UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE - UNESC
CURSO DE DIREITO
JOSIANE APARECIDA DA SILVA
OS EFEITOS DO ENCARCERAMENTO NO COMPORTAMENTO
SOCIAL DO CONDENADO: UM ESTUDO SOBRE A PRISONIZAÇÃO
À LUZ DA TEORIA DO LABELLING APPROACH
CRICIÚMA, JUNHO DE 2009
JOSIANE APARECIDA DA SILVA
OS EFEITOS DO ENCARCERAMENTO NO COMPORTAMENTO
SOCIAL DO CONDENADO: UM ESTUDO SOBRE A PRISONIZAÇÃO
À LUZ DA TEORIA DO LABELLING APPROACH
Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado
para obtenção do grau de Bacharel no Curso
de Direito da Universidade do Extremo Sul
Catarinense, UNESC.
Orientador: Prof. Dr. André Viana Custódio
CRICIÚMA, JUNHO DE 2009
2
JOSIANE APARECIDA DA SILVA
OS EFEITOS DO ENCARCERAMENTO NO COMPORTAMENTO SOCIAL DO
CONDENADO: UM ESTUDO SOBRE A PRISONIZAÇÃO À LUZ DA TEORIA DO
LABELLING APPROACH
Trabalho de Conclusão de Curso aprovado pela
Banca Examinadora para obtenção do Grau de
Bacharel, no Curso de Direito da Universidade
do Extremo Sul Catarinense, UNESC.
Criciúma, 22 de junho de 2009.
BANCA EXAMINADORA
Prof. André Viana Custódio - Doutor - UNESC - Orientador
Prof. Sergio Francisco Carlos Graziano Sobrinho - Doutor - UNESC
Prof. Ismael Francisco de Souza - Mestre - UNESC
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Dedico este trabalho ao meu esposo, aos
meus pais e especialmente ao meu filho,
que deixou de vir ao mundo para que eu
pudesse concluir este curso.
4
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, gostaria de agradecer a Deus, por toda saúde, força e
coragem que tem me dado e, sobretudo, por me proporcionar a realização do sonho
de uma formação superior.
Agradeço ao meu esposo, Everaldo Lucas Castanhetti, pela compreensão
e pela força que me deu em todos os momentos em que deixei de lhe dar a devida
atenção para me dedicar aos estudos.
Agradeço também a minha mãe, Terezinha Montini da Silva, por me
ensinar a ser uma mulher de fibra e nunca desistir dos meus sonhos, bem como ao
meu pai, Jandir Soares da Silva, por todos os momentos em que esteve ausente, me
proporcionando, com o fruto do seu trabalho, uma vida mais digna e honesta.
Agradeço a minha sogra, Diva Lucas Castanhetti, e ao meu sogro José
Castanhetti, por todo o carinho, cuidado e dedicação.
Agradeço às professoras, Liége Inocêncio Búrigo, Rosane Deoclésia Dal
Toé e Christine Vieira Scarpato, pela oportunidade de trabalho que me possibilitou o
ingresso no Curso de Direito, bem como pela amizade e carinho.
Agradeço aos meus amigos e amigas pelo companheirismo e confiança.
Agradeço, ainda, ao Dr. Idelfonso Leal de Souza e ao Dr. Walterney
Angelo Reus, advogados que me proporcionaram a aplicação prática de tudo o que
aprendi na faculdade, sempre de forma paciente e amigável.
Agradeço aos Mestres por todo conhecimento repassado, capaz de me
transformar numa cidadã mais digna e numa profissional mais ética e eficiente.
Por fim, agradeço ao meu orientador, Professor Doutor André Viana
Custódio, pelo comprometimento e auxílio intelectual, que foram de fundamental
importância para construção deste trabalho.
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“Os ninguéns!
As pulgas sonham com comprar um cão, e os ninguéns com
deixar a pobreza, que em algum dia mágico a sorte chova de
repente, que chova a boa sorte a cântaros; mas a boa sorte
não chove ontem, nem hoje, nem amanhã, nem nunca, nem
uma chuvinha cai do céu da boa sorte, por mais que os
ninguéns a chamem e mesmo que a mão esquerda coce, ou se
levantem com o pé direito, ou comecem o ano mudando de
vassoura.
Os ninguéns: os filhos de ninguém, os donos de nada.
Os ninguéns: os nenhuns, correndo soltos, morrendo a vida,
fodidos e mal pagos: Que não são embora sejam.
Que não falam idiomas, falam dialetos.
Que não praticam religiões, praticam superstições.
Que não fazem arte, fazem artesanato.
Que não são seres humanos, são recursos humanos.
Que não têm cultura, têm folclore.
Que não têm cara, têm braços.
Que não têm nome, têm número.
Que não aparecem na história universal, aparecem nas
páginas policiais da imprensa local.
Os ninguéns, que custam menos do que a bala que os mata”.
(Eduardo Galeano – O livro dos abraços)
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RESUMO
O presente trabalho visa estudar os efeitos do fenômeno da prisonização no
comportamento social do condenado à pena privativa de liberdade, sendo que tais
efeitos influenciam de forma direta na estrutura psicossocial do recluso,
impossibilitando a tão sonhada ressocialização e a conseqüente reintegração à
sociedade , pois que endurecido pelo ambiente prisional e modificado em sua
própria identidade. Assim, a sociedade cria o delinqüente através de um processo de
criminalização, estigmatizando-o socialmente, e novamente o excluindo depois do
cárcere, quando então, passa a carregar o estereótipo de delinqüente, além dos
estigmas que já possuía anteriormente ao cárcere. Portanto, os efeitos da
prisonização que representam grande problemática ao cárcere, representam
também sério problema para a própria sociedade. Contudo, para desenvolvimento
deste trabalho utilizou-se o método científico dedutivo, partindo de uma análise geral
da pena de prisão a través dos tempos, passando pelo enfoque criminológico do
etiquetamento e finalizando nos aspectos e efeitos da prisonização sobre a vida do
recluso.
Palavras-chave: Exclusão. Estigma. Prisonização. Estereótipo. Ressocialização.
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .........................................................................................................8
2 BREVE HISTÓRICO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE .............................10
2.1 A Antiguidade e a prisão-custódia...................................................................10
2.2 Idade Média: primeiras manifestações da prisão como pena .......................12
2.3 Idade Moderna: a transformação definitiva da prisão-custódia em prisãopena..........................................................................................................................13
2.4 Período Humanitário: movimento codificador................................................15
2.5 Período Criminológico ......................................................................................18
2.5.1 Fase Antropológica – Cesare Lombroso......................................................19
2.5.2 Fase Sociológica – Enrico Ferri ....................................................................21
2.5.3 Fase Jurídica – Rafaelle Garófalo .................................................................22
2.6 A Criminologia Crítica.......................................................................................23
3 O LABELLING APPROACH E A CLIENTELA DO SISTEMA PRISIONAL .........25
3.1 Seleção de pessoas: regras para quem? ........................................................26
3.2 Seleção de fatos e suas conseqüências .........................................................31
4 O FENÔMENO DA PRISONIZAÇÃO ....................................................................36
4.1 Aspectos da prisonização ................................................................................38
4.2 Os efeitos da prisonização e a utopia da ressocialização do condenado ...44
5 CONCLUSÃO ........................................................................................................49
REFERÊNCIAS.........................................................................................................52
8
1 INTRODUÇÃO
Denota-se
de
um
modo
geral
que
a
sociedade
compreende
fantasiosamente o sistema prisional como um meio de recuperar e ressocializar o
condenado, mas como revela os estudos criminológicos, o crime é produto de um
fenômeno sócio-político e o sistema prisional acaba por funcionar como um processo
de marginalização social, na medida em que atinge uma determinada parcela dessa
mesma sociedade.
Todavia, desde os primórdios da história do homem civilizadamente
organizado, o sistema penal sempre exerceu e ainda exerce de forma implícita a
função de retribuir o mal causado pelo delinqüente, deixando de lado o falacioso
objetivo de regenerar ou ressocializar o condenado à pena de prisão, pois suas
metas de punir, prevenir e regenerar são conflitantes entre si e acabam não
cumprindo a função a que se propõem.
Sendo assim, é notório que a justiça criminal é seletiva e sua clientela é
formada pelas camadas mais pobres e culturalmente mais desfavorecidas, ou seja,
àquelas que antes mesmo de ingressarem no sistema prisional já são vitimizadas
socialmente.
Portanto, através do fenômeno da prisonização, que consiste na
transformação ou modelagem do recluso pelo ambiente institucional, o recluso sofre
uma significativa alteração em sua própria identidade.
Por isso, as pessoas estigmatizados pela lei penal acabam por não
alcançar a inserção social quando deixam à prisão, pois na verdade, nunca foram
socializados, e muitas vezes voltam a reincidir na criminalidade, pois afetados pelos
efeitos da prisonização, comumente não conseguem se adaptar às normas de
convivência do mundo livre.
Dentro deste contexto, o objetivo desta pesquisa é estudar os efeitos do
encarceramento no comportamento social do condenado a pena privativa de
liberdade, dando ênfase ao fenômeno da prisonização e relacionando-o com a teoria
do Labelling Approach.
Para cumprir com o objetivo proposto, o presente trabalho se dividirá em
três capítulos, sendo que no primeiro capítulo se fará um breve histórico da pena
privativa de liberdade, enfatizado sua finalidade em cada época específica,
9
iniciando-se na Antiguidade, passando-se pela Idade Média, Idade Moderna, período
humanitário da pena, período criminológico e finalizando com uma breve abordagem
na criminologia crítica.
O segundo capítulo versará sobre a teoria do Labelling Approach,
revelando como o etiquetamento auxilia no ingresso dos membros das classes
economicamente desfavorecidas no sistema prisional.
Já o terceiro capítulo, demonstrará quais os principais aspectos da
prisonização e quais os seus efeitos no comportamento psicossocial do recluso.
Assim, o presente estudo é muito importante, vez que complementará
várias outras pesquisas já realizadas neste mesmo sentido, pois visa demonstrar
que o sistema prisional além de selecionar seus clientes, reproduz ainda mais a
criminalidade, fabricando indivíduos sem autonomia e sem identidade, que jamais se
adaptarão à sociedade.
Para tanto, o método científico a ser utilizado será o dedutivo, partindo do
geral para o específico, sendo que a pesquisa será do tipo qualitativa e fará uma
análise teórica do tema prisonização. Enquanto que a técnica a ser utilizada será a
pesquisa bibliográfica em livros, artigos e documentos eletrônicos.
10
2 BREVE HISTÓRICO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE
O ser humano foi e sempre será objeto de estudo do próprio homem ao
longo dos séculos, sendo certo que as suas atitudes e costumes através dos tempos
delinearam em cada época histórica específica o homem social e o homem
delinqüente.
Neste sentido, Naspolini (1997, p. 57) afirma que “cada forma de punição
e de controle social encontram-se inseridos em determinada forma de Estado e de
sistema de produção, os quais condicionam suas especificidades”.
Portanto, para uma melhor percepção da pena privativa de liberdade
contemporânea, necessária se faz uma análise da sua evolução através dos tempos.
2.1 A Antiguidade e a prisão-custódia
A Antiguidade vivenciou o período da vingança, o qual teve início nos
primórdios da humanidade e se prolongou até o século XVIII.
Assim, o período da vingança é dividido em vingança privada, vingança
divina e vingança pública, sendo que essas fases não se sucedem de imediato, não
há um marco de rompimento exato entre elas, na verdade elas convivem umas com
as outras, até que a fase ascendente passe a prevalecer sobre a anterior.
(NORONHA, 2004, p. 20)
Como o próprio nome sugere, a vingança privada era a vingança
praticada pela própria vítima do crime, por sua família ou até mesmo pelo grupo
social onde estava inserida (tribo), na maioria das vezes a pena imposta
ultrapassava a figura do criminoso recaindo em seus familiares ou em sua tribo.
Nesta época, os povos primitivos revidavam o mal de maneira
desproporcional, não havia limites. Era um período marcado por grandes conflitos
entre famílias e tribos, levando até mesmo a extinção de uma tribo pela outra, era
um verdadeiro genocídio. (NORONHA, 2004, p. 20-21)
Foi então que surgiu a necessidade de se estipular regras para evitar-se o
aniquilamento entre os povos primitivos, passaram a adotar a lei do talião que se
11
tratava de um instrumento moderador da ação defensiva, que mais tarde evoluiu
para a composição que era a possibilidade de satisfazer a ofensa através de
indenização (moeda, gado, vestes, armas).
Assim, a vingança privada não poderia nem de longe ser considerada
uma instituição jurídica, vez que apenas representava uma reação instintiva de uma
realidade sociológica.
Segundo Noronha (2004, p. 21), na fase subseqüente, denominada
vingança divina “já existe um poder social capaz de impor aos homens normas de
conduta e castigo”, todavia, neste período a religião se confunde com o Estado no
exercício do poder, sendo o crime um pecado cometido diretamente ao poder divino.
Surge, então, a figura do juiz, ofício praticado pelos sacerdotes, os quais
aplicavam penas cruéis, severas e desumanas, de modo a exercitar a justiça
retributiva e a contenção da ira divina.
Nesta etapa histórica, a religião tem influência decisiva na vida dos povos
antigos, entretanto, a justiça divina trouxe as primeiras idéias sobre a privação de
liberdade como pena, vez que os criminosos eram encarcerados para meditarem e
se arrependerem da infração cometida.
A vingança pública, por sua vez, ocorreu num momento histórico em que
já havia uma maior organização social, inclusive no campo político. A pena, então,
deixou de ter caráter religioso e passou a ter um objetivo diferente, a proteção do
monarca. (NORONHA, 2004, p. 22)
Entretanto, apesar das penas continuarem cruéis, houve uma evolução no
que se refere a sua aplicação, vez que deixou de ser aplicada por terceiros e passou
a ser aplicada pelo Estado na figura de seu governante.
Portanto, o caráter religioso da pena fora se dissipando para dar lugar ao
caráter intimidador, visando-se a prevenção do crime.
Deste modo, analisando-se todo o contexto histórico da Antiguidade,
verifica-se que a mesma conheceu a prisão somente como local de encarceramento
do delinqüente enquanto este aguardava sua execução, sem, contudo, visualizar
este encarceramento como medida punitiva.
Bitencourt (2001, p. 4), menciona que:
Até fins do século XVIII a prisão serviu somente aos objetivos de contenção
e guarda dos réus, para preservá-los fisicamente até o momento de serem
julgados ou executados. Recorria-se, durante esse longo período histórico,
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fundamentalmente, à pena de morte, às penas corporais (mutilações e
açoites) e às infamantes.
As civilizações antigas se utilizavam das prisões como salas de torturas,
bem como, ali eram colocados os criminosos condenados à prisão perpétua para
definharem até a morte. (WU, 2006, p. 90)
Contudo, estas civilizações jamais deram a prisão o caráter de pena, vez
que “o catálogo das sansões praticamente se esgotavam com a morte, penas
corporais e infamantes”. Neste diapasão, “a finalidade da prisão, portanto, restringiase à custódia dos réus até a execução das condenações referidas. A prisão dos
devedores tinha a mesma finalidade: garantir que cumprissem as suas obrigações”.
(BITENCOURT, 2001, p. 8)
2.2 Idade Média: primeiras manifestações da prisão como pena
A idade média tem início no ano de 476 d.C, e é marcada por penas ainda
mais brutais “que consistiam em espetáculos públicos de açoitamentos, torturas,
mutilações, enforcamentos, queimas nas fogueiras etc, eram acontecimentos
presentes do dia-a-dia da população”. (NASPOLINI, 1997, p. 58)
Durante a Idade Média também não existia a idéia de pena de prisão
como forma punitiva, ela continuava tendo caráter custodial que visava garantir a
execução das penas acima referidas. (BITENCOURT, 2001, p. 9)
As sanções criminais na Idade Média estavam submetidas ao arbítrio dos
governantes, que as impunham em função do status social a que pertencia
o réu. Referidas sanções podiam ser substituídas por prestações em metal
ou espécie, restando a pena de prisão, excepcionalmente, para aqueles
casos em que os crimes não tinham suficiente gravidade para sofrer
condenação morte ou a pena de mutilação. (BITENCOURT, 2001, p. 9)
Sendo assim, é neste período que surge a prisão-estado, onde eram
encarcerados os inimigos do monarca acusados do delito de traição, bem como seus
adversários políticos. Surge também a prisão eclesiástica reservada aos clérigos
rebeldes que atendiam aos ideais de caridade, redenção e fraternidade da Igreja,
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tendo como objetivo a penitência e a meditação, visando o arrependimento pelo mal
causado. (BITENCOURT, 2001, p. 10)
A igreja via no delito a expressão do pecado e para dirimir a culpa o infrator
deveria sujeitar-se à penitência que poderia aproximá-lo de Deus: quoties
inter homines fui, minor homo redii. Daí então cumprir-se o internamento em
prisão de conventos: detrusio in monasterium. (DOTTI, 1998, p. 33)
Começa, então, a surgir os primeiros sinais históricos da transformação
da prisão-custódia em prisão-pena. Neste sentido, esclarece Correia Junior (2002, p.
34), que a prisão eclesiástica trouxe as primeiras concepções da prisão como pena
privativa de liberdade.
Entretanto, a prisão somente ganhou roupagem de pena na Idade
Moderna, haja vista que neste momento histórico, “estava em curso um grande
processo de revisão em torno da essência e dos fins perseguidos pela pena”.
(DOTTI, 1998, p. 36)
Contudo, Bitencourt (2001, p. 12) conclui que apesar da Idade Média ser
marcada por um sistema punitivo ineficaz e desumano, deixou uma seqüela positiva
que fora a influência do direito canônico, com seu isolamento celular para levar ao
arrependimento e correção do delinqüente, porquanto buscava a reabilitação do
recluso, que sem sombra de dúvidas caracteriza antecedente da prisão moderna.
2.3 Idade Moderna: a transformação definitiva da prisão-custódia em prisãopena
A Idade Moderna surge a partir do século XVI, com a queda de
Constantinopla e o desaparecimento do Feudalismo. Sendo que, com o nascimento
do Capitalismo, este período histórico fora marcado pela pobreza generalizada que
se abateu por toda a Europa.
Bitencourt (2001, p. 15-16) esclarece que as “vítimas da escassez
subsistiam das esmolas, do roubo e assassinatos”. Neste sentido, a pena capital já
não era mais instrumento hábil a coibir tanta miséria e caos, pois que “eram muitos
para serem todos enforcados, e a sua miséria, como todos sabiam, era maior que a
sua má vontade”.
14
Assim, a crise da pena capital foi dissipada com o surgimento da pena
privativa de liberdade, haja vista que aquela já não se demonstrava mais capaz de
conter a criminalidade devido ao excessivo número de réus. (CORREIA JUNIOR,
2002, p. 35).
Bitencourt (2001, p. 16) assevera que “na segunda metade do século XVI
iniciou-se um movimento de grande transcendência no desenvolvimento das penas
privativas de liberdade, na criação e construção de prisões organizadas para a
correção dos apenados”.
Na verdade, a pena de prisão não nasceu para substituir a pena capital,
mas da necessidade do novo regime econômico que se estabelecia, e ainda como
instrumento de manipulação da classe dominante, o que bastava para se concluir
que o fim da pena de prisão não haveria de ser a ressocialização do condenado,
mas, a apropriação de sua força de trabalho (CORREIA JUNIOR, 2002, p. 35).
Foucault (2002, p. 203-204) já afirmava que o trabalho nas prisões
deveria ser visto como uma máquina cujo papel seria transformar o detento
simultaneamente em engrenagem (apropriação de sua força de trabalho) e produto
(disciplina e submissão).
E, continuando esclarece: “A utilidade do trabalho penal? Não é o lucro;
nem mesmo a formação de uma habilidade útil; mas a constituição de uma relação
de poder, de uma economia vazia, de um esquema da submissão individual e de
seu ajustamento a um aparelho de produção”. (FOUCAULT, 2002, p. 204)
Neste contexto, Bitencourt (2001, p. 24) ressalta:
Não interessa a reabilitação ou emenda; o que importa é que o delinqüente
se submeta, que o sistema seja eficaz por meio de uma obediência
irreflexiva. Por outro lado, a dureza particular das condições no interior da
casa de correção tem, ademais, outro efeito sobre o exterior, o que os
juristas chamam de prevenção geral, ou seja, uma função de intimidação,
através da qual o trabalhador livre, antes de arriscar terminar na casa de
trabalho ou prisão, prefere aceitar as condições impostas ao trabalho.
Contudo, não se deve imaginar que a substituição dos suplícios pela pena
de prisão traria ao condenado maior conforto ou qualidade de vida, vez que aquela
sociedade era muito ligada aos castigos corporais, porquanto é inevitável afirmar
que o aprisionamento também era acompanhado de maus tratos físicos e
psicológicos. (TASSE, 2004, p. 105)
15
2.4 Período Humanitário: movimento codificador
Oliveira (2003, p. 42) esclarece que na segunda metade do século XVIII o
suplício das penas tornou-se insuportavelmente repudiado, surgindo por toda parte
um movimento de protesto formado por juristas, legisladores, magistrados, filósofos
etc.
Dentre os vários reformadores que difundiram seus ideais estavam
“Servan, Voltaire, Marat, Duport, Targe”, no entanto, o grandioso expoente da época
fora Cesare Bonesana, conhecido como Marquês de Beccaria “cujos princípios
renovaram e abrandaram o sistema penal, despertando a consciência pública contra
as vergonhosas atrocidades do suplício”. (OLIVEIRA, 2003, p. 42)
Neste sentido, afirma Prado (2008, p. 78), que Beccaria em seu livro “Dos
Delitos e das Penas”, fora o autor que mais difundiu a idéia de estrita legalidade dos
crimes e das penas, o que sintetizou da seguinte forma:
a) a afirmação do princípio fundamental da legalidade dos delitos e das
penas: só as leis podem fixar as penas em relação aos delitos e essa
autoridade não pode residir senão no legislativo; b) a afirmação de que a
finalidade da pena é a prevenção geral e a utilidade: a pena deve ser
necessária, aplicada com presteza, determinada, suave e proporcional ao
delito; c) a abolição da tortura e da pena de morte; d) a infalibilidade na
execução das penas; e) a clareza das leis; f) a separação das funções
estatais; e g) a igualdade de todos perante a lei penal.
Assim, Beccaria (2006, p. 119) conclui que “[...] para que toda pena não
seja a violência de um ou de muitos contra o cidadão particular, devendo, porém, ser
essencialmente publica, rápida, necessária, a mínima dentre as possíveis, em dadas
circunstâncias, proporcional aos delitos e ditada pelas leis”.
Bitencourt (2001, p. 36) revela que Beccaria tinha uma concepção utilitária
da pena, vez que considerava que a pena era sensível motivo que influenciaria na
conduta humana, vendo na pena imposta um exemplo para o futuro, sem, contudo,
interpretá-la como uma vingança pelo passado. Sendo assim, o objetivo da
prevenção geral não seria obtido através do terror, mas pela certeza da punição.
Em verdade, os reformadores não tinham o objetivo de somente abrandar
as penas, eliminando os suplícios, mas atacavam a corrupção que dominava a
justiça que “se apresentava lacunosa, irregular e contraditória, em que instâncias
múltiplas a denegriam e a centralizavam no superpoder monárquico”. (OLIVEIRA,
16
2003, p. 43)
Continuando, ressalta Oliveira (2003, p. 45), que tal reforma visava uma
melhor distribuição da justiça penal que se concentrava na mão do monarca, de
modo que fosse exercida de forma justa e universal, haja vista que o novo direito
penal deveria deslocar-se da vingança suprema do soberano e ter como objeto a
defesa social, deveria “abandonar seu caráter retributivo e caracterizar-se pela
intimidação, atenuação da punição, codificação nítida dos crimes e sanções e formar
um senso a respeito da necessidade e da preservação do delito [...]”.
Todavia, a transformação da pena foi gradativa:
[...] em princípio do século XIX, o grande espetáculo da punição física: o
corpo suplicado é escamoteado; exclui-se do castigo a encenação da dor.
Penetramos na época da sobriedade punitiva. Podemos considerar o
desaparecimento dos suplícios como um objeto mais ou menos alcançado,
no período compreendido entre 1830 e 1848. Claro, tal afirmação em termos
globais deve ser bem entendida. Primeiro, as transformações não se fazem
em conjunto nem de acordo com um único processo. Houve atrasos.
Paradoxalmente, a Inglaterra foi um dos países mais reacionários ao
cancelamento dos suplícios: talvez por causa da função de modelo que a
instituição do júri, o processo público e o respeito ao habeas-corpus haviam
dado à sua justiça criminal; principalmente, sem dúvida, porque ela não quis
diminuir o rigor de suas leis penais no decorrer dos grandes distúrbios
sociais do período 1780-1820. (FOUCAULT, 2002, p. 16-17)
Além disso, foi com Cesare Beccaria, em 1764, que ocorreu o início da
humanização da pena, e com Jonh Howard autor do livro “State of Prisions in
Ingland and Wales”, em 1777, se iniciou um movimento pela humanização das
regras disciplinares da detenção penal e do regime prisional vigente à época.
(OLIVEIRA, 2003, p. 51)
Bitencourt (2001, p. 40) assevera que Howard não aceitava as condições
deploráveis das prisões inglesas, pois que no seu entendimento não cabia as
prisões produzir e formar massas de proletários, mas sim servir como instrumento
intimidador e de
controle político. Em verdade, “com
Howard
nasce o
penitenciarismo. Sua obra marca o início da luta interminável para alcançar a
humanização das prisões e a reforma do delinqüente”.
Vale ainda destacar o nome de Jeremy Bentham, criador do sistema
panótipo, que deu continuidade aos ideais de John Howard após a morte do mesmo.
Bentham via na pena a finalidade de prevenir delitos semelhantes, dizia
que a pena era um “sacrifício indispensável para salvação comum” e que a mesma
deveria “ser cruel somente na aparência”. Todavia, também não admitia pena
17
infamante, haja vista não possibilitar a reabilitação do condenado. (BITENCOURT,
2001, p. 46)
Bentham aplicou o princípio do bem-estar no comportamento criminoso.
Esse é um dos aspectos fundamentais que explicavam sua teoria sobre as
penas. Considerava que a natureza colocou o homem sob o império do
prazer e da dor. Os fatos humanos estão orientados pelo princípio da
utilidade. Considerava que o delinqüente é sujeito que governa livremente
seu comportamento, avaliando o conjunto de prazeres e dores que um fato
concreto pode proporcionar-lhe. (BITENCOURT, 2001, p. 46)
Foucault (2002, p. 208-209) assevera que a prisão é um local de
observação dos reclusos em dois sentidos, o da vigilância propriamente dita e o do
conhecimento individual do detento, bem como de seu comportamento e de sua
progressão de melhora. Para ele a prisão deve ser “um local de formação para um
saber clinico sobre os condenados”.
E, é neste contexto que se insere o sistema panótipo de Bentham, que
segundo narração de Foucault (2002, p. 165-166) constitui-se:
[...] na periferia uma construção em anel; no centro, uma torre; esta é
vazada de largas janelas que se abrem a face interna do anel; a construção
periférica é dividida em celas, cada uma atravessando toda a espessura da
construção; elas têm duas janelas, uma para o interior, correspondendo às
janelas da torre; outra dá para o exterior, permite que a luz atravesse a cela
de lado a lado. Basta então colocar um vigia na torre central, e em cada cela
trancar um louco, um doente, um condenado, um operário ou um escolar.
[...].
Assim, afirma Oliveira (2003, p. 52) que o panótipo não era somente uma
estrutura física, mas tinha por objetivo guardar os reclusos com maior segurança e
economia, visando uma reforma moral, educacional e de boa conduta.
Por fim, Bentham tinha a prisão como instrumento que privava a liberdade
do homem que dela abusava. Entretanto, visava à prevenção de novos delitos, além
de desviar do mesmo os demais homens pelo terror e pelo exemplo. Assim, “a casa
de correção devia propor a reforma dos costumes das pessoas reclusas, a fim de
que seus regressos à liberdade não constituíssem uma desgraça à sociedade nem
aos encarcerados”. (OLIVEIRA, 2003, p. 54)
Neste diapasão, pode-se concluir que o movimento reformador contribuiu,
e muito, para o desenvolvimento e mudança da legislação, sendo que a codificação,
sintetizou princípios esparsos que facilitaram a pesquisa, a interpretação e aplicação
da norma. (PRADO, 2008, p. 78)
18
Deste modo, as idéias fundamentais expostas principalmente por
Beccaria e reproduzidas por diversos autores da época, na primeira metade do
século XIX, foram reunidas sob a denominação de Escola Clássica que indica e
reúne os doutrinadores desta etapa histórica. (MIRABETE, 2004, p. 39)
Prado (2008, p. 79) aduz que a Escola Clássica “tem origem na filosofia
grega antiga que sustentava ser o direito afirmação da justiça, no contratualismo e,
sobretudo no jusnaturalismo”.
Mirabete (2004, p. 40) esclarece que a Escola Clássica utilizava-se do
método dedutivo ou lógico-abstrato. Em relação à pena, objetivava a tutela jurídica
aos bens protegidos penalmente. Já em relação à sanção norteava-se pela não
arbitrariedade, pois era regulada pela intensidade do dano sofrido, que embora seu
caráter retributivo, sua finalidade ainda deveria ser a defesa social.
Mezzaroba (2004, p. 65-66) adverte que o método dedutivo é aquele que
parte de argumentos gerais para específicos. Acrescenta, ainda, que “o raciocínio
dedutivo fundamenta-se em um silogismo, uma operação típica da lógica em que, a
partir de uma premissa maior e mais genérica e uma menor e mais específica, podese chegar a um resultado necessário que é a conclusão”.
Outra característica da Escola Clássica é que a mesma era “[...] partidária
do livre arbítrio, base e essência da responsabilidade moral. Os delitos são expiados
pela livre vontade dos homens, porque eles têm liberdade moral”. (OLIVEIRA, 2003,
p. 66)
Contudo, vale destacar que um dos grandes expoentes desta escola fora
Francesco Carrara, para quem o livre arbítrio como indicador de responsabilidade é
princípio fundamental, na medida em que o ser humano é livre para escolher praticar
ou não o delito. (MIRABETE, 2004, p. 39).
2.5 Período Criminológico
O movimento criminológico do direito penal teve início com a escola
positiva, que se originou do despontar da filosofia positiva e do florescimento dos
estudos biológicos e sociais.
19
Dias (1997, p. 10-11) aduz que no século XIX houve uma profunda
transformação nos estudos do crime. De outro norte, assistiu-se a falência da
reforma penal e penitenciária provenientes do iluminismo, pois tal reforma não só
não havia reduzido a criminalidade como a mesma aumentava constantemente e
diversificavam-se também os delitos, bem como aumentavam os índices da
reincidência. Passou-se, então, ao estudo da natureza e as causas do crime.
Neste sentido, a Escola Positiva apresenta três fases distintas, que serão
objeto de análise a seguir, quais sejam: a fase antropológica de Cesare Lombroso,
autor do Livro L´uomo delinqüente (1876); a fase sociológica de Enrico Ferri, autor
do livro Sociologia Criminale (1892); e, a fase jurídica de Rafaelle Garófalo, autor do
livro Criminologia (1885). (PRADO, 2008, p. 80)
2.5.1 Fase Antropológica – Cesare Lombroso
A fase antropológica da Escola Positiva parte da premissa de que o
homem não é livre, como é o entendimento da Escola Clássica, mas determinado
por forças inatas, porquanto, para os positivistas o crime é resultado da vida em
sociedade, onde o indivíduo está sujeito a variações no tempo e no espaço,
conforme determina a lei da evolução. (NORONHA, 2004, p. 35)
Lombroso foi o fundador da fase antropológica, como médico psiquiatra,
estudou o delinqüente do ponto de vista biológico, pois considerava o crime uma
“manifestação humana e produto de várias causas”. (MIRABETE, 2004, p. 40)
Através de pesquisas realizadas em prisioneiros italianos vivos e também
em outros mortos que investigou por meio de necropsia:
[...] imaginou ter encontrado, no criminoso, em sentido natural-científico,
uma variedade especial de homo sapiens, que seria caracterizada por sinais
(stigmata) físicos e psíquicos. Tais estigmas físicos do criminoso nato,
segundo Lombroso, constavam de particularidades da forma da calota
craniana e da face, consubstanciadas na capacidade muito grande ou
pequena do crânio, no maxilar inferior procidente, fartas sombrancelhas,
molares muito salientes, orelhas grandes e deformadas, dessimetria
corporal, grande envergadura dos braços, mãos e pés etc... Como estigmas
ou sinais psíquicos que caracterizavam o criminoso nato, Lombroso
enumerava: sensibilidade dolorosa diminuída (eis porque, os criminosos se
tatuariam), crueldade, leviandade, aversão ao trabalho, instabilidade,
20
vaidade, tendência a superstições, precocidade sexual. (FERNANDES,
2002, p. 81)
Assim, adverte Noronha (2004, p. 34) que segundo o entendimento de
Lombroso somente o indivíduo que apresentasse diversos estigmas poderia ser
enquadrado no “tipo criminoso”, haja vista que pessoas comuns e de boa fé também
poderiam apresentar um ou outro estigma.
Na verdade, para Lombroso o criminoso era um ser atávico, sendo que
muitas de suas características regrediam as características próprias das formas mais
primitivas dos seres humanos. O atavismo, portanto, significa “o aparecimento em
um descendente, de um caráter não presente em seus ascendentes imediatos, mas
sim em remotos [...]”. (FERNANDES, 2002, p. 82)
Além do criminoso nato, do qual já foram feitas as considerações acima,
Lombroso também classificava os criminosos em: Falso ou pseudo delinqüente que
representava o delinqüente ocasional; e, o criminalóide que se refere ao meio
delinqüente, assemelhando-se ao meio louco. (FERNANDES, 2002, p. 84)
Mirabete (2004, p. 40-41) em perfunctória conclusão, enumera as idéias
de Lombroso, veja-se:
1. O crime é um fenômeno biológico, não um ente jurídico, como afirma
Carrara. Por essa razão, o método que deve ser utilizado no seu estudo é o
experimental, e não o lógico-dedutivo dos clássicos. 2. O criminoso é um ser
atávico e representa a regressão do homem ao primitivismo. É um selvagem
e nasce delinqüente como os outros nascem sábios ou doentios, fenômenos
que, na Biologia, é chamado de degeneração. 3. O criminoso nato
apresenta características físicas e morfológicas específicas, como
assimetria craniana, fronte fugidia, zigomas salientes, face ampla e larga,
cabelos abundantes e barba escassa etc. 4. O criminoso nato é insensível
fisicamente, resistente ao traumatismo, canhoto, ou ambidestro, moralmente
insensível, impulsivo, vaidoso e preguiçoso. 5. A causa da degeneração que
conduz ao nascimento do criminoso é a epilepsia (evidente ou larvada), que
ataca os centros nervosos, deturpa o desenvolvimento do organismo e
produz regressões atávicas. 6. Existe a “loucura moral”, que deixa íntegra a
inteligência, suprimindo, porém, o senso moral. 7. O criminoso é, assim, um
ser atávico, com fundo epilético e semelhante ao louco moral, doente antes
que culpado e que deve ser tratado e não punido.
Contudo, da doutrina de Lombroso se retira conclusão muito importante
para a política criminal, qual seja, que ao criminoso nato “não caberiam expiações
morais ou punições infamantes e a sociedade teria o direito de proteger-se desse
tipo de criminoso, até condenando-o à prisão perpétua e só excepcionalmente e
apenas como ‘medida de seleção’ condená-lo a morte”, vez que o criminoso nato
21
não tem senso de moralidade, portanto, não pode fazer uso do livre arbítrio dos
clássicos. (FERNANDES, 2002, p. 80)
2.5.2 Fase Sociológica – Enrico Ferri
A teoria de Lombroso não morreu com ele, pois ao lado das concepções
antropológicas também se apresentava a fase sociológica de Enrico Ferri que
insculpiu o trinômio causal do delito, o qual era constituído de fatores antropológicos,
sociais e físicos. Sendo assim, Ferri, dentre todos os demais, foi considerando o
maior nome da Escola Positiva, pois “pregou a responsabilidade social em
substituição à responsabilidade moral”. (NORONHA, 2004, p. 36)
Fernandes (2002, p. 92) em apertada síntese traz a classificação dos
delinqüentes adotada por Enrico Ferri, que os dividia em natos, loucos, ocasionais,
habituais e passionais. Veja-se:
O nato é o tipo instintivo de criminoso, descrito por Lombroso, com seus
estigmas de degeneração. Ferri vislumbra, como seu traço característico
essencial e dominante, a completa atrofia do senso moral; O louco seria não
só o alienado mental, como, também, os semi-loucos, os matóides e os
fronteiriços; O ocasional é aquele que eventualmente comete delito [...]; O
habitual é o reincidente da ação delituoso. É o indivíduo que praticamente
faz do crime sua profissão; O passional é aquele que é levado à
configuração típica pelo arrebatamento, pelo ímpeto.
Neste sentido, para Ferri, o homem age como sente não como pensa, e
só tem responsabilidade porque vive em sociedade, sendo que suas ações sofrem
influências tanto de seu organismo psíquico quanto fisiológico, bem como do
ambiente social em que vive. (PRADO, 2008, p. 81)
Assim, conclui Fernandes (2002, p. 91) que Ferri “não aceitava a
liberdade da vontade psíquica do homem” e defendia como já dito anteriormente, a
teoria da responsabilidade social em substituição à responsabilidade moral. Neste
contexto, para Ferri, todos os criminosos, fossem eles doentes mentais ou não,
deveriam ser afastados do convívio social, não para serem castigados ou
penalizados, mas para garantir a defesa social, portanto, não haveria de ter um
22
código penal, mas um “código de defesa social, fundado na periculosidade do
infrator”.
2.5.3 Fase Jurídica – Rafaelle Garófalo
Rafaelle Garófalo era um jurista e foi também o criador do termo
criminologia. Neste sentido, buscou construir uma ciência criminológica que
envolvesse tanto o estudo do campo antropológico, como o social e jurídico. Para
Garófalo “a criminologia é a ciência da criminalidade, do delito e da pena”.
(FERNANDES, 2002, p. 93)
Mirabete (2004, p. 41) sustenta que para Garófalo existem dois
sentimentos básicos que conduzem o ser humano, a piedade e a probidade (senso
de justiça) e que o ato delituoso é sempre uma lesão a um destes sentimentos.
Neste sentido, aduz Noronha (2004, p. 38) que “é nesta última fase da
Escola Positiva que se observa o labor jurídico”, que Garófalo visava buscar um
conceito de crime que pairasse acima da legislação, criou, então, o conceito de
delito natural que é “a ofensa feita à parte do senso moral formada pelos
sentimentos altruístas piedade e probidade”.
Assim, continuando, acrescenta que Garófalo via o delinqüente como ser
anormal, cuja anomalia sedimentava-se pela completa ausência de um senso de
moralidade.
Única distorção que se encontra na tese de Garófalo está no que tange a
repressão do crime, vez que se afasta do entendimento cultivado pela Escola
Positiva. Para Garófalo, o fim da medida penal seria a eliminação do indivíduo ou
sua deportação para que vivesse em completo isolamento. (NORONHA, 2004, p. 38)
Fernandes (2002, p. 96) trás a baila a classificação dos criminosos
designada por Garófalo, a qual é dividida em três categorias: assassinos, violentos
ou enérgicos e ladrões ou neurastênicos.
Os assassinos, ou delinqüentes típicos, consoante Garófalo: “obedecem
unicamente o próprio egoísmo, aos próprios desejos e apetites
instantâneos, atuando sem cumplicidade alguma indireta, do meio social.
Oferecem, freqüentemente, anomalias anatômicas, umas vezes repressivas,
outras teratológicas ou atípicas; muitos sinais exteriores falam neles de uma
23
suspensão de desenvolvimento moral, compatível, aliás, com uma anormal
faculdade de ideação, pelos instintos, como pelos apetites; aproximam-se
estes delinqüentes dos selvagens e das crianças”.
Nos violentos e nos ladrões, ou neurastênicos, não falta o senso moral. Nos
violentos, ou enérgicos, falta o sentido de compaixão ou é sobremaneira
escasso, a ponto de, facilmente, permitir-lhes a prática criminosa sob
pretexto de falsa idéia, de exagero amor próprio ou de preconceitos sociais,
religiosos ou políticos.
Dos criminosos violentos se destaca um subgrupo, os impulsivos, ou seja,
os que cedem à cólera ou à excitação nervosa exacerbada. Eles não têm a
fisionomia peculiar ou característica dos violentos e neles poucas vezes se
percebem as assimetrias e hemiatropias do crânio ou da face,
correspondentes ou desequilíbrio funcional das faculdades.
Nos ladrões falta o instinto de probidade, que pode ser diretamente
hereditário e, num pequeno número de casos, atávico; de ordinário, à
herança juntam-se os exemplos do ambiente imediato, imprimindo-se-lhes
no espírito durante a infância ou a adolescência. [...]. (FERNANDES, 2002,
p. 96)
Contudo, pode-se afirmar que Garófalo operou a sistemática jurídica da
Escola
Positiva,
vez
que
estabeleceu
“a
periculosidade
como
base
da
responsabilidade e a prevenção especial como fim da pena”. (PRADO, 2008, p. 81)
2.6 A Criminologia Crítica
As bases da criminologia crítica nasceram das críticas acerca da postura
da criminologia até então vigente, que era incapaz de compreender a totalidade do
fenômeno criminal, vez que nesta o pensamento estava calcado no entendimento
marxista que sustentava que o delito era um fenômeno dependente do modo de
produção capitalista. (SHECAIRA, 2008, p. 326)
Sendo assim, Shecaira (2008, p. 329) adverte que “a teoria crítica propõe
uma ampla reflexão do próprio conceito do crime”, sendo que sua redefinição
depende de uma reflexão crítica sobre a realidade do sistema legal que se baseia no
poder e no privilégio de alguns indivíduos em detrimento de outros.
Neste sentido, Maíllo (2007, p. 255) assevera que “costumam-se distinguir
várias orientações no âmbito dos chamados enfoques criminológicos críticos”.
Todavia, dentre tais enfoques, será objeto deste trabalho somente o
enfoque do etiquetamento, que por sua relevância terá um capítulo próprio.
Por oportuno, cabe apenas mencionar que tal enfoque também chamado
de Labbeling Approach tem por objetivo, estudar a importância que a reação social
24
tem sobre o delito, ou seja, “que não existe quase nenhum ato que seja delitivo em
si mesmo, mas delitivo ou desviado é aquilo que se define como tal pela comunidade
ou pelos órgãos do sistema da Administração da Justiça”. (MAÍLLO, 2007, p. 256).
25
3 O LABELLING APPROACH E A CLIENTELA DO SISTEMA PRISIONAL
Também conhecida como a teoria do etiquetamento, da rotulação ou da
reação social, o Labelling Approach surgiu nos anos sessenta, precisamente nos
EUA, tendo como autores principais Beckers, Lemert e Goffman. (ALVES, 2006, p.
68)
Shecaira (2008, p. 271-272) assevera que essa década fora marcada por
um culto às drogas e ao rock and roll, pelas lutas das minorias negras, pelas
campanhas às conquistas de alguns direitos civis, e por vários outros
potencializadores capazes de fermentar a sociologia do conflito.
Tais fatores resultaram numa “cultura suficientemente forte para
engendrar a criação da teoria da rotulação social”. Deste modo, a lei penal criada
para conter e controlar condutas problemáticas passou a ter por objetivo reprimir os
movimentos sociais, transformando cidadãos comuns em criminosos. (SHECAIRA,
2008, p. 286)
Sell (2007) esclarece que o Labelling Approach:
Sofreu uma forte influência do interacionísmo simbólico, corrente sociológica
que sustenta que a realidade humana não é tanto feita de fatos, mas da
interpretação que as pessoas coletivamente atribuem a esses fatos. Isso
significa, entre outras coisas, que uma conduta só será tida como criminosa
se os mecanismos de controle social estiverem dispostos a assim classificála.
Neste contexto, “o Labelling caracteriza-se pelo relativismo jurídico e
moral, pela acentuação do pluralismo cultural e pela manifesta simpatia para com as
minorias mais desfavorecidas”, por isso, desloca o problema criminológico do plano
da ação para o da reação. (ALVES, 2006, p. 70)
Deste modo:
Modelado pelo interacionismo simbólico e o construtivismo social como
esquema explicativo da conduta humana, o labelling parte dos conceitos de
“conduta desviada” e “reação social”, como termos reciprocamente
interdependentes, para formular sua tese central: a de que o desvio – e a
criminalidade – não é uma qualidade intrínseca da conduta ou uma entidade
ontológica preconstituída à reação (ou controle) social, mas uma qualidade
(etiqueta) atribuída a determinados sujeitos através de complexos
processos de interação social; isto é, de processos formais e informais de
definição e seleção. (ANDRADE, 1997, p. 205)
26
Assim, o Labelling tem por objetivo estudar o processo de criminalização,
passando a indagar: porque um fato fora definido como crime? Porque alguns
indivíduos são tidos como criminosas? Quais as conseqüências desse tratamento?
E, por fim, qual a fonte de sua legitimidade? (ALVES, 2006, p. 70)
Então, para que haja uma melhor compreensão do Labelling Approach,
necessária se faz uma análise do processo de criminalização, o qual passa por
várias etapas até resultar na transformação definitiva de alguns cidadãos comuns
em criminosos.
3.1 Seleção de pessoas: regras para quem?
Pode-se considerar que a desigualdade e a exclusão social são os
primeiros passos ao processo de criminalização, pois são estes os fatores que irão
delinear a maior parte da clientela do sistema prisional.
Sobre o diferente, ou seja, o excluído adverte Gomes (2009, p. 2):
A repugnância do ser humano para com o “diferente” e a dificuldade de com
ele conviver não são temas novos - embora prementes - tampouco o são as
soluções empregadas, qual seja, a exclusão, o afastamento. Para se livrar
do estorvo causado pela presença do que não se encaixa no modelo
padronizado, a regra geral é o confinamento, o isolamento.
Atualmente, vive-se sob a influência direta de um sistema capitalista que
tudo direciona e tudo determina, onde as pessoas são identificadas pelo que têm e
não pelo que são, onde as aparências e o consumo delineiam os detentores do
poder e os marginalizados.
Para Gomes (2009, p. 3), “o fato de ser ‘diferente’, leia-se, de não se
enquadrar dentro dos parâmetros de aceitação social determinados evidentemente
pela própria sociedade, gera um processo de distanciamento, de segregação, de
segmentação entre as pessoas”.
Deste modo, o ser humano vem sendo motivado diariamente ao consumo,
pois, somente é reconhecido como parte integrante dessa sociedade, aquele que
detém o poder de consumir.
Neste sentido, adverte Bauman (1998, p. 55) que:
27
O consumo abundante, é-lhes dito e mostrado, é a marca do sucesso e a
estrada eu conduz diretamente ao aplauso público e à fama. Eles também
aprendem que possuir determinados objetos, e adotar certos estilos de vida,
é a condição necessária para a felicidade, talvez até para a dignidade
humana.
Todavia, com o alto nível de desigualdade social, oriunda da má
distribuição de riquezas, muitos são os que não podem atingir o ideal de satisfação
que a todos é oferecido indistintamente, passando a fazer parte daqueles que nada
acrescentam a sociedade consumeira, tornando-se, conseqüentemente, parte dos
incluídos na massa dos excluídos.
A possibilidade de consumo se torna a linha que separa os que estão dentro
dos que estão fora do jogo. Com a retirada do Estado do setor social, as
regras passaram a ser ditas pelo mercado que, a cada dia, apresenta novas
e mais sedutoras oportunidades de consumo. Propala-se a idéia de que a
felicidade é proporcional ao quanto se consome de serviços e produtos; a
dignidade humana passa a ser entendida simplesmente como a capacidade
de aquisição de determinados objetos, adoção de certo estilo de vida e
possibilidade de freqüentar alguns lugares. (GOMES, 2009, p. 6)
Neste sentido, Alves (2006, p. 33) esclarece que os excluídos:
Num primeiro momento, seriam os marginais, pedintes, mendigos, os quais
povoaram e povoam os espaços sociais, formando universos
estigmatizados e estereotipados, presentes em toda a história da
humanidade. Hodiernamente, também podemos somar a essa classe
excluída, pessoas idosas, deficientes, desadaptados sociais, minorias
étnicas ou de cor, desempregados de longa duração, jovens
impossibilitados de ascender no mercado de trabalho, bem como todos os
explorados em um subemprego, os trabalhados do mercado informal e,
ainda, dentre tantos outros, aqueles que percebem um mísero salário
mínimo.
Tal exclusão não só provoca a total ausência de bens materiais à
disposição dos excluídos, como atinge diretamente a dignidade dessas pessoas,
que se sentem fracassadas e culpadas pela própria pobreza, por não terem
conseguido ascender socialmente. (ALVES, 2006, p. 36)
O confinamento espacial, o encarceramento sob variados graus de
severidade e rigor, tem sido em todas as épocas o método primordial de
lidar com setores inassimiláveis e problemáticos da população, difíceis de
controlar. (...) A separação espacial que produz um confinamento forçado
tem sido ao longo dos séculos uma forma quase visceral e instintiva de
reagir a toda diferença e particularmente à diferença que não podia ser
acomodada nem se desejava acomodar na rede habitual das relações
sociais. (BAUMAN, 1999, p. 114)
28
Para Sawaia (2006, p. 8), “todos estamos inseridos de algum modo, nem
sempre decente e digno, no circuito reprodutivo das atividades econômicas, sendo a
grande maioria da humanidade inserida através da insuficiência e das privações,
que se desdobram para fora do econômico”.
Neste sentido, esclarece Gomes (2009, p. 8) que “Em nossas sociedades
individualistas prepondera um pendor para a repressão da dessemelhança, a partir
do momento em que os desiguais são cada vez mais segregados espacialmente”. E,
continuando, acrescenta: “O ‘outro’ é tratado como ‘algo’ absolutamente desprendido
de singularidade individual”.
Neste diapasão, acrescenta Bauman (1998, p. 55):
Como a viabilidade de uma redistribuição de itens desejáveis do
consumidor, socialmente iniciada, está-se desvanecendo, mesmo para os
que não podem participar do banquete dos consumidores e, assim, não são
propriamente regidos pelos poderes de sedução do mercado, resta apenas
uma linha de ação a adotar para se atingirem os padrões que a sociedade
consumidora promove: tentar alcançar os fins diretamente, sem primeiro se
aparelharem os meios. Afinal, não se pode aparelhar o que não se possui.
O que se pretende dizer com o acima exposto, é que a exclusão social
leva a inclusão de boa parte das pessoas excluídas no sistema prisional, vez que a
imensa maioria que ingressa nesse sistema faz parte dessa categoria que não
conseguiu ascender aos padrões sociais tidos como comuns, e que, por
conseguinte, acabam por praticar os crimes, especialmente contra o patrimônio que
ainda é o crime mais exercitado pelos clientes do sistema prisional. (ALVES, 2006,
p. 60-61)
Corroborando com os argumentos acima, Baratta (1999, p. 172) adverte:
Sob o pesado véu de pudor e da falsa consciência que aqui se estende, não
sem a contribuição de uma parte da sociologia oficial, com a imagem falaz
de uma ‘sociedade das camadas médias’, a estratificação social, isto é, a
desigual repartição do acesso aos recursos e às chances sociais, é drástica
na sociedade capitalista avançada. O ascenso dos grupos provenientes dos
diversos níveis da escala social permanece um fenômeno limitado ou
absolutamente excepcional, enquanto o auto-recrutamento dos grupos
sociais, especialmente dos inferiores e dos marginalizados é muito mais
relevante do que parece à luz do mito da mobilidade social.
Em verdade, muito mais que impossibilitados do acesso aos bens
materiais indispensáveis a uma sobrevivência digna na sociedade do consumo, as
pessoas excluídas estão à margem de toda riqueza espiritual, vez que rejeitados e
29
desvalorizados, sobretudo, culturalmente. (WANDERLEY, 2006, p. 17-18).
Portanto, observa-se que o Estado brasileiro, “ante a desigualdade social
que mantém e perpetua é o maior responsável pela seleção e inclusão da clientela
do sistema prisional”. (ALVES, 2006, p. 58)
Assim, Gomes (2009, p. 9) esclarece:
Em outras palavras, na medida em que “coisificamos” aquelas pessoas que
são “diferentes” porque não podem consumir em plena sociedade de
consumidores, nos desobrigamos de olhar para elas como cidadãos e,
conseqüentemente, não devemos a elas qualquer consideração ou respeito.
Para Sawaia (2006, p. 9), a exclusão:
Não é uma coisa ou um estado, é processo que envolve o homem por
inteiro e suas relações com os outros. Não tem uma única forma e não é
uma falha do sistema, devendo ser combatida como algo que perturba a
ordem social, ao contrário, ela é produto do funcionamento do sistema.
Neste sentido, ressalta Gomes (2009, p. 9):
Se outrora, aqueles que não conseguiam consumir eram os produtores e,
no caso dos desempregados, a reserva de mão-de-obra, portanto,
integrantes da sociedade, ainda que numa condição de inferioridade; hoje,
esses mesmos seres – e mais alguns que a eles se agregaram – são
encarados como transgressores da lei e perturbadores da ordem.
Depois da exclusão, o próximo passo do processo de criminalização é dar
à pessoa excluída uma marca, ou seja, um estigma.
O estigma é como um sinal infamante, uma cicatriz que jamais deixa o
corpo e o decoro de sua vítima. Geralmente se encontra impregnado nas classes
economicamente inferiores, ou seja, nos marginalizados e vitimados pelo sistema
social em vigência. Sendo certo dizer que quanto mais estigmas perseguirem a
pessoa já estigmatizada, mais predisposto ao crime ela estará, vez que um estigma
nada mais é que a depreciação social de alguém.
Sobre o tema adverte Sell (2007):
Tire de uma pessoa uma boa parte de sua dignidade social e ela facilmente
se encarregará de acabar com o resto, pois quanto mais baixa é a sua
posição na sociedade, menor são suas alternativas de vida honesta e
menores são também os custos simbólicos de sua entrada no mundo do
crime. Uma exclusão abre caminho para a outra e assim sucessivamente.
30
Em verdade, um estigma nada mais é que uma marca que desqualifica e
impede o indivíduo de ser reconhecido na sociedade, porquanto, pode-se dizer que
é a própria sociedade quem cria o criminoso. (ANITUA, 2008, p. 583)
Para Goffman (1988, p. 45):
A pessoa que tem um estigma particular passa pelas mesmas experiências
de aprendizagem social relativas à sua condição e pelas mesmas
modificações em sua concepção do “eu” – uma carreira moral similar que é,
ao mesmo tempo, causa e efeito do compromisso com uma seqüência
semelhante de ajustamentos pessoais.
A exclusão, como já referido, é produto do sistema social em vigência.
Neste sentido, a desigualdade social cria a massa de marginais a ponto de deixá-los
a um passo da criminalidade. Todavia, o sistema penal não deseja punir todas as
pessoas que cometem crime, e nem poderia fazê-lo, sob pena de ter de processar,
julgar e condenar, toda população por várias vezes. (KARAM, 1993, p. 202)
Quem poderia dizer que nunca cometeu um crime: um pequeno furto, um
atestado médico falso, um jeitinho para pagar menos imposto de renda (ou
seja, uma sonegação fiscal), uma propina para o guarda, ou, pelo menos
um adultério...? Fosse efetivamente cumprida a lei penal, para que se
punissem todos os casos em que se desse sua violação, praticamente não
haveria ninguém que não fosse várias vezes processado e punido, tendo-se
que propor como conseqüência, tão lógica quanto absurda, a transformação
da sociedade em um imenso presídio, o que também não funcionaria, pois
dificilmente sobraria alguém para julgar, ou para exercer a função de
carcereiro. (KARAM, 1993, p. 202)
Para Mongruel (2002, p. 171) “as atitudes deliberativas de não permitir e
castigar apresentam um certo traço engenhoso, que não combatem a criminalidade,
mas sim criminalizam certas atitudes humanas, marcando-as como negativas,
erradas e más”.
A seleção dos que vão desempenhar o papel de criminoso, de mau, de
inimigo – os bodes expiatórios – naturalmente, também obedece à regra
básica da sociedade capitalista, ou seja, a desigualdade na distribuição de
bens. Como se trata aqui da distribuição de um atributo negativo, os
escolhidos para receber toda a carga de estigma, de injustiça e de violência,
direta ou indiretamente provocada pelo sistema penal, são preferencial e
necessariamente os membros das classes subalternas, fato facilmente
constatável, no Brasil, bastando olhar para quem está preso ou para quem é
vítima dos grupos de extermínio. (KARAM, 1993, p. 206)
Neste sentido, basta que o indivíduo cometa somente uma conduta ilícita,
seja ela qual for, como, por exemplo, furtar alimento num supermercado para seu
31
filho faminto, esse ato será tudo que se tem de referência estigmatizante sobre esta
pessoa. (SHECAIRA, 2008, p. 292)
Mas, além disso, isolando, estigmatização e ainda submetendo aqueles que
seleciona ao inútil e desumano sofrimento da prisão, o sistema penal faz
destes selecionados pessoas mais desadaptadas ao convívio social e,
conseqüentemente, mais aptas a cometer novos crimes e agressões à
sociedade, funcionando, já por isso, como um alimentador da violência, o
que faz da demanda de maior repressão penal uma atitude um tanto
sadomasoquista. (KARAM, 1993, p. 204)
Contudo, “a lei penal brasileira não se destina a proteger apenas os bens
e valores essenciais, no sentido de bens comuns a todos os homens, tendendo
assim a privilegiar os interesses daquela minoria de detentores das riquezas e
poder”. (KARAM, 1993, p. 75)
E, desse modo, a liberdade do livre, a individualidade do indivíduo são
ameaçadas não apenas pelos detentores do poder. Estes últimos sustentam
a liberdade individual como o laço sustenta o homem enforcado – o homem
ou mulher que assume a responsabilidade com suas próprias mãos vive o
pesadelo de todo poder. Os detentores do poder, contemporâneos e em
perspectiva, não reconhecem senão uma forma de responsabilidade dos
seus súditos: ser responsável, na linguagem do poder, é seguir o comando,
enquanto “ter poder” significa, essencialmente, tirar o direito de alguém mais
a qualquer outra responsabilidade, que é a sua liberdade. (BAUMAN, 1998,
p. 249-250)
3.2 Seleção de fatos e suas conseqüências
O momento da criação das leis penais também pode ser considerado
mais uma etapa do processo de criminalização, vez que é neste instante que se
define quais os bens jurídicos que serão protegidos pela lei penal, quais condutas
serão tipificadas como crime, bem como a quantidade e qualidade de pena a ser
aplicada. Além disso, tais definições obedecem “a uma primeira lógica de
desigualdade que, misticamente pelo chamado ‘caráter fragmentário’ do Direito
Penal pré-seleciona, até certo ponto, os indivíduos criminalizáveis”. (ANDRADE,
1997, p. 278)
Bianchini (2000, p. 61) esclarece que: “várias, e de gravidade
diferenciada, são as ações conflitantes que se resolvem por via punitiva
32
institucionalizada. Porém, nem todos os agentes envolvidos no conflito são
submetidos a essa solução”, porquanto a aplicação da norma penal dirige-se a uma
parcela bastante reduzida que é “filtrada por meio de um processo que quase
sempre, elege os menos providos economicamente”.
Portanto, sobre o tema esclarece Sá (2007, p. 31):
O sistema de leis vigente, comprometido com a reação social ante o crime,
elege como delinqüente unicamente aqueles que tentam romper com as
interdições secundárias, deixando ilesos e isentos de culpa os que tentam
romper com a interdição primária. Cria-se pois um curioso paradoxo: os
delinqüentes são comumente identificados entre aqueles que, ainda que de
forma pouco ajustada ou “ilegítima”, tentam capturar as frutas proibidas a
que têm direito, a fim de simplesmente tornarem-se iguais aos homens, mas
raramente são identificados entre aqueles que tentam se igualar a “Deus”,
na busca do poder e domínio totais.
Para Mongruel (2002, p. 170) “a conduta humana de desvio é o resultado
da aplicação de normas e sanções a um indivíduo dito ‘transgressor’. Ou seja, a
pessoa é somente considerada desviada porque lhe aplicaram este rótulo, esta
etiqueta, segundo as próprias leis”.
Anitua (2008, p. 592), assevera que Becker analisa dois momentos de
etiquetamento:
O primeiro deles é o da imposição ou criação de normas, e o segundo o de
aplicação das normas já criadas. Em ambos selecionam-se
comportamentos em abstrato e pessoas em concreto para impor-lhes
etiquetas que implicarão um recusa mais geral, além de configurar uma
“carreira delinqüêncial”. Estas duas “seleções” seriam chamadas desde
então “criminalização primária” e “criminalização secundária”.
O desvio, portanto, divide-se em dois tipos: o desvio primário – que seria
o ato inicial ao qual se refere à norma penal e que tem causas sociais, culturais e
psicológicas. Sendo que “a reação social – freqüentemente o castigo – frente ao
desvio primário cumpre um primeiro passo na direção da imposição do ‘estigma’ de
desviado”. E o desvio secundário, que ocorre como resposta à reação social, ou
seja, o desviado se adapta e adquire a identidade delinqüente que lhe foi imputada
pela norma penal. (ANITUA, 2008, p. 590-591)
Neste diapasão, assevera também Shecaira (2008, p. 303):
Tomados os atos humanos como condutas coletivas (ainda que não se
desconsidere o ato humano como individual), pode-se dizer que as pessoas
agem com um olho no que os outros fizeram, estão fazendo, ou poderão
33
fazer no futuro. O ato humano ajusta-se aos atos daqueles que estão à
nossa volta com expectativa do que irão ver, fazer ou como vão reagir.
Quando se vê a desviação como um ato dentro de um contexto de
coletividade sempre se terá uma própria avaliação de como os outros
receberão o ato e qual será a avaliação que dele se fará. O ato jamais é um
ato isolado; ele é a expectativa da reação do ato. Ele é a própria interação
com o ato. O ato deixa, pois, de ser exclusivamente uma aguda
manifestação da interioridade humana. É também o que se espera que ele
seja. A maneira como o ato será avaliado é que produzirá um novo contexto
de ação, o que demanda – sempre – tentar entender como o ato deverá ser
recebido pela coletividade. Não é por outra razão que tal teoria, além de ser
denominada teoria da rotulação social (com suas variações semânticas),
também é chamada de teoria da reação ou interação social.
Assim, percebe-se que o processo de criminalização é altamente seletivo
e desigual, tendo como foco principal determinadas classes de pessoas dentre a
população total, enquanto que o comportamento do indivíduo não é por si só,
condição essencial deste processo. (ANDRADE, 1997, p. 202)
Continuando, Andrade (1997, p. 205) esclarece que:
Uma conduta não é criminal “em si” ou “per si” (qualidade negativa ou
nocividade inerente) nem seu autor um criminoso por concretos traços de
sua personalidade (patologia). O caráter criminal de uma conduta e a
atribuição de criminoso a seu autor depende de certos processos sociais de
“definição”, que atribuem à mesma um tal caráter, e de “seleção”, que
etiquetam um autor como delinqüente.
Neste sentido, o Labelling Approach acentua que as agências de controle
penal não detectam a natureza criminal de uma conduta, mas a geram ao etiqueta-lá
como criminosa, porquanto o crime e a criminalidade são produtos da reação social,
não tendo natureza ontológica, mas social e de definição. (PABLO DE MOLINA,
1988, p. 585 apud ANDRADE, 1997, p. 206)
[...] os grupos sociais criam o desvio ao fazer as regras cuja infração
constitui o desvio e aplicar ditas regras a certas pessoas em particular e
qualificá-las de marginais (estranhos). Desde este ponto de vista, o desvio
não é uma qualidade do ato cometido pela pessoa, senão uma
conseqüência da aplicação que os outros fazem das regras e sansões para
um ‘ofensor’. O desviante é uma pessoa a quem se pode aplicar com êxito
dita qualificação (etiqueta); a conduta desviante é a conduta assim chamada
pela gente. (BECKER, 1971, p. 19 apud ANDRADE, 1997, p. 206)
Assim, a seleção realizada pela norma penal nunca vem sozinha, mas
acompanhada de cerimônia degradante, constituindo-se em processo ritualizado ao
qual é submetido o indivíduo tido como criminoso e que atinge diretamente a autoestima do mesmo.
34
Tal cerimônia degradante tem início com o envolvimento do desviante
com as diversas agências do controle penal, e se perpetua com o próprio processo
criminal, que de maneira mais ofensiva atinge o íntimo do ser humano. Deste modo:
Há inúmeros exemplos de como uma cerimônia degradante, que em grande
parte das vezes acontece antes mesmo de um processo criminal ser
iniciado, pode atingir a identidade de alguém. Por certo que todos se
lembram das conseqüências advindas da irresponsável cobertura de um
episódio jornalístico, ocorrido há algum tempo em São Paulo, em que os
donos de uma escola infantil foram ferozmente crucificados pela imprensa
de todo o País por uma acusação que não tinha qualquer base material.
Foram presos, sua escola depredada, suas honras atingidas, suas
reputações destruídas, suas fotos publicadas em capa dos jornais com
manchetes desairosas. Qual o resultado desse prejulgamento?
Processualmente nada aconteceu. Não houve sequer denúncia contra os
acusados! Mais de cinco anos depois, a Folha de São Paulo publicava: “os
seis acusados de abuso sexual contra crianças, no episódio que ficou
conhecido como Escola Base, ainda não conseguiram reconstruir suas
vidas, arrasadas pela irresponsabilidade da polícia e da imprensa. Ninguém
recebeu qualquer tipo de indenização pelos danos materiais e morais que
sofreu. (SHECAIRA, 2008, p. 295).
Shecaira (2008, p. 304) faz um breve resumo dos atos seqüenciais do
Labelling Approach que consiste no seguinte:
Delinqüência primária - resposta ritualizada e estigmatização - distância
social e redução de oportunidades - surgimento de subcultura delinqüente
com reflexo na auto-imagem - estigma decorrente da institucionalização carreira criminal - delinqüência secundária.
Neste contexto, a prisão serve para que o condenado assuma a
identidade de detendo e amolde seu comportamento ao estereótipo que dele a
reação social já esperava quando o encarcerou. (ANITUA, 2008, p. 584)
Portanto, Shecaira (2008, p. 297) conclui que:
A pena atua como geradora de desigualdades. Ela cria uma reação dos
círculos familiares, de amigos, de conhecidos, que acaba por gerar uma
marginalização no âmbito do mercado de trabalho e escolar. Levar uma
conduta desviada para a esfera da reprovação estigmatizante tem um
função reprodutora do sistema de controle social. O que é uma conduta
social desviada, o mais das vezes cometida por um agente primário,
transforma-se, pela repercussão que encontra na sociedade em face da
pena, em uma carreira delitiva permanente e irreversível. A repressão
punitiva – e em especial a prisão – passa a funcionar como elemento de
criminalização que gera um processo em espiral para a clientela do sistema
penal.
35
Contudo, com o desviado já estigmatizado, aprisionado e estereotipado
está concluído o processo de criminalização, restando daí em diante apenas o ser
humano prisonizado – objeto central deste estudo – inadaptado ao convívio social
extramuros “exatamente por se identificar com a instituição total a que está
recolhido, até por necessidade de sobrevivência”, vez que o mesmo passa a
carregar uma nova identidade, “fruto do estigma da prisão” que resulta no seu total
descrédito diante da sociedade tida como “normal”. (GOFFMAN, 1988, p. 155)
36
4 O FENÔMENO DA PRISONIZAÇÃO
O delito além de implicar numa perda material, traz à sociedade outras
conseqüências como, por exemplo, o temor de ser vítima ou de se converter em
infrator para o fim de defender-se. “Tudo isso leva à instabilidade e ao isolamento da
população e daí a um desequilíbrio das estruturas sociais”. (CERVINI, 2002, p. 68)
Assim, segundo Thompson (2002, p. 3) a pena de prisão propõe como
finalidade a punição retributiva do mal causado pela ação delinqüente, a prevenção
através da intimidação para inibir às pessoas potencialmente criminosas da prática
de novos crimes e a regeneração do condenado, de modo a transformá-lo em
cidadão de bem, apto a viver novamente na sociedade.
Entretanto, “punir é castigar, fazer sofrer. A intimidação, a ser obtida pelo
castigo, demanda que este seja apto a causar terror. Ora, tais condições são
reconhecidamente impeditivas de levar ao sucesso uma ação pedagógica”.
(THOMPSON, 2002, p. 5)
Sobre o tema esclarece Sá (2007, p. 114):
Ao delinqüir, o indivíduo concretiza um confronto com a sociedade. Ao
penalizá-lo com prisão, o Estado concretiza o antagonismo entre ele e a
sociedade. Sua “recuperação” será uma recuperação para a sociedade, ou
seja, será uma reintegração social, e só será possível mediante a resolução
desse antagonismo e a superação desse confronto. Por outro lado,
portanto, a pena de prisão traz, como conseqüência, o recrudescimento do
confronto e do antagonismo entre preso e sociedade, por meio dos efeitos
da prisonização. Por outro lado, a reintegração social do preso só será
viável mediante a participação efetiva, tecnicamente planejada e assistida,
da sociedade, da comunidade.
Assim, por ser uma instituição total, a prisão através da privação da
liberdade, transforma o condenado num integrante de uma nova sociedade que
subsiste dentro de outra sociedade, com regras de convivência próprias, seguida de
submissão e luta pela sobrevivência.
Goffman (2007, p. 16), traz a definição de instituição total:
Quando resenhamos as diferentes instituições de nossa sociedade
ocidental, verificamos que algumas são muito mais “fechadas” do que as
outras. Seu “fechamento” ou seu caráter total é simbolizado pela barreira à
relação social com o mundo externo e por proibições à saída que muitas
vezes estão incluídas no esquema físico – por exemplo, portas fechadas,
paredes altas, arame farpado, fossos, água, florestas ou pântanos.
37
Aduz Goffman (2007, p. 17-18) que a disposição básica na sociedade é o
fato do indivíduo fazer suas atividades (comer, dormir, trabalhar, estudar etc) em
diversos lugares e possuir a companhia de diferentes pessoas na efetivação de cada
uma dessas atividades, além de submeter-se a diferentes autoridades sem um plano
racional geral. Todavia:
O aspecto central das instituições totais pode ser descrito com a ruptura das
barreiras que comumente separam essas três esferas da vida. Em primeiro
lugar, todos os aspectos da vida são realizados no mesmo local e sob uma
única autoridade. Em segundo lugar, cada fase da atividade diária do
participante é realizada na companhia imediata de um grupo relativamente
grande de outras pessoas, todas elas tratadas da mesma forma e obrigadas
a fazer as mesmas coisas em conjunto. Em terceiro lugar, todas as
atividades diárias são rigorosamente estabelecidas em horários, pois uma
atividade leva em tempo predeterminado, à seguinte, e toda a seqüência de
atividades é imposta de cima, por um sistema de regras formais explícitas e
um grupo de funcionários. Finalmente, as várias atividades obrigatórias são
reunidas num plano racional único, supostamente planejado para atender
aos objetivos oficiais da instituição. (GOFFMAN, 2007, p. 17-18)
Neste sentido, Thompson (2002, p. 21) também assevera que:
O uso generalizado da privação da liberdade humana como forma precípua
de sanção criminal deu lugar ao estabelecimento de grande número de
comunidades, nas quais convivem de dezenas a milhares de pessoas. Essa
coexistência grupal, como é obvio, teria de dar origem a um sistema social.
Não se subordinaria este, porém, à ordem decretada pelas autoridades
criadoras, mas, como é comum, resultado da interação concreta dos
homens, diante dos problemas postos pelo ambiente particular em que se
viram envolvidos.
Assim, todo ser humano submetido ao confinamento numa instituição total
como a prisão, se sujeita em alguma extensão à subcultura do ambiente. É o
chamado fenômeno da prisonização, também conhecido como prisonalização ou
institucionalização. Portanto, a “prisonização corresponde à assimilação dos padrões
vigorantes na penitenciária, estabelecidos, precipuamente, pelos internos mais
endurecidos, mais persistentes e menos propensos a melhoras”. (THOMPSON,
2002, p. 95)
O homem, diz a psicanálise, estabelece com o ambiente uma relação
contínua e profundamente projetiva, pela qual ele vê e sente o espaço e
aquilo que nele acontece por meio de seus conteúdos psíquicos. O
indivíduo projeta na estrutura do espaço a sua própria estrutura psíquica;
nos acontecimentos do espaço, ele projeta seu tempo, os seus dinamismos
internos. E esta projeção vai se filtrar na percepção que ele tem desse
espaço, na interpretação que faz dele e na forma como o vivencia. (SÁ,
2007, p. 125)
38
Contudo, esclarece Barreto (2006, p. 583) que o fenômeno da
prisonização revela a maneira como o ambiente institucional age sobre o
comportamento do recluso gerando-lhe alterações psíquicas que lhe perseguirão até
mesmo após sua libertação.
Assim, “É a partir da prisionalização que as tradições, valores, atitudes e
costumes impostos pela população carcerária são apreendidos pelos internos, como
uma forma natural de adaptação ou até mesmo de sobrevivência ao rígido sistema
prisional”. (BARRETO, 2006, p. 583)
4.1 Aspectos da prisonização
Muitos são os aspectos do cárcere que levam o recluso à assimilação do
modo de vida e sobrevivência praticado na prisão. Sá (2007, p. 113-114) classificava
tais problemas em dois grupos, os quais abaixo se destacam:
Podem-se classificar os graves problemas carcerários em dois grandes
grupos, conforme segue.
O primeiro grupo são os problemas decorrentes da má gestão da coisa
pública, falta de interesse público, inabilidade administrativa e técnica. Entre
os incontáveis e sobejamente conhecidos problemas deste grupo, citam-se
os seguintes: presídios sem a infra-estrutura mínima necessária, material e
humana, para o cumprimento de pena; falta de condições materiais e
humanas para o incremento dos regimes progressivos de cumprimento de
pena, conforme prevê o texto legal; superpopulação carcerária, com toda as
suas inúmeras conseqüências; descumprimento da lei etc. Poder-se-ia
mencionar ainda a falta de pessoal administrativo, e segurança e disciplina
e pessoal técnico formado e habilitado para a função.
[...]
O segundo grupo são os problemas inerentes à própria natureza da pena
privativa de liberdade, sobretudo quando cumprida em regime fechado, e os
inerentes à própria natureza do cárcere. Entre eles, citam-se: o isolamento
do preso em relação a sua família, a sua segregação em relação à
sociedade, a convivência forçada no meio delinqüente, o sistema de poder
(controlando todos os atos do indivíduo), as relações contraditórias e
ambivalentes entre o pessoal penitenciário e os presos (o pessoal oferecelhes apoio e assistência, ao mesmo tempo em que os contém, os reprime e
os pune), entre outros.
A grande diferença do segundo grupo em relação ao primeiro é que seus
problemas são praticamente inevitáveis. Assim como é impossível
demonstrar afeto para um filho por meio da surra, ou motivar um aluno a
estudar simplesmente pela reprovação (pois são medidas e objetivos que se
excluem), também é impossível desenvolver em alguém a maturidade para
o convívio em sociedade segregando-o da sociedade.
39
Num primeiro momento, o processo de admissão na prisão caracteriza o
fim do convívio social na sociedade e o início da prisonização.
Ao ingressar na prisão o novato já tem formada uma concepção de si
mesmo, a qual fora adquirida pelas disposições sociais estáveis do mundo em que
estava acostumado a viver, assim ao ingressar na prisão é imediatamente despido
de tais disposições. Começa, então, a vivenciar uma série de rebaixamentos e
humilhações, as quais acabam por anular o seu próprio eu, “começa a passar por
algumas mudanças radicais em sua carreira moral, uma carreira proposta pelas
progressivas mudanças que ocorrem nas crenças que têm a seu respeito e a
respeito dos outros que são significativos para ele”. (GOFFMAN, 2007, p. 24)
A vida carcerária é uma vida em massa. Sobretudo para os presos,
evidentemente. Como conseqüência, ela lhes acarreta, dependendo do
tempo de duração da pena, uma verdadeira desorganização da
personalidade, cumpre destacar: perda da identidade e aquisição de nova
identidade; sentimento de inferioridade; empobrecimento psíquico;
infantilização, regressão. O empobrecimento psíquico acarreta, entre outras
coisas: estreitamento do horizonte psicológico, pobreza de experiências,
dificuldades de elaboração de planos a médio e longo prazo. A infantilização
e regressão manifestam-se, entre outras coisas, por meio de: dependência,
busca de proteção (religião); busca de soluções fáceis; projeção da culpa no
outro e dificuldade de elaboração de planos. (SÁ, 2007, p. 115-116)
Assim, o preso vai se amoldando ao ambiente carcerário e se
identificando com os costumes do cárcere, os quais vão se projetando até
influenciarem no seu comportamento social.
Ora, a personalidade do indivíduo vai se estruturando, ou seja, vai se
definindo, vai adquirindo sua identidade exatamente por meio da relação
com o meio externo, ou seja, com o espaço. O indivíduo se define, vai aos
poucos “moldando” sua identidade no espaço, na relação com os objetos
que ele integra. E é o espaço que vai lhe oferecer os objetos e fenômeno
equivalentes aos seus referenciais internos, fenômenos esses quais ele vai
se projetar, com os quais ele vai se identificar. (SÁ, 2007, p. 125)
Quanto à influência do ambiente no processo de alteração da identidade
psicológica do interno, ainda esclarece Sá (2007, p. 126):
[...] é legítimo pressupormos que o preso estabelece e desenvolve com a
edificação carcerária uma relação simbólica. Uma relação de reavivamento,
de seleção, de reforçamento de experiências. Uma reação simbólica que,
conforme passam os anos de prisão, em sua incomparável rotina diária (e
graças também a essa rotina), certamente vai se sedimentando cada vez
mais. Ela será tanto mais intensa e criará sulcos tanto mais profundos,
quanto maior for o isolamento, e quanto maior fora pena. Portanto, é
40
provável que tal relação de preso com a edificação carcerária venha a lhe
criar marcas em seu psiquismo, tanto mais ressoantes quanto mais
exclusiva e duradoura tiver sido a supracitada relação.
Deste modo, Thompson (2002, p. 24) também corrobora com o
entendimento de Goffman quanto a ser o processo de admissão no sistema
prisional, o primeiro passo do interno ao fenômeno da prisonização. Veja-se:
O primeiro passo, e o mais obviamente integrativo, diz respeito a seu status:
transforma-se, de um golpe, numa figura anônima de um grupo
subordinado; traja as roupas dos membros deste grupo; é interrogado e
admoestado; logo descobre que os custodiadores são todo-poderosos;
aprende as classes, os títulos e os graus de autoridade dos vários
funcionários; e, usando ou não a gíria da cadeia, ele vem a conhecer seu
significado; embora passa manter-se solitário, termina por referir-se, ao
menos em pensamento, aos guardas como os samangos, aos médicos
como receitadores de roda de jipe (aspirina) e a usar os apelidos locais para
designar os indivíduos; acostuma-se a comer apressadamente e a obter
alimento através dos truques usados pelos que lhe estão próximos. De
várias outras maneiras, o preso novo desliza para dentro dos padrões
existentes; aprende a jogar ou aprende novas maneiras de fazê-lo; adquire
comportamento sexual anormal; desconfia de todos, olha com rancor os
guardas e, até, os companheiros etc. Em suma: vem a aceitar os dogmas
da comunidade. Nem todos os homens sujeitam-se a todas essas
transformações. Entretanto, nenhum escapa a determinadas influências,
que se poderiam chamar de fatores universais da prisonização, tais como:
aceitação de um papel inferior; acumulação de fatos concernentes à
organização da prisão; o desenvolvimento de novos hábitos, no comer,
vestir, trabalhar, dormir; a adoção do linguajar local; o reconhecimento de
que nada é devido ao meio ambiente, quanto à satisfação de necessidades;
eventual desejo de arranjar uma “boa ocupação” (ou no jargão prisional
carioca, uma faxina). (THOMPSON, 2002, p. 24)
Assim, o encarcerado descobre, logo de início, que já perdeu algumas de
suas características essenciais como, por exemplo, sua autonomia e individualidade,
as quais só poderia fazer uso quando membro na sociedade , passando, agora, a ter
uma alteração na sua própria identidade, deixando, paulatinamente de reconhecer
seu próprio eu.
O muro da prisão, física e simbolicamente, separa duas populações
distintas: a sociedade e a comunidade daqueles que foram, por ela,
rejeitados. A altura e espessura da barreira, a presença, no cimo, de
soldados armados de metralhadoras, o portão pesado com pequenas
viseiras, cuja abertura exige uma operação complicada por várias medidas
de segurança, estão a demonstrar, inequivocamente, que os rejeitadores
desejam muito pouco contato com os rejeitados. O uniforme destes, o
estado de subordinação permanente, as trancas, os conferes, as revistas,
lembram-os, a todo o instante, serem portadores de um estigma tão
aparente e difícil de arrancar quanto o produzido pelo ferrete na rês.
(THOMPSON, 2002, p. 57)
41
Quanto ao sistema de vigilância constante e perda da individualidade,
ressalta Sá (2007, p. 132):
A edificação carcerária providencia também, via
de regra,
arquitetonicamente, uma grande separação, uma grande diferenciação
entre os internos e a equipe dirigente. Estabelecem-se aí dois mundos
arquitetonicamente distintos da prisão. A arquitetura, por conseguinte,
estaria contribuindo, nesse caso, para se consubstanciar, dentro da
instituição prisional, a reedição da estrutura social com suas divisões não
raras vezes até geográficas, entre os que detêm o poder e riqueza e os
demais.
Por outro lado, se a edificação carcerária providencia a construção e
fortalecimento das barreiras externas, que separam o interno da sociedade,
ela providencia também a demolição das barreiras, dos limites que separam
o interno, como pessoa, dos demais, uma vez que ela está comprometida,
compactuada primeiramente com o sistema de segurança e vigilância. Os
lugares, os ambientes são todos comuns. As próprias celas, não arras
vezes, são coletivas e o próprio sanitário fica exposto. Mesmo quando em
cela individual, o preso fica continuamente exposto ao olhar do vigilante.
Após o processo de admissão, o recluso passa a conviver forçadamente
com os demais presos, tendo assim, que obedecer tanto os mecanismos formais de
repressão impostos pela administração do presídio, quanto os informais criados
pelos próprios presos, suas normas de convivência tornam-se, antes de tudo, um
mecanismo de sobrevivência.
Nenhum ser humano normal aceita naturalmente um poder totalitário que o
controle 24 horas por dia. Daí, emergem entre os presos um poder informal
e uma cultura paralela, definindo regras, costumes, uma ética própria e até
mesmo critérios e condições de felicidade e sobrevivência. Não é descabido
conjecturar-se sobre um pacto latente (não verbalizado) entre esses dois
sistemas de poder, afim de se garantir a tranqüilidade, ainda que aparente,
perante a sociedade e a opinião pública, da instituição prisional. Constituise, pois, assim, um ambiente artificial, do qual ninguém gosta, num primeiro
momento, mas ao qual todos, com o tempo, acabam aderindo, de uma
forma ou de outra. Desta adesão, surge a prisonização, a qual pode atingir,
não só os presos, como a Direção, os Agentes de Segurança, e, quem
sabe, até os próprios técnicos. (SÁ, 2007, p. 115)
Neste contexto, além de uma organização formal determinada pelas
regras da administração, surge também a organização informal dos detentos, a qual
não se submete à primeira, mas coexiste.
A organização informal dos detentos, observada sob a ótica sistêmica,
sendo composta por elementos humanos (seus subsistemas) em ambiente
(Umwelt) hostil (a internação coercitiva, punitiva e segregadora)
apresentam, assim como todos os sistemas, a busca do atendimento do
parâmetro básico da sua permanência (sobrevivência). O parâmetro
conectividade dada à alta densidade demográfica da população carcerária,
42
aliado à já descrita opressão pelo poder burocrático favorecerá o surgimento
de líderes nuclearizadores, atratores dos componentes em ilhas de
funcionalidade. Tem esses líderes com os seus grupos, por seu turno, a
incumbência de incrementar a funcionalidade do sistema e manter padrões
de comportamento, a sua própria cultura organizacional, com vista à sua
permanência. (UHLMANN, 2001, p. 7.)
Além disso, a submissão, a ausência de privacidade, a superlotação, a
vigilância continua e a ausência do mínimo de bens particulares (roupa, sapatos, etc)
levam o preso a se sentir como um animal enjaulado que recebe “ração e tratamento
de mantença”. (THOMPSON, 2002, p. 64)
Ora, no mundo ocidental, a posse de bens materiais faz parte, de maneira
fundamental, da concepção do indivíduo sobre si mesmo. Nas condições
descritas, que somam às demais características da prisão, fácil fica avaliar a
que ponto desce o conceito que o preso tem de si, como pessoa. Julga-se,
e convenhamos, com toda a razão, o lixo da sociedade. (THOMPSON,
2002, p. 64)
Desta forma, alguns dos reclusos passam a “deixar de lado” a vida
extramuros e concentram-se na busca de vantagens que lhes garantirá algum status
dentro do próprio presídio, enquanto perdurar a sua pena. Todavia, tal concorrência
na busca pelo status dentro da prisão acaba com qualquer feição de solidariedade
entre os presos. Neste sentido, assevera Thompson (2002, p. 66):
O homem confinado, pois, ao contrário do que se pensa aqui fora, não se
restringe, passivamente, a esperar o esgotamento da pena, numa espécie
de hibernação ou sonoterapia. Ao contrário, engaja-se ao sistema social da
penitenciária e luta para obter as vantagens disponíveis e repelir os males
passíveis de afastamento – vendo umas e outras numa escala de grandeza
completamente diversa da nossa.
Goffman (2007, p. 50) ressalta que o sistema de vantagens é o que
muitas das vezes gera certa reorganização pessoal no recluso, sendo possível
mencionar três elementos básicos desse sistema:
Em primeiro lugar, existem as “regras da casa”, um conjunto relativamente
explícito e formal de prescrições e proibições que expõe as principais
exigências quanto à conduta do internado. Tais regras especificam a
austera rotina diária do internado. Os processos de admissão, que tiram do
novato os seus apoios anteriores, podem ser vistos como a forma de a
instituição prepará-lo para começar a viver de acordo com as regras da
casa.
Em segundo lugar, em contraste como esse ambiente rígido, apresentam-se
um pequeno número de prêmios ou privilégios claramente definidos, obtidos
em troca de obediência, em ação e espírito, à equipe dirigente. É importante
43
ver que muitas dessas satisfações potenciais são parte da corrente de apoio
que, o internado aceita como indiscutível. [...]. Apresentada ao internado
como possibilidades, essas poucas reconquistas parecem ter um efeito
reintegrador, pois restabelecem as relações com todo o mundo perdido e
suavizam os sintomas de afastamento com relação a ele e com relação ao
eu perdido pelo indivíduo.
O terceiro elemento no sistema de privilégio está ligado aos castigos; estes
são definidos como conseqüências de desobediência às regras. Um
conjunto de tais castigos é firmado pela recusa temporária ou permanente
de privilégios ou pela eliminação do direito de tentar consegui-los. De modo
geral, os castigos enfrentados nas instituições totais são mais severos do
que qualquer coisa já encontrada pelo internado em sua vida fora da
instituição. De qualquer forma, as condições em que alguns poucos
privilégios facilmente controlados são tão importantes são as mesmas que
fazem com que seja tão terrível o seu afastamento. (GOFFMAN, 2007, p.
50-51)
Dentre as vantagens oferecidas está a possibilidade de trabalho, que
além de tudo favorece na remissão da pena, todavia, assim como na sociedade não
há colocação para todos os reclusos que desejam trabalhar.
Neste sentido, “dentro da instituição prisional reproduz-se a exclusão
ocorrida na sociedade e somente alguns obtêm acesso ao trabalho”. (POZZEBON,
2007, p. 271).
Pozzebon (2007, p. 272) esclarece, ainda, que:
Dessa forma, permanece uma multidão de pessoas ociosas, sem acesso ao
benefício da remissão da pena e sem oportunidade de vir a conhecer uma
profissão, isto é, o indivíduo não é preparado para sua liberdade. Por outro
lado, se forem aceitos para o trabalho passam à categoria de privilegiados,
e muitas vezes são pressionados a delatarem seus colegas denunciando
fugas ou drogas ou ainda simples desentendimentos. Além disso, o
trabalhador deve ser educado, competente, disciplinado, submisso, bem
humorado, jamais responder para o guarda e nunca se mostrar contrariado
ou irritado.
A superlotação também caracteriza outro aspecto da prisonização, que,
aliás, por si só já é uma violência praticada contra o ser humano que como um lixo
social encontra-se amontoado numa cela, sem perspectiva e sem dignidade.
Pozzebon (2007, p. 269) esclarece algumas conseqüências importantes
decorrentes da superlotação:
O estabelecimento penal superlotado geralmente não possui espaço para
trabalho, escola, reuniões de grupo, etc. As acomodações para dormir vão
ficando escassas, numa cela onde deveriam dormir dois, dormem quatro,
seis. Alguns, por falta de beliches dormem no chão. A proximidade leva à
promiscuidade. Na cela superlotada, alojado com indivíduos que não
conhece e obrigado, muitas vezes, a conviver com desafetos, a violência é
constante e a violência sexual é a mais freqüente nesse meio, inclusive, em
44
tempos de HIV essa violência se constitui em condenação à morte. Dessa
forma, o dia a dia é uma luta constante pela sobrevivência. No banheiro os
vasos sanitários, lavatórios e chuveiros são insuficientes, e a comida, por
ser preparada para um grande número de pessoas, possui a qualidade
sofrível.
Este conjunto de estímulos estressantes podem levar o indivíduo à
violência, à acomodação e à assimilação da cultura vigente, bem como, à
depressão, à doença mental e ao suicídio.
Contudo, “Rejeitados pela sociedade, confinados à força. Obrigados a
uma coabitação não escolhida, privados de autonomia, de recursos, de bens e
serviços de caráter pessoal, de iniciativa, de relações heterossexuais, de segurança
[...]”, só resta aos reclusos adaptarem-se às condições de vida que lhes é imposta,
fazendo funcionar um novo sistema social, dentro da sociedade. (THOMPSON,
2002, p. 82)
4.2 Os efeitos da prisonização e a utopia da ressocialização do condenado
Como referido anteriormente, a prisonização é a assimilação dos padrões
de comportamento vigorantes no ambiente prisional.
Neste contexto, considerando-se alguns dos aspectos apresentados, tais
como: a perda da identidade, a submissão às regras da administração do presídio,
assim como às regras de convivência dos próprios detentos, acrescentando-se a
perda da autonomia e da privacidade, a alteração no jeito de comer, falar, bem como
a violência sexual a que são submetidos e a vigilância constante, pode-se dizer que
o principal efeito da prisonização seria um forte abalo na estrutura psicossocial do
indivíduo encarcerado, de forma a fazê-lo adquirir uma nova identidade a ponto de
não se reconhecer mais como uma pessoa apta a voltar para a sociedade.
Neste sentido, a partir do comentário abaixo, Thompson (2002, p. 14)
tenta descrever como a sociedade extramuros percebe o recluso que considera
regenerado pelo ambiente prisional:
[...] Está muito diferente do menino que conheci, logo que caiu nas mãos da
Justiça. Engordou, exibe formas algo arredondadas; os olhos estão meio
baços e, em geral, fitam o chão; curva-se com bastante servilidade, diante
das pessoas; a voz mostra um certo acento feminino; move-se com lentidão,
cuidadosamente, quase que diria com receio; formalmente respeitoso,
parece preocupado em, por qualquer distração, deixar de cumprir algum
45
comando regulamentar; na pequena conversa que teve com você, sugeriu
uma intriga envolvendo um guarda e um companheiro. É... daquele jovem
atrevido, enérgico, topetudo, independente, altivo, não restou nada. [...] Foi
uma bela regeneração.
Ora, a falácia da ressocialização do recluso pelo sistema prisional está
nitidamente caracterizada pelo fato de que o modo de vida do recluso é totalmente
diferente dos padrões de convivência exigidos na sociedade. Veja-se:
Se no estabelecimento prisional, as pessoas devem ser passivas e
submissas às regras institucionais, no mundo liberto, é importante que haja
autonomia. Se, nas penitenciárias, os reclusos resolvem uma situação
conflituosa por meio da força e da dominação, nas relações interpessoais do
mundo externo, é preciso diplomacia. Se, nas celas, a desconfiança é um
sentimento sempre presente, na vida familiar, é indispensável a confiança e
o auxílio mútuo. Inúmeros são os aspectos que divergem entre uma cultura
e outra, o que torna o indivíduo estranho ao seu próprio local de origem,
como pássaro que, após ser retirado e aprisionado em uma gaiola, não mais
consegue retornar ao seu ambiente natural (BARRETO, 2006, p. 591)
Em verdade, assevera Sá (2007, p. 132):
O recluso raramente tem um espaço para um encontro consigo mesmo, na
solidão. E, o pior, talvez acabe por se acostumar com isso, com essa perda
da identidade e da privacidade. Privacidade, identidade – fatores de
inestimável importância para a saúde mental e para readaptação social.
Baratta (1999, p. 183-184) também relata que nos países capitalistas o
modelo carcerário não produz o efeito de reeducação e reinserção social do
condenado, mas, favorece sua “estável inserção na população criminosa”, através
da promoção do individualismo, da degradação do ser humano e outros fatores
contrários ao ideal contemporâneo de educação. “A educação promove o sentimento
de liberdade e de espontaneidade do indivíduo: a vida no cárcere, como universo
disciplinar, tem um caráter repressivo e uniformizante”.
A sociedade simplesmente livra-se do “marginal”, colocando-o bem
distante de sua visão, esquecendo-se que sua pena não será eterna, e de que um
dia, este voltará à sociedade, todavia, mais endurecido do que quando na prisão
adentrou.
Em sociedades fortemente marcadas com problemas econômicos e sociais,
vige a ideologia e que é preciso amparar muitos outros excluídos antes de
desenvolver mecanismos voltados para a população carcerária. Em certa
medida, é um posicionamento bem fundamentado, já que a noção de culpa
possibilita uma melhor compreensão das conseqüências do sofrimento.
Todavia, não se deve perder de vista que uma penitenciária é um segmento
46
da sociedade, e não se separa dela. Depois de cumprirem suas penas, os
prisioneiros ultrapassarão os portões que os separam da parte “livre” da
comunidade e trarão, para fora da cadeia, reflexos do que sofreram e
enfrentaram dentro de suas celas. (BARRETO, 2006, p. 593)
Ao mesmo tempo em que deseja se livrar do diferente, do delinqüente,
daquele de quem sente repulsa, a sociedade se mantém sempre atenta às questões
carcerárias já que:
À primeira vista, parece que a sociedade está alheia aos problemas do
cárcere. A sociedade não quer, isto sim, é envolver-se com a solução dos
mesmos. No entanto, é notório e significativo o fato de que as notícias de
crime e as relativas a prisões, fugas, rebeliões etc., têm espaço garantido na
mídia e atraem a atenção do grande público, provocam discussões e sobre
tais assuntos quase todos têm suas opiniões a dar. Por que motivo teria a
sociedade tanto interesse em saber das questões carcerárias, opinar sobre
elas, cobrar soluções, sem que, porém, queira envolver-se na busca de
soluções? O motivo parece claro, ainda que sob uma ótica psicanalista: os
criminosos são membros dessa mesma sociedade, pelo que provocam na
mesma interesse e sedução, ao mesmo tempo que rejeição e repulsa. (SÁ,
2007, p. 117)
Neste diapasão, sendo a própria sociedade a criadora dos “delinqüentes”,
através do mecanismo da exclusão social, cabe também a ela minorar os efeitos da
marginalização secundária, bem como, “evitar o retorno do ex-presidiário à
marginalização primária, pois, caso contrário, a marginalização secundária facilitará
o retorno à primária, daí a prática de novos crimes e, por fim, o retorno ao cárcere”.
(SÁ, 2007, p. 116)
Por conseguinte, “a reintegração social do preso se viabilizará na medida
em que se promover uma aproximação entre ele e a sociedade e esta se abrir para o
cárcere”. (SÁ, 2007, p. 117)
Para Barreto (2006, p. 592) uma reestruturação completa do cárcere apta
a dar uma condição mais digna ao recluso no cumprimento de sua pena, seria uma
das formas de minimizar os efeitos da prisonização:
A análise da violência, não como causa, mas como conseqüência de
problemas sociais, tem como implicação a responsabilidade da sociedade e
do Estado em promover transformações. Contudo, a forma como a
sociedade estigmatiza o ex-presidiário ou até mesmo um menino de rua
denota a importância de efetivação de programas que promovam a inclusão
social dos ex-presidiários na sociedade.
Um outro plano de ação estaria vinculado a transformações nos ambientes
penitenciários, não como forma de humanizar os cárceres, mas sim, como
um meio de reestruturá-los completamente. Se o sistema penitenciário não
promove modificação no interno, e, em vez disso, torna-o mais violento, é
de fundamental importância o investimento em estruturas prisionais, de
47
forma a dar condições de vida adequadas, tais como alimentação, higiene,
trabalho, não sendo retirada a dignidade do indivíduo que vivencia a
reclusão. (BARRETO, 2006, p. 592)
Portanto, o desnecessário sofrimento da pena de prisão não reduz e
jamais reduzirá o problema da criminalidade, uma vez que serve somente para
reproduzir a criminalidade formando cidadãos cada vez mais desadaptados ao
convívio social e voltados a uma personalidade delinqüente.
De outro norte, o próprio condenado não vê razão na sua readaptação,
pois sabe que nada receberá da sociedade, além de mais sentimento de repulsa e
exclusão.
Neste sentido, esclarece Sá (2007, p. 149):
A civilização, em princípio, exige renúncia da parte de todos, a todos ela
impõe formas reguladoras e restritivas de satisfação do prazer. Mas vem
então a grande pergunta: e quais os benefícios que ela oferece, como
recompensa? A quem ela os garante? Aqui está a marca da diferença
fundamental, que implica uma grande injustiça: só uma minoria, constituída
pelos ricos e opressores, por alguns abençoados pela sorte é que tem a
ganhar com as perdas sofridas, pois só eles compartilham dos benefícios,
benefícios da terra e todo o instrumental necessário para cultivá-la, do
dinheiro, do trabalho digno e salário justo, benefícios da cultura, do
conhecimento, da ciência, da filosofia, da arte, do lazer e muitos outros.
Assim, resta ao marginalizado, de um lado, as forças da repressão e do
outro, a ilusão de ideais que jamais serão alcançados:
Chega-se à conclusão de que a grande maioria de indivíduos, a dos
oprimidos, subordinada às normas da civilização que exigem renúncia à
satisfação dos instintos e ao prazer, não tendo acesso aos bens reais que
integram o patrimônio espiritual dessa civilização, não dispõe de recursos
internos que lhe possibilitem formas elaboradas de autocontrole que
promovem o fortalecimento e crescimento individuais. Fica, portanto, sujeita
unicamente às forças de repressão, de um lado, e, de outro, à ilusão dos
ideais. (SÁ, 2007, p. 151)
Neste contexto, ressalta Sá (2007, p. 161) que:
Desenvolver sobre a realidade uma visão que transcenda a bipolaridade
delinqüente – não delinqüente, explorador – explorado, pobre – rico,
ressocializado – não ressocializado, vítima – vitimário, implica,
profundamente, no âmago da subjetividade de cada um, uma capacidade
de superar esse dualismo, de superar essa cisão na descoberta e
compreensão de si mesmo, reconhecendo o próprio lado delinqüente,
explorador, vitimário e não suficientemente socializado. Feito esse
reconhecimento, feita esta integração (que inevitavelmente será fator de
crescimento interno), o indivíduo (a sociedade) não terá mais a necessidade
48
de criar grupos de excluídos e neles lançar tudo o que rejeita em si e estará,
por conseguinte, em melhores condições de reconhecer no delinqüente o
seu lado não delinqüente e socializado, ou, que seja, o seu lado que quer a
socialização (ainda que disto não tenha plena consciência) e que é digno da
mesma. Esta concepção bipolar também existe nos sentenciados, e neles
ela deve ser trabalhada e superada, com cada um de acordo com suas
peculiaridades. Alguns tendem a isolar seus aspectos ruins, projetando-os
na sociedade, no sistema prisional, na polícia. Outros (e não são poucos)
isolam seus aspectos bons, identificam-se totalmente com seu lado
delinqüente e não reconhecem mais em si nenhum valor. Tanto numa
hipótese como noutra, os reeducandos acabam por tornar mais resistente a
barreira que os separa da sociedade.
Todavia, para se alcançar uma possível reintegração social, talvez a
direção seja desviar um pouco o foco das estratégias e métodos científicos de
intervenção entre encarcerado e sociedade, e redirecioná-lo diretamente para o ser
humano e suas relações, sopesando os valores e das diferenças existentes. (SÁ,
2007, p. 161-162)
Penso então que, em termos de busca efetiva da reintegração social dos
encarcerados, um grande passo a ser dado, e a ser continuamente dado,
seria um passo, não no campo propriamente das estratégias e métodos
científicos de intervenção, mas no campo dos valores e das diferenças
sobre o homem e suas relações. Todos os atores dessa reintegração,
profissionais do sistema penal, vitimários, vítimas e sociedade deveriam
desenvolver valores e crenças que os levem sempre mais a reconhecer,
entre outras coisas, que: no forte também existe o fragilidade, assim como
no frágil também existe a força; no justo também existe o delinqüente, assim
como também no delinqüente existem virtudes; no civilizado também existe
o primitivo, assim como no primitivo existe, ao menos, a vocação para o
civilizado; no inimputável, também existe a imputabilidade, assim como em
todos os imputáveis existem muitas vezes grandes parcelas de
inimputabilidade. (SÁ, 2007, p. 161-162)
Contudo, “a prisonização assenta suas bases, suas raízes, exatamente no
processo de segregação social”. Sendo exatamente este o foco que deve ser
combatido na busca da reintegração social do condenado, porquanto, “não há como
minorar seus efeitos e melhor preparar o preso para sua reintegração social, a não
ser com a participação efetiva da própria sociedade. Daí que a prisonização, além de
um dilema para o cárcere, é um grande desafio para a sociedade”. (SÁ, 2007, p.
116)
49
5 CONCLUSÃO
Ao se analisar o fundamento da pena privativa de liberdade através da
história, verifica-se que a mesma sempre teve mais caráter retributivo que
ressocializador.
Na realidade do sistema prisional brasileiro, outro caráter também não
poderia deixar de ter a pena de prisão, apesar do velho propósito regenerador
divulgado como objetivo da mesma.
Entretanto, verifica-se que o sistema prisional brasileiro, como tantos
outros existentes em vários países do mundo, não consegue cumprir a função a que
se propõe, pois os objetivos de punição, retribuição, prevenção e regeneração do
condenado são contrapostos e, por isso, conflitantes entre si.
Neste sentido, vários são os aspectos que contribuem para ineficácia do
sistema penal, no que tange a regeneração do condenado, dentre eles destaca-se o
fenômeno da prisonização, o qual foi o principal objeto de estudo deste trabalho.
Assim, a presente pesquisa cumpriu com seus objetivos, vez que no
primeiro capítulo demonstrou a evolução histórica da pena de prisão, bem como o
objetivo que visava atingir o encarceramento em cada época histórica específica, até
chegar-se a pena de prisão contemporânea.
No segundo capítulo, através da analise da Teoria do Labelling Approach,
demonstrou-se que os tipos penais definidos em lei não são feitos para todos, mas,
apenas para uma pequena parcela, já marginalizada socialmente, dos quais se pode
destacar: pobres, negros, homossexuais, desempregados entre outros.
Neste contexto, a teoria do Labelling Approach sugere que o crime é um
ente político criado pelo legislador para atingir as condutas habituais de uma certa
classe social, e o criminoso é produto da estrutura social desigualitária em que se
vive.
Assim, o Labelling sustenta que é mais fácil alguém ser tido como
criminoso pelo que é do que pelo que realmente fez, porquanto, os estigmas
carregados pelo condenado e também por certa parcela da sociedade que ainda não
faz parte da clientela do sistema penal, mas que possivelmente fará, são peças
fundamentais dentro de um processo de criminalização previamente pensado.
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O processo de criminalização, por sua vez, na maioria das vezes, reflete
diretamente na entrada do desviado no sistema prisional, sendo que já
estigmatizado e aprisionado, o recluso começa a ser modelado pelo ambiente da
instituição total a que está submetido.
Paulatinamente, o recluso vai sofrendo uma significativa alteração em seu
comportamento psíquico-social, tornando-se uma pessoa sem autonomia, sem
identidade, submisso e incapaz de restabelecer-se aos padrões de convivência
vigente na sociedade, o que o faz com que o mesmo cada vez mais se reconheça
como membro da comunidade prisional, quase sempre assumindo a identidade
delinqüente e reincidindo no crime.
Já no terceiro e último capítulo, estudou-se os aspectos da prisonização,
bem como seus efeitos no comportamento psicossocial do condenado à pena
privativa de liberdade.
Sendo que, ficou evidenciado que na sociedade extra-murus o indivíduo é
movido por sua iniciativa, pela sua autonomia, pelo seu poder de decisão, porém, o
método adotado pelo sistema prisional para ressocialização do recluso é o da
criação de um novo indivíduo com características passivas e submissivas,
impedindo-o de exercer a autonomia necessária à sua sobrevivência na sociedade.
Ressalte-se, ainda, que além da perda de certas capacidades que são
essenciais ao ser humano, pode-se dizer que ao deixar a prisão para retornar a vida
social, o recluso enfrenta vários problemas, dentre os quais se pode destacar: a falta
de apoio do Estado - no que tange o acompanhamento da reinserção do indivíduo -,
a falta de apoio da família e dos amigos, e, sobretudo, o estigma de ex-condenado
que ficará rotulado na vida do egresso impedindo-o, muitas vezes, de conseguir um
emprego e reconquistar sua dignidade como cidadão de uma sociedade que atribui
ao ser humano o valor dos bens que o mesmo possui.
Assim, o principal efeito da prisonização é a alteração na estrutura
psíquica e social do recluso, fazendo com que o mesmo retorne à sociedade com
mais estigmas do que quando na prisão adentrou, havendo, consequentemente,
uma redução das oportunidades de uma vida digna, que possivelmente resultará
numa reincidência ao crime, eis que nele já estão incorporados os costumes do
cárcere.
Contudo, a pena privativa de liberdade deveria ser medida de última
instância, apenas para criminosos de alta periculosidade, pois ninguém aprende a
51
ser melhor sofrendo. O sentimento de vingança é o que certamente dará força ao
recluso para devolver a sociedade todo mal que recebeu na prisão.
52
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Josiane Aparecida da Silva - Universidade do Extremo Sul