NOVOS MOVIMENTOS SOCIAIS E ESFERA PÚBLICA: uma reflexão crítica Antonio de Ponte Jardim 1 - Introdução Este artigo tem por objetivo fazer uma reflexão crítica a respeito de como são analisados, no geral, os novos movimentos sociais assim como a importância enquanto agentes de transformação social e política. Neste sentido, parte-se das mudanças dos paradigmas estabelecidos para a análise dos movimentos sociais no que se refere ao papel dos atores sociais na transformação da ação política e social. O ponto de partida centra-se na análise de três princípios, que julgamos ter um papel fundamental na determinação dos novos movimentos sociais que são: a questão da identidade, vista através do reconhecimento da especificidade dos sujeitos (dos atores); a questão de oposição em relação ao social e ao político, onde o papel dos novos movimentos sociais é fundamental no processo de mudança de enfoque e atuação na esfera pública e administrativa e, no terceiro princípio ressalta-se a questão da totalidade, como proposta crítica e alternativa para a reinterpretação das mudanças sociais e políticas ocorridas na sociedade capitalista, a partir dos anos 60. Finalmente, nas considerações finais, conclui-se que não existe um consenso do que sejam novos movimentos sociais, pelo fato de que a compreensão dos novos movimentos sociais passa pelo entendimento de que a sociedade e a política precisam Este trabalho foi elaborado a partir das discussões do curso “Metrópole, Esfera Pública e Movimentos Sociais”, ministrado pela professora Ana Clara Torres Ribeiro no IPPUR/UFRJ, segundo bimestre de 1997. Texto publicado na Revista Redes, vol.2, n.5, 1998. p: 55-77 Pesquisador da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. 1 ser (re)nomeadas, no que se refere à ação dos novos atores. Essa compreensão associa-se, também, ao entendimento de que os sujeitos são os principais agentes de transformação social. Desse modo, os novos movimentos sociais estão relacionados à análise de que a sociedade possui processos e dinâmicas próprias, a partir da ação dos sujeitos, enquanto agentes transformadores da estrutura social. 2 - A Contextualização Até os anos 60 a leitura dos movimentos sociais era feita através da análise estruturalista, da economia, da política e de modelos pretensamente explicativos e totalizantes, a partir de uma visão estrutural-funcional da sociedade. A ruptura analítica começou a ser realizada no momento em que se percebeu que a sociedade já não era somente um ecofenômeno da economia e da política, mas também da cultura. Assim, temos, por um lado, uma multiplicidade de práticas e compromissos evidenciados por organizações que procuravam defender e explicar os interesses populares e/ou de grupos que em base na Segunda e Terceira Internacionais Socialistas, cujos projetos pretendiam “revolucionar” o mundo no sentido de “uma concepção serial das fases históricas pelas quais deveriam passar necessariamente todos os países” (Ingrosso, 1973, p. 20)1. Por outro lado, o economicismo e o reducionismo funcionalista, estabelecido pelo modelo americano imposto após a Segunda Guerra Mundial, contribuíram significativamente para a mudança de sensibilidade analítica. Em relação ao primeiro aspecto, o acontecimento se deu, por um lado, a partir da crise paradigmática no interior do próprio marxismo. E, por outro, a partir da “tradição sociológica” que se fundamentava nas noções de sociedade, evolução e papeis referenciados a uma totalidade estrutural-funcional, que não era capaz de interpretar os processos históricos específicos (Touraine, 1996) relacionados aos sujeitos. Observa-se que pelo lado da nova concepção analítica da esquerda, passou a existir um anseio em superar as estruturas sem se perder a visão de 1 INGROSSO, Marco. - Modelos socioeconómicos de interpretación de la realidad latinoamericana: de Mariátegui a Gunder Frank, tradução de Joaquín Jordá, Barcelona, Editorial Anagrama, 1973, (Cuadernos Anagrama). 2 totalidade (Lefebvre, 1991; Giddens, 1976, 1989; Bourdieu, 1989)2. É nesse sentido que a vida em sociedade passa a ser vista, em parte, através das práticas dos sujeitos (Bourdieu) e das disputas entre diferentes interesses. Esta nova perspectiva analítica permitiu o surgimento de um novo enigma teórico/político no que se refere à valorização de novos sujeitos, cujo processo e construção não passam pela política, mas envolvem diferentes classes sociais. Passa-se a valorizar o cotidiano no sentido que permite conhecer o sujeito social como ele atua3. É, neste aspecto, que há uma mutação analítica profunda, pelo fato de que é no cotidiano que os sujeitos agem. A valorização dos sujeitos no cotidiano remete-os ao diálogo e ao senso comum. Entretanto, o senso comum, elemento formador do cotidiano se desloca no tempo, enquanto que a cotidianidade é interrompida resultando em perdas de referenciais em relação às práticas anteriores. Desse modo, a autonomia dos novos sujeitos passa a ser sinônimo de indeterminação dos processos históricos. Entretanto, ressalta-se que a noção de sujeito passa pelo seu coletivo, pois é na coletividade onde se elabora e se organiza a identidade, através de práticas pelas quais seus membros pretendem defender seus interesses e expressar suas vontades, constituindo-se assim, em lutas (Sader, 1988:55) permanentes. Deste modo, os sujeitos representam a construção permanente de novas identidades, que vão permitir o surgimento de novas sensibilidades analíticas, construídas a partir das práticas dos sujeitos (Touraine - 1996; Giddens - 1986). Entre essas novas sensibilidades analíticas, as práticas dos sujeitos podem ser interpretadas a partir das noções de ator e agente, que veem da tradição sociológica que os considera como os fundantes do sistema social. Nesta tradição, o ator representa e possui papéis definidos na estrutura social. É a partir dessa constatação que Touraine retoma a noção de ator4 e 2 LEFEBVRE, H. - A Vida Cotidiana no Mundo Moderno. Tradução de Alcides João de Barros. São Paulo, Ática, 1991, (Caps. I, II e V) 216 p; GIDDENS, A- Novas Regras do Método Sociológico - uma crítica positiva das sociologias compreensivas. Tradução de Maria José da Silveira Lindoso. Rio de Janeiro, Zahar Editores; 1976. GIDDENS, A. - A Constituição da Sociedade. Tradução de Álvaro Cabral. São Paulo, Martins Fontes, 1989; P. BOURDIEU, - O Poder Simbólico. Lisboa, DIFEL, 1989. 3 O cotidiano aqui referenciado “é o conjunto de atividades que caracterizam a reprodução dos homens particulares, os quais, por sua vez, criam e recriam a possibilidade de reprodução social” - Agnes HELLER, Sociologia de la Vida Cotidiana, Barcelona, Ediciones Península, 1987, p. 19 4 O autor, para Touraine (1996:12), é o indivíduo constituído historicamente, produzido pelas grandes orientações normativas da vida social. 3 autonomia, em relação à ação dos atores. Já em Giddens, os sujeitos estão referenciados ao conceito de agência no sentido que só pode ser definida em termos de intenções, pela razão de que para cada item do comportamento seja considerado uma ação é preciso que o realizador tenha a intenção de manifestar, caso contrário o comportamento em questão é apenas uma resposta relativa. Desse modo, a agência diz respeito a eventos dos quais um indivíduo é portador, pelo fato de que ele poderia em qualquer fase de uma dada sequência de conduta, ter atuado de modo diferente. É a partir dessa postura que as práticas dos sujeitos passam a ser referidas à dinâmica viva da sociedade (aos processos sociais) e estão associadas aos acontecimentos (descrição dos problemas sociais). Desse modo, os atores ganharam representação e historicidade5. Daí, a valorização de novos sujeitos enquanto agentes e formadores de novas identidades (dos Novos Movimentos Sociais). A partir das mudanças ocorridas na sociedade nos anos 60 e do surgimento de novos enfoques analíticos, constata-se que a crise paradigmática não é uma crise das ciências sociais, em si mesmas, mas das transformações sociais. Neste sentido, não é análise da sociedade em sua totalidade que vai explicar os movimentos sociais, mas a relação entre os novos movimentos sociais e as formas de organização social. Daí, as diferenças teóricas fundamentais entre os paradigmas da sociologia clássica e os atuais. Como forma de explicar essas mudanças, a partir de categorias formuladas sob a inspiração marxista, temos: 1) a sociedade burocrática de consumo dirigido (Lefebvre, 1991); 2) a reação às alianças do Estado com as burguesias (Castells, 1976)6 pelo fato de ser a sociedade capitalista o locus da reprodução. Neste aspecto, Castells priorizou a cidade como sendo o locus da mediação entre a produção e a reprodução; 5 Touraine substituiu a noção de representação da vida social pela noção de historicidade, de movimento social e de sujeito. Para ele, a historicidade está associada “a capacidade que uma sociedade tem para construir as suas práticas a partir de modelos culturais e através dos conflitos e dos movimentos sociais”. TOURAINE, A.O Retorno do Actor. Tradução de Armando Pereira da Silva. Lisboa, Instituto Piaget, 1996, p: 8-9. 6 CASTELLS, M. - La Cuestión Urbana, Buenos Aires, Argentina, 2a. edición corregida y aumentada, Siglo XXI Editores, 1976. 4 3) o capitalismo monopolista de Estado (Lojkine, 1981)7 que se esgota nos anos 80, onde a cidade é o locus da reprodução e não da produção. Neste sentido, há uma relação entre meios de consumo coletivo, movimentos operários e movimentos sindicais; 4) a sociedade pós-industrial busca a construção teórica a partir de formas abrangentes de sociedade, de organização e de manifestação dos sujeitos (A. Touraine, 1970)8. Essas quatro orientações analíticas estabeleceram, de modo geral, modificações entre as práticas de investigação e os modos de ação; procuram delimitar as rupturas ideológicas e culturais, a partir de novas formas de organização, associadas às novas relações com a política no aspecto de que a transformação social está relacionada à legitimidade na esfera política. Assim, se configurou a base identidária dos novos processos sociais pela: crescente tendência de determinantes sociais para o cultural; valorização do cotidiano no que se refere a coerência entre a prática e o discurso; crítica aguda ao teoricismo, a partir dos anos 60; crítica ao “etapismo” (a evolução econômica, social e cultural); crítica às chamadas “totalidades vazias” (Karel Kosik)9; crítica ao pensamento essencialista no que se refere a valorização da essência em detrimento da aparência. Desse modo, a base identidária dos novos processos sociais está associada ao reconhecimento de quem está agindo por isso, passa-se a dar ênfase à agência humana. É o discurso que constrói os sujeitos, a partir da valorização do aqui e o 7 LOJKINE, J. - O Estado Capitalista e a Questão Urbana, São Paulo, Martins Fontes, 1981. TOURAINE, A. - A Sociedade post-industrial, Lisboa, Moraes Editorea, 1970. 9 A noção de totalidade de Karel Kosik - Dialética do Concreto, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1976, que M. Santos redefine como sendo “o conjunto de todas as coisas e de todos os homens, em sua realidade, isto é, em suas relações e em seu movimento”. Neste sentido, “a totalidade é, ao mesmo tempo, o real abstrato e o real concreto. (...) Só se realiza completamente através das formas sociais, incluindo as geográficas. (...) Cada indivíduo é apenas um modo da totalidade, uma maneira de ser. Ele reproduz o todo e só tem existência em relação ao todo”. M. Santos, A Natureza do Espaço-técnica e tempo, razão e emoção, São Paulo, HUCITEC, 1996, p. 92. 5 8 agora, da proximidade e não mais a questão da práxis enquanto ação revolucionária e transformadora da totalidade social. Já que a práxis em Marx refere-se de modo geral, a ação e a atividade como elemento transformador da sociedade e do próprio homem. É através da práxis que o homem faz, produz, reproduz e transforma (como também modela) o seu mundo (a história, o seu modo de agir). É a partir das diferentes práticas que o cotidiano passa a ser visto como o lugar da vivência e da convivência, no que se refere à organização da sociedade. Para Touraine (1996)10 essa ruptura analítica se deu pelo fato de que: o ator rebelou-se rapidamente contra o sistema, não aceitou definir-se pela sua participação social, denunciou o imperialismo irracional dos dirigentes, definiu-se mais pela sua história e pela cultura particulares do que pelo seu grau de modernidade. É neste aspecto que o ator social e a sociedade opuseram-se entre si e, por conseguinte, a sociologia estrutural-funcionalista entrou em crise. O que a sociologia clássica chamava de sociedade “não era mais do que a confusão entre uma atividade social, definida, em termos gerais - como a produção industrial ou o mercado - e, um Estado nacional. A Unidade da sociedade era aquela que lhe dava e impunha um poder legítimo”. Neste sentido, a sociedade era pseudônima de pátria (Touraine, op. cit. p. 18). Hoje, as práticas já não podem ser compreendidas se não conheço o tecido social, ou seja, se não conheço como se dão as trocas intersubjetivas, os diferentes atores e agentes sociais. Assim, passa-se a valorizar círculos de trocas simbólicas/afetivas (Bourdieu, 1992)11, aspectos que os grandes projetos de transformação da sociologia clássica não os concebia. Como podemos compreender a sociedade a partir da ação? Porém, quem age? Como age? Por que age? Qual o sentido da ação? Parsons e Touraine partem desses questionamentos. 10 TOURAINE, A. op. cit. p. 9. BOURDIEU, P. - A Economia das Trocas Simbólicas. Introdução, Organização e Seleção de Sérgio Miceli. Tradução de Sérgio Miceli, Silvia de Almeida Prado, Sônia Miceli e Wilson Campos Vieira. São Paulo, Perspectiva, 1992. 6 11 Se por um lado, a nova concepção analítica avançou na recuperação da ação individual e da historicidade dos sujeitos, por outro, houve perdas analíticas significativas, no que se refere à particularização dos processos sociais e da sua vinculação com à totalidade social. Para se entender essa situação é importante ressaltar dois aspectos que achamos que merecem ser destacados a respeito dos novos sujeitos (dos atores): o primeiro refere-se às perdas analíticas, em relação à compreensão estrutural dos interesses, da análise das diferentes visões sociais de mundo referenciadas às totalidades abrangentes, da temática dos sujeitos sociais e dos projetos políticos de transformação radical da realidade social. O segundo aspecto, refere-se aos ganhos analíticos, valoriza o ator, as bases culturais e os valores intersubjetivos, que demarcam as diferentes visões sociais de mundo. A historicidade dos fatos particulares ganham outras dimensões enriquecidas pela mudança histórica (Touraine, 1996). Essas mudanças foram importantes no sentido de que deixamos de analisar o sujeito a partir das estruturas e avançamos para os processos, uma vez que os processos são instrumentos da totalidade e o veículo da metamorfose da universalidade em singularidade, por onde passa a compreensão da totalidade12. Neste sentido, os processos passam a ser referenciados a uma totalidade que se apresenta em novas escalas e constitui-se num processo totalizante, como uma aspiral. Estas novas dimensões permitem que se estabeleçam diferenças entre rede social e rede técnica, entre relações sociais e relações técnicas (esta é a gênese e a consistência da análise marxista). É a partir das interações entre relações sociais e técnicas que se avança para o entendimento dos sujeitos, como agentes concretos da transformação social. Desse modo, deixamos de pesquisar somente ação, orientada por valores (no sentido weberiano e parsoniano), referenciada a expectativa do outro, mas ação enquanto agente do processo de transformação. Este aspecto pôs à prova o pensamento estruturalista/ funcionalista13. 12 SANTOS, M. “A totalidade do Diabo: como as formas geográficas difundem o capital e mudam as estruturas sociais”. Revista CONTEXTO, no. 4, novembro, 1996, p.:31-44. 13 Para GOHN, M. G. Habermas e Foucault, entre outros, são os principais articuladores da teoria fundada no discurso dos agentes na ação dos indivíduos. O discurso sobre ação versus estrutura surgiu num contexto histórico em que havia reação ao estrutural/funcionalismo, especialmente parsoniano. GOHN, M. G. - Teorias dos Movimentos Sociais - Paradigmas clássicos e contemporâneos. São Paulo, Edições Loyola, 1997, p. 133. 7 Em síntese, é a partir dessas novas abordagens analíticas que ressaltamos a existência de várias orientações teóricas, que normalmente partem da definição de movimento social como se fosse uma questão dada. Essas orientações apresentam restrições por serem definições que emergem do empírico, das observações indutivas e por isso não é possível de se achar sempre generalizações. Neste aspecto, temos que tomar cuidado com as imputações, pelo fato de haver dificuldades teóricometodológicas no trato dos procedimentos que se denominam (novos) movimentos sociais (Ribeiro, 1997)14. 3 - A delimitação da abordagem da esfera pública e dos movimentos sociais No que pese as limitações da abordagem analítica sobre os novos movimentos sociais podemos destacar, no geral, a existência de três princípios básicos que possuem um papel fundamental na delimitação das análises sobre a esfera pública e do tema em questão. Estes princípios estão associados à identidade (reconhecimento da especificidade e de sua historicidade); a questão da oposição (em relação ao social e o político) e de totalidade (como proposta alternativa). 3.1 - No primeiro princípio podemos analisar os movimentos sociais através do ângulo da identidade - visto através do reconhecimento da especificidade. Este princípio remete-nos a uma questão que consideramos principal: Como (re) pensar a dimensão da totalidade a partir das práticas? Esta interrogação remete-nos à problematização da especificidade pelo fato de que temos, por um lado, uma ruptura entre o pensamento empiricamente orientado pelas práticas e pelo empirismo. E por outro, não dá para imputar aos processos sociais (e os movimentos sociais) o sentido de classes sociais, na concepção do marxismo clássico, tal como foi proposto por Marx no início da Revolução Industrial. 14 RIBEIRO, A. C. T. - Trabalho, mutações sociais e conjuntura urbana. VIII Congresso da Sociedade Brasileira de Sociologia, Brasília, 7 a 9 de agosto de 1997. Grupo de Trabalho Novos Olhares Sociológicos sobre o Urbano. 8 É necessário entender a natureza de classe a partir da dominação e da forma contemporânea de realização do capitalismo15. Essa questão remete-nos também, por um lado, aos aspectos das perdas analíticas (após os anos 1960), pelo fato de termos que abandonar a postura analítica do estruturalismo-funcionalista, a respeito da natureza estrutural dos interesses, ou seja, a análise dos determinantes estruturais dos interesses. Neste sentido, sai-se das estruturas para os sistemas (Vide crítica de Touraine a Parsons,)16. Passa-se a ter dificuldades de lidar com categoria sujeito social, no aspecto da perda dos essenciais dos sujeitos, enquanto atores capazes de transformação do social e possuidores de historicidade, o que é possível somente a partir das estruturas, ou seja, das alianças estratégicas na cena política. Deste modo, o conhecimento do mundo social e das categorias que o tornam possível de entendimento fazem parte do jogo político (entre política e o saber) nos vários campos (espaço onde as posições conquistadas pelos agentes se encontram em permanente disputa) e pela posição do sujeito no mundo (Bourdieu, 1989: 107-161)17. Por outro lado, temos os ganhos analíticos através da valorização do ator, como sujeito consciente de si, com capacidade e responsabilidade de agir, de transformação, enquanto sujeito coletivo. Observa-se o surgimento de novos valores e bases culturais mobilizadas, no que tange as transformações dentro da própria classe operária, fazendo com que houvesse uma fragmentação do movimento operário, 15 Autores como Thompson (1987) e Robsbawm (1987) vão mostrar em seus estudos sobre o desenvolvimento do capitalismo contemporâneo de que “as transformações e a estrutura de classe não são mais dirigidas exclusivamente pela grande indústria; tampouco a classe operária é o único agente político que dinamiza as lutas da classe trabalhadora. O desenvolvimento das forças produtivas materiais, diversificando as práticas produtivas, ampliou também as diferenciações na mão de obra entre o trabalho qualificado e o trabalho precário, entre emprego industrial e terciário. Mas ainda, o questionamento, a mobilização política e a luta social fazem emergir novos agentes com novas questões...” AZAIS, C. H; APELLIN, P.; - “Para uma análise das classes sociais” In SIQUEIRA, D. E.; POTENGY, G. F.; CAPELLIN, P. (Orgs.) - Relações de Trabalho, Relações de Poder, Brasília, DF, Universidade de Brasília, 1996, p.27. 16 Para Touraine (1996:18), a sociologia parsoniana foi o espelho dos Estados Unidos no apogeu de seu poder e de sua hegemonia o sentido de que “quanto mais se falava de sociedade menos se falava de atores sociais, uma vez que eram concebidos como portadores de atributos próprios do lugar em que ocupavam no sistema social...” 17 BOURDIEU, P. - “A Identidade e a representação: elementos para uma reflexão crítica sobre a ideia de região”. In O Poder Simbólico. Lisboa/Rio de Janeiro, DIFEL/Bertrand Brasil. p.: 107-161. 9 enquanto classe unitária e portadora do processo de transformação18. Assim, temos a alteração no teor da democracia a partir da fala dos outros, da fragmentação da própria classe operária. Entretanto, constata-se que houve uma reificação do proletariado como classe e o ator passou a explicar-se por si mesmo (Sader, 1988)19. Os limites impostos à maioria das análises recentes a respeito das identidades dos sujeitos Os limites que se colocam às análises sobre a identidade dos sujeitos são tantos quanto as suas representações. Assim, cai-se na questão da empiria, onde as vivências e convivências dos sujeitos são tratadas através das falas e das práticas dos dominados, explicam-se por si mesmas. Daí exclui-se a classe social, pelo fato de que os agentes sociais não são mais vistos como sujeitos pertencentes a determinadas classes sociais, mas relacionados a interesses específicos que transcendem a classe social. Em substituição, surge a colocação dos sujeitos plenos no sentido de que eles se estruturam em si mesmos, ou seja, se explicam por si mesmos, através da subjetividade. Assim, quando se elimina as contradições, o princípio de dominação (no sentido clássico da totalidade social -, tanto em Durkheim como em Marx passa a não existir - o sujeito desaparece, enquanto construção de interesses sociais e coletivos, no aspecto da luta de classes (da classe em si e para si). Desse modo, observa-se a psicovalorização do sujeito, pelo fato de estar próximo do caminho da fragmentação, da busca de interesses particulares (específicos). É por isso que a fronteira entre fragmentação e plenitude é tênue. Como reconstruir uma unicidade e não uma totalidade imposta? A nova orientação analítica passa a valorizar o senso prático da vida, a partir da introdução de uma alteração no fazer e na teoria da ação. Isto implica, por um 18 Vão nessa linha de raciocínio: THOMPSON, E. P. - A Miséria da Teoria. Rio de Janeiro, Zahar Editor, (1981) e HOBSBAWM, E. - Revolucionários. Rio de Janeiro, Paz e Terra. 1982. 19 SADER, E. - Quando novos personagens entram em cena: experiências, falas e lutas dos trabalhadores da Grande São Paulo (1970-1980) - Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1988, (Parte I). 10 lado, paralelamente, numa perda do rigor analítico, no sentido de traçar os projetos dos movimentos sociais. E, por outro, recupera-se a categoria Poder como forma de alcançar os objetivos da transformação social, a partir do agir dos sujeitos. Deste modo, a questão da institucionalidade e da institucionalização passa a ser o ponto chave no estudo dos movimentos sociais. Abrem-se múltiplas possibilidades para a interpretação dos processos sociais. Por exemplo, a questão da família deixa de ser somente uma unidade produtiva e reprodutiva e passa, também, a ser analisada nos aspectos referentes à sexualidade e à reprodução social que, vistos por diferentes ângulos, nos dão outra dimensão da família em suas especificidades, até então não relevantes. O mesmo se pode dizer em relação à questão do masculino e do feminino que passa pela questão de gênero, pelas diferentes sexualidades e, portanto, pela construção de identidades que transcendem aos aspectos anatômicos e de classe, mas que são construídos por processos históricos específicos. Em síntese, não é a análise da sociedade que vai explicar os movimentos sociais, mas a relação entre os novos movimentos sociais e as novas formas de organização, o que nos permitem inferir sobre as diferenças teóricas explicativas sobre a sociedade20. 3.2 - No segundo princípio coloca-se a questão da oposição21 em relação ao social e o político Os autores que orientam suas análises de acordo como esse princípio, vão analisar os novos movimentos sociais como sendo resultante de um processo entre o social e o nível político, que se reestruturam a partir das demandas (de necessidades 20 A necessidade de explicar as transformações ocorridas na sociedade capitalista de consumo dirigido, após a Segunda Guerra Mundial e a sua crise (reestruturativa) a partir da guerra do Vietnã, os pensadores como L. Althusser - (On Contradiction and Overdetermination); H. Marcuse, (On Dimensional Man) e J. Habermas (Knowledge and Human Interest) serviram de base para o questionamento, ao nível político-filosófico, das noções positivistas do conhecimento e da ciência em relação às explicações e compreensão do Estado, do partido e das organizações sociais e econômicas, no sentido do questionamento da produção de conhecimento em relação à interpretação da realidade social de então. Vide: H. Wainwright - Uma Resposta ao Neoliberalismo - Argumentos para uma nova esquerda. Trad. de Angela Melim. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editores, 1998, p.87, 88. 21 BOURDIEU, p.op. cit. 11 prementes)22. Desse modo, a análise de conjuntura, feita a partir dos atores, nos permite conhecer a estrutura. Assim, é um grande equívoco analisar os indivíduos como um constructo de classe, pelo fato de que as representações são mediadoras na disputa pelo poder, pelo fato de que a política é um jogo de forças, de posições e de estratégias, de lutas entre mandantes e mandatários, onde os mandantes transformamse em consumidores de política, de estratégias de marketing e de representação político-partidária. Assim, a política passa a ser uma “arte especializada”, através do capital político, que permite que se instaure a lógica oligopolística do capital político, expresso pelas marcas políticas. Quanto mais o partido se especializa ( coloca-se a questão dos quadros técnicos) observa-se a uma tendência a siparidade (fissão). Neste sentido, estabelece-se a crise do sistema de representação - via desgaste de confiabilidade e crise das mediações do partido e do cargo. A partir das práticas, o conceito de campo (Bourdieu, 1983:89)23 é fundamental pelo fato de que implica relações e jogos de interesses. Ao nível partidário, estabelece-se a concorrência no interior dos próprios partidos, com tendência a fissão. Observa-se que a capacidade de mobilização como força política é uma ameaça da potencialidade intrapartidária no sentido que se de instaura a questão da verdade enunciada (o que não é uma verdade que se manifesta no embate político, ou seja, na própria política). Daí, a importância da representação política em relação à legitimidade que é organizacional e não pessoal. A partir deste fato, temos, ao nível de partido, a seguinte questão: quanto maior o tempo de vida do partido maior é a disputa interna e quanto maior o ciclo de vida do partido maior a distância entre as reivindicações e as representações partidárias, devido à questão da especialização político-administrativa dos quadros partidários. Estas situações podem ser analisadas como fenômeno social, por ser um movimento mediado pelo partido na esfera da 22 Destacamos entre os principais autores, já clássicos nesta linha de análise, Clauss OFFE - Partidos Políticos y Nuevos Movimientos Sociales. Madri, Editorial Sistema. 2a. edición 1996. Ao nível de América Latina, Norbert LECHNER - Los patios Interiores de la Democracia: subjetividade y política. Santiago, FLACSO. 2a. edición , 1990. 23 Para Bourdieu, o campo é o espaço onde as posições conquistadas pelos agentes se encontram permanentemente e disputa. O campo se define como o locus onde se trava uma luta concorrencial entre atores em torno de interesses específicos que caracterizam a arena no campo específico. BOURDIEU, P.) - “Algumas propriedades dos campos”. In Questões de Sociologia. Rio de Janeiro, Marco Zero, 1983, p.89. 12 política. Entretanto, é importante ter-se presente que a política enquanto movimento político é o da sociedade. É nesse sentido que Hannah Arendt (1993)24 estabelece processos diferentes para a passagem dos sujeitos para a política -, através da hipérbole dos sujeitos plenos -, onde essa passagem é analisada em si mesma. Assim, se faz necessário refletir filosoficamente a política pelo fato de que a ação está ligada à intenção. É nesse sentido que a compreensão sucede e precede o entendimento, pelo fato de que as palavras não devem ser transformadas em armas geradoras de violência. Quando as palavras se transformam em armas de violência, a civilização perde a sua característica de compreensão do processo político, tornando-o doutrinas políticas (em ideologia). Assim, há uma relação entre ordenação e doutrinação no aspecto de haver uma imputação ao outro do meu discurso (a partir de práticas autoritárias, via instrumentalização da política). Para H. Arendt, a compreensão da perda do senso comum é a perda da relação com a compreensão do conhecimento. É através dessa perda que se estabelece um caminho para a impossibilidade do julgamento, o que torna próximo da estupidez, no sentido de não haver conhecimento em si mesmo. Para não criar-nos estúpidos e préconceituosos temos que renomear o real (estabelecer novas categorias analíticas). Por exemplo, o discurso do politicamente correto. Desse modo, a impressão se faz necessária para que as coisas tenham significado no sentido de que sem ação não há significado. Entretanto, essa impressão estabelece uma hierarquização de significados, construída a partir da visão social de mundo. É a partir da hierarquização que incluímos ou excluímos o outro, pelo fato de divergimos logicamente o seu sentido. Assim, o outro passa a ser um objeto do nosso conhecimento e de nossas ações. É nesse aspecto que a análise histórica, de Hannah Arendt, é feita a partir da causalidade e, por isso, não nos permite analisar a ação. 24 ARENDT, H. - “Compreensão e Política” e “Será que a Política ainda tem algum sentido?” In A Dignidade da Política. Rio de Janeiro, Relume-Dumará, 1993. 13 O presente é que ilumina o passado e não o contrário no sentido de criar novas possibilidades analíticas sobre os sujeitos e suas diferentes ações. Ainda dentro do segundo princípio (a questão da oposição em relação ao social e ao político), a Cidadania está dada pela igualdade na diferença25. A cidadania possa ser associada à ampliação da esfera pública; entretanto, isto não significa um processo democrático de institucionalidade crescente na sociedade. Pelo contrário, a cidadania é vista pelo prisma do individualismo (da igualdade na diferença e da diferenciação na igualdade). Esta visão é fruto da conquista do liberalismo em relação ao feudalismo26. É sinônimo de sujeitos coletivos, de autores coletivos e coletivizado. Entretanto, o individualismo é também sinônimo de exclusão, de autoreferência e de inclusão. Assim, o indivíduo tornou-se um “escravo” do consumo e da produção. Entretanto, a questão do indivíduo e da individualidade estabelece um novo código organizacional na modernidade, no que se refere à inclusão ou a exclusão de novos processos societários. O sentido da inclusão está associado à plenitude dos sujeitos, enquanto responsáveis pelos seus próprios destinos e de exclusão na medida em que essa plenitude é, ao mesmo tempo, limitadora do outro, no que tange ao consumo e a produção de diferenciação entre os sujeitos. Nesse aspecto, as práticas classificatórias determinam e nomeiam o lugar dos sujeitos na estrutura social. Por exemplo, quando digo: “menino de rua”: estou fazendo uso do discurso de práticas organizativas e articuladoras da posição social do indivíduo na estrutura social. 25 HEALEY, Patsy- “Planning Through Debate: The Communicative Turn in Planning Theory” In FISHER, FORESTER, J. (Eds.) - The Argumentative Turn in Policy Analysis and Planning. Durham and London: Duke University Press, 1993, p. 233-253. 26 HOBBES, TH. (1651) mostrava que o Estado funda a sociedade civil, a partir de sua leitura e concepção individualista da sociedade na luta de todos contra todos. MARX, K., mostra a A Ideologia Alemã que a sociedade burguesa oculta a exploração e as contradições sociais. E, finalmente, em GRAMSCI, A. temos o reconhecimento da sociedade na valorização do senso comum, prático da concepção histórica da sociedade. O reconhecimento está associado aos valores. Neste sentido, podemos ver como a estrutura de valores é manipulada pela escolha na formação de hegemonia. Para Gramsci, o Estado é diferente de aparelho de Estado. O Estado faz parte da sociedade civil no sentido de que o Estado está relacionado com a sociedade civil e a sociedade política. 14 É a partir do lugar dos sujeitos na estrutura social que Eduardo G. Carvalho (1991)27 mostra a relação entre a ordem política e as necessidades (valores profundos da cultura versus o direito), onde os setores progressistas avançam na conquista de direitos que não são acompanhados pela sociedade, como um todo. É nesse sentido que a questão da legislação, por exemplo, avança para além das conquistas das lutas sociais (do coletivo) e com isto há possibilidade de “engessamento” de futuras ações do sujeito coletivo, portador de demandas específicas. Na medida em que se institucionaliza o social como posso observar os novos valores? É nesse aspecto que o conceito de esfera pública28, da separação entre o trabalho e a casa, que difere de vida pública, das relações interpessoais, está além do conceito de Estado. A construção da esfera pública não estatal se dá a partir do controle do Estado pelo denominado terceiro setor29, instituído pelo Estado como sendo um campo de superação da concepção da esfera pública estatal. Ao mesmo tempo, o Estado “avança” sobre a sociedade, como poder instituinte e normatizador do social. Assim, atuais problemas do funcionamento político-administrativo do Estado passam pela dissonância entre a racionalidade administrativa e sistêmica (OFFE, 1996)30. Esse processo implica em alterações nas formas de domínio do Estado de Bem-estar, no sentido de que há uma alteração na forma administrativa, onde as prioridades passaram a serem traçadas a priori. Desse modo, estabelecem-se duas racionalidades: uma racionalidade burocrático-legal (de direito genérico) e outra racionalidade de prioridades. Assim, a administração passa a depender de critérios empíricos de consenso. O que significa mudança na forma de administrar o Estado. Nesse aspecto, possibilita a ruptura entre a administração e a política, o que 27 DE CARVALHO, E. G. - Negócios da Terra - A questão fundiária e a justiça. Rio de Janeiro, UFRJ série Universidade, 1991. 28 O conceito de esfera pública significa, em primeiro lugar, tudo que vem a público ou pode ser ouvido e visto por todos e, em segundo lugar, significa o próprio mundo “na medida em que é comum a todos e diferente do lugar que nos cabe dentro dele”. ARENDT, H. - A Condição Humana, Rio de Janeiro, Forense Universitária, 1991, p: 59-62. 29 O dito terceiro setor está relacionado com políticas sociais não estatais que podem ser públicas ou privadas, envolvendo, assim, no caso brasileiro, a atuação das Organizações Não Governamentais (ONGs). 30 C. OFFE - Partidos Políticos y Nuevos Movimentos Sociales. Madri, Editorial Sistema, 2a. edición, 1996. 15 estabelece uma configuração mais ampla entre Estado e sociedade no capitalismo. Nesse sentido, o cidadão passa a ser a referência da própria administração no aspecto de que as funções executivas passam a ser assumidas pelo cidadão, que se expressa desde o controle, via função executiva, até mutirões associados à economia solidária ou da reprodução31. Ao mesmo tempo, constata-se que há uma luta pela reconquista da esfera pública. Deste modo, o que politiza os movimentos sociais é o confronto das políticas públicas como o Estado. Assim, temos a impressão do processo de democratização do Estado, via pressão e participação de certos setores politicamente organizados. Entretanto, o Estado deixa de fora a sua responsabilidade, pelo fato de se criar uma institucionalização da parceira que contribui, cada vez mais, para a despolitização dos movimentos sociais e, portanto, para a institucionalização dos processos sociais. Esta nova configuração, que começa a se delinear nos anos 90, ainda não está devidamente analisada. Hoje, todo discurso político é afirmativo e não analítico. Por isso, há dificuldade de discernir a técnica do social, pelo fato de que existe uma tensão entre as Organizações Não Governamentais (ONGs), o chamado terceiro setor, e os novos movimentos sociais principalmente no que se refere à representação política. Há uma tendência do poder instituído (do Estado) transferir para as ONGs programas e projetos com vistas à institucionalização do social, ou seja, há uma instrumentalização do social, cada vez mais, por parte do Estado. Deste modo, as ONGs passam a serem meras agenciadoras de políticas sociais e não agentes de mudança. A partir dessa prática, trata-se a modernidade (técnico-administrativa) da sociedade como sinônimo de cidadania. Neste aspecto houve, por um lado, um deslocamento do Estado, enquanto movimento institucionalizado, para as ONGs. E, por outro, as campanhas políticas, na contemporaneidade, passam pela questão estratégica do discurso, via técnica de controle de ação (social e política). 31 A ideia de “economia solidária” ou “da reprodução” está ligada aos domicílios e à comunidade no sentido de que as atividades sociais e econômicas não são monetarizadas, na maioria das vezes, mas que têm um papel importante na viabilização e manutenção da reprodução econômica e social dentro do sistema capitalista. 16 Observa-se, também, o abandono das instâncias de controle pelo social, fato que se traz a sociedade para dentro do privado (Offe, 1996) e, ao mesmo tempo, uma publicização da vida privada. Entretanto, o que se observa é uma volta aos valores fundamentais (tradicionais). O Estado via escola e universidade foi um agente modernizador do projeto fordista/taylorista32. Hoje, com a “privatização” do Estado provedor, observa-se a perde de sua função de Estado de bem-estar social, implementada pelas políticas keynesianas ou neokeynesianas. Esta perda se dá, em parte, pela reificação do mundo da vida, via privatização (individualização) dos interesses sociais (coletivos). Assim, estabelece-se um conflito distorcido de interesses e de terapias que estão associados ao puro pragmatismo, via Milton Fridmann. Na concepção conservadora, a crise está associada a um transtorno no sentido de retorno ao mundo da vida e da meta-política (enquanto instrumentalização da política). Frente a essa concepção, temos que rever as teorias da crise, por parte da esquerda que, normalmente, associa às crises como sendo produto do próprio sistema. A partir da crise é posta a questão da ingovernabilidade que, segundo Clauss Offe (1996), não é uma situação atual, pelo fato de que ela nem sempre é aceleradora de conflitos sociais ou de revoluções. Esta constatação nos dá outra leitura da ingovernabilidade, no aspecto da quebra entre reprodução sistêmica e a reprodução social. A sociedade não deve ser interpretada ou dirigida em relação ao afastamento dos mecanismos de integração social, via sistema. O que deveria ser trabalhado, pelo pensamento crítico, seria a questão da não existência do mercado autorregulado, isto porque, por mais que exista técnica, a acumulação só funciona pela articulação entre “trabalho vivo” e capital. É esta articulação que permite o afastamento entre integração social e sistêmica. Para Offe, estes elementos dão o perfil dos novos movimentos sociais no sentido de se estabelecer uma polarização entre o mundo da vida e o sistêmico. E, a questão da ingovernabilidade para o pensamento político 32 HARVEY, D. - Condição Pós-moderna. Tradução de Ubirajara Sobral e Maria Stela Gonçalves. São Paulo, Edições Loyola. 1993, p:115-184. 17 conservador estará posta nos fundamentos não políticos de ordem e de estabilidade. Neste sentido, procura a redefinição restrita de política e de conflitos, no aspecto de poder administra-los enquanto Estado instrumentalizado e, instrumentalizador do social via políticas públicas setoriais. A questão do velho paradigma do (Estado do bem estar social e do Estadoprovidência), da estabilização de um ciclo de acumulação através do enriquecimento da classe operária, via aumento da capacidade de consumo dos trabalhadores, criou cenários de disputas entre determinados atores sociais, no aspecto da modernização social. Por isso, o velho paradigma se calcava, nos países centrais, em base a valorização de uma cultura cívica desmobilizada, via estabilidade do consumo e do bem estar social da população. É desta época a proclamação do fim das ideologias. As teorias dos movimentos sociais, segundo Clauss Offe, seguem dois caminhos: um subjetivista (dos atores) que se expressa através das características específicas dos movimentos sociais (abordagem dos movimentos sociais em si); outro, objetivista (da ação, dos agentes) que busca instrumentalizar os movimentos sociais através de suas possibilidades políticas, da (re)instrumentalização da política. É pela articulação desses dois caminhos que podemos reconhecer os atores e as ações. Em síntese, observam-se alterações nas práticas sociais e políticas com o surgimento de novos sujeitos na esfera pública. Verificam-se alterações no modo de produção capitalista que emerge na Europa e nos Estados Unidos após a Segunda Guerra Mundial. Constata-se a presença do Estado e sua intervenção na esfera da cultura, através da mercantilização da cultura; por exemplo, a “indústria do turismo”, a etnical foods entre outros. Verificam-se modificações no social e nas relações sociais e societárias e, finalmente, observam-se mudanças nas esferas pública e privada. Essas modificações nos alertam, segundo Clauss Offe, para as possibilidades de novos cenários traçados a partir: 18 a) da aliança conservadora através da velha classe média e o segmento dos marginalizados; b) da aliança que não contemple os novos movimentos - no sentido de aliança com a nova e a velha classe média, deixando de lado os marginalizados e usando da estratégia a difusão do medo; c) da aliança entre a esquerda tradicional e os novos movimentos sociais sentido da abertura dos sindicatos para tratar dos marginalizados numa no aliança entre a nova classe média e a classe operária. 3.3 - No terceiro princípio coloca-se a questão da totalidade como proposta alternativa (Lefebvre) A compreensão da sociedade e da dominação contemporâneas passa pela análise da dominação, no aspecto de que a sociedade não pode ser lida somente pelo econômico, no sentido da sociedade burocrática de consumo dirigido, cuja ideia é a da administração do consumo e da vida cotidiana. Esta ideia permite uma série de âmbitos e práticas que anteriormente estabeleciam certo antagonismo, de imediato, com a reprodução sistêmica. Entretanto, a sociedade de consumo dirigido também expressa uma categoria de apropriação muito importante que é o irrelevante, pelo fato de que não pode ser transformado em propriedade de alguém. A sociedade de consumo dirigido colocou-nos nas mãos o fruto podre da ciência que, através de sua institucionalização institui e faz uso do discurso terrorista, da competência33. Nesse sentido, compreender os movimentos sociais é necessário compreender à opressão, o terrorismo imposto pela sociedade de consumo dirigido. A sociedade é, cada vez mais, apoiada na comunicação que, através da metalinguagem, constrói a abstração da vida diária (do cotidiano). A metalinguagem se expressa em formas abstratas, sem conteúdo, manipuladas para o consumo, com o objetivo de gerar novas necessidades nos indivíduos, enquanto agentes e consumidores. O mercado passa a 33 . LEFEBVRE, H. A Vida Cotidiana no Mundo Moderno. Tradução de Alcides João de Barros. São Paulo, Ática (cap. I, II e V), 1991, 216p. 19 ser o agente regulador do consumo, ocultando as contradições existentes em relação à produção e circulação de bens e serviços. Esta orientação faz parte da estratégia de manutenção da estrutura de classes existente na sociedade capitalista contemporânea. Para que as classes se mantenham é necessário repressão, persuasão e opressão (Lefebvre, 1991). É por isso que existe uma relação direta entre controle da vida privada e o controle da vida pública, a publicização da vida privada e da intimidade. O controle da vida pública e privada se acentuou a partir dos anos 70, quando se passa a negar a realidade extradiscursiva, no aspecto de que a luta coletiva foi dirigida para a transformação de estruturas que existem independentemente de suas atividades. Desse modo, retoma-se a ideia inicial de Hayek de que a sociedade é resultado das atividades cegas causadas pelos indivíduos. E neste aspecto, há necessidade de proteger, por parte do Estado, os aspectos morais e políticos da evolução social, contra qualquer protesto particularista no sentido de que se rompem as diferenças entre essas duas esferas da vida humana34. Entretanto, o que se vem observando é a publicização, cada vez maior, da vida privada. Esta situação vai se manifestar em relação à opressão que se exterioriza para além dos contratos sociais e jurídicos. Por exemplo, matrimônio/sexualidade, infância idealizada, masculino/feminino e gênero entre outros aspectos. Para a compreensão da sociedade de consumo dirigido é necessário que se estabeleçam diferenças entre uma sociedade repressiva de uma sociedade terrorista: na sociedade repressiva a repressão se desintitucionaliza para atuar na vida cotidiana, enquanto que na sociedade terrorista, vista através da democracia liberal, o terror ligado ao indivíduo no que se refere ao embate entre a igualdade na diferença, via solidificação da concepção individualista e egocêntrica. E, aqui se faz necessário que se estabeleça a diferença entre a individuação, onde os indivíduos passam a serem sujeitos plenos em suas particularidades de ser e o individualismo, fruto do egocentrismo, que é o ponto de referência de si e dos outros. Para nós, o 34 Vide: Wainwright, H. Uma resposta ao Neoliberalismo - Argumentos para uma nova esquerda, 1998, especialmente, capítulos I e IV. 20 individualismo está centrado na competição e da exclusão do outro. Portanto, na gênese do processo de exclusão/inclusão e de segregação sociais, aspectos cada vez mais presentes na sociedade de consumo dirigido. Desse modo, a diferença entre a sociedade aterrorizada e a terrorista é que cada um torna-se terrorista do outro e de si mesmo. Os valores não precisam ser explicitados, bastam a si mesmos. A sociedade terrorista é um caso extremo de sociedade repressiva... As infrações à cotidianidade se tornam prescritas, rejeitadas à demência, à marginalidade. O cotidiano se faz regra... (Lefebvre, 1991:159). Assim, o que existe é uma promessa do que não existe, devido à impossibilidade de sua realização. O presente passa a ser o futuro, pelo fato que as satisfações das carências e necessidades tornam-se próximas, distantes, indefinidas e estão sempre no futuro próximo. Observa-se, através da metalinguagem, o resgate da fala contra a escrita, mas não o da narrativa. A fala é a nova rebeldia que se estabelece contra a narrativa. A sociedade da fala é a sociedade da metalinguagem que prioriza as formas, a esteticização, as aparências, o efêmero. Para Lefebvre, a sociedade terrorista é o caso extremo de sociedade repressiva. Por isso, temos que ter bom-senso. É a sociedade da promessa e da fartura que se expressa através da sociedade de consumo dirigido. O projeto político da sociedade da metalinguagem é libertário, pelo fato de que se identifica com a busca do bem-estar e com a felicidade plena. Por isso, há uma tendência fugir, através do projetar-se para além do cotidiano, para o futuro. É a sociedade dos sonhos que nos remetem ao mesmo tempo ao passado e ao futuro, mas nunca ao presente vivenciado. A sociedade terrorista é a sociedade da escrita propriamente dita, cuja lógica está contida, inclusive, no desenho da cidade e na representação cartográfica, nas novas formas de instrumentalização do saber. Essa lógica mostra as diferenças que se instauram entre projeto imediato (mediatizado) e o projeto coletivo. Possibilitam que se observe a existência exacerbada das comunicações como forma de superação das barreiras sociais e mentais. Verificam-se processos de individuação simultânea e crescente. Assim, os novos direitos têm 21 aberto novos caminhos não-burocratizados, não institucionalizados, cujas diferenças mostram também que: há uma sedução pela possibilidade de realização plena; há uma tensão entre opressão e apropriação (o direito à cidade, negação da sociedade de consumo dirigido); há uma tensão entre as coisas que estão escritas e a fala (enquanto códigos sociais e mentais) - a fala é resistência numa sociedade de metalinguagem. Para Lefebvre o direito à cidade é o direito a palavra, o direito a produção/reprodução. A palavra pode unir os fragmentos de recordações e de narrativas. A sociedade contemporânea é uma sociedade de isotopias; há uma confusão entre o lugar com a sociedade, no sentido de que a noção de espaço social é diferente do lugar. Lefebvre ressalta a importância do espaço social para análise da sociedade de classes, no aspecto de que toda sociedade de classes é uma sociedade repressiva. Isto porque é, de um lado, uma sociedade de penúria e, de outro, de consumo de luxo e acumulação, de persuasão e opressão. O fundamento da repressão está associado à sexualidade e à fecundidade, pelo fato de que a repressão se estende à vida biológica e fisiológica, à natureza, à infância, à pedagogia, a entrada na vida (Lefebvre, 1991:156). Qual é o suporte da cotidianidade da sociedade terrorista? O suporte da sociedade terrorista está dado pela burocracia e os seus métodos de controle organizativo, via gestão (administração) dos diferentes espaços e territórios. Este processo organizativo burocrático permite a supressão da história em nome da memória, que em nome da transparência esvaziou o sentido - a razão (enquanto saber individual e coletivo das lógicas em uso, do senso comum) - imputou uma nova racionalidade técnica administrativa, com relação à universalização de procedimentos como mecanismos de controle político-administrativos. É por isso que a coisa escrita provoca adesão e fascinação pela sua flexidez. O código da sociedade 22 terrorista é a mercadoria (Lefebvre, 1991:167), inclusive em sua forma simbólica, como um produto de troca e de consumo. Daí, a importância que assume o mercado, como regulador da economia e da sociedade, para as políticas neoliberalistas35. Desse modo, a sociedade terrorista faz com que o controle do tempo livre transforme os sujeitos em objetos de ação (de gestão, administração de uso do tempo). Assim, as necessidades passam a ser administradas com o propósito de cada vez mais gerarem novas necessidades, numa cadeia incessante de insatisfações e diferenciações excludentes, que realimentam o sistema. Deste modo, transforma-se o cotidiano no lugar onde os embates entre produção/reprodução e revolta revolucionam o próprio conhecimento, pelo fato de controlar a criação, a revolução, transformando-a em modernização, no sentido das inovações tecnológicas e sociais. Ao nível político, Lefebvre reconhece a importância da nomeação e ataca a apropriação dos discursos, pelo fato de que quando o discurso político é destituído da prática se distância das práticas sociais. É a partir dessas práticas discursivas, que a sociedade transforma e controla as lutas sociais, através do terrorismo; institui o politicamente correto, no sentido da administração da lógica em uso, como forma de despossuir e desapropriar os movimentos sociais de sua utopia experimental36. As necessidades (prementes) são absorvidas pela lógica instrumental da sociedade (administrada) de consumo dirigido. Esta administração tem por propósito “acomodar conflitos e igualar diferenças. Assim, institucionaliza-se o mundo das tribos (Mafesoli, 1997)37, diferencia-se a representação, multiplicam-se as cotidianidades, estabelece-se uma igualdade na diferença, no aspecto das pessoas 35 WAINWRIGHT, H. (1998) Op. cit. capítulos 2 e 3. Para Lefebvre, a utopia experimental está relacionada com as práticas que ao serem praticadas não deixam de ser utópicas. É um projeto rebelde, revoltado que está relacionado à ação. Neste sentido, a utopia experimental seria uma ação possível que não compactua com nada. Lefebvre alerta-nos que na medida em a ação se torna um programa já não é utópica. É importante ter claro que ao se instituir o projeto utópico se institui todas as ações que tinham de rebeldes e utópicas. Para que se realize o projeto utópico, temos que saber ler o exercício experimental da utopia assim como saber ler o cotidiano para encontrar as ocasiões e as personas capazes de desenvolver tais atos. Para Lefebvre, são as próprias práticas que impulsionam o desenvolvimento das contradições (e das diferenças) que se impõem e estruturam/reestruturam o espaço/tempo do cotidiano e possibilitam o exercício da utopia experimental. 37 MAFESOLI, M) - A Transfiguração do Político - A tribalização do mundo. Tradução de Jurandir Machado da Silva. Porto Alegre, Sulina, 1997. 23 36 viverem juntas, porém diferentemente. (Healey, 1993)38. Deste modo, a obra, a felicidade, o trabalho, o sexo entre outros, tornam-se objetos de consumo dirigido e, portanto, não são criadores e libertadores no sentido revolucionário (de transformação e plenitude dos sujeitos). Pelo contrário, volta-se para o vazio e para a insatisfação pessoal, num incessante processo de revoltas e de violência. 4 - Considerações finais Com observamos, no transcorrer deste texto, não existe consenso em relação definição do que sejam novos movimentos sociais, pelo fato de haver várias orientações teóricas, que partem da definição de social como se movimento social fosse uma questão dada. É a partir dos limites impostos à maioria das análises recentes, que a maioria das definições caem na questão da empiria, no sentido das análises fragmentadas e descritivas, feitas em si mesmas, desconectadas dos processos que originaram a nova ordem, o novo, (os novos movimentos). Essas análises partem, em sua maioria, do pressuposto de que o novo se explica por si mesmo. Os novos movimentos sociais são elos ativos entre a sociedade e a política, por isso temos que acompanhar os processos e não os movimentos. Neste sentido, a noção de processo é fundamental para o discernimento dos movimentos sociais, pelo fato de que a sociedade possui processos e dinâmicas próprias. É somente a partir desta compreensão que podemos fazer análises sobre os movimentos sociais. É a compreensão da dinâmica própria da sociedade que nos remete às especificidades e delimitações dos movimentos sociais, no aspecto das diferenças estabelecidas pelas relações sociais e técnicas (como observadas por Marx, no Capital). Foi a partir desta compreensão que se delimitou os movimentos sociais em relação aos seus aspectos identidários (em relação ao reconhecimento da especificidade), de oposição (em 38 HEALEY, P. (1993) “Planning Through Debate: The Communicative Turn in Planning Theory” - In FISHER, FORESTER, J. (Eds.) The Argumentative Turn in Policy Analysis and Planning. Durham and London. Duke University Press. p: 233-254 24 relação ao social e o político) e de totalidade (como proposta alternativa para a mudança social). A compreensão dos novos movimentos sociais passa pelo entendimento de que a sociedade precisa ser nomeada (especificada), no que se refere aos cenários onde surgem os novos atores. E por isso é necessário que nos interrogássemos sobre o que significam os novos atores? Quem são os atores não esperados política e institucionalmente? Que sociedade é esta onde emergem esses novos atores? Quais são os novos cenários? A compreensão e a estruturação dos sujeitos, enquanto agentes de ação transformadora, não está na política, mas na ação pelo fato de que os sujeitos só podem emergir pelo agir. É através da ação que compreendemos o agir dos sujeitos, no sentido de que só compreendemos o que podemos dar significado. A questão está referenciada aos indivíduos, no que se refere a sua intersubjetividade, pelo fato de serem ao mesmo tempo, objeto e sujeito de suas ações. Deste modo, a questão dos sujeitos enquanto agentes transformadores estabelece um novo código organizacional e institucional. É nesse sentido que a administração passa a depender de critérios empíricos de consenso, centrados nos princípios básicos da gestão, o que significa mudanças na forma de administrar o Estado. A partir dessa forma, se estabelece a ruptura entre administração e política, o que permite uma nova configuração, no sentido mais amplo, entre Estado e sociedade capitalistas. Esta mudança faz com que haja, cada vez mais, uma imbricação entre o político e o administrativo - entre o Estado e a sociedade civil. Desse modo, o cidadão passa ser a referência da administração, no que se referem às funções executivas que passam a serem, paulatinamente, assumidas pelos cidadãos, através do Terceiro Setor. Neste aspecto, observa-se que a modernidade é tratada como sinônimo de cidadania, no sentido de que está havendo um deslocamento do Estado (institucional) para um Estado parceirizado, a partir das Organizações Não Governamentais (ONGs), ou seja, no caso brasileiro se identifica 25 com o chamado terceiro setor. Esta parceria, a nosso ver, despolitiza os movimentos sociais, pelo fato de transformar a gerência estatal em produtos versus programas (políticas de ação). São as mudanças de programas para projetos, com a institucionalização do social, que transformam o Estado em um mero executor de políticas (públicas) e não um agente de mudança. É por isso, que se verifica uma corrida para o campo da legislação da ação, por parte das ONGs, como forma de garantir espaços no gerenciamento do Estado, da coisa pública. Entretanto, esta corrida não significa uma mudança, necessariamente, nas práticas sociais, pelo contrário, observa-se um retorno ao conservadorismo, via instrumentalização técnicoadministrativa da sociedade. Finalizando, o aspecto que se coloca de novo nos novos movimentos sociais é que há o reconhecimento de quem está agindo constrói os sujeitos e a si mesmo. Os sujeitos ganham historicidade. Esta construção leva a valorização do aqui e do agora, em relação à proximidade, o que significa uma ruptura com as chamadas totalidades vazias, dos projetos das vanguardas predominantes até os anos 60. Neste sentido, os novos movimentos sociais estabelecem rupturas ideológicas e culturais, no que se refere às novas formas de organização e de política que são estabelecidas. Portanto, observa-se uma transformação social com legitimidade na esfera política, a partir da ação dos sujeitos. * * * * * 26 5 - Referências bibliográficas ARENDT, H. - A Condição Humana, Rio Janeiro, Forense Universitária, 1991. ___________- A dignidade da Política. Rio de Janeiro, Relume-Dumará, 1993. AZAIS, Cristian; C. APPELIN, Paola; - “Para uma Análise das Classes Sociais”. In SIQUEIRA, D. E. & POTENGY, G. F.; CAPELLIN, P. (Orgs.) Relações de Trabalho, Relações de Poder, Brasília, DF, Universidade de Brasília, 1996, p.:1846. BOURDIEU, P. - Questões de Sociologia. Rio de Janeiro, Marco Zero, 1983. _____________ - O Poder Simbólico. Lisboa, DIFE. 1989. _____________ - A Economia das Trocas Simbólicas. Tradução de Sérgio Miceli, Silvia de Almeida Prado, Sônia Miceli e Wilson Campos Viera. São Paulo, Perspectiva, 1992. DE CARVALHO, E. G. - Negócios da Terra - A questão fundiária e a Justiça. Rio de Janeiro, UFRJ, 1991, (série universidade). 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