ANALISANDO AS PRÁTICAS DE PROFESSORES DURANTE UM PROCESSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA Gilda Lisbôa Guimarães – [email protected] Leila Nascimento da Silva – [email protected] Universidade Federal de Pernambuco Carvalho e Simões (1999), a partir de um levantamento sobre artigos publicados em 10 periódicos especializados em formação e praxes do professor, na década de 90, concluíram que existem pelo menos três grupos de concepções acerca do que seria formação continuada: a) aquisição de informações e/ou competências b) prática reflexiva c) para além da prática reflexiva. O projeto de Formação Continuada que será analisado defende, coerentemente com autores agregados ao terceiro tipo de concepção, que a formação continuada deve ser uma prática reflexiva. Destacamos que "a formação continuada deve incentivar a apropriação dos saberes pelos professores, rumo à autonomia, e levar a uma prática reflexiva abrangendo a vida cotidiana da escola e os saberes derivados da experiência docente", pois "não basta uma maneira segura de ensinar o conhecimento de novas teorias no campo das ciências, o professor precisa cultivar atitudes de reflexão sobre sua prática" (Leal e Guimarães, 2001). Creditamos também, que é essencial "refletir com os professores sobre as estratégias didáticas, buscando associar os saberes sobre o objeto de estudo, os saberes a serem ensinados e os saberes sobre as estratégias de ensinamento, considerando, portanto, a escola como uma instituição social dotada de especificidades na qual os conhecimentos assumem usos escolares que devem ser articulados com os usos sociais gerais (extra-escolares) de tais conhecimentos" (Leal e Guimarães, 2001). Sabendo-se que existe um distanciamento entre o conhecimento científico e a versão desse conhecimento produzido na escola buscamos discutir esse distanciamento o qual pode ser justificado pela transposição didática, uma vez que esta pressupõe uma adaptação do conhecimento original para o conhecimento escolar. Anais do VIII ENEM – Comunicação Científica GT 1 – Educação Matemática nas Séries Iniciais 2 Assim como a produção do conhecimento, a transposição didática não é linear e constitui um processo de apropriação e transmissão dos conhecimentos mantendo pouca fidelidade ao conhecimento original. Lerner (1996), afirma: que “Diferentes situações correspondem diferentes conhecimentos. Conseqüentemente, o saber nunca é exatamente o mesmo para seus criadores, para seus usuários, para seus alunos, etc. ele muda...” (p.25) Para Chevallard (1991) “todo projeto social de ensino e de aprendizagem se constitui dialeticamente com a identificação e a designação de conteúdos de saberes como conteúdos a ensinar. Um conteúdo de saber que foi designado como saber a ensinar sofre a partir de então um conjunto de transformações adaptativas que vão torná-lo apto para ocupar um lugar entre os objetos de ensino. O trabalho que transforma de um objeto de saber a ensinar em um objeto de ensino, é denominado de transposição didática”.(p.45) Chevallard (1985) o saber tal qual é ensinado é necessariamente outro em relação àquele elemento do saber inicialmente designado a ser ensinado considerando a influência da instância de decisão política que define os conteúdos de saber a serem transpostos para o ensino e as criações didáticas. Essa ruptura entre um determinado domínio do saber em seu contexto original de produção e o saber do ensino formal produz deformações. A consciência por parte dos professores dessa idéia de serem autores das deformações existentes no conhecimento escolar gera, para alguns, uma sensação de “infidelidade” ao conhecimento original. Surgem, então, diferentes posturas em relação à transposição didática que varia da rejeição a aceitação. A rejeição ocorre porque os professores se sentem “fraudadores” do conhecimento. Para os que crêem em “verdades matemáticas”, a transposição didática é percebida como algo ruim ou no máximo um mal necessário. Astolfi e Develay (1990) afirmam que “a designação de um elemento do saber sábio como objeto do ensino modifica-lhe muito fortemente a natureza, na medida em que se encontram deslocadas as questões que ele permite resolver, bem como a rede relacional que mantém com os outros conceitos. Existe assim, uma “epistemologia escolar” que pode ser distinguida da epistemologia em vigor nos saberes de referência.”. Esses acreditam que a transposição didática provoca uma despersonalização e uma descontemporialização dos conceitos, quando estes se tornam objetos do ensino. Para esses, se a transposição didática é inerente a toda integração de um conceito ao texto do saber escolar, é preciso ver se é possível dispor de indicações que permitam Anais do VIII ENEM – Comunicação Científica GT 1 – Educação Matemática nas Séries Iniciais 3 ao didata construir proposições sistemáticas de transposição didática que busquem práticas sociais de referência. A idéia de prática social de referência permite pensar nas diversas características de uma transposição didática sistemática. Segundo Forquin (1993), “... a educação escolar não se limita a fazer uma seleção entre os saberes e os materiais culturais disponíveis num dado momento, ela deve também, para torná-los efetivamente assimiláveis às jovens gerações, entregar-se a um imenso trabalho de reorganização, de reestruturação, ou de “transposição didática”(cf. Y. Chevallard, 1985). Ocorre que a ciência do sábio, assim como a obra do escritor ou do artista, ou o pensamento do teórico não são diretamente comunicáveis ao aluno: é necessária a intercessão de dispositivos mediadores, a longa paciência de aprendizagens metódicas (as quais não conseguem se livrar das escoras do didatismo) e a elaboração de todos os elementos de saberes intermediários.”(p.16) Por outro lado, há os que acreditam que numa transposição didática há pontos positivos e apresentam uma perspectiva menos pessimista. Esses buscam boas transposições de saberes correspondentes as demandas didáticas da sociedade. Buscam, assim, a gênesis sócio-histórica do saber designado para ser ensinado, ou seja, a construção histórica do saber. Outros buscam as especificidades do projeto de construção didática do saber, analisam as condições e os marcos em que esse se encontra. Para os que aceitam a transposição didática como atividade natural e necessária para o processo de ensino, é preciso buscar maneiras de fazê-la com o máximo de fidelidade do conhecimento cientifico. A fim de que os objetos didáticos do conhecimento não sejam confundidos com o próprio conhecimento. Chevallard ressalta a necessidade de se preservar a essência epistemológica do conteúdo original em relação ao conteúdo a ser ensinado. O saber que é produzido na transposição didática é um saber diferente de suas origens do saber sábio e separado de sua produção histórica. Essa distância da passagem do saber sábio para o saber ensinado é importante para os questionamentos. Para os didatas, esse se converte em uma ferramenta que permite recapacitar, tomar distância, interrogar as evidências, por em questão as idéias simples e desprender-se da familiaridade enganosa de seu objeto de estudo. É o conceito de transposição que permite a articulação da análise epistemológica com a análise didática e se converte, então, em um guia de um bom uso da epistemologia para a didática. Preparar uma lição é sem dúvida trabalhar na transposição didática. Anais do VIII ENEM – Comunicação Científica GT 1 – Educação Matemática nas Séries Iniciais 4 Segundo Henry (1991), para Chevallard, o matemático seleciona da noosfera, a partir de todos os conhecimentos acumulados historicamente, aqueles que ele considera pertinentes a seus alunos, esses serão os objetos a ensinar. Essa é a 1a transposição didática. Depois dos objetos a ensinar estarem selecionados, eles serão avaliados pelo sistema educativo considerando quais desses objetos os alunos serão capazes de compreender. Estes serão organizados em disciplinas integradas em um currículo. Para fazer um texto coerente e acessível aos alunos, os professores recriarão as definições e propriedades a compor as articulações lógicas e a transformar certas demonstrações objetos de ensinamento. Essa é a 2a etapa da transposição didática. Em seguida o professor elabora um texto expresso nos livros. Esses são recortados em capítulos estruturados para que os alunos possam aprender – saber escolar. Sua elaboração é o 3o ato da transposição didática. O 4o ato é aquele em que o professor vai adaptar seus conhecimentos sobre os objetos a ensinar, inseri-los dentro do saber escolar e organizalos dentro de um espaço de tempo – saber ensinado. Os professores sabem muito bem que o saber ensinado não é o que o aluno compreendeu – o saber do aluno. Assim temos o 5o ato da transposição. Essa interação entre o professor e o aluno lida com o saber transposto, que é o essencial da relação didática. Moreira e David (2003), em um artigo muito interessante, buscam discutir essa relação existente entre “matemática escolar” e a “matemática científica” e as possíveis implicações disso para a formação do professor. Para esses autores podemos pensar em quatro perspectivas diferentes. A primeira refere-se a posição de Chevallard que afirma que a transposição didática é inerente a qualquer processo de ensino, “independentemente do fato do saber a ser ensinado provenha ou não de um corpo científico de conhecimento, o trabalho de ensinar requer a construção de uma percepção particular e específica do objeto de ensino”. Assim, Chevallard toma a matemática científica como a fonte privilegiada do saber à qual o sistema escolar sempre recorre para recompatibilizar-se com a sociedade, além de tomar também esse saber científico como a referência última que permitiria a comunidade dos matemáticos desautorizar o objeto de ensino que não seja considerado “suficientemente próximo ao saber sábio”. Dessa forma, considera a matemática escolar como fundamentalmente “dada” pela matemática científica, ao invés de “a ser explicada”, em termos de seus múltiplos condicionantes. “Matemática escolar é quase reduzida a uma espécie de resultado do processo técnico de didatização”.(p.61) A matemática científica é fonte e a didática da matemática é instrumento. Anais do VIII ENEM – Comunicação Científica GT 1 – Educação Matemática nas Séries Iniciais 5 Uma segunda posição é apresentada por Chervel (1990), que ao contrário de Chevallard, afirma que as disciplinas escolares não são meras vulgarizações para um público jovem das ciências de referências, ou seja, daqueles “conhecimentos que não se lhe podem apresentar em sua total pureza e integridade”. O papel da pedagogia também não é o de um lubrificante do processo de vulgarização do conhecimento. As disciplinas escolares desfrutam “de uma organização, de uma economia interna e de uma eficácia que elas não parecem dever a nada além delas mesmas, quer dizer, à sua própria história”.(p.180). A disciplina escolar é criada na escola, pela escola e para a escola. Segundo Moreira et al (2003) parece que Chervel “em certos momentos fecha as portas a um tipo de abordagem em que uma multiplicidade de elementos e mecanismos – subjetivos e estruturais, externos e internos à escola, desempenhando papeis contraditórios e complementares dentro do processo – viria constituir aquilo que se designa com o nome de matemática escolar.”(p.63). Para Moreira, a matemática científica e a matemática escolar são resultante das práticas respectivas do matemático e do professor de matemática da escola. A prática do matemático se caracteriza pela produção de resultados originais de fronteiras com ênfase nas estruturas abstratas através de um processo rigorosamente lógico-dedutivo e de extrema precisão de linguagem. Por outro lado, a prática do professor de matemática desenvolve-se num contexto educativo, envolvendo interesses políticos, econômicos e sócio-culturais. Assim, não se trata de uma transposição de um saber sábio para um objeto de ensino. A terceira posição refere-se a Schulman (1987) o qual apresenta o “conhecimento pedagógico do conteúdo”. Este conhecimento pode ser entendido como a forma profissional com que o professor concebe o seu objeto de ensino e, ao mesmo tempo, uma forma prática com que ele opera a organização, representação e apresentação do saber numa determinada disciplina escolar. Para descrever o conhecimento necessário a prática docente elabora uma lista mínima: conhecimento do conteúdo, conhecimento curricular, conhecimento pedagógico (estratégias de ensino), conhecimento pedagógico do conteúdo (construção elaborada no interior das práticas escolares), conhecimento das características cognitivas do aluno, conhecimento do contexto educacional e o conhecimento dos fins educacionais. Entretanto, o conhecimento pedagógico do conteúdo não vai além de forma – embora criativa e fundamentada na experiência – de ensinar aquilo que se encontra prescrito nos currículos escolares. Anais do VIII ENEM – Comunicação Científica GT 1 – Educação Matemática nas Séries Iniciais 6 Finalmente, a quarta posição é a defendida por Tardiff (2000) o qual argumenta que a atividade docente se desdobra concretamente numa rede de interações com outras pessoas, símbolos, valores, sentimentos, atitudes que constituem matéria de interpretação e decisões. O professor, neste movimento, seleciona, adapta e produz os saberes que se desenvolvem na prática. Ele, então, não rejeitaria em sua totalidade os outros saberes, como afirma Chervel, ao contrário, os incorporariam à sua prática, porém retraduzindo-os em categorias do seu próprio discurso. Assim, temos que pensar o processo de formação de professores a partir do reconhecimento de uma tensão, e não de identidade, entre educação (escolar) e ensino (da matemática científica). É necessário se colocar a questão da complementariedade. Moreira et al (2003) relacionando a matemática escolar e a científica afirmam que se considerarmos a matemática escolar uma didatização da científica, a formação pedagógica seria apenas um lubrificante. Se concebemos a matemática escolar como uma construção autônoma da prática escolar, não há muito o que ser feito no processo de formação do professor. Se concebemos a matemática escolar como uma construção histórica que reflete múltiplos condicionamentos, é necessário para o processo de formação uma análise em seus diferentes aspectos: produção, retradução, seleção, adaptação, carência e transmissão de saberes. Conclui-se, assim, a grande necessidade de uma formação continuada que, de fato, permita aos docentes a apropriação (e construção) de conceitos visando uma posteriori reorganização dos saberes para a sua prática. Mais importante do que o dilema da “superioridade” ou não do conhecimento científico, estão os valiosos momentos de reflexão teórico-prática que contribuem, de maneira significativa, para o estabelecimento de uma relação de complementaridade entre os saberes da formação inicial e os saberes da prática. Concebendo que Formação Continuada implica em teorização sobre a prática num espiral de ação - reflexão - ação, postulamos que é necessário que um mesmo tema seja retomado em diferentes momentos pelo aprendiz, de diferentes maneiras e sempre tendo como âncora a sua prática diária. Assim, se não forem definidos temas a serem aprofundados, corremos o risco de não levar o professor a uma teorização por não garantir o tempo suficiente de apropriação dos saberes que são indispensáveis dentro do tema em questão. Nesse sentido, esse projeto buscará dentro da área de matemática, investigar o ensino das resoluções de problemas de estrutura aditiva. Apesar das operações de adição Anais do VIII ENEM – Comunicação Científica GT 1 – Educação Matemática nas Séries Iniciais 7 e subtração serem realizadas quotidianamente para resolver vários problemas da vida real, os alunos do Ensino Fundamental apresentam muitas dificuldades nesse conteúdo. A literatura vem nos mostrando que ao final da 4a série do Ensino Fundamental, os alunos ainda apresentam dificuldades em resolver problemas de estrutura aditiva (Vergnaud e Durand, 1976; Borba e Santos, 1997; Borba; Pessoa e Santos, 1997). Compreender a estrutura lógica dos problemas não é difícil apenas quando os mesmos são apresentados na forma de enunciados escritos. Guimarães, Gitirana e Roazzi (2001), investigando como alunos de 3a série do Ensino Fundamental resolviam problemas apresentados a partir de um gráfico de barras ou de uma tabela, observaram que os alunos também apresentaram dificuldades, principalmente quando era solicitada uma comparação. Em parte, podemos creditar essas dificuldades aos próprios livros didáticos que não apresentam uma preocupação com a apresentação das diferentes situações problemas no campo das estruturas aditivas, como mostram Borba, Pessoa e Santos (1997). Podemos creditar essas dificuldades dos alunos, também, às defasagens na formação dos professores. Pessoa e Falcão (1999) realizaram um interessante estudo buscando investigar como os professores responsáveis pelo ensino deste conteúdo compreendiam os aspectos conceituais envolvidos em problemas de estrutura aditiva observaram que e os graduandos em pedagogia apresentaram dificuldades não só na compreensão dos problemas, como também na resolução de algoritmos de subtração. Esse tipo de observação, ou seja, de que os professores apresentam dificuldades de compreensão dos conceitos que se prontificam a ensinar já foram levantados em outros estudos, mostrando que a dificuldade não se resume às estruturas aditivas. O trabalho de Oliveira, Pessoa e Borba (1999) mostra os mesmos resultados com problemas que envolviam divisão ou o trabalho de Guimarães e Wanderley (1994), envolvendo a compreensão do conceito de fração. Dessa forma, pretendemos levar os professores a compreender que a adição e a subtração estão ligadas à mesma estrutura lógica. Então, uma mesma operação está relacionada a problemas diferentes e um mesmo problema pode ser resolvido por diferentes operações. Podemos distinguir dois tipos de cálculos na resolução de um problema: o cálculo relacional que está ligado à compreensão lógica do problema e o cálculo numérico que está ligado à computação que o aluno faz. É importante ressaltar que tanto os professores como os alunos precisam saber estabelecer os diferentes Anais do VIII ENEM – Comunicação Científica GT 1 – Educação Matemática nas Séries Iniciais 8 cálculos relacionais: mudança envolvendo inclusão, mudança envolvendo equalização, combinação e comparação entre quantidades. Não menos importante é saber que não existe uma única forma de resolver os problemas e que, portanto, precisamos considerar os desenhos, rabiscos, formas pessoais, cálculo mental e o algoritmo convencional como diferentes estratégias de resolução. Diante dessa situação, parece-nos que trabalhos de formação continuada de professores no campo das estruturas aditivas se fazem imprescindíveis se pretendemos uma real aprendizagem. Objetivos Este estudo observou o processo de transposição didática realizado por uma professora a partir dos encontros de formação continuada, buscando analisar o processo de construção de conhecimentos dessa professora sobre estruturas aditivas relacionado as estratégias adotadas por ela na condução do ensino. Metodologia No início do processo de formação continuada realizamos uma diagnose referente às atividades propostas pelas professoras em sala de aula. Em seguida foram realizadas atividades de reflexão teórico - prática acerca da organização do trabalho pedagógico e das formas de ensino adotadas para a aprendizagem do campo conceitual das estruturas aditivas. Foram realizadas observações de aulas das professoras, as quais foram gravadas e transformadas em relatórios. Nesse estudo, analisamos os 6 (seis) relatórios dos encontros pedagógicos realizados com 9 (nove) professoras e 1 (uma) coordenadora de 1 a 4a série do Ensino Fundamental. Foram analisados também 10 (dez) observações de aulas de uma professora da 4a série, aqui denominada professora “S”, referente aos anos de 2002 e 2003. Esse trabalho foi desenvolvido em uma escola pública da Região Metropolitana do Recife. Resultados Começaremos analisando a compreensão das professoras expressas nos encontros pedagógicos, pois consideramos fundamental que elas dominem não só o processo de ensino-aprendizagem, mais também os conteúdos com os quais estão Anais do VIII ENEM – Comunicação Científica GT 1 – Educação Matemática nas Séries Iniciais 9 trabalhando, pois somente dessa forma serão capazes de organizá-los em função de seus objetivos. No Encontro Pedagógico do dia 19/06/02, por exemplo, a formadora (G) discute várias soluções dos alunos diante de problemas de estruturas aditivas, chamando a atenção para a diferença entre os alunos compreenderem o cálculo relacional e o numérico, como já havia feito em outros encontros, argumentando que muitas vezes o aluno compreende o problema (cálculo relacional), monta a conta correta, mas faz o cálculo numérico errado, como ocorre na situação abaixo. G: Aí o outro, vamos ver. “Carlos tem R$23,00 e Pedro tem R$17,00. Quantos reais Pedro precisa ganhar para ficar com a mesma quantia de dinheiro que Carlos?”... G: Duas quantidades diferentes que uma eu vou ter que igualar à outra. né? Então, aí ele responde assim: 23 -17 15 G: Ele entendeu a lógica do problema? P(diferentes professoras): Entendeu. G: Ele entendeu. Soube fazer o cálculo numérico? Professoras: Não...Ele armou a continha certa só que ele errou a conta. G: Ele errou o quê? P: A subtração com reserva. Só o resultado. G: Então ele montou a conta certa, mas o algoritmo dele estava errado. Essa conversa, entre outras, parece indicar que as professoras estão conseguindo entender que na resolução de um problema existem dois tipos de cálculo, o relacional e o numérico e que o aluno pode acertar um e errar o outro. Isso é de fato importante para as professoras, pois como discute Pessoa e Falcão (1999), podemos creditar as dificuldades dos alunos em resolver problemas também às defasagens na formação dos professores. Foi visto em estudos anteriores que os professores apresentavam dificuldades de compreensão dos conceitos que se prontificavam a ensinar. É importante ressaltar que tanto os professores como os alunos precisam saber estabelecer os diferentes cálculos relacionais. Partindo disso, nossos encontros pedagógicos buscaram levar os professores à compreensão do campo conceitual das estruturas aditivas, para assim terem elementos para o trabalho em sala de aula. A partir desse exemplo, também podemos observar a estratégia utilizada por nós, durante o processo formação, a qual buscou proporcionar as professoras situações nas quais elas podiam colocar suas experiências e a partir destas, irem estabelecendo uma Anais do VIII ENEM – Comunicação Científica GT 1 – Educação Matemática nas Séries Iniciais 10 relação entre a teoria e a prática, permitindo, assim, a construção dos conceitos que estavam sendo estudados num movimento espiral de ação - reflexão – ação. No dia 20/06/2002, ou seja, no dia seguinte do encontro pedagógico analisado acima, a professora S. discute sobre o que havíamos refletido nesse encontro comentando com seus alunos: S: Acredito que todos entendam que soma é o contrário da subtração, ou seja, é uma operação inversa. Se eu juntar o contrário de juntar, o que é? Tirar, né? Subtrair. A subtração eu tiro, às vezes eu comparo o que tem a mais, ou a menos. Nós sempre fazemos subtração nesse tipo de situação para resolver o problema, sendo que às vezes quando o aluno não lê o problema direito ele faz a continha errada o que não significa que ele não sabe fazer conta. A professora S. nos mostra que ela compreendeu que existem dois tipos de cálculo. O cálculo relacional, quando ela afirma que “às vezes quando o aluno não lê o problema direito ele faz a continha errada”, ou seja, quando ele não consegue interpretar corretamente o problema ele acaba registrando uma conta que não leva a solução do problema. Ela enfatiza também o cálculo numérico quando afirma “o que não significa que ele não sabe fazer conta”. Assim a professora S nos mostra compreender não só que existem dois tipos de cálculo como também a relação entre os dois, podendo o aluno acertar um e não o outro. Podemos, ainda argumentar que quando S. diz “A subtração eu tiro, às vezes eu comparo o que tem a mais, ou a menos. Nós sempre fazemos subtração nesse tipo de situação” pode ser reflexo do que a formadora, em encontros anteriores, discute a respeito dos diferentes tipos de cálculo relacional de estrutura aditiva e afirma que nem sempre são trabalhadas essas diferentes lógicas, argumentando, ainda, que os problemas que envolvem comparações são em geral pouco explorados em sala e nos livros didáticos como também argumentam Borba e Santos (1997). A professora, na situação explicitada acima, então, já afirma para os alunos o que ela faz como se estivesse respondendo ao que já havia sido discutido anteriormente. Por outro lado, podemos também interpretar que essa professora percebeu a importância de trabalharmos as diferentes lógicas. Entretanto, a partir da fala da professora S, duvidamos que os alunos consigam entender o que ela desejava trabalhar nesse momento. Para nós esse trecho parece demonstrar que a professora começa a compreender o que foi discutido com ela, mas Anais do VIII ENEM – Comunicação Científica GT 1 – Educação Matemática nas Séries Iniciais 11 não conseguiu realizar uma transposição de seus conhecimentos em possibilidade de conhecimentos para seus alunos. Assim, essa professora está construindo um conhecimento, ainda de forma inconsciente, o que a leva a não conseguir elaborar uma boa estratégia para a condução do ensino de estruturas aditivas em sua prática de sala de aula relacionando com o que foi discutido nos encontros pedagógicos. Por último, ela ainda acha que o aluno que não entende o problema é porque não leu o problema direito “às vezes quando o aluno não lê o problema direito ele faz a continha errada” desconsiderando, assim, o que ela mesma vinha vivenciando nos encontros já ocorridos e buscando explicitar para seus alunos. Em outro momento, ainda dessa aula, a professora S. corrige no quadro as questões da prova: S: Numa loja tinha 76 bandeirinhas do Brasil venderam algumas (algumas está aqui é o que a gente não sabe) ficando com 24, 24 é a quantidade que ficou na loja. A loja antes tinha 76 bandeirinhas, ficou com 24, quantas bandeirinhas venderam? A professora arma assim: 76 – = 24 Alunos: 52 (...) S: Aí quando eu passo a questão em forma de problema, conto uma história pra vocês resolverem, vocês se atrapalham. Por quê? Porque não interpretam o problema como ele está escrito aqui.(...) É isto aqui: valor desconhecido. Vale ressaltar que todos os problemas que estavam na prova foram postos em valores desconhecidos pela professora durante a correção e que durante suas aulas, em vários momentos, ela trabalhou com atividades que envolviam valores desconhecidos e resolução de problemas. Analisando esse e outros momentos, percebemos que a utilização do valor desconhecido foi a estratégia encontrada pela professora para ajudar os alunos a entenderem que existem diferentes lógicas nos problemas. No entanto, sabemos que ela não usou uma estratégia suficiente para possibilitar a construção de conhecimentos pelos alunos. Além do mais muitas vezes tentando ajudar o aluno, a professora acabava resolvendo o cálculo relacional, deixando para ser feito apenas a conta. Podemos levantar uma outra questão que surgiu na entrevista feita ao final dessa aula (dia 20/06/2002). A professora coloca que um dos seus objetivos era corrigir a avaliação e “ver o que os alunos erraram? Porque erraram? Como erraram?” Percebemos o interesse dela em analisar o erro de seus alunos, buscando entender suas hipóteses e Anais do VIII ENEM – Comunicação Científica GT 1 – Educação Matemática nas Séries Iniciais 12 estratégias. Essa postura pode ser reflexo dos muitos momentos que aconteceram nos encontros, onde foram discutidos hipóteses e estratégias de vários alunos, diante de situações diversas. Aliás, esta é uma das atividades mais importantes no processo de formação continuada, pois permite ao professor interpretar a aprendizagem de seus alunos a partir de seus conhecimentos sobre o conceito e sobre o processo de construção do mesmo. No caso da professora investigada neste trabalho (S), além dela expressar como objetivo seu de aula essa questão do erro do aluno, podemos perceber sua preocupação em de fato colocar este objetivo em prática. Abaixo descrevemos um episódio (aula25/07/2002) em que a professora reconhece o erro do aluno como um momento de aprendizagem: Uma aluna vai ao quadro para responder uma questão e erra. S: Ninguém corrigi nada. Vamos ver o raciocínio de G. É bom...Vejam bem, quando uma pessoa, quando uma pessoa erra aqui no quadro, é uma oportunidade de consertar, de aprender e tirar dúvidas. Vamos acompanhar o raciocínio dela para que a gente possa descobrir a forma para ela compreender correto. Esta sua postura deu origem a um artigo escrito por S o qual relata uma experiência sua e foi publicado em livro sobre formação continuada de professores. Nesse artigo ela apresentou a atividade de correção da tarefa de casa como um valioso momento de reflexão e construção da aprendizagem, discutindo a importância de um trabalho em sala baseado na valorização do erro do aluno. Segundo S é preciso fazer com que o aluno perceba isso também: “Discuto sempre com os alunos que todos precisam saber que o erro servirá de instrumento para a aprendizagem, pois todos podemos errar e através dele iremos aprender o certo”. O processo de formação continuada pelo qual passou essa professora pode ter contribuído para que ela assumisse essa postura em sala de aula. Vemos em suas falas vestígios das muitas discussões ocorridas nos encontros pedagógicos, como por exemplo, a necessidade da análise das hipóteses e estratégias dos alunos na hora deles resolverem questões. Embora reconhecemos a tentativa da professora em pôr em prática muitos dos conteúdos, procedimentos e atitudes trabalhados nesses momentos de reflexão, temos consciência de que não se trata de um processo linear de construção de conhecimento, como discute Lerner (1996). Algumas vezes a professora em foco não consegue Anais do VIII ENEM – Comunicação Científica GT 1 – Educação Matemática nas Séries Iniciais 13 trabalhar determinados conceitos (ou não vê como necessário). Destacamos mais um desses momentos. A professora comenta as dificuldades dos alunos (aula-27/08/02): S: Tem gente que acha uma dificuldade resolver um problema... há eu não sei fazer... Um problema é uma situação que vocês enfrentam também quando a mãe diz: Vá ali na venda e compre uma dúzia de ovos, vocês não sabem quantos ovos vão comprar? Doze.(...) Ao invés de ser o pai e mãe que mandou fazer, é uma historinha que está no livro e que tem que resolver. É uma besteira e tem gente que faz um bicho de sete cabeças. A professora sabe que os problemas estão no cotidiano dos alunos. Ela até fala isso para eles, mas continua trabalhando apenas aqueles problemas escritos nos livros, mostrando uma preocupação com a resolução em si e não como um meio. Nos encontros pedagógicos foi discutido em vários momentos a importância de um trabalho significativo com a matemática, na qual ela não seja o fim e sim um instrumento. No encontro do dia 25/04/2002, por exemplo, foi discutido a função dos números numa conta de luz e a importância destes para nós: G: ... é a data, que é um número que marca o tempo, né? Eu tenho aqui um número que marca os Kws, que é uma outra medida. Eu tenho aqui o valor monetário, que é uma outra medida (...) É só pra chamar atenção um pouco, o quanto que uma conta de luz ela pode propiciar a gente vários trabalhos interessantes sobre diferentes funções do número... . A quantidade de pessoas que existem e não sabe olhar, entender o que está escrito numa conta de luz, numa conta de água é muito grande (...) É a discussão da vida do cidadão, a relação social dele com a matemática... . A matemática tem que ser objeto, instrumento nosso de melhoria da gente, de inserção. No trecho de aula destacado anteriormente, percebe-se também, de certa forma, a angústia da professora para saber o porquê dos alunos não conseguirem resolver problemas se estes estão na vida, se já sabem fazer conta e se ela já ensinou o valor desconhecido - O que falta? Ela acaba apelando “é uma besteira e tem gente que faz um bicho de sete cabeças”. Finalmente gostaríamos de apresentar ao leitor uma tabela que mostra o que foi realizado pela professora em cada uma das aulas e seus objetivos explicitados ao final de cada uma. Essa comparação nos ajuda a entender o quanto a professora consegue compreender ou analisar sobre o seu processo de ensino-aprendizagem. Se refletir sobre a ação é um pressuposto fundamental para o exercício do ofício de professor, essas pequenas entrevistas nos permitem investigar se as professoras conseguem ter clareza Anais do VIII ENEM – Comunicação Científica GT 1 – Educação Matemática nas Séries Iniciais 14 dos objetivos das atividades que propõem e, se de fato, o que dizem fazer corresponde com o que fazem. Assim, a Tabela 1 apresenta uma descrição das atividades desenvolvidas e os objetivos explicitados pela professora ao final de cada aula. Tabela 1 - Aulas observadas em 2002 e 2003 da professora S. Data Atividades realizadas 16/05/2002 - Correção no quadro com os alunos da tarefa de casa sobre valor aproximado; - Resolução de problemas contidos no livro sobre estrutura aditiva e valor aproximado - Correção do exercício coletivamente; - Tarefa de casa: Armar e efetuar contas de adição e subtração; arredondar os números e resolver expressões numéricas. 20/06/2002 A professora comenta o desenvolvimento dos alunos durante o semestre; conversa sobre a avaliação de matemática e em seguida começa a corrigi-la (a professora lê as questões e resolve com os alunos no quadro); - Coloca um exemplo de tabela no quadro e solicita a construção de um gráfico a partir dos dados contidos na tabela dada. 25/07/2002 - Correção da tarefa de casa no quadro: (resolução de problemas) - Exploração inicial sobre o conceito de multiplicação: resolução no quadro (professora e alunos) de um problema que pode ser resolvido através da multiplicação. - Exercício do livro sobre multiplicação e em seguida correção coletiva - Tarefa de casa: resolver um problema que envolve multiplicação. Objetivos explicitados pela professora na entrevista “É para que eles compreendessem que muitas vezes não são mostrados os valores exatos das coisas. Por exemplo, cerca de 120.000 pessoas participaram da missa do padre Marcelo. Aproximadamente tantos habitantes, aproximadamente... Quer dizer é uma quantidade exata? ...Calcular justamente essa, o valor aproximado e a estimativa.” “Revisão de assuntos já trabalhados, correção da avaliação (o que erraram, porque erraram, como erraram). Questões de subtração e adição, resolução de problemas, leitura e interpretação de problemas, leitura do gráfico e construção do gráfico.” “Compreensão da idéia da multiplicação. Que eles compreendam como fazer a multiplicação, como utilizar e quando”. Anais do VIII ENEM – Comunicação Científica GT 1 – Educação Matemática nas Séries Iniciais 27/08/2002 - Correção coletiva da tarefa de casa sobre expressões numéricas; - Resolução pelos alunos de problemas de multiplicação contidos no livro. (um dos problemas vinha proposto em forma de tabela. - Correção dessa atividade com os alunos. 15 “Revisão e observação da compreensão dos problemas. Eu sempre gosto de fazer correção coletiva, em conjunto e através da correção a gente faz uma revisão e tira as dúvidas. (...) Eles tiraram dúvidas em relação à resolução de problemas, a leitura da tabela, alguns não tem interesse de ler a tabela e entender”. “A revisão de assuntos já trabalhados, no caso as quatro operações, procurando trabalhar a divisão que foi o assunto mais recente, não esquecendo as outras operações, não é?” 11/09/2002 - Correção coletiva da tarefa de casa: (resolução de problemas de divisão) - Resolução de problemas do livro referentes às estruturas multiplicativas. - correção coletiva no quadro; - Tarefa de casa: divisão de números e resolução de problemas de estruturas multiplicativas 10/10/2002 - Correção da atividade de casa: “Trabalhar com problemas e (Expressões numéricas e resolução de mostrar que não é difícil problemas de estruturas multiplicativas). resolver problemas. (...) Sobre a expressão, já foi trabalhado. A inclusão das chaves eles já compreenderam, a maioria está sabendo fazer.” 31/03/2003 - Correção da atividade de casa: criação de uma mensagem codificada pelos Não houve entrevista alunos e uma questão referente à propriedade associativa da adição; - Tarefa de classe: propriedades da adição - Tarefa de casa: problemas do livro envolvendo adição. 28/04/2003 - Correção no quadro com os alunos da “Continuar a aula anterior.” tarefa de casa sobre valor aproximado; - Exercício de classe: Resolução de problemas contidos no livro sobre estrutura aditiva e valor aproximado. 30/06/2003 - Correção coletiva da tarefa de casa no “É a compreensão do conceito multiplicação não livro: questões referentes à multiplicação de – Resolução de problemas envolvendo automática, mas compreender multiplicação e a construção pelos alunos o que realmente é a de uma tabela com a tabuada de multiplicação”. multiplicação por 2 e 3; - Tarefa de casa: exercício do livro e um problema envolvendo multiplicação Anais do VIII ENEM – Comunicação Científica GT 1 – Educação Matemática nas Séries Iniciais 30/07/2003 - Correção da tarefa de casa: expressões numéricas; - Resolver problemas que envolvem multiplicação. - Correção coletiva; - Tarefa de casa: Resolução de problemas de multiplicação e expressões numéricas. 16 “Deixa eu pensar... a compreensão de problemas, resolver problemas através das operações já trabalhadas, usando a expressão numérica”. Analisando o que esta professora coloca como objetivo seu da aula e o que ela realmente faz em sala, podemos tecer alguns comentários. Na aula do dia 16/05/2002, ela explicita como objetivo didático “... que eles compreendessem que muitas vezes não são mostrados os valores exatos das coisas”. Percebemos a sua preocupação em mostrar para os alunos que os conteúdos matemáticos se fazem presentes em situações diversas de nossa vida. Ela até trouxe na entrevista, como exemplo, a missa do padre Marcelo que tinha ocorrido naquela época no Recife. No entanto, na aula pudemos notar que ela apenas utilizou as atividades do livro didático. A professora S. apesar de desejar trabalhar o conteúdo de forma mais significativa, de fato, não o fez. Entretanto, isso não significa que ela sempre trabalhe dessa forma. Na aula do dia 20/06/2002, por exemplo, a professora coloca como um dos objetivos didáticos “leitura do gráfico e construção do gráfico”, um conteúdo pouco lembrado nas escolas, e ela consegue concretizar seu objetivo de forma mais significativa, utilizando uma situação cotidiana. Como podemos ver, a professora S nos mostra como a construção do conhecimento é um movimento freqüente de idas e vindas além da complexa relação de complementaridade entre seu discurso e a sua prática de sala de aula. Transformar a ação pedagógica em uma ação construtiva, criativa e crítica implica em inserir nas discussões acadêmicas com os professores e no acompanhamento desses, reflexões sobre a importância de uma matemática significativa, os objetivos do ensino da mesma e um domínio de conteúdos a serem desenvolvidos com os alunos. A prática da professora em análise nos aponta que ela conseguiu compreender grande parte dos conceitos trabalhados nos encontros e isso é que permite que ela organize sua prática. Não é um simples adaptar seus conhecimentos para os alunos. É considerar os valores e expectativas dos alunos, os seus e os dos pais de seus alunos, além dos valores da comunidade no entorno que julgam em última instância o valor de seu trabalho, considerando ou não a escola digna de educar seus filhos. A partir do que foi discutido acima, podemos ressaltar que como afirma Chevallard, os conteúdos trabalhados nos encontros foram selecionados pelas formadoras, o que segundo ele seria o primeiro momento da transposição didática, ou Anais do VIII ENEM – Comunicação Científica GT 1 – Educação Matemática nas Séries Iniciais 17 seja, a definição do “saber a ser ensinado”. O segundo momento da transposição seria a forma como foi organizado o saber a ser ensinado ou o modelo de formação continuada utilizado, transformando esse saber em “objeto de ensinamento”. Entretanto, consideramos que segundo nosso modelo de formação, as formadoras não transformaram o saber a ser ensinado em objeto de ensinamento e sim em objeto de apropriação das professoras. Portanto, não refere-se apenas ao “ensinamento” mas sim ao ensino-aprendizagem o qual considera as professoras construtoras de seu saber. Na mesma linha Tardiff (2000) argumenta que a atividade docente é matéria de interpretação e decisões, nas quais o professor seleciona, adapta e produz os saberes que se desenvolvem na prática criando o seu próprio discurso. Trabalhar com formação continuada de professores é reconhecer esse processo de construção e apropriação de conhecimentos e proporcionar momentos de reflexão teórico-prática que contribuam, de maneira significativa, para o estabelecimento de uma relação de complementaridade entre os saberes da formação inicial e os saberes da prática. Palavra-chave: transposição didática - estrutura aditiva – formação continuada Referenciais bibliográficos ASTOLFI, J. & DEVELAY, M. (1990). A Didática das Ciências. Campinas. Papirus. BORBA, R. & SANTOS, R. (1997). Analisando a resolução de problemas de estruturas aditivas por crianças de 3ª série, Anais da 49ª Reunião anual da SBPC, MG. BORBA, R.,PESSOA, C. & SANTOS, R. (1997). O livro didático de matemática de 1ª a 4ª série e o ensino-aprendizagem das estruturas aditivas, Anais do XXVI Congresso Interamericano de Psicologia, PUC - São Paulo. CARVALHO, J.M. E SIMÕES, R.H.S. (1999). 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