UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” LUANA FERREIRA SILVA DE OLIVEIRA OS DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM NUMA ABORDAGEM PSICOPEDAGÓGICA Brasília - DF 2009 2 Luana Ferreira Silva de Oliveira OS DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM NUMA ABORDAGEM PSICOPEDAGÓGICA OBJETIVOS: Esta publicação atende a complementação didático pedagógica de metodologia da pesquisa e a produção e desenvolvimento de monografia, para o curso de pósgraduação em Psicopedagogia. Pela autora Luana Ferreira Silva de Oliveira. Brasília - DF 2009 3 DEDICATÓRIA Dedico o presente trabalho a meus pais que sempre me ajudaram e incentivaram na busca dos melhores resultados tanto na vida profissional como na vida pessoal e ao meu esposo por toda paciência e incentivo sendo imprescindível neste final de jornada e a toda a minha família pelo apoio e compreensão, obrigada. 4 AGRADECIMENTOS Agradeço a minha Orientadora professora Narcisa Castilho Melo pelo auxílio prestado durante a elaboração deste trabalho, e por suas dicas sem a qual não atingiria êxito na difícil elaboração do presente trabalho monográfico e a todos àqueles que me ajudaram nesta etapa importante da minha vida. 5 RESUMO Buscar uma análise dos processos e das formas mediante as quais a criança chega a aprender a ler e a escrever, identificando nestes as dificuldades existentes no processo de aprendizagem. Identificar os distúrbios de aprendizagem e a importância da leitura e da escrita na formação do indivíduo. Reconhecer a proposta de um diagnóstico preventivo dos distúrbios de aprendizagem, a intervenção do psicopedagogo no auxílio das dificuldades e, ainda, o acompanhamento contínuo das crianças e das famílias envolvidas no processo de aprendizagem apresentando-as como recursos imprescindíveis no trabalho dos educadores envolvidos no estudo dos distúrbios de aprendizagem, e na prática pedagógica servindo como respostas às questões propostas. 6 METODOLOGIA Tendo em vista que a presente pesquisa visa compreender a relação existente entre as atividades acadêmicas da leitura e da escrita, e as crianças portadoras de distúrbios de aprendizagem relacionadas a estas, fez-se necessário um estudo em diversas referências bibliográficas acerca do tema proposto, para que pudesse dar embasamento teórico a este estudo. Considerando, ainda, a prática pedagógica do cotidiano de sala de aula foi preciso fazer uma abordagem que demonstrassem os diversos conceitos existentes, as diversas visões e, sobretudo, as soluções propostas com intuito de identificar tais distúrbios. Assim, o presente estudo baseia-se em diversas pesquisas e referenciais teóricos com intuito de demonstrar as diversas teorias existentes, buscando uma síntese coerente das mesmas. 7 SUMÁRIO INTRODUÇÃO .................................................................................................. 8 CAPÍTULO I LEITURA E A ESCRITA: AS ETAPAS DO DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM ................................................................................................... 11 CAPÍTULO II AS CAUSAS DOS DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM ................................ 18 CAPÍTULO III DISTÚRBIOS DA LEITURA E DA ESCRITA .................................................. 31 CONCLUSÃO .................................................................................................. 37 BIBLIOGRAFIA ............................................................................................... 39 ÍNDICE ............................................................................................................. 40 8 INTRODUÇÃO Diversos são os caminhos que levam uma criança a ler e a escrever, dessa forma entende-se esse caminho como um processo pelo qual a criança deverá passar para compreender o objeto de seu conhecimento. A leitura e a escrita vistas como atividades acadêmicas exercem papel fundamental na formação do indivíduo como um todo, seja por propiciar o acesso às diversas áreas do conhecimento, ou ainda, como meio de inserção cultural. O saber ler e escrever tornou-se algo indispensável na vida do indivíduo, integrando-o ao contexto social ao qual está inserido ou possibilitando-lhe meios para um crescimento profissional. Aqueles que possuem dificuldades ou não dominam essas funções encontrarão sérios obstáculos na vida cotidiana para desempenhar seus “papéis sociais”, seja nas atividades mais simples, como se locomover, até o preenchimento de formulários em lojas, empregos, bancos etc. Assim, pelo exposto, é que se tem dispensado, por parte dos educadores, tamanha preocupação quanto a estes níveis de linguagem. Inúmeros estudos vêm sendo realizados com intuito de facilitar a aprendizagem da leitura e da escrita e, consequentemente, identificar as habilidades envolvidas nestes dois processos e a partir daí estimulá-las ao longo do período escolar, o que acabará por facilitar a alfabetização e todo o caminho que se segue. Porém, apesar de todo o esforço depreendido, aprender a ler e a escrever não são tarefas fáceis para um grande número de crianças, estas são classificadas por muitos estudiosos como portadoras de um distúrbio de aprendizagem, e que dificilmente conseguirão ser alfabetizadas ou até mesmo acompanhar o processo de ensino, sem o apoio de uma intervenção psicopedagógica. 9 Pamplona (1997) nos fala em reeducação psicopedagógica, que seria uma intervenção terapêutica que tem como objeto de seu trabalho crianças, adolescentes e até adultos que, independente do motivo, apresentam dificuldades para aprender. Dessa forma, entendendo a psicopedagogia como um meio de ajuda que se situa na fronteira existente entre psicologia e pedagogia. Sua atuação engloba diversas habilidades cognitivas, motoras, perceptivas, lingüísticas e os fatores externos que se relacionam com o processo de aprendizagem. Geralmente, esta intervenção não acontece de forma isolada, envolve além do atendimento do sujeito, a escola e a família. A esta são oferecidas as orientações de como lidar com as dificuldades que venham a ocorrer, enquanto aqueles são estimulados nas áreas que apresentam dificuldades. Por isso é essencial que seja realizado este trabalho em conjunto, para que os distúrbios existentes sejam superados e o sujeito consiga acompanhar o processo de ensino. Contudo, um dos grandes problemas na área de reeducação psicopedagógica é o reconhecimento tardio da criança portadora de um distúrbio de aprendizagem, seja por parte dos educadores, seja dos profissionais da área, esse desconhecimento acaba por agravar o problema, uma vez que a criança é encaminhada para atendimento depois de ter reprovado anos seguido e ter assimilado de forma automática os erros de leitura e de escrita. Desta forma, o processo reeducativo que deveria ter sido rápido e simples, torna-se algo demorado e demasiadamente complexo, o que acaba por gerar ansiedade nos pais que querem ver a questão resolvida, e as crianças que querem superar o mais rápido possível as dificuldades e, assim, poder acompanhar a turma. Assim, no decorrer do curso e ao longo dos estudos de diferentes materiais buscou-se identificar as diferentes causas dos distúrbios, as características dos mesmos e, como poderiam proceder os educadores frente a essas dificuldades escolares. Ressaltando, ainda, o papel do psicopedagogo no auxílio da identificação precoce dos distúrbios de aprendizagem, bem como na elaboração de programas reeducativos ou de reforço escolar que visem à reintegração da criança, com dificuldades, no processo de ensino formal. 10 A presente monografia apresenta-se dividida em três capítulos. O primeiro aborda, de modo geral, as definições da leitura e da escrita que permitirão entender e trabalhar os distúrbios de aprendizagem que por ventura possam surgir no decorrer do processo de ensino, e, ainda, o entendimento destas como parte do desenvolvimento geral da linguagem, e que não devem ser vistos como processos isolados. No segundo capítulo tratam-se das causas que contribuem para o fracasso escolar, a estimulação das habilidades básicas necessárias à alfabetização, os métodos relacionados ao ensino, os fatores maturacionais e emocionais, e ainda, a dislexia. E por fim, no terceiro capítulo são relacionados os distúrbios da leitura e da escrita. No que tange a leitura são analisadas as dificuldades de percepção (auditiva e visual) das palavras e, as dificuldades em compreender e assimilar aquilo que lê. Com relação à escrita observam-se as trocas ocorridas na escrita, as dificuldades referentes ao traçado gráfico e, por último o conceito de disgrafia. Assim, buscou-se por meio de reflexões teóricas um reconhecimento das dificuldades de leitura e de escrita relacionados aos distúrbios de aprendizagem no processo de ensino com intuito de verificar as mesmas e contribuir para melhoria da qualidade tanto do ensino, quanto da vida dos educando com dificuldades de aprendizagem. 11 CAPÍTULO I A LEITURA E A ESCRITA: AS ETAPAS DO DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM Desde tempos remotos o homem sente a necessidade de se comunicar com os outros da sua espécie, o que se torna explícito no período pré-histórico através de processos de pinturas encontrados em cavernas, nos quais eram feitas mensagens em formas de desenhos. Essa era uma forma de comunicação estabelecida entre eles. Porém, com a evolução do tempo e, consequentemente, do próprio homem os processos de leitura e escrita se alteraram consideravelmente. Na concepção de Pamplona (1997, p.17) vamos encontrar o seguinte esclarecimento: Para responder às exigências de uma comunicação mais precisa, inventaram-se as consoantes e as vogais e, a linguagem ocidental, tornou-se alfabética. Cada som passou a ser representado por uma determinada grafia (letra). A especialização e o aprofundamento das ciências em torno do universo humano deram lugar de destaque às atividades gráficas já que se tornou impossível transmitir todos os conhecimentos através da fala. Aprender a ler e a escrever, deixou de ser privilégio dos mais abastados para se tornar uma preocupação de todos os governos, pois transformou-se num termômetro de desenvolvimento social. 12 Cabe aqui recordar alguns dados relevantes que fazem referência à situação educacional na América Latina, que servem de exemplificação da problemática levantada. Os dados oficiais da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e Cultura – UNESCO (1974) mostram que: • Do total da população compreendida entre os 7 e 12 anos, em 1970, 20 % encontravam-se fora do sistema educacional. • De toda a população escolarizada, apenas 53% chegam à 4ª série – o limiar mínimo indispensável para uma alfabetização definitiva – ou seja, a metade da população abandona sua educação, sem regressar à escola, ainda num momento muito elementar do ensino fundamental. • Dois terços do total de repetentes estão situados nos primeiros anos de escolaridade, e em torno de 60% dos alunos egressos da escola repetiram o ano uma ou mais vezes. Tais dados servem para reforçar e comprovar a existência de um problema de tamanha magnitude que não pode e não deve passar despercebido aos olhos das autoridades e órgãos competentes, sejam eles nacionais ou internacionais. No ano de 1976, a UNESCO por meio de estatísticas oficiais estimava em 800 milhões o número de adultos analfabetos no mundo. Em 1977, a UNESCO toma uma resolução importante, transmitida pelo jornal Le Monde, de Paris, que dizia o seguinte: Em 8 de setembro, Dia internacional da Alfabetização, terá lugar, em Paris, na sede da UNESCO, uma cerimônia na qual, pela primeira vez, não será outorgado nenhum dos prêmios destinados a recompensar uma ação realizada para combater o analfabetismo (prêmios Mohammed – Reza-Pahlevi e Nadejda Kroupaskaía). O júri tomou essa decisão em razão do aumento do número de analfabetos no mundo estimado, em 1976, em 800 milhões de adultos. O júri estima que a alfabetização deveria fazer parte dos planos de desenvolvimento nacional dos países afetados. Na mensagem 13 publicada em razão desse Dia Internacional, o diretor geral da UNESCO, Amadou Mathar M’Bow, exorta os estados a consagrar aos programas de alfabetização uma parte dos gastos dedicados a armamentos, sublinhando que “o custo total de um só bombardeiro com seu equipamento equivale ao salário de 250.000 professores por ano”. Este ato da UNESCO se mostra importante, pois enfatiza o aumento do número de analfabetos no mundo à medida que reconhece o fracasso das diversas campanhas de alfabetização realizadas em anos recentes. Considerando que a alfabetização tem duas vertentes: uma relativa aos adultos, e a outra, relativa às crianças. Segundo nos aponta Ferreiro (1999, p.19): [...] se em relação aos adultos trata-se de sanar uma carência, no caso das crianças trata-se de prevenir, de realizar o necessário para que essas crianças não se convertam em futuros analfabetos. Ambas as tarefas são responsabilidade dos estados que – como membros das Nações Unidas – aceitaram a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948). O Artigo 26 dessa declaração fala do Direito à Educação: ‘Todo o indivíduo tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, ao menos no que se refere ao ensino elementar e fundamental. O ensino elementar é obrigatório”. 1.1 As etapas do funcionamento verbal Conforme Condemarín (apud Pamplona, 1997, p.18) a linguagem oral (fala) é uma característica biologicamente determinada, que se desenvolve de forma natural e espontânea se existir um ambiente estimulante, se a criança não apresenta nenhum distúrbio a nível fonoarticulatório, o mesmo não acontece com a leitura e a escrita. Cabe salientar que “dois terços da população humana não lê nem escreve, enquanto toda a população mundial fala” (ibidem). Neste sentido, fica evidente que a leitura e a escrita não são 14 características inatas da espécie humana e por isso é necessário esforço e, sobretudo, existência de um ambiente que favoreça tais manifestações. Todavia, a leitura e a escrita não devem ser visto como atos isolados no processo de desenvolvimento da criança. Estes dois processos fazem parte da evolução da linguagem que se inicia logo nos primeiros dias de vida da criança. Ainda de acordo com Condemarín, o desenvolvimento da linguagem pode ser dividido em cinco etapas interdependentes e sequencializadas. Interdependentes porque cada uma dessas etapas depende da anterior para se desenvolver e, sequencializadas, pois obedecem a uma sequência de desenvolvimento. Neste sentido, qualquer deficiência em uma dessas etapas poderá implicar em distúrbios nas etapas posteriores. A primeira etapa do funcionamento verbal é a aquisição do significado. A segunda etapa é a compreensão da palavra falada. A terceira etapa é a expressão da palavra falada. A quarta e quinta etapas são respectivamente, a compreensão da palavra impressa (leitura) e a expressão da palavra impressa (escrita). Na primeira etapa a criança adquire a noção e a função dos objetos que a rodeiam atribuindo-lhes um significado social. Por meio da observação e da experimentação é que a criança faz a relação entre os objetos e os seus respectivos significados. Já na segunda etapa os objetos que agora já possuem um significado passam a ter também nomes na concepção da criança. É na terceira fase que o comportamento vocal (fala) da criança começa a se assemelhar à fala do adulto, pois a criança compara os sons que emite aos sons falados pelos adultos e imita-os. Assim, é possível verificar que a fala se desenvolve por imitação, por isso que uma criança surda, geralmente não passa da etapa do balbuciar porque não consegue comparar nem imitar os sons emitidos por ela, com as palavras faladas pelos adultos. A quarta e a quinta etapas seriam os estágios superiores da linguagem. 1.2. A Leitura 15 A leitura envolve a identificação dos símbolos impressos (letras, palavras) e a relação destes com os sons que eles representam. No início do processo de aprendizagem a criança tem que diferenciar visivelmente cada letra, e perceber que cada símbolo gráfico tem um correspondente sonoro. Quando a letra “p” é visualizada, esta deve ser relacionada com a forma sonora que a representa, ou seja, /p/. Ao entrar em contato com as palavras, a criança deverá diferenciar visivelmente cada letra que forma a palavra e, associá-la ao seu respectivo som, formando, assim, uma unidade lingüística dotada de significado. Se a associação entre Palavra impressa e Som não for realizada, a criança não conseguirá ler, pois as letras e as palavras não terão correspondentes sonoros. Dessa maneira, a criança que não consegue fazer a associação: Palavra impressa – Som, quando se deparar, por exemplo, com a palavra “gato”, esta não passa de um desenho porque não tem correspondência com sua linguagem falada. Como nos aponta Pamplona (1997), este processo de discriminação visual dos símbolos impressos e a associação entre Palavra impressa - Som é chamado de decodificação. No entanto, para ler não basta apenas decodificar os símbolos é necessário que se compreenda aquilo que está lendo. Compreender, então, é relacionar as palavras que são decodificadas aos seus significados. Como exemplificado acima ao lê a palavra “gato” a criança deverá associá-la ao animal “gato”, porém, se a criança nunca viu um “gato”, não poderá compreender o que significa aquela palavra que decodificou. Pamplona (1997, p.21) assim nos assevera: [...] sem a compreensão, a leitura deixa de ter interesse e de ser uma atividade motivadora, pois nada tem a dizer ao “leitor”. Na verdade, só se pode considerar realmente que uma criança lê quando existe a compreensão. Quando a criança decodifica e não compreende, não se pode afirmar que esteja lendo. 16 Por fim, a última fase do processo de leitura refere-se à análise crítica do material o qual já foi decodificado e compreendido. Dessa maneira, cada indivíduo constrói, com base na sua experiência, um referencial de idéias e pensamentos que servem de base para a realização da análise crítica. 1.3. A Escrita No processo da escrita ocorre o inverso da leitura, se nesta estabelece uma relação entre Palavra impressa – Som – Significado, naquela a relação estabelecida é entre Som – Significado – Palavra impressa (o que está escrito). Ao fazermos uma cópia, começamos por fazer uma discriminação visual de todos os detalhes das letras e do formato da palavra que está servindo de modelo. Logo após, relacionamos os símbolos impressos - as letras e a palavra – aos sons, aos movimentos articulatórios, aos movimentos gráficos, aos significados e, só então, reproduzimos graficamente a palavra – modelo. No ditado, as palavras ditadas oralmente pelo professor devem ser discriminadas e diferenciadas auditivamente pelo aluno, em seguida, são associadas aos significados, a sua forma gráfica. Na redação, as palavras são elaboradas mentalmente e ligadas aos respectivos sons, aos significados, à forma gráfica e escritas. É notório que nesta prática da escrita, a leitura tem papel essencial. É através da leitura de diversos textos que adquirimos vocabulário novo, diferente daquele usado cotidianamente, que percebemos como se articulam as regras gramaticais e se aprendem novas formas de escrever. Por isso, dificilmente uma pessoa que não lê conseguirá se expressar na forma escrita, não terá um rol variado de palavras. Segundo Pamplona (1997), na redação o escritor busca no seu interior as palavras adequadas para poder repassar ao outro, aquilo que vivencia e, a opção da escolha de palavras e da forma como estas vão se articulando representam, no fundo, modelos interiorizados de inúmeras leituras que o escritor realizou durante a sua vida. 17 Assim, podemos entender que em qualquer uma destas modalidades da escrita é perceptível que a relação existente entre Palavra impressa e Som deve estar automatizada para permitir que a criança se expresse graficamente. Em síntese, a criança precisa saber ler para poder escrever, se ela lê com dificuldade ou ainda não aprendeu a ler, de nada adiantará os exercícios escritos, uma vez que as palavras por ela escrita não tem correspondente sonoro e, não são compreendidas. Neste sentido, a escrita se torna um processo sem significado, cansativo e desgastante e exigirá muito esforço para ser realizado. Dessa forma, quando se fala em Distúrbios da Aprendizagem ligados a leitura e a escrita, faz-se necessário a priori analisar a leitura oral e silenciosa antes de se avaliar a escrita (cópia, ditado, redação), por serem as dificuldades de escrita, na grande maioria, decorrentes de uma leitura lenta, analítica, impregnada de trocas de sílabas ou palavras sem pontuação nem ritmo e, portanto, incompreensível. 18 CAPÍTULO II AS CAUSAS DOS DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM Segundo diversas pesquisas realizadas, várias são as causas tidas como responsáveis pelas dificuldades escolares e pelos altos índices de evasão e reprovação escolar, entre eles pode-se citar: • Falta de estimulação adequada nos pré-requisitos necessários à alfabetização; • Métodos de ensino inadequados; • Problemas emocionais; • Falta de maturidade para iniciar o processo de alfabetização; e • Dislexia Cabe citar, ainda, o aspecto carencial da população; as diferenças culturais e/ou sociais; fatores intra-escolares (currículo, programas, sistemas de avaliação, relação professor/aluno); deficiência mental; problemas físicos e/ou sensoriais (déficits auditivos ou visuais). Faz-se necessário, portanto, que exista uma preocupação em determinar precocemente a causa da dificuldade para aprender. O diagnóstico precoce do distúrbio de aprendizagem é ponto fundamental para a superação das dificuldades escolares, serve de orientação aos educadores e pais sobre a melhor forma de lidar com a criança, direcionando a elaboração de programas de reforço escolar, e a adoção de estratégias clínicas e/ou educacionais que 19 auxiliam a criança no desenvolvimento escolar. Nesse contexto, o professor possui um papel de destaque cabendo a ele o reconhecimento das crianças com dificuldade de aprendizagem, já que participa diretamente do processo ensino-aprendizagem. Após este reconhecimento inicial, a criança deve ser encaminhada a um profissional especializado com o intuito de se determinar “a real causa do não-aprender”. Porém, deve ficar claro que a aprendizagem da leitura e da escrita é um processo complexo que envolve várias habilidades e, por isso, não se pode esperar, portanto, que um determinado fator seja o único responsável pela dificuldade para aprender. Na realidade, os distúrbios de aprendizagem dependem de causar múltiplas, cabendo ao profissional o diagnóstico, destacar a área mais comprometida e, recomendar a abordagem terapêutica mais indicada para a superação das dificuldades. 2.1. Ausência de estimulação das habilidades básicas necessárias à alfabetização Com base em análises feitas sobre os comportamentos envolvidos nos processos da leitura e da escrita, é possível verificar a classificação das várias habilidades básicas ou pré-requisitos necessários à alfabetização. É possível definir estes pré-requisitos como certos “conceitos”, que a criança deve adquirir ao longo do seu período pré-escolar, e que facilitam a aprendizagem da leitura e da escrita. A aquisição dessas habilidades não acontece de forma aleatória ou espontânea, é um processo ao qual a criança é submetida e que exige um treinamento programado e específico, de acordo com a fase de desenvolvimento em que se encontra. a) Imagem corporal – Esta habilidade implica no conhecimento adequado do corpo, das funções dos seus órgãos, seus membros, suas 20 sensações, e por fim a impressão que a criança tem de seu corpo, proveniente das experiências desta com o meio ambiente que a rodeia. É através do corpo que a criança interage com o mundo. Dessa maneira, o conceito de imagem corporal é relevante no que tange à aprendizagem, pois uma boa formação deste pré-requisito faz com que a criança torne seu corpo um ponto de referência. Assim, poderá assimilar conceitos indispensáveis à alfabetização, tais como: em cima, embaixo; na frente, atrás; esquerdo, direito; alto, baixo; b) Lateralidade – Segundo o seu conceito é o uso preferencial de um lado do corpo para a realização das atividades, referindo-se aos olhos, mão e pé. Dessa forma, existem pessoas destras que usam a parte direita do corpo para realizar as atividades. E, existem pessoas canhotas, que são aqueles que utilizam da parte esquerda do corpo. Além destas classificações mais conhecidas, também, se podem encontrar indivíduos com lateralidade contrariada, cruzada, indefinida e ambidestros. A lateralidade contrariada refere-se às pessoas, na grande maioria canhotos, que foram obrigadas a mudar a preferência manual devido às exigências sociais e/ou familiares. Já na lateralidade cruzada não ocorreu à pressão ambiental, não existindo homogeneidade na preferência de um dos lados do corpo. Lateralidade indefinida é um termo utilizado para caracterizar crianças que ainda não se decidiram pelo uso preferencial de um lado do corpo – é esperado que a dominância lateral esteja estabelecida por volta dos 4 ou 5 anos de idade. E por último, o termo ambidestria que vêm a ser aplicado às pessoas que se utilizam de ambos os lados do corpo com mesma habilidade e destreza. Segundo Pamplona (1997), durante muitos anos pensou-se que a lateralidade contrariada, cruzada e a lateralidade indefinida pudessem causar distúrbios de leitura, de matemática, de fala ou problemas emocionais. Hoje já se sabe que crianças que apresentam distúrbios de aprendizagem ou de fala, 21 podem apresentar, também, esses tipos de lateralidade, mas não que os problemas que elas apresentam tenham sido causados por estas. No que diz respeito ao processo de aprendizagem, verifica-se que as dificuldades que surgem nas crianças com lateralidade contrariada, cruzada e indefinida referem-se: ao tipo de grafia; às dificuldades de orientação espacial quando utilizam a folha de papel; e, às posturas inadequadas para escrever. c) Conhecimento de direita e esquerda - O conceito de direita e esquerda é de suma importância para o processo de alfabetização. Este conceito, ligado ao conceito de imagem corporal e de lateralidade, permite à criança distinguir o lado direito e o lado esquerdo em si, nas outras pessoas e nos objetos. Conforme o entendimento de Ajuriaguerra (apud Pamplona, 1997, p.43), é esperado que por volta dos 6 ou 7 anos, a criança consiga reconhecer em si mesma estas noções. Iniciar aprendizagem da leitura e da escrita sem aquisição destes conceitos, pode implicar em confusões na orientação espacial. A criança poderá apresentar dificuldades para diferenciar letras que distinguem quanto à posição espacial, por exemplo: b-d, p-q. Em nossa sociedade, a leitura e a escrita, realizam-se no sentido da esquerda para a direita. A criança que não possui estas noções tende a não respeitar esse sentido, por não precisar corretamente o lado esquerdo e direito. Todavia, essas dificuldades deverão ser motivo de preocupação, caso estejam presentes no momento em que se inicia a alfabetização, pois interferirão de forma negativa na associação entre letras e sons. d) Orientação espacial – Ao se falar em orientação espacial, é necessário fazer a diferenciação entre posição no espaço e relação espaciais. Considerando que a posição espacial é a relação existente entre um objeto e seu observador. A criança que possui uma boa imagem corporal é capaz de perceber a posição que os objetos ocupam, usando como ponto de referência o seu próprio corpo. 22 Desta maneira, ela consegue discriminar as diferentes posições espaciais que os objetos ocupam e, compreender e assimilar os diferentes conceitos relacionados com a posição espacial, tais como: atrás, à frente; esquerdo, direito; em cima, embaixo, etc. Assim, as crianças que iniciam o processo de alfabetização sem possuírem as noções de posição e orientação espacial, acabam por confundir letras que diferem quanto à orientação espacial e têm dificuldades em respeitar a ordem de sucessão das letras nas palavras e das palavras na frase. e) Orientação temporal – Conquanto, a orientação espacial está sempre relacionada às atividades visuais, a orientação temporal relaciona-se à audição. A criança precisa captar e discriminar a duração e a sucessão dos sons, e ainda, dominar determinados conceitos temporais, como exemplo: ontem, hoje, amanhã, dias da semana, meses, anos, horas, etc. A noção destes conceitos vai permitir que a criança se oriente no tempo durante a realização das tarefas. A ausência deste pré-requisito pode causar dificuldades na pronúncia e na escrita de palavras, trocando a ordem das letras ou invertendo-as; dificuldades na retenção de uma série de palavras dentro da sentença e, de uma série de idéias dentro de uma história; má utilização dos tempos verbais; e problemas nas correspondências dos sons com as respectivas letras que o representam. f) Constância de percepção de forma e tamanho – É a capacidade de perceber que um determinado objeto permanece inalterado apesar da posição que ocupa no espaço – se está perto, longe – ou independente do ângulo que é percebido. A constância de tamanho permite à criança perceber o tamanho como constante, mesmo que a imagem desse objeto tenha se tornado menor na retina. A constância de forma é a habilidade que permite o reconhecimento de que as formas são as mesmas, apesar de olhadas por diferentes ângulos. 23 Crianças com dificuldades em perceber a constância de tamanho e de forma poderão apresentar dificuldades no reconhecimento de figuras geométricas, e no reconhecimento de palavras ou letras aprendidas, mas inseridas em contextos diferentes e desconhecidos, ou quando escritas tipos diferentes de grafia – manuscrita, impressa. g) Percepção de figura-fundo - No que se refere à escrita, a criança poderá ter dificuldades em dirigir sua atenção para uma palavra ou grupo de palavras dentro de um texto ou para letras dentro das palavras. Neste caso, as palavras ou letras serão percebidas de forma confusa o que dificultará bastante a compreensão do que é lido ou escrito. Numa realidade mais específica, as crianças poderão ter dificuldades em perceber com exatidão as letras e as palavras impressas numa folha, pois a sua atenção perceptiva pode alterar-se entre as palavras impressas e o branco da folha. h) Habilidades auditivas específicas - Assim como na visão, o sistema auditivo em seu perfeito funcionamento é de suma importância no processo de aprendizagem. É por meio destes dois sistemas (visual e auditivo), que as informações gráficas são recebidas e conduzidas ao cérebro para serem analisadas, comparadas com outras informações e armazenadas na memória. Especificamente no caso da audição, além do bom funcionamento deste sistema, há a necessidade que exista uma estimulação a nível de discriminação de sons, de figura-fundo e memória auditiva, para que o processo de aprendizagem ocorra com facilidade. i) Discriminação de sons - Refere-se à capacidade de se perceber e discriminar auditivamente e, sem duplo sentido, todos os sons existentes na língua falada. As crianças com dificuldades em discriminar auditivamente sons diferentes, não terão possibilidade de reproduzi-los com exatidão na leitura e na escrita, pois será muito difícil associarem um som percebido de forma errada com a grafia correta. 24 j) Memória auditiva - Segundo Vallet (apud Pamplona, 1997, p.60), a memória auditiva permite a retenção e a recordação das informações captadas auditivamente. Este acontecimento faz com que a criança seja capaz de fixar e reproduzir, oralmente ou por escrito, as informações recebidas auditivamente e lembrar qual o som correspondente a um símbolo gráfico visualizado. As dificuldades mais freqüentes ligadas a esta habilidade são as falhas na retenção de palavras ou séries de palavras percebidas auditivamente, e as falhas em associar os símbolos gráficos discriminados visualmente aos correspondentes sonoros. k) Linguagem oral - Salienta Pamplona (1997), se partimos do princípio de que, a leitura e a escrita são os últimos estágios de desenvolvimento da linguagem e que, a linguagem oral é uma etapa anterior à linguagem escrita, então a linguagem oral, constitui um pré-requisito que serve de alicerce à aprendizagem gráfica. Entre as modalidades inseridas na linguagem falada podem-se destacar três, sendo a prolação ou pronúncia, que seria a forma correta de pronunciar as palavras ou frases e, deve ser avaliada de acordo com a idade cronológica da criança e de estágio de desenvolvimento, o vocabulário, que seria a capacidade de falar palavras conhecendo seu significado baseado na própria experiência, e por fim a sintaxe oral que vêm a ser a habilidade de formular frases oralmente ou sintaxe oral correta, que implica na perfeita elaboração mental das unidades básicas do pensamento, que são as frases. 2.2. Métodos de ensino A escolha e a elaboração dos métodos de ensino têm como objetivo principal permitir e facilitar a aprendizagem da leitura e da escrita. Considerando que nem sempre esse objetivo foi alcançado, encontra-se uma grande variedade de métodos de ensino. 25 Os métodos de ensino podem ser diferenciados em três grandes grupos: os métodos sintéticos, os métodos analíticos e os métodos analíticosintéticos. Os métodos sintéticos têm sido classificados em: alfabéticos, fonético e silábico. Os métodos de orientação analítica caracterizam-se por iniciarem o processo de alfabetização partindo de unidades significativas da língua, ou seja, de palavras, frases, parágrafos ou textos, e são classificados em: método das palavras, da frase, do parágrafo e do conto. O terceiro tipo de métodos são os analítico-sintéticos que combinam as duas formas anteriores. 2.2.1. O método alfabético Conforme indicado pelo próprio nome, o ensino da leitura iniciava-se pelo nome das letras que compunham o alfabeto. Depois de se haver decorado o alfabeto de forma direta, inversa e salteada, o aluno fazia todas as combinações possíveis entre as vogais e as consoantes. Porém, foram inúmeras as críticas a esse método de ensino, já que o nome das letras pouco ou nada tinha a ver com os sons que representavam. E por isso, devido à sua falta de aplicabilidade, enquanto meio de facilitar a aprendizagem da leitura, o método alfabético foi sendo abandonado e caiu em desuso. 2.2.2. O método fonético O método fonético parte do princípio de que a palavra se forma à medida que se pronuncia rapidamente os sons das letras e não o seu nome. A principal vantagem deste tipo de método, segundo vários autores, era que ao se usar o som das letras e não o seu nome para identificar as palavras, desenvolvia-se a capacidade de pronunciar qualquer palavra visualizada. 26 No entanto, as desvantagens deste método referem-se às dificuldades de se emitirem os sons das consoantes isoladamente do som das vogais e, à falta de interesse do aluno, principalmente no início da alfabetização. Para superar estas dificuldades, introduziram-se figuras de animais ou de pessoas associadas aos sons a serem ensinados. 2.2.3. O método silábico Este método surgiu para tentar superar os obstáculos apontados no método fonético, principalmente aqueles em relação às dificuldades de se pronunciar com exatidão os sons das consoantes isoladas dos sons das vogais. No método silábico as unidades chaves empregadas para ensinar a ler são as sílabas. As sílabas ao serem aprendidas eram combinadas em palavras e daí se chegava às frases. As críticas ao método silábico são praticamente as mesmas que foram feitas ao método fonético. 2.3. Métodos analíticos 2.3.1. O método da palavra A aprendizagem da leitura inicia-se pelas palavras. Estas são apresentadas visualmente às crianças, que por sua vez repetem em voz alta até que consigam identificá-las rapidamente. À medida que as palavras vão sendo aprendidas, são utilizadas na construção de frases. As críticas a este método ressaltam as dificuldades que a maioria das crianças encontram para identificar as palavras, o que atrasa o processo de aprender a ler. 27 2.3.2. O método da frase Este método de ensino que utiliza a frase como ponto de partida para a aprendizagem da leitura, parte do pressuposto de que as frases são mais interessantes que as palavras, pois facilitam a compreensão do que se lê. As frases que surgem na classe são escritas no quadro e os alunos repetem-nas visualizando-as. À proporção que as frases vão sendo aprendidas, o aluno vai comparando-as e percebendo quais as diferenças existentes entre elas, sempre baseado no todo. 2.3.3. O método do parágrafo A justificativa para o uso deste método é que o parágrafo é a verdadeira unidade lingüística. Assim, tem-se que o ensino da leitura é iniciado com uma discussão acerca de algo interessante para a classe. Após esta discussão, o professor escreve uma das observações no quadro e a lê. Os alunos também a lêem e identificam grupos de palavras dentro de cada grupo. Através de exercícios, novas palavras vão sendo aprendidas e, mais tarde, pode-se concentrar o estudo nas unidades que constituem as palavras. 2.4. O método analítico-sintético ou eclético Os métodos analítico-sintéticos, que combinam os dois processos psicológicos envolvidos na leitura (análise-síntese), surgiram como respostas às críticas feitas aos métodos sintéticos e aos métodos analíticos. No método eclético o processo psicológico envolvido na leitura é sempre o mesmo: ao se deparar com palavras, o aluno deverá dividi-las em sílabas (análise), o que permite a decodificação dos símbolos impressos e, para pronunciá-las e compreendê-las deverá realizar a síntese, ou seja, a “recombinação” das sílabas em palavras. 28 Umas das principais vantagens do método analítico-sintético é de permitir que o aluno reconheça rapidamente as palavras visualizadas, e que compreenda os símbolos gráficos que está decodificando. 2.5. Métodos de ensino X Distúrbios de aprendizagem Inúmeras são as pesquisas que têm sido realizadas para determinar qual o método mais eficaz para o ensino da leitura e da escrita, todavia não é possível chegar à conclusão de qual é o melhor método de ensino utilizado nos dias de hoje, mas é consenso que método desenvolve no aluno determinadas capacidades. As crianças que são alfabetizadas pelo método fonético têm apresentado mais facilidade para identificar palavras, do que as crianças que são ensinadas por um método do tipo global. As crianças alfabetizadas por um método global, parecem ter mais facilidade para compreender o significado das palavras ou mesmo dos textos, mas têm mais dificuldades em identificar palavras, especialmente as desconhecidas. Mas, os melhores resultados obtidos nas pesquisas realizadas, têm sido a favor dos métodos analítico-sintéticos, os quais desenvolvem ao mesmo tempo, a identificação das palavras e a compreensão. Baseados nestes resultados, vários estudiosos têm defendido a idéia de que a ênfase na alfabetização deve ser tanto a nível de decodificação de palavras, como na sua compreensão utilizando-se, para isso, métodos de orientação analíticosintéticos. 2.6. Dislexia A partir do século XIX, passou-se a dar mais atenção às crianças com problemas de leitura e que não apresentavam fracassos nas demais disciplinas 29 escolares, nem possuíam quaisquer deficiências que pudessem explicar as dificuldades para ler. Assim, pela necessidade de entendermos essas dificuldades conceituouse dislexia como sendo o termo que se refere às crianças que apresentam sérias dificuldades de leitura e, consequentemente, de escrita, apesar de seu nível de inteligência ser normal ou estar acima da média. Por outro lado, a criança disléxica não apresenta distúrbios a nível sensorial ou físico, a nível emocional, ou desvantagens sócio-econômicas, culturais e instrucionais, que possam ser consideradas causas das dificuldades para aprender a ler. Se a causa das dificuldades para ler é alguma das variáveis citadas acima, então não se pode falar em dislexia. Partindo deste pressuposto, fica evidente que o diagnóstico da criança disléxica é algo muito complexo, que envolve várias áreas e, na maioria das vezes, é necessária a opinião de diferentes profissionais para se conseguir um diagnóstico perfeito. 2.6.1. Classificações da dislexia Considerando que os conceitos dados à dislexia variam de acordo com os estudos e pressupostos teóricos de diferentes autores, assim também acontece com as classificações. Segundo Johnson e Myklebust (apud Pamplona, 1997, p.97) existem dois tipos de dislexia: auditiva e visual. Para esses autores, a dislexia auditiva caracteriza-se pela dificuldade em distinguir semelhanças e diferenças entre sons acusticamente próximos; em perceber sons no meio de palavras; em análise-síntese, memória e seqüências auditivas. Estas crianças, apesar de possuírem uma acuidade auditiva normal, não conseguem discriminar e relacionar os sons que constituem as palavras. Desta maneira, cada palavra visualizada por ela dificilmente é decodificada, pois os sons que representam as letras ou palavras não são recordados. A dislexia visual caracteriza-se pela dificuldade em diferenciar, interpretar e recordar palavras vistas visualmente. Assim, as crianças disléxicas visuais têm severas dificuldades em memória e análise-síntese visual, de 30 detalhes, em perceber rapidamente as palavras escritas, em respeitar as seqüências viso-espaciais, etc. Neste caso, os distúrbios de leitura manifestamse pelas trocas entre palavras com detalhes ou configurações gerais semelhantes, pela dificuldade em representar graficamente as palavras ouvidas ou elaboradas mentalmente, e pelas inversões de letras que diferem quanto á orientação espacial. 2.6.2. Prognóstico da dislexia Na grande maioria das vezes, através de uma reeducação psicopedagógica, o disléxico consegue dominar as habilidades e destrezas necessárias para ler e escrever. Porém, sem uma atenção especializada, raramente a criança disléxica consegue, por si só, superar suas dificuldades e, quase sempre, acaba se excluindo das atividades escolares ou de profissões que exijam a realização de processos gráficos. Os problemas emocionais que geralmente a criança disléxica apresenta, não são as causas das dificuldades para ler, mas sua conseqüência. Geralmente, incompreendida em seu fracasso, e não sendo valorizada em suas tentativas para superar suas dificuldades escolares, a criança disléxica acaba desenvolvendo uma auto-imagem negativa, e uma total desmotivação para empreender a difícil tarefa de ler e de escrever. É decorrente desta situação que, tanto a dislexia como demais dificuldades escolares (independente de causa), devem ser motivo de preocupação de professores e pais na tentativa de se fazer um diagnóstico precoce, com a finalidade de desenvolver uma estratégia de ajuda, que auxilie a criança a superar os obstáculos que vão tornando impossível o ato de aprender a ler e a escrever. 31 CAPÍTULO III DISTÚRBIOS DA LEITURA E DA ESCRITA A percepção das palavras envolve, necessariamente e, no mínimo, dois sistemas: o visual e o auditivo. Se por algum motivo esses sistemas estão recebendo a estimulação ambiental de forma distorcida, o cérebro processará informações erradas. Com base neste pressuposto que se analisará os distúrbios da leitura decorrentes das dificuldades de percepção. Quando se fala em distúrbios de leitura relacionados às dificuldades de discriminação auditiva, não se está afirmando que as crianças têm perda de acuidade auditiva. Na leitura, as trocas que ocorrem devido às dificuldades de discriminação auditiva envolvem sons acusticamente próximos. A confusão entre estes sons está, intrinsecamente, relacionada com o ponto de articulação de cada um, no momento da emissão sonora. No caso dos sons acusticamente próximos, os pontos de articulação são praticamente iguais, o que leva a criança a confundir esses fonemas. Na leitura, as trocas mais freqüentes de serem constatadas são entre consoantes surdas e sonoras. Praticamente, a diferença que existe entre estas consoantes é a vibração das cordas vocais (visto a proximidade do ponto de articulação). Na pronúncia das consoantes sonoras as cordas vocais vibram e nas surdas isso não ocorre. A criança que apenas se detém na posição dos órgãos articulatórios para diferenciar estes fonemas, acaba confundindo-os. Possíveis trocas entre consoantes surdas e sonoras (e vice-versa) Consoantes surdas Consoantes sonoras Troca de F (faca) por V (vaca) 32 Troca de P (pão) por B (bão) Troca de CH (chato) por J (jato) Troca de T (toca) por D (doca) Troca de S (seca) por Z (zeca) Troca de C (cola) por G (gola) Cabe afirmar que, geralmente, as trocas relacionadas à discriminação auditiva dos diferentes sons, são mais notórias na escrita do que na leitura. Isto ocorre considerando o fato de que o professor que acompanhar a leitura oral dessas crianças, irá se apoiar no sentido das palavras e/ou no contexto em que estão inseridas e, estas confusões podem passar desapercebidas. 3.1. Dificuldades de discriminação visual Os distúrbios de leitura que envolvem a discriminação visual, não implicam, obrigatoriamente, na existência de “déficits” visuais. Quando se aborda a leitura e a escrita, quatro conceitos emergem como fundamentais para que se discriminem satisfatoriamente as letras, as palavras e os números. São eles: em cima e embaixo; esquerda e direita. Os conceitos “em cima e embaixo” são de fácil aquisição, pois podem ser vivenciados no, e pelo próprio corpo. Facilmente, a criança percebe que sua cabeça fica em cima do seu tronco e seus pés abaixo. No que se refere à leitura e à escrita, estes conceitos são importantes na medida em que sua aquisição permite a distinção adequada das letras. Já no que tange aos conceitos “esquerdo e direito” pode-se dizer que sua aquisição é bem mais difícil e complicada de ser adquirida. Isto ocorre porque ao se tomar o corpo como de ponto de referência, nota-se que estes conceitos são simétricos e relativos. Simétricos, pois o lado esquerdo do corpo é idêntico ao lado direito, não existindo quaisquer sinais ou características observáveis que diferenciem um lado do outro. Relativos, porque dependem da posição que o sujeito ocupa. 33 Em relação aos problemas de aprendizagem, a não aquisição destes conceitos pode ocasionar trocas entre letras que apenas diferem quanto à orientação espacial tais como “b” e “d”; “p” e “q”. 3.2. Leitura silenciosa Segundo Silvestre, Azzi e Ferraz (apud Pamplona, 1997, p.113), a leitura silenciosa é uma atividade pedagógica em que o individuo, tendo a sua frente um texto, deve lê-lo usando apenas os olhos, sem movimentar os lábios ou apontar com o dedo. Neste sentido, espera-se que a leitura silenciosa seja uma atividade muito mais rápida do que a leitura oral, pois não envolve a articulação das palavras. Em relação aos distúrbios de aprendizagem, o aluno com dificuldades para ler, caracteriza-se por apresentar uma leitura silenciosa lenta, devido aos problemas em reconhecer rapidamente as palavras impressas. Esta lentidão pode estar acompanhada de uma grande dispersão, que é ocasionada pelas dificuldades no reconhecimento das palavras, tornando a leitura incompreensível, extremamente cansativa e desmotivadora. Além desta lentidão e dispersão, o aluno pode apresentar uma leitura subvocal, ou seja, pode mover os lábios durante a leitura silenciosa. Nesta modalidade de leitura, anseia-se que as informações sejam captadas apenas pelos órgãos visuais e, se a criança está articulando as palavras é porque a via visual não está sendo suficiente para captar e interpretar os símbolos impressos. Outro fato que pode ser observado nas crianças durante a leitura silenciosa, é o de seguirem apontando com o dedo (ou régua ou lápis), as palavras que estão sendo lidas. Neste tipo de ajuda podem estar implícitas dificuldades de convergência binocular. A criança que não consegue focalizar ambos os olhos num estímulo, necessita de um apoio, de um auxílio para guiar os movimentos oculares. 34 3.3. A compreensão da leitura A definição de leitura aponta como objetivo desta atividade a compreensão do material decodificado. A compreensão da leitura pode ser dividida em três níveis: a compreensão literal, que engloba a compreensão das idéias propostas no texto; a compreensão inferencial, que pressupõe a análise das idéias que não estão contidas no texto e, baseia-se na intuição ou na experiência do leitor; E, o último nível é a compreensão crítica, que é o posicionamento do leitor frente ao que é lido. Há várias formas de avaliar a compreensão da leitura de um texto. As mais comuns são: a) Pedir ao aluno, após a leitura de um texto, que conte o que entendeu; b) Dar um texto para o aluno ler e, após a leitura, este deverá responder a questões de múltipla escolha; c) Após leitura de um texto, pedir que o aluno responda as perguntas abertas sobre o conteúdo (explícito ou implícito) desse texto. 3.4. Distúrbios da escrita A escrita é a última etapa do desenvolvimento do comportamento verbal a ser adquirida. Seu objetivo principal é o de transmitir idéias, sentimentos e registrar a história do homem. Assim, espera-se que, ao terminar as primeiras séries do Ensino Fundamental, a criança já faça uso da escrita de forma adequada. Para tanto, deve ter conhecimento de todos os símbolos gráficos que representam os sons falados; deve ter entendido a relação existente entre linguagem escrita e linguagem falada; deve saber juntar os símbolos gráficos para formar unidades lingüísticas com sentido; e, usar corretamente a pontuação. No entanto, nem todas as crianças têm facilidade em aprender a usar os processos gráficos para representarem a linguagem oral. Geralmente, estas crianças são classificadas de disortográficas. 35 3.4.1. Disortografia Quando se fala em disortografia, três critérios devem ser considerados: o nível de escolaridade, a freqüência e os tipos de erros. Tais critérios permitem a realização do diagnóstico de uma criança disortográfica de forma objetiva e concreta, pois nem todas as crianças que apresentam dificuldades para escrever corretamente a língua falada, podem ser chamadas de disortográficas. No que diz respeito ao processo de escolaridade, a ocorrência de trocas ortográficas é esperada dependendo da série em que a criança se encontra. Assim, numa primeira série, é esperado que a criança apresente uma grande quantidade e variedade de trocas entre letras, porque a relação entre palavra impressa e som, ainda não está totalmente automatizada. Da mesma forma, numa segunda série é aceitável que uma criança cometa erros quando escreve palavras como “necessidade”, “sucesso”, “excelência”. O outro critério que deve merecer atenção para o diagnóstico da disortografia é a freqüência das palavras no vocabulário oral e visual da criança. Fica claro, portanto, que avaliar a ortografia de uma criança usando-se palavras que não estão inseridas em seu vocabulário visual, é ocasionar um erro, já que não se pode esperar que a criança escreva corretamente uma palavra que não conhece graficamente, nem compreende seu significado. 3.4.2 Disgrafia Pode ser definida como sendo uma deficiência na qualidade do traçado gráfico sendo que, essa deficiência, não deve ter como causa um “déficit” intelectual e/ou neurológico. Dessa feita, fala-se de crianças de inteligência média ou acima da média, que por vários motivos apresentam uma escrita ilegível ou demasiadamente lenta, o que lhes impede um desenvolvimento normal da escolaridade. A disgrafia, também chamada de “letra feia”, não 36 está necessariamente associada à disortografia. Na maioria destes casos, a “letra feia” é conseqüência das dificuldades para recordar a grafia correta para representar um determinado som. Neste sentido, a criança escreve de forma devagar, retocando cada letra, a fim de tentar disfarçar os erros ortográficos. Todavia, é possível encontrar crianças disgráficas que não apresentam qualquer tipo de disortografia. 37 CONCLUSÃO Os estudos acerca dos distúrbios de aprendizagem são relativamente recentes, especialmente no Brasil. Devido a isso é comum encontrar idéias distorcidas ou ultrapassadas, mas que ainda servem de aparato e influenciam a visão e a forma de relação dos educadores e pais com as crianças que apresentam dificuldades de aprendizagem. Quando uma criança apresenta dificuldades para aprender, é comum que o professor ou os pais esperem que tal fato passará e esta criança conseguirá acompanhar o andamento da classe. No entanto, este momento que se caracteriza pela superação da dificuldade, partindo da própria criança, raramente acontece. Cabe ressaltar, que ademais do exposto e ao longo dos estudos fica evidenciado que as dificuldades de aprendizagem podem se manifestar isoladamente, ou ser uma soma de vários fatores que acabam por originar a problemática. O que se verifica é a automatização das dificuldades à medida que o programa escolar vai se tornando mais complexo. Este fato vai acarretando um fracasso escolar que influencia diretamente na auto-imagem da criança. Se esta, apesar de todos os esforços depreendidos, não consegue superar essas dificuldades e consequentemente não consegue alcançar o ritmo da classe, acaba se julgando incapaz. Sentindo-se perdida para superar as dificuldades, ela pode recusar-se a voltar ao ambiente escolar pelo qual tomou aversão, pois é nesse ambiente que a criança se depara com os obstáculos e com as dificuldades que não consegue vencer. Com intuito de evitar esta situação, indica-se que a partir do momento em que a criança comece a sentir dificuldades para acompanhar a classe, seja realizado um diagnóstico com a finalidade de detectar as possíveis causas para o “não aprender”. Este diagnóstico deve ser feito por um psicopedagogo, que irá avaliar todas as habilidades (perceptivas, motoras, lingüísticas, cognitivas) envolvidas no processo da leitura e da escrita; os fatores emocionais e os próprios atos de ler e escrever. Com base nestes dados é possível verificar as áreas mais deficitárias e, consequentemente, recomendar os procedimentos terapêuticos necessários para a superação dos distúrbios de aprendizagem. 38 Dessa forma, a fim de ajudar a criança a desenvolver a sua autoestima, devem-se identificar as áreas de interesse e estimulá-las. Crianças com dificuldades para ler e/ou escrever, podem possuir habilidades para outras áreas como música, pintura, matemática, cabendo ao professor, reforçar estas áreas e, auxiliar o aluno a utilizá-las como uma forma de compensar suas limitações. Além disso, o educador também deve reforçar todo e qualquer desempenho escolar adequado, por mínimo que ele seja. Esta valorização da auto-imagem, implica no desenvolvimento da autoconfiança que a criança necessita para se engajar novamente no processo de ensino e sentir prazer em aprender. Assim, um trabalho conjunto envolvendo o professor, a família e o psicopedagogo trará ao aluno a sensação e a certeza de que conseguirá superar os obstáculos já que, está sendo apoiado por pessoas nas quais ele confia e que, em contrapartida confiam nele. 39 BIBLIOGRAFIA ABNT. Apresentação de relatórios técnico-científicos. Rio de Janeiro: 2001. CHAVES, E.B.F. – Para melhor ler, escrever e falar. Rio de Janeiro, 1984. FERREIRO, Emilia. A representação da linguagem e o processo de alfabetização. São Paulo. 1985. ___________. Psicogênese da língua escrita. tradução Diana Myriam Lichtenstein, Liana Di Marco, Mário Corso. Porto Alegre: Artmed, 1999. MASINI, Elcie F. Salzano (Org.). Psicopedagogia na escola: buscando condições para a aprendizagem significativa. São Paulo: Loyola, 1994. MORAIS, Antonio Manuel Pamplona. Distúrbios da aprendizagem: uma abordagem psicopedagógica. São Paulo: Edicon, 1997. OLIVEIRA, Marta Kohl. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um processo sócio-histórico. 2.ed. São Paulo: Scipione. 1995. SILVA, Maria Cecília Almeida. Psicopedagogia: em busca fundamentação teórica. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998. de uma 40 ÍNDICE INTRODUÇÃO .................................................................................................. 8 CAPÍTULO I LEITURA E A ESCRITA: AS ETAPAS DO DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM ................................................................................................... 11 1.1 As etapas do funcionamento verbal ........................................................... 13 1.2. A Leitura .................................................................................................... 14 1.3. A Escrita .................................................................................................... 16 CAPÍTULO II AS CAUSAS DOS DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM ................................ 18 2.1. Ausência de estimulação das habilidades básicas necessárias à alfabetização .................................................................................................... 19 2.2. Métodos de ensino .................................................................................... 24 2.2.1. O método alfabético ....................................................................... 25 2.2.2. O método fonético .......................................................................... 25 2.2.3. O método silábico .......................................................................... 26 2.3. Métodos analíticos .................................................................................... 26 2.3.1. O método da palavra ..................................................................... 26 2.3.2. O método da frase ......................................................................... 27 2.3.3. O método do parágrafo .................................................................. 27 2.4. O método analítico-sintético ou eclético ................................................... 27 2.5. Métodos de ensino X Distúrbios de aprendizagem .................................. 28 2.6. Dislexia ..................................................................................................... 28 2.6.1. Classificações da dislexia ............................................................. 29 2.6.2. Prognóstico da dislexia ................................................................. 30 CAPÍTULO III DISTÚRBIOS DA LEITURA E DA ESCRITA .................................................. 31 3.1. Dificuldades de discriminação visual ........................................................ 32 3.2. Leitura silenciosa ...................................................................................... 33 41 3.3. A compreensão da leitura ......................................................................... 34 3.4. Distúrbios da escrita ................................................................................. 34 3.4.1. Disortografia ..................................................................................... 35 3.4.2 Disgrafia ............................................................................................ 35 CONCLUSÃO .................................................................................................. 37 BIBLIOGRAFIA ............................................................................................... 39