Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
MAL-ENTENDIDOS: arte contemporânea, vida cotidiana e experiência
estética
MISUNDERSTANDINGS: contemporary art, everyday life and aesthetic
experience
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Eduardo Antônio de Jesus
Resumo: O texto toma as obras de Rivane Neuenschwander para refletir sobre as
experiências estéticas que se dão no trânsito entre os espaços institucionalizados
da arte e a vida cotidiana. Aproximamos as obras da artista da noção de
“literatura menor” desenvolvida por Deleuze e Guattari em torno da produção
literária de Franz Kafka. Para os autores, Kafka produziu uma “literatura menor”
que aciona aspectos políticos e revolucionários. Ao construirmos essa
aproximacão nos interessa ver como as obras de Rivane produzem
desterritorializações que nos permitem perceber a vida cotidiana como território
de intensas experiências estéticas. Esse trânsito reverbera de forma política como
um forte processo de resistência aos modos como o capitalismo cognitivo, através
dos diversos sistemas midiáticos, assedia nossa produção de subjetividade,
encaminhando-a para formas padronizadas e controladas de se inserir no mundo
Palavra chave: Experiência estética. Arte contemporânea. Vida cotidiana.
Abstract: The text takes the Rivane Neuenschwander´s works to reflect on aesthetic
experiences that occur in transit between the institutionalized spaces of art and
everyday life. We approach the artist´s work to the minor literature notion
developed by Deleuze and Guattari around the literary production of Franz Kafka.
For the authors, Kafka produced a " minor literature" that triggers political and
revolutionary aspects. In building this approach we are interested to see how the
works of Rivane produce deterritorializations that allow us to perceive everyday
life as an area of intense aesthetic experiences. This influence reverberates in a
political way as a strong process of resistance to the ways in cognitive capitalism
through the various media systems, harasses our production of subjectivity,
forwarding it to standardized forms and controlled to enter the world.
Keywords: Aesthetic experiences. contemporary art. Everyday life.
Listas de supermercado escritas a mão em diversos tipos de papel, as vezes bem pequenos,
outros grandes, rasgados ou recortados grosseiramente ao acaso. Nestes pedaços de papel são
utilizadas canetas com traços, cores e tipos diferentes. Esfereográfica ordinária que se encontra em
qualquer lugar, de traço mais grosso ou mais fino. Canetinha quase sem tinta. As caligrafias
distintas, os vestígios no papel e os produtos listados. Recolhidas de diversos supermercados em
Londres entre junho de 2013 e maio de 2014, estas listas de compras, organizadas em torno das
estações do ano, compõem a obra “Colheita” de Rivane Neuenschwander, que integrava a
exposição “mal-entendidos”.
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Retomo as obras de Rivane Neuenschwander provocado por essa exposição e por outros
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trabalhos da artista apresentados na exposição coletiva “Do objeto ao mundo” . Tomo, mais uma
vez, o caminho quase tortusoso que tenta aproximar experiências estéticas e vida cotidiana,
começando na arte contemporânea, nos espaços institucionais da arte, para chegar ao domínio da
vida ordinária. Anteriormente, a questão despertada por algumas obras, entre elas as de Rivane, era
perceber como a arte poderia nos reconduzir ao domínio da vida cotidiana, mas com uma
percepção alargada das potentes experiências estéticas do mundo ordinário. Sem epifanias e
acionando uma resistência silenciosa ao grande alarido típico dos meios de comunicação –
sintonizados no tom espetacular típico da vida contemporânea – essas obras parecem nos remeter
do espaco expositivo à vida cotidiana, mas compreendendo-a como espaço de intensas experiências
estéticas e resistência.
Era essa a formulação na qual me detive durante um certo tempo e que graças a um potente
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conjunto de formulações e comentário desdobrou-se em novas direções. A intensidade do diálogo
e a visita as duas exposições me fizeram retomar a reflexão para circunscrevê-la em relação a
noção de “literatura menor”, extrapolando-a para um conceito mais aberto de “arte menor”. Essa
nova direção mantém a questão inicial: a relação entre experiência estética, arte contemporânea e
vida cotidiana, como um processo de resistência diante das formas espetaculares que assediam as
subjetividades. Anteriormente havíamos tomado, de forma ainda superficial, as reflexões de
Deleuze & Guattari (2014) em torno da noção de literatura menor que, derivada e expandida, tornase agora o principal vetor para a construção da noção de arte menor, que acreditamos caracterizar
algumas obras de Rivane. Naquele momento, a noção apareceu somente mais ao final do texto,
num lampejo do que agora se torna a articulação mais central “para pensar essas experiências
estéticas que se dão nos contextos e espaços institucionalizados da arte, mas nos conduzem para
fora em direção aos espaços cotidianos da vida ordinária”. Assim, acreditamos que as experiências
estéticas acionadas por algumas obras nos permitem ativar outras possibilidades de inserção no
mundo, nos abre para a invenção de possíveis, como afirma Suely Rolnik:
A especificidade da arte enquanto modo de expressão e, portanto, de produção de
linguagem e de pensamento é a invenção de possíveis – esses ganham corpo e se
apresentam ao vivo na obra. Daí o poder de contágio e de transformação de que é
portadora a ação artística. É o mundo que está em obra por meio dessa ação.
(ROLNIK, 2008, p. 27)
Gerando outras formas de inserção no mundo e ativando novos possíveis a produção
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artística acaba por criar uma espécie de resistência a certa “padronização dos possíveis”. No
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território das “mundos-imagens” do consumo as saídas parecem sempre nos enviar para um
mesmo lugar cercado pelo espetáculo midiático tanto em suas formulações ligadas aos meios de
comunicação de massa e de traço mais Debordiano, quanto as horizontais (mass self communication
, como afirma Manuel Castells), essas que alimentamos com nossas imagens nas redes sociais, bem
como em seus cruzamentos. Naturalmente que sabemos de toda a potência existente nas
apropriações, contratos e passagens entre os processos de subjetivação ativados na recepção dessas
imagens e a vida social. Coletiva e individualmente essas imagens-mundo, sem dúvida servem a
difusão do consumo e dos apaziguamentos de todas as contradições contemporâneas, mas apesar
disso, sempre há algo que escapa, que pela intensidade dos sentidos em jogo na recepção, reverbera
de outro modo. Não há caminho único na contemporaneidade, as relações entre esses significados
se colocam em termos de multiplicidades e agenciamentos expandidos nos dinamismos da vida
social.
1. mal-entendidos
Esse era o nome da exposição panorâmica de Rivane Neuenschwander no MAM-SP
realizada entre setembro e dezembro de 2014. O nome deriva de uma das obras expostas: um copo
cheio de água, no qual flutua um ovo. Devido a refração, a parte de baixo, imersa na água, fica
imensa enquanto a de cima continua no mesmo tamanho, provocando um desencontro entre ambas
as partes. Para além do simples truque ótico, “Mal-entendido” (2000) exposto em uma pequena
prateleira no espaço expositivo, aponta para outras questões bem mais complexas. Trata-se de
“uma demonstração de que mesmo materiais aparentemente transparentes como o vidro e a água
podem distorcer nossa boa percepção da realidade. A pergunta é: existe, de fato, uma boa
percepção e representação da realidade?” (PEDROSA, 2014).
A questão apontada pelo curador Adriano Pedrosa atravessa a exposição e constrói um
potente tensionamento entre sistemas de linguagem e formas de representação apontando falhas e
lacunas que tornam os processos de significação abertos ao Outro e ao acaso. Tudo parece pulsar
numa vitalidade silenciosa, aproximando os códigos de linguagem, organizados de forma mais
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rígida e geométrica, do erro, da falha e do mal-entendido. Paira a dúvida e a instabilidade de
sentidos dos códigos da linguagem minados pelas forças do afeto, da vida, do acaso e do orgânico.
Mesmo porque o Outro, convocado a participar da própria elaboração da obra, coloca em jogo seu
próprio desejo, como em “Primeiro amor”. Nesta obra o “visitante é convidado a descrever seu
primeiro
amor
para
um
desenhista
da
polícia
especialista
em
retrato-falado”
(NEUENSCHWANDER, 2010, p. 150). Tal qual a música (“meu primeiro amor tão cedo acabou e
só a dor deixou nesse peito meu”), as imagens nebulosas e fugidias do primeiro amor, na traição da
memória e de nossas próprias construções, vai ganhando forma no desenho e nas sucessivas
perguntas e descrições, um jogo entre vivido e imaginado, entre a experiência e o trabalho dos dias,
entre fabulação e realidade. Lisete Lagnado comenta essa implicação do Outro nas obras de Rivane:
A maioria das obras depende da implicação pessoal de colaboradores que Rivane
consegue mobilizar sem nenhum outro capital que a motivação gerada por seu
trabalho. (…) Parte do serviço dela consiste em coordenar indivíduos que lhe
emprestam de sua energia vital, um eufemismo da ciência biológica para não nomear
diretamente o desejo. Subordinados a suas instruções, os cooperantes colocam suas
competências à disposição e assim o trabalho de um vai nutrindo o do outro.
(LAGNADO, 2011, p. 14).
Esse compartilhamento cúmplice entre sujeitos e obras atua de forma intensa na construção
dos sentidos e sobretudo nas sensíveis reverberações que provocam nos processos de subjetivação,
especialmente por tornarem os sistemas de linguagem ainda mais falhos e lacunares. Em
“Esculturas involuntárias (atos de fala)” (2001-2010) o que vemos são pequenos objetos “feitos por
diversas pessoas durante conversas em bares e restaurantes” (NEUENSCHWANDER, 2010, p.
140). Esses pequenos vestígios também funcionam como mapas afetivos construídos nos
momentos de distração, na fluidez do espaço amistoso dos encontros e conversas. Paulo
Herkenrhhoff comenta a obra e destaca seu lugar na articulação das falhas da linguagem:
A falta de destino social desses objetos-situação parece ter sido corrigida por
Neuenschwander ao trazê-los para a arena da arte. Ali enfrentariam a conclusão de
Maurice Blanchot de que “a palavra sempre já fracassou em capturar o que nomeia.
(HERKENHOFF, 2010, p.76)
Talvez a construção dos sentidos passe mais pelo sensível, pelo envolvimento direto na
obra sabendo que não há sistema de linguagem que consiga abordar a totalidade do que somos e
sentimos, como mostrou Herkenhoff ao citar Blanchot. Tudo aberto ao encontro com o Outro e
com seus processos de subjetivação, sempre ativando o sensível. Assim os “atos de fala” e outros
sistemas de linguagem surgem na exposição como os alfabetos, organizados rigidamente em linhas,
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mas feitos com temperos, de Açafrão a Zattar em “Alfabeto comestível” (2002). As linhas de
tempero que compõem cada um dos 26 paineis podem nos permitir escrever um outro texto, muito
mais lacunar e aberto para as mais diversas narrativas e paladares. O alfabeto também é o ponto de
partida para “Palavras cruzadas” (2001) que dividia a sala com os quadros de temperos e
condimentos. Em pequenas caixas de papelão no chão, como construções labirínticas, pousam
limões e laranjas desidratados com letras do alfabeto esculpidas. São quatro conjuntos de letras do
jogo palavras cruzadas (Scrabble) que permitem aos visitantes comporem palavras com as letraslaranja. As duas obras que ocupavam a primeira sala da exposição apontam para lacunas e falhas
nos sistemas de linguagem. Como escrever com os temperos? Como usar esse alfabeto? É preciso
acionar os sentidos (olfato, visão e tato) para se expressar nesse sistema. As laranjas e limões, por
outro lado, nos permitem – nas rígidas composições geométricas e labirínticas onde estão dispostos
– escrever e expressar livremente. Essa dimensão ativa da participação do Outro seja um visitante,
os autores de obras que são incorporadas a exposição ou um funcionário do museu, ativa as obras
levando-as para o território do afeto e da vida.
Quando olhamos para as listas de compra de “Colheita” ou os pequenos volumes de papel
retorcidos em “Esculturas involuntárias (atos de fala)” parece que vemos uma cartografia do Outro.
Os pontos são os possíveis momentos compartilhados e a própria vida. Fabulação do Outro na vida
cotidiana possibilitado pela arte como um mapa aberto da história de cada um de nós e de nossos
afetos. Sempre incompleta, é em torno dessa construção repleta de possíveis erros e falhas, lacunar
por excelência, que nos perguntamos sobre as potências da experiência estética na vida cotidiana.
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A vida faz parte das obras e ampliam o sentido dos encontros acionando a memória de outras
experiências para que as obras sejam sensivelmente percebidas e experimentadas. O jogo entre as
experiências – aquelas vindas da arte e de seus espaços institucionais e as mais ordinárias e
cotidianas – atuam na construção dos sentidos da obra, trata-se de uma desterritorialização. Não
estamos exclusivamente no território da arte, mas numa linha de fuga. Nesse contexto o sensível
tem uma centralidade na constução dos sentidos das obras, como nos mostra Jean-Luc Moriceau e
Isabela Paes ao comentarem sobre as relações entre o sensível e o sentido:
Nosso contato com o sentido, ou o nosso trabalho de construção de sentido, nasce a
partir de nossa abertura ao mundo, nossa sensibilidade, nossa capacidade de sermos
afetados, se origina e toma forma ao tocar de nossas sensações, mas ainda mais no
universo do sensível. (MORICEAU e PAES, 2014, p. 110).
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A questão central nessas obras de Rivane Neuenschwander está justamente nessa
capacidade de sermos afetados. É o modo como as obras nos solicitam ver que, por exemplo, cada
uma das listas de compra traz consigo fragmentos de muitas vidas revelando a nossa própria e a
potência que essa banal lista de compras pode trazer para revelar momentos da vida, contextos,
experiências e subjetividades. Um caminho de volta da galeria ou museu aos, supostamente,
insignificantes momentos da vida cotidiana, onde, silenciosamente, nada parece significar ou
acontecer. Assim nos deslocamos do mais programado e conseguimos sensivelmente perceber que
é justo na lisura do cotidiano que efetivamente damos sentido a vida e produzimos uma
subjetividade descolada dos meandros, quase deterministas, do mercado e do capital. Aqui também
alçamos uma linha de fuga e escapamos dos esquematismos de uma produção de subjetividade
programada e fechada para termos outras formas de inserção no mundo. Experimentar as obras de
Rivane é adentrar-se nesse território no qual a linguagem escapa, tornando-se falha e lacunar, e
onde nossos desejos são implicados como vetor sensível para a produção de sentidos e de
encontros.
2. a arte menor
A imagem dialética à qual nos convida Benjamin consiste em fazer surgirem os
momentos inestimáveis que sobrevivem, que resistem a uma organização de valores
que empobrece a experiência, fazendo-a explodir em momentos de surpresa. (DidiHuberman, 2011, p.126).
A produção artística contemporânea traz em suas abordagens, estratégias e procedimentos
as questões e tensionamentos do mundo. Como afirma Suely Rolnik: “não há então porque
estranhar que a arte se indague sobre o presente e participe das mudanças que se operam na
atualidade” (ROLNIK, 2008, p. 27,). Tomando a produção artística podemos esboçar sensações,
sentidos e significados típicos de nosso tempo, minado, desde os anos 70, pelas formas sofisticadas
do capitalismo cognitivo ou cultural que se alimenta da criação, do conhecimento e das políticas de
subjetivação. Nesse conexto, algumas vezes uma obra pode manejar pulsações de vida com
tamanha intensidade que faz com que se torne uma singular forma de perceber a arte como
eminente desterritorialização, experiência que para ativar sua potência precisa nos deslocar, gerar
vetores de saída e linhas de fuga.
As obras de Rivane Neuenschwander solicitam a implicação direta dos sujeitos em sua
construção, algumas vezes no momento da exibição, como em “Primeiro amor” e em outras no
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processo construtivo como “Esculturas involuntárias (atos de fala)”. O Outro, com o seu desejo e
singularidade, bem como as complexas relações que desprende de sua presença habitam as
multiplicidades acionadas nas obras. Por isso, sempre há uma tensão entre a organização formal
geométrica e o que vem do erro e do acaso desestabilzando sistemas de linguagem que alterados,
nos permitem colocar a linguagem em outra voltagem, mais aberta a ação do Outro, como afirma
Pedrosa:
Tudo parece emergir de uma crise da representação e seus códigos, da linguagem e
seus alfabetos, e de um desejo de desenvolver alternativas que, ainda que não
descartem a grade (seja ela geométrica, arquitetônica, científica ou linguística),
passem também pelo erro, o orgânico, o acaso, o afeto, a vida. (PEDROSA, 2014,
s.p.).
O deslocamento e o tensionamento provocado pela presença do Outro redimensiona os
processos de construção de sentido da linguagem fazendo-os se abrirem para o mundo perdendo
com isso certa precisão e o desejo totalizante de tudo representar. Aqui o fracasso habita a
linguagem e a recoloca em contato conosco, para juntos duvidarmos das “boas representações da
realidade”.
Esse gesto que recoloca a linguagem em uma situação de imprecisão e risco, presente nas
obras de Rivane, pode nos levar a pensá-las como manifestações de uma arte menor, derivando,
mais uma vez, das reflexões de Deleuze e Guattari (2014). Mas o que seria uma arte menor? Será
que o conceito desenvolvido pelos autores para dar conta dos rizomas e multiplicidades que
caracterizam a obra de Kafka podem nos servir para caracterizar obras contemporâneas, como as de
Rivane? Será mesmo que essa arte menor pode se tornar uma linha de resistência em relação ao
modo como as políticas e os poderes, expressos sobretudo no domínio das imagens, assediam
nossas subjetividades? Para empreendermos essa aproximação, é importante retomarmos as
reflexões originais dos autores em torno da obra de Franz Kafka.
Originalmente lançado em 1975, o pequeno livro sobre literatura se situa entre duas
importantes obras de Deleuze e Guattari e funciona como campo de experimentação e de
desenvolvimento de conceitos que seriam centrais para as obras posteriores. Assim entre “O antiÉdipo” (1972) e “Mil platôs” (1980) os autores lançam “Kafka: por uma literatura menor”.
Conceitos centrais na obra dos autores como rizoma – que aparece pela primeira vez logo no início
de “Kafka” (“como entrar na obra de Kafka? É um rizoma, uma cova.”) – e agenciamento (que dá
nome a um dos capítulos do livro) fazem com que esse livro assuma um lugar de destaque nas
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obras da dupla. Mas não apenas por isso, mas sobretudo pela passagem de uma “postura crítica,
denunciativa, que é a de ´O anti-Édipo´ em face da psicanálise, para uma posição afirmativa, a de
seu próprio procedimento, singular, testando-a no confronto com uma grande obra literária”
(DOSSE, 2010, p. 202). As características da obra de Kafka em suas multiplicidades e
tensionamentos, para além do texto propriamente dito, é a matéria pela qual Deleuze e Guattari
refletem sobre a relação entre teoria e literatura. Como nos mostra Schollhammer, a questão que se
coloca diz respeito a uma abordagem mais experimental tanto da literatura quanto da teoria literária:
(…) poderíamos dizer que não se trata, para Deleuze e Guattari, de compreender os
textos literários nem de interpretá-los e procurar o que significam, mas de descobrir
como funcionam, o que podem fazer, assim como se descobre o funcionamento de
uma máquina, desmontando-a para logo remontá-la teoricamente, evidenciando sua
real performance. (SCHOLLHAMMER, 2002, p. 60)
Esse traço da obra de Deleuze e Guattari (2014) nos interessa bastante por ativar uma
espécie de protocolo experimental na abordagem da literatura de Kafka trazendo para o primeiro
plano o funcionamento da “máquina” e rompendo com os “cânones consagrados pela tradição,
opondo a ela a força criativa de uma literatura dita menor” (DOSSE, 2010, p. 203). O protocolo
experimental desenvolvido por Deleuze e Guattari em Kafka torna-se um horizonte a ser
perseguido para a abordagem de obras de arte no contexto contemporâneo.
O que estrutura o livro de Deleuze e Guattari, além da postura mais ampla de abordagem da
máquina Kafka ligada a um protocolo experimental (“não acreditamos a não ser em um
experimentação de Kafka, sem interpretação nem significância, mas somente protocolos de
experiência”) é a construção da noção de literatura menor. Na obra são destacadas as três
principais características das literaturas menores, tomando as obras de Franz Kafka. Listamos e
comentamos essas características a seguir, para vermos como poderemos aproximar esse complexo
rizoma conceitual do domínio da arte contemporânea. Primeiramente os autores tratam da
desterritorialização abordando a literatura judia em Varsóvia ou em Praga. Para Deleuze e Guattari,
“uma literatura menor não é a de uma língua menor, mas antes a que uma minoria faz em uma
língua maior. Mas a primeira característica, de toda maneira, é que, nela, a língua é afetada de um
forte coeficiente de desterritorialização” (DELEUZE e GUATTARI, 2014, p. 35).
Nas proposições maquínicas ou teoremas de desterritorialização, os autores apontam no
primeiro teorema que “jamais nos desterritorializamos sozinhos, mas no mínimo com dois termos:
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mão-objeto de uso, boca-seio, rosto-paisagem. E cada um dos dois termos se reterritorializa sobre o
outro” (DELEUZE e GUATTARI, 2012, p. 45). Schollhammer nos mostra como os autores
caracterizam a desterritorialização na obra de Kafka:
Mas como entender esta prática motivada por “um forte coeficiente de
desterritorialização”? No caso histórico de Kafka, trata-se de um escritor que escreve
em alemão como parte de uma minoria judia em Praga e, portanto, é
desterritorializado triplamente. Não escreve em tcheco, a língua da sua pátria, não
escreve em iídiche, a língua da sua comunidade, mas escreve num alemão deficitário,
deslocado da língua maior. Assim, a desterritorialização da língua de Kafka expressa
a ruptura do seu compromisso nato com as ideologias de uma língua materna, estofo
da consciência nacional e conteúdo de uma identidade orgânica que naturalmente
representa. (SCHOLLHAMMER, 2002, p. 63)
A desterritorialização aqui ativa esse completo impasse que faz da literatura de
Kafka “algo de impossível: impossibilidade de não escrever, impossibilidade de escrever em
alemão, impossibilidade de escrever de outro modo” (DELEUZE e GUATTARI, 2014, p. 35).
Assim compreender essa primeira característica da literatura menor, esse “alto coeficiente de
desterritorialização” é perceber que a língua, a linguagem e seus usos produzem um modo
específico de estar no mundo, um modo de experimentar as linhas de fuga desta
desterritorialização, para reterritorializar novamente. Se “(…) cada um dos dois termos se
reterritorializa sobre o outro”, desdobrando a reflexão de Deleuze e Guattari no primeiro teorema,
dois possíveis termos em Kafka poderiam ser: língua-pátria, como percebemos em Schollhammer.
Esses dois podem se abrir para todo um sistema de “reterritorializações horizontais e
complementares” entre língua e pátria ampliando sensivelmente os modos de abordagem graças as
reterritorializações ocorridas. Tudo em movimento.
De certa forma podemos perceber o mesmo gesto em algumas obras de Neuenschwander.
Distante dos processos formais de elaboração fechados em si e ligados a tradição da arte,
excessivamente centrada na autoria, as obras da artista parecem precisar do Outro e de seu desejo
para se construírem. Trata-se de uma língua incompleta, menor, deslocada do domínio principal da
arte, porque precisa intensamente do envolvimento do Outro e de seus processos de subjetivação
para ativar suas potências. Existe um enorme coeficiente de desterritorialização nesses processos de
formalização das obras, que deslocam para o Outro um importante atributo na própria existência da
obra, como por exemplo em “Primeiro amor”, que descrevemos anteriormente. A obra parece
existir para criar um processo de desterritorialização entre o real vivido e o fabulado, ampliando
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sensivelmente o território da arte que, de forma sutil, tangencia a própria vida, criando uma potente
desterritorialização da própria arte e de sua linguagem para as tramas subjetivas de nossa existência.
Retomando as reflexões de Deleuze e Guattari em torno da literatura menor, a
segunda característica apontada pelos autores é “que nelas tudo é político” (DELEUZE e
GUATTARI, 2014, p. 36). Para os autores “o que nas grandes literaturas permance oculto e obtuso,
na literatura menor torna-se operação em plena luz, mostrando o que pode ser dito e o que não
pode” (DELEUZE e GUATTARI, 2014, p. 37). Todo um entrelaçamento entre individual e
coletivo se constrói nesse momento ativando as questões políticas da literatura menor. Trata-se,
como afirmam os autores ao comentarem a obra de Kafka, de um programa político “que faz com
que cada caso individual seja imediatamente ligado à política” (DELEUZE e GUATTARI, 2014, p.
37).
Nas obras de Rivane não há explicitamete, numa primeira visada, um traço político ou
engajado especialmente se confrontamos com os atuais rótulos de “arte política” que animam os
circuitos das grandes exposições. O que percebemos em suas obras é muito mais “políticas de
subjetivação” (ROLNIK, 2008, p.29), ou mesmo uma política da resistência que ao
desterritorializar as obras, aproximam-se de nossas inquietações diante da vida. Não há traço
espetacular nas obras e tampouco nos materias usados. Tudo oscila entre uma intrigante
simplicidade e a potência ativada quando experimentamos as obras, que se desdobram em nossos
processos de subjetivação e nos aproximam ou nos reenviam, de forma intensa, para a vida
cotidiana, mas transformados. Ao contrário de nos ligarmos nas sensações mercantis padronizadas
e controladas que o capitalismo cognitivo nos oferece – com seus mundos de referência para que
nos filiemos a eles através de suas imagens sensacionais – nos retiramos para a vida cotidiana, e em
tom mais baixo, vemos que ali, distante das epifanias programadas do sistema midiático, ativamos
experiências estéticas transformadoras que pelas sua características individuais nos encaminham
para o coletivo. As políticas de subjetivação, como afirma Suely Rolnik, “mudam com as
transformações históricas, pois cada regime depende de uma forma específica de subjetividade para
sua viabilização no cotidiano de todos e de cada um”, reforçando assim, como Deleuze e Guattari
na abordagem de Kafka, a passagem do individual ao coletivo, traço eminentemente político.
A terceira característica desdobra-se da segunda, trata-se do agenciamento coletivo de
enunciação e nos mostra que “tudo toma um valor coletivo (...) o que o escritor sozinho diz já
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constitui uma ação comum, e o que ele diz ou faz é necessariamente político, mesmo que os outros
não estejam de acordo.” (DELEUZE e GUATTARI, 2014, p. 39). Para os autores “menor não
qualifica mais certas literaturas, mas as condições revolucionárias de toda literatura no seio daquela
que se chama grande (ou estabelecida)”. O complexo conceito de agenciamento desenvolvido por
Deleuze e Guattari aponta para uma certa junção entre um conjunto de relações materiais e um
regime de signos. O agenciamento, pode assim ser compreendido, pela expressão (agenciamento
coletivo de enunciação) e pelo conteúdo (agenciamento maquínico). Podemos citar como exemplos
de agenciamentos coletivos de enunciação, entre outros, os agenciamentos midiáticos, familiar,
judicial e escolar.
Em “Primeiro amor”, “Colheita” ou “Esculturas involuntárias (atos de fala)”, obras de
Rivane Neuenschwander que abordamos anteriormente, a passagem do individual ao coletivo e o
manejo dos agenciamentos coletivos de enunciação é bastante nítido. Todos nós nos lembramos,
mesmo que vagamente, do primeiro amor, mas ao confrontar o agenciamento judicial do policial
especialista em retratos falados que, de dentro do espaço expositivo, diante de toda a audiência
presente dá forma aos vestígios de nossa memória, toda a forma individual abre-se para o coletivo.
De alguma forma, o mesmo ocorre em “Colheita”. Só conseguiremos perceber a cartografia do
Outro que as listas desenham se nos voltarmos para as nossas próprias listas de compras ou para o
sentido que uma lista de compras pode ter ao pensarmos sobre as dinâmicas da vida cotidiana. As
“Esculturas involuntárias (atos de fala)” também orbitam nesta mesma passagem do indivual ao
coletivo. Os pequenos volumes de papel, os canudinhos ou tampas de garrafa retorcidos, bem como
as dobraduras de papel entre outras peças nos conduzem imediatamente para conversas
despretenciosas em bares, encontros com amigos, momentos que todos nós, de alguma forma, já
experimentamos. Mais uma vez o agenciamento coletivo de enunciação assume o lugar do sujeito e
aponta para o coletivo, para aquilo que somos em conjunto.
3. resistências e políticas
O aspecto imediatamente político da literatura menor não tem nada a ver com seu
conteúdo ideológico, mas com sua performance enquanto uma multiplicidade de atos
de fala que forma uma máquina expressiva. (SCHOLLHAMMER, 2001, p. 64)
Construir a noção de arte menor – desdobrando as reflexões de Deleuze e Guattari
em torno das obras de Kafka e de sua “literatura menor” – talvez seja um empreendimento teórico
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grande demais para o exíguo espaço deste ensaio, mas trata-se de um gesto de aproximação, ainda
tímido que vem se desdobrando e ganhando precisão e densidade. O que nos interessa
sobremaneira, antes de qualquer coisa, é assumir o mesmo gesto de Deleuze e Guattari na
abordagem de Kafka, escapando dos cânones e dos significantes, para perceber a potência da
máquina expressiva e construir um protocolo experimental na abordagem das obras. Aqui nos
interessa centralmente esse caminho que nos tira do cubo branco e nos faz, inevitavelmente,
ancorar o sentido das obras nas multiplicidades da vida cotidiana. A lista de compras, os pequenos
volumes “escultóricos” feitos de canudinhos ou as estranhas imagens do primeiro amor apontam
para uma uma máquina, potente o suficiente, para fazer ecoar a voz do Outro na arte
contemporânea. A arte menor, em nossa construção ainda precária e inicial, é essa potência que nos
desloca dos cânones da arte para fazer instaurar em nós outras formas mais abertas de se inserir no
mundo, como se fosse uma espécie de “solidariedade ativa” (DG, 37) que nos permite produzir
formas de subjeitividade mais libertárias e resistentes aos apelos do capital.
A proximidade com a vida cotidiana ou mesmo sua inserção em torno das formas de
perceber e experimentar as obras nos fazem construir outros universos de referência menos
espetaculares e menos midiatizados. O traço de uma experiência estética que para ser acionada pela
arte precisa inevitavelmente de ter um lastro nas experiências cotidianas e ordinárias. Uma não
opera sem a outra, a máquina expressiva típica de algumas obras de Rivane traz esses estilhaços da
vida cotidiana e a ela nos conduz novamente. Agora pensamos que todas as nossas listas de
compras são, na verdade, retratos dos momentos que vivemos e dos encontros que, de alguma
forma, dão sentido a nossa existência. Para Martin Seel as experiências estéticas ativadas pela arte
e aquelas da vida cotidiana estão intimamente tramadas:
A experiência da arte vive da experiência fora da arte – e, com referência a essa
última, vive de experiências estéticas nos espaços da cidade e do campo, estas sendo
experiências em que as coordenadas do savoir-vivre e confiança no mundo estão
embaralhadas. Assim, quando é uma questão do âmbito da experiência estética, do
seu alcance, não podemos parar nas artes como se fossem a verdadeira realização da
experiência estética. A experiência estética não conhece realização canônica
verdadeira. Ela encontra realização em sermos atraídos para as possibilidades de
percepção e compreensão, dentro e fora da arte, e descobre que estas possibilidades
não podem ser esgotadas, controladas ou determinadas. (SEEL, 2014, p. 36)
Talvez essa seja a passagem que as obras de Rivane nos mostram: da arte para fora dela e
vice-versa. Território da arte, mas repleto de intensas linhas de fuga operando potentes
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tensionamentos e desterritorializações nos modos como percebemos a arte e a relacionamos com
nosso entorno e nossa vida. Nesse trânsito entre arte e vida cotidiana, entre os espaços da arte e os
da vida ordinária, também residem as formas políticas que apontam para processos de resistência
aos apelos mercantis do grande circuito midiático. As obras reforçam a singularidade dos processos
de subjetivação, apontam, como Kafka, para essa comunidade porvir, essa que parece se colocar,
cada vez mais, “em condição de exprimir uma outra comunidade potencial, de forjar os meios de
uma outra consciência e de um outra sensibilidade” (DELEUZE e GUATTARI, 2014, p. 37). Essa
outra consciência, certamente, percebe que as experiências estéticas, em seu trânsito entre arte e
vida cotidiana, pode assumir contornos mais políticos e tão revolucionários quanto a literatura
menor de Kafka, vista por Deleuze e Guattari. A arte menor se coloca como uma noção que nos
permite construir abordagens da arte contemporânea, seguindo os caminhos abertos por Deleuze e
Guattari, para além de sua língua própria e de seu repertório específico, para construir um
protocolo experimental que veja a arte e as experiências estéticas em deslocamento como uma
potência da própria vida ou como afirmava o artista francês Robert Filliou: a arte é o que faz a vida
ser mais interessante que a arte.
1
Doutor, Professor do Programa de Pós Graduação em Comunicação Social da PUC Minas,
[email protected]
2 Exposição realizada no Palácio das Artes em Belo Horizonte, Minas Gerais, entre 12 de dezembro de 2014 a 08 de
março de 2015.
3O relato extremamente detalhado e bem cuidado apresentado na último XVIII Encontro da Compós produzido pela
Professora Ângela Cristina Salgueiro Marques e seus orientandos Thales Vilela Lelo e Ana Karina de Carvalho Oliveira
foi a principal motivação para retomada da questão.
4Retomamos aqui a expressão de Suely Rolnik presente em seu texto Geopolítica da cafetinagem. “(...) é exatamente por
causa de nossa crença no mito religioso do neoliberalismo que os mundos-imagens que esse regime produz se tornam
realidade concreta em nossas próprias existências” (ROLNIK, 2008, p. 33).
5 “De repente, atentados pipocam por todos os lados: indivíduos se apóiam na parede que exibe fitas adesivas horizontais;
tropeços acabam dispersando os montículos de pimenta-do-reino que pontuavam o espaço (Attachment); bacias e copos s
o f r e m esbarros, derramando seus líquidos (Continente). Dirijo-me a cada pessoa, explicando a natureza da obra e
exigindo mais cautela. Ninguém me dá ouvidos. A situação escapa de meu controle; a exposição desaba. Levo o relato
dessa falta de tino do público em relação ao trabalho da artista e eis a resposta que me chega: “É assim mesmo. A vida faz
parte. Esta é a medida do trabalho”. E Rivane continua conversando tranqüilamente com seus convidados” (LAGNADO,
2011, p. 09)
Referências
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Kafka: por uma literatura menor. Belo Horizonte:
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DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. São Paulo:
Editora 34, 2012.
DIDI-HUBERMAN, Georges. Sobrevivência dos vaga-lumes. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2011.
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2010.
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Magno Camargos e FILHO, Jorge Cardoso. Experiência estética e performance. Salvador:
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NEUENSCHWANDER, Rivane. Um dia como outro qualquer. Rio de Janeiro: Editora Cobogó,
2010
PEDROSA,
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Rivane
Neuenschwander:
mal-entendidos.
Disponível
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http://mam.org.br/exposicao/rivane-neuenschwander/. Acessado em 15 de setembro de 2014.
ROLNIK, Suely. Geopolítica da Cafetinagem. IN: FURTADO, Beatriz e LINS, Daniel. Fazendo
Rizoma. São Paulo: Hedra, 2008
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Deleuze e Guattari. IN: Ipotesi (UFJF), Rio de Janeiro, v. 5, n.2, p. 59-70, 2002.
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