ensino bilíngue demonstram resultados insatisfatórios
onde os alunos não aprendem nem uma nem outra língua. Cidadãos afirmam estar
cansados de pagar impostos e não ver resultado nenhum, e a mídia ainda faz
críticas aos altos valores investidos nesse tipo de educação. Pais de alunos que
pertencem aos grupos minorizados são contra a educação bilíngue, pois vem que a
39
língua inglesa é o caminho da ascensão econômica e social de seus filhos, e os
imuniza de passar pelo estigma da diferença.
O que se percebe com isso, é que o poder econômico e o poder dominador
se apresentam em formas linguísticas. O inglês é a língua que as pessoas do mundo
inteiro desejam saber, para serem bem sucedidas. Desta forma, os cidadãos deste
país não teriam reais motivos para buscar uma segunda língua, pois eles já
dominam uma língua que é considerada franca, falada no mundo inteiro.
No Canadá, a educação bilíngue surgiu como forma de valorização da língua
e cultura francesa. No país alguns movimentos se organizaram e passaram a
demonstrar sua insatisfação ao fato de que, a língua francesa vinha perdendo
espaço dentro do país. Começaram então, a título experimental, a ser implantado o
ensino de francês desde os anos inicias da vida escolar, provocando assim, a
aprendizagem acidental do francês.
A princípio as crianças começavam a ter aulas em francês e aos poucos se
introduzia o inglês, chegando um momento em que as aulas eram proferidas em
proporções de 60% em francês e 40% em inglês. Nas palavras da autora:
A partir daí, os programas de imersão evoluíram e assumiram as diferentes
formas que podem ser encontradas em todas as províncias do Canadá e em
diversas regiões dos Estados Unidos. Embora em ambos os países a
educação bilíngue tenha surgido como uma resposta a um problema
político-sociolinguístico, no Canadá a busca dessa resposta tinha como
premissas básicas tanto o estabelecimento de um bilinguismo do tipo aditivo
quanto à integração social de comunidades linguística e culturalmente
distintas, ao passo que nos Estados Unidos a solução para o problema
fundamentava-se na perspectiva de um bilinguismo do tipo subtrativo e na
assimilação de uma cultura pela outra. (MELLO, 2010, p. 125).
No Brasil o bilinguismo está associado (de forma estereotipa) com a
educação dos povos indígenas ou a línguas de prestígio como o inglês, espanhol,
francês, italiana, entre outras, chamada de educação bilíngue de elite. A visão de
país monolíngue, tem apagado as minorias linguísticas que estão presentes em
nosso país, como a língua e dialetos indígenas, a língua dos grupos de imigrantes,
os dialetos criados nas áreas de divisa... O Brasil vem conseguindo abafar esses
grupos, assim como fez com os negros trazidos da África, que foram “podados” de
falarem sua língua e seus dialetos.
40
Assim, o Brasil vai mantendo o patamar de país monolíngue, e apoiando a
ideia que o domínio de uma segunda língua é para as classes altas. A única
comunidade com direito previsto em lei a educação bilíngue pública, são os
indígenas, que recebem instrução na língua materna e aprendem o português. Na
escola pública brasileira, temos implantada também, sob forma de lei, aulas de
língua estrangeira, onde normalmente o inglês é a língua ensinada. Como já falamos
neste trabalho, o ensino de línguas em nosso país requer atenção, pois o mínimo
dos objetivos vem sendo alcançados.
O Brasil prossegue assim, quase que totalmente monolíngue. Tendo ainda
grandes problemas com o ensino de línguas dentro de suas salas de aula. E aqueles
que possuem melhores condições financeiras buscam as escolas bilíngues, ou
cursos de idiomas de maneira a adquirirem o domínio de uma segunda língua.
Feito o estudo a respeito do bilinguismo, da sua origem, das suas
concepções e conceitos, partimos para o estudo de outras questões relativas a este
tema. O que trataremos a seguir será o que poderíamos chamar do resultado da
aquisição de uma segunda língua em aspectos cognitivos e cerebrais.
41
3 O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO E CEREBRAL DE UM INDIVÍDUO
BILÍNGUE
3.1 DESENVOLVIMENTO COGNITIVO
Por muitos anos, mais precisamente desde o século XIX, pessoas
acreditavam e mostravam que o fato de falar duas línguas poderia impedir a
aprendizagem de uma das línguas ou das duas, de forma correta. Para essas
pessoas, a criança que aprendesse duas línguas poderia começar a confundir-se
nas línguas quando entrasse na escola, ou seja, o bilinguismo era visto como uma
desvantagem. A ideia que se tinha é que as crianças, que falavam uma língua
diferente da língua dominante, tinham dificuldades na hora de se inserir no contexto
escolar, que iria confundir os idiomas na hora de escrever, que teria sotaque na
língua dominante e assim por diante.
Neste trabalho, já fora citado como se deve proceder nesses casos, pois a
criança irá aprender a língua dominante, porém ela deve ser estimulada em seu
ambiente familiar, a continuar fazendo uso da língua que aprendeu dentro deste
ambiente. Mas e por que Ligthbown & Spada (1999) nos dizem isso? Apenas para
que a criança saiba falar duas línguas? Para manter uma boa relação com a família?
Os estudos que se desenvolveram a partir dessas perguntas iniciaram-se,
de acordo com a matéria de Catherine de Lange publicada na Revista Galileu
(13/08/2013)
36
, por volta de 1962 com Elizabeth Peal e Wallace Lambert, na
universidade McGill no Canadá. Neste estudo Peal & Lambert constataram que falar
dois idiomas não prejudicaria o desenvolvimento da criança, antes eles superariam
os monolíngues nas pesquisas que tinham realizado.
Peal & Lambert (1962) atribuíram os resultados negativos dos bilíngues nos
estudos anteriores à falha dos pesquisadores em diferenciar ‘pseudobilíngües’ e ‘bilíngües verdadeiros’. Os mesmos pesquisadores acreditavam
que o pseudo-bilíngüismo poderia trazer desvantagens, mas que o
bilinguismo verdadeiro poderia ser uma grande vantagem no
desenvolvimento cognitivo. (BILLIG & FREDERES, 2008, p.02)
36
Disponível
em:
http://revistagalileu.globo.com/Revista/Common/0,,EMI313503-17579,00-BILIN
GUES+TEM+VANTAGENS+NO+APRENDIZADO.html.
42
Os resultados desta pesquisa, porém, foram ignoradas por praticamente
todos os pesquisadores da época. Com o passar dos anos, o bilinguismo voltou a
chamar atenção, e graças à modernidade tecnológica, o cérebro de bebês poderia
ser observado através da espectroscopia de infravermelho próximo funcional. Foi
isso que fez Laura Ann Petitto, da Universidade de Gallaudat, onde ao observar o
cérebro de bebês, descobriu um grande aumento de atividade neurológica, quando
ouvem línguas totalmente desconhecidas ao final do primeiro ano de vida. Petitto
(apud Langue, 2012) acredita que a atividade bilíngue faz com que o bebê
reconheça sons de origens diferentes e que esse fato facilitaria às crianças bilíngues
a aprender outros idiomas para o resto da vida. (Langue, 2012).
O estudo a respeito do bilinguismo é recente. Segundo Langue, em 2003,
Ellen Bialystok, psicóloga e neurocientista da Universidade York de Toronto realizou
uma pesquisa onde pediu que um grupo de crianças, bilíngues e monolíngues,
identificasse a forma gramatical de algumas frases. Os dois grupos identificaram o
erro na frase “maçãs cresçam em árvores”, porém as diferenças vinham quando
analisavam frases sem sentido como “maçãs crescem em narizes”. As crianças
monolíngues não conseguiam ver que a frase não apresenta nenhum erro
gramatical, pois estavam preocupados com o sentido dela, enquanto as crianças
bilíngues viam que a frase não possuía sentido, mas que estava escrita
gramaticalmente de forma correta. Isso mostra que, os bilíngues possuem um
desenvolvimento maior no que diz respeito ao sistema executivo, que faz os
bilíngues se concentrarem na gramática e bloquear informações irrelevantes
(Langue, 2012). O sistema executivo do cérebro é uma habilidade mental, capaz de
bloquear informações desnecessárias, por isso dos alunos prestarem atenção na
gramática e ignorar o sentido das palavras. Esse sistema é necessário para
praticamente tudo que fizemos como ler, dirigir um carro, realizar cálculos
matemáticos... (Langue, 2012).
Ellen Bialystok é um dos nomes mais renomados no que tange a bilinguismo
e esta pesquisa que relatamos acima é apenas uma de tantas que Bialystok vem
realizando. No próximo item veremos inclusive suas contribuições a respeito do
desenvolvimento cerebral, onde suas pesquisas têm mostrado resultados muito
interessantes.
43
O que se discute muito na questão do cognitivismo, é a idade adequada
para que a criança aprenda uma língua. Para Pettito (2009 apud Nobre & Hodges,
2010, p. 183) a exposição de uma criança a duas línguas facilita a aquisição
proficiente e o domínio de ambas, mas mesmo que esta criança venha a aprender
uma segunda língua mais tarde, nada impedirá que ela aprenda a língua e a domine.
O que se percebe, entretanto, é que quanto mais tarde se der a aprendizagem,
maiores serão as marcas do sotaque, ritmo e entonação da primeira língua. (Nobre
& Hodges, 2010, p. 184).
Muitos autores falam a respeito de um período crítico para a aprendizagem
da língua. Esse período crítico segundo Nobre & Hodges (2010, p. 138) seriam
“momentos nos quais o indivíduo está mais suscetível a influências externas.” Em
outras palavras é uma etapa na vida, em que mais absorvemos novos
conhecimentos, e que este período depois de encerrado, faria com que a
aprendizagem de uma língua, por exemplo, se tornasse muito mais difícil.
Contudo, há alguns pesquisadores que não acreditam neste período crítico
para se aprender uma língua. Uma entrevista realizada com Peter Indefrey, um dos
mais respeitados neurolinguistas da atualidade, pela revista Ciência Hoje, questiona
o pesquisador a respeito desse período crítico. Ele afirma que o período crítico é um
mito, que nada se encerra e explica:
... o que se percebe é um declínio gradual na proporção de pessoa que
aprendem uma segunda língua e passam a fala-la com a mesma
proficiência que têm na língua materna. Mas sempre se achará alguém que
fala uma segunda língua perfeitamente, mesmo que tenha começado a
aprendê-la tardiamente. Esse declínio gradual começa em idades diferentes
para aspectos diferentes da língua. (INDEFREY, 2007)
Indefrey (2007) ainda disse que, para falar sem sotaque o importante é
começar cedo, mas já para ganhar vocabulário é mais importante o tempo que se
dedica a aprendizagem do que a idade em que se aprende a língua. Para nós, esta
é uma questão muito controversa e que ainda necessita de um maior número de
pesquisas sobre o assunto, para que possamos afirmar de fato algo a respeito do
período crítico.
Independente da existência ou não do período crítico, o que algumas
pesquisas mostram, é que bilíngues que aprenderam uma língua na infância têm
44
melhores resultados em tarefas de atenção, monitoramento e troca de tarefas
(Emmorey et al.,2008 apud Nobre & Hodges, 2010). Isso se justifica, pois,
a constante necessidade de selecionar a linguagem apropriada é um
processo que envolve uma ativação coordenada e ressonante das
características inter-relacionadas da linguagem ativada, bem como a
rejeição de competição e interferência de uma língua sobre a outra.
(PRIOR&MACWHINNEY, 2010, apud Nobre & Hodges, 2010, p.184).
Ou seja, quando o bilíngue seleciona qual a palavra correta deve usar,
dentro de determinada língua, ele está desenvolvendo a função executiva. Assim,
atenção, inibição, monitoramento e alternância de tarefas são desenvolvidas por
bilíngues (Bialystok, 2007,2008 apud Nobre&Hodges, 2010). As crianças bilíngues
são capazes de vetar a atenção para informações que não são necessárias, e que
poderiam causar a dispersão dessa criança, (Bialystock, 2001, apud Bandeira,
2008), desta forma, elas têm um poder de concentração maior, que crianças
monolíngues.
Ainda para Bialystock (2011) “em termos de proficiência geral da linguagem,
as crianças bilíngues tendem a ter um vocabulário menor em cada um dos idiomas,
do que crianças monolíngues em seu próprio idioma”. Contudo, estas crianças
bilíngues possuem um conhecimento da estrutura linguística tão boa e até melhor do
que a de crianças monolíngues.
3.2 DESENVOLVIMENTO CEREBRAL
Quando falamos no que uma pessoa que domina uma ou mais línguas
desenvolve, falamos nos aspectos cognitivos. Acontece também, que um indivíduo
bilíngue acaba tendo, além disso, algumas questões de ordem cerebral. Segundo
pesquisas recentes percebeu-se que além de desenvolvimento em relação à
atenção, à concentração, maior conhecimento metalinguístico da língua; o nosso
cérebro também é beneficiado com o bilinguismo. Para entender isso de uma forma
melhor, precisamos conhecer nosso cérebro no que tange a linguagem.
Os estudos referentes à como o cérebro procede em relação à
aprendizagem da linguagem, iniciaram-se a partir do interesse em descobrir a causa
45
das afasias cerebrais37. Infelizmente, existem milhares de pessoas no mundo que
sofrem de afazia. Essas pesquisas começaram a desenvolver-se na década de
1860, quando um médico francês Paul Broca investigou o cérebro de um paciente
que havia perdido a fala e cujo cérebro fora colocado a sua disposição. Broca
verificou que havia uma destruição de tecido numa parte posterior e inferior do lobo
frontal esquerdo. Essa área fica acima e a frente do ouvido esquerdo, e recebeu por
meio de outros autores o nome de área de Broca. Atribuíram a ela a faculdade da
fala articulada (Geschwind, 1976).
Porém com o passar dos tempos, os pesquisadores perceberam que muitas
afasias não tinham sua origem na área de Broca, que era a suposta área que
correspondia à linguagem. Com esses pressupostos, surge um jovem de apenas 26
anos de idade, Carl Wernicke. Após analisar diferentes afasias levou sua análise
ainda mais longe, para tentar entender como o cérebro estava organizado para a
linguagem.
Assinalou que a área de Broca localizava-se exatamente em frente à área
em que se situa a representação de boca, língua e palato, isto é, dos órgãos
da fala. Assim, parecia razoável considerar a área de Broca um depósito
das sequências de movimentos necessários à fala (GESCHWIND, 1976, p.
82).
Poderíamos afirmar que a área de Broca é composta por programas para a
linguagem articulada. Já a região que é responsável pela forma falada, para
Wenicke, está localizada próxima à região cortical em que se situa a representação
da audição. Qualquer que fosse a lesão nesta área, resultaria em dificuldades de
compreensão da fala (Geschwind, 1976).
De acordo com Geschwind (1976), “Wernicke considerava razoável admitir
que a linguagem originava-se nessa região e era transmitida em seguida à área de
Broca, onde era, por assim dizer, recodificada em padrões de movimentos dos
músculos articulatórios”. Temos assim, a área de Broca e área de Wernicke, que são
responsáveis pela linguagem.
37
O termo afasia é usado para descrever os distúrbios de linguagem resultantes de uma lesão no
cérebro. (Geschwind, 1976).
46
Imagem 1 – Áreas cerebrais responsáveis pela linguagem
Fonte: UOL Como tudo Funciona38.
Muitos anos antes de chegarmos aos conhecimentos modernos, a respeito
do funcionamento do cérebro em relação à linguagem, acreditava-se que o lado
esquerdo do cérebro era responsável pela linguagem, e se localiza a área de Broca
e Wernicke. Contudo, ao longo dos anos, realizaram-se pesquisas que analisavam
até mesmo a diferença de pessoas destras para não destras no que se referia às
possíveis diferenças entre, o funcionamento do cérebro das mesmas. (Geschwind,
1976).
De acordo com Geschwind (1976) quando um adulto sofre uma lesão
significativa nas regiões da fala do hemisfério esquerdo, terá graves distúrbios
permanentes na linguagem, porém, se o mesmo acontecer com uma criança,
percebe-se com frequência, uma ótima recuperação da linguagem, mesmo que seja
uma extensa lesão nessas regiões. Segundo o mesmo autor, isso significa que o
hemisfério direito está dotado de potencial para o desenvolvimento da fala.
Entretanto, com raras exceções, parece que só assume funções linguísticas quando
38
Disponível em: http://ciencia.hsw.uol.com.br/chimpanze-aprende-linguagens1.htm
47
o hemisfério esquerdo é danificado durante a infância. Vendo isto nos questionamos
então, por que em um adulto não acontece o mesmo?
Geschwind (1976) nos responde que por muito tempo acreditava-se que o
hemisfério esquerdo era a metade dominante e que o hemisfério direito era
subordinado. Porém, nos últimos estudos chegou-se a um novo conceito. Geschwind
(1976) afirma que na verdade o hemisfério direito não é subordinado e sim
dominante para algumas aptidões. Ou seja,
O hemisfério direito parece estar mais envolvido na percepção, sentido
espacial, música e reatividade emocional, ao passo que o hemisfério
esquerdo está envolvido na linguagem, em padrões complexos de
movimento e, de um modo geral, nas associações de aprendizagem entre
estímulos (GESCHWIND, 1976, p. 87).
Ainda, Geschwind (1976) coloca que, em estudos realizados por Geschwind
e Walter Levistky, sobre as diferenças anatômicas do cérebro, estes concluíram que
a região da fala, localizada na parte superior e posterior do lobo temporal, é
consideravelmente maior que a região correspondente ao lado esquerdo. Isso fora
constatado em cérebros de adultos e de crianças, mostrando que o desenvolvimento
da linguagem no hemisfério esquerdo é geneticamente determinado. Assim,
O lado dominante é aquele que adquire a linguagem mais rapidamente, mas
como o outro lado tem o potencial, não é difícil entender por que, após a
destruição do lado esquerdo, a criança pode recuperar sua capacidade de
aquisição mediante o uso do lado direito do cérebro. Por que, então, o
adulto não a recupera, por meio do seu lado não dominante? Pode ser, é
claro, que essa capacidade esteja permanentemente perdida, uma vez
atingida a idade adulta. (GESCHWIND, 1976, p. 88).
Desta forma, podemos compreender como nosso cérebro se estrutura em
relação à linguagem, visto que, falaremos sobre o cérebro e a segunda língua.
Inicialmente Indefrey (2007) em sua entrevista, ao ser questionado se as línguas são
processadas de forma diferente pelo cérebro das formas de Broca e Wernicke, ele
responde que “se falarmos em termos de regiões cerebrais, a resposta é não”. Para
ele não existe uma região no cérebro que seja só usada para uma língua
estrangeira. Quando Indefrey (2007) analisou o cérebro de crianças bilíngues
percebeu que se veem ativadas as duas regiões relacionadas à língua (Broca e
Wernicke). Afirma, contudo que “existem evidências que nessas áreas possam
48
ocorrer pequenas diferenças na localização exata das populações de células
nervosas que processem as línguas maternas e outras”. Segundo Indefrey (2007),
devem existir diferenças no cérebro como o modo que este processa as línguas.
De acordo com o artigo Por que o estudo de uma Segunda Língua é bom
para o cérebro?39 do blog Todos Somos Um, uma pesquisa realizada na
Universidade de College London, estudou o cérebro de 105 pessoas, das quais 80
eram bilíngues. O que esta pesquisa mostrou foi que estudar uma segunda língua
altera a massa cinzenta – área do cérebro que processa as informações – da
mesma forma que exercícios formam músculos. O efeito de mudar sua estrutura é o
que se chama de plasticidade do cérebro, que ocorre mediante estimulação. Os
resultados mostraram que a densidade da massa cinzenta no córtex parietal inferior
esquerdo do cérebro é maior em bilíngues.
Outra pesquisa realizada pelos cientistas de Northwestern University e
divulgada pela BBC Brasil, revela que o tronco cerebral40 dos que são bilíngues foi
intensificado,
isso significa que
o indivíduo
melhora suas condições de
concentração. Esta pesquisa também revelou que o indivíduo bilíngue desenvolve
um poderoso sistema auditivo, que se torna mais flexível e focado no seu
processamento automático do som.
A reportagem ainda lembra que pesquisas anteriores sugerem que ser
bilíngue auxilia na prevenção de demência. Em relação a isso falamos novamente
nas pesquisas de Ellen Bialystok que além de pesquisar se haviam vantagens
cognitivas, dedicou-se inclusive a estudar o lado cerebral do bilíngue. Em uma
entrevista que Bialystok concedeu a Claudia Dreifus do The New Yourk Times41,
publicada em maio de 2011, a pesquisadora explicou que o primeiro estudo, de
2004, ela e seus colaboradores descobriram que, idosos bilíngues tiveram melhor
funcionamento cognitivo que idosos monolíngues. E ainda, os idosos bilíngues
realizavam tarefas de controle executivo com melhor desempenho. Bialystok, disse
ainda, que o normal é que se vá perdendo essas funções na mesma proporção entre
os idosos.
39
Disponível em: http://somostodosum.ig.com.br/clube/artigosP.asp?id=31543
Tronco Cerebral é aqui entendido como uma estrutura neurológica que se localiza entre a medula
espinhal e o diencéfalo e é responsável em parte, pela atenção. Fonte: http://www.psiqweb.med.br/
site/DefaultLimpo.aspx?area=ES/VerDicionario&idZDicionario=597
41
Disponível em: http://translate.google.com.br/translate?hl=pt-BR&sl=en&tl=pt&u=http% 3A%2F%2F
www.nytimes.com%2F2011%2F05%2F31%2Fscience%2F31conversation.html&anno=2&sandbox=1
ou no original: http://www.nytimes.com/2011/05/31/science/31conversation.html?_r=0
40
49
Em outro estudo que realizou, Bialystok analisou os registros médicos de
400 pacientes de Alzheimer. O que ela descobriu foi que em média os bilíngues
desenvolveram Alzheimer cinco ou seis anos mais tarde, do que aqueles que não
falavam duas línguas. A pesquisadora salientou, que o que vem auxiliando nessas
pesquisas é a tecnologia da neuroimagem, onde se consegue estudar mais e melhor
o cérebro humano e acrescenta:
Uma das coisas que temos visto é que, em certos tipos de testes ainda nãoverbais, as pessoas bilíngues são mais rápidas. Por quê? Bem, quando
olhamos em seus cérebros através de neuroimagem, parece que eles estão
usando um tipo diferente de uma rede que pode incluir centros de línguas
para resolver um problema completamente não-verbal. Todo o seu cérebro
parece religar por causa de bilinguismo. (BIALYSTOK, 2011)
Já em outa entrevista dada, desta vez ao The Guardian, por Killian Fox em
junho de 201142, ela relata melhor seu estudo com pacientes que desenvolveram
Alzheimer, onde neste estudo, ao analisar o cérebro de idosos com cerca de 75
anos e com exatamente o mesmo nível cognitivo, Bialystok percebeu que o córtex
medial temporal dos bilíngues havia muito mais danos que nos pacientes
monolíngues. Isso significa que, os idosos bilíngues poderiam estar com a doença
mais adiantada se fossem monolíngues, assim o fato de falarem duas línguas
retardou a doença.
Contudo, Bialystok salienta que esses resultados são encontrados em
pessoas que usam ambas as línguas o tempo todo. Ela enfatiza ainda que uma nova
língua deve ser aprendida em qualquer idade e que não devemos buscar uma língua
somente por que teremos melhor desenvolvimento cognitivo e evitaremos o
aparecimento de demências, mas também, para conhecermos novas culturas, outras
pessoas, outras formas de pensar.
42
Disponível em: http://translate.google.com.br/translate?hl=pt-BR&sl=en&u=http://www.theguardian.
com/technology/2011/jun/12/ellen-bialystok-bilingual-brains-more-healthy&prev=/search%3Fq%3D
BIALYSTOK,%2BEllen.%26biw%3D1366%26bih%3D675 ou no original: http://www.theguardian.
com/technology/2011/jun/12/ellen-bialystok-bilingual-brains-more-healthy
50
CONCLUSÃO
Este trabalho foi pensado a partir da perspectiva sobre a importância da
linguagem na vida humana. A partir disso, remetemos nossa pesquisa à segunda
língua, e apresentamos as principais teorias de aquisição expondo as de forma que
encontrássemos qual delas explicaria, de melhor forma, como se dá o
desenvolvimento de uma segunda língua. Falamos inclusive, sobre o bilinguismo,
seus conceitos e demais questões que derivassem do mesmo e por fim buscamos
estudos que falassem a respeito dos supostos benefícios cognitivos em se aprender
uma segunda língua, bem como, como nosso cérebro trabalha em relação à
linguagem e o que acontece quando este é exposto a uma segunda língua.
Podemos afirmar que alcançamos nossos objetivos, uma vez que no que se
refere às teorias de aquisição e aprendizagem, percebemos que a teoria que melhor
expõe e explica o processo de aquisição e aprendizagem é a Teoria de Krashen e
suas cinco hipóteses. Conseguimos inclusive, apesar de se tratar de um tema novo
e
em
expansão,
conceituar
o
termo
bilinguismo
através
dos
principais
pesquisadores/autores que estudaram e estudam o bilinguismo, onde encontramos
vários conceitos, e acreditamos, por fim, que um indivíduo bilíngue é aquele capaz
de se comunicar em mais de uma língua, e que este desenvolverá a habilidade que
lhe for mais necessária (ler, escrever, entender ou conseguir expressar-se nesta
língua). Além disso, encontramos a origem do bilinguismo e falamos brevemente
sobre a educação bilíngue.
Por fim, encontramos pesquisas que confirmam a hipótese dos benefícios
cognitivos provenientes do bilinguismo bem como os benefícios cerebrais
desenvolvidos, e no geral podemos dizer que ser bilíngue garante ao indivíduo mais
poder de reter atenção ao que é necessário, conseguindo ignorar aspectos
51
irrelevantes, tem mais facilidade com o uso gramatical da língua, por se concentrar
na forma da língua. A respeito dos benefícios cerebrais, o fato de ser bilíngue ajuda
a manter o cérebro saudável evitando demências como o Alzheimer. Além disso,
consideramos que o fato de que uma segunda língua garante o conhecimento de
novas culturas, novas histórias, e a entender outras pessoas e seu modo de viver.
Percebemos, contudo, que o estudo sobre segunda língua e principalmente
sobre o bilinguismo, tem um longo caminho a percorrer, tanto que encontramos
dificuldades em realizar este estudo por ser algo muito recente, principalmente em
nosso país. Neste aspecto, vimos que o nosso país é um país composto de várias
comunidades bilíngues e que o termo monolíngue dirigido ao nosso país é um tanto
quanto equivocado. Temos aqui, inclusive, muito campo de pesquisa, temos
comunidades de descendentes de alemães, italianos, russos... e os indígenas.
Assim, faz-se necessário que trabalhos como o nosso tenham continuidade, mas
que estes sejam voltados também à pesquisa de campo, a coleta de dados, pois ao
final deste trabalho percebemos que não precisamos ir tão longe assim para
encontramos um número considerável de bilíngues.
52
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TCC Final Celina Eliane Frizzo