ISSN 2236-8671
v. 1, n. 1, jul./dez. 2011
Revista das Faculdades Integradas Coração de Jesus
1
INTER FAINC
v. 1, n. 1, jun./dez. 2011
EQUIPE EDITORIAL
Editores Chefe
Prof. Dr. Wellington de Oliveira, FAINC
Profª Ms. Missila Loures Cardozo, FAINC
Editoração Gráfica
Agência Experimental, FAINC, Santo André, SP
Joyce Francisca da Silva
Revisores de Texto
Ir. Ivone Braga de Rezende
Bibliotecária Esp. Tânia Aparecida da Silva
Contato Principal
Sandra Rodrigues Lima
E-mail: [email protected]
COMITÊ CIENTÍFICO
Dr. Alcides José Scaglia, UNICAMP (Campinas, SP)
Dr. Arquimedes Pessoni, USCS (São Caetano do Sul, SP) e FMABC (Santo André, SP)
Dra. Daniele Pimenta, FAINC (Santo André, SP)
Dra. Fernanda Coelho Liberali, PUC- SP (São Paulo, SP)
Dra. Ivana Maria Lopes de Melo Ibiapina, UFPI (Teresina, PI)
Dra. Maria Cecília Camargo Magalhães, PUC-SP (São Paulo, SP)
Dra. Maria Otilia Guimarães Ninin, UNIP (São Paulo, SP)
Dra. Maria Dora Ruiz Temoche, UEPB (Campina Grande, PB)
Dra. Mônica Pegurer Caprino, USCS (São Caetano do Sul, SP)
Dra. Tânia Regina de Souza Romero, UFLA (Lavras, MG)
Dr. Wellington de Oliveira, FAINC (Santo André, SP) e PUC-SP (São Paulo, SP)
SANTO ANDRÉ, SP
PERIODICIDADE SEMESTRAL
ISSN:
Inter Fainc, Santo André, SP, v. 1, n. 1, p. 1-84, jun./dez. 2011
2
FACULDADES INTEGRADAS CORAÇÃO DE JESUS - FAINC
Diretor
Prof. Dr. Wellington de Oliveira
Vice-Diretora
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Diretora Financeira
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FICHA CATALOGRÁFICA
Elaborada pela Biblioteca Cecília Meireles – FAINC
Tânia Aparecida da Silva, CRB-8/5516
Inter FAINC [recurso eletrônico] / Faculdades Integradas Coração de Jesus.
Rede Salesianas de Ensino – Vol. 1, n. 1 (jan./jun. 2011) – Santo André,
SP: FAINC, 2011Semestral
Resumo em Português e Inglês.
Modo de acesso: World Wide Web: <www.interfainc.com.br/inter01.pdf>
ISSN
1. Comunicação - Periódicos 2. Educação - Periódicos 3. Artes Periódicos 4. Nutrição - Periódicos 5. Biblioteconomia - Periódicos
7. Administração 8. Comunicação científica - Periódicos 9. Ciência da
informação I. Faculdades Integradas Coração de Jesus. Rede Salesianas de
Ensino
CDD 001.25
3
EDITORIAL
Imbuídos no espírito crítico da ciência, é que com grande satisfação, apresentamos à
comunidade científica o primeiro exemplar da Revista INTERFAINC, produzida pelo
Grupo de Pesquisa em Educação - GEST, Subjetividades e Tecnologias das Faculdades
Integradas Coração de Jesus - FAINC.
A revista se destina à publicação de trabalhos inéditos e originais na área de Educação,
Subjetividade e Tecnologias resultantes de pesquisas e práticas educativas refletidas
teoricamente e recebe artigos e resenhas congregando elaborações teóricas e metodológicas
em torno desse tema, visando a estimular reflexão interdisciplinar e articulação de diferentes
maneiras de compreender a temática a partir de suas múltiplas faces.
Ao entregarmos este exemplar para a comunidade com a contribuição dos membros do
Comitê Científico, nós, os Editores, demonstramos que há no diálogo compartilhado a
possibilidade de um fazer científico renovador e transformador, que inspira estratégias e
espaços concretos para o exercício da cidadania ativa e responsável. Esta edição também
concretiza um antigo anseio da FAINC em ter um espaço para o registro de suas produções
e do fazer científico em nossa casa. Estamos certos de que a revista muito contribuirá para o
aprimoramento acadêmico da FAINC e, esperamos que, a partir de agora, a INTERFAINC
consolide-se como um veículo aberto a todos aqueles que desejarem colaborar para um
fazer compartilhado em ciência.
Wellington de Oliveira e Missila Loures Cardozo
Editores
4
SUMÁRIO
Eventos oficiais como ferramenta da
comunicação pública
----------
06
Para pensar a metodologia de pesquisa nas
ciências humanas
----------
17
Theoretical-Methodological Choices in AL Research:
Critical Research of Collaboration in Teacher Education
----------
34
A produção colaborativa e critica na ciência:
uma alternativa para desenvolvimento da
pluripertença social
----------
46
A formação profissional e o futebol: dilemas pedagógicos
----------
54
Atividade docente de professores universitários:
Reflexões crítica em contexto colaborativo
----------
65
O teatro contemporâneo e o ensino
das artes cênicas
----------
74
Normas para publicação ---------- 81
5
Eventos oficiais como ferramenta da
comunicação pública
Official events as a tool of public
communication
1
Arquimedes Pessoni
Camila Moreira Fonseca Ferman 2
RESUMO
O ponto de partida deste estudo é a análise da utilização dos eventos como ferramenta da comunicação pública,
tornando visíveis as realizações da gestão governamental aos veículos de comunicação e respectivos públicos
(população, parceiros, rivais políticos, etc.). Trata-se de uma estratégia de aproximação e divulgação de conteúdos
que não teriam visibilidade apenas pela divulgação oficial. A análise teórica consiste na revisão bibliográfica sobre o
tema e o cruzamento de informações entre evento e ferramentas de comunicação pública.
Palavras chave: Eventos oficiais. Comunicação Pública. Cerimonial. Relações Públicas.
ABSTRACT
The starting point of this study is the analysis of the use of the events as a tool of public communication, becoming
visible the accomplishments of the governmental management vehicles of communication and respective public
(population, partners, rivals politicians, etc.). This is a strategy is to bring closer and spreading the contents that
would not have visibility only for the official spreading. The theoretical analysis consists of the evaluation of official
registers and public communication areas study, events and ceremonial.
Keywords: Official Events. Public Communication. Ceremonial. Public Relations.
RESUMEN
El punto de partida de este estudio es examinar el uso de eventos como herramienta de comunicación pública, hacer
visible los logros de la gestión de gobierno a los medios de comunicación y sus audiencias (públicos, socios, rivales
políticos, etc) .. Se trata de una estrategia de aproximación y difusión de contenidos que no tienen visibilidad sólo
para el lanzamiento oficial. El análisis teórico es revisar la literatura sobre el tema y el cruce de información entre el
evento y las herramientas de comunicación pública.
Palabras-clave: Eventos Oficiales. Comunicación Pública. Etiqueta. Relaciones Públicas.
1
Mestre e Doutor em Comunicação Social pela UMESP. Graduado em Jornalismo pela UMESP. Professor do corpo permanente
do Programa de Mestrado em Comunicação e de graduação da USCS. Professor-colaborador da disciplina de Saúde Coletiva da
Faculdade de Medicina do ABC - FMABC. Vice- presidente do Centro de Estudos de Saúde Coletiva da FMABC - CESCO. Assessor de imprensa da Prefeitura de Santo André desde 1991 (em licença). É editor do Blog da Rede Comsaúde, ligado à Cátedra
Unesco/Metodista de Comunicação. Consultor ad hoc da Universidade do Norte do Paraná - Unopar e parecerista da Revista de
Gestão USP (REGE-USP). E-mail: [email protected].
2 Relações-Públicas e Especialista em Comunicação Organizacional pelo UniFIAMFAAM. E-mail: [email protected].
6
1 Introdução
O tema deste estudo visa a discutir a realização de
eventos, por meio de cerimônias públicas/oficiais,
como ferramenta de aproximação e visibilidade das
ações desenvolvidas na gestão pública. O trabalho
mostra que, independente das inúmeras novas
mídias e estratégias de comunicação utilizadas para
aproximar a população e formadores de opinião
das ações realizadas por um órgão governamental,
a realização dos eventos não perde espaço, muito
ao contrário, cada vez mais as novas ferramentas
são utilizadas no auxílio da propagação das
informações divulgadas em eventos. O estudo busca
o entendimento dos eventos e qual a sua participação
no ciclo que abrange a transmissão das informações
na comunicação pública, que tem obrigatoriedade por
transparência e alcance máximo dentro da população.
“Evento é um fato que desperta a atenção, podendo
ser notícia e, com isso, divulgando o organizador”
(Cesca, 1997, p. 14). É considerado um instrumento
de marketing quando atinge o público desejado, torna
a marca e os produtos do patrocinador conhecidos,
promovendo as vendas e possibilita a conquista
de novos mercados. Trata-se de uma excelente
oportunidade de conquistar novos clientes e estreitar
o relacionamento com clientes antigos (Sachuk e
Corrêa, 2007, p. 44).
A realização da pesquisa, baseada na metodologia
da revisão bibliográfica, foi motivada pela crescente
discussão sobre a necessidade de a área governamental
investir numa política global de comunicação com
os seus públicos de interesse e, como afirma Lima
(2002), que esta política vá além da realeasemania.
Na visão do autor, a atuação de um profissional de
comunicação na área pública requer que este possua
visão do que é a comunicação integrada, mesclando
conhecimentos de várias áreas da comunicação para
o desenvolvimento de trabalho de interface com os
diversos públicos de interesse. A pesquisa abrangeu
a realização de levantamento bibliográfico, visando
compreender as concepções de autores da área sobre
a função da comunicação e das relações públicas no
governo. Constatou-se que existe pouca produção
bibliográfica a respeito, partindo daí a necessidade de
realização de pesquisas em documentos institucionais,
entrevistas com profissionais atuantes nestas áreas e
delineadores destas diretrizes de atuação e pesquisas
junto às entidades da área de comunicação pública.
A pesquisa busca mapear, a partir das diretrizes
políticas ou partidárias, o evento como ferramenta
de comunicação em cerimônias oficiais/públicas
e um aprofundamento em torno das regras que
delimitam estas cerimônias, que de forma geral
norteiam os eventos públicos, ou seja, o conjunto
de regras que regem um evento com a participação
de uma autoridade pública, formalizado a partir do
Decreto Federal nº. 70.274, de 09 de março de 1972,
que estabelece as Normas do Cerimonial Público e a
Ordem Geral de Precedência.
2 Comunicação pública
Toda a base de estudos aqui apresentada gira em torno
da atuação de órgãos governamentais e suas estratégias
de comunicação. Inicialmente, parece simples a
avaliação apenas vivenciada pela comunicação destes
órgãos, mas em busca do embasamento teórico
para esta análise, muitas lacunas ainda ficam sem
preenchimento. As publicações nesta área ainda são
limitadas a avaliações pontuais sobre determinados
nichos de mercado, ou seja, os estudos constatados
apresentam pontualmente análises sobre políticas
públicas, impactos sociais, econômicos, ambientais e
estruturais na sociedade a partir da atuação de cada
gestão governamental, constatando-se assim, que
os estudos em torno do conceito da comunicação
pública são recentes e ainda pouco explorados.
A discussão da comunicação pública a partir do
enfoque pragmático-idealizante perpassa a análise
conceitual e estabelece linhas de atuação conforme o
interesse público. A comunicação pública tem origem
na viabilização da democracia e na transformação
do perfil da sociedade brasileira a partir da década
de 1980, até então as referências de comunicação
desenvolvida pela esfera governamental registram
viés autoritário.
Por uma breve passagem histórica permite-se a
compreensão da mudança do perfil da comunicação
pública nas últimas décadas, o que diferentemente
das instituições privadas, que sempre dependeram da
comunicação para captar clientes e obter lucro passou
de autoritária a agregadora, compreendendo que
o sistema comunicacional é fundamental para
o processo das funções administrativas internas
e do relacionamento das organizações com o
7
ambiente externo. Além disso, é preciso ver como
ela funciona, identificando-se sua direção e sua
rede de transmissão (Kunsch, 2003, p. 69).
Nos anos 1930 o governo federal implementou as
políticas de controle de informações por meio do
Departamento de Imprensa e Propaganda – DIP, uma
rede nacional que controlava e orientava a imprensa.
Este controle foi ampliado durante o regime militar
com a organização do Sistema de Comunicação
Social com foco na propaganda e censura.
A primeira mudança de panorama veio com o fim da
censura, a Constituição de 1988, o Código de Defesa
do Consumidor e a transformação do papel do
Estado, que deu espaço para a atuação de movimentos
sociais. Simultaneamente, o desenvolvimento
tecnológico forçou a criação de mecanismos para dar
entendimento aos cidadãos sobre informações do
Estado e instituições.
O surgimento do conceito empresarial socialmente
responsável, ainda que diretamente ligado a estratégias
comerciais, demanda maior transparência no setor
público. Neste sentido, muitas empresas ganham
espaço para a realização de ações comunitárias que
são obrigação do governo e não são cumpridas. Já o
contraponto do governo é a publicidade de suas ações.
Mesmo com as mudanças, a população não se
apropria das informações como interesse coletivo.
De acordo com uma pesquisa realizada pelo Ibope
em 2003 constou-se que 44% dos brasileiros desejam
influenciar políticas públicas, entretanto 56% não
têm interesse. E o que mais se destaca neste estudo
é que dos não-interessados 35% alegam que não se
interessam simplesmente por não ter informações de
como fazer (DUARTE e VERAS, 2006). Isto posto,
vale ressaltar que o cidadão entra em sua zona de
conforto e alega não conhecer as fontes de informação
simplesmente por não buscá-las ou por apresentar
intolerância aos métodos oficiais de publicação das
informações públicas, o que vale a defesa de que,
o cidadão parece considerar os governos como algo
não relacionado à sua vida e tornam-se um tanto
cínicas (sic) com relação à política e à capacidade
dos governantes de buscar o interesse público.
Mais do que simples interesse do indivíduo em
ser sujeito da ação, muitas vezes, a apatia e a falta
de formação política são resultado do cruzamento
entre desinformação, falta de oportunidade de
participação e descrédito com a gestão pública.
(DUARTE e VERAS, 2006, p. 35)
8
A comunicação na área privada é administrada,
essencialmente, para a eficiência de um ambiente
lucrativo instável, volátil e crítico, já a comunicação
pública precisa ter a capacidade de mediar seu próprio
interesse com o atendimento direto ao cidadão na
viabilização de demandas coletivas das mais diversas
áreas.
Assumir a perspectiva cidadã envolvendo os temas
de interesse coletivo é a matriz estratégica da
comunicação pública e, por isso, a compreensão do
seu ambiente de atuação é fundamental. Os fluxos
de informação interferem diretamente da interação
entre agentes públicos e atores sociais. Este ambiente
compreende a integração governamental, seja nas
esferas federais, estaduais e municipais, por meio
dos poderes executivo, legislativo e judiciário,
conciliando interesses de partidos políticos, entidades
representativas, movimentos sociais, organizações
não governamentais, empresas e imprensa com foco
na perspectiva cidadã em temas de interesse público.
Toda a complexidade estratégica da comunicação
pública não se limita ao ambiente e sim ao conteúdo
e forma de expressar, para isto, de acordo com Duarte
e Veras (2006, p. 51) alguns conceitos delimitam sua
atuação:
A comunicação governamental diz respeito
aos fluxos de informação e padrões de
relacionamento, envolvendo os gestores e a ação
do Estado e a Sociedade. Estado, neste caso, é
compreendido como conjunto das instituições
ligadas ao Executivo, Legislativo e Judiciário,
incluindo empresas públicas, institutos,
agências reguladoras, área militar e não deve ser
confundido com governo. Este é apenas o gestor
transitório daquele. [...] A comunicação política
trata do discurso e ação de governos, partidos
e seus agentes na conquista da opinião pública
em relação a idéias ou atividades que tenham
a ver com poder político, relacionado ou não a
eleições.
A comunicação pública diz respeito à interação
e ao fluxo de informação relacionados a temas
de interesse coletivo. O campo da comunicação
pública inclui tudo que diga respeito ao
aparato estatal, às ações governamentais,
partidos políticos, terceiro setor e, em certas
circunstâncias, às ações privadas.
A existência de recursos públicos ou interesse
público caracteriza a necessidade de atendimento
às exigências da comunicação pública.
Na prática não há como restringir estas divisões,
que se integram em diversas áreas, entretanto, a
comunicação pública assume como desafio alinhar
a perspectiva da sociedade acima das instâncias
governamentais, privadas, midiáticas, pessoais e
políticas, o que de alguma forma unifica o conjunto.
Cabe justamente à comunicação pública o
levantamento de ferramentas para informar a
sociedade, abrindo espaço para mais diálogo e
participação, o que requer um trabalho de qualificação
da gestão do público, em outras palavras, organizar
estratégias para popularizar os canais de informação
adequando-os para cada nicho da sociedade.
Para Duarte e Veras (2006, p. 44), as informações
podem ser agrupadas didaticamente em categorias:
a)institucionais: referentes ao papel, responsabilidades e funcionamento das organizações–o aparato
relativo à estrutura, políticas, serviços, responsabilidades e funções dos agentes públicos, poderes, esferas governamentais, entre federativos, entidades,
além dos direitos e deveres do cidadão. O que esperar, onde buscar e reclamar;
b) de gestão: relativos ao processo decisório e de
ação dos agentes que atuam em temas de interesse
público. Incluem discursos, metas, intenções, motivações, prioridades e objetivos dos agentes para
esclarecer, orientar e municiar o debate público. O
cidadão e os diferentes atores precisam saber o que
está acontecendo em temas relacionados a acordos,
ações políticas, prioridades, debates e execução de
ações;
c) de utilidade pública: sobre temas relacionados ao dia-a-dia das pessoas, geralmente serviços
e orientações. Imposto de renda, campanhas de
vacinação, sinalização, causas sociais, informações
sobre serviços à disposição e seu uso são exemplos
típicos;
d) de prestação de contas: dizem respeito à explicação e esclarecimento sobre decisões políticas e
uso de recursos públicos. Viabiliza o conhecimento,
avaliação e fiscalização da ação de um governo;
e) de interesse privado: as que dizem respeito, exclusivamente, ao cidadão, empresa ou instituição.
Um exemplo: dados de imposto de renda, cadastros
bancários;
f) mercadológicos: referem-se a produtos e serviços
que participam de concorrência no mercado;
g) dados públicos: informações de controle do Estado e que dizem respeito ao conjunto da sociedade
e a seu funcionamento. Exemplos: normas legais,
estatísticas, decisões judiciais, documentos históricos, legislação e normas.
Ainda que pareça óbvio que a estrutura pública
necessite facilitar a informação consistente ao
cidadão, cabe ao cidadão buscar os caminhos para
interpretar as informações disponíveis conforme suas
necessidades. Outro aspecto importante é foco dado
por muitas instituições apenas para a publicidade,
sinônimo de divulgação na busca de convencimento.
Geralmente embasadas na Constituição de 1988,
em seu artigo 37, que estabelece a publicidade como
um dos princípios da administração pública. Assim,
como defende Kunsch (2003, p. 89) a “comunicação
é uma via de mão dupla que requer um processo
circular de troca de informações e influências”.
Qualificar a comunicação não significa apenas
ampliar as ferramentas utilizadas, o que fortalece o
bombardeio de informações transmitidas e reduz a
absorção de conteúdo. A sociedade brasileira exige
refinamento das estratégias utilizadas, a comunicação
eficaz propicia a criação de formas adequadas de
acesso e participação, ampliação de redes sociais que
permitam maior ligação entre os agentes públicos, os
grupos de interesse e o cidadão.
De acordo com Duarte e Veras (2006), a comunicação
de qualidade implica a criação de uma cultura
de comunicação que perpasse todos os setores
envolvidos com o interesse público, o compromisso
do diálogo em suas diferentes formas e de considerar a
perspectiva do outro na busca de consensos possíveis
e de avançar na consolidação da democracia.
Para garantir que a comunicação pública encontre
maneiras adequadas de fazer a informação circular e
chegar aos interessados é preciso mapear os públicos
de interesse, avaliar o padrão de relacionamento com
cada público e estabelecer objetivos e estratégias para
a utilização de instrumentos como pesquisas, planos,
diretrizes, programas, manuais, normas, canais
institucionais, publicações e produtos.
2.1 A Comunicação Como Uma Necessidade dos
Governos
Percebe-se que os governos – sejam na esfera
municipal, estadual ou federal – enfrentam no Brasil
uma crise de credibilidade junto à opinião pública.
Na visão de Torquato (2002, p. 125):
9
A imagem da administração pública, [...] é precária.
Em determinados setores, é alicerçada num
conjunto de mazela: empreguismo, obsoletismo,
desmotivação de quadros, inércia, inadequação de
funções, serviços desqualificados, ineficácia geral.
Noutros casos as instituições públicas se vêem às
voltas com denúncias de fraudes, escândalos e
situações confusas.
Os fatores listados pelo autor são inúmeros e também
não são fenômeno recente. Das razões que motivam
um cenário de descrédito para com os governos, no
entanto, uma em especial deve ser destacada - a forma
como lidam com a comunicação e a transparência em
relação às ações desenvolvidas.
Em grande parte a crise de imagem vivenciada
pela área governamental pode ser atribuída à
inexistência de uma política de comunicação
contínua e transparente que informe a sociedade das
ações realizadas, que preste contas da utilização do
dinheiro público, ou ainda, nos casos de denúncias
sobre fraudes, esclareça as providências tomadas para
sensibilizar os culpados.
Desde a década de 80 desenrola-se a discussão sobre
a necessidade dos governos utilizarem uma estratégia
de comunicação que os aproxime dos públicos. Na
época, Andrade (1982) afirmava que:
A separação entre governantes e governados é quase
sempre conseqUência da falta de informações.
A administração pública não pode funcionar
sem a compreensão popular de suas atividades
e processos, pois o poder público depende do
consentimento e da participação do povo na
execução das diretrizes governamentais.
Atualmente, mais de duas décadas depois, verifica-se
que um dos maiores desafios dos governos continua
sendo a adoção de uma política transparente que seja
capaz de informar e esclarecer de maneira contínua
os seus públicos sobre seus atos/realizações.
Muitas dificuldades enfrentadas na área governamental são originadas pela falta de informação. Na
visão de Torquato (2002, p. 120), “há momentos de
ocorrências de muitos fatos e informações e períodos
de quase completa falta de notícia, mesmo em período de atividades dos poderes”.
Assim como nas organizações privadas, as públicas
também dependem da comunicação como elemento
vital para seu crescimento. Para Kunsch (2003, p.
10
69), “[...] no sistema comunicacional é fundamental
o processamento das funções administrativas
internas e do relacionamento das organizações com
o meio externo”. E nas organizações públicas não é
diferente, principalmente quando estas possuem a
responsabilidade pela gestão dos bens públicos. A
comunicação deve ser vista na esfera governamental
como facilitadora da relação do governo e seus
diversos públicos e, também, como base da prevenção
do surgimento de possíveis crises entre o governo e a
população.
Outro aspecto a ser considerado quando se discute
o papel da comunicação governamental é que a
socialização dos seus atos é um dos princípios
constitucionais da administração pública. A partir
disso, entende-se que é dever das organizações
públicas informar seus públicos sobre assuntos que
dizem respeito ao interesse de todos. Porém, o que
se observa de maneira geral, é que dificilmente a
população vê os órgãos públicos prestarem contas de
seus atos, faltando na maioria dos casos, por parte
do governo, o compromisso com a popularização da
informação que é de interesse público.
A abordagem anterior não diz que os órgãos públicos
se recusam a prestar contas de suas ações, entretanto
o conflito com a população, quando esta argumenta
não ter informações sobre os atos governamentais
inclui também a utilização de instrumentos de
divulgação meramente administrativos, seja por meio
de publicações em diário oficial ou veículos muito
específicos.
Além da obrigatoriedade de tornar público seus atos,
de ser uma necessidade de administração pública, um
outro aspecto que deve ser levado em consideração é
o dever dos governos com a sociedade, pois o acesso
às informações precisa ser vista como um direito
do cidadão. A Declaração Universal dos Direitos
Humanos da ONU assegura que “a informação é
unanimemente reconhecida como direito universal
inviolável e inalienável do homem moderno
correspondente a uma profunda necessidade de sua
natureza racional” (Andrade, 1982, p. 84). Ou seja,
este direito deve ser respeitado especialmente pelos
governos.
Na defesa de que a comunicação deve ser vista pelos
governos como fundamental na construção da
cidadania Torquato (2002, p. 122) diz:
A comunicação como base de cidadania: função:
direito à informação. A comunicação deve ser
entendida como um dever da administração
pública e um direito dos usuários e consumidores
dos serviços. Sonegar tal dever e negar esse direito
é um grave erro das organizações públicas. Os
comunicadores precisam internalizar esse conceito,
na crença de que a base da cidadania se assenta
também no direito à informação.
Neste contexto, o desenvolvimento de uma política de
comunicação é essencial para os governos. Ainda de
acordo com Torquato (1985, p. 44):
A comunicação governamental é uma necessidade
social, mais que uma infraestrutura de sustentação
do poder. Por sua rede, os segmentos sociais
tomam conhecimento do que se passam nos
diversos setores do governo e, por seu intermédio,
transmitem aos governantes suas expectativas e
desejos. Deve ser entendida, pois, como via de duas
mãos.
É importante destacar quando o autor defende que
a comunicação governamental deve ser vista como
uma via de duas mãos. Ou seja, as organizações
precisam, acima de tudo, compreender a amplitude
do conceito de comunicação. Além de informar, de
tornar público seus atos, os governos precisam criar
canais de comunicação que permitam que a sociedade
manifeste sua opinião, possa tirar dúvidas ou indicar
sugestões de melhorias.
A partir desta visão, Lima (2002, p. 300) defende
como sendo fundamental que os governos revejam
sua estratégia, que na maioria das vezes, está
pautada no envio de releases para eventos, tendo
como público prioritário a imprensa ou apenas uma
minoria de parceiros geralmente também de governo
que participam das cerimônias oficiais. Isso se deve
segundo o autor “porque os chefes do executivo,
equivocadamente, confundem comunicação com
jornalismo e escolhem para atuar nesse segmento
apenas jornalistas, quase na totalidade deles com
experiência em veículos”.
Ao fazer da divulgação jornalística sua principal
estratégia, os governos e os profissionais, que atuam
nas assessorias deixam claro que não visualizam a
contribuição efetiva da comunicação no seu conceito
mais amplo. Por outro lado, enquanto muitos
acreditam que a divulgação das ações do governo
é que deve ser o caminho para alcançar o objetivo
maior na conquista de visibilidade junto à sociedade,
destacam-se as demandas da sociedade sobre a falta
de informação pelo uso de ferramentas limitadas ou
inadequadas.
Ainda, de acordo com Lima (2002), uma mudança
de concepção quanto ao papel da comunicação
governamental passa também pela discussão do
perfil do profissional adequado para atuar na área
governamental que, na sua visão, deve “integrar
conhecimentos das várias áreas da comunicação e
que saiba desenvolver o trabalho de interface com os
públicos”. A implantação de política de comunicação
eficiente na área governamental dependerá em grande
parte na visão exata do que seja a comunicação
integrada.
Neste sentido, a questão do planejamento de
estratégias de comunicação com os diversos públicos
de interesse se torna necessário. Torquato (2002, p.
122) também destaca a função da pesquisa como
uma aliada da comunicação governamental, onde são
analisadas questões como o ambiente organizacional
e a opinião dos públicos.
[...] Há de se considerar a prospecção ambiental
como ferramenta importante do planejamento
estratégico da comunicação. Afinal de contas, a
pesquisa é o que detecta o foco, os eixos centrais
e secundários, as demandas e expectativas dos
receptores.
Quando se trata da comunicação governamental tornase necessário, também, que a área governamental
assimile a necessidade de trabalhar com a visão de
públicos de interesse, ou seja, que os governos se
preocupem em planejar a relação não somente com o
público externo – população e imprensa, mas também
com o público interno. Para Torquato (2002, p. 125)
“nesse sentido, torna-se indispensável à alocação
de uma força de comunicação capaz de trabalhar
nas duas pontas do processo de imagem: ambientes
interno e externo”. No ambiente interno, a adoção
de estratégias de comunicação e relações públicas
contribuirão para promover a integração interna
e motivação do público interno que desempenha
papel estratégico na recuperação da credibilidade dos
serviços públicos.
A partir da necessidade de melhorar sua imagem
junto à sociedade, de estabelecer um processo de
comunicação contínuo e transparente, cabe aos
11
governos visualizarem a comunicação como estratégia
fundamental na construção de credibilidade junto
aos seus públicos de interesse.
2.2 Visibilidade e Comunicação Pública
Na última década uma nova linha de comunicação
ganhou força na sociedade, é evidente que, com a
crescente complexidade das novas mídias, haja a
crescente demanda para a adequação de muitas áreas
ao panorama social e de negócios, com isto o fator
de tornar visíveis os acontecimentos deixa de ser uma
opção nos sistemas de comunicação e passam a ser
cada vez mais difíceis de serem controlados. Trata-se
de uma estratégia explícita por parte de um nicho da
sociedade que bem sabem utilizar a sociedade com
uma arma de enfrentamento de lutas diárias.
A comunicação formal perde sua exclusividade de
conteúdo, o cidadão passa a ser repórter, interlocutor
e receptor crítico das informações, a nova visibilidade,
conforme Thompson (2008) ultrapassa as barreiras da
comunicação massiva com um novo cenário político
visível no mundo mediático, no qual a distância é
irrelevante e a propagação da informação ganha força
com a internet e outras mídias em rede, sendo assim,
a nova visibilidade está definitivamente relacionada
às maneiras de agir e interagir trazidas com a mídia.
As mídias comunicacionais não se restringem aos
aparatos técnicos usados para transmitir informações
de um indivíduo a outro, enquanto a relação entre eles
permanece inalteradas novas formas de interagir são
criadas consideradas as características individuais do
cidadão.
12
de co-presença a interação mediada ocorre em termos
espaciais, podendo ser comprimida em termos
temporais. Uma forma de comunicação mediada
pode ser exemplificada, inicialmente, por falar ao
telefone e escrever cartas ou e-mails. Ela cria diversos
tipos de relacionamentos interpessoais e trocas
simbólicas, o que Thompson (2008, p. 19) chama de
“intimidade não-recíproca à distância”.
O desenvolvimento de uma gama de novas tecnologias
da comunicação relacionadas aos computadores
pessoais e a Internet, como blogs, comunidades
no Orkut e Twitter podem ser analisadas de forma
semelhante, pois criam uma variedade de situações
de interação que tem características próprias.
Todas estas novas tecnologias de comunicação
não eliminam as demais, ampliando seu alcance
na sociedade por outras formas de interação que
assumem papel em constante crescimento. De acordo
com Thompson (2008, p. 20):
Cada vez mais os indivíduos são capazes de
captar informações e conteúdos simbólicos
de fontes outras que não as pessoas com quem
interagem diretamente no decurso de suas vidas
cotidianas; cada vez mais eles têm acesso a um
<<conhecimento não-local>> e que podem
incorporar, de maneira reflexiva, em seus
processos de reconstrução pessoal. A criação e
a renovação das tradições são processos que se
tornaram cada vez mais atrelados à troca simbólica
mediada; as tradições não são, necessariamente,
destruídas com o avanço (sic) sociedades
modernas, mas perdem gradualmente seu lastro
nas situações cotidianas. O desenvolvimento dos
meios cria novos campos de ação e interação
que envolvem diferentes formas de visualidade
e nos quais as relações de poder podem alterarse rapidamente, dramaticamente e tomando
caminhos imprevisíveis.
A forma tradicional de interação é comumente
conhecida por face-a-face, quando os indivíduos
compartilham de uma estrutura espaço-temporal e
a transmissão de informações pode ser de duas vias,
ou seja, pode haver diálogo entre os presentes, neste
caso a recepção da mensagem é complementada
por características ambientais, gestuais, entonações
e referências visuais. Na comunicação pública
a interação face-a-face sempre precedeu outras
ferramentas na transmissão de informações aos
formadores de opinião, seja por meio de reuniões ou
eventos.
Para a comunicação pública esta nova visibilidade
traduz novas formas de aproximar o governo do
cidadão, um exemplo disto é que em cerimônias
públicas os líderes políticos estavam visíveis apenas
àqueles que compartilhavam o espaço de sua
realização, sendo sempre membros da elite mandante
ou formadores de opinião com poder de decisão junto
ao poder público. O que posteriormente teria uma
divulgação pontual pela imprensa ou algum veículo
oficial, sem espaço para interação da sociedade.
Enquanto a interação face-a-face se passa no contexto
Com o desenvolvimento da nova visibilidade os
parâmetros de tempo e espaço das cerimônias
públicas, por exemplo, vão muito além do momento
em que acontecem, expandindo a divulgação oficial
e pela mídia; um participante pode ser propagador
da informação por meio das redes de comunicação
não-formais, que possibilitam a multiplicação da
informação bem como a interação do cidadão com
questionamentos, críticas e sugestões, o que por
não ser oficial não depende do crivo institucional
para circular e alcançar as mais diversas avaliações,
tornando crescente a demanda e o monitoramento
por transparência na gestão pública.
Mais uma vez cabe ao interlocutor da comunicação
pública, geralmente conduzido por um profissional
de relações públicas e sua equipe de comunicação
integrada, criar e sustentar uma base que mantenha
a centralidade das informações oficiais prontas para
esclarecer com objetividade e transparência o que
circula no espaço público não-formal.
Não se pode mais controlar o fluxo das informações,
as demandas e respostas não seguem mais o percurso
previamente estabelecido e a forma mais comum de
expansão dos limites da informação na comunicação
pública é por meio de eventos, que ao trazer para
si representantes da sociedade abre espaço para
novas linhas de divulgação e discussão das ações
apresentadas, Thompson (2008, p. 37) diz que
a visibilidade das ações e eventos, o
impacto dessas ações e imagens na forma
como os indivíduos comuns entendem
[...] moldam suas opiniões e julgamentos
morais sobre tais situações têm se tornado,
no tempo presente, uma parte inseparável
do decurso dos eventos em si.
2.3 Evento
Partindo do pressuposto que evento é uma ferramenta
indispensável para a comunicação social, sobretudo
ao profissional de Relações Públicas, o evento pode ser
empregado com sucesso em campanhas institucionais
e de mercado. Seu objetivo é criar conceitos e reforçar
a imagem de produtos, serviços, pessoas, entidades
e organizações, por meio da aproximação entre os
públicos envolvidos.
A imagem de uma instituição no mercado é valiosa,
é o que a torna competitiva, geralmente é fortalecida
por meio de eventos. Por apresentar características
complementares ao evento, o Cerimonial é também
uma ferramenta importante e fundamental. Suas
funções e atribuições vêm evoluindo através
da história, harmonizando o comportamento
das pessoas, de acordo com a prévia pesquisa e
organização de regras e costumes. De acordo com
Gimenes (1991 apud Cesca, 1997, p. 14) para as
relações públicas, “evento é a execução do projeto
devidamente planejado, de um acontecimento com o
objetivo de manter, elevar ou recuperar o conceito de
uma organização junto ao seu público de interesse”.
É um fato que desperta a atenção, podendo ser
notícia e, com isso, torna-se uma mídia poderosa de
divulgação.
Transformar em evento o conjunto de informações
institucionais que serão transmitidas ao público
alvo é uma crescente rápida e em constante
desenvolvimento. Kotler (1990) situa o início desta
demanda na década de 1950 na área de negócios, por
meio de eventos formatados em feiras e exposições
com foco em promoções de vendas. Inicialmente estes eventos tinham como objetivo
principal orientar os promotores de venda sobre
técnicas de exposição, apresentação e venda dos seus
produtos, em seguida os eventos passaram a acontecer
para promover estas vendas, o que deu espaço para
a integração de tipologias, as feiras de exposição
passaram a ter cerimônia de abertura, coquetéis de
lançamento de produtos, palestras e até muitas vezes
congressos integrados. Ciacaglia (2007) reforça que
há que se considerar as mudanças significativas nestes
eventos, as grandes feiras diminuíram dando espaço a
transformação de eventos em commodities.
Surgiram, então, para o proponente de eventos
requisitos que, embora não fossem novos, se
tornaram cada vez mais imprescindíveis, como
idéias muito criativas, excelente estruturação,
projetos e proposta adequados, capacidade de
comunicação e facilidade de vendas na busca
de patrocínios que viabilizassem a realização de
seus eventos (Ciacaglia, 2007, p. XVI).
Com a ampliação da demanda seguiu-se a ampliação
das exigências, trabalho integrado tornou-se
referência, principalmente pela necessidade de
captação de parcerias, o que não se limita às cotas
de patrocínio e espaços para exposição de marcas, é
preciso conhecer a atuação das instituições parceiras
13
para aliar suas imagens a do evento que será por elas
patrocinado.
Essa expansão do mercado de eventos abrange
também a utilização de novas mídias e tecnologias,
as informações sobre o evento precisam ser
disponibilizadas no maior número possível de mídias
que proporcionem não apenas a informação, mas
também a interação do público alvo, convidando-o a
participar da elaboração e avaliação do evento.
Assim como Cesca (1997) defende que o evento é a
execução de um projeto que reúne um determinado
público para a elevação ou manutenção do conceito
que este possui sobre a instituição, destaca-se a
importância de conhecer o público-alvo do evento
e seu poder de influência sobre os demais públicos
indiretamente envolvidos. A opinião trabalhada a
partir de um evento precisa ser avaliada conforme
seu poder de repercussão, e é exatamente por isso,
que o evento é uma ferramenta tão poderosa de
aproximação dos formadores de opinião, não se
limita ao acontecimento pontual.
Nesta etapa é fundamental a definição do público-alvo
e a mensagem que será transmitida, o que em segundo
plano exige ainda uma avaliação detalhada de como
esta informação será recebida e, posteriormente
,repassada por este público. Como eficácia de um
evento se mede pelo seu poder de repercussão,
cabe aí ao organizador estruturar um planejamento
consistente de pré e pós-evento para monitoramento
destes resultados.
Outro aspecto fundamental é a riqueza de detalhes
que compõem um evento, ao trabalhar em parceria
é preciso avaliar se os princípios organizacionais do
parceiro condizem com a mensagem do evento, se
o público participante realmente tem interesse pela
informação principal e se a propagará de maneira
adequada, se a participação dos envolvidos atende
o objetivo inicial do projeto e, principalmente, se a
linguagem utilizada no evento está adequada aos
participantes.
Ao abordar a linguagem do evento temos abertura
para avaliar tudo o que ele comunica a seu público,
desde a comunicação visual, receptividade,
organização, cerimônia de abertura com ou sem
autoridades presentes, serviços oferecidos, espaço
14
para participações e intervenções do público, mídias
utilizadas e muito mais instrumentos que compõem a
mensagem final que do evento.
De acordo com Duarte (2009),
[...] tem vários tipos de Comunicação, às vezes
até o prédio é um elemento de Comunicação,
quando tu viaja por alguns Estados, que são
muito pobres, e vê o prédio da justiça, por
exemplo, todo envidraçado, todo bonito, aquilo
transmite alguma coisa para as pessoas que vêem,
quando tu vê um logotipo, um tipo de pintura
num prédio, até o layout, isso tudo te traduz
uma mensagem, então de um modo geral a
Comunicação ocorre por diversos mecanismos.
Como é um mecanismo de Comunicação,
planejado, tem um conceito, as pessoas
trabalham com ele com uma certa perspectiva,
tu tem uma maneira mais ou menos fácil de
organizar, de localizar, então fica mais clara essa
Comunicação, a Comunicação de um evento, é
até mais óbvia do que a de um prédio, de um
layout ou de um símbolo, porque um símbolo
pode ter sido criado há 10 anos, o prédio também,
é atemporal, um evento não, um evento é feito
por quem está no poder, quem está organizando,
é possível tu pensar em Comunicação a partir
de um evento sim, desde a concepção lógica até
mesmo pelo conteúdo dele e além de ser um
mecanismo de comunicação em si, ele permite
novos mecanismos de comunicação, porque tu
tem um evento que significa alguma coisa, por
exemplo, quando tu faz um evento sobre os Sem
Terra, na verdade tu ta dizendo alguma coisa
com isso, está mostrando a visão que o Governo
tem sobre aquele assunto. Você ta falando dos
Sem Terra, você ta passando uma mensagem, se
tu fizer um evento sobre grandes empresários
de agronegócios tem uma outra mensagem, em
termos de política pública, tem uma mensagem,
o evento em si também tem uma mensagem, as
falas das pessoas, o que é distribuído tem outras
mensagens, tem um conceito geral, uma lógica
geral, mais tem várias mensagens dentro de tudo
isso[...]
Uma avaliação mais detalhada dos componentes de
um evento traduz, exatamente, a mensagem a ser
transmitida, vejamos:
a) comunicação visual: se há ou não uma
logomarca específica para o evento ou o projeto/
assunto abordado; as cores utilizadas no ambiente
induzem comportamentos; se o material
produzido (banners, folders e vídeos) possuem
imagens, e que tipo de imagem é utilizada para
a ocasião; se o formato de montagem do espaço
aproxima ou afasta as pessoas; entre outros
aspectos;
b) receptividade: indica como os organizadores
se preocupam com o público presente. Se há recepcionistas para indicação de acomodações e direcionamento dos percursos; se há ou não sinalização ou equipe de boas vindas; a preocupação dos
organizadores com estacionamento e local com
acesso por transporte público; cuidados com a alimentação na chegada e intervalos para refeições;
preparo para receber convidados com alguma deficiência, e muito mais detalhes traduzem que o
evento quer mostrar aos convidados a importância
da sua presença naquela ocasião;
c) organização: reflete o quanto de preparo
houve para que tudo ocorresse da melhor forma.
Pontualidade, sutileza e discrição simbolizam um
evento bem organizado;
d) cerimônia de abertura: é o marco inicial do
evento, demonstra que o assunto abordado é
de interesse e importância relevantes, por isso
reúne autoridades públicas e institucionais para
formalizarem seu apoio e/ou prestígio. As regras
de cerimonial e protocolo devem ser atentamente
respeitadas durante a abertura de qualquer evento.
3 Considerações finais
A realização de eventos oficiais se adapta às demandas
apresentadas em sua elaboração, neste caso tratamos
como eventos oficiais, todo acontecimento organizado
por um órgão ou instituição pública para propagação
de uma determinada informação ao seu respectivo
público. É fundamental ressaltar, que as diretrizes
para organização e realização destes eventos oficiais
são regidas pela autoridade máxima da instituição
organizadora, ou seja, definições como tipologia,
formato, linguagem, público, mensagem e abordagem
de cada evento são definidos pelo topo hierárquico.
Em situações de realização de eventos é possível
observar as peculiaridades de cada gestor. Podemos
considerar, como sinalizador do impacto político,
que cada um quer causar, externamente, a quantidade
de eventos realizados e a abordagem de cada um
deles, por exemplo, um gestor público que tem maior
enfoque na atuação política com ambições partidárias
demandará eventos bem segmentados, para que
conquiste os mais diversos públicos, são organizadas
desde inaugurações e visitas em regiões periféricas
para tornar tangível o contato com a população
mais carente até a promoção de cafés e almoços com
empresários renomados para fortalecer parcerias.
O estudo aqui apresentado mostra que, independente
das inúmeras novas mídias e estratégias de
comunicação utilizadas para aproximar a população
e formadores de opinião das ações realizadas pelo
governo, a realização de eventos não perde espaço.
O evento oficial é uma ferramenta de aproximação
da instituição governamental para a prestação
de satisfações e divulgação de serviços e ações,
utilizando em grande escala e de forma personalizada
para minimizar impactos e ruídos na comunicação
pública entre gestores e seus respectivos públicos. O
fortalecimento do evento é ainda maior por seu poder
de repercussão e adaptação de linguagem, seja com a
imprensa ou formadores de opinião.
REFERÊNCIAS
ANDRADE, Luís Aureliano G. de. Habitação e poder: da fundação da casa popular ao Banco Nacional da
habitação. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.
CESCA, Cleuza Gertrude Gimenes. Organização de eventos. São Paulo: Summus, 1997.
CIACAGLIA, Maria Cecília. Eventos: como criar, estruturar e captar recursos. São Paulo: Thomson, 2007.
15
DUARTE, Jorge; VERAS, Luciara (Orgs.). Glossário de comunicação pública. Brasília: Casa das Musas, 2006.
DUARTE, Jorge. Jorge Duarte: depoimento [4 ago. 2009]. Entrevistadora: Camila Moreira Fonseca Ferman.
São Paulo, 2009. 1 CD.
KOTLER, Philip. Marketing. São Paulo: Atlas, 1990.
KUNSCH, Margarida M. K. Planejamento de relações públicas na comunicação integrada. São Paulo: Summus, 2003.
LIMA, Gerson Moreira. Muito além do releasemania. In: BARROS FILHO, Clovis de (Org.). Comunicação na
polis: ensaios sobre mídia e política. Rio de Janeiro: Vozes, 2002.
SACHUK, Maria Iolanda; CORRÊA, Tamy Carla. Ferramentas de marketing utilizadas em organização de
eventos: o caso do Paraná Fashion. Revista Gestão & Regionalidade, São Caetano do Sul, v. 23, n. 67, maio/
ago. 2007. p.38-51.
THOMPSON, John B. A nova visibilidade. Tradução de Andrea Limberto. Inglaterra: Matrizes, 2008. p. 1537.
TORQUATO, Gaudêncio. Marketing político e governamental. São Paulo: Summus, 1985.
______. Tratado de comunicação organizacional e política. São Paulo: Pioneira, 2002.
16
Para pensar a metodologia de pesquisa nas
ciências humanas
Thinking research methodology in the humanities
Fernanda Coelho Liberali1
André Ricardo Abbade Liberali2
Resumo
Este artigo apresenta uma breve discussão sobre importantes aspectos metodológicos das pesquisas
em ciências humanas. Aborda essenciais paradigmas de pesquisa, tipos de raciocínio, métodos de
pesquisa, tipos de estudo, tipologias de pesquisa, plano amostral, procedimentos de produção e/ou
coleta, procedimento e técnicas para tratamento de dados e mecanismos para a garantia de validade,
confiabilidade e credibilidade.
Palavras-chave: Metodologia da Pesquisa. Pesquisa Cientifica. Ciências Humanas.
Abstract
This article presents a brief discussion of important methodological aspects of research in the humanities.
Discusses key research paradigms, types of reasoning, research methods, types of study, types of research,
sampling, production procedures and/or collect, process and techniques for data processing and
mechanisms for ensuring validity, reliability and credibility.
Keywords: Research Methodology. Scientific Research. Humanities.
1
Mestre e Doutora em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP.
Graduada em Letras pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Atua como professora do Programa de Estudos Pós-Graduados
em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem da PUC-SP. Desde 2008, é a representante brasileira da International Society for
Cultural and Activity Research (ISCAR). Atua como coordenadora geral do Programa de Extensão Ação Cidadã e diretora do Instituto Ação cidadã. É uma das líderes do Grupo de Pesquisa Linguagem em Atividade no Contexto Escolar e coordenadora do Grupo
de Estudos sobre Educação Bilíngue. Em programas de extensão, ministra e coordena cursos sobre formação de educadores, gestão
escolar, teorias de ensino-aprendizagem, leitura nas diferentes áreas do saber, multiculturalidade, argumentação e cidadania. Atua
também como consultora e assessora para instituições públicas e privadas. Sua pesquisa aborda questões sobre a formação contínua
de educadores com foco na teoria da atividade, na formação crítica e na análise do discurso, com foco na argumentação. É Bolsista
de Produtividade em Pesquisa do CNPq - Nível 2. E-mail: [email protected]
2
Especialista em Administração pela Escola de Administração de Empresas de São Paulo e graduado em Engenharia de Produção
pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ. Funcionário de Carreira da Saint-Gobain Vidros S.A.
17
1 Introdução
A metodologia de pesquisa, segundo Minayo (1993,
p. 16), seria “o caminho do pensamento e a prática
exercida na abordagem da realidade”. Embora
fundamental, a metodologia de uma pesquisa não
pode agir como uma “camisa de força”, mas como
um meio de desenvolvimento do conhecimento. A
escolha metodológica realizada por um pesquisador
não acontece de forma isolada. Conforme aponta
Kuhn (1978), há um conjunto de crenças, modelos,
esquemas de referência, visões de mundo e formas
de trabalhar, reconhecidos por uma comunidade
científica em determinados momentos históricos,
que acabam por nortear a metodologia de pesquisa
adotada, concebidos como paradigmas. Neste artigo,
discutimos alguns aspectos que consideramos
essenciais para uma tomada de decisão dos
pesquisadores no momento de decidir sobre seus
projetos de pesquisa. Essa decisão não pode ser vista
como uma simples escolha de um produto na prateleira
de possibilidades que aqui serão apresentadas, mas
como escolhas políticas e ideologicamente marcadas
que constituirão seu fazer como pesquisador e sujeito
no mundo.
Para a reflexão de pesquisadores preocupados com suas
escolhas de pesquisa, apresentamos alguns aspectos
que consideramos relevantes para uma tomada de
decisão. São eles: paradigmas de pesquisa, tipos de
raciocínio, métodos de pesquisa, tipos de estudo,
tipologias de pesquisa, plano amostral, procedimentos
de produção e/ou coleta, procedimento e técnicas para
tratamento de dados, mecanismos para a garantia
de validade, confiabilidade e credibilidade, alem de
rápidas considerações finais.
2 Paradigmas de Pesquisa
Denomina-se paradigmas na concepção de Kuhn
(1978), como um conjunto de regras implícitas que
regulam aspectos da atividade científica, sendo
determinados por alguns critérios:
a) o que vem a ser um problema digno para se
tornar objeto de uma pesquisa que os cientistas
devem resolver;
b)que tipo de tratamento, de métodos de
observação, descrição, representação formal de
dados que podem ser utilizados em uma pesquisa;
c) que tipo de solução pode haver para o problema.
18
Diferentes áreas lançam mão desses paradigmas
distintos na tentativa de verificarem suas hipóteses,
de obter maior compreensão de seus fenômenos
ou mesmo de transformá-los. Dessa forma, tornase fundamental uma discussão inicial sobre os
diferentes paradigmas que norteiam as pesquisas,
essencialmente, em ciências humanas.
Segundo Bredo e Feinberg (1982), são três os
principais paradigmas nessa área: positivista,
interpretativista e crítico. Segundo os autores, esses
três paradigmas se pautam pelos três principais
interesses humanos, descritos por Habermas (1970
apud BREDO e FEINBERG, 1982) como: o técnico, o
prático e o emancipatório. O interesse técnico procura
entender a realidade empírica e busca maneiras de
controlar o meio através do trabalho, ou seja, do agir
instrumental. Por sua vez, o interesse prático diz
respeito à influência da realidade cultural e histórica
nas relações entre os indivíduos em sua vida social.
Finalmente, o interesse emancipatório, é traduzido
por Habermas como a ligação ou a ponte entre os
saberes teórico e prático em toda a atividade humana,
bem como pela busca de valores éticos.
Pautado nas idéias, o paradigma positivista de pesquisa
enfatiza o interesse técnico como constitutivo do saber
(Bredo e Feinberg, 1982). Ainda dominante, na
maioria das áreas, esse paradigma pressupõe que a
realidade existe por si mesma. Com isso, credita maior
valor à descoberta e à hipótese determinística de que o
mundo é feito de necessidades (Girod-Séville e Perret,
2001), de que todo conhecimento válido ou legitimo é
construído em uma relação de dicotomia entre objeto
e sujeito, isto é, não há relação entre conhecedor e
conhecido, entre sujeito e objeto.
O objeto de conhecimento pode ser estudado como
um sistema fechado, pois os fatos são relacionados e
explicados por leis gerais, que integram um sistema
teórico coerente. O conhecimento gerado nesse
paradigma está aberto às modificações racionais, uma
vez que pode ser testado empiricamente. Há, pois, o
privilégio da explicação que pode confirmar ou refutar
hipóteses que não demostrem uma consistência lógica.
O conhecimento nesse paradigma é desprovido do
sujeito conhecedor (Girod-Séville e Perret,
2001).
Segundo Smircich (1983, apud Girod-Séville
e Perret, 2001), em um paradigma positivista o
mundo social é visto como pré-definido e universal
e as organizações são entendidas como tendo
cultura. Em outras palavras, as organizações seriam
instrumentos sociais que produzem bens e serviços e ,
também, geram um produto secundário (by-product),
tais como: a linguagem, os símbolos, os rituais
e as cerimônias. Esses artefatos culturais seriam
controlados de forma previsível. Nesse sentido, o
interesse técnico seria preponderante, uma vez que
pesquisadores positivistas estariam preocupados em
desenvolver meios de controle e avaliação do meio
social. Sua maior preocupação seriam a eficiência e
a eficácia dos meios para atingir determinados fins,
sendo que esses fins não estariam abertos à crítica ou
à mudança. Há o interesse pelo tipo de conhecimento
que permite a previsão e controle dos eventos
(Liberali, 2002).
Resumindo com as palavras de Minayo (1993, p. 23),
alguns princípios básicos desse paradigma seriam:
a) o mundo social opera de acordo com leis causais;
b) o alicerce da ciência é a observação sensorial;
c) a realidade consiste em estruturas e instituições
identificáveis enquanto dados brutos por um lado
e crenças e valores por outro. Estas duas ordens
se correlacionam para fornecer generalizações e
regularidades;
d) O que é real são os dados brutos;
e) valores e crenças são dados subjetivos que só
podem ser compreendidos através dos primeiros.
Contrastivamente ao positivista, o paradigma
interpretativista preocupa-se com interesses práticos,
isto é, o conhecedor e o conhecido estão em relação
intensa e direta. Os fatos analisados passam a ser
vistos como relativos a um esquema simbólico
particular constituído por um conjunto de termos,
conceitos e rótulos. Nesse paradigma, o conhecimento
é gerado levando-se em conta as convenções que uma
determinada comunidade científica adota e, portanto,
a interpretação torna-se a mola mestra para a pesquisa
(Bredo e Feinberg, 1982). Essa interpretação
seria a tentativa de dar transparência e coerência ao
que anteriormente não tinha. Há uma perspectiva de
que a essência do objeto é múltipla, portanto, o mundo
seria feito de possibilidades (Girod-Séville e
Perret, 2001). A compreensão seria, então, a base
fundamental desse paradigma.
Dessa forma, seria essencial a compreensão de que
“a realidade jamais seria independente da mente ou
da consciência da pessoa que a observa ou testa”
(Girod-Séville e Perret, 2001, p. 16). Segundo
Lincoln e Guba (1985), o conhecimento produzido
nesse paradigma seria subjetivo e contextualizado.
Em outras palavras, o conhecimento é produzido
com base em elementos de referência definidos pelos
pesquisadores.
Nesse enfoque interpretativista, a visão do mundo
social estaria pautada por critérios emergentes e
específicos, determinados por relações simbólicas
sustentadas por processos contínuos de interação
humana (Smircich,1983 apud Girod-Séville
e Perret, 2001). Nesse contexto, as organizações
seriam a própria cultura, ou seja, as organizações
seriam formas expressivas ou manifestações da
consciência humana e a linguagem, os símbolos, os
mitos, os rituais seriam processos que constituiriam a
própria existência das organizações – seriam, portanto,
as próprias organizações. A pesquisa realizada dentro
de um paradigma interpretativista teria como função
essencial a possibilidade de encontrar os sentidos
dados à realidade pelos agentes, e não controlar essa
realidade, preocupação esta típica do paradigma
positivista.
Partindo de uma raiz filosófica alemã centrada nas
idéias de Marx e Hegel e, mais recentemente, nas
contribuições de Jürgen Habermas, o paradigma
crítico de construção do saber engloba interesses
técnicos, práticos e emancipatórios. Avalia tanto
as contribuições de pesquisas positivistas e,
principalmente, de pesquisas interpretativistas,
numa tentativa de sintetizá-las na compreensão
e transformação do conhecimento no contexto
da evolução social da humanidade (Bredo e
Feinberg, 1982). Para os teóricos críticos, o
conhecimento é visto dentro de contextos constitutivos
do individuo e como uma possível contribuição para
a evolução social, entendida em termos de progressão
material e emancipação simbólica de todos os
envolvidos no processo de pesquisa.
Essa perspectiva coloca o conhecimento dentro
de um desenvolvimento histórico e social, que
aponta potenciais repressivos e/ou emancipatórios
do próprio pesquisar. Nessa perspectiva, a relação
entre conhecedor e conhecido torna-se muito mais
estreita, ao ponto de um influenciar o crescimento
19
e desenvolvimento do outro. O pesquisador torna-se,
assim, um agente de mudanças ou um reforçador do
status quo. Segundo Girod-Séville e Perret (2001), em
uma perspectiva que se denomina construtivista, a
compreensão da realidade contribui para a construção
dessa realidade, ou seja, a realidade é construída pelo
ato de conhecer e não apresentada a uma percepção
objetiva.
Alguns aspectos essenciais para a compreensão do
paradigma crítico de pesquisa seriam:
a) entendimento e aplicação como um ato único;
b) estabelecimento de comunidade dialógica;
c) pesquisa não sobre, mas em, para e com;
d) percepção do pesquisador como participante no
ato de manter ou reconstruir o mundo social;
e)pesquisador e participante em relação de
reciprocidade;
f)pesquisa como propiciadora de movimentos
contrários a relações opressivas de qualquer
natureza e em direção a relações mais igualitárias
e democráticas – desenvolvimento de alternativas
para os envolvidos na pesquisa;
g)orientação para a transformação das condições
sociais das minorias e de participantes em posição
de desvantagem;
h)pesquisa com valor educativo – impulsiona
todos a verem o mundo de uma outra forma.
Esses três paradigmas criam as bases para a
compreensão dos fenômenos que se quer pesquisar.
A partir deles, estabelecem-se formas de organizar o
pensamento para a busca dos objetivos da pesquisa.
Nesse sentido, faz-se necessário considerar a forma
como o raciocínio se organiza para a compreensão da
realidade.
3 Tipos de Raciocínio
No estudo da lógica, dois são os métodos mais
frequentemente utilizados: o raciocínio dedutivo
e o raciocínio indutivo. Para buscar um melhor
entendimento sobre o tema, torna-se fundamental
compreender as diferentes posições apresentadas por
alguns autores.
Segundo Trochim (2002), o raciocínio dedutivo parte
do mais genérico para o mais específico (abordagem
de cima para baixo) e o indutivo move-se de
observações específicas para amplas generalizações e
20
teorias (abordagem de baixo para cima). No dedutivo,
começa-se com uma teoria pensada sobre o tópico
a ser analisado; elaboram-se, então, específicas
hipóteses para testar a teoria; parte-se para a coleta
de observações que remeta às hipóteses; finalmente,
confronta-se a validade da teoria original pelo
teste das hipóteses, que podem confirmá-la ou não.
Já o indutivo começa com a detecção de padrões
ou regularidades para as observações específicas
coletadas; parte-se para a formulação de hipóteses
que possam ser exploradas e, finalmente, chega-se ao
desenvolvimento de conclusões gerais ou mesmo de
teorias. A maioria das pesquisas envolve os dois tipos
de raciocínios em alguma parte da pesquisa.
A validade do raciocínio dedutivo, na visão de Copi
(1978), baseia-se no fato de que suas premissas,
se verdadeiras, provam as conclusões. Assim, o
raciocínio dedutivo pode ser classificado como
válido ou inválido. No que concerne ao raciocínio
indutivo, o autor afirma que, a partir da análise de
suas premissas, há algumas evidências para chegar à
conclusão proposta. Logo, a classificação do raciocínio
indutivo pode ser dada como melhor ou pior quanto
ao grau de que as premissas suportem as conclusões.
Por sua vez, Severino (2000) apresenta o raciocínio
como uma forma de obtenção de conhecimento a
partir de um anterior já existente. Assim, o raciocínio
tem duas fases: a antecedente – em que já existe
conhecimento – e a conseqüente – em que se obtém
o novo conhecimento. Assim, forma-se o construto
do raciocínio dedutivo como aquele que possui, na
fase antecedente, princípios universais já previamente
aceitos e na fase consequente, é obtida a conclusão
usando-os. Já o construto indutivo é aquele que
possui, na fase antecedente, observações específicas,
dados ou outros fatos e, na fase conseqüente, elaborase uma afirmação mais abrangente que pode ser uma
lei, norma, regra ou mesmo um princípio universal.
O autor cita como os dois exemplos clássicos de
raciocínio dedutivo, os silogismos (da lógica formal
clássica ou aristotélica) e as formas de explicação
científica de estrutura (da lógica simbólica moderna)
e como exemplo clássico de raciocínio indutivo é
apresentada a analogia.
Para Demo (1987), a indução é o método que aceita
a generalização somente com a apresentação de casos
concretos que o suportem. A dedução é entendida
como o método que parte de um pressuposto teórico
para confrontar os casos particulares. As principais
críticas à forma dedutiva devem-se ao fato de ser
apriorística – gratuitamente ou dogmaticamente
– e de ser tautológica – é porque é. Na indução, as
principais críticas relacionam-se ao seu simplismo –
muitas vezes a realidade não ocorre na superfície que
é observável e o que importa ou que se procura nem
sempre está na parte observável – e à sua limitação
na descrição empírica, dificultando a avaliação dos
elementos significativos e a sua relevância.
A distinção entre a lógica dedutiva da indutiva
para Carraher (1983), ocorre pela necessidade das
conclusões. A dedução é construída a partir de
premissas, que, caso sejam aceitas como verdadeiras,
suas conclusões necessariamente também serão.
A indução, no entanto, utiliza argumentos cuja
conclusão é possível, provável ou plausível, mas não
necessária.
Köche (1997) critica a validação do método indutiva
pelo fato de não poder inferir os resultados das
observações para todo o universo, não possibilitando,
portanto, confirmar, testar ou comprovar uma
hipótese como verdadeira. Alicerça, também, suas
críticas no fato das premissas usadas na indução não
poderem ser transpostas para a conclusão. O autor
suporta o método dedutivo e sugere o uso de teoria:
para fundamentação das hipóteses e para criação e
determinação de categorias de análise e de métodos e
técnicas de pesquisa.
A partir da definição da forma de pensar sobre a
pesquisa e de acordo com os contextos mais específicos
de ação dos pesquisadores são necessários métodos
que permitam o tratamento adequado dos dados.
4 Métodos de Pesquisa
No desenvolvimento de uma pesquisa, três métodos
são, essencialmente, significativos para a organização
da coleta e análise dos dados: quantitativo, qualitativo
e dialético (Minayo, 1993).
Surgindo como uma das principais influências
do positivismo nas ciências humanas, o método
quantitativo teve como foco a utilização da
matemática para a compreensão dos fenômenos
sociais. Consequentemente, houve uma apropriação
da linguagem de variáveis para especificar atributos e
qualidades do objeto de investigação. A padronização,
própria do paradigma positivista, pressupunha o uso
de instrumentos que fossem pretensamente neutros.
Nesse sentido, a linguagem matemática passou a servir
de base para análise precisa e objetiva da realidade.
O método qualitativo, por outro lado, trabalha
com o universo dos significados, dos motivos, das
aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes
que não podem ser reduzidos à operacionalização
de variáveis (Minayo, 1993). Esse método ocupase, principalmente, do estudo dos significados das
ações e das relações humanas. Nascido no berço das
ciências sociais, esse método apareceu contrapondose à visão quantificadora da realidade. Tendo como
base pesquisas de cunho interpretativistas, o foco
do método qualitativo era perceber a realidade a
partir dos significados, portanto, a subjetividade
passa ser o fundamento do sentido da vida social. Os
pesquisadores não mais quantificam, mas focalizam
sua atenção na compreensão e explicação das
relações sociais explicitadas na vivência, experiência,
cotidianidade das ações humanas em relação estreita
com a compreensão das estruturas e instituições que
a compõem (Minayo, 1993).
O método dialético, segundo Minayo (1993, p.
23), seria uma tentativa de correlacionar esses dois
métodos anteriores, unificando o estudo quantificado
da realidade ao qualitativo. Assim, nesse método, a
relação de quantidade seria uma das qualidades dos
fatos e fenômenos e serviria à compreensão e à relação
com o todo. Segundo Pereira (1999), com base em
Greenhalgh e Taylor (1997 apud Pereira, 1999), o
método quantitativo de análise serve para mostrar
padrões que emergem na própria análise qualitativa.
Essa é uma das razões para que Pereira (1999, p. v22),
considere extemporânea e inapropriada a oposição
entre esses métodos.
5 Tipos de Estudo
Para realizar-se, a pesquisa necessita de um estudo,
ou seja, uma reflexão profunda sobre algum tipo de
fenômeno, situação, caso, problema. Esse estudo se
realiza por meio de distintos procedimentos. Segundo
Grenier e Josserand (2001) dois são os possíveis tipos
de estudo de um fenômeno: de conteúdo ou de
processo. O estudo do conteúdo seria a investigação
21
de sua composição, enquanto o estudo de seu processo
pressupõe a tentativa de explicar o comportamento de
um fenômeno no fluxo de tempo, sua evolução.
5.1 Estudo Baseado em Conteúdo
O estudo baseado em conteúdo revela a existência e
co-existência de certo número de elementos, não sua
evolução (Grenier e Josserand, 2001). Dois são
os tipos essenciais de estudos com base em conteúdo:
descritivo e explicativo.
O estudo descritivo é caracterizado pela ausência de
manipulação do pesquisador no objeto pesquisado
e se realiza quando há interesse de descrever as
características de um fenômeno (Grenier e
Josserand, 2001 e Richardson, 1989, p.
26). De acordo com Barros e Lehfeld (1986:), a
pesquisa descritiva é aquela em que o “pesquisador
observa, registra, analisa e correlaciona os fatos ou
fenômenos (variáveis) sem manipulá-los”. Não há,
portanto, nenhum tipo de interferência por parte do
pesquisador, uma vez que “seu objetivo é conhecer e
analisar as principais contribuições teóricas existentes
sobre um determinado problema” (Koche, 1997, p.
122).
“O estudo descritivo não tem preocupação com
a transformação do fenômeno ou população que
estuda. Seu foco está na exposição das características
dessa população ou fenômeno” (Vergara, 1998,
p. 45). Como apontam Rizzini, Castro e Sartor (1999,
p. 29), “a pesquisa descritiva procura determinar a
natureza e a intensidade de dado fenômeno”.
Esse tipo de estudo pode ser desenvolvido, de
acordo com Triviños (1987, p.110), para “descrever
com exatidão os fatos e fenômenos de determinada
realidade”. Assim, são necessárias diversas
informações prévias sobre o objeto de pesquisa.
Segundo Collado, Lucio e Sampieri (1998), os estudos
descritivos medem, de forma mais independente, as
variáveis a que se referem e requerem consideráveis
conhecimentos da área pesquisada, para se formular
perguntas específicas às respostas procuradas.Tais
estudos podem oferecer a possibilidade de previsões,
ainda, que rudimentares.
No estudo descritivo é possível desenvolver duas
formas de atuação: decomposição em partes e
22
apreensão global por identificação. A decomposição
do objeto de conhecimento em diferentes partes segue
o processo cartesiano clássico por meio da quebra da
estrutura em diferentes subunidades.
O segundo tipo é constituído pela apreensão global
por identificação entre os objetos. Em outras palavras,
a identificação entre as partes do objeto serve para
mostrar a interdependência dos elementos, ou
seja, para mostrar que o conjunto das partes é mais
importante do que as partes em separado. Nesse tipo
de estudo, os pesquisadores adotam duas abordagens
fundamentais: taxonomia e tipologia (Grenier e
Josserand, 2001).
A taxonomia usa dados empíricos para estabelecer
configurações. Através de técnicas estatísticas
desenvolve classificações e estruturações que
permitem uma melhor visão da situação estudada.
A tipologia não surge de dados empíricos, mas se
estrutura a partir de pesquisas já existentes e de
conhecimentos acumulados pelo pesquisador.
Os estudos explicativos ou causais de conteúdos
são desenvolvidos quando há interesse na análise
de crenças ou conseqüências de um fenômeno
(Richardson,1989, p. 26). Seu objetivo é mostrar
e explicar as ligações causais entre variáveis que
compõem um objeto (Grenier e Josserand,
2001). Segundo Collado, Lucio e Sampieri (1998),
os estudos explicativos são dirigidos a responder
as causas de eventos físicos ou sociais. Estes estudos
são mais estruturados que os demais e proporcionam
um sentido de entendimento do fenômeno que fazem
referência.
Além disso, esse tipo de investigação explicativa
tem como principal objetivo tornar algo inteligível,
justificar-lhe os motivos. Vergara (1988, p. 45)
salienta que esse estudo “visa, portanto, esclarecer
quais fatores contribuem, de alguma forma, para a
ocorrência de determinado fenômeno”.
Essa pesquisa utiliza a abordagem hipotético-dedutiva
combinada com métodos quantitativos (Grenier e
Josserand, 2001), que pressupõem certo número de
hipóteses formuladas em relação às ligações causais
entre variáveis. A abordagem quantitativa ligada
à hipotético-dedutiva objetiva desenvolver uma
validade externa maior e encorajar o acúmulo de
conhecimento.
5.2 Estudo Baseado em Processo
O estudo baseado em processo preocupa-se com a
revelação de como as variáveis evoluem no tempo.
Tem como objetivo descrever e analisar esse processo
evolutivo (Grenier e Josserand, 2001). Permite,
ainda, a identificação e articulação de sequências,
ciclos, fases que serão nomeados como forma de
explicar o processo. São dois os tipos de estudos dessa
natureza: descritivos e explanatórios.
Os estudos descritivos de processo, como os de
conteúdo apresentados acima, ocupam-se da
descrição dos elementos do processo. São três os seus
aspectos principais (Grenier e Josserand, 2001): a)
descrição temporal profunda dos objetos em estudo;
b) descrição do processo propriamente dito; c)
comparação entre dois ou mais processos.
O objetivo dos estudos explicativos de processos é
explicar um fenômeno observado. Em outras palavras,
envolve a explicação de como variáveis evoluem
através do tempo.
Além desses dois tipos de pesquisa voltados para
conteúdo e processo, é possível verificar, ainda,
outro tipo de estudo bastante difundido nas ciências
humanas: os estudos exploratórios.
caracterização qualitativa e quantitativa nos casos em
que não há disponibilidade de teorias e conhecimentos
sobre um assunto. Seu objeto principal é a descrição
ou caracterização das variáveis envolvidas no assunto
a ser conhecido.
Esses estudos exploratórios propõem-se a familiarizar
o pesquisador com fenômenos relativamente
desconhecidos, a realizar um estudo mais completo
sobre determinado assunto da vida real, investigar
problemas de comportamento humano pertinentes
para determinada área, identificar conceitos ou
variáveis importantes e definir prioridades para
pesquisas futuras ou definir sentenças a serem
confirmadas (Collado, Lucio e Sampieri,
1998). Em poucas situações não ocorrem outras
pesquisas a partir desses estudos.
6 Tipologias de Pesquisa
As pesquisas podem ser classificadas segundo a forma
tipológica como são conduzidas. Segundo Royer e
Zarlowski (2001), esse desenho tipológico é a estrutura
através da qual os vários componentes do projeto de
pesquisa se reúnem (questão de pesquisa, revisão
literária, dados, análise e resultados). Nesta seção,
serão abordadas algumas das principais tipologias de
pesquisa em ciências humanas.
6.1 Grounded Theory
“Os estudos exploratórios organizam-se quando não
há informação sobre o tema e deseja-se conhecêlo” (Richardson, 1989, p. 26). Esses estudos são
usados para obtenção de maiores conhecimentos,
delimitação de uma ampla teoria, desenvolvimento de
instrumentos e levantamento de possíveis problemas
de pesquisa. Para êxito do estudo são fundamentais
alguns cuidados como a revisão da literatura, a
elaboração de entrevistas e o uso de questionários,
seguindo os padrões inerentes a um trabalho
científico.
A Grounded Theory tem como objetivo construir
uma teoria explanatória sobre um fenômeno social
baseada na identificação de regularidades (Royer
e Zarlowski, 2001). O método se realiza pelos
estudos de múltiplos casos que tenham como base
dados coletados através de entrevistas e/ou de outros
instrumentos, tais como o uso de material escrito e
observação. A análise realiza-se de forma qualitativa
com uso adicional de análise quantitativa.
Para Vergara (1998, p. 45), “a investigação exploratória
é realizada em área na qual há pouco conhecimento
acumulado e sistematizado. Por sua natureza de
sondagem não comporta hipóteses, que, todavia
poderão surgir durante ou ao final da pesquisa”.
Köche (1997) explica que a pesquisa exploratória
trabalha com o levantamento das variáveis e a sua
A Pesquisa Etnografia objetiva descrever, explicar
e entender um fenômeno social particular no seu
ambiente (Royer e Zarlowski, 2001). A etnografia
busca descrever um conjunto de compreensões
e conhecimentos específicos compartilhados por
um grupo de participantes. Esse conjunto ordena
seu comportamento em contextos específicos, o
6.2 Pesquisa Etnografia
23
que designa sua cultura, isto é, o foco dos estudos
etnográficos. Na etnografia, os dados são coletados
através de contínua observação do fenômeno em seu
contexto. Nesse desenho, os métodos de análise são
essencialmente qualitativos.
experimento; 6) Apresentação dos dados; 7) Provas
de significância; 8) Análise e interpretação dos resultados; 9) Conclusões.
6.3 Estudos Experimentais
O Estudo de Caso é um estudo “intensivo, exaustivo e
profundo” (Rizzini, Castro e Sartor,1999, p. 29) sobre
um evento, indivíduo, instituição ou comunidade.
Para Vergara (1998), esse tipo de estudo busca
profundidade e detalhamento, sendo, normalmente,
restrita a um grupo específico como, por exemplo,
uma família, uma empresa, um produto.
Os Estudos Experimentais foram apoiados,
principalmente, pelo positivismo. A pesquisa
experimental envolve a manipulação da quantidade
e qualidade das variáveis (fatores) associadas a um
determinado fenômeno para identificar relações
de causa e efeito entre elas (Köche, 1997). Tal
pesquisa é caracterizada pela prévia manipulação das
variáveis independentes e o controle das variáveis
neutralizadas. Caso haja numa pesquisa mais de duas
variáveis independentes ela é denominada pesquisa
de delineamento fatorial. Para Vergara (1998, p.
31), essa pesquisa “permite observar e analisar um
fenômeno sob condições determinadas”. Nesse tipo
de pesquisa, o investigador manipula uma variável
(independente), objetivando observar as variações
produzidas em outra variável (dependente).
Esses estudos necessitam de um adequado
planejamento. Inicia-se com a formulação do
problema e de hipóteses, permitindo, assim, uma
delimitação das variáveis que agem sobre o fenômeno
a ser estudado. Parte-se para identificação de uma
forma de controle das variáveis e para a seleção
aleatória da amostra para formação do grupo de
controle e do grupo experimental. Elaboram-se,
então, instrumentos de coleta de dados que devem ser
testados para verificar a sua eficácia. Define-se e atestase a hipótese nula, iniciando-se, então, o experimento.
Verifica-se o efeito na variável dependente causada
pela manipulação da variável independente. Para
testar sua validade deve-se questionar duas situações:
se não existe alguma outra variável no fenômeno que
esteja influenciando a variável dependente e se os
resultados obtidos podem ser generalizados para toda
a população.
Resumidamente, uma investigação experimental realiza-se a partir das seguintes etapas (Marinho,
1981 apud Barros e Lehfeld, 1986, p. 94): 1) Investigação e definição do problema em estudo; 2) Literatura sobre o problema; 3) Elaboração de hipóteses;
4) Definição do plano experimental; 5) Realização do
24
6.4 Estudo de Caso
Segundo Goode e Hatt (1969), o estudo de caso
baseia-se na análise qualitativa, possível de ser
mais eficientemente empregado na pesquisa social.
Embora, essencialmente qualitativo, o estudo de caso
pode utilizar-se de quantificações que permitirão
uma melhor percepção dos resultados.
Stake (1987) esclarece que o estudo de caso não é
propriamente uma escolha metodológica, mas uma
escolha de um objeto a ser estudado. O foco essencial
do estudo está no interesse pelo caso único e particular
que deve ser bem delimitado por características
específicas, ou seja, cada estudo concentra sua
investigação em um único caso, que deve ser estudado
em seu contexto natural. “O foco central não está na
preocupação com a posterior generalização, mas com
possíveis comparações entre semelhanças e diferenças
com outros casos” (Rizzini, Castro e Sartor,
1999, p. 29). Esse fato não indica que o estudo de
caso não seja válido, ao contrário, os estudos de
caso permitem aos leitores uma experiência vicária
do contexto investigado, assim como dos resultados
obtidos, que contribuem para a construção social do
conhecimento (Stake, 1987, p. 95).
6.5 Pesquisa Bibliográfica
A Pesquisa Bibliográfica consiste, segundo Köche
(1997), na explicação de um problema baseada no
conhecimento disponível pelas teorias encontradas
em material impresso. De acordo com Barros
e Lehfeld (1986), a pesquisa documental e/ou
bibliográfica é aquela advinda de material gráfico ou
sonoro e objetiva recolher, analisar e interpretar as
contribuições teóricas já existentes sobre determinado
fato, assunto ou idéia, antecedendo, normalmente,
a pesquisa de campo. Os dados são colhidos através
de registros, anais, regulamentos, circulares, ofícios,
memorandos, balancetes, comunicações informais,
filmes, fotografias, vídeo-tapes, disquetes, diários e
outros afins (Vergara, 1998).
Para Richardson (1989), a pesquisa documental ou
bibliográfica visa resolver um problema ou adquirir
mais conhecimento sobre um tema a partir de pesquisa
em material já existente. Assim, pode-se coletar,
analisar e interpretar o que já foi produzido sobre o
tema, que, geralmente, ocorre antes da pesquisa de
campo ou exploratória, conferindo ao pesquisador
condições para formular e delimitar o seu problema
de pesquisa.
Por sua essencialidade, essa investigação pode preceder
qualquer outro tipo de pesquisa, possibilitando o seu
uso para aumentar conhecimentos de determinada
área, delimitar um problema de pesquisa, fundamentar
a construção de um modelo teórico para explicar um
problema ou para desenvolver hipóteses e, finalmente,
descrever ou sistematizar o que melhor tiver sobre o
problema (Köche, 1997).
6.6 Pesquisa-Ação
A Pesquisa-Ação objetiva a investigação autoreflexiva realizada pelos próprios participantes, tendo
como meta compreender e melhorar suas práticas
e transmitir conhecimento a outros praticantes
(Cavalcanti e Moita Lopes, 1991). Nesse
sentido, há uma relação de cooperação ou participação
entre o(s) pesquisador (es) e o(s) participante(s)
da situação para resolução ou esclarecimento, em
conjunto, de um problema. O pesquisador exerce uma
importante função, desencadeando ações no grupo
que permitem a solução do problema, objetivando
aumentar o seu conhecimento e o grau de consciência
do grupo envolvido.
Vergara (1998) esclarece, ainda, que esse tipo de
pesquisa tem como base a investigação de finalidade
intervencionista, que pressupõe uma interferência do
pesquisador na realidade social. Para Barros e Lehfeld
(1986, p. 93),
os pesquisadores desempenham um papel ativo no
equacionamento dos problemas encontrados[...]a
participação dos pesquisadores é explícita dentro da
situação de investigação com os cuidados necessários
para que a ação aseja conjunta com os grupos
implicados nessa situação.
Além disso, Kincheloe (1997, p. 195), ao discutir a
pesquisa-ação em uma perspectiva crítica, “defende
que ela fornece um veículo para descobrir e analisar
os sentidos que os participantes depreendem das
experiências vividas”. De posse desse conhecimento,
o pesquisador-praticante pode tomar decisões que
busquem atender às necessidades do contexto.
6.7 Pesquisa Colaborativa/ Intervencionista
A Pesquisa Colaborativa/ Intervencionista envolve o
processo conjunto de investigação da ação que visa à
apreensão, análise e crítica de contextos de ação com
vistas à sua transformação. Nesse tipo de pesquisa,
segundo Cole e Knowles (1993), diferentes aspectos
do processo são pensados de forma conjunta: o
planejamento e a preparação da pesquisa, a coleta de
informações, a análise e a interpretação dos dados, o
relato e o uso das descobertas de pesquisa.
Vergara (1998) esclarece que tal pesquisa tem como
principal característica e objetivo a interferência do
pesquisador junto ao contexto de pesquisa, não só no
que se refere ao processo investigativo, mas, também,
quando o mesmo busca alterar a realidade.
Conforme salienta Magalhães (1994, p. 72), dentro
dessa visão,
o papel do pesquisador não é o de um
observador passivo que procura entender o
outro. O papel do outro, também, não é o de
ser entendido pelo pesquisador. Ambos são
vistos como co-participantes ativos e sujeitos
no ato de construção e de transformação do
conhecimento.
Dessa forma, o objetivo da pesquisa colaborativa é
permitir que todos os participantes negociem suas
agendas na construção do conhecimento e reflitam
durante e sobre ações diárias.
Segundo Liberali (2010), uma proposta emancipatória
de pesquisa passa pelo interesse dos pesquisadores
em um trabalho colaborativo junto aos praticantes e à
comunidade. Visa, assim, a entender seus problemas
e interpretá-los, unindo teoria formal e prática. Fazse necessária, para tanto, uma postura política de
abertura que considere quais projetos desenvolver e
como envolver os praticantes no exercício da pesquisa.
Lançar mão de uma metodologia de base colaborativa
25
tem por objetivo transformar em conjunto a situação,
o participante e o pesquisador.
6.8 Pesquisa de Campo
Na Pesquisa de Campo, o pesquisador exerce as
funções de observador e explorador e não a de
mero coletor de dados, recolhendo-os diretamente
no campo em que ocorreram os fenômenos. Para
tanto, utiliza técnicas como questionários, entrevistas
e observação (participante ou não-participante).
Devem fazer parte do anteprojeto de pesquisa os
procedimentos metodológicos adotados para a
realização da pesquisa de campo. Para Vergara
(1998), trata-se da investigação empírica (entrevistas,
questionários, testes) realizada no local onde ocorre o
fenômeno ou que dispõe de elementos para explicálo.
6.9 Pesquisa Ex Post Facto
De acordo com Vergara (1998), na Pesquisa Ex Post
Facto as variáveis não são manipuladas, visto que o
fenômeno já ocorreu ou as mesmas não podem ser
controladas.
7 Plano Amostral
Amostras são conjuntos de indivíduos selecionados
dentro de uma população que se objetiva investigar,
isto é, a população a ser investigada (Rizzini,
Castro e Sartor, 1999). Segundo Mattar
(1999), a idéia básica de medir uma amostra é obter
informações que representem o resultado de toda
a população. A amostragem está baseada em duas
premissas: de similaridade entre os elementos de uma
população e de discrepância entre os valores das
variáveis da população.
Para o planejamento de uma amostragem alguns
aspectos devem ser seguidos (Malhotra, 2001, p. 302):
1 – definir a população;
2 – determinar o Arcabouço Amostral;
3 – escolher a(s) Técnica(s) Amostral(ais);
4 – determinar o Tamanho da Amostra;
5 – executar o Processo de Amostragem.
A definição da população alvo é compreendida por
Malhotra (2001, p. 302) como a definição da “coleção
de elementos ou objetos que possuem a informação
procurada pelo pesquisador e sobre os quais devem
26
ser feitas inferências”. Essa população alvo deve
ser definida com precisão, pois a sua indefinição
pode resultar em uma pesquisa ineficiente e até
desorientadora. Um arcabouço amostral (Malhotra,
2001, p. 302) é uma representação dos elementos da
população alvo, que consiste de uma lista ou conjunto
de instruções que definem a população alvo. Royer e
Zarlowski (2001) e Malhotra (2001, p. 305) apontam
técnicas de amostragem por:
a) probabilística é o tipo em que os elementos
do universo têm a mesma chance de serem
escolhidos (Barros e Lehfeld, 1986), envolvendo
a seleção de elementos aleatoriamente. Segundo
Malhotra (2001, p. 305), uma amostragem
não probabilística, é “técnica de amostragem
que não utiliza seleção aleatória, ao contrário,
confia no julgamento pessoal do pesquisador”.
Já a amostragem probabilística, segundo o autor,
garante que cada elemento tenha uma chance
fixa de ser incluído na amostra.;
b)conveniência privilegia a conveniência do
investigador, é a que menos tempo consome e
a menos dispendiosa, não são representativas e
não permitem generalizações;
c) julgamento é uma forma de amostragem
por conveniência em que os elementos são
selecionados com base no julgamento do
pesquisador;
d)quotas é uma técnica de amostragem nãoprobabilística que envolve dois estágios: no
primeiro, desenvolvem-se categorias ou quotas
de controle da população e, no segundo,
selecionam-se os elementos da amostra com
base na conveniência ou no julgamento.
A determinação do tamanho da amostra relaciona-se
ao número de elementos a serem incluídos no estudo
(Malhotra, 2001 e Royer e Zarlowski, 2001) envolve
aspectos qualitativos e quantitativos. Malhotra (2001)
aponta que os fatores qualitativos mais importantes
são: importância da decisão, a natureza da pesquisa,
o aumento de variáveis, a natureza da análise, os
tamanhos amostrais utilizados em estudos similares,
as taxas de incidência, as taxas de preenchimento e as
restrições de recursos. Os fatores quantitativos para a
determinação do tamanho da amostra baseiam-se na
inferência estatística e o nível de precisão é especificado
antecipadamente. Essa abordagem fundamenta-se na
construção de intervalos de confiança em torno de
médias ou proporções amostrais.
A execução do processo de amostragem exige “uma
especificação detalhada de como as decisões sobre o
planejamento da amostragem serão implementadas”
(Malhotra , 2001, p. 304). Devem ser dadas
informações detalhadas para todas as decisões de
planejamento amostral.
8 Procedimentos de Produção3 e/ ou
Coleta de Dados
A escolha dos instrumentos de produção e/ou coleta
adequados pressupõe uma compreensão do método e
tipo de pesquisa adotada. Os instrumentos necessitam
estar em sintonia com os objetivos da pesquisa para
que seja possível a realização do tipo de pesquisa
desejado. Para que os dados produzidos/coletados
sejam compatíveis com as questões feitas, é preciso
uma escolha de instrumental de coleta minuciosa e
de alta qualidade (Rizzini, Castro e Sartor,
1999). A percepção dos diferentes instrumentos de
pesquisas torna-se uma questão fundamental ao
considerar-se o material que será necessário para a
compreensão do problema pesquisado.
Segundo Mattar (1999, p. 16),
o planejamento das operações de coleta de dados
engloba o cronograma de atividades com os
tempos das operações, sequência de atividades e
responsáveis; o orçamento de despesas e de saídas
de caixa com a previsão dos gastos envolvidos; a
administração dos recursos humanos necessários
com a contratação e treinamento do pessoal e o
controle das atividades planejadas.
Nesse sentido, é essencial considerar, em primeiro
lugar, dois tipos de documentos: as fontes primárias
e as fontes secundárias (Oliveira, 2001). As
fontes primárias podem ser: dados históricos; fitas
gravadas; peças de artes; dados bibliográficos e
estatísticos; arquivos oficiais e particulares; registros
em geral; documentação pessoal (diários, memoriais,
autobiografias); correspondência pública, etc. Já os
dados secundários são livros, revistas e jornais.
Alguns métodos de coleta de dados comuns na área são
observação participante, entrevista e questionários.
Na observação participante é possível ao pesquisador
inserir-se no contexto da pesquisa e observar de perto
as atividades das pessoas, as características físicas e
sociais da situação e a sensação dos participantes
do evento observado. Na observação participante,
o pesquisador estabelece focos de observação que o
levarão a uma observação mais seletiva. Esse processo
caracteriza, essencialmente, a progressão no ato de
pesquisa etnográfica (Spradley, 1980).
As entrevistas consistem em uma conversa intencional
utilizada quando se quer fundamentalmente
aprofundar as informações oferecidas. Podem ser de
três tipos (Rizzini, Castro e Sartor, 1999):
1. Entrevista dirigida ou padronizada, que se organiza a partir de um questionário sobre um tema
específico sobre o qual o entrevistado apresentará
respostas fechadas;
2. Entrevista semidirigida ou semi-estruturada,
aplicada a partir de um pequeno número de
questões que facilitam a sistematização. No entanto,
muitas outras questões podem ser formuladas
durante o processo da entrevista e freqüentemente
ser utilizada;
3. Entrevista não-dirigida ou não-diretiva, que se
organiza como uma entrevista aberta que vai se
delineando a medida que a entrevista prossegue. O
entrevistador possui um roteiro que servirá de base
para a exploração do tema, porém, os rumos do
diálogo serão traçados no processo da entrevista
por ambos, entrevistador e entrevistado.
Segundo Malhotra (2001), alguns passos precisam ser
levados em conta para que uma entrevista seja bem
sucedida:
a) registrar as perguntas durante a entrevista;
b) utilizar as palavras próprias do entrevistado;
c) não resumir nem parafrasear as respostas;
d) incluir tudo o que diga respeito aos objetivos da
pergunta;
e) incluir todas as sondagens e comentários;
f) repetir a pergunta ao escrevê-la.
O questionário é o documento em que as perguntas e
questionamentos serão apresentados ao respondente e
onde serão registrados as respostas e os dados. Pode ser
formado por cinco partes: 1) dados de identificação,
2) solicitação para cooperação, 3) instruções para sua
utilização, 4) as perguntas, questões e as formas de
3 Entendemos que pesquisas de cunho intervencionista, colaborativo e critico não se prestam apenas a simples coleta de dados, mas
incluem também, a atuação ativa e efetiva do pesquisador na produção da atividade em foco.
27
registrar as respostas, e 5) dados para classificar sócio
economicamente o respondente.
Diferentes tipos de perguntas podem ser aplicados
num questionário de acordo com o grau de “abertura”
das questões propostas:
1 - Perguntas com respostas abertas - as repostas
são constituídas a partir de falas e opiniões dos
entrevistados (Rizzini, Castro e Sartor, 1999).
As vantagens desse procedimento são o maior
conteúdo das respostas, a menor influência sobre
os respondentes do que em perguntas fechadas,
a possibilidade de ser uma primeira questão para
um tópico que será explorado com perguntas com
respostas fechadas e o menor tempo de preparação
exigido. Por outro lado, esse tipo de questionário
obriga uma grande disponibilidade de tempo e custo
para codificação das respostas. Ainda, permitem
que os entrevistadores distorçam o conteúdo das
respostas e possibilita que as pessoas sintam-se
menos propensas a escrever respostas com conteúdo
importante. Esse tipo de pergunta é muito utilizado
em pesquisas exploratórias ou para esclarecer dados
obtidos em perguntas com respostas fechadas.
2 – Perguntas com respostas fechadas - esse tipo
de questionário confere alto grau de objetividade à
pesquisa (Rizzini, Castro e Sartor, 1999).
Mattar (1999, p. 230) prevê dois tipos de respostas
fechadas: dicotômicas, em que possuem apenas
duas opções para a resposta – sim ou não; múltipla
escolha, onde são feitas escolhas entre as opções
oferecidas. Esses dois tipos de questões têm como
vantagens: a rapidez de resposta, sua fácil análise e a
baixa probabilidade de erros; e como desvantagens: o
elevado tempo de preparação, a necessidade de apurar
os resultados de respostas do tipo “outros, Quais ?
_____”, e a tendência dos respondentes em escolher
sempre os mesmo itens de resposta, independente de
seu conteúdo.
3 – Perguntas com respostas em escala: questionário
com perguntas fechadas em que os respondentes
indicam numa escala sua opinião a respeito do que
está sendo perguntado.
9 Procedimento e Técnicas para
Tratamento de Dados
28
As análises dos dados a serem realizadas podem ser
ocorrer de diferentes formas. Dentre elas, elencamos
algumas: análise descritiva dos dados, análise
inferencial e escalas.
9.1 Análise Descritiva
A análise descritiva dos dados pode ser de cinco tipos:
análise estatística descritiva, análise multivariada,
análise de conteúdo, análise por mapeamento
cognitivo e análise de discurso.
A análise estatística descritiva inicia-se após a
disponibilização dos resultados observados para extrair
as informações neles contidas (Costa Neto, 1991).
Dessa forma, é necessário que as características que se
desejam verificar estejam bem definidas. O trabalho
não será feito a partir dos elementos existentes, mas
a partir de algumas características essenciais desses
elementos que permitirão uma melhor compreensão
do fenômeno estudado. Usualmente, os resultados da
estatística descritiva são expressos através de gráficos
de distribuições de freqüência ou outro parâmetro
associado a tais distribuições.
Com o advento da tecnologia, houve um crescimento
dos modelos de análise baseados em técnicas
estatísticas, conhecidas como análise multivariadas.
Segundo Hair et. al. (1998), o propósito da análise
multivariada consiste em medir, explicar e prever o
grau de relacionamento entre aos atributos. Portanto,
o fator multivariado recai sobre a relação entre
atributos que são combinações lineares de variáveis
com pesos determinados empiricamente.
Destacam-se algumas técnicas:
a) análise de componentes principais e fatores
comuns;
b) regressão múltipla;
c) análise de múltiplos discriminadores;
d) análise multivariada de variância e covariância ;
e) análise conjunta;
f) correlação canônica;
g) análise de cluster;
h) escala multidimensional;
i) análise de correspondência;
j) modelos de probabilidade linear;
k) modelos de equação estrutural.
A análise de conteúdo se organiza a partir da
repetição de unidades da análise do discurso (palavras,
expressões ou significantes similares ou sentenças e
parágrafos), que revela os interesses e preocupações
dos autores do discurso. O texto, oral ou escrito, é
quebrado e reorganizado em termos de unidades
de análise que o pesquisador decidiu estudar, de
acordo com a abordagem apropriada de códigos.
A classificação das diferentes unidades de análise
ocorrerá dentro de um limitado número de categorias
relativas aos objetivos do estudo. Tal método é usado
para analisar respostas abertas, comparar estratégias
de diferentes organizações, através do confronto
entre seus discursos e os documentos distribuídos ou
para discernir os interesses de diferentes indivíduos,
grupos ou organizações.
O objetivo do mapeamento cognitivo reside em
estabelecer e analisar mapas cognitivos, que são a
representação das crenças de uma pessoa ou de uma
organização que levam em conta um determinado
domínio (Axelrod, 1976). É composto por dois
elementos: conceitos – construtos ou variáveis – idéias
que descrevem um problema ou um determinado
domínio e de ligações entre estes conceitos.
Uma vez coletados, esses conceitos (ou categorias) e
suas relações podem ser representados, graficamente,
na forma de pontos e flechas. Tal método é usado
principalmente em gerenciamento para:
a) estudar as representações de indivíduos
para explorar suas visões. Esses estudos tentam
comparar as representações de diferentes pessoas
ou da mesma pessoa ao longo do tempo para
explicar ou predizer comportamento ou para ajudar
executivos em formular problemas estratégicos;
b) estabelecer e estudar a representação de um
grupo, de uma organização ou de um setor. Nesse
caso, os objetivos dos estudos são entender ou a
evolução da estratégia corporativa num período
de anos ou as interações e influência de diferentes
grupos de gerentes.
São várias as possibilidades de análise do discurso.
No entanto, alguns pontos precisam ser considerados
em qualque opção feita: a visão de linguagem que
perpassa a perspectiva teórica de abordagem presente
no estudo. Em um quadro que compreender a
linguagem em uma perspectiva dialógico-enunciativa
(Brait, 2006), em que as categorias de análise não são
aplicáveis de forma mecânica, mas são selecionadas e
adaptadas para a compreensão dos fatos e fenômenos
em foco. Essas categorias de análise são revistas em
função da necessidade de adaptação ao contexto e
aos objetivos de compreensão do processo, levando
em conta algumas características centrais análise
(Liberali, 2010):
a) observação e leitura dos dados com busca de
conteúdo léxico-semântico e paralinguístico,
que permita uma primeira compreensão das
atividades;
b) descrição do contexto, levando-se em
consideração o lugar físico e social de produção,
o momento da produção e o papel social dos
interlocutores;
c) análise do conteúdo temático, realizado nas
escolhas lexicais mais relevantes. A partir dessa
análise geral, diferentes categorias lingüísticodiscursivas serão retomadas, correlacionadas e
expandidas.
A análise inferencial diz respeito “a como se pode
assumir conclusões para toda uma população a partir
das medições e da análise de apenas uma parte dela, de
forma que o risco de se realizar conclusões incorretas
possa ser medido” (Mattar, 1999, p. 82-83). Dois
tipos de problemas que dizem respeito à inferência:
estimar os parâmetros de uma população e realização
de teste de hipóteses.
Mattar (1999) cita, ainda, que com os métodos de
inferência é possível, por exemplo, assumir com
determinada probabilidade conhecida que há erro
na média calculada numa amostra como estimativa
do parâmetro da população, se pode também realizar
os testes de hipóteses, por exemplo, a respeito da
diferença entre duas distribuições.
A análise inferencial se organiza a partir de testes
paramétricos e não paramétricos. O teste paramétrico
é um teste estatístico, que assume uma distribuição
específica para um dos parâmetros da população
estudada, por exemplo, um teste paramétrico pode ser
usado se um pesquisador acreditar que a população
é normalmente distribuída. O teste não paramétrico
é um teste estatístico que, não necessariamente,
especifica a distribuição paramétrica dentro da
população.
As escalas permitem a quantificação do grau de
concordância entre os entrevistados a respeito de
um determinado assunto (Rizzini, Castro e
29
Sartor, 1999). Segundo Mattar (1999, p. 194),
existem quatro principais tipos básicos de escalas de
medidas. São elas:
1. Escalas nominais: em que os números servem
apenas para nomear, identificar ou organizar dados
coletados;
2. Escalas ordinais: servem para, além de nomear,
identificar e categorizar, ordenar, segundo um
processo de comparação de determinada amostra
em relação à determinada característica;
3. Escalas de intervalo: que mostram, através dos
intervalos entre os números obtidos, qual a posição
e quanto as pessoas, objetos ou fatos estão distantes
entre si em relação à determinada característica;
4. Escalas razão: possuem as mesmas propriedades
das escalas de intervalo com a vantagem de
possuírem o zero absoluto, o que torna possível obter
qual a sua magnitude, além de informar a posição e
quanto as pessoas, fatos ou objetos estão distantes
entre si em relação à determinada característica.
10 Validade, Confiabilidade e
Credibilidade
Para que uma pesquisa possa ser aceita em um meio
acadêmico é preciso que as pessoas possam perceber
que seus resultados não advêm apenas da vontade,
gosto ou opinião do pesquisador. Embora, seja um fato
atestado, que nenhum tipo de pesquisa possa se dizer
neutra (Bredo e Feinberg, 1982), há a necessidade
de que o estudo realizado seja comprovado e/ou
compreendido em sua extensão. Por isso, critérios
de validade, confiabilidade e/ ou credibilidade sejam
trabalhados.
10.1 Validade e Confiabilidade em Pesquisas
Positivistas
Segundo Mattar (1999, p. 34), “a validade de uma
medição refere-se a quanto o processo de medição
está isento, simultaneamente, de erros amostrais e
erros não amostrais” , enquanto “a confiabilidade de
uma medição refere-se a quanto o processo está isento
apenas de erros amostrais”. Num gráfico de curva
normal, quanto menor for os desvios da amostra,
maior a confiabilidade dos resultados. Se o resultado
afastar-se muito do valor esperado, afirmamos que os
resultados não demonstram a validade da hipótese.
Para uma medida ser válida, precisa ser confiável.
Porém, se uma medida não for confiável, ela não
poderá ser válida; e, em sendo confiável, poderá
ou não ser válida. A confiabilidade é uma condição
30
necessária, mas não suficiente para a validade. Por
essas razões, dizemos que o conceito de validade é
mais importante para os resultados de uma pesquisa
que o conceito de confiabilidade, justamente por ser
mais amplo e incluir aquele (Mattar, 1999, p. 36).
Para se estimar a validade é preciso comparar os
resultados obtidos com o valor real da amostra na
população. No entanto, o valor real da amostra
raramente é conhecido, razão pela qual Mattar (1999,
p. 36) aponta 04 métodos para estimar a validade de
uma pesquisa, listados a seguir:
1.Validade Construída: Nesta modalidade,
os resultados obtidos são comparados com
os resultados de outras pesquisas ou estudos
relacionados já efetuados, de tal forma, que o
referencial teórico seja desenvolvido de acordo
com o fenômeno que está sendo medido. Se
não for verificado relacionamento entre os
resultados, deve-se questionar a validade das
medidas ou a validade da hipótese em que se
baseou a pesquisa;
2. Validade Satisfeita: Coleta-se a opinião (subjetiva) de um ou mais especialistas quanto a adequacidade do processo de medição;
3. Validade Concordante: Realiza-se duas diferentes medições com técnicas diferentes do mesmo fenômeno, na mesma ocasião. Neste caso,
uma das técnicas já deve ser conhecida, e se o
resultado da nova técnica tiver alta correlação,
sua validade está comprovada;
4. Validade Preditiva: mede-se um fenômeno
num dado momento e, baseando-se nestes
resultados, efetua-se nova medição desse mesmo
fenômeno ou de outro, no momento futuro. Se
houver alta correlação, dizemos que a medição
inicial teve validade preditiva.
O mesmo autor cita dois métodos para verificar a
confiabilidade dos dados de pesquisa:
1. Confiabilidade de teste-reteste: compreende
em repetir várias vezes a medição, utilizandose o mesmo instrumento com os mesmos
respondentes, sob as condições mais parecidas
com a medição original. Os resultados das várias
medições são comparados para determinar a
confiabilidade;
2. Confiabilidade de formas alternativas: compreende em efetuar duas medições dos mesmos respondentes, porém com instrumentos
diferentes, mas equivalentes. Os resultados das
medições são comparados para determinar a
confiabilidade.
10.2 Credibilidade em Pesquisas Não Positivistas
As questões de credibilidade em pesquisas não
positivistas apontam para a necessidade de considerar
o estudo e seus resultados de forma mais ampla,
levando em conta o modo de realização da pesquisa,
seus resultados, o alcance de seus resultados para as
comunidades envolvidas e a possibilidade de critica
de interferência dos participantes no processo de
pesquisa.
Alguns critérios apontam a necessidade de percepção
dos envolvidos e da comunidade acadêmica sobre
o fazer da pesquisa; os resultados precisam ser
considerados em direta relação com os participantes,
que precisam ter poder de decisão e de avaliação no
desenvolvimento da pesquisa. Além disso, o processo
de pesquisa precisa ser trabalhado e apresentado de
forma cuidadosa para que os procedimentos adotados
sejam reconhecidos, compreendidos e avaliados. Para
isso, é possível desenvolver propostas de:
a) realização de observações constantes,
b) triangulação (ou uso de diferentes modos) de
coleta, tempo, espaço, investigador, teoria, análise;
c) member checking (consulta a participantes);
d) exame de parceiros (de fora do contexto de
pesquisa);
e) busca de explicações rivais ou casos negativos;
f) monitoramento De viés (Bias).
11 Considerações Finais
Como apontamos ao longo do texto que se propôs a
ser uma breve exposição de possibilidades de se pensar
pesquisa de modo a apontar alguns caminhos para
aqueles que se iniciam nesta jornada árdua, porém
instigante de pesquisar. Nossa apresentação procurou
oferecer alguma contribuição introdutória para que
os leitores possam ser instigados a aprofundar suas
leituras, o que certamente, permitirá a realização de
escolhas metodológicas engajadas e respeitadoras do
modo de ser e agir de cada um.
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33
Theoretical-Methodological Choices in AL
Research: critical research of collaboration
in teacher education
Maria Cecília Camargo Magalhães 1
Abstract
This text discusses the importance of a theoretical-methodological frame to base language that might create
contexts for participants’ collaboration in research conducted in teacher continuing education in Applied
Linguistics (AL). It has a dual, but related focus. First, it discusses the concept of collaboration. Secondly,
based on Vygotskian, Bakhtinian, and Voloshinovian discussions, it describes a concept of language
conceived as dialogic, that is, as the result of contradictions and conflicts situated in particular socialhistorical-cultural contexts. This understanding stresses the central importance of a language concept to
create collaborative contexts for participants’ joint discussions to transform teaching-learning in Brazilian
public schools located in poor districts. It also reveals the need to provide researchers with theoreticalmethodological support to create linguistic categories to analyze collaboration and its role in teachers’
critical development. The concept of collaboration in research is thought to provide researchers and state
school teachers with a possibility to jointly discuss: 1) the needs of teachers’ particular contexts of action; 2)
their objectives; 3) the meanings of their actions; 4) how to transform teaching-learning in schools located
in deprived districts.
Keywords: Applied Linguistics. Teacher. Continuing Education. Teaching-Learning
1 Introduction
This text discusses the importance of collaboration
between participants in investigations conducted
in teacher continuing education work, aiming at
creating contexts to allow teachers to critically probe
into their routine practices and into their schools’
social-educational problems, to understand and
transform them. Central to this issue is a theoretical
base that focuses language as a key concept to allow
1
34
researchers to provide such a context, as well as to
analyze participants’ interactions to understand
the collaborative possibilities created, and the
transformations that emerged from them.
This discussion is based on an understanding
of Applied Linguistics (AL) as interdisciplinary
knowledge (Moita Lopes, 2006; Signorini, 2006;
Cavalcanti, 2006, in which linguistics dialogues with
other areas of study (e.g., education, psychology,
Doutora em Educação. UFPI/PI-PROCAD(CAPES) Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte UFRN. Mestre em Educação pela Universidade Federal do Piauí - UFP. Graduada em Pedagogia e em Ciências Econômicas pela
Universidade Federal do Piauí. Professora titular da UFP, Centro de Ciências da Educação, Departamento de Métodos e Técnicas
de Ensino e do Programa de Pós-Graduação em Educação. Coordenadora da base de pesquisa FORMAR. Desenvolve estudos e
pesquisas com base no referencial teórico e metodológico da Teoria Sócio Histórico Cultural - TASHC e da pesquisa Crítica de
Colaboração PCCol. E-mail: [email protected]
sociology, philosophy, among others) to challenge
issues of language use in diverse contexts. This
dialogue may introduce new knowledge production
paths that are based on theoretical frames which see
language and the researcher’s role alternatively. In this
direction, Pennycook (2006, p. 67) discusses “Applied
Linguistics as a challenging way to think and act, as
transgressive approach to which epistemological and
political tools are central”.
Along the same lines, when discussing research in
AL, Liberali (2006) points out that it is necessary
to go beyond enabling researchers’ to introduce
transformation in the way to understand, think and
act in schools contexts. According to Liberali (2006),
transformations in the social, cultural and political
conditions to think and act in schools involve creating
a locus for participants to learn how to look at, and
organize language so as to analyze the issues at stake.
In her view, research needs to provide teachers with
tools to work with linguistic-discursive organizations
to base their actions in particular action situations.
Teachers learning about how to organize language
to understand their practices and to reflect critically
on them might transform the individualist senses of
being a teacher, as well as those of being a student historically, the bases of school culture. Educating a
reflective professional means empowering teachers
and, as pointed out by Liberali (2006), it presupposes
creating such a context in which teachers may learn
new ways to organize language to look at their own
actions and at those of their students and colleagues
to understand the political issues that underlie them.
2 LANGUAGE AS THEORETICAL BASES TO
CREATE COLLABORATIVE CONTEXTS
This section discusses firstly the language concept
that bases our research, and secondly the concept of
collaboration, which is central to this discussion.
2.1 Language
The linguistic theoretical frame that supports our
Research Group Language in School
Context Activities (= Linguagem em Atividades
no Contexto Escolar - LACE), which works on
teacher continuing education, is based both on
the Social-Cultural-Historical Activity Theory
(SCHAT) tradition and on the Bakhtinian Circle.
The contributions of both frames are central to the
discussion on collaboration for critical-reflectiveprofessional development (MAGALHÃES, 2004).
However, it has demanded us more time to organize
linguistic categories for data analysis that might allow
us to look at language to understand the collaborative
patterns of teachers’ and researchers’ discussions
as emphasized by the theoretical frames above. For
instance, Magalhães (2007), Magalhães and Fidalgo
(2007) explored linguistic categories that based their
linguistic analysis to discuss collaboration in its aim
to promote critical reflection. In the same direction,
Liberali (2004, 2006, 2007) developed linguistic
categories to analyze and discuss argumentative
language for critical reflection. This linguistic
investigation, however, is far from concluded.
Several authors have also delved into these issues. For
instance, Jones (2007) examines language theories
that base traditional linguistics, Bakhtinian and
Voloshinovian linguistic theoretical frame and the
view of language in Vygotsky’s theoretical discussions.
He states (with some caution) the common basis of
both the Bakhtinian Circle and Vygotskian frames.
Jones suggests that Voloshinov’s and Bakhtin’s
theoretical discussions might be useful for a “revision” of the Cultural-Historical Activity Theory
(CHAT) investigation of the concept of “semiotic
mediation”.
The similarities between both frames, as far as language
understanding goes, have also been highlighted by
other researchers (e.g.: Holquist, 1990), and have been
the foundation of analytical categories to examine
data in educational research built on social-CulturalHistorical Activity Theory (e.g., WERTSCH, 1998;
BRONCKART, 1999, BRONCKART and MACHADO,
2004; MAGALHÃES, 2007; MAGALHÃES and
FIDALGO, 2007; LIBERALI, 2007, among others).
In fact, Vygotsky’s discussion of the dialectical
relationship between dialogue (speech) and the
constitution of human consciousness, as well as
the focus on a dialogical concept of language, can
be seen throughout his work. For him “Speech is a
means of social interaction, a means of expression
and understanding” (VYGOTSKY, 1987, p.48). As he
stresses, the understanding of others’ talk is complex
and involves a dialogue with the other, as well as an
analysis of the social-cultural-historical situation
35
of action and of the motives that led to talking in a
particular way, in a particular context and situation.
In Vygotsky’s (1987, p .48) words:
Understanding the words of others also requires
understanding their thoughts. And even this is
incomplete without understanding their motives
or why they expressed their thoughts. In precisely
this sense we complete the psychological analysis
of any expression only when we reveal the most
secret internal plane of verbal thinking - its
motivation. […] The word is the most direct
manifestation of the historical nature of human
consciousness.
We believe we can point at the similarity between
Vygotsky’s and Bakhtin‘s Circle discussions based on
the dialogical concept of language as a “battlefield”
of meanings produced by the participants of the
discourse, and by focusing on the central concept
attributed to social, cultural and historical factors
when it comes to comprehension. Also, language
is seen as socially constituted by different forces,
all of which display meaning and voices. However,
differently from Vygotskian’s, the Bakhtinian and
Voloshinovian’s. discussions stress how these
multiplicity and struggles are linguistically marked in
the utterances in which a conflict of differing views/
voices is put into work.
These issues are important since they aim at
examining participants’ voices to understand if and
how discourse in educational contexts creates a locus
for participants’ collaboration to occur. Besides, they
allow for the implication of this locus and discourses to
be viewed as to the critical development of all involved
(researcher, teachers, students, coordinators…). We
discuss next our understanding of collaboration.
2.2 Collaboration
When carrying out research on teacher continuing
education, collaboration is, for us, a crucial concept
that aims at creating spaces for learning and
development. In this sense, establishing collaboration
is of vital importance to raise, share and question the
participants’ senses about the content at stake – often
allowing for transformation to take place. We are,
though, emphasizing the creation of collaborative
contexts as prior and necessary to learning and
development.
Collaboration is seen as a process of shared evaluation
36
and re-organization of practices, mediated by
language, in activities that involve all the participants
of a discussion. It is organized in ways that allow
all the different participants to have possibilities
to talk; question each other’s senses attributed
to theoretical concepts (that were learned from
prescribed educational books, or by practice), ask
for clarification, and report descriptions of concrete
cases to explain their ideas or to relate theory and
practice. As a participant, the researcher is mostly
responsible for the probing of other participants to
deepen their ideas in their revision of prior views, of
their description of school contexts, their objectives,
their social and educational practices, as well as of
the theoretical concepts that base their actions and
utterances. Also, researchers are responsible for the
deepening of discussions on the social-culturalhistorical factors involved in the debates, and for
relating school practices to the education of students
according to the view of citizenship that the school
shares. In fact, as we have noticed, it is usually
difficult for teachers to understand the relationships
between educational and political issues involved
in their actions as well as in students’ learning and
development, since investigating the political forces
that shape the discourses and practices within schools
is not something valued in educational premises
(MAGALHÃES, 2004).
Collaboration, therefore, does not mean there will
be no contradictions and conflicts between those
who take part in the debates. In fact, based on the
theoretical issues put forth here, we take it that it is
precisely by stressing and analyzing contradictions
and conflicts that we might understand participants’
(researchers included) senses, and might be able
to negotiate new production of meaning. For us,
collaboration allows all voices to be heard, but more
than that, it allows participants to question each
others’ senses and share the production of new (or
newly-transformed) knowledge.
However, it is important to say that, collaborative
contexts may be a “rather uncomfortable zone of action”
(John-Steiner, 2000, p. 82), especially when we initiate
research. This is due to the fact that, usually, the focus
of work in school contexts is on individual practices.
By and large, social, historical, cultural and political
issues are hardly considered in problem-solving (or
problem challenging) discussions. Also, the discourse
organized around argumentation – as a type of
textual organization that can be taught-learnt - is not
usual in school contexts. Therefore, teachers, as well
as researchers, may not be familiar with questioning
or with being questioned. To us, the problem lies in
the assumption that an individual context-based
organization might lead teachers to think that, when
they are challenged, it is their individual knowledge
and practices that is being questioned. Sooner, being
questioned is often a possibility to critically reflect on
the theoretical concepts that base teaching-learning
in schools, and students’ education.
In this sense, as stated by John-Steiner (2000) and
by Moran and John-Steiner (2003), collaborative
contexts always involve emotional intensity, which
may cause teachers to resist. In fact, researchers need
to always be aware of these issues during research
conduction. Also, discourse analysis will reveal how
participants’ voices interact; how contradictions and
conflicts are used in learning and development and
in social transformations. So, it is important to have
linguistic categories to analyze these issues - since
language may be an instrument to exert, as well as to
share power as discussed by Bakhtin and Voloshinov’s
theoretical frame.
This process of jointly producing new meanings for
theories, roles, and actions takes place within a zone
of contradiction and conflict that Vygotsky calls
Zone of Proximal Development (ZPD). It is in this
zone that new and old meanings are confronted and
re-signified. As discussed by Magalhães and Fidalgo
(2007, p. 336-337), the Zone is not however unified;
there may be more than one situation of conflict
occurring at the same time and influencing the same
outcome […]. While we were working to built trust
and to confront ideas so as to challenge old meanings
[in the teacher continuous educating program
discussed] we were, at the same time, confronting
our meanings as to the role we ourselves were playing
in that educational context – would our roles be of
experts or of outsiders? If experts, should we be more
assertive in our questions? If outsiders, should be take
a position of listeners? Collaboratively speaking, we
ought to do a bit of both, stepping back and forth to
build trust.
We call this frame to research design and conduction
Critical Research of Collaboration and set it in a
critical research paradigm, since the objective of the
investigation is not only to understand the others’
voices but to introduce transformation in the [in
our case, educational] contexts. The analysis of
collaboration is discussed next.
2.3 Analytical Procedures and Categories Used to
Analyze Collaboration
Theoretical-methodological frames derived from
discursive analysis – social-discursive interactionism
(Bronckart, 1999; Bronckart and Machado, 2004) or
from conversational analysis (Kerbrat-Orecchioni,
1997) have based our analytical procedure to examine
collaborative patterns in continuing teacher research
and its role in participants’ learning and development.
Based on Bronckart (1999), Bronckart and Machado
(2004) we have analyzed Workshops and HTPC
contexts to understand the historical, social and
cultural aspects involved, and later to interpret data
analysis and the political issues that based them. We
analyzed:
a) the interactions within global plans, which have
allowed us to identify the texts dialogical structure
and understand the protagonists’ senses, utterance
mechanisms, and objectives to talk. The utterance
mechanisms contribute to the pragmatic coherence
of the text, revealing thematic content, assessment
mechanisms (opinions, values, feelings). They also
reveal information about the relationship of those
who speak with the others (voices), as well as their
discursive position. This is achieved by analyzing
their modal expressions and linguistic choices
(nouns, types of verbs connectives…);
b) the linguistic discursive marks: deitic units: first,
second and third person possessive and adjective
pronouns, time and place adverbs, and the use
of first person plural of the simple present allow
us to analyze the protagonists’ voices, discursive
position and senses about reading, reading
practices and citizenship education.
From the area of conversational analysis, KerbratOrecchioni (1997) provided a frame to analyze
turn-taking devices and the agent’s position and
interpersonal relationships. Mainly she provided us
with a frame to analyze:
a) the power and hierarchy among participants,
which involves the organization of turn-taking
37
– how much each participant talks, who is
responsible for initiating and for closing the main
conversational units; and the linguistic structural
organization of the conversation;
b) number and type of questions in conversations
to initiate, react or react-initiating new themes.
This allows the inter-agents to go back and forth
towards thematic content, and provides possibility
for contradictions and conflicts to be perceived and
explored;
c) question-answer exchange as an utterance constructed jointly and dialogically. Nystrand (1997
apud WERSCH, 1998), also points out that teachers organize questions, usually, either to test or to
give instruction. These are often, therefore, not authentic questions for which there are no pre-specified answers and allow for the use of several answers, but questions used simply to confirm what
the teacher has said. Brookfield and Preskill (2010)
discuss two types of questions: “broad focused
questions and focused questions”. Broad focused
questions require: open-ended answers; evaluation
and prediction. Focused questions require recalling
facts, defining terms, categorizing and confirming.
Next we will discuss the program aimed at teacher
continuing education and the project whose data
is discussed here to explain how collaboration was
employed.
3 CONTEXT: ACTING AS CITIZENS PROGRAM
(PAC)
The Acting as Citizens is an Extra Mural Program
coordinated by Liberali and Magalhães, professors at
the Applied Linguistics and Language Studies PostGraduation Program at PUC-SP. It aims mainly at
developing collaborative projects with the objective
to form, in schools, Teacher Support Teams (concept
based on the discussions of Daniels and Parrilla,
1994). These teams have the objective of supporting
their colleagues within the schools to work as a
community with their particular needs.
Within PAC, work is conducted by the Research
Group LACE that involves doctors, doctoral,
master’s and undergraduate students. Their projects
all deal with problems in education and broadly
aim at understanding and transforming the
difficult conditions of education in Brazilian public
schools. Based on the socio-historical-cultural
activity perspective, these projects investigate
how language can organize collaborative actions
between participants. The objective of collaboration
is to involve all participants to jointly and critically
question and understand teachers’ daily classroom
practices and the teaching-learning and development
theories that base them, so that each one can analyze
the social-political stands that actually base their
actions.
Since 2002, this program has developed different
social projects such as:
1. Meetings with teachers, students, parents,
directors, coordinators and researchers to discuss
school needs (2002-2003);
2. Working with teachers in a school HTPC sessions
to discuss teaching-learning of reading to deal with
students’ reading failure in SARESP 2(2004);
3. The constitution of Teacher Support Teams
– TST, based on Daniels and Parrila’s (2004)
discussion of the organization of teacher support
teams in Spanish schools. It was organized as a
3
creative chain to develop:
a) critical reading for social action (2005-2008);
b) working with schools social projects that might
involve the community around schools (20052008).
This text concentrates on data collected in the project
Reading in Different Areas (LDA), thought to deal with
reading problems presented by Brazilian state school
2 Hora de Trabalho Pedagógico Coletivo (Collective Hour for Pedagogical Work – a State policy within Sao Paulo State School
system). HTPC is a school locus for teacher continuing education conquered by the teachers’ syndicate in Sao Paulo. However,
it has been used by school principals and coordinators to discuss technical, administrative and organizational matters. So, regaining this school space for educational discussions has two objectives: working with school staff on educational subjects and
providing a methodology that may create learning, development and transformation possibilities for all involved.
3 Creative Chain is defined by Liberali (2007) as implying jointly endeavors “to produce meanings which will be, afterwards,
shared with other new partners through the senses (Vygotsky, 1934) that those take to the new activity. Therefore, new meanings are produced carrying some aspects created in the first activity. Similarly, some of the partners from the second activity,
when engaged in a third activity, follow the same path. This creative chain presupposes that features of the whole can emerge
in the production of new creative outcomes and of its creators”.
38
students and revealed by the bad scores in SARESP.
This project was conducted in poor communities of
two cities, in the outskirts of São Paulo – Carapicuíba
and Cotia. Its main objective was to work with
critical reading of the social genres (BAKHTIN,
1997). Specifically, it aimed at developing, in schools,
the Teacher Support Team – TST – so teachers could
work in an autonomous way with reading in different
subject areas.
The TST was initially organized (2004-2006) with three
or four teachers from different knowledge areas (e.g.,
Portuguese, Mathematics, Physics, Sciences, History,
Geography, Arts, Physical Education) from each of
the 24 school that participated in monthly workshops
with researchers at local State Sub-Department of
Education (SDE). These workshops were followed
by meetings with TST and school staff in schools, in
which classroom observation were carried out, as well
as planning, presentation of projects developed and
conducted by students in their communities.
During the workshops, researchers, teachers and
supervisors discussed the theoretical-methodological
concepts that base the role of TST in schools, the
project LDA and their own school community
projects. In the workshops, teachers also planned
and developed material to involve and support their
colleagues in the work to be conducted with reading
in their particular schools, as well as to deal with
problems considered central by the community.
4 CRITICAL RESEARCH OF COLLABORATION:
RELATING THEORY TO PRACTICE
Analyzing our data for collaboration, we realized
the main pattern we found was the one John-Steiner
(2000, p. 198-200) calls complementary collaboration.
According to her, this pattern is the most practiced
form of collaboration and “is characterized by a
division of labor based on complementary expertise,
disciplinary knowledge, roles and temperament”.
The objective of the joint discussion in this pattern
is a “mutual appropriation”, in which, “partners hear,
struggle with, and reach for each other’s thought and
ideas”. This will be described in this section based on
data collected in two different activities of the research
conducted. The first is the beginning of the work with
reading in a school HTPC to discuss the concept
of reading in the work to be developed. The second
is a workshop at the local State Sub-Department of
Education, in which TST teachers present and discuss
the work to be conducted in their schools with
citizenship production.
At the beginning of the work, teachers and researchers
had different objectives to participate; however, we all
had in common the need and intention to introduce
changes in school reading practices. As researchers,
we aimed at discussing new ways to understand
teaching-learning of reading in schools, and to work
with reading practices to successfully deal with the
problem of students’ failure in SARESP. However, we
strongly aimed at introducing, with a collaborative
turn-taking organization, changes in teachers’
apolitical and a-historical traditional ways of seeing
schools as a place where they teach and students learn,
as well as a locus of practice only. At the same time,
the teachers, aimed at learning from the researchers
new ways to act and deal with the same problem –
students’ reading failure. The common need to assist
students’ in their learning and development toward
reading was the starting point to establish our work
in partnership.
Next, we discuss an HTPC session to reveal teachers’
and researchers’ initial work with reading. The
objective for the session was to understand teachers’
senses on critical reading and reading instruction,
as well as to introduce the researchers’ views. The
researchers (R1 and R2) distributed transcript of two
diverse reading classes – one in which students read a
story and another in which students read and discuss
a history text. Teachers were supposed to discuss the
two texts first, in small groups and then in the larger
group.
At the beginning of the session the researcher (R1)
clearly states the objective of the work to be developed
and the central issues that base researchers’ senses
toward the work to be conducted - the relationship
between theories and practices, critical reading
education, the results of SARESP. So teachers and
researchers could work on common grounds as to
the need to work on students’ reading and as to our
responsibility of working with reading instruction.
The extract below points at these aspects:
R1 …we (researchers) saw the SARESP result
(teachers and researchers’ common knowledge
about students’ reading).
[…] texts point
out that it is our (teachers) duty (obligation
39
to form a critical student) to educate this critical
student (the teaching-learning theoretical bases of
educational prescriptive texts) […] so, what is this
like in practice? (establishing theory and practice
relationships through the use of a true question
to introduce researchers’ sense on working with
teachers) Ours position here (researchers’ senses
about working with teachers), is not to discuss
theory with you, but to relate theory and practice.
So, what is this like in practice? (focus on the
relationship between theory and practice) This issue
is crucial. We (joint work to be developed) are not
just going to discuss practice either. This wouldn’t
make sense, would it? (establishing the focus of the
work - theory and practice relationships) […]. So
what is this? What does it mean to educate a critical
student? How can we teach so that the student
learns, and that the teacher also learns, ok? (broad
questions to help teachers to focus on the work
to be developed) So the first question that we put
forth to you is the need to have a clear idea of who
your clients are; so who is this student that I have?
What kind of problems do they have? (knowing
the students’ needs is central issue to the work to
be developed). Now, with the SARESP exam, we
can see a few things more clearly. We know what
kind of reading comprehension problems they
have, don’t we? (SARESP revealed that students’
reading problems are in all knowledge areas) We
now know (researchers and teachers) that reading,
understanding and writing are not activities, are
not only for the Portuguese (mother tongue)
teacher to teach. It is something that all subject
areas are responsible for – including maths, right?
(emphases on all teachers’ responsibility to teach
reading and writing to involve the teachers of other
content areas. Emphasis on math teachers reveals
the researcher’s understanding that these teachers
might not understand their presence in the group).
The researcher’s talk reveals several of the concepts we
discussed that base our understanding of the work to
be developed:
a)clear statement of the objectives of work to be
developed and researchers’ responsibility in the
work showed by the use of pronouns;
b)theoretical concepts about the didactic practices
to educate a critical student, and the dialogical
interaction of teaching-learning contexts based
the theoretical-methodological frame of SCHAT;
c)emphases on the need of all teachers’
responsibility to teach reading and writing – a
common knowledge for teachers and researchersrevealed by the choice of,
• deontic modalization has to – explained by
Bronckart (1997) as pertaining to the social world
(Habermas, 1985) of obligations and rights;
40
• broad questions What is this like in practice?
What does it mean to educate a critical student?
How can we teach so that the student learns, and
that the teacher also learns, ok?;
d)theoretical concepts on the work to be developed
- an emphasis that relates theory and practice;
e)stress on the researchers and teachers knowledge
on the students’ reading and writing failure
revealed in SARESP – which pointed out that
students had reading problems related to every
one of the knowledge areas- thus, everyone would
be responsible for working with reading;
f)use of true questions (Wertsch) to elicit thought
from participants – broad and focused questions
(Brookfield and Preskill).
Considering our discussion on collaboration, it is
a first and important moment for the work to be
initiated with teachers.
After describing the objective of the work to be
developed, R1 and R2 ask teachers to exam two
reading lesson transcripts from two diverse knowledge
areas – Portuguese and History - to verify the concept
of reading that base them and if/how they might be
creating contexts for the education of a critical reader.
By using transcripts of reading classes from two diverse
knowledge areas, researchers aimed at providing
teachers with a concrete context to relate instruction
to teaching-learning theories by examining teachers’
and students’ roles, and actions. The excerpt below is a
dialogue on reading instruction in the history lesson.
The teachers discussed in the small groups. Each
group chose a participant to present their findings
and opinions to the larger group. The researcher
initiates by asking the group, which had volunteered,
to describe their evaluation of the reading instruction
for the education of a critical student:
R2: …Would you say this lesson educates a
critical and active student? […] How so and
why?
(R2 initiates with an evaluation question) […]
R1: How would this lesson contribute for the
student to have a better result in SARESP? (R1’
s question reacts and expands R2’s to provide
teachers with a concrete basis of analysis, and to
relate the task to the previous discussion).
D: it is not critical (teacher gives the group
evaluation)... we hightlighted two aspects… we
can actually see positive aspects in this lesson,
but we we had only written the negative ones,
(teacher modalizes when she realized the group
only had pointed the negative aspects of lesson) –
which are that: the lesson is to limiting; students
are too limited by the text. (the group evaluated
the lesson based on history teachers’ focus on text
content).
R2: Why do you think they are limited by the text?
(Researcher questions teachers’ evaluation with a
question to expand and clarify the group’s position,
using an evaluation question initiated with why.
This question has the objective of making the
teachers reflect on the group’s superficial criticism.
It is important since teachers usually provide
general answers while analyzing teaching-learning
from classroom descriptions.)
D: Because if there were any question outside the
text, they wouldn’t know how to answer (Teacher
advances a little bit)
R2: Where did you see that? ( R2’s question probes
teacher to clarify her answer by showing where the
group based the class evaluation)
D: Letter […] c.
R2: Letter […] c?
D: When she (the history teacher) asks about the
disease, the girl (the student) does not know what
to answer because they: they (protagonists of the
history text) were::: getting the disease. (evaluates
teacher’s question was not appropriated for text
content, and that this prevented the student from
answering). So this is what we saw, we saw thought
that the idea of placing the text here […] was
actually a good one (evaluates as good the use of
text to discuss historical content), but the only
thing is that first the teacher is there, all locked up
(evaluates as negative teacher’s type of questions
and the fact she did not allow students’ to introduce
information that is not in the text) in what she
proposed; if they got away from it, like the boy did
when he was telling his life story… rather than look
at the answer, at his information, she just cut him
out. This can’t be. (the teacher’s answer is confusing,
thus revealing a production that resulted from the
researcher’s probing.)
E: can’t talk, and when she asks about the […] a
question that is not in the text; so this is what we
think: to what extent is this valid? (justifies the
colleague’s evaluation based on the same argument.)
R2: so... (researcher’s probing for teacher to deepen
her evaluation)
E: you can’t repeat anything outside what has been
written (repeats the same argument).
R2: Were you going to say anything? (other group
tries to take the turn).
G: ...we saw that too; that she cuts him off, doesn’t
she? she doesn’t let the students give their opinion, if
they are leaving the text; she only accepts whatever
is in that text that […] the problem ... ( teacher
states in a clearer form the previous colleague’s
evaluation)
4
R are the researchers; all others are teachers
R2: so what you are saying is that the right
answer is only the one which reproduces what is
written in the text? (R1 relates the answers to a
teaching-learning problem while working with
texts: focusing only on information explicitly
found in texts) […]
CL: …there is no inference, right? (another
teacher – CL - takes the turn to stress a central
problem observed in SARESP – students had
failed in questions that involved inferencing.
She completes G’s answers).
This excerpt reveals R2’s actions while discussing
the reading class. She acts to understand teachers’
senses on teaching-learning of reading by asking
broad questions to challenge teachers to evaluate
(Brookfield and Preskill, 2010) the class based on
previous theoretical discussion on active and critical
reader constitution and to explain their reasoning:
Would you say this lesson educates a critical and active
student? […] How so and why? She also challenges
teachers to clarify their answers and to explain where
they supported with focused questions such as: Why
do you think they are limited by the text? Where did
you see that ? These are questions Wertsch (1998)
points as true questions. R2, also, probes teachers to
deepen their answers with expressions such as: So…,
by reorganizing teachers’ answers: So what you are
saying is that the right answer is only the on which
reproduces what is written in the text? R2’ language
organization creates a collaborative context for joint
participation, in which teachers and researcher
complete each other thinking, and risk initiating a
theoretical conclusion to a practice under discussion:
… there is no inference, right?
So, through questioning, researchers mediate teachers’
4
answers and probe participants into deepening
their ideas, considering each other’s answers, prior
collocations, schools particular context, the objectives
to reach, the social and educational practices and
theoretical concepts that base them. Also mediation
probes teachers to talk from their peers answers,
revealing they are sharing thinking and action. The
interaction shows that teachers and researches are
involved in mutual understanding to produce a
shared meaning about the possibilities the history
teacher created to students’ critical education. It also
allowed researchers to understand teachers’ senses
on reading instruction and the choices to make to
41
the next meeting. R2’s actions creates a “zone of
conflicts” that Vygotsky calls ZPD, in which old senses
may be questioned and new meanings and creative
actions produced through the group questioning and
collaboration.
4.1 Workshop at the Educational Directory: citizenship education with school projects
The objective of this session was to reveal how
researchers created a locus for joint discussion of
citizenship projects developed by teachers to be
conducted in their schools. We want to understand
teachers’ concepts of citizenship by discussing their
projects. It is important to stress that it was difficult
for teachers to relate theoretical discussions on
citizenship to a practice to be developed, since these
are not usual issues stressed in schools. The type of
collaboration observed was also what John-Steiner
calls complementary collaboration. This pattern
can be seen in the researchers’ actions to probe
teachers to clearly pose the objectives of their choice,
the relationship between theories and practices of
the work developed. Also, it reveals teachers’ and
researchers’ now joint participation to probe other
teachers to deepen their explanations.
In the excerpt below TST teachers present the Projects
to be conducted in their school in a workshop at the
State Education local Department:
P1 the objective... the text actually is… the stories
are...comic book stories... this is the intention, isn’t it?
Actually... to entertain... but also to indirectly teach,
because in some of the stories they are always teaching
something, aren’t they? Something ... we... ahn:: and
Chico Bento (and his) character is part of this group
... ( Teacher describes her school Project – to work
with a comic book - Turma da Mônica – because the
protagonists always teach something).
Ps Turma da Mônica...( a member of the same group
completes to clarify which group the teacher had been
talking about)
P1 da Mônica... (we have) Cebolinha... Magali…
don’t we? Mônica... Cascão... each one has their own
characteristics... Magali eats too much, right? eats...
eats... eats... and doesn’t put on weight…we have
Cebolinha... that speaks “incollectly” ... so each one
has their own characteristics and actually we work
by making those who are reading can notice these
differences and starts to accept them... (the teacher
42
describes the protagonists diversity in the chosen
comic book to make the group’s point of choosing the
story to work with citizenship education)
Px: Cascão doesn’t like showering (a teacher
establishes a contradiction in working with
a character who does not shower to discuss
citizenship)...
P1 Cascão does not shower... but he is actually
always talking about keeping the place clean [...]
(the presenter solves the conflict establishing a
confrontation between Cascão’s bad habits and
his concern with the environment).
R1: hold on... there’s something there that I
didn’t pay attention to... so the specific aim ...
[...] (Researcher asks for clarification about
the project objective. She intends to bring the
discussion about the Project specific objectives
back)
P1 the specific objective … to create reflective
possibilities about the cultural diversity by
means of the comic book and the mathematical
(principles) … percentage and whole number…
are taught in a very simple way in this story…
(the presenter restates the objective and
expands it - to work with cultural diversities and
also to work with math, but she does not stress a
central objective of the program that is working
with students’ communities).
[...]
R2: now... you see... with the end of
presentations… we will… ask you a question…
one question… which is … what could we
do… what could our students do with this
knowledge so that they can improve their living
conditions within their communities? ...So that
their social experiences may become more
interdependent? So, what could my student
do... ( researcher’s question intends to probe
teachers into establishing the relationship that
was rarely mentioned during the presentation the clarification of the objective to the project
towards the concept of citizenship discussed
during the workshops.)
S: you’re talking about citizenship action… a
teacher takes the turn to present a conclusion to
the researcher’s speech).
R1 citizenship action... (researcher repeats the
teacher’s conclusion)
CE: can you please repeat the question, S …
what can the student do… (a teacher asks S to
repeat the researcher’s question)
P1: with this knowledge ... to improve their living
conditions ... within the community and within
their social experiences… in an interdependent
way? ( P1 rewords R2’s question, but does not
answer it)
((short pause))
R2: ... it is important to carry out these group
works with teachers in different areas… so as to
allow for reflection to take place on critical reading
work done with our students… that this critical
reading may allow our students to internalize this
knowledge; take this knowledge to society and
transforms this society… this is what acting as
citizens means...( nobody says anything and the
researcher clarifies the central issues of the work
to be conducted that defined acting as a citizen
– it has to involve teachers from different areas,
and students’ communities, with the objective to
introduce transformation in these communities. In
fact she answers the question she had posed.) [...]
The collaborative context created during the workshop
conduction is the result of months of work together,
so teachers feel comfortable to question each other, to
establish contradictions in the proposal description.
For instance, Px questions the presenters choice of
a character who does not shower in a project that
aims at citizenship education. However, it is precisely
the conflict that probes the group to clarify the
contradiction established and explain that character’s
role in the story: Cascão does not shower... but he is
actually always talking about keeping the place clean.
Planning and conducting schools projects with
students so as to deal with a school problem, whilst
also involving the community, was difficult for
teachers. This can be seen in when the group answers
R1’s probe for the objective clarification: the aims was
to develop a project to deal with a school problem:
working with diversity and with math content.
By the end of the presentations, R2 stresses this issue
again with a prediction question (Brookfield and
Preskill, 2010) about how to involve the community
in these projects: …what could our students do with
this knowledge so that they can improve their living
conditions within their communities? ...So that their
social experiences may become more interdependent?
So, what could my student do? The choice of openended questions (Brookfield and Preskill, 2010), and
the lexical choices that emphasize students’ work in
the community reveal the researchers’ evaluation
of the projects presented. S takes the turn to point
at the focus of R2’s evaluation: You’re talking about
citizenship action. The silence prior to expanding the
concept of citizenship on the projects developed made
one of the researchers initiate a discussion on what
citizenship education meant. This discussion probed
several schools to reorganize their projects. The results
were presented in their schools, and in an event of the
Research Group LACE at PUC, and in another event
at the local State Education Department.
We would say that the dialogical concept of language
as a “battlefield” of meanings produced by the participants of the discourse), were linguistically marked in
the utterances in which a conflict of differing views/
voices was put into work (VOLOSHINOV, 1992;
BAKHTIN, 1997). This composed the collaborative pattern John-Steiner (2000, p. 198) called complementary collaboration. The excerpts presented
in this paper reveal teachers’ and researchers’ joint
work to discuss concepts that until then seemed to
have been new for teachers and learning from each
other, that John-Steiner called mutual appropriation.
She defines this pattern as a cognitive and emotional
process. That is as a result of sustained engagement
during which partners hear, struggle with, and reach
other’s thoughts and ideas. These interactions reveal
the work in the ZPD aimed at all participants’ creative
collaboration.
We would say that true collaboration was developed
and all participants contributed to the others’ learning
and development. As researchers, we realized teachers’
difficulties in relating the theory discussed to practice,
in relating the work with critical reading developed in
schools and the school project which was supposed
to involve students’ community. This comprehension
was important so we could create other learning
moments to focus on what troubled them. In fact, the
examples presented showed that all participants acted
to support the others to reorganize their thinking to
produce more complete and clearer understanding
of what reading, reading instruction and citizenship
education entail.
Our role as researchers was to challenge teachers’
ideas, concepts and incomplete or superficial answers
so they were able to rethink and reorganize them,
but it was also our role to describe the objectives
for the work developed and to explain concepts
that, during the interactions, we found difficult for
them. We can say that the work developed provided
theoretic-methodological bases to critical reflection –
to create learning and development activities for all
participants. As discussed by Magalhães and Fidalgo
(2007, p. 333), already pointed in the text “While we
were working to built trust and to confront ideas so as
to challenge old meanings; we were, at the same time,
43
confronting our meanings as to the role we ourselves
were playing in that educational context […]”
REFERENCES
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45
A produção colaborativa e critica na ciência:
uma alternativa para desenvolvimento da
pluripertença social
The collaborative production and criticism in science: an alternative
for the development of social pluripertença
Wellington de Oliveira
1
RESUMO
Este artigo tem como objetivo discutir os limites e possibilidades da colaboração crítica como perspectiva
teórico-metodológica para a pesquisa científica. Para isto procura responder os seguintes questionamentos:
de que maneira a pesquisa crítica de colaboração interfere com o objeto de pesquisa constituído pelas
práticas nos diferentes contextos em que é aplicada? Como os conhecimentos produzidos pela colaboração
entre pares se constituem e se validam para as partes envolvidas no processo? Por que colaborar criticamente
na produção de ciência gera possibilidades de pluripertença social? Ao final, observo que colaborar
criticamente no desenvolvimento da pesquisa científica viabiliza a pluripertença social, pois no processo
de desenvolvimento de ações compartilhadas engendramos experiências com diferentes pertenças e
possibilitamos aos sujeitos a construção de suas próprias identidades a partir de múltiplas referências.
Palavras-chave: Colaboração Crítica. Ciência. Práxis. Conhecimento.
ABSTRACT
This article aims to discuss the limits and possibilities of collaboration as a critical theoretical and
methodological perspective for scientific research. For it seeks to answer the following questions: how does
critical research collaboration interfere with the object of inquiry constituted by the practices in different
contexts in which it is applied? How the knowledge produced by collaboration between peers and validate
is it for the parties involved in the process? Why does critical collaboration science create opportunities
for social pluripertença? Finally, I note that critical collaboration on the development of scientific research
makes possible the social pluripertença because the process of developing actions engender shared
experiences with different affiliations and allowing the subjects to construct their own identities from
multiple references.
Keywords: Critical Collaboration. Science. Praxis. Knowledge.
1
Doutor em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP. Professor
nos cursos de especialização da COGEAE/PUC-SP e Diretor Geral da FAINC. Atua como pesquisador do grupo Linguagem
e Atividade em Contextos Escolares – LACE da PUC/SP. Membro do International Society for Cultural and Activity Research
(ISCAR). E-mail: [email protected]
46
1 INTRODUÇÃO
Está no ethos do percurso de desenvolvimento
da pesquisa-ação, pesquisa crítica e colaborativa
ou pesquisa de intervenção, 2 principalmente, nas
3
pesquisas que desenvolvo no grupo LACE focada em
contextos escolares, que colaborar propicia qualificar
a maneira pela qual se constrói e se põe em movimento
o dispositivo de trabalho por meio do qual interagem
pesquisadores e os demais que, conforme o quadro
teórico, chamamos de práticos, parceiros, atores,
sujeitos, indivíduos ou pessoas. De parte da pesquisaação, a colaboração se coloca de saída em torno de
um problema para cujo tratamento se convoca um
pesquisador interessado.
As questões que me coloco são: de que maneira a
pesquisa crítica de colaboração interfere com o objeto
de pesquisa constituído pelas práticas nos diferentes
contextos em que é aplicada? Como os conhecimentos
produzidos pela colaboração entre pares se constituem
e se validam para as partes envolvidas no processo?
Por que colaborar criticamente na produção de
ciência gera possibilidades de pluripertença social?
A produção em ciência como processo sistemático
de construção do conhecimento tem como
metas principais gerar novos conhecimentos e/
ou corroborar ou refutar algum conhecimento
pré-existente. Produzir ciência é um processo de
aprendizagem tanto do indivíduo que a realiza quanto
da sociedade na qual ela se desenvolve. Partindo-se
2
3
da premissa de que o conhecimento não é matéria ou
assunto acabado, é infinito e deve ser continuamente
explorado, repensado e reformulado, vejo que a
ciência se faz essencial para estabelecimento dessa
constante reformulação e desenvolvimento do ser
humano e da sociedade.
Sem dúvidas, os recentes avanços tecnológicos, as
transformações políticas, sociais e culturais somadas
ao processo de globalização reestruturam um
novo mundo e impõem um acelerado crescimento
do conhecimento e das informações. Por isso,
é imprenscidível que os cientistas transformem
continuamente seus conhecimentos, postulados
teóricos e suas formas de agir construídos ao longo da
sua formação para que possam equacionar soluções
para os problemas cotidianos. No desenvolvimento
do século XXI, todos os segmentos da sociedade
demandam profissionais críticos, participativos
e autônomos com capacidade de saber lidar com
as mudanças, preparados para buscar respostas,
alternativas e propor inovações. Esse é o grande
desafio para a pesquisa neste século, a formação
de cientistas capazes de responder às demandas
concretas da sociedade e a projetar novas formas
de colaboração em que pensar e agir incidam sobre
a capacidade de envolvimento e implementação da
cidadania ativa.
Este artigo tem como objetivo discutir os limites
e possibilidades da colaboração crítica como
perspectiva teórico-metodológica para a pesquisa
Há inúmeras discussões acerca da classificação de pesquisas e dos aspectos metodológicos que aproximam e diferenciam os diversos
tipos de conduta nas pesquisas. Neste artigo não me deterei nesta discussão e recomendo para aprofundamento a leitura de
MONCEAU, Gillles. Transformar as práticas para conhecê-las: pesquisa-ação e profissionalização docente. Educação e Pesquisa,
São Paulo, v. 31, n. 3, p. 467-482, set./dez. 2005. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ep/v31n3/a10v31n3.pdf. Acesso em: 1
jul. 2011.
O grupo LACE, fundado em 2004, focaliza principalmente a formação de educadores e alunos crítico-reflexivos. Inclui pesquisas
de intervenção crítico-colaborativas que investigam a constituição dos sujeitos, suas formas de participação e a produção de
sentidos e significados em Educação. Além disso, visa desenvolver e aprofundar: a) a discussão dos modos como a linguagem está
sendo enfocada nos contextos de formação de professores; b) um quadro teórico-metodológico para o trabalho de intervenção nos
contextos profissionais escolares. Integra duas temáticas centrais: Linguagem, Colaboração e Criticidade (LCC), sob a liderança da
Profa. Dra. Maria Cecília Magalhães e, Linguagem Criatividade e Multiplicidade (LCM), sob a liderança da Profa. Dra. Fernanda
Liberali. Partindo da Teoria da Atividade Sócio-Histórico-Cultural (Vygotsky, Leontiev, Bakhtin), as temáticas consideram: a)
as atividades como formas de transformação da ação do ser humano na vida; b) a pesquisa como uma forma de emancipação
pela perspectiva de ação no/para/sobre/com o mundo. O LCC examina e discute o conceito de colaboração como central para
o desenvolvimento de reflexão crítica na produção de conhecimento sobre questões de ensino-aprendizagem e de produção da
consciência crítica. O LCM aborda questões de formação crítica em contexto mono e bilíngües, em que a linguagem permite a
constituição de Cadeias Criativas (Liberali, 2008) como espaço de formação em que os participantes geram novos significados,
criando uma multiplicidade de possibilidades de participação no mundo.
47
científica. Pretendo apontar as possibilidades de como
tal abordagem aplicada no fazer científico poderia
promover a articulação social capaz de superar os
problemas cotidianos.
Para a consecução deste objetivo organizo o artigo em
dois segmentos. O primeiro em que trato conceituação
da colaboração crítica e o segundo quando discuto a
articulação de uma produção critica e colaborativa na
ciência como alternativa para pluripertença social.
2 Pressupostos para o debate sobre
colaboração crítica
Na esteira de autores como Magalhães (2010), Liberali
(2008), Oliveira (2009, 2010), Ibiapina (2008), dentre
outros, a pesquisa colaborativa visa estudar a realidade
socio-histórica de forma coletiva, compreendendo e
intervindo nos problemas reais advindos de práticas
sociais. Nesse processo, os diversos participantes das
pesquisas trabalham colaborativamente no sentido
de aproximar as preocupações da academia às de um
determinado contexto social em prol da resolução de
problemas determinados pelas práticas sociais.
A agencia social é constitutiva do homem nos contextos
em que se insere o ser humano, como sugerem Marx,
Engels e Lukács, pois o homem é antes de tudo um
ser vivo e que responde a uma dada objetividade para
poder. Porém, o homem não se limita à natureza na
sua forma dada, espontânea, ele cria e recria o mundo
através do trabalho, ou seja, ele se apropria da natureza
e a transforma conforme suas necessidades. Ao passo
que a natureza é transformada, consequentemente,
são alteradas as bases materiais da vida; esse processo
revela-se nas relações sociais aí implícitas.
As ações de colaboração crítica consistem em
promover por meio da negociação compartilhada
situações discursivas em que os sujeitos no agir
dialético possam criar condições que lhes permitam
uma suspensão dos momentos cotidianos fetichizados
e alienados, o que conforme Heller (2000) é objeto da
própria critica social.
Nesse contexto é preciso pensar a ciência não sob
a égide da academia, mas como uma das formas
de constituição do ser humano. A ciência, nesse
direcionamento, torna-se precisamente composto
social que vincula a reprodução subjetiva da
48
experiência acumulada no curso da sócio-história.
A ciência constitui-se então, em ação voltada para
proporcionar que o individuo assimile a forma e o
conteúdo da atividade humana; uma vez que o homem
aprende a ser homem à medida que se apropria da
atividade objetiva no curso da história.
Marx (1987, p. 442) descreve a colaboração como
uma “[...] forma de trabalho em que muitos trabalham
planejando lado a lado e conjuntamente, no mesmo
processo de produção ou em processo de produção
diferentes, mas conexos”, potencializando-se assim,
as capacidades individuais.
Contudo, considero, apoiado no próprio Marx
(1987, p. 129), que trabalhar coletivamente não
pode prescindir da crítica, pois “devido a certa
cegueira crítica, [...] mesmo as melhores inteligências
falham completamente, deixando de ver coisas que
estão à frente de seus narizes”.
A partir desse ponto, observo que as ações de
colaboração articuladas criticamente representam
um fator essencial para a compreensão e possíveis
intervenções na vida cotidiana, pois a cegueira crítica
impede os sujeitos de compreender a complexidade
da vida vivenciada por eles mesmos. Tornando-os,
muitas vezes, também incapazes de visualizarem
alternativas que possam lhes proporcionar caminhos
de superação das situações alienantes do cotidiano.
Nesse contexto, a crítica fornece condições para
superar as ilusões criadas no cotidiano, pois “a crítica
não é paixão da cabeça, mas a cabeça da paixão [...].
A crítica já não é fim em si, mas apenas um meio; a
indignação é seu modo essencial de sentimento, e a
denuncia sua principal tarefa” (Marx, 1987, p. 147).
Transpondo essa visão para a conceituação da
colaboração crítica, posso dizer que ela serve como
instrumento para ampliar as perspectivas e o campo
de visão do cientista no movimento de construção do
objeto a ser observado, constituindo-se como uma
forma de compreender e propor intervenções para
as situações e necessidades vivenciadas na realidade
dentro e fora de determinados contextos, mais
especificamente na escola, nos casos das pesquisas
que realizo. Isto é, ao colaborar criticamente de um
modo planejado, alunos, professores e pesquisadores
podem presenciar a possibilidade de superar
limitações individuais e cotidianas.
Conforme discuto em outro trabalho (Oliveira, 2010,
p. 209), a colaboração não significa cooperação,
tampouco participação, significa oportunidade
igual e negociação de responsabilidades, em que
os partícipes têm voz e vez, geradas por meio da
mútua concordância e de relações mais igualitárias
e democráticas voltadas para o desenvolvimento
de novos conhecimentos, novas compreensões e
possibilidades de ação.
Penso que adotar essas ações, não significa que
o pesquisador deva quebrar todas as hierarquias
estabelecidas na sua área de atuação, mas definir
de forma clara os papéis a serem seguidos por cada
elemento no cotidiano escolar, afinal:
[...] todo trabalho diretamente social ou coletivo
executado em maior escala requer em maior ou
menor medida uma direção, que estabelece a
harmonia entre as atividades individuais e executa
as funções gerais que decorrem do movimento
do corpo produtivo total, em contraste com
o movimento de seus órgãos autônomos. Um
violinista isolado dirige a si mesmo, uma orquestra
exige um maestro (Marx, 1987, p. 447).
Isso assim se configura, pois “os múltiplos modos
de usar as coisas é um ato histórico [...]”, bem como
também o é “[...] a descoberta de medidas sociais
para a quantidade das coisas úteis” (Marx, 1987,
p. 165). Dessa forma considero que a produção
científica torna-se pertinente quando é capaz de situar
toda a informação em seu contexto e, se possível no
conjunto global no qual está inserida. Todavia, para
que todos possam ter voz e vez e de fato participar
da construção da ciência no cotidiano, é preciso que
nos espaços onde se produz ciência, pesquisadores e
agências institucionais sejam conscientes da realidade
– dentro e fora do âmbito de atuação que os cercam.
Como afirma Freire (1987, p. 11) o estudo “é também
e sobretudo pensar a prática e pensar a prática é a
melhor maneira de pensar o certo”. Ainda sobre
essa questão, amparado em Demo (2011), ressalto
que produzir conhecimento não implica retratar ou
copiar a realidade, mas reconstruí-la a partir do olhar
localizado e datado sócio-historicamente. Entender
o outro não é apenas ouvir sua fala ou retratar
conteúdos, mas interpretar, reconstruir a mensagem,
pois o senso compartilhado que temos da realidade
não é produto de cópia, mas uma negociação de
sujeitos, cujos olhares naturalmente diferem em sua
individualidade, subjetividade e cultura, constitutivas
na práxis.
A colaboração tal como a concebo nas pesquisas que
realizei e realizo (Oliveira, 2009, 2010) refere-se à
práxis, à maneira como percebemos nossa atuação
e os motivos que regem nossa prática pedagógica e
a (re) construção da nossa prática educativa. Como
focaliza Gâmboa (1995), apoiado em Vasquez
(2007), a práxis é o fundamento do mundo em que
hoje nos desenvolvemos, e por ser justamente o
fundamento do mundo real que hoje existe, a práxis
proporciona à ciência, ao conhecimento, não só a
sua finalidade como o seu objeto. O conhecimento
não é mera contemplação à margem da prática;
consequentemente, o conhecimento só existe na
prática.
Como postula Vasquez (2007, p. 305):
A práxis opera como fundamento porque
somente se conhece o mundo por meio de sua
atividade transformadora: a verdade ou falsidade
de um pensamento funda-se na esfera humana
ativa. Logo, a práxis exclui: o materialismo
ingênuo segundo o qual sujeito e objeto
encontram-se em relação de exterioridade e
o idealismo que ignora os condicionamentos
sociais da ação e reação para centrar-se no
sujeito como ser isolado, autônomo e não-social.
Portanto, as ações de colaboração crítica privilegiam
processos interventivos, que visam transformar
determinada realidade e emancipar os indivíduos que
dela participam com “ o propósito de transformar as
escolas em comunidades críticas de professores que
problematizam, pensam e reformulam práticas tendo
em vista a emancipação profissional” (Ibiapina,
2008, p. 13). Entretanto, não podemos esquecer
essa atuação coletiva e participativa, colaborativa
e crítica não ocorre sem contradições inerentes ao
seu processo de desenvolvimento, pois como aponta
Lenin (1977, p. 123):
O conhecimento é o processo pelo qual o
pensamento se aproxima infinita e eternamente
do objeto. O reflexo da natureza no pensamento
humano deve ser compreendido não de
maneira “morta”, não “abstratamente”, não sem
movimento, não sem contradição, mas sim no
processo eterno do movimento, do nascimento
das contradições e sua resolução.
A comunidade científica está repleta de contradições,
porque é composta de seres humanos dialeticamente
polarizados. Na trama das relações sociais cientistas
se inserem em campos permanentes e diferenciados
49
de força, influenciando e sendo influenciados
dialeticamente; “quando dois pesquisadores dialogam
, não apenas se comunicam, falam, mas igualmente se
confrontam, disputam espaços e propostas, rivalizam
em suas formulações em uma complexa relação de
forças “ (Demo, 2011, p. 39).
Para que se configure a voz e vez de todos os
participantes nesse movimento científico que se quer
colaborativo e crítico, é preciso criar condições para
que se enalteça o sujeito, afastando-o da condição
de mero espectador. Para isso, precisamos fomentar
discussões nas quais todos possam comparecer
igualitariamente em meio a contradições que se
evidenciam na argumentação, no compartilhamento
e na aprendizagem. Em parte, isso se articula
quando oportunizamos o mínimo do domínio
conceitual necessário à formulação da qualidade
política do debate, que não é adquirido somente no
desenvolvimento das ações práticas do cotidiano.
Antes, esse domínio requer um entendimento do
processo teórico-metodológico das ações traduzido
em práxis múltiplas pautadas na dinâmica das
relações entre os sujeitos e a educação e desses com o
conhecimento em construção no processo.
Entendo que a colaboração crítica como articulação
teórico-metodológica na pesquisa envolve discutir
a construção de vontades coletivas correspondentes
às necessidades que emergem das forças produtivas
objetivadas ou em processo de objetivação, bem
como da contradição entre estas forças e o grau de
dinamismo expresso pelas relações sociais, pois o
cientista, entendido individualmente ou como todo
um grupo social, não só compreende as contradições,
mas põe a si mesmo como elemento da contradição,
elevando este elemento a princípio de conhecimento
e, por conseguinte, de ação (Gramsci, 2001, v. 4).
A seguir, perseguindo esse movimento, discuto
a articulação entre colaboração crítica e o fazer
científico.
3 A colaboração crítica e as
condições da ciência em mundo de
mudanças
O desafio de produzir ciência em pleno século XXI
configura-se na busca da articulação entre conhecimento e o enriquecimento da sociedade com um
50
número crescente de cidadãos comprometidos com a
sua transformação estrutural para que se busque uma
sociedade livre, democrática e participativa; supere
as discriminações na construção de uma convivência pluralista; incentive as várias formas de manifestações culturais e religiosas que propiciem um pleno
desenvolvimento humano.
Entendo que essa produção em um viés colaborativo
e crítico, rompe com um modelo de pensar linear
e lógico, estruturado de forma simplificada e
desarticulado do contexto sócio-histórico e cultural.
Isto é, pensar colaborativa e criticamente um projeto
para ciência é ter em mente a complexidade como
plano de pensamento e ação e permitir que as múltiplas
possibilidades de investigações metodológicas
assumam o valor central que nos permite ver as coisas,
as pessoas e o mundo como partes de um todo amplo.
Ou seja, no processo colaborativo e crítico concebese no plano da investigação que nada que existe de
forma independente e isolada nos contextos sociais
de produção. Tudo está interligado, cada pensamento,
sentimento e ação pode ser compreendido como
objetivação de um conjunto de ideias, valores,
significado e relações que se estabelecem, desenham
e constroem direções e intervenções para o contexto
micro e macro de nosso mundo, de nosso universo.
Nesse viés, produzir ciência aponta para um
movimento que dialoga e se desvela em pluripertença
social, pois ordena ver o mundo como uma rede sóciohistoricamente interconectada e interdependente.
Assim, uma das características marcantes de uma visão
colaborativa e crítica para ciência é que ela propõe
questionar tudo o que até o momento aceitamos
como verdade, seja por nossos hábitos, modo de
vida, modelos de pensamento, ou ainda, nossos
relacionamentos, possibilidades e impossibilidades.
O fazer científico colaborativo e critico concorre para
instauração de um processo de pluripertença social
com vista à formação de cidadãos plenos no sentido
profundo do termo. Isto é, esse fazer científico aposta
no valor heurístico dos eventos cotidianos e se
debruça na sua singularidade simbólica e no interesse
sócio-histórico que possa haver nele. Tudo isso sem a
pretensão de ensinar, revelar, consolidar pensamentos
e sim, como forma de produzir uma microrrelação
social com a linguagem que se quer política, reflexiva,
instigante.
A cotidianidade nesse fazer científico constitui a
base do processo de transformação do individual, do
social e das relações estabelecidas entre os indivíduos
e destes com o meio ambiente numa perspectiva de
formação de uma consciência crítica que depende,
fundamentalmente, de sensibilização, compromisso
ético-político, em observância dos princípios éticos
universais, de políticas públicas e dos processos de
socialização e educação.
É importante esclarecer que no plano colaborativo
e crítico a ciência não está só em função do
cotidiano, mas a partir dele articula processos para
formação de consciência crítica que se dá pelos
desafios que a ela se apresentam, possibilitando-lhe
o descondicionamento das forças alienadoras, a que
estamos submetidos no cotidiano fragmentador e
alienante da sociedade globalizada. O fazer científico
colaborativo e crítico alinha-se além dos limites da
cotidianidade e, justamente, por isso, revela-se na
criticidade, na eticidade, na práxis, na cidadania e na
sensação de pluripertença.
O fazer científico na colaboração crítica instaurase então, como um movimento impulsionador,
processual e de formação de nova consciência
centro de articulação de novas categorias nascidas
das necessidades ambientais, políticas, éticas e
culturais. Assim, a estratégia desse fazer desvela-se
na construção da consciência social crítica que se
reforça ou se desmantela pelo conjunto de ações dos
indivíduos no espaço cotidiano, da vida social real.
Produzir ciência critica e colaborativamente tende
a declarar uma ação transformadora do cotidiano
no contexto sócio-histórico e implica mudanças
significativas no tipo de visão e prática social
quando se pretende formar cidadãos que exerçam
conscientemente sua cidadania. Daí a necessidade de
uma proposta metodológica que construa o sentido
da ação a partir do cotidiano.
A colaboração crítica determina a qualidade da
consciência social ao considerarmos que a cognição,
a socialização e a construção de valores e de uma
4
nova ética fazem parte de um mesmo processo de
pluripertença social. A construção da consciência
social está, portanto, atrelada à relação do interno
com o externo e vice-versa. Entendo, dessa forma,
que esta inter-relação em que se conjugam os
fatores do pensamento e da linguagem como sendo
o fundamento de uma consciência social complexa,
das múltiplas relações que o indivíduo constrói e
estabelece numa perspectiva social, cultural, política,
econômica e planetária.
A meu ver, esse movimento colaborativo e crítico
proporciona a desalienação do cidadão e sua retirada
da invisibilidade social. Por isso mesmo, cada ação
por menor que seja tem uma importância no contexto
e é essa ação contextualizada no cotidiano da pessoa
e da comunidade que estimula a formação de um
cidadão centrado na criticidade.
Em trabalho anterior declaro que a criticidade não
nasce do meu ponto de vista, do meu olhar, depende
do olhar do outro nas práticas sociais (Oliveira,
2010). Logo, essa relação colaborativa e crítica
não exclui o conflito, o confronto de olhares é
necessário para que se chegue à construção de uma
determinada verdade, que não é a minha, mas aquela
construída no compartilhamento de significados
entre os colaboradores. Bakhtin (1993) nos ensina
que a verdade (pravda)4 é que confere realidade ao
pensamento. A assinatura de um pensamento é o que
constitui como ato e que lhe confere validade. Mas
a assinatura não é expressão de uma subjetividade
fortuita, e sim de uma posição. Assinar é iluminar
e validar o pensamento com aquilo que somente do
meu lugar pode-se ver ou dizer.
O fazer científico colaborativo e crítico marca, assim,
o compartilhamento de significados na articulação de
um processo capaz de conduzir a uma transformação
na compreensão dos processos de formação do ponto
de vista do pesquisador quanto da sociedade, quanto
à produção de saberes críticos que desafiam modos
de criar perspectivas na produção de um pensamento
autônomo.
Bakhtin distingue em seu texto, Para uma Filosofia do Ato: válido e inserido no contexto, dois termos para se referir à verdade:
istina e pravda. Istina refere-se à verdade universal, a um universo de possibilidades, à virtualidade do conteúdo do pensamento.
Pravda é verdade singular, o ato de pensar que transforma teoria em ética. A verdade da pravda adquire validade dentro do contexto em que se pensa e da posição a partir da qual se pensa. Nesse sentido, apenas pravda é ato, e ato é pensamento e criação
51
Esse movimento constitui-se como uma experiência
que representa uma forma de desenvolver nos
pesquisadores suas capacidades para compreenderem
melhor o mundo e, assim, atuarem socialmente
de forma ampla, crítica, participativa e adequada
às situações concretas e práticas que envolvem a
interação em múltiplos contextos.
4 Considerações finais
Neste texto, dispus-me a discutir os limites e
possibilidades da colaboração crítica como
perspectiva teórico-metodológica para a produção de
ciência, procurando apontar possibilidades de como
tal abordagem aplicada no fazer científico promoveria
articulação social capaz de superar os problemas
cotidianos.
Ao finalizar estas laudas, questiono-me como
colaborar criticamente amplia as perspectivas do
conhecimento que se desenvolve na pesquisa?
Retomando as discussões do artigo percebo que a
intencionalidade educativa que qualifica a pesquisa
faz dela um espaço articulado e rico de propostas
para ampliar e transformar a vida e a esperança
social. Assim, quando colaboro criticamente no
desenvolvimento da pesquisa crio condições de
confronto com os diversos contextos e com as
necessidades que deles emergem , favorecendo a
perspectiva de um trabalho que enfrenta os desafios
formativos emergentes pela capacidade de ler as
demandas sociais dos novos contextos, ampliando
as possibilidades de novos contatos e confrontos
significativos que levam à superação de preconceitos,
a propostas educativas transformadoras com vistas à
construção de uma sociedade solidária.
Colaborar criticamente no desenvolvimento da
pesquisa viabiliza a pluripertença social, pois
ao legar aos sujeitos voz e vez no processo de
desenvolvimento das ações do conhecimento,
engendramos experiências com diferentes pertenças
e possibilitamos aos envolvidos no processo a
construção de suas próprias identidades a partir de
múltiplas referências.
Todavia, na ciência como na vida, muitas vezes
prefere-se um trabalho solitário, em lugar de
confrontar-se e perseguir trilhas coletivas, justamente
porque olhar colaborativa e criticamente a produção
do conhecimento requer constantes paradas e
correções de rotas nos processos instituídos, que
obriga os sujeitos a reconstruirem o sentido profundo
da realidade que se julgava plenamente conhecida.
Por fim, considero que trabalhar na perspectiva da
colaboração crítica, além de enriquecedor, é, sem
dúvida, estimulante e positivo, pois com o aporte
de todos os envolvidos em um projeto, auxiliamos a
nós mesmos e aos outros a se tornarem protagonistas
da própria história e da procura de uma consciência
critica e coletiva voltada para o bem comum.
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53
A formação profissional e o futebol:
dilemas pedagógicos
Vocational training and football: pedagogical discussions
Alcides José Scaglia
1
Resumo
O presente artigo advém de uma revisão bibliográfica que percorre as teorias da aprendizagem, os
estudos piagetianos, os pressupostos didático-metodológicos interacionistas e as proposituras presentes
nos estudos aplicados das novas tendências em pedagogia do esporte, com vistas à superação do dilema
na formação profissional, frente à hegemonia acrítica do método tradicional de ensino do futebol
pautado em uma metodologia tecnicista. Metodologia esta alicerçada, principalmente, no empirismo, e
que privilegia a cópia e a repetição de movimentos estereotipados em detrimento à imitação e a criação
de ambientes de aprendizagem que facilitem a construção de conhecimentos, por meio de problemas
contextuais advindos dos inúmeros jogos pertencentes à nossa rica e diversificada cultura lúdica. Desse
modo, defendemos que o futebol é passível de ser ensinado, diferentemente do que pensa o sensocomum - o qual se apoia no inatismo -, pois se configura um produto cultural, engendrado por um
processo de constantes ressignificações lúdicas de jogos populares. Por fim, apresentamos, por meio de
uma analogia, uma proposta de aplicação das ideias interacionistas para o ensino do futebol, de forma a
superar o dilema pedagógico estabelecido.
Palavras-chave: Futebol. Formação Profissional. Interacionismo.
Abstract
This article comes from a literature review that covers the theories of learning, Piagetian studies,
didactic and methodological assumptions and propositions interactionists present in applied studies
of new trends in sport pedagogy, with a view to solving the dilemma in vocational training, against the
hegemony uncritically the traditional method of teaching football ruled by a technical methodology. This
methodology is mainly based on empiricism, and which focuses on copy and repetition of stereotyped
movements rather than the imitation and the creation of learning environments that facilitate knowledge
construction, using contextual problems arising out of numerous games that belong to our rich and
diversified play culture. Thus, we argue that football is likely to be taught differently than you think
common sense - which relies on innateness - because it sets up a cultural product, engineered by a
process of constant reinterpretation playful popular games. Finally, we present, by means of an analogy,
a proposed application of interactionist ideas for teaching soccer in order to overcome the dilemma
pedagogical established.
Keywords: Football. Training. Interactionism.
1
54
Doutor em Pedagogia do Movimento, é docente do curso de Ciências do Esporte na Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) da
UNICAMP, onde coordena o Laboratório de Pedagogia do esporte e estudos avançados sobre o Jogo. Desenvolve estudos na área
da Pedagogia do Esporte e Educação Física escolar (é co-autor do livro “Educação como prática corporal” editado pela Scipione),
a partir do referencial teórico da teoria do jogo e da complexidade. E-mail: [email protected]
1 Introdução
São longos os anos de discussão e construção
de hipóteses científicas a respeito das teorias do
conhecimento em Educação, consequentemente
na Educação Física e Esportes. Todavia, apesar do
grande volume de estudos sobre o tema, poucos são
compreendidos, a ponto de modificar o pensamento do
senso-comum, logo muitos equívocos se estabelecem,
e o que é pior, arraigam-se e são transmitidos de
geração em geração, tornando-se verdades absolutas
em nossa sociedade, configurando-se para nós em
um dilema pedagógico.
Por exemplo, podemos destacar os estudos
epistemológicos desenvolvidos por Jean Piaget (1976,
1990, 1987) e colaboradores, escolhido dentre outros
tantos excepcionais interacionistas. Piaget (1990) em
sua vasta obra, resultado de uma vida de pesquisa,
sobre a construção do conhecimento a qual deu azo
à teoria da epistemologia genética, explica como o ser
humano aprende. Então se sei como se aprende posso
a partir desse conhecimento desenvolver um método
para se ensinar.
Desse modo, Piaget não criou sozinho um novo
paradigma em educação. Ele na verdade apoiou sua
teoria nos preceitos básicos que regem o paradigma
emergente (Santos, 2003; Morin, 2006) para
desenvolver suas pesquisas, estudos e trabalhos,
opondo-se aos ditames firmados ao redor do
empirismo ou do inatismo (GARCIA, 2002; BECKER,
2010).
Convencionou-se
denominar
interacionismo
esta nova tendência que busca dar significado e
resposta para intrigante pergunta: Como se adquire
conhecimento? Como se processa as informações no
interior da mente humana que lhe permite construir
teorias, formular conceitos, desvendar enigmas,
resolver problemas dos mais simples aos mais
complexos?
Segundo a tendência inatista (apriorista, ou
racionalista), que concebe o conhecimento como
advindo da natureza humana, o homem já nasceria
determinado geneticamente. Os conhecimentos
para resolver determinados problemas aflorariam
à medida que o indivíduo atingisse determinado
amadurecimento biológico e estímulo externo, logo
esta tendência é determinista a priori (BECKER,
2010; ASSIS, MANTOVANI DE ASSIS, 2010).
Assim, é sem dúvida advinda dos inatistas, ou melhor,
sustentado por essa tendência, a idéia de dom, aptidão
inata para desempenhar determinadas atitudes, o
que acabava por explicar “racionalmente” porque
Pelé jogava tão bem futebol, ou então a sapiência
de Leonardo Da Vinci, as músicas de Wagner ou
Mozart...
A metodologia que se alicerça nessa tendência faz
do professor um simples descobridor de talentos. No
futebol esta visão é ainda muito forte, pois muitos
acreditam no dom (talento nato). Tanto é que uma das
máximas (entre muitas existentes neste universo) é
aquela que expressa o seguinte pensamento: “Quando
se descobre um talento, quanto menos interferir
melhor”. Ou seja, quanto menos intervenções o
técnico fizer para tentar fazer do talento um jogador
melhor só atrapalhará o processo natural.
Já, as teses empiristas, contrariamente, desconsideram
qualquer herança genética, buscando explicar a
aquisição do conhecimento por meio das impressões
que ficarem gravadas na mente humana em
decorrência de uma experiência vivenciada (BECKER,
2010; ASSIS, MANTOVANI DE ASSIS, 2010).
Partindo-se desse princípio, o indivíduo se constitui
um ser vazio que deve ser completado (enchido ou
preenchido) de conhecimentos, através de transmissão
(depósito) unilateral (sem interação) de experiências.
Na prática, é advinda desta tendência a ideia
(disseminada pelo senso comum) de que determinadas
pessoas, ao longo do processo de aquisição do
conhecimento, mostram-se incompetentes para
aprender as respostas dadas para a resolução de
certos problemas a que são expostas, pois segundo
os empiristas todos devem (ou podem) aprender no
mesmo ritmo, tanto é que eram as cartilhas (também
concebidas em meio a essa tendência), que ditavam a
sequência e o ritmo da alfabetização, propagando este
processo como um caminho suave a todas as crianças
de sete anos de idade.
Ao mesmo tempo, em consonância com esta proposta,
são fincados os alicerces da metodologia tecnicista, a
qual parte dos mesmos princípios acima citados, porém
55
acrescem em sua operacionalização a fragmentação
em partes do conhecimento a ser transmitido. Logo,
como exemplos, podemos citar um treinamento
de esporte qualquer, em que o treinador separa o
jogo em movimentos (habilidades/fundamentos
técnicos) e na organização do treinamento prioriza
o adestramento destes movimentos, contudo sem o
contexto de sua realização no jogo. Ele faz isto, pois
parte da ideia de que especializando as partes terá
um todo (jogo) melhor. Esta metodologia é a mesma
que operacionalizava a alfabetização por meio das
cartilhas.
No treinamento do futebol, as pessoas que se dizem
entendidas no assunto, na maioria das vezes são
tecnicistas, pois é óbvio que esta tendência vem a
justificar a presença do ex-jogador como o melhor
treinador. Se se aprende por modelação e transmissão
de um padrão a ser copiado de modo estereotipado, o
melhor modelo só poderia ser o melhor jogador, pois
ele mostrará com perfeição o movimento que deve ser
repetido à exaustão (SCAGLIA, 2011b).
Em meio a estas duas tendências diametralmente
opostas, é concebida a tese interacionista, quem nem
é determinista como a inatista, porém não descarta
os ditames genéticos, nem é funcionalista como as
empiristas, todavia não desconsidera a importância
das experiências ao longo do processo de aquisição
dos conhecimentos (FREIRE, 1998).
Para o interacionismo, o conhecimento é construído
em decorrência das interações do indivíduo (sujeito)
com meio, muitas vezes intermediada por um objeto,
ou melhor, nas palavras da conceituada autora Rosa
(1994, p. 31) a tese “[...] interacionista, reconhece o
conhecimento como resultante das interações do
sujeito (com todas as suas características hereditárias)
com o meio (com todos os seus condicionantes sociais
e culturais).” As teses interacionistas, se se quiser buscar suas
raízes epistemológicas e seus pressupostos filosóficos,
encontrar-se-á suas sementes cravadas no iluminado
século XVIII, sendo então filha dos iluministas que
procuravam defender a idéia de que o homem deveria
se guiar pela razão, e a partir dela criar e recriar o
mundo.
Há quem ousa dizer que as origens de tal tendência
56
são mais remotas ainda, recaindo sobre Sócrates
com sua maiêutica a inspiração de tal tendência.
Entretanto, apesar desses dados históricos, nota-se
que só há pouco tempo que esta tese vem ganhando
espaço no mundo das idéias, principalmente na área
da Pedagogia.
Portanto, é aqui que deve se abrir um parêntese para
explicar que o interacionismo não se limita a um novo
método pedagógico, mas sim a uma nova concepção
teórica, impregnada de preceitos advindo do complexo
paradigma emergente, a qual discorre sobre a forma
como se concebe a aquisição de conhecimento.
Assim, pode-se afirmar que não existe apenas um
método interacionista, mas sim inúmeros, que
são idealizados ao se respeitar a coerência teórica
coadunando com as exigências ambientais.
Esta coerência teórica é contemplada quando no
processo, parte-se do princípio que o indivíduo
(aprendiz) tem necessidades, e estas se constitui
problemas e a partir daí, ao se desencadear processos
de assimilações e acomodações provocadas pelas
situações problemas, o ser/sujeito possa construir
seu conhecimento, mantendo estritas relações com o
meio cultural, evidenciando a equilibração majorante
(PIAGET, 1976).
Quando as crianças têm liberdade para se expressar
– entendendo lúdico como liberdade de expressão
-, vemos claramente o método interacionista sendo
aplicado de forma espontânea (SCAGLIA, 2011a).
A pedagogia da rua que nos ensinou tão bem a jogar
futebol é, intuitivamente, interacionista. Os ricos
ambientes de aprendizagem provenientes das peladas,
gol caixotes, controles, rebatidas, proporcionavam a
construção do conhecimento por meio da interação
do ser com o meio (FREIRE, 2003; SCAGLIA, 1999,
2003, 2011a ).
Portanto, segundo as perspectivas pedagógicas
interacionistas, o conhecimento é adquirido. Sendo
assim, pode-se aprender de tudo, dependendo para
isso apenas o estabelecimento de vínculos afetivos e
significativos (aprendizagem significativa), em meio
à convivência em um rico ambiente de aprendizagem
administrado pelo professor. Logo, conhecer sobre
teorias da aprendizagem passa a ser conhecimento
básico para a formação de qualquer professor, em
especial, aos pretensos professores de futebol, que
ainda são impregnados pelos conhecimentos do senso
comum e das teses empiristas, como sua hegemônica
metodologia tecnicista (SCAGLIA, 1999; 2011b).
2 As mazelas do método tecnicista
Em alguns textos e crônicas pedagógicas que já
escrevi sobre a formação, enfatizei que o Brasil, em
especial, não desenvolve um trabalho de formação
de jogadores, mas sim apostam todas as fichas na
captação (SCAGLIA, 2007a; 2007b).
Ao se preocuparem apenas com a captação denunciam,
mesmo que inconscientemente, uma concepção
inatista em relação à aquisição e construção do
conhecimento. Contudo, ao mesmo tempo quando
se observa as metodologias de ensino e treinamento
desenvolvidas, fica evidente as teses empiristas, ao
adotarem hegemonicamente a metodologia tecnicista.
Quando qualifico uma metodologia de treinamento
tecnicista, estou querendo dizer que sua preocupação
principal se concentra no desenvolvimento e
aperfeiçoamento das técnicas do jogo.
O tecnicista fragmenta o todo (jogo) em partes
(fundamentos técnicos). Cada parte é trabalhada de
forma descontextualizada, objetivando o automatismo
de um movimento fechado.
Por exemplo, um tecnicista aplicaria um treino de
passe dois a dois, cobrando de forma autoritária
que o gesto técnico seja executado com maestria
e em consonância com os padrões biomecânicos;
desenvolveria um treino de chute a gol em fila; um
treino de cruzamento sem defesa; um treino tático
com o time adversário fazendo sombra, um coletivo
sempre com o mesmo número de jogadores em cada
time...
O que se pode notar nestes exemplos de treinamento
é o fato de que se desconsidera a imprevisibilidade
existente no jogo. Adestra-se um movimento de passe,
enquanto que o mais importante seria a ampliação da
capacidade de executar um passe certo em diferentes
circunstâncias (SCAGLIA, 2011b).
O jogo de futebol, como todos os jogos coletivos,
exigem habilidades abertas (Graça, 1995; Garganta,
1995; Bayer, 1994; Grego, Benda, 1998), ou seja,
habilidades que sejam flexíveis e ajustáveis aos
contextos de suas respectivas realizações, pois o jogo
tende ao caos e não à ordem servil.
Mas a metodologia tecnicista não contempla a
desordem. Ela parte do pressuposto: ordem e
progresso. Nunca passaria pela cabeça de um
tecnicista ortodoxo de que o progresso advém do
constante processo de organização engendrado pela
desordem do sistema (SCAGLIA, 2007b).
Assim, o futebol nunca poderia ser ensinado mesmo,
pois jogo é jogo, treino é treino. Não existe relação
direta entre o que se treina e as exigências do jogo.
Não se considera a especificidade do jogo de futebol,
apenas os seus movimentos padrões.
Contudo, não posso ser injusto em dizer que o
método tecnicista é inócuo. Ele é muito eficiente para
hipertrofiar as ações que os jogadores já possuem.
Analisemos este caso: um menino com certo
potencial para se especializar no futebol é descoberto
por um olheiro, ou mesmo “empresário”, na sequência
é encaminhado (condenado) ao confinamento em
um alojamento, lá recebe uma carga excessiva de
treinamentos físicos - hipertrofiando os músculos-,
e em mesma dose treinamentos técnicos e táticos
desenvolvidos por meio de um método tecnicista
- causando “hipotonia” cerebral. Consequência:
forma-se um menino tanque que até faz malabarismo
com uma bola nos pés, porém deficiente no que tange
às adaptações. Logo, mais uma vítima fácil da cruel
seleção natural (SCAGLIA, 2007b). Enquanto que,
o jogo de futebol exige um jogador inteligente que
seja capaz de aproximar cada vez mais pensamento
e ação em situações diversificadas e relativamente
imprevisíveis.
E afirmo que é possível formar este jogador, desde que
se supere o obsoleto método tecnicista, e por meio
de treinamentos consonantes às exigências do jogo,
potencialize-se o aprendizado, permitindo que os
jogadores na especialização possam desenvolver seus
potenciais (e não enterrá-los para o juízo final).
O craque do futuro não será mais o malabarista, mas
sim o que faz arte contextualizada, gerando um novo
57
e contemporâneo futebol arte.
Contudo, são poucos os profissionais formados a partir
dos conhecimentos advindos das novas tendências em
pedagogia do esporte (SCAGLIA, 2011b), as quais se
inspiram nas teorias da aprendizagem interacionistas.
Urge a formação profissional superar o dilema
pedagógico provocado pela abordagem tradicional
de tratamento de tal temática ao longo da formação
profissional, principalmente, quando ainda, é
grande o número de cursos de Educação Física, em
que as disciplinas que tematizam o esporte ainda
se preocupam em ensinar os futuros professores a
jogar o esporte e não a aprender sobre metodologias
de ensino, ou melhor, sobre pedagogia do esporte.
Logo, faz-se premente discorrer sobre ambientes de
aprendizagem.
3 Ambientes de aprendizagem: a
imitação, a cópia e a imaginação
A imitação e a cópia são palavras sinônimas. Mas aqui,
para este tópico de ligação das ideias sobre formação
profissional e o futebol, elas serão diferentes. Uma
diferença sutil, porém determinante para a edificação
do belo e a transcendência do ser humano.
Para os empíricos a metodologia para o sucesso é a
cópia. Parte-se do pressuposto de que se temos um
modelo que apresenta bons resultados, a garantia para
se continuar tendo êxito está na sua fiel reprodução
(BECKER, 2010).
Este paradigma ainda rege o mundo. A maioria
das pessoas, inconscientemente, pensa assim.
Concomitantemente age assim e, ainda mais, espera
que outras assim também procedam.
Exemplos? Tenho inúmeros, para todas as áreas e
gostos. Poderia falar de hábitos, ditados populares,
escolas, modo de produção... Mas, propositadamente,
ficarei no futebol.
No futebol, por exemplo, segundo esta lógica, o
melhor técnico só pode ser o ex-jogador, pois ele é
o modelo. Só ele domina os padrões de movimentos
a ser copiados. Ele mostra como faz e os alunos
copiam. Quem não reproduzir fielmente está errado.
O espelho que é o professor está lá para corrigir os
58
movimentos. Sua função é não deixar que se aprenda
o movimento errado. Seu lema é não deixar acontecer
o que diz o ditado inspirado nas teorias behavioristas:
“pau que nasce torto, morre torto”. Contudo, a cópia
enclausurada no método descrito acima vai contra a
lógica da aprendizagem interacionista, significativa.
A aprendizagem significativa se dá por meio do
que chamo aqui intencionalmente, imitação.
Na imitação o espelho não se encontra à frente, mas
no interior de cada pessoa.
Para melhor entendimento, convido você a se recordar
do seu tempo de infância. Na época em que sua maior
preocupação era a de se transformar no rei da rua. No
maior jogador de bola das redondezas.
Veja como é simples, porém com desdobramentos
complexos e profícuos.
Você, como eu, tinha seus ídolos. Você os via jogar. E
quando algum deles marcava um gol de placa, como,
por exemplo, os gols feitos pelo Brasil na virada frente
à URSS no jogo de estréia da copa de 1982, nascia em
você, como emergiu em mim, o desejo de imitá-los.
Acabava o jogo e ia lá você para o campinho, para
a rua, ou para o quintal, quarto, sala, cozinha,
garagem... enfim, onde fosse possível criar um campo
de futebol (e atesto que todos estes locais acolheram
perfeitamente o meu “Maracumbi”).
Estes campos serviam como palco. Imitava-se
“perfeitamente” os ídolos. Digo perfeitamente entre
aspas, pois o espelho não está mais à frente, como
disse anteriormente, está no interior da mente,
alimentando a imaginação. Sem o espelho, é preciso
trazer a imagem para dentro. No momento em que
ela entra é contaminada pelo eu. O eu a que me refiro
estabelece um filtro que seleciona o que e como as
coisas podem entrar. Assim interioriza-se somente
aquilo que é significativo. Além do que, o eu estabelece
parâmetros autocríticos para a auto-correção.
Se o que é para ser imitado agora está impregnado pelo
eu, logo quando se satisfaz os desejos pela imitação,
a motricidade não mais expressa um movimento
padrão qualquer (muito menos o movimento que
serviu de inspiração), mas sim o meu movimento, ou
melhor, a minha forma e capacidade para interpretar
aquilo que vi, gostei, procurei imitar, imitei e me
satisfiz ao revivê-lo do meu jeito. Desse modo, o meu
movimento passa a ter os meus traços. Estabeleço
meu estilo. Crio as minhas ações. Humanizo o meu
gesto. Produzo cultura. Sou autodidata. Amplio
minha inteligência (FREIRE, 1998, 2002; SCAGLIA,
2005).
Sou como o artista: expresso pela motricidade lúdica
minhas impressões sobre o mundo. Uso a minha
motricidade para transcender e superar as minhas
carências, como diria o professor Manuel Sérgio
(2003).
Por fim, quero com a distinção entre a imitação e a
cópia destacar duas hipóteses. A primeira referente a
como se deu a construção de um estilo peculiar do
brasileiro para jogar futebol, e a segunda, as causas da
premeditada ruína deste estilo encantador e belo.
Na verdade, para mim não são hipóteses, mas
sim, teses. Infelizmente, ainda vejo muitas pessoas
difundindo o método da cópia em detrimento ao
estímulo à imitação. São poucos os que vejo criando
ambientes de aprendizagem que valorizem o eu e
estimulem a imaginação, logo passa a ser conteúdo
básico na formação profissional dos professores de
futebol. Mas, por falar nisto: futebol se ensina?
3.1 Futebol se Ensina
Por mais incrível que possa parecer essa pergunta é um
dos grandes enigmas que pairam na cabeça de muitos
brasileiros. O senso comum, apoiado nas perspectivas
inatistas, diz que, ou os craques já nascem sabendo
jogar, dotado de uma genética privilegiada (o gene
futebol) ou atribuem o talento a um dom divino.
Mas, tudo não passa de folclore, dito popular. O senso
comum não tem compromisso com a verdade, ou
seja, não precisa se justificar. Fala e está acabado: é
verdade.
Já, ao se levar esta discussão para o campo da
ciência, a história é outra, pois o pensamento
científico presta conta de aquilo que afirma. Desse
modo, não cabe apenas afirmar, é preciso explicar o
método: a organização e ordenação de pensamentos
e procedimentos, buscando explicar e justificar a(s)
verdade(s) nas ciências naturais, humanas (sociais) e
abstratas (SCAGLIA, 2008).
Assim, ao me apoiar nas teorias interacionistas
(Piaget, Garcia 2011; Freire, Scaglia, 2003), posso
dizer que o homem é um ser condenado a ser livre, ou
seja, em meio à sua liberdade constrói o seu destino,
produzindo cultura, como na sustenta Jacquard
(1989), em sua obra “Herança da liberdade”. Toda esta liberdade, que o possibilitou alcançar a
evolução atual, é determinada pelo ambiente cultural
que o rodeia. Os pássaros e outros animais vivem
num ambiente natural pouco alterável, mesmo
porque, alterações os levariam à extinção, pois
nascem sabendo quase tudo que precisam para viver,
sobrando-lhes poucas ou quase nulas possibilidades
de aprender novas soluções para sobrevivência.
Já o homem nasce sabendo quase nada para viver
num ambiente cultural muito alterável, portanto, tem
a possibilidade de aprender quase tudo para a sua
perpetuação, como salienta o professor Freire (1998)
em “De corpo e alma”, sua mais densa obra.
A humanidade só se perpetua devido às suas duas
gestações: uma biológica, na barriga da mãe; outra
social, quando sai do ventre materno.
A gestação biológica, primeira etapa da perpetuação
da espécie humana, concretiza-se devido à capacidade,
adquirida em meio às evoluções, de procriar. Nesta
procriação, dois hominídeos, de sexos opostos,
copulam, doando metade de seus patrimônios
genéticos para a criação de um terceiro, que
caracteriza um ser intermediário. Este ser denominase genótipo, que nada mais é que um conjunto de
genes (unidades de transmissão hereditária; situamse nos cromossomos), que, interagindo com o meio
ambiente, condicionam a manifestação de suas
características, resultando no fenótipo (conjunto
das características morfológicas e fisiológicas do
indivíduo). Ao se preestabelecer o fenótipo, durante
a sua coabitação com a mãe, ainda inserido na
gestação biológica, apreende informações que não são
genéticas, mas comportamentais (FREIRE, 1998).
Percebe-se, então, que no ponto de partida, há um
espermatozoide e um óvulo, que contêm todas as
informações necessárias para formar um corpo,
caracterizando um ser biológico. Todavia, como
ressalta Albert Jacquard (1998, 1988) em seus livros
“Todos semelhantes, todos diferentes” e “Elogia a
59
diferença”, isso constitui apenas a matéria-prima: o
corpo. Mas, para sua sobrevivência, não é suficiente
construir um corpo, é necessário, também, formar
um ser: o homem cultural.
E é somente devido a essa magnífica insuficiência
(saber quase nada ao nascer), que lhe garante a
possibilidade de aprender quase tudo ao longo da
vida, e, com isso, homologar sua condição de réu,
condenado a ser livre para aprender.
Estas conexões, que representam um limite para o
inato, realizam-se por intermédio da contribuição
de outros homens, caracterizando-se o adquirido,
a cultura humana. Assim, inicia-se a gestação social
(cultural), que vem completar e solidificar a gestação
biológica, possibilitando a perpetuação da espécie.
O homem, sendo um ser social, impregna e é
impregnado pela sociedade. Para Jacquard (1998,
1988, 2002), ser homem é partilhar da humanitude
acumulada e participar com seu próprio contributo.
Entendendo humanitude como a contribuição de
todos os homens, de outrora ou de hoje, para cada
homem.
Desse modo, o homem está no mundo para se
enriquecer com os atributos adquiridos e construir
novos, que serão passados a outros homens.
Entendendo, logicamente, que estes contributos não
são transmitidos pelo patrimônio genético, pois não
são assimilados em nível biológico, mas, tão somente,
pela cultura.
Na existencialista ideia de Sartre (1997, p. 45),
sintetizam-se as reflexões expostas: “Eu sou homem
feito de outros homens”.
Em meio aos percalços dessa liberdade, o homem
aprendeu atos nefastos, mas também, durante a sua
gestação social, desenvolveu certas habilidades,
que o possibilitaram ser mais, superando-se e
transcendendo-se a cada conquista.
Esse superar-se atingiu todos os campos de atuação
humana, quer seja no âmbito intelectual, no social
ou no motor, ocasionando assim, o aparecimento
dos talentos esportivos, ou seja, pessoas que se
sobressaem sobre outras na prática esportiva.
60
Todavia, o que quero defender, amparado pelas teorias
interacionistas, dentre as quais saliento as piagetianas
(PIAGET, GARCIA, 2011; GARCIA, 2002; BECKER,
2003, 2010; MACEDO, 1994, 2009) é o fato de que
todos somos dotados da capacidade de aprender os
atributos culturais produzidos ao longo dos tempos
pelas diferentes sociedades.
Destarte, sendo o futebol produto da cultura
humana, ele é fruto da humanitude, logo é passível
de ser ensinado. Ser um craque de futebol, já é outra
questão que demanda um aprofundamento neste
tema. Entretanto, o futebol é um esporte que, por ser
coletivo, no qual cada jogador desempenha funções
específicas, um craque será aquele que compreender
mais rapidamente a dinâmica do jogo, sua lógica e as
mais eficazes e eficientes respostas. Não precisando
para isto excepcionais qualidades físicas, fato que é
incontestável em outros esportes, principalmente os
individuais.
Sendo assim, esclarecido que futebol se ensina (em
todos os seus níveis: iniciação, especialização e
profissionalização) cabe agora descobrir como ensinar
(como treinar) e isto será possível através de outra área
do conhecimento: a Pedagogia. Mais particularmente
a pedagogia do esporte, imbricando esforços com as
teorias do treinamento e as teorias da aprendizagem.
4 Considerações finais ou aprendendo
futebol a partir de uma aula de
culinária
Rubem Alves (2011) sempre nos apresenta inúmeros
saborosos textos. Frequentemente, constrói metáforas
relacionando culinária e educação. Em seu “Variações
sobre o prazer”, por exemplo, ele explicita as ideias de
Roland Barthes, dizendo: “Barthes, agora, esquecido
e desaprendido, adota a ontologia das cozinheiras.
Mas que absurdo é esse, dizer que cozinheiras têm
ontologia, como se elas fossem filósofas?!” (ALVES,
2011, p. 140).
Sem muitas pretensões e com pouca competência perto
do mestre supracitado, quero também experimentar
construir um texto culinário pedagógico, almejando
discorrer sobre metodologias de ensino a partir da
receita de um bolo de chocolate.
Quanto relaciono culinária à aprendizagem, logo me
vem à mente como seria uma aula em que os alunos
deveriam aprender sobre bolo de chocolate, seguindo
procedimentos metodológicos advindo das teorias
empíricas.
A aula seria mais ou menos assim: a professora, única
dona da verdade, começaria sua aula desconsiderando
as possíveis experiências gustativas e conhecimentos
que os alunos já possuíam a respeito de bolo de
chocolate. Como ela é detentora da receita verdadeira,
e a única a ter o modelo, transcreve-a na lousa para
que todos copiem fielmente.
Após a cópia da receita, os alunos são encaminhados
à cozinha experimental para que cada um faça o seu
bolo (seguindo a receita da professora). E, à medida
que os bolos vão ficando prontos, a professora vai
degustando. Se o gosto, a textura, o recheio, o cheiro,
a cobertura..., estiverem idênticos ao dela, estes
alunos estão aprovados. Os que não atingirem esta
meta, estabelecida pela professora, são encaminhados
para a recuperação ou mesmo à retenção. Ou seja,
ao final do processo temos como consequência o
estabelecimento de um padrão uniforme, previsível,
redutível e invariável; um gosto único de bolo de
chocolate com defeito zero de fabricação. Um bolo
de chocolate com o selo de qualidade da ciência
positivista.
Já se esta mesma aula de culinária fosse desenvolvida
por meio de uma metodologia interacionista,
teríamos outro processo e, concomitantemente,
outros produtos.
Vejamos: primeiramente, uma professora de culinária
partiria do princípio básico de que todo mundo
já comeu um bolo de chocolate e de que existem
inúmeras receitas de bolo com variações de sabor.
Assim, a professora se preocupa com a realização
de uma pesquisa prévia, em que os alunos deveriam
pesquisar diferentes tipos de receitas de bolo junto a
sua família, de modo a conseguir entender o processo.
Depois é que cada aluno iria fazer a sua receita (a que
pesquisou) de bolo de chocolate no forno da escola. O
professor também deve compartilhar sua experiência,
confeitando sua receita (que deixa de ser a receita
para ser mais uma receita).
Com os bolos prontos, iniciam-se as trocas de
pedaços com os demais alunos da sala. A tarefa do
professor neste momento é a de mediação. Ele é
responsável por mediar os câmbios, até que todos
tenham experimentado todos os diferentes gostos de
bolo de chocolate.
Outra função da professora é cria um ambiente
de aprendizagem, de modo que, os alunos fiquem
atentos e sensíveis aos diferentes gostos, aprendendo
a degustar o bolo com calma, apreciando o paladar, e
não apenas, se preocupando em saciar a fome. Seria
uma aula sobre análise sensorial, que depois este
aprendizado poderá ser transferido à vida cotidiana
ao se apreciar outros alimentos ou mesmo bebidas.
As diferenças de receita e, consequentemente, no que
tange gosto, cheiro, recheio, cobertura..., acontece
devido ao fato de que cada aluno vem de uma região
diferente, ou mesmo, sem sair da sua região sofre a
influência direta e indireta de diferentes ambientes
relacionáveis.
Ao final do processo (projeto) de aula a professora
ainda se preocupa em desenvolver mais ambientes de
aprendizagem propícios à construção coletiva de uma
receita de bolo de chocolate da classe. Um bolo único,
singular, irredutível, que terá um pouco do gosto de
cada um dos alunos, juntamente com a do professor
que deverá ser oferecido à degustação de todos os
pais, avós e outros que contribuíram com as pesquisas
iniciais.
É uma forma de retribuição às pessoas e à sociedade,
por tudo aquilo que está aí, solto em nossa cultura
para ser apreendido e que precisa ser constantemente
ressiginificado pelas novas gerações, ganhando mais
vida e força a cada processo desencadeado e finalizado.
Sendo assim, os alunos, além de terminar o projeto
com um amplo, diversificado e saboroso conhecimento
significativo construído aprenderam a aprender, ou
seja, aprenderam que são sujeitos históricos capazes
de produzir conhecimento, ao mesmo tempo em que
são responsáveis por tudo aquilo que fazem.
Entretanto, onde e como entra o futebol nesta história
e a formação profissional?
A resposta é muito simples: troquem o conteúdo bolo
61
de chocolate por futebol e mantenham as funções do
professor, que apenas substituirá o conteúdo.
A metodologia tecnicista, em que, por exemplo,
os jogadores ficam um de frente ao outro trocando
passes, ziguezagueando cones, ou mesmo o clássico
exemplo do chute a gol em fila, reproduzindo modelos
(estereotipados), produzem jogadores dependentes
de uma verdade apenas, e na maioria das vezes, de
forma indigesta (ninguém gosta de comer mais que
um pedaço).
Essa verdade é apresentada pelo modelo (o professor),
que sabe da técnica, mas não sabe de seus porquês e
de seus contextos. Desse modo, esta metodologia só
pode formar exímios malabaristas com a bola nos
pés (de um leque pequeno de variações), além de
impedi-los de entender a lógica do jogo de futebol
(conhecimentos táticos).
Por sua vez, com uma aula de futebol em que a
metodologia seja pautada nas proposituras das teorias
interacionistas, cria-se ambientes de aprendizagem
que ampliam sobremaneira as possibilidades de
realmente formar um jogador inteligente de corpo
inteiro.
quais querem dominar e sufocar a revolução pacífica,
advinda do aumento da inteligência e auto-estima da
sociedade.
Portanto, como Alves (2011, p. 46) disse podemos
aprender com a ontologia culinária:
As cozinheiras trabalham com efeitos sensíveis:
o prato tem de ser gostoso; o prato tem de ser
cheiroso; o prato tem de ser bonito; o prato tem
de ser excitante ao tato – por isso a pimenta
[...] Quando uma cozinheira pensa-cozinha ela
leva em consideração a totalidade dos efeitos
práticos que o prato que ela está preparando irá
ter sobre aquele que vai degustá-lo. Ela pensa a
partir da boca, elabora uma ontologia do gosto.
Sendo assim, a formação profissional em Ciências
do Esporte, Educação Física, e particularmente,
no futebol devem refletir sobre metodologias, ou
seja, devem deixar evidentes os objetivos (para
os diferentes cenários de atuação profissional),
os conteúdos, os métodos (respaldados por uma
teoria da aprendizagem, a qual balizará as condutas
pedagógicas), a avaliação e o currículo (o qual agrupa
todas as teorias que consubstanciarão as práticas
pedagógicas), superando o dilema pedagógico aqui
evidenciado.
Este jogador não só aprenderá futebol, e bem, quanto
aprenderá conhecimentos para sua emancipação e
libertação das amarras que nos aprisionam junto à
mediocridade dos conformados e reacionários, os
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64
Atividade docente de professores universitários:
Reflexões crítica em contexto colaborativo
Teaching activities of university teachers: critical thinking in a
collaborative context
1
Ivana Maria Lopes de Melo Ibiapina
RESUMO
Este artigo apresenta contexto de colaboração em que professores universitários refletem criticamente
sobre a atividade docente, sobre o sentido e o significado de ‘ser professor universitário’. A pesquisa
realizada retrata o percurso reflexivo de professores universitários no contexto da pesquisa colaborativa
desenvolvida com base nos princípios teórico-metodológicos da Teoria da Atividade Sócio-hitóricocultural (TASHC). As reflexões realizadas são dirigidas ao compartilhamento do significado de docência
como profissão. Dividimos este texto em quatro partes, na primeira, revelamos o porquê da escolha do
enredo, destacando o contexto teórico e as questões que direcionaram a montagem do texto; na segunda,
discutimos porque pesquisar colaborativamente e apresentamos os instrumentos utilizados para a
produção dos enunciados: a entrevista e a sessão de reflexão; na terceira parte, apresentamos a análise do
processo reflexivo e colaborativo. Na síntese final, relatamos, de forma sucinta, os sentidos e as práticas
enunciadas no que se refere ao sentido e significado da atividade docente para o grupo que participou
deste estudo.
Palavras-chave: Reflexão crítica. Colaboração. Professores universitários.
ABSTRACT
This article presents the context of collaboration in which university teachers to reflect critically on
teaching activities, on the meaning and significance of ‘being a university professor. “The survey captures
the reflective journey of university teachers in the context of collaborative research developed based
on theoretical and methodological principles of Social and Historical Cultural Activity (TASCH) . Our
reflections are aimed at sharing the meaning of teaching as a profession. We divide the text into four
parts, first, to reveal the reason for choosing the plot, highlighting the theoretical context and the issues
that have driven the assembly of the text, in the second, because we discuss collaborative research and
present the instruments used for the production of statements: interviewing and brainstorming, the third
part we present the analysis of reflective and collaborative process. In the final synthesis report, briefly,
the meanings and practices set out in relation to the meaning and significance of teaching activity for the
group that participated in this study.
Keywords: Critical thinking. Collaboration. University teachers.
1
Doutora em Educação. UFPI/PI-PROCAD(CAPES) Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte UFRN. Mestre em Educação pela Universidade Federal do Piauí - UFP. Graduada em Pedagogia e em Ciências Econômicas pela
Universidade Federal do Piauí. Professora titular da UFP, Centro de Ciências da Educação, Departamento de Métodos e Técnicas
de Ensino e do Programa de Pós-Graduação em Educação. Coordenadora da base de pesquisa FORMAR. Desenvolve estudos e
pesquisas com base no referencial teórico e metodológico da Teoria Sócio Histórico Cultural - TASHC e da pesquisa Crítica de
Colaboração PCCol. E-mail: [email protected]
65
1 INTRODUÇÃO
Neste artigo, as discussões selecionadas fazem parte
do acervo de informações produzido no decorrer
da pesquisa colaborativa desenvolvida no Curso de
Doutoramento realizado na Universidade Federal do
Rio Grande do Norte (UFRN), no ano de 2004, sob
a orientação de Maria Salonilde Ferreira (IBIAPINA,
2004). O excerto analisado foi extraído do banco de
dados desta pesquisa, gravado em áudio e vídeo e
transcrito para compor o acervo da referida pesquisa.
Com o objetivo de compreender como se constituem
as relações entre a aprendizagem da docência e o
desenvolvimento do ‘ser professor’ na universidade,
organizei sessões reflexivas que proporcionassem
condições para que os professores dividissem com
os pares os conflitos vividos durante a atividade
docente, bem como as possibilidades que criam
de superação desses conflitos. Para que, de forma
colaborativa, compartilhassem as histórias de suas
vidas profissionais.
A sessão reflexiva que compartilho foi analisada com
base no referencial teórico-metodológico da Teoria
da Atividade Sócio-histórico-Cultural (TASCH),
principalmente no que se refere à análise da produção
de subjetividades de professores na interface com o
contexto histórico-social da universidade. A categoria
principal escolhida para a produção das compreensões
foi o trabalho docente como atividade. A compreensão
central que formulamos está ancorada na idéia de
que o lugar que o professor universitário ocupa, na
vida e no mundo do trabalho, decorre dos sentidos e
dos motivos produzidos para desenvolver ações em
contextos interativos concretos do mundo social.
A escolha por compreender como se processa a
produção de sentidos e significados relacionados
à docência com professores universitários foi
marcada pela leitura sobre a formação de professores
universitários, temática que vem se constituindo em
preocupação marcante nas pesquisas educacionais
desde a primeira década do século XXI (MASETTO,
2000). A exploração do tema se justifica em virtude
da lacuna que existe sobre as complexas questões que
envolvem o pensar e o agir do professor universitário.
A importância deste trabalho também se define
na medida em que o professor universitário,
desde 1990, sofre pressão para se qualificar na área
66
educacional, principalmente, nos aspectos didáticos
e pedagógicos. É marcante a presença na educação
superior, principalmente, nos cursos de bacharelado,
de profissionais que exercem a docência sem ter
vivenciado processos formativos na educação. Alguns
docentes apresentam apenas a experiência profissional
na área em que atuam e outros não possuem nem
mesmo essa experiência, já que são professores que
ingressaram na universidade, logo após conclusão de
cursos de especialização e/ou curso de pós-graduação
stricto sensu (IBIAPINA, 2002).
Considerando os aspectos mencionados, o professor
desempenha a função docente sem formação para
exercer a atividade de ensinar. O aspecto mencionado
é decorrente da própria estrutura organizativa das
universidades que incentiva os professores a se
preocuparem mais com a formação específica da
área de formação inicial do que com o investimento
pessoal e profissional em educação contínua que possa
dar conta da atividade docente. Para compreender
o significado da atividade docente, bem como da
formação necessária ao desenvolvimento dessa
função, farei, inicialmente, discussão teórica sobre a
categoria atividade, na perspectiva da TASCH.
2 CATEGORIA ATIVIDADE NA PERSPECTIVA
DA TEORIA DA ATIVIDADE SÓCIO-HISTÓRICO-CULTURAL
Para compreender o significado de atividade, no
contexto da TASCH, discuto o significado da categoria
atividade, recorrendo às explicações de Marx (2005),
Vygotsky (2001), Leontiev (1978) e Engeström (1999).
A compreensão do significado de atividade é basilar
na TASCH. Diferentes versões sobre o que é atividade
emergiram nos países do ocidente, a partir das idéias
marxista-leninistas ligadas à categoria atividade.
Estudos contemporâneos (século XX e XXI) propõemse a investigar o problema da atividade e da relação
entre atividade e consciência humana, bem como a
definir o papel e o lugar do significado da atividade
na psicologia e na educação (ENGESTROM, 1999;
IBIAPINA, 2004).
Atividade, em sua interpretação materialistadialética, é base da vida social da humanidade. A
base da existência humana, a forma primária na qual
está a produção de instrumentos. Para transformar
a realidade, o homem produz instrumentos que são
usados para fazer objetos e satisfazer as necessidades
vitais humanas.
A produção de instrumentos tem natureza
universalmente transformadora e social. De acordo
com Marx (2005), a atividade existe na forma
diretamente coletiva e individual quando o homem
age como ser social, transformando a natureza e a si
próprio por meio dos instrumentos. Nesse sentido, a
atividade é categoria que determina as características
da existência social do homem.
Com base nas compreensões formuladas por Marx
(2005), Vygotsky (2000) explicou a atividade do
homem, relacionando-a ao uso de instrumentos
psicológicos. O autor destaca que a atividade
humana é mediada pelos instrumentos, cujo papel
fundamental cabe a linguagem (fala). O autor
defende que os sistemas simbólicos são responsáveis
pela transformação das funções mentais superiores
e pelo desenvolvimento da condição humana. A
categoria central no pensamento de Vygotsky (2001)
é o sentido/significado da palavra no processo de
constituição dos indivíduos.
Partindo das concepções vigotskiana, Leontiev (1978)
elabora a Teoria da Atividade e explica que o uso de
instrumentos, normalmente, reflete as experiências
de outras pessoas que tentaram resolver problemas
em dado momento histórico e, para isso, inventaram
ou modificaram os instrumentos culturalmente
produzidos. Esta experiência é acumulada tanto nas
propriedades estruturais do instrumento (forma,
material, signo e símbolo) quanto no conhecimento
de como ele é usado. Esses conhecimentos são
passados de geração a geração, sendo aperfeiçoados
constantemente. Assim, ao longo do processo sóciohistórico, a criação de instrumentos transformou o
desenvolvimento da atividade, bem como o próprio
processo de desenvolvimento da espécie humana.
Leontiev (1978) foca seus estudos na compreensão
da atividade prática humana. Nesse sentido, defende
que a estrutura psicológica da atividade possui os
seguintes componentes: necessidade – motivo –
objetivo – condições para atingir o objetivo (a unidade
do objetivo e as condições que delineiam o problema)
- ações e operações. O homem atinge determinado
objetivo em certas condições (ou resolve o problema),
executando ações e operações (cada ação possui
operação correspondente dependendo do problema).
Para o desenvolvimento de determinada atividade,
é necessário que haja determinado motivo que se
originou da ação prática do homem. Atividade e ação
não coincidem, quando motivo e objetivo coincidem,
há atividade, quando não, há ação.
Esse processo é explicado da seguinte forma:
os indivíduos, movidos por necessidades, por
motivos, buscam resolver problemas, traçam
objetivos mediados por ferramentas e símbolos e
em colaboração com os outros, desenvolvem ações
e operações para resolver o problema e atingir os
objetivos almejados, quando objetivo e motivo
coincidem há atividade. Leontiev (1978) considera
que os componentes básicos das atividades humanas
são as ações, que surgem na relação não coincidente
entre o objetivo e o motivo. Nessa perspectiva, ação é
processo cujo motivo não coincide com seu objetivo
(isto é, com aquilo para o qual ele se dirige), mas
reside na atividade da qual faz parte.
A atividade humana é produzida por meio das ações.
As ações são desenvolvidas por meio de operações condições que são dadas para a sua concretização. A
distinção entre ações e operações emerge quando o
autor conceitua operação como o modo de execução
de determinada ação, conteúdo necessário de qualquer
ação. Considerando essa diferença fundamental,
determinada ação pode ser executada por diferentes
operações e, inversamente, recorrendo à mesma
operação se realiza diferentes ações.
Isso se torna possível porque a ação é determinada
pelo seu fim, enquanto as operações dependem das
condições em que é dado esse fim. Isto é, os indivíduos
executam determinada ação, utilizando de operações
diversas para concretizá-la e, embora os modos
de execução, isto é, as operações executadas sejam
diferentes, a ação é a mesma. É preciso ressaltar,
que as emoções são elementos que precisam ser
considerados quando se aborda a categoria atividade,
pois elas cumprem a função de captar os sinais
externos, internalizando-os como motivos. Para
Leontiev (1978), a vontade e as emoções refletem as
relações existentes entre as necessidades do indivíduo
e as possibilidades que ele tem de realizar com êxito
determinada atividade que corresponda a essas
necessidades. Dessa forma, as emoções surgem como
67
elemento mediador entre a realidade, o motivo e o
objetivo, isto é, a valoração racional das ações.
No início do século XXI, as explicações elaboradas por
Vygotsky (2000) e Leontiev (1978) são expandidas por
compreensões como as Engeström (1999), que propõe
a explicação das Redes de Sistemas de Atividade (fig.
1).
Artefato mediador
Artefato mediador
Objeto 1
Objeto 1
Regras Comunidade
Divisão de trabalho
Objeto 2
Objeto 3
para as ações de negociação de sentidos e de
compartilhamento de significados (colaboração);
3º princípio: o sistema de atividade é
compreendido
na
dimensão
histórica,
construindo-se e transformando-se no decorrer
das atividades;
4º princípio: as contradições são consideradas
condições de mudança e desenvolvimento. As
contradições geram conflitos que impulsionam as
tentativas de renovação e mudanças do objeto e
dos motivos;
5º princípio: há possibilidade de transformações
expansivas no sistema de atividade. Esse ciclo
de transformação é entendido como produção
coletiva que se realiza por meio da criação da
Zona de Desenvolvimento Proximal.
Regras Comunidade
Divisão de trabalho Com base nas explicações do referido autor,
destacamos o papel do conflito no surgimento
Figura 1- Rede de Sistemas de Atividade na perspectiva
de motivos que levam ao agir transformador e ao
Sócio-Histórico-Cultural
desenvolvimento colaborativo entre indivíduos, no
Fonte: Engeström (1999)
caso deste estudo, entre professores universitários que
Para Engeström (1999), a fig. 1 representa a com- refletem criticamente sobre a docência em contexto
preensão de como as atividades se expandem, for- organizado para que ocorra colaboração.
mando rede de sistemas de atividades em constante
interação. O autor explica que no desenvolvimento Considerando as explicações de Marx (2005),
de determinadas atividades há ciclos expansivos da Vygotsky (2000), Leontiev (1978) e Engeström
atividade em decorrência de aprendizagens expansi- (1999), trabalho com os professores em vez de falar
vas, que ocorre quando os indivíduos questionam as sobre eles. O processo de pesquisar se concretiza por
práticas aceitas, estabelecendo o conflito que leva à meio da colaboração desenvolvida entre professores
transformação da prática decorrente desse questiona- e pesquisadores em contextos organizados para que
mento que provoca novas necessidades e motivos. os envolvidos expandam conhecimentos, idéias,
O desenvolvimento (a expansão) ocorre quando as representações e valores, quando são trazidos à
contradições são superadas. Na visão de Engeström tona sentidos para serem negociados, analisados e
(1999), nos sistemas de atividade, as contradições in- interpretados, promovendo o compartilhamento de
fluenciam a formação e definição do motivo/objeto significado.
da atividade e promovem transformações nas práticas
A partir dos entendimentos expostos, conforme
humanas.
propõe Marx (2005), apresento o excerto da pesquisa
Na tentativa de explicitar como esse processo é que parte da vida vivida por professores que atuam
desencadeado, o autor formula cinco princípios que na educação superior e dos seus discursos sobre a
auxiliam no entendimento da perspectiva teórica atividade de ensinar na universidade.
ilustrada acima:
1º princípio: a unidade primária de análise é 3 NARRATIVAS PROFISSIONAIS:
o sistema de atividade coletivo, orientado para DISCUTINDO SOBRE O TRABALHO
determinado objeto e mediado por instrumentos; DOCENTE
2º princípio: por trás de determinado sistema de
atividade há uma comunidade de múltiplos pontos Na pesquisa que relato, a escolha de partir das
de vista, tradições e interesses. Essas diferentes subjetividades produzidas na interface com o mundo
posições criam o espaço de tensão necessária social é decorrente da leitura de Nóvoa (1988, p. 126)
68
e da sua defesa de que no processo de formação se
deve conceder atenção especial à vida do professor,
pois o saber de referência dele está ligado às suas
experiências e à sua identidade como docente.
Conforme denota na colocação: “O adulto em situação
de formação é portador de uma história de vida e de
uma experiência profissional; as suas vivências e os
contextos sociais, culturais e institucionais em que
as realizou são fundamentais para perceber o seu
processo de formação.”, ao que acrescento: e também
a expansão do aprendizado da docência.
(PESQUISADORA): Você poderia explicar isso
melhor?
Nessa perspectiva, Dominicé (1988) recomenda
que a formação do professor parta da construção
da subjetividade do profissional, haja vista que sua
formação está, indissociavelmente, ligada à produção
de sentidos sobre vivências e sobre experiências de vida.
Nesse sentido, ressalto a importância de o professor
formador agregar aos instrumentos de pesquisa à
possibilidade de os professores compartilharem os
momentos vividos nas suas trajetórias profissionais,
partilhando aprendizados profissionais.
(CONCEIÇÃO): E aí? Você não está dizendo tão
certinho? Como não sabe fazer?
As narrativas expressam o efeito que tem a voz do
professor no processo reflexivo crítico, bem como
trazem à tona as falas sobre o trabalho docente
que denotam a produção de compreensões sobre
a complexidade da tessitura do ‘ser professor’,
especialmente ao ser professor universitário. Os
saberes que apresento neste artigo são fruto do
processo reflexivo crítico e colaborativo produzido
pelos professores participantes do grupo colaborativo
de minha tese de doutoramento.
(POLLYANNA): Refiro-me à pesquisa não no
sentido de estratégia de estudo, mas no sentido
de sua aplicabilidade no contexto de sala de aula,
com os meus alunos, fazendo-os realmente investirem no ato da pesquisa como forma deles
aprenderem a pensar, a delimitar questões, sistematizar idéias, procurar responder questões
com o respaldo teórico e prático. Enfim, despertar a disposição, o olhar investigativo sobre
a realidade deles.
(POLLYANNA): Eu considero que este é um
desafio, para mim, ainda representa uma dificuldade trabalhar com a pesquisa.
(PESQUISADORA): Porque você acha que é um
desafio, esclareça melhor o que significa essa dificuldade?
(POLLYANNA): Refiro-me à pesquisa não no
sentido de estratégia de estudo, mas no sentido
de sua aplicabilidade no contexto de sala de aula,
com os meus alunos, fazendo-os realmente investirem no ato da pesquisa como forma deles
aprenderem a pensar, a delimitar questões, sistematizar idéias, procurar responder questões
com o respaldo teórico e prático. Enfim, despertar a disposição, o olhar investigativo sobre
a realidade deles.
(CONCEIÇÃO): É isso aí, continuo achando
que você sabe o que está dizendo...
A construção social do que é e como se faz pesquisa
na universidade passa do plano externo, quando os
professores atribuem sentidos aos significados ao
socialmente construídos, ao plano interno, quando
o significado é internalizado e o novo sentido passa
a regular as ações dos docentes na universidade.
Percebo isso quando retomo os enunciados das
professoras e encaminho a discussão para o agir do
professor, conforme demonstra a discussão que segue.
Para favorecer o processo de discussão sobre
o desenvolvimento da atividade docente na
universidade, a pesquisadora (que sou eu) questiona
sobre as possibilidades que a pesquisa traz para
o desenvolvimento das situações de ensinoaprendizagem no contexto universitário. Refletindo
sobre a questão formulada, a Professora Pollyanna2
compartilha com o grupo o conflito que vive no
processo de trabalho para articular ensino e pesquisa,
Os sentidos negociados no excerto anterior são
conforme ilustra o excerto que segue:
expandidos pelos Professores Capitu, Anna Flora e
(POLLYANNA): Eu considero que este é um
Milka, que trazem à tona outras questões importantes
desafio, para mim, ainda representa uma dificulcomo a ação de planejar e a importância da formação
dade trabalhar com a pesquisa.
específica para trabalhar, articulando ensino e pesquisa.
2
Os nomes dos colaboradores foram escolhidos por eles próprios para serem reconhecidos ao longo da pesquisa.
69
As intervenções dos professores referidas revelam
o potencial das explicações e dos posicionamentos
assumidos no contexto colaborativo para que
ocorra a produção do significado compartilhado
da atividade docente. Os diferentes pontos de vistas
dos professores esclarecem as reais dificuldades em
trabalhar a pesquisa de forma articulada ao ensino.
Capitu criou contexto colaborativo de reflexão crítica
quando se refere à articulação pesquisa-ensino:
(CAPITU): Não sei se vai ajudar [...]
(longa pausa)
(Silêncio: todos os presentes na sessão ficam calados, aguardando).
(CAPITU): Basicamente, gostaria de destacar o que
a Polyana já disse, a pesquisa é uma questão importante, devemos pensá-la como investimento, como
o diferencial do nosso trabalho. Não adianta entrar
em nossa sala de aula e sair de lá como se tudo estivesse muito bem. Acho que o que está por trás de
tudo isso é a questão do planejamento. Necessitamos parar, ter tempo para pensar e planejar, sem antes ter planejado, sem antes ter parado para pensar:
o quê eu posso fazer? Não resolve, não.
(ANNA FLORA): É isso mesmo, agora para planejar
nesses moldes que você coloca, acho que só se pode
mudar a prática de planejar e a postura na sala de
aula, a partir do momento que procuramos investir
na nossa formação. Como trabalhar a pesquisa com
meus alunos, se não me sinto suficientemente preparada para isso?
(MILKA): É isso mesmo, para ensinar, é preciso
planejar, pensar no como, e para trabalhar com foco
na pesquisa isso é fundamental. Assim, entendo que
falta qualificação, falta tempo para pesquisar, mas
considero também que a base para o ensino é a pesquisa. É preciso encontrar o caminho...
(É interrompida por Capitu)
(CAPITU): É, concordo. A pesquisa qualifica o ensino e o professor melhora o processo de ensinoaprendizagem, melhora você, pessoalmente e profissionalmente. A questão central é como fazer isso?
(POLLYANNA) (responde pensativa): Essa é a dificuldade que falei antes, como fazer com que você
melhore o ensino, melhorar nisso é fundamental.
O que tenho de fazer para melhorar? Aí é que está
como posso fazer? Como já foi colocado pelos colegas, um dos instrumentos é a pesquisa.
(PESQUISADORA): É isso. Vejo a pesquisa como
uma atitude a se cultivar tanto como prática dos
70
professores quanto dos alunos, pois pesquisar
não é só aquele trabalho formal, acadêmico com
rigorosa elaboração, mas uma questão de desenvolvimento da capacidade de problematização
do real e das práticas cotidianas, do espírito
crítico e reflexivo e isso não e fácil, realmente é
preciso aprender como fazer isso, porque não fomos formados para fazer isso.
Com essa colocação da pesquisadora, a discussão
muda de foco e passa a centralizar nas razões para
pesquisar. Essa discussão parece relevante para
que os professores compreendam que as questões
não têm como foco testar seus conhecimentos,
mas proporcionar condições para que possam
desenvolver trabalhos futuros como organizadores
de outros processos de produção compartilhada de
significado. Além disso, a discussão foca nas ações
que proporcionam o desenvolvimento do processo de
ensino-aprendizagem profissional.
(SCARLET): Além disso, considero que trabalhar com a pesquisa é também manter um
diálogo constante com a prática, é ter postura
teórico-metodológica que auxilia a melhorar
nosso ensino.
(KEYNES): Realmente, um aspecto que considero importante no trabalho com a pesquisa é que
ele me dá oportunidade de refletir sobre a minha
prática e de me fazer rever conceitos e atitudes
que levam a melhoria do ensino. É isso que também acho.
(ANNA FLORA): Também concordo, acho a
pesquisa um ponto fundamental para o exercício docente, mas eu acho muito difícil fazer
isso com as condições que a gente tem. A gente
prega muito, fala muito, entende? Mas na hora,
na prática é difícil romper com o modelo na
qual fomos formados. Não é que não é possível
mudar, isso é, tenho certeza que é sim possível.
Esse medo de mudar é conseqüência da nossa
própria formação que foi muito tradicional e na
qual só jogavam conhecimentos para a gente e a
gente recebia sem questionar, sem refletir muito.
Eu acho que esse modelo ainda é muito forte na
nossa prática, acho que ainda temos muito que
aprender, mas acredito também que estamos
no caminho certo, a pesquisa e a reflexão são
atitudes que podem romper com esse modelo e
fazer com que nossas ações sejam profissionais,
rompendo com o modelo clássico de docência
que só desmerece nossa profissão.
(PESQUISADORA): Concordo com vocês, é
por meio da pesquisa que construímos conhecimentos e crescemos profissionalmente. O
exercício reflexivo também ajuda muito nesse processo e não é qualquer processo reflexivo, não, é um
processo que nos faça compreender o que fazemos,
para que possamos fazer melhor, romper, como já
disse antes com o modelo de nossa formação, não é
fácil, mas é possível por esse caminho que estamos
discutindo. Mas acho que temos que considerar um
elemento que ainda não foi abordado por vocês, é o
isolamento do professor universitário e não é como
ele que vamos conseguir romper com esse modelo,
com o medo de expor nossas dificuldades e nossas
descobertas aos colegas, ficamos isolados, achando
que os problemas que vivemos na sala de aula são só
nossos e acho que é na troca, no ambiente colaborativo com os colegas que vamos avançar.
(é interrompida por um professora que faz uma síntese e expande a discussão)
(MILKA): O professor vive passando por situações
conflituosas se ele não contar com os colegas, se se
isolar, realmente ele se perde. Voltamos aos pontos
já destacados, concordo que para evitar a insegurança, o isolamento e desenvolver trabalho profissional,
reflexão e a pesquisa, são importantes, mas não é
sozinho que vamos fazer isso, é preciso propor situações reais de ação, o que podemos fazer então? É a
busca por formação que vai possibilitar que nossas
práticas de pesquisa e de ensino avancem, mas uma
formação diferenciada daquela que tivemos acesso
até agora.
(POLLYANNA): Reconheço também que o caminho está mesmo na busca de formação e na nossa organização mais colaborativa. O estudo, a reflexão e a
pesquisa são necessárias, precisamos construir esses
espaços, pois o nosso processo formativo foi muito
deficitário com relação a esse aspecto, mas não é por
isso que vamos ficar de braços cruzados. Podemos
formar grupos como esses não? Esses momentos
aqui podem gerar frutos, podemos mudar os contextos de atuação. É preciso agir em conjunto, não
podemos cruzar os braços e ver a história passar.
(Quase todos os componentes da sessão balançam
a cabeça concordando. A sessão reflexiva continua
[...]).
Os conflitos relatados pelo Grupo sobre o trabalho
docente foram manifestados em vários momentos
da sessão de reflexão. A insegurança na condução da
pesquisa, como recurso articulador do ensino, bem
como a dificuldade em assegurar as condições básicas
para o seu desenvolvimento, no cotidiano do fazer
pedagógico, constituem-se em desafios para a prática
docente, porém, a voz compartilhada dos professores
denota que eles assumem responsabilidades que
levam à transformação das condições existentes tanto
nos processos de formação docente quanto de ensino-
aprendizagem universitário.
A tentativa de superar a dificuldade em aliar ensino
e pesquisa é inegável, os motivos apresentados
pelos professores para o desenvolvimento de ações
docentes mais colaborativas também representa
conflito vivenciado na prática docente, entretanto
o compartilhamento de significados denota que há
intenção de agir para adquirir novos referenciais
formativos que orientem o trabalho docente na
direção discutida pelos professores.
No processo de reflexividade relatado, a função
docente é ato político, é atividade complexa, que
envolve a opção por ações educativas voltadas para
formar alunos críticos, conscientes da sua função
social. É importante os professores compreenderem,
não somente o contexto restrito da sala de aula, mas
também, as relações sociais mais amplas que envolvem
a formação universitária. Essa compreensão foi
construída no compartilhamento de significado em
que os professores tentam aliar o ensino à pesquisa,
refletem sobre o que e o como fazem essa articulação,
bem como sobre os conflitos que vivem, ressaltando
as conseqüências de seus atos para a formação dos
alunos. O Grupo faz crítica ao modelo clássico de
ensino, isto é, à lógica utilizada pelo ensino tradicional,
apontando alternativas de reformulá-lo com base em
lógica diferente daquela em que eles foram formados.
Na opinião dos professores, para superar a dicotomia
entre ensinar e pesquisar, é preciso conjugar pesquisa
e ensino, modificar conceitos, reformular atitudes,
romper e criar espaços de produção de novos
conhecimentos e práticas.
Os significados compartilhados expressam motivos
para usar a pesquisa como espaço de produção de
saberes e de construção de práticas profissionais.
Conforme defende Bakhtin (2002), as palavras só se
tornam de alguém quando o enunciador a populariza
como sua própria intenção; quando ele apropriase da palavra, adaptando-a a sua própria intenção
semântica e expressiva, assim, compreendo que a
apropriação das idéias de outros não se constitui em
ato neutro e impessoal, é produção social e mediação
semiótica, esse foi justamente o elemento que auxiliou
os professores a se apropriarem da importância de
integrar ensino, pesquisa e reflexão crítica por meio
71
do compartilhamento do significado de docência, o
que contribuiu também para que as práticas relatadas
adquirissem novos sentidos e novos motivos para agir
no desenvolvimento da atividade docente.
Nessa direção, considero em comum acordo com
o grupo de professores participantes deste estudo,
que as contradições trazidas à tona sobre a relação
ensino e pesquisa, proporcionaram as condições
para que houvesse compartilhamento de significado,
a colaboração instituída nas discussões foi de
fundamental importância para a mediação e o cultivo
da mudança das práticas docentes já consolidadas no
âmbito da educação universitária.
4 CONCLUSÃO
Nesta pesquisa, constatei que, no trabalho docente
as ações e operações realizadas se ampliam quando
o processo de desenvolvimento profissional vincula
os objetivos pessoais e os motivos às significações
construídas pela categoria. Em razão do nível de relação
existente entre o objetivo e o motivo de determinada
atividade há possibilidades do agir docente mudar no
sentido de ser conduzido com profissionalismo, haja
vista que cada professor, dependendo dos motivos
que o impulsiona a agir, apreende as informações
e os conhecimentos de forma específica e pessoal,
reagindo também de maneira diferenciada diante das
situações práticas, mas, sobretudo, apreende o real e
o transforma quando compartilha com os outros as
práticas vivenciadas e os significados socialmente
construídos, o que amplia ainda mais a capacidade de
transformação dos contextos de atuação docente na
universidade.
Nesse sentido, compreendo que quanto mais reflexiva
e colaborativa for a prática docente, mais facilmente
nós professores romperemos com a cultura do
isolamento e de práticas não profissionais de ensinar.
Nesse caso, vale relembrar que transformar a
prática não é algo fácil, é conflituoso. É desafio que
exige a ampliação de conceitos, posturas, atitudes,
ações e operações. Por essa razão, os processos
de transformação pressupõem aprendizagens que
conduzam ao desenvolvimento mútuo, que envolvam
tanto a produção de práticas que não implicam em
riscos quanto daquelas que demandam a expansão
de conceitos, valores e atitudes tanto em nível pessoal
quanto profissional, o que envolve tanto o risco
72
quanto a chance de transformar a universidade que
conhecemos. Esse desafio foi partilhado pelo grupo
de professores e pela pesquisadora que conduziu
o processo reflexivo registrado na sessão reflexiva
analisada neste artigo.
A ruptura representa, para todos nós professores,
processo complexo, uma vez que requer a produção de
sentidos que possam quebrar rotinas e desestruturar
formações cognitivas, afetivas e emocionais já
consolidadas. Essa ruptura envolve aprendizagens
pessoais e profissionais contínuas e alteração dos
quadros teóricos e das práticas cristalizadas e
rotineiras.
É claro que as transformações de pessoas e contextos
não são processos que ocorrem de maneira
espontânea, tampouco com a rapidez que se quer,
entretanto, é possível afirmar que a transformação
pode ocorrer quando as ações realizadas são mais
responsáveis e responsivas, é o que denotamos como
primordial nas enunciações dos colaboradores desta
pesquisa.
Para finalizar, recomendo que as políticas propostas
para a formação de professores, especialmente do
professor universitário, considerem as reflexões
que fizemos ao longo deste texto, para que
desenvolvam projetos formativos que atendam às
demandas reais dos professores de aprendizagem
profissional e de superação das condições materiais
de desenvolvimento da atividade docente na
universidade. Com este trabalho, espero contribuir
para que as ações formativas transformadoras
possam ser desenvolvidas no âmbito da educação
universitária, quando os saberes e as práticas reais dos
professores forem tomados como parâmetro para a
expansão da rede de atividade produzida na educação
superior.
REFERÊNCIAS
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DOMINICÉ, P. A biografia educativa: instrumento de investigação para a educação de adultos. In: NÓVOA,
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ENGESTRÖM, Y. Activity theory and individual and social transformation. In: ______; MIETTINEN, R.;
PUNAMÄKI, R. L. Perspectives on activity theory. New York: Cambridge University Press, 1999. p.19-38.
IBIAPINA, I. M. L. M. Docência universitária: conceitos internalizados e competências construídas pelos
professores do Campus de Parnaíba. 2002. 197f. Dissertação (Mestrado em Educação)-Programa de PósGraduação em Educação. Universidade Federal do Piauí. Teresina, 2002.
______. Docência universitária: um romance construído na reflexão dialógica. 2004. 393f. Tese (Doutorado
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Natal, 2004.
LEONTIEV, A. N. O desenvolvimento do psiquismo. São Paulo: Moraes, 1978.
MARX, K. Ideologia alemã: teses sobre Feuerbach. São Paulo: Centauro. 2005.
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NÓVOA, A. A formação tem de passar por aqui: as histórias de vida no projecto Prosalus. In: ______; FINGER, M. (Org.). O método (auto)biográfico e a formação. Lisboa: Departamento de Recursos Humanos.
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VYGOTSKY, L. S. A construção do pensamento e da linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
______. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
73
O teatro contemporâneo e o ensino das
artes cênicas
The contemporary theater and performing arts education
Daniele Pimenta
1
RESUMO
O teatro contemporâneo desenvolve-se com base em expedientes e recursos técnicos e estéticos, os quais
transitam por diversas linguagens artísticas e estrutura-se a partir do diálogo horizontalizado entre
as propostas de criação dos artistas envolvidos, exigindo do encenador uma perspectiva pedagógica na
condução do processo criativo. A partir da observação e da participação em processos artísticos profissionais,
a autora transporta para a sala de aula a aplicação de técnicas e o desenvolvimento de conceitos do teatro
pós-dramático, como ferramentas para o ensino do teatro.
Palavras-chave: Teatro contemporâneo. Teatro dramático. Teatro pós-dramático. Pedagogia do Teatro. Ator.
ABSTRACT
The contemporary theater is developed based on expediency and technical and aesthetic features, which
transit through various artistic forms, and is structured from the dialogue between horizontalized proposals
for the creation of the artists involved, requiring the director to conduct an educational perspective the
creative process. From observation and participation in professional artistic processes, the author brings to
the classroom application of techniques and development of concepts of post-dramatic theater as tools for
teaching theater.
Keywords: Contemporary Theatre. Drama Theatre. Post-dramatic theater. Pedagogy of the Theatre. Actor.
1
74
Doutora em Artes pela UNICAMP. Mestre em Artes Cênicas pela USP e graduada em Artes Cênicas pela
UNICAMP. Professora da graduação e da pós-graduação do curso de Educação Artística da FAINC, em
Santo André. Atriz, diretora, diretora musical e coreógrafa da Cia. PICNIC de Teatro. Membro da ONG
CONSORTE de Teatro. E-mail: [email protected]
1 INTRODUÇÃO
As artes cênicas compõem um campo amplo e de
complexa (quase impossível e, talvez, desnecessária)
delimitação, tantas são as linguagens manifestas
e outras tantas as linguagens com as quais estas
dialogam.
O teatro contemporâneo – aqui compreendido como
o teatro feito a partir de expedientes pesquisados
e desenvolvidos contemporaneamente, os quais
envolvem conceitos específicos concernentes às
formas de abordagem temática, técnica, expressiva
e estrutural, e não, genericamente, como o teatro
feito atualmente, pois inúmeras vertentes estéticas
e diferentes meios de produção artística coexistem
– assume definitivamente o trânsito por diferentes
“territórios e fronteiras” 2.
A possibilidade de incursão por diversas linguagens
artísticas e, nessas macro linguagens, pelas diversas
estéticas, demanda do encenador contemporâneo
uma postura extremamente pedagógica na condução
do trabalho junto a seus intérpretes e equipe de criação,
pois o processo colaborativo, atualmente a vertente
processual mais difundida entre os grupos que se
dedicam à pesquisa de expedientes contemporâneos
do teatro pós-dramático, pressupõe a abertura para
que o coletivo criador confie na possibilidade de
acolhida para a pluralidade de linguagens e meios, os
quais mudam sensível ou profundamente de acordo
com as referências individuais.
O trabalho do intérprete expande-se vertical e
horizontalmente, o depoimento torna-se inerente a
sua atuação. Seu papel, muito mais que desempenhar
um papel, é refletir sobre a sociedade, sobre o entorno,
sobre o ser humano, suas atitudes e consequências, e
manifestar-se em um discurso poético.
O ensino do teatro deve abrir-se para esta nova
perspectiva: partir do referencial pessoal do alunointérprete para a construção do percurso que o levará
ao aprendizado dos conteúdos pertinentes, evitando
a cristalização de formas recebidas unilateralmente,
sem possibilidade de reflexão.
Para tanto, o
2
teatro contemporâneo nos fornece expedientes
perfeitamente aplicáveis a diferentes realidades
educacionais.
A abordagem pedagógica detectada nos processos
teatrais pós-dramáticos profissionais parte de
proposições que estimulam a autonomia criativa
e expressiva dos intérpretes. De maneira similar,
os alunos-intérpretes podem ser motivados a
participar ativamente dos processos desenvolvidos
em aula, experimentando expedientes que se tornam
ferramentas para a composição da cena, sem, no
entanto, negar a potencialidade expressiva do teatro
dramático.
O presente artigo é uma tentativa de organizar
algumas de minhas reflexões, provocadas e
alimentadas pelo convívio com artistas profissionais e
estudantes em diferentes processos, o que me permite
a observação, seleção de recursos, experimentação e
análise dos resultados obtidos a partir da aplicação
de expedientes do teatro contemporâneo em minhas
aulas de graduação e pós-graduação.
2 TEATRO DRAMÁTICO
Classificar um processo de criação ou um espetáculo
teatral como dramático não deve implicar em fechar
sua definição em um formato único, visto que há
muitos gêneros teatrais que apresentam as mesmas
características estruturais básicas, preservando, entre
si, enormes diferenças estéticas e de linguagem.
Via de regra, o teatro dramático engloba todas as
formas teatrais que partem do desenvolvimento e
resolução de um conflito pela ação de seus personagens.
Em definição muito superficial, apenas para catalisar
a reflexão que se segue, o teatro dramático ainda pode
ser aristotélico, quando a ação constrói uma trama
linear, ou épico, quando do uso de expedientes que
interrompem o fluxo da ação dramática, visando
romper temporariamente a sensação de ilusão ou o
envolvimento emocional com a cena, possibilitando
uma visão crítica por parte do espectador.
Não cabe aqui esmiuçar a teoria dos gêneros, a qual
Não por acaso Territórios e Fronteiras é o nome dado ao grupo de trabalho que acolhe os pesquisadores das áreas de
multilinguagens artísticas nos congressos da Associação Brasileira de Pesquisa e Pós-Graduação em Artes Cênicas - ABRACE.
75
define e compartimenta os gêneros literários em
épico, lírico e dramático (a palavra drama tem origem
no termo grego para ação). Mas é importante atentar
para a ligação imediata que se faz entre os conceitos
teatral e dramático a ponto de serem considerados
sinônimos.
Partindo da teoria dos gêneros e, consequentemente,
da definição de critérios para uma literatura
dramática, a evolução do teatro foi registrada e
analisada com foco bastante fechado na produção de
textos dramáticos, isto é, na literatura para ser posta
em ação. Essa perspectiva textocentrista alimentou
por séculos a idéia de que teatro se faz a partir do
texto como base única e inquestionável.
Essa abordagem relegou ao status de arte menor
todas as vertentes de teatro popular, apoiadas na
performance de seus intérpretes e não na literatura,
abertas à transformação da cena pela relação com o
público e não estancadas pela subserviência ao texto.
Obviamente, essas questões precisariam de espaço
próprio para sua análise e discussão, mas, aqui, é
preciso apontar a importância do texto como matriz
absoluta para a criação da cena teatral para grande
parcela dos críticos e historiadores, os quais, em um
processo cíclico, alimentaram-se das e orientaram
as escolhas de artistas que abraçaram o teatro dito
sério, oficial, erudito, considerado tradicional,
em detrimento do teatro popular, cujas formas
estabelecem muito mais concretamente uma tradição,
pois dependem da transmissão oral e pessoal de
técnicas e convenções.
A liberdade criativa do teatro popular desenvolvido
ao longo dos mais de dois milênios do teatro não
oficial, frequentemente, em detrimento de uma
literatura dramática rigorosa, aproxima-se e dialoga
diretamente com o teatro contemporâneo pósdramático, pela generosa ocupação dos espaços
urbanos, pela participação ativa do intérprete como
criador da cena e pela observação atenta da recepção.
3 TEATRO PÓS-DRAMÁTICO
O termo pós-dramático pode indicar a ideia de
contraponto tanto à ação dramática quanto à
dramaturgia em seu sentido original de literatura
dramática. Os dois sentidos complementam-se e
corroboram com uma perspectiva de encenação
76
que não parte, necessariamente, de um texto
originalmente concebido como literatura dramática,
embora não, necessariamente, o exclua. A abordagem
e o tratamento dado a cada elemento de composição
da obra teatral é que mudam substancialmente no
teatro contemporâneo, pois o espetáculo passa a
constituir-se de camadas que se articulam pela soma
e multiplicação de seus significados, pela relação
com cada elemento como uma potencial matriz
espetacular.
Essa pluralidade matricial conduz a resultados
inerentemente polissêmicos e este é um dos maiores
contrastes com o teatro dramático, no qual todos os
elementos de um espetáculo são concebidos para
reforçar a visão do diretor sobre o texto, conduzindo
a recepção na leitura da obra.
No teatro pós-dramático a recepção torna-se ativa. A
obra composta é lacunar e o espectador passa a ser
também compositor do sentido final, recorrendo a
seu repertório pessoal (intelectual, político, social,
afetivo, etc.) para traduzir as impressões causadas
pela obra.
Podemos pensar que, se várias são as possibilidades
de leitura pela recepção, várias devem ser as fontes
textuais presentes na obra. Esse raciocínio nos
ajuda a compreender o conceito contemporâneo de
dramaturgias.
4 DRAMATURGIAS
O termo dramaturgia expande-se para além da
literatura dramática e abarca a proposição de
matrizes dos vários outros elementos compositores
do espetáculo. Assim, além do autor do texto
dramático, quando houver, teremos a dramaturgia do
encenador, a dramaturgia do ator, a dramaturgia das
materialidades, a dramaturgia sonora, entre tantas
outras possibilidades, culminando na dramaturgia do
espectador. Essa abertura de perspectiva implica em
tirar cada membro do coletivo de sua zona de conforto,
própria de suas diferentes especialidades, e convidálo a colaborar (no sentido original de trabalhar junto,
não no de dar alguma ajuda) no desenvolvimento do
processo criativo.
O processo assim estabelecido depende de uma
postura consistentemente pedagógica por parte do
encenador, que promova o estímulo à liberdade de
proposição; à condução de uma apreciação madura
com discussões produtivas; o aporte teórico para a
exploração dos conceitos pertinentes; o estudo das
possibilidades de entrecruzamento das proposições
individuais para a construção do resultado coletivo.
Esse trabalho estabelece-se como um processo
colaborativo, o que implica no exercício da escuta
e da permeabilidade. O processo colaborativo não
priva o artista da liberdade e da responsabilidade de
atuar em sua área de especialização, mas pressupõe
o aproveitamento e o compartilhamento dessas
potencialidades.
no espetáculo, mas de um discurso poético, o qual
pode traduzir-se tanto verbalmente quanto plástica,
sonora e corporalmente. O ator compartilha sua
visão sobre o tema desenvolvido, ao mesmo tempo
em que expressa ou demonstra suas investigações
estéticas com autonomia para propor para o coletivo,
a participação em células cênicas por ele concebidas,
as quais comporão posteriormente e, aí sim, sob
a coordenação do encenador, o todo orgânico do
espetáculo.
No campo do ensino do teatro, esse processo pode
provocar e estimular o aluno a tornar-se agente, mais
do que receptor, elevando sua auto-estima e levando-o
a conscientizar-se de que pode e deve ser um integrante
produtivo do coletivo. Mas esse processo pressupõe o
conhecimento por parte do professor, dos conceitos
e expedientes que podem fazer parte do processo de
construção da cena no teatro contemporâneo.
O depoimento pode ser construído a partir de um
texto ou de fragmentos de textos, dramáticos ou
não; de materialidades (objetos, texturas, materiais
orgânicos e inorgânicos); da composição de
sonoridades, tanto as geradas pelo corpo-voz do
ator quanto às exploradas em objetos, instrumentos
musicais ou sonorização mecânica; da elaboração de
figurino e maquiagem carregados de significações;
do próprio corpo, pela exploração e exposição de
uma corporeidade que pode nos apresentar uma
personagem, uma figura ou uma criatura (LEHMAN,
2007).
4.1 Fragmentação
4.3 Multilinguagem
A liberdade de escolha e abordagem das matrizes
temáticas e estéticas do espetáculo se traduz,
frequentemente, na fragmentação. A não linearidade
narrativa é um dos aspectos da fragmentação, que se
compõe, também, da agilidade com que inserções
externas às fontes primárias são assimiladas, da
abertura à presença de outras linguagens artísticas, da
construção do discurso poético do espetáculo pelos
discursos dos diferentes artistas envolvidos.
O teatro contemporâneo abre-se generosamente
para a aproximação com outras linguagens artísticas.
Diferentemente de outras vertentes teatrais, nas quais,
artistas de outras áreas contribuem para a criação
de um espetáculo, oferecendo suas técnicas para a
elaboração de elementos do espetáculo (um arquiteto
que cria o cenário, um músico que cria a trilha
sonora, um bailarino que coreografa para atores). No
teatro pós-dramático diversas áreas artísticas podem
compor a cena in natura, o que significa, por exemplo,
que um elemento plástico será inserido na cena como
obra em si, dialogando semanticamente com o todo
espetacular.
Cada parte, pedaço, caco, grão... cada fio dessa trama
tecida meticulosamente está impregnado de atitude,
pesquisa, depoimento. As várias camadas trançadas
revelam vestígios que nos instigam a refletir sobre as
possibilidades apenas prenunciadas. A fragmentação
torna-se, assim, um fecundo terreno para que a
percepção se dê de maneira ativa.
4.2 Depoimento
Uma das matrizes textuais para a composição do
espetáculo teatral contemporâneo é o depoimento
do ator. Não se trata de uma declaração explícita,
formatada oralmente como uma declaração inserida
Neste sentido, o teatro contemporâneo incorpora
muitos traços da performance, a qual, caracterizase justamente pelo livre trânsito por diferentes
linguagens artísticas, em composições que mesclam
recursos multimídia a técnicas artísticas próprias do
teatro, da dança, da música (vocal ou instrumental) e
das artes plásticas.
No entanto, no teatro, diferentemente do que
ocorre na performance, as cenas construídas
77
pela multilinguagem inserem-se no contexto do
espetáculo, devendo corresponder às suas funções
dramáticas (ou não dramáticas) na obra como um
todo, preservando um formato relativamente fixo a
partir de sua concepção original. Já a performance
é intrinsecamente mutável, estabelecendo-se no
momento de sua realização, partindo de uma
concepção estética e temática, mas moldando-se às
possibilidades geradas pelo instante, na relação direta
com o espaço, a plateia e o entorno.
No espetáculo teatral essa flexibilidade e a
possibilidade de relação com o entorno é muito
importante, mas não deve comprometer o fluxo de
desenvolvimento das cenas. Assim, o ator deve ter
domínio do ritmo da cada cena, abrindo espaço para
o diálogo poético com o entorno, sem perder a noção
de que cada célula cênica tem uma duração, uma
função e um propósito, pré-estabelecidos ao longo de
todo o processo de criação do espetáculo.
4.4 Espacialidade
A relação com o espaço é uma investigação valorizada
no teatro contemporâneo, principalmente por
corroborar com a perspectiva autoral do trabalho
dos artistas envolvidos, abrindo possibilidades de
exploração estética e temática, no que concerne
a aspectos crescentemente estudados, não só no
campo das artes, mas em áreas como antropologia,
sociologia, arquitetura, entre outras.
A construção da cena, quando parte da espacialidade
ou, ao menos, a considera, pode acrescentar ao
repertório de potencialidades para o processo criativo
conceitos como topografia e historicidade, os quais
impulsionam o artista pesquisador a relacionar-se
tanto com o espaço em si, buscando composições
visuais com a arquitetura e relevos quanto com o
universo semântico gerado pela história ligada ao
local e seu entorno.
5 ATOR / INTÉRPRETE / ATOR CRIADOR /
ATOR COMPOSITOR / ATOR RAPSODO
Há uma discussão corrente, gerada pela percepção
dos novos papéis do ator no teatro contemporâneo,
acerca da denominação adequada a sua função.
Essa discussão, quando lançada a estudantes de
teatro, propicia uma apropriação conceitual que em
78
muito complementa e catalisa o desenvolvimento do
aprendizado e de seus reflexos no processo criativo.
Ainda que, independentemente da discussão
doravante descrita, sejamos todos atores, o termo ator
– aquele que age – é associado, pelo senso comum, ao
trabalho de colocar em ação o que está escrito no texto
teatral. Essa noção alimenta, até hoje, uma postura
cristalizada pela qual o ator coloca-se à disposição
do texto, esperando que um diretor lhe diga o que
deve ser feito. É o que chamamos de ator tarefeiro,
que pode ser um ótimo ator quanto aos resultados
apresentados, dedicado ao treinamento para o
aprimoramento técnico para melhor corresponder às
proposições do diretor.
Podemos analisar o termo intérprete – aquele que
lê, que decifra – como o artista que extrai do texto
possibilidades expressivas, contribuindo com sua
visão da obra para a construção da encenação em
diálogo com o diretor. E, ainda aqui, o conceito parte
de uma base textual.
Com o aprofundamento do conceito de dramaturgias,
o ator passa a ter agregado ao termo original a palavra
criador, proclamado, então, ator criador, pois é
também propositor de dramaturgias para a criação
do espetáculo. Este é o ator que, por experimentações
cênicas, discussões e estudos teóricos, propõe
caminhos para o trabalho em processo.
Em uma aparentemente sutil diferença surge o termo
ator compositor, definindo aquele artista que compõe,
ou seja, que articula um repertório pessoal, técnico
e estético para o estabelecimento de um discurso
poético, pessoal ou coletivo, lançando mão de outras
linguagens e acumulando camadas de sentido ao
trabalho proposto.
As duas últimas definições, a do ator criador e do ator
compositor, somam-se em no termo ator rapsodo,
conceito, portanto, amplo, mas que traduz com mais
precisão o trabalho do ator no teatro contemporâneo.
Para refletir sobre esses conceitos, compreendêlos, aceitá-los ou refutá-los, é preciso tentar colocálos em prática, oportunizando ao estudante de
teatro a experiência de se lançar nas diferentes
situações apontadas. Essa investigação, por si,
independentemente de quaisquer resultados cênicos
concretos, expandirá a percepção que o estudante tem
do teatro como arte e de sua importância, enquanto
indivíduo, artista, cidadão em um contexto criativo,
pois, para inserir-se no processo para ser propositor,
o estudante deve posicionar-se diante dos temas ou
conceitos sugeridos, expandindo suas perspectivas
expressivas e críticas.
6 DIÁLOGO COM A TRADIÇÃO
O teatro contemporâneo não deve ser analisado sem
levarmos em consideração todo o passado teatral que
nos conduziu às potencialidades de hoje. O que muda
é a forma com que expedientes são adotados, não os
expedientes em si.
Ao trabalhar com estudantes de oficinas ou de
graduação 3, parto da aproximação com o universo
teatral pelo viés tradicional com jogos dramáticos
e teatrais pelo estudo de textos teatrais, que possam
esclarecer os conceitos desenvolvidos nos jogos, pela
encenação de pequenas peças ou de cenas de textos
dramáticos e até pela encenação de textos criados
pelos próprios alunos, elaborados a partir de conceitos
do teatro dramático.
Essa abordagem é importante para que os estudantes
de níveis iniciais compreendam melhor o que é o teatro,
confrontando e esclarecendo conceitos enraizados
pela perspectiva leiga, externa ao fenômeno teatral,
ao mesmo tempo em que experimentam, satisfazem
e repensam algumas expectativas geradas por essa
mesma perspectiva externa.
Para os alunos da Habilitação em Artes Cênicas
da FAINC 4, em minhas aulas práticas5 , após um
período essencial de instrumentalização técnica,
lanço mão de experimentações com base em recursos
do teatro pós-dramático para que os estudantes se
desenvolvam, técnica e expressivamente, para além da
6
compartimentação programática que os dividiria
em
corpo e voz, pela exploração das influências diretas
estabelecidas pela relação corpo-voz-mente.
O desenvolvimento do estudante como artista
pressupõe seu desenvolvimento intelectual, técnico,
expressivo e criativo. A noção de que pode criar
dramaturgias coloca o estudante diante de desafios
que o farão explorarem possibilidades e refletir sobre
os temas escolhidos ou sugeridos, sobre as opções
estéticas a serem feitas, sobre as atitudes a serem
tomadas.
Na pós-graduação, o teatro contemporâneo é
explorado profundamente, em todos os seus conceitos
com abordagens teóricas e práticas, mas esse mergulho
começa em bases concretas que apresentam aos
estudantes as matrizes essenciais desse teatro, cujos
elementos mais marcantes podem ser reconhecidos
em movimentos teatrais muito anteriores 6.
7 CONCLUSÃO
É fundamental que o estudante-artista-pesquisador
teatral lance-se de maneira aberta ao estudo do teatro
contemporâneo para compreender, experimentar,
dialogar e inserir-se no panorama teatral atual, o qual
é, em muito, definido ou influenciado justamente
pelo desenvolvimento crescente do universo artístico
acadêmico. Haja vista as produções e a difusão das
pesquisas desenvolvidas em universidades próximas
a nós, como a USP, a UNESP e a UNICAMP por
pesquisadores-artistas que alimentam a produção
artística profissional da região. Entretanto,
não se pode manter a sensação de que o teatro
contemporâneo descobre pólvoras diariamente. Entre
os tantos conceitos desenvolvidos atualmente, muitos
são aqueles presentes em gêneros e fases teatrais
3
Além de professora da FAINC, ministrei diversas oficinas teatrais em projetos públicos estaduais e municipais, junto à Prefeitura
de São Bernardo do Campo.
4 Após quatro semestres de curso básico, de corpo curricular comum, o curso de Licenciatura em Educação Artística oferece diferentes habilitações, nas quais os alunos terão disciplinas específicas da área escolhida (geralmente são formadas turmas de Artes
Cênicas e Artes Plásticas).
5
No curso de habilitação em Artes Cênicas sou responsável por disciplinas teóricas e práticas: Expressão Corporal e Expressão Vocal. Em função de minhas concepções pedagógicas, conto com a colaboração da coordenação do curso no sentido de preservar
a possibilidade destas duas disciplinas serem ministradas em uma mesma noite de trabalho.
6 Uma das disciplinas pelas quais sou responsável nos cursos de pós-graduação é “Fundamentos do Teatro Popular”, a qual compõe
a grade da Pós-Graduação em Teatro, abrindo o curso juntamente com a disciplina Vanguardas Históricas Europeias, ministrada
pelo Prof. Dr. Alexander Mate.
79
anteriores.
Além das heranças próximas, como as performances
das vanguardas européias e os elementos do teatro
épico, podemos reconhecer elementos presentes em
diferentes períodos da evolução do teatro.
A própria relação com o espaço é indicada por
um termo questionável: encenação em espaço
alternativo ou não convencional! Ora, o palco
italiano, comumente considerado como espaço
tradicional ou convencional para a representação
teatral, que foi concebido como alternativa para que
a elite pudesse assistir às produções teatrais oficiais,
longe da desconfortável presença do populacho que
predominava na plateia dos espetáculos das praças,
feiras e tavernas.
Figuras e criaturas preencheram a cena teatral com
suas deformidades e máscaras, desde as fábulas
atelanas até a commedia dell’arte, passando pelos
demônios do teatro medieval. E o que é o trabalho
desenvolvido pela tradição iletrada dessas trupes
populares, se não uma dramaturgia do ator?
Portanto, são muitos elementos a serem experimentados e discutidos e, grande a responsabilidade de
situar o estudante como artista, como ser histórico e
social.
REFERÊNCIAS
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BONFITTO, M. O ator compositor. São Paulo: Perspectiva, 2006.
LEHMANN, Hans-Thies. Teatro pós-dramático. São Paulo: Cosac & Naify, 2007.
REBOUÇAS, Evill. A dramaturgia e a encenação no espaço não convencional.
São Paulo: Ed. UNESP, 2009.
SARRAZAC, Jean-Pierre. O futuro do drama: escritas dramáticas contemporâneas. Porto: Campo das Letras,
2002.
PIMENTA, Daniele. O raciocínio clownesco na construção de uma poética contemporânea ou o que um
palhaço faz no meio disso tudo? In: CONGRESSO DE DRAMATURGIA, Tradição e Contemporaneidade,
6., 2010, São Paulo. Anais... São Paulo: Associação Brasileira de Pesquisa e Pós-Graduação em Artes Cênicas,
2011. Disponível em: <http://portalabrace.org/memoria1/?p=1259>. Acesso em: 30 jun. 2011.
RYNGAERT, Jean-Pierre. Jogar, representar: práticas dramáticas e formação. São Paulo: Cosac & Naify, 2009.
SILVA, Eduardo. Um ator no século XXI na cidade da São Paulo. Ateliê Compartilhado, São Paulo, n. 1,
2011.
80
NORMAS PARA PUBLICAÇÃO NA REVISTA INTER FAINC
InterFainc é um periódico multidisciplinar semestral das Faculdades Integradas Coração de Jesus FAINC, Rede Salesianas de Ensino da cidade de Santo André, SP, dirigida a pesquisadores, professores,
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• NBR 10.520/2002: apresentação de citações em documentos;
• NBR 5892/1989: norma para datar;
• NBR 6028/2003: resumo;
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1.2 Diretrizes para Autores
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com mais de 3 linhas*);
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d) margens esquerda e superior de 3 cm, inferior e direita de 2 cm;
e) as páginas deverão ser numeradas no canto superior à direita.
*A revista é editada em duas colunas, portanto, vamos considerar as citações com mais de 5 linhas.
82
4º. Todos os textos deverão estar acompanhados de um resumo (máximo de 250 palavras) e palavras-chave,
abstract e keywords (precedendo o texto) e referências;
5º. O título deverá estar em fonte Arial 14, centralizado, seguido do nome do autor em fonte Arial 12 e da afiliação institucional, com espaço duplo entre o título e o nome do autor. Não iniciar uma nova página a cada
subcapítulo. Os títulos são diferenciados graficamente entre seções de hierarquia diferentes e iguais quando de
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idiomas citadas no texto;
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abreviatura de página (p.) e o número desta. Exemplo: SILVA, 1992, p. 3-23;
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