LIVRO: Como elaborar projeto de pesquisa: linguagem e método.
Ed. FGV, 2008.
Autores: Fabio Siqueira, Roberto KarlmeyerKarlmeyer-Mertens, Mario Fumanga e Claudia
Benevento.
CAPÍTULO I: DO CONHECIMENTO CIENTÍFICO E PESQUISA ACADÊMICA
Nenhuma pessoa razoável duvidará da verdade objetiva ou da
probabilidade objetivamente fundamentada das teorias maravilhosas
da Matemática e das Ciências naturais. Aqui não há em geral
margens para “opiniões”, “pareceres”, “posições particulares”. Se as
houver, apesar disto, em casos singulares, é sinal de a ciência ainda
não ter chegado a constituir-se, mas encontrar-se ainda em via de
constituição e é geralmente considerada como tal.
HUSSERL
1.1 ATRAVÉS DA METODOLOGIA AO CONHECIMENTO
Este texto começa com algo que deve ser dito previamente: qualquer
compreensão que se faça de metodologia não aponta para esta disciplina
como um fim em si mesma, mas como um meio para fins. Esta consideração
parece extemporânea e sem o devido preparo para uma introdução. Contudo, é
conveniente definir desde já o mote cujos desdobramentos explicativos darão
corpo a nosso texto.
Observam-se grandes dificuldades dos alunos em seu primeiro contato
com a metodologia na universidade, dificuldades responsáveis por certa
aversão em torno desta matéria. Algumas explicações surgem para este
fenômeno, considerando vários fatores:
a) próprio grau de especificidade desta disciplina;
b) despreparo de parte dos alunos que nunca tiveram acesso a
disciplinas técnicas durante sua formação no ensino médio;
sobretudo;
c) fato de ordinariamente a metodologia ser ministrada nos primeiros
semestres do curso acadêmico, sendo que os alunos crêem que
sua aplicação só será requerida, de maneira estanque, ao fim
deste; diante da exigência de redação de monografias ou
Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC). A ABNT diz sobre
trabalhos acadêmicos na NBR 14724:2005, que são similares
como: trabalho de conclusão de curso – TCC, trabalho de
graduação interdisciplinar – TGI, trabalho de conclusão de curso
de
especialização
ou
aperfeiçoamento
e
outros;
assim
determinadas instituição adotam outros tipos de nomenclaturas,
quando diz respeito a trabalhos finais ou de conclusão de curso.
Esta última, talvez seja a mais problemática das três hipóteses, pois, além
de ser um elemento desmotivador ao aprendizado, possui uma série de
incompreensões acerca do que é a metodologia, para que serve, qual seu
objeto e, ainda, o contexto de sua aplicação (quer dizer, o conhecimento
científico, a pesquisa acadêmica, a produção universitária).
Para muitos a metodologia é apenas um conjunto de procedimentos
técnicos, que visa, prescritivamente, a uniformização de padrões na execução
e apresentação de produtos acadêmicos. Procedimentos que, na prática
cotidiana, poderiam ser dispensados como meras formalidades em prol da
“simplicidade” e do “ganho de tempo”. Pensar metodologia deste modo seria,
primeiro, desconsiderar um dos principais pressupostos do saber científico, o
fato do conhecimento não só possuir conteúdo, mas também forma; depois,
prescindir de dois pré-requisitos deste conhecimento específico: a clareza e a
distinção. Com isto, parece ficar claro que não pode pretender legitimidade a
concepção que faz uso da metodologia apenas em um momento do curso (isto
é, na hora de escrever um projeto, ou um trabalho final). O recurso à
metodologia é indispensável ao fazer da universidade, necessário a todo
momento, seja em um fichamento na graduação ou em um ensaio de pósdoutorado. Não havendo espaço, portanto, para o elaborar tarefas acadêmicas
“fora da metodologia” (como veremos adiante). O uso contínuo, indispensável e
mediato da metodologia procura ser grifado já em nosso título, quando
propomos: Através da metodologia ao conhecimento. Poderíamos ter nos
limitado, acertadamente à preposição ”da”, obtendo o seguinte resultado: Da
metodologia ao conhecimento. Contudo, ao sacrificarmos o beletrismo
persistindo no uso daquela palavra, buscamos enfatizar a idéia que perpassa a
noção metodologia e de método.
A palavra “através”, aqui, é aquela que melhor reproduz o sentido de
metodologia. Ela não aponta apenas para o ponto do qual partimos, tampouco
ao final de um processo. Este vocábulo aponta para o todo: o princípio do qual
se parte para a busca do conhecimento; o caminho propriamente dito, donde o
conhecimento é produzido mediado por instrumentos que a metodologia
constitui e o final, resultado que pode ser inferido por meio destes
procedimentos. Deste modo, é através da metodologia que se obtém o
conhecimento; isto é, o método é o através do que se chega a todo
conhecimento científico. Idéia que, em sua gênese, se mantém fiel ao termo
grego Méthodos, do qual é oriundo; composto pelas palavras “Meta” e “hódos”,
possíveis de serem traduzidas interpretativamente como caminho através do
qual... se faz ciência (BAILLY,1950).
Nossa advertência inicial pode ser retomada agora com propriedade. Ora,
se a metodologia é um caminho através do qual se faz ciência, ela não poderia
ter um fim em si mesma. Ela teria um fim em vista, o conhecimento científico;
ela é um meio para este fim.
A metodologia aqui não é uma nova ciência (no caso, a ciência dos
métodos, como seu nome poderia sugerir). Embora isto seja possível, a ponto
de pesquisadores se debruçarem ao seu estudo em caráter disciplinar, ela é
essencialmente instrumental. De modo que, só o metodólogo ou o teórico do
conhecimento faz dela sua razão de ser. Para o pesquisador geral, em seus
afazeres acadêmicos, a metodologia é uma disciplina auxiliar.
Após esta contextualização, uma melhor caracterização de metodologia é
necessária.
1.2 CARACTERIZAÇÃO DE METODOLOGIA
A complexidade do método fez dele uma disciplina denominada
metodologia. Metodologia cientifica é o estudo dos métodos de conhecer.
Trata-se de métodos de buscar o conhecimento, é uma forma de pensar para
se chegar à natureza de um determinado problema, seja para explicá-lo ou
estudá-lo. O método científico é entendido como o conjunto de processos
orientados por uma habilidade crítica e criadora voltada para a descoberta da
verdade e para a construção da ciência hoje, a pesquisa constitui seu principal
instrumento ou meio de acesso (CERVO & BERVIAN, 2002).
Para Lakatos e Marconi (1991), o método caracteriza-se como uma
abordagem ampla, em nível de abstração elevado dos fenômenos da natureza
e da sociedade. Para tanto, método se define como um modo de proceder seja
um fazer, um agir, um conhecer, para alcançar um fim previamente projetado.
Abreviadamente: método é a ordem dos elementos de um processo, para
atingir um fim (DESCARTES, 1999).
Segundo Dalarosa (1998), não seria correto falar em metodologia da
ciência, pois não é a metodologia que tem uma ciência, é a ciência que ao ser
construída, necessita de um método. Sendo que, no quadro geral da ciência,
metodologia é uma “metaciência”, isto é, um estudo que tem por objeto a
própria ciência e as técnicas específicas de cada ciência.
Barros & Lehfeld (1986) afirmam que a metodologia não procura
soluções, mas
escolhe
as
maneiras
de encontrá-las,
integrando os
conhecimentos a respeito dos métodos em vigor nas diferentes disciplinas
científicas ou filosóficas. E com relação à importância da disciplina metodologia
científica, essa é baseada na apresentação e exame de diretrizes aptas a
instrumentar o universitário no que tange a estudar e aprender. Para nós, mais
vale o conhecimento e manejo dessa instrumentação para o trabalho científico
do que o conhecimento de uma série de problemas ou o aumento de
informações acumuladas sistematicamente. Essa disciplina está, pois, voltada
a assessorar e colaborar com o crescimento intelectual do aluno para a
formação de um compromisso científico frente à realidade empírica.
Metodologia científica não é um amontoado de técnicas, embora elas
devam existir, mas sim uma disciplina que deve estar sempre em
relacionamento e a serviço de uma proposta de conhecimento, assim,
estrutura-se, para que o conhecimento desenvolva as funções que lhe são
impostas frente às necessidades culturais e científicas.
Entre os diversos modos de conhecimento, alguns são importantes de
serem ressaltados, tendo-os em vista na hora de elaborar um projeto de
pesquisa acadêmico.
1.3 DO CONHECIMENTO EM GERAL
Todos sabemos o que é conhecimento. Naturalmente não por
encontrarmos
uma
definição
temática
expressa
em
nosso
cotidiano.
Certamente não temos uma explicação teórica imediata para o que seja o
conhecimento, apenas conhecemos; antes mesmo de formularmos qualquer
explicação para isto. Conhecemos “coisas” todos os dias: uma palavra nova
para enriquecer nosso vocabulário, um novo sentido para uma palavra que
utilizamos corriqueiramente, um novo utensílio que facilita nossa vida prática,
um recurso até então não utilizado de uma velha ferramenta, um caminho mais
curto para chegar aonde queremos... Sempre que conhecemos, nos
apropriamos destes conhecimentos em prol de novos conhecimentos, sem
sequer nos darmos conta disso, sem sequer teorizarmos sobre isto. Quando
conhecemos, já o fazemos de modo a lidar com as coisas que encontramos no
mundo sempre de maneira pré-temática, ou ainda, de modo pré-teórico,
antecedendo qualquer compreensão deste processo.
O conhecimento e seus modos são alvo de preocupação de muitos
autores em diversas áreas do saber ao longo da história. O filósofo Aristóteles
(1990, p. 3) talvez tenha sido um dos primeiros a propor algo substancial sobre
o tema, quando afirma: “Todos os homens têm sua gênese afim ao conhecer”.
Com esta frase o autor grego expressa o parentesco do homem com o
conhecimento; fazendo, mesmo, que compreendamos o conhecimento como
algo próprio a este. Garcia (1987), fazendo uso inteligente da palavra francesa
connaissance (conhecimento), grifa esta afinidade operando uma análise de
suas partes do termo. Para a interpretação proposta pela autora, o
conhecimento seria uma co (con) nascença (naissance), isto é: um nascer
junto. Deste modo, podemos pensar o conhecimento como o ato a partir do
qual o homem constrói a si mesmo, dando gênese à novas possibilidades de
sua realização na medida que conhece novos meios para tal, nascendo e
renascendo em cada novo conhecimento apropriado e utilizando-os no mundo;
alterando e reconstruindo, com isto, suas relações com os outros homens, com
as coisas deste mundo, com sua cultura, sua sociedade, sua história. É isso
que nos assegura o seguinte referente:
Um mundo é dado ao homem; sua glória não é suportar ou depreciar
este mundo, mas sim enriquecê-lo construindo outros universos. Ele
amassa e remodela a natureza, submetendo-a a suas próprias
necessidades; constrói a sociedade e é, por sua vez, construído por
ela; trata logo de remodelar este ambiente artificial para adaptá-lo a
suas próprias necessidades animais e espirituais, assim como a seus
sonhos: cria o mundo dos utensílios e o mundo da cultura. O
conhecimento como atividade [...] pertence à vida social (BUNGE,
1980, p. 9).
De posse do conhecer, a partir de um modo peculiar de lidar com este
processo, o homem passa a ter uma relação diferenciada com seu próprio
mundo, pode ele compreende-lo, interpretá-lo, transformá-lo. Assim, os
homens se conhecem, se elaboram diante da evidência de que o conhecimento
é algo frente ao qual ele nunca está acabado, mas sempre na iminência de
uma nova aquisição e projeto.
1.3.1 Do senso comum
Os conhecimentos que adquirimos espontaneamente no cotidiano,
geralmente produzidos pela interação com o mundo, constituem um conjunto
de princípios empíricos intercambiáveis no convívio com os outros. Estes são
pontos comuns capazes de estabelecer uma comunidade de princípios e
conhecimentos chamada de senso comum.
O senso comum é mais do que a compreensão corriqueira geralmente
expressa como o saber empírico através do qual, por exemplo, um camponês
sabe a época mais propícia para semear este ou aquele grão; se o solo está
em boas condições de plantio ou quanto tempo demora certo tipo de legume
até poder ser colhido.
É o senso comum que orienta os indivíduos no mundo, ordenando seus
afazeres,
executando
tarefas
práticas
com
eficiência,
estabelecendo
consensualmente normas de boa convivência, julgando a partir de valores
prévios seus interesses imediatos, conservando as relações que julgam
proveitosas ao bem comum, agindo adequadamente em situações especificas
e até opinando sobre assuntos diversos. Os conhecimentos comuns são os
que primeiro temos contato e normalmente nos chegam de maneira não
rigorosa a partir de um “eu ouvi falar”, ou de um “dizem que é desta forma”,
discurso já comum em grupos sociais primários como a família, mas que se
estende como um sistema de significação por toda a sociedade (RODRIGUES,
1980).
Por isto, existem várias linhas de raciocínio que pesam sobre o senso
comum. Todas elas são feitas em vista de uma compreensão de ciência. Entre
estas, a de que: o conhecimento comum é lato, isto é, apreendido de maneira
não criteriosa; é subjetivo, dependendo de sensos prévios que cada indivíduo
particularmente possuiria, o que daria ao conhecimento caráter acidental e não
objetivo; fragmentário e não planejado, consistindo em uma maneira não
metódica ou sistemática; herdados de maneira acrítica, não temática e, por
isto, ingênua; podendo conter compreensões errôneas, acarretadas por
conclusões induzidas pela repetição freqüente de um dado. Esta última
característica faz com que o filósofo alemão Hans-Georg Gadamer (1998)
aponte que o senso comum se alimente não do verdadeiro, mas do provável.
Isto
não
faz
do
conhecimento
comum
algo
que
deveria
ser
desconsiderado. Afinal, é sempre dele que partimos, mesmo quando nos
encaminhamos à ciência, em seu sentido mais ortodoxo. Quanto a isto,
Gadamer acrescenta:
sensus communis significa aqui, certamente, não somente aquela
capacidade universal que existe em todos os homens, mas, ao
mesmo tempo, o senso que institui comunidade. O que dá à vontade
humana sua diretriz (...) não é a universalidade abstrata da razão,
mas a universalidade concreta, que representa a comunidade de um
grupo, de um povo, de uma nação, do conjunto da espécie humana.
O desenvolvimento deste senso comum é, por isso, de decisiva
importância para a vida (GADAMER, 1998, p.63).
Esta passagem pretende apontar, também, que os conhecimentos
relativos ao senso comum são diferentes do conhecimento cientifico, mas nem
por isso menos próprios à vida. Contudo, as noções do senso comum são
inválidas ao fazer científico, por não atenderem as requisições deste modo
específico de conhecimento, diverso do senso comum, mas não de todo
isoladas deste.
1.3.2. Do conhecimento científico
Trata-se de um modo de conhecer que exige mais do que o saber
adquirido na chave de tentativa-erro-repetição, característica do conhecimento
empírico. Tendo ganho formulação rigorosa na modernidade, este já traz, em
seu registro de nascimento, um novo modo de apreender as coisas, não como
mera ocorrência fortuita, mas a partir da relação entre essas ocorrências
(efeitos) e suas causas; bem como com as leis que as regem. Com base na
exposição de Bunge (1980), o conhecimento científico em geral pode ser
inventariado em algumas de suas principais características. Daí, esse
conhecimento pode ser:
a) Objetivo, fático: por apreender os fenômenos do mundo como
objetos de conhecimento; visam determiná-lo tais como seriam de
fato, independente de qualquer interferência externa ao interesse
científico. Baseia-se em fatos dados pela experiência, conhecidos
por “empíricos”;
b) Analítico: pois aborda os problemas delimitados em sua alçada
um a um, decompondo-os em seus elementos. Assim, a análise é
a tentativa de entender a situação total de um objeto (seus
mecanismos e causas de sua ocorrência) a partir de seus termos;
c) Específico: Atendo-se a um tema, que determinará inclusive o
modo com que metodologicamente seu objeto seria abordado;
d) Claro: buscando os resultados com exatidão sem correr o risco
de gerar dúvidas capazes de invalidá-lo. Nesse intuito, a ciência
visa formular suas proposições de maneira objetiva; inequívoca
em seus enunciados; definindo a maioria de seus conceitos;
adequando seu discurso à explicação do seu objeto; avaliando e
registrando produtos de sua experiência, comunicando-os à
comunidade científica para que este seja público e possa ser
verificável.
e) Distinto: na medida em que se seus resultados (obtidos a partir
dos experimentos) podem ser distinguindos dos outros diferentes
e dados por variáveis;
f) Universal, comunicável, público: Não se pretendendo restrito
apenas em um setor social ou região do planeta, ele é público. A
linguagem científica é, portanto, comunicável a quem quer que se
interesse saber; formando-se, mesmo por ela. Sua explicitação
tem forma essencialmente dissertativa e função informativa e não
expressiva ou prescritiva (COPI, 1981).
g) Verificável: considerando que todo conhecimento científico
apóia-se
em
um
fundamento
sólido
capaz
de
sustentar
firmemente sua certeza, afirmarmos que este é conhecimento
certo, obtendo estas certezas por meio de uma averiguação ou
exame experimental chamado verificação, ou como o próprio
termo indica em suas raízes latinas: um fixar (ficare) o verdadeiro
(verum).
h) Metódico: como dito, o conhecimento científico não é adquirido
com a tentativa e a repetição até o acerto, mas consiste em um
conhecimento planejado (sem errância). O método compara um
conjunto finito de objetos não estabelecendo previamente o
critério geral para reuni-los em um conjunto limitado (ao levar em
conta sua estrutura), apenas registra os objetos encontrados que
não são idênticos. Opera desta forma seguindo a ordem que as
razões que a própria investigação lhe oferece.
i) Sistemático: encontra-se ordenado de maneira que proposições
científicas estejam atreladas a um princípio que as fundamente. O
sistema opera privilegiando uma proposição fundamental e
relaciona através dele todos os objetos; portanto, classifica e
propõe
relacionando
um
critério;
neutralizando
as
compatibilidades ou incompatibilidades provenientes de outros
pontos (podemos distinguir método do sistema afirmando que:
enquanto no sistema se o critério produz as diferenças, no
método as diferenças produzem o critério).
j) Legal: pois, busca determinar supostas “leis naturais” capazes de
explicar a ordem e a regularidade das ocorrências (efeitos) do
mundo, e suas relações com suas causas. Move-se no âmbito
dessas leis inferindo novos conhecimentos por meio destas.
k) Explicativo: intentando explicar os princípios, processos e as leis
que regulam os fenômenos objetivados. Propõe assim uma
descrição detalhada; procurando responder renovadamente como
ocorrem certos fatos sujeitos à investigação. Quanto a isto, Bunge
(1980, p. 30) assevera: “A história da ciência ensina que as
explicações científicas se corrigem ou descartam sem cessar”.
l) Previsível: não se limitando ao que já apreendido na experiência,
mas projetando-se à empreendimentos e realizações de futuros
conhecimentos. A previsão permitida pela ciência torna eficaz o
conhecimento, o planejamento, a administração e controle da
situação de um estado de coisas, permitindo sua eficiência no
asseguramento de suas conclusões. Constrói-se por meio de
formulação de hipóteses que prenunciam uma ocorrência
provável capaz de ser validada por meio dos métodos e técnicas
de que a ciência dispõe (KAHLMEYER-MERTENS, 2005).
Essas características do conhecimento científico merece uma ressalva,
por aplicar-se, com nuanças técnicas para qualquer possível objeto de ciência.
É isso que Kerlinger (1980, p. 11-12) ilustra:
Embora seja aplicada geralmente à observação e à mensuração
científica, a idéia é mais ampla. Quando os psicólogos fazem
experimentos, lutam por objetividade. Isso significa que fazem sua
pesquisa controlando de tal modo a situação experimental e
descrevendo de tal modo o que fazem que outros psicólogos poderão
repetir o experimento e obter resultados iguais ou semelhantes. Em
outras palavras, a objetividade ajuda o pesquisador a “sair” de si
mesmo, ajuda-o a conseguir condições publicamente replicáveis e,
conseqüentemente averiguáveis. A ciência é um empreendimento
social e público, como tantos outros empreendimentos humanos, mas
uma regra importantíssima do empreendimento científico é que todos
os procedimentos sejam objetivos – feitos de tal forma que haja ou
possa haver acordo entre cientistas especialistas. Esta regra dá à
ciência uma natureza distinta, quase remota porque tanto maior a
objetividade mais o procedimento se afasta das ciências humanas –
de suas limitações.
A proposição do autor visa grifar que o fazer científico não se restringe
aos limites das ciências naturais ou das idéias “simples”, como presenciamos
nas matemáticas. Também os conhecimentos complexos, como o humano
(enfocando suas matizes sociais e culturais), receberiam o status de ciência.
Mas, para que o conhecimento seja assim reconhecido, deve atender aos
referidos requisitos que, direta ou indiretamente, tangem a metodologia. Nestes
casos, a metodologia aparece implicada aos procedimentos pelos quais esta
objetividade, própria à ciência, se afirmaria universal e verificável. O trecho
ainda sintetiza muito das características que comentamos anteriormente.
A metodologia, bem como a lógica, se apresentaria, pois, como a ciência
dos meios e da forma, aquela que encaminha e “enforma” o conhecimento
possível à ciência; e, em boa medida, que dá parâmetros à própria ciência em
sua
tarefa
de
resolver,
metodicamente,
quebra-cabeças
e
produzir
conhecimento em face de seus paradigmas.
Outros modos de conhecimento com paradigmas diversos ainda são
possíveis de serem apontados. Contudo, embora relevantes por suas
contribuições de natureza distinta, não possuem as exigências do modelo
científico; isto quer dizer: não são científicos, mas: filosófico e teológico.1
Em uma definição genérica, se relacionado ao saber, o modelo filosófico é
aquele que busca, por seu turno, determinar o estatuto dos princípios
fundamentais de todo conhecimento; sendo, portanto, anterior a ele. Busca
investigar a instância primeira que sustenta as proposições da ciência;
resguardando, por meio do discurso, as condições de possibilidade de tal
conhecimento. Por outro turno, o conhecimento teológico é, tal como entendido
por Comte (1978), aquele que se ocupa das coisas sobrenaturais, dado por
meio da revelação beatífica ou da reprodução dos dogmas das religiões,
trafegando no plano da crença e não estando sujeito à verificação ou
comprovação.
A íntima relação entre método e ciência é ponto considerado no próximo
tópico.
1.4 METODOLOGIA E CIÊNCIA
As definições dos termos ciência e metodologia são em si mesmas um
objeto de estudo. Esse estudo, levado a efeito pela filosofia da ciência, deve
nortear
o
pensamento
humano
sobre
suas
próprias
descobertas
e
representações. Tendo em vista a pergunta pela definição da ciência, vejamos:
A ciência é todo um conjunto de atitudes e atividades racionais,
dirigidas ao sistemático conhecimento com objetivo limitado, capaz de
ser submetido à verificação [...] A ciência é um conjunto de
conhecimentos
racionais,
certos
ou
prováveis,
obtidos
metodicamente, sistematizados e verificáveis, que fazem referência a
objetos de uma mesma natureza. (LAKATOS & MARCONI, 1991,
p.80).
Para Bunge (1980) a ciência é como um sistema de idéias estabelecidas
(conhecimento científico), é como uma atividade produtora de novas idéias
(investigação científica). Gil (1999) mais próximo ao sentido cartesiano, diz
que, etimologicamente, ciência significa conhecimento, sendo o seu objetivo
fundamental à veracidade dos fatos, com o objetivo de formular, mediante
linguagem rigorosa e apropriada às leis que regem os fenômenos.
1
Diante das requisições de nossa tarefa, só os abordaremos de maneira breve, sem maiores
aprofundamentos.
Podemos afirmar que a ciência é o conhecimento resultante do
processo de elaboração do conhecimento científico. É científico
porque, para tanto, necessita-se de que seja uma forma de
conhecimento que inclua, em qualquer forma ou medida, uma
garantia da própria validade (ABBAGNANO apud DALAROSA, 1998,
p.136).
A ciência envolve mais do que a mera catalogação de fatos e
descobertas, através da tentativa e erro, de maneiras de proceder de como
funcionam os fenômenos. O que é crucial na verdadeira ciência é o fato de
envolver a descoberta de princípios aos fenômenos naturais. O ser humano
pela observação adquire quantidade de conhecimentos constituindo uma
importante fonte de conhecimento.
Bachelard (apud DALAROSA, 1998, p.101) afirma que “a ciência não
constitui um mundo a descrever. Ela constitui um mundo a construir”. Constitui
devido a ciência referir-se tanto à investigação racional como ao estudo da
natureza, direcionado à descoberta da verdade.
Tal prática investigativa é normalmente metódica, ou de acordo com o
método científico, é um processo de avaliar o conhecimento empírico. Bunge
(1980) ainda afirma que o conhecimento científico é fático e seus enunciados
confirmam o que chamamos de, usualmente, dados empíricos, na ciência fática
podem induzir a considerar o mundo como inesgotável. A ciência fática
(material) verifica (confirmam ou não confirmam hipóteses em sua maioria
provisória, quer dizer, necessita de uma refutação).
A ciência então seria, o conhecimento ou um sistema de conhecimento
que abarca verdades gerais ou a operação de leis gerais especialmente
obtidas e testadas através do método científico. Então, caracteriza-se como
“conhecimento racional, sistemático, exato, verificável e, em conseqüência,
falseável” (op.cit.) e, fundamentalmente, tem quatro objetivos: analisar,
explicar, prever e atuar.
A ciência produz modelos que nos permitem fazer predições mais úteis e
tenta descrever o que é, mas evita tentar determinar o que é (o que é
impossível por razões práticas). Ela é uma ferramenta útil, é um corpo
crescente de entendimento que nos permite postular mais eficazmente o que
está ao nosso redor e melhor adaptar e evoluir como um todo social, assim
como independentemente. As áreas da ciência podem ser classificadas em
duas grandes dimensões:
a)
Pura (o desenvolvimento de teorias) versus aplicada (a aplicação de teorias
às necessidades humanas); ou
b)
Natural (o estudo do mundo natural) versus social (o estudo do
comportamento humano e da sociedade).
Logo, a ciência aumenta o poder do homem sobre a natureza, mas não
lhe ensina a governar as suas escolhas, as suas preferências, os seus fins e
um significativo aumento de conhecimentos ao buscar explicações sobre esta
natureza, fenômenos e fatos. E assim, pela ação desses, se percebe a
evolução da ciência. E essa evolução transforma-se em dimensões que,
segundo Eco (1995) são invisíveis, incógnitas, submersas, recônditas,
múltiplas, sensíveis, complexas.
O homem nutre, hoje, crenças a respeito do mundo físico, que a ciência
lhe confirma e garante. Começa a ter conhecimento sobre os valores que
regulam a sua conduta; a ciência vai lhe mostrar a gênese, o desenvolvimento
e valores e, deste modo, possibilitar o controle dos mesmos.
Para Bunge (1980) há a separação das ciências: ciência da natureza e a
ciência do espírito; ambas, não céticas, não falíveis. A falibilidade é uma forma
negativa de indicar a sua capacidade de acertar. A ciência, quando erra, tem
nos seus próprios métodos a correção. Logo, nenhuma outra direção pode ser,
menos cética e, ao mesmo tempo, mais vigilante. A generalização do espírito
científico a todos os aspectos da vida tem sido o mais seguro penhor do
progresso científico e social do homem.
Podemos observar que a ciência está fundamentalmente relacionada à
metodologia. A preocupação central é de proporcionar um conteúdo de
conhecimentos que possam ser tomados como certos e verificáveis. Assim,
esse sistema de enunciados elaborados racionalmente, fundamentados na
experiência empírica e passíveis de falseabilidade através de experiências é o
que denominamos ciência.
Durante muito tempo, houve a idéia de que uma tese só era científica se
fosse baseada em fatos ao invés de opiniões. Isso foi depois substituído pela
idéia de que uma tese para ser científica tinha de ser provável. Tal critério por
sua vez foi derrubado pelo princípio da “falseabilidade”, do filósofo Popper
(1902-1994). Em seu livro A lógica da descoberta científica (1959), Popper
afirma que a ciência se desenvolve a partir de revoluções constantes,
renovando-se permanentemente e o critério de falseabilidade está associado à
idéia de movimentação e rupturas de teorias e modelos científicos, que tem
como princípio básico à idéia de validade. A idéia é a de que a ciência ou o
conhecimento científico se desenvolve a partir da busca e da tentativa de
encontrar lacunas para falsear uma teoria.
Essa distinção procura estabelecer características metodológicas que
devem ser dadas a cada tipo de ciência, de acordo com a natureza dos objetos
sob sua responsabilidade e com os experimentos que podem ser aplicados
para validação e refutação das teorias acerca desses fenômenos. Porém, a
própria classificação é uma proposta para as ciências estabelecidas na
atualidade, significando que outras propostas e abordagens poderão surgir.
Logo, a ciência é autoquestionável, sofre críticas, mas visa exibir seus
avanços, exige resultados reproduzíveis, busca, estuda, procura evidências,
fatos, experimentos, confia na testagem e no pensamento analítico, mantém-se
alerta em relação a falhas ou erros para corrigi-los; uma seqüência que se
mantém permanente de acréscimos de conhecimentos racionais e verificáveis
da realidade. Sobre o método científico Popper (1959, p.75) alude:
Começo, regra geral, as minhas lições sobre Método Científico
dizendo aos meus alunos que o método científico não existe.
Acrescento que tenho obrigação de saber isso, tendo eu sido,
durante algum tempo, pelo menos, o único professor desse
inexistente assunto em toda a Comunidade Britânica.
[...] Tendo, então, explicado aos meus alunos que não há essa
coisa que seria o método científico, apresso-me a começar o
meu discurso, e ficamos ocupadíssimos. Pois um ano mal
chega para roçar a superfície mesmo de um assunto
inexistente.
O método científico é uma forma de conhecimento, que está levando a
ciência a uma validez que reflete claramente os acontecimentos da Idade
Moderna, apresentado por transformações conceituais e por mudanças
técnico-científicas. Logo, a metodologia científica se propõe a definir regras e
procedimentos que darão segurança e validade ao exercício de conhecer tendo
a pesquisa presente neste processo.
Em poucas palavras, o método científico é realizado com metodologia
criteriosa, de natureza científica. Tendo várias etapas até poder se transformar
em uma teoria confiável, fazendo a ciência progredir com seus experimentos.
1.5
METODOLOGIA E PESQUISA
Um dos aspectos mais característicos do ser humano, e que de certa
forma o distingue dos demais seres vivos, é sua inquietação no que se refere à
sua existência, origem, destino e relação com seus semelhantes e meio
ambiente. Por meio de suas dúvidas e incertezas, o homem busca caminhos
para o desvendamento delas, assim buscam na pesquisa respostas
(ARISTÓTELES, 1990). No que se refere à pesquisa, podemos dizer que, é um
modo programado do homem aprender. É exatamente no pesquisar, ao
procurar respostas para suas indagações e no questionar que o homem
desenvolve o seu processo de diálogo crítico com a realidade. O fomento
assim se dá pois a
[...] pesquisa significa diálogo crítico e criativo com a realidade,
culminando na elaboração própria e na capacidade de intervenção.
Em tese, pesquisa é a atitude do ‘apreender a apreender’, e, como
tal, faz parte de todo processo educativo e emancipatório (DEMO,
1993, p.80).
A pesquisa faz parte do processo educativo. O pesquisador só tem
oportunidade de fazê-la à medida que compreende e domina uma série de
técnicas e de conhecimento. Sua edificação e aprimoramento são conquistas
que o pesquisador obtém ao longo de seus estudos, da realização de
investigações e elaboração de trabalhos acadêmicos. Corroborando com isso,
Cervo & Bervian (2002) afirmam que a pesquisa está voltada para as soluções
de problemas teóricos ou práticos através do ato de conhecer pela ciência,
partem da dúvida de um problema e com o uso do método científico buscam
uma resposta ou solução; porém não é a única forma de obtenção de
conhecimentos e descobertas.
Muito mais que uma simples definição, o exposto permite observar alguns
conceitos essenciais para uma plena compreensão da prática da pesquisa.
Como forma de adquirir conhecimento, a pesquisa distingue-se pelo método,
pelas técnicas e por estar voltada para a realidade empírica e pela forma de
comunicar os resultados obtidos. Gil (1999) entende por pesquisa o processo
formal e sistemático, em busca de respostas para problemas mediante o
emprego do método científico, que se desenvolve. Segundo Lüdke & André
(1986), através do confronto entre os dados, evidências e informações
coletadas a respeito de determinado assunto e que, de acordo com o que
professa Gil (1994, p.42), é “conjunto de procedimentos intelectuais e técnicos
adotados para se atingir o conhecimento”. Assim, a pesquisa significa muito
mais do que apenas procurar a verdade, é descobrir respostas para perguntas
ou soluções válidas para os problemas levantados através do emprego de
métodos científicos.
Para Kerlinger (1980) a pesquisa metodológica é parte integrante e
significativa de toda a atividade científica. As pesquisas devem contribuir para a
formação de consciência crítica ou espírito científico do pesquisador. O
estudante, apoiando-se em observações, análises, deduções e de uma
reflexão crítica, vai, paulatinamente, formando o seu espírito científico crítico, o
qual não é inato.
De uma forma muito simples, poderíamos dizer que pesquisa é todo
conjunto de ações que visa encontrar solução para um problema proposto,
usando processos científicos. É isso que Richardson (1999, p.15) nos permite
afirmar:
A única maneira de aprender a pesquisar é fazendo uma pesquisa.
Outros meios, porém, podem ajudar. [...] exemplos concretos de
história do êxito e fracasso, frustrações e satisfações, dúvidas e
confusões, que formam parte do processo de pesquisa, produzem
uma impressão bastante diferente daquela que surge da leitura de um
relatório final de pesquisa. [...] as destrezas para resolver dificuldades
rotineiras – tais como procurar bibliografia relevante ao problema
pesquisado, transformar uma idéia em um problema de pesquisa,
escrever um projeto e relatório final [...] a experiência lhe permitirá
enfrentar as dificuldades e obter produtos adequados [...].
Através da dimensão empírica das pesquisas chegamos a um
entendimento mais aprofundado das coisas e a um conhecimento naquilo que
se propõe. E esse conhecimento seria a relação que se estabelece entre
sujeito que conhece ou deseja conhecer e o objeto em pauta ou que se dá a
conhecer. Com a necessidade de explicitar a complexidade do real onde se dá
este conhecimento, Hühne (1990, p.36) acrescenta que “[...] o conhecimento
como elaboração só tem sentido no momento mesmo da elaboração, do ato
criador, que o produz”. Neste sentido é que vem o ato de pesquisar e o
pesquisador.
Mas que é o pesquisador? O pesquisador é aquele que deve enfatizar a
relevância da pesquisa e a concordância com a necessidade de se desenvolver
uma atitude autocrítica em relação às próprias pesquisas. Ele deve estar
sempre examinando o seu ponto de vista pela veracidade ou falsidade dos
fatos reorganizando o conceito do saber, formando uma nova visão que
permita reconhecer a incerteza, a falta de clareza, a relatividade, a
instrumentalização
e
a
ambigüidade
do
conceito
“verdade
científica”
(RICHARDSON, 1999).
Mas, e o pesquisador iniciante, como deve proceder? Para os iniciantes
em pesquisa a ênfase na preocupação da aplicação do método científico deve
ser mais relevante do que propriamente a ênfase nos resultados obtidos, pois a
pesquisa é um esforço dirigido para a aquisição de um determinado
conhecimento. O objetivo dos principiantes deve ser a aprendizagem quanto à
forma de percorrer as fases do método científico e à operacionalização de
técnicas de investigação. À medida em que o pesquisador amplia o seu
amadurecimento na utilização de procedimentos científicos, torna-se mais hábil
e capaz de realizar pesquisas (BARROS & LEHFELD, 1986, p. 88).
Kerlinger (1980) afirma que se pesquisa influencia a prática, podemos
dizer que a metodologia influencia fortemente a pesquisa. Nas universidades, a
metodologia é utilizada apenas como ferramenta científica, há uma
preocupação excessiva com a técnica. Segundo Kaplan (apud HÜHNE, 1990)
a metodologia toma a prática científica como ponto de partida e se é
considerada razoável, propaga a aceitação de hipóteses insatisfatórias com o
fato do que está sendo feito, e gera o conformismo, que contra o mesmo é de
importância insistir no caráter normativo do método científico.
Sendo assim, a relevância da pesquisa está na capacidade de fazer
avançar o conhecimento científico. O papel da introdução à pesquisa na
universidade é levar o acadêmico ao pensamento lógico e à busca de
respostas para os problemas. Observa-se que a demanda pelo saber é
incessante e contínua. Se assim o é, nada mais sensato que estimular o
discente a estudar, utilizando o conhecimento científico e métodos de pesquisa,
não o deixando fazer à revelia, como se o provável, o acaso e a consciência
pessoal fossem entendidos/assimilados como ciência.
É importante salientar como metodologia e universidade se encontram
hoje com relação à pesquisa e ao conhecimento. Nós podemos fazer o
conhecimento, usá-lo, nos posicionarmos diante dele, mas para que serve a
metodologia na universidade, qual o seu propósito?
1.6 METODOLOGIA E UNIVERSIDADE
Não temos a pretensão de abordar este tema largamente. Sua extensão
nos cobraria mais do que devemos dar nesta parte do trabalho, efetuando um
desvio de propósito que nos é urgente: expor a metodologia e sua aplicação no
ambiente que lhe é próprio; esclarecimento ao público que tem a necessidade
imediata de elaboração de um projeto de pesquisa. Neste tópico, o intuito é
mostrar como o conhecimento científico, produzido pela pesquisa e amparado
pela metodologia, reflete no saber acadêmico. Tal temática se fomenta com a
seguinte assertiva:
Na pesquisa reside o sustentáculo maior que dá vida e razão de ser a
uma Universidade. De fato, não basta estabelecer uma hierarquia
entre a pesquisa, a formação de profissionais e todo o mais que
possa ser de iniciativa das Universidades. Por essencial e
impostergável que seja a formação de profissionais, por mais zelo,
contra até mesmo os imperativos da urgência, em garantir os mais
elevados níveis de competência, tudo deve ser feito assentado no
espírito da pesquisa. Pois só esse espírito consegue impregnar a
transmissão de técnicas e conhecimentos de forma criativa, e fazer
da criatividade o solo em que se desenvolve a educação universitária
em sua plenitude. Uma Universidade destituída de emulações
criativas limita-se à condição de mera repetidora do que é elaborado
em outros centros (BORNHEIM, 1992, p. 38).
Como um projeto moderno, e mesmo em suas heranças medievais, a
universidade é uma instituição comprometida com a formação do indivíduo,
bem como da sociedade e da Humanidade. A produção de saber na
universidade, elaborada por meio da pesquisa, é contribuição que não se
restringe a um nicho; antes, pretende-se saber público e universal. Como tal, a
pesquisa é prática intrínseca e característica de qualquer instituição que
pretenda a este.
Por constituir saber público, o conhecimento científico produzido no
espaço acadêmico deve possuir padrões que uniformizem os métodos e
técnicas de sua elaboração, experimentação e publicação. A metodologia vem
ao encontro desta demanda, criando condições para que o conhecimento
esteja acessível por todos que desejarem acercar-se de tais experiências, seja
na qualidade de alguém que se forma por meio deste conhecimento
(recebendo-os em publicações que os reproduzem) ou formam o conhecimento
(avançando com ele para suas extremas possibilidades na pesquisa).
A metodologia auxilia e orienta o universitário no processo de
investigação para tomar decisões oportunas na busca do saber e na formação
do estado de espírito crítico e hábitos correspondentes necessários ao
processo de investigação científica. O uso de processos metodológicos
permitirá ao estudante o desenvolvimento de seu raciocínio lógico e de sua
criatividade (CERVO & BERVIAN, 2002). Dito isto, parece que fica claro que
metodologia científica não é um simples conteúdo a ser decorado pelos
discentes, para ser verificado num dia de prova. Trata-se de fornecer aos
discentes um instrumental indispensável para que sejam capazes de atingir os
objetivos da academia, que são o estudo e a pesquisa em qualquer área.
Um curso de metodologia científica deve, assim, se propor a desenvolver
a capacidade de observar, selecionar e organizar cientificamente os fatos da
realidade. Diante dessa temática Richardson (1999, p.259) afirma que a
observação:
[...] sob algum aspecto, é imprescindível em qualquer processo de
pesquisa científica, pois ela tanto pode conjugar-se a outras técnicas
de coletas de dados como pode ser empregada de forma
independente e/ou exclusiva.
Com essa afirmativa, estamos voltados à capacitar o estudante, através
de reflexões, práticas e reflexões sobre essas mesmas práticas, a uma análise
do conhecimento e do seu processo de produção. Considerando-se a
universidade como centro do saber, como uma instituição preocupada com o
ensino, com o rigor da aprendizagem e com o progresso da ciência, ela terá na
metodologia um valioso ajudante quanto ao desenvolvimento de habilidades e
competências do universitário. Essa disciplina vem, portanto, fornecer os
pressupostos do trabalho científico, ou seja, normas técnicas e métodos
reconhecidos pelo uso entre cientistas, referentes ao planejamento da
investigação científica, à estrutura e à aplicação, apresentação e comunicação
dos seus resultados.
Nos estudos de Richardson (1999) a pesquisa e seu objetivo imediato é a
aquisição de conhecimento, posto isto, é como uma ferramenta para adquirir
conhecimento, logo, aprendendo a pensar, a pesquisar e formando o seu
espírito científico, o universitário estará obtendo conhecimentos novos e ao
mesmo tempo sendo ativo e participante da tarefa de transformação da
realidade.
Para tudo o que se faz existe um método, uma forma de fazer. Assim, Gil
(1997, p.60) diz que “quando alguém tem necessidade de obter determinado
conhecimento, dirige sua atenção e energias para leituras, cursos, palestras e
outras ações capazes de satisfazer as necessidades”.
Do mesmo modo que a metodologia científica auxilia a formação
profissional do estudante, esse pretende alcançar uma formação profissional
competente bem como uma formação sócio-política que o conduzirão a uma
leitura crítica e analítica do seu cotidiano. Assim, Kahlmeyer-Mertens et al.
(2006, p.4) nos assegura que o “uso da metodologia e do conjunto metódico
que a integra é essencial ao fazer da universidade, recorrente e necessário em
todo momento”. Também a formação profissional competente está diretamente
relacionada ao crédito dado ao estudo e à elaboração de um projeto de estudo.
Tendo em vista os diversos graus de originalidade, criatividade e
profundidade, têm-se diferentes níveis e conseqüentemente diferentes tipos de
trabalhos científicos ou acadêmicos, tanto na graduação quanto na pósgraduação. Os primeiros, basicamente recapitulativos e bibliográficos, são mais
realizados na graduação e, os últimos, estudos mais originais, são exigências
da pós. Mas em todos eles se exigem qualidade, organização, rigor,
observação
e
respeito
às
normas
técnicas
conferidos
pelo
método
(SALVADOR, 1982).
Nessa perspectiva em que a pesquisa científica é a ferramenta e
instrumento de refinamento e lapidação das potencialidades do acadêmico,
nada mais coerente aprender a pesquisar fazendo pesquisa. É importante o
iniciante ter em mente que não existe fórmula para soluções de problemas e
muito menos ciência sem problemas. “Precisa-se ter conhecimento da
realidade, algumas noções básicas de metodologia e técnicas de pesquisa,
seriedade
e,
sobretudo,
trabalho
em
equipe
e
consciência
social”
(RICHARDSON, 1999, p.15). Mas para o sucesso ou frustrações de qualquer
trabalho científico, o acadêmico, independente da sua área do conhecimento,
precisa entender que nada se faz ao acaso e todo processo científico começa
com a escolha do tema, do objeto de estudo, de sua delimitação, provocar
problema e montar sua pesquisa.
Deste modo, a pesquisa, o espírito científico, a universidade e aquilo que
nosso autor chamou de “emulações criativas”, ocorrem mediados pela
metodologia. Isto confirma e justifica sua presença e necessidade na hora de
elaborar trabalhos científicos enquanto veículos de conhecimentos gerados por
pesquisas acadêmicas.
CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A. Metodologia Científica. 5. ed. São Paulo:
Pearson Pratice Hall, 2004.
COMTE, A. Curso de filosofia positiva. In Col. Os pensadores. Trad. José
Arthur Giannotti. São Paulo: Abril Cultural, 1978.
COPI, I. M. Introdução à lógica. Trad. Álvaro Cabral. 5. ed. São Paulo: Mestre
Jou, 1981.
COUTO, L. A. et al. Iniciação à lógica e à metodologia da Ciência. Leônidas
Hegenberg (org.). São Paulo: Cultrix, 1976.
DEMO, P. Desafios modernos de educação, 2. ed. Petrópolis: Vozes, 1993.
ECO, U. Como se faz uma tese. Trad. Gilson César Cardoso de Souza. São
Paulo: Brasiliense, 1995.
FOUCAULT, M. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências
humanas. Trad. Salma Tannus Muchail. São Paulo: Martins Fontes, 2002
GALLIANO, A. G. O método científico: teoria e prática. São Paulo: Harbra,
1986.
GARCIA, O. M. Comunicação em prosa moderna – Aprenda a escrever
aprendendo a pensar. 22. Ed.. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 2002.
GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5. ed. São Paulo: Atlas,
1999.
__________.
Paulo. 1994.
Métodos e técnicas de pesquisa social. 4. ed. Atlas. São
__________. Como elaborar projetos de pesquisa. 2. ed. São Paulo: Atlas,
1989.
__________. Metodologia no ensino superior. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1997.
HÜHNE, L. M. Metodologia Científica – Caderno de textos e técnicas. 4. ed.
Rio de Janeiro: Agir, 1990.
KERLINGER, F. N. Metodologia da pesquisa em ciências sociais: Um
tratamento conceitual. Trad. Helena Mendes Rotundo. São Paulo:
EPU/EDUSP, 1980.
LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. A. Fundamentos de metodologia científica.
3.ed. rev. ampl. São Paulo: Atlas, 1991.
__________. Técnicas de pesquisa. 3.ed. rev. ampl. São Paulo: Atlas, 1996.
__________. Pesquisa bibliográfica. In: Metodologia do trabalho científico.
São Paulo: Atlas, 1987.
LÜDKE, M.; ANDRÉ, M. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas.
São Paulo: EPU, 1998.
__________. A Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo:
EPU, 1986.
MARTINS, A. Manual para a elaboração de projetos de pesquisa. Rio de
Janeiro: Universidade Gama Filho, 1998.
MENDES, G.; TACHIZAWA, T. Como fazer uma monografia na prática. 4.
ed., Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1999.
MICHEL, M. Metodologia e pesquisa científica em ciências sociais – Um
guia prático para acompanhamento da disciplina e elaboração de trabalhos
monográficos. São Paulo: Atlas, 2005.
MINOGUE, K. O conceito de universidade. Trad. Jorge Eira Garcia Vieira.
Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1981.
PARRAS FILHO, D.; SANTOS, J. A.
Monografia, TCC, Teses e
Dissertações. 7.ed., São Paulo: Futura, 2002.
PIMENTEL, L. A. Prosa e poesia reunidas. Aníbal Bragança (org.). Niterói:
Niterói livros, 2004.
POPPER, K. A lógica da descoberta científica. London: Hutchinson, 1959.
Download

do conhecimento científico e pesquisa acadêmica