JOSÉ LUIZ DE QUEIROZ COMUTATIVIDADE NO CONTRATO DE SEGURO MESTRADO EM DIREITO PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA SÃO PAULO – 2007 JOSÉ LUIZ DE QUEIROZ COMUTATIVIDADE NO CONTRATO DE SEGURO Dissertação apresentada à banca examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito das Relações Sociais – Direito Civil Comparado, sob orientação da Professora Livre-docente Maria Helena Diniz. SÃO PAULO 2007 BANCA EXAMINADORA ________________________________ À Judith, minha mãe, ser que me aceitou como filho neste mundo, com todo o meu carinho e saudade. Gustavo e Suzane, filhos afetuosos, alegria de minha vida. Sueli, pelo amor que nos une e que traz sentido à minha vida, fonte sublime de esperança que se renova em cada despertar. AGRADECIMENTO À professora Doutora Maria Helena Diniz. Agradeço profundamente o privilégio de ter sido seu aluno. Hoje e agora, onde estivermos, o exemplo de sua dedicação e postura ética será o norte que perseguirei para o aperfeiçoamento na seara do direito e na docência. Ao Professor Doutor Renan Lotufo. Mestre que despertou em mim a necessidade de bem compreender que o direito, antes de tudo, é simplicidade e amor ao próximo. À minha família, seres iluminados que me honram com sua presença, carinho e compreensão. RESUMO Nos dias de hoje, o direito moderno encara a relação obrigacional de um ponto de vista dinâmico, indo além dos elementos que a compõem para considerar as funções que deve desempenhar. Nesta perspectiva dinâmica, a obrigação se apresenta como um processo em que a relação obrigacional se configura como algo complexo que se encadeia e se desdobra numa sucessão de atos em direção a um fim: o adimplemento, ou satisfação, dos interesses do credor. Assim vislumbramos no direito obrigacional uma preocupação moral de se buscar a harmonia social em detrimento aos interesses de cunho meramente egoístico. Revela-se, pois, uma tendência para a socialização e a moralização. Isolado, o homem é muito vulnerável aos golpes do acaso, que o mantêm em um estado de insegurança moralmente apenável e economicamente nefasto. Empreender e assumir responsabilidades exige uma certa confiança no futuro; ora, se o seguro não evita os sinistros, ele dilui seus efeitos entre todos os segurados. Mas, para que a empresa de seguro possa efetivamente indenizar todos os sinistros que tenham cobertura contratual, é necessário que ela organize a mutualidade dos riscos segundo regras matemáticas rigorosas que são o fundamento de sua técnica. O seguro é, pois, um contrato comutativo, em verdade um negócio jurídico coletivo, integrado pelos muitos atos individuais que aportam para o fundo comum os recursos tecnicamente exigidos para segurança de todos em relação às incertezas do futuro. A massa comum dos recursos financeiros a ninguém pertence, em termos de propriedade individual, sendo algo em aberto e permanentemente disponível para atender às necessidades que surjam e para cuja satisfação foi constituída. ABSTRACT Nowadays the modern law faces the obligatory relationship from a dynamical point of view, exceeding the elements it is composed of in order to consider the duty it must perform. In such dynamic perspective the obligation is shown as in a process where the obligatory relationship figures as something complex that links and unfolds a succession of acts towards an aim: completion or satisfaction of creditor´s interests. So, in the obligatory law we might shimmer a moral concern in the search of social harmony in detriment of merely selfish interests. It reveals then a tendency to socialization and moralization. Isolated, man is very vulnerable to unexpecdted crisis that might keep him in a state of insecurity which might be morally punishble and economically disastrous. Undertaking and holding responsabilities demands a certain trust in the future; why, if the insurance does not avoid damage, it dissolves its effects among all the insured people. But for the insurance Company being able to really repay all the damages with contractual covering, it is necessary to organize the mutuality of risks according to rigid mathmatical rules which are the base of its technique. The insurance is, therefore, a commutative contract, as a matter of fact, a coletive forensic business which is integrated by many individual acts that lead to the common fund the technically demanded resources, viewing the security of everyone concerning to the future uncertainness. The common mass of financial resources belongs to nobody when it refers to individual property, being sometimes left open and permanently available to comply the needs which may appear and for which satisfaction is was constituted. VI COMUTATIVIDADE NO CONTRATO DE SEGURO SUMÁRIO ABREVIATURAS ................................................................................. VIII PREFÁCIO ............................................................................................ X 1. O MUTUALISMO OU SEGURO NO BRASIL ........................................... 1 2. A OBRIGAÇÃO COMO PROCESSO ....................................................... 7 2.1. O dever de prestar garantia ............................................... 18 2.2. A conduta das partes contratantes ..................................... 21 3. A NATUREZA JURÍDICA DO CONTRATO DE SEGURO ......................... 26 4. ELEMENTOS CONCEITUAIS DO SEGURO ........................................... 36 4.1. Segurador ......................................................................... 36 4.2. Segurado .......................................................................... 44 4.3. Prêmio e seu cálculo ......................................................... 47 4.4. Risco ................................................................................. 51 4.4.1. O interesse segurado ......................................................... 66 4.4.2. O risco no contrato de seguro e no jogo ou aposta ............ 72 4.5. Indenização ...................................................................... 78 5. CARACTERES DO CONTRATO DE SEGURO ........................................ 86 5.1. A boa-fé ........................................................................... 89 VII 5.1.1. Histórico da boa-fé objetiva ............................................... 92 5.1.2. Definição da boa-fé objetiva .............................................. 95 5.1.3. A boa-fé objetiva e o contrato ........................................... 99 5.1.4. Normatização da boa-fé objetiva ..................................... 101 5.2. Função social do contrato de seguro ................................ 107 5.3. Função econômica do seguro ........................................... 116 5.4. Comutatividade ................................................................ 119 5.5. Contrato por adesão ......................................................... 126 5.6. Contrato aleatório ............................................................ 134 6. CONCLUSÕES ............................................................................... 141 7. BIBLIOGRAFIA ............................................................................. 143 8. ANEXO – Legislação nacional sobre seguros em ordem cronológica: Decreto-Lei nº 73/66 ......................................................................... 151 Decreto-Lei nº 261/67 ....................................................................... 183 Decreto-Lei nº 60.459/67 .................................................................. 185 Decreto nº 61.867/67 ........................................................................ 212 Decreto-Lei nº 802/69 ....................................................................... 219 Lei nº 6.194/74 ................................................................................. 220 Decreto-Lei nº 85.266/80 .................................................................. 224 Lei nº 7.944/89 ................................................................................. 225 Lei nº 8.177/91 ................................................................................. 228 Lei Complementar nº 109/01 ............................................................ 241 VIII Lei nº 10.190/01 ............................................................................... 264 VIII ABREVIATURAS Ac. - acórdão AI - agravo de instrumento AP - apelação Ap.Civ. - Apelação Cível art. - artigo c/c - combinado com Cap. - capítulo CC - Código Civil; Câmara Civil CF - Constituição Federal civ. - civil; cível CPC - Código de Processo Civil Des. - Desembargador DJU - Diário da Justiça da União DOE - Diário Oficial do Estado ECA - Estatuto da Criança e Adolescente inc. - inciso j. - julgado LICC - Lei de Introdução ao Código Civil m.v. - maioria de votos Min. Ministro IX RE - recurso extraordinário Rel. - Relator RF - Revista Forense RJ - Revista de Jurisprudência (seguindo-se o Tribunal que a edita) RT - Revista dos Tribunais RTJ - Revista Trimestral de Jurisprudência STF - Supremo Tribunal Federal STJ - Superior Tribunal de Justiça T. - Turma TAC - Tribunal de Alçada Civil TACivRJ - Tribunal de Alçada Civil do Rio de Janeiro TACivSP - Tribunal de Alçada Civil de São Paulo TJDF - Tribunal de Justiça do Distrito Federal TJES - Tribunal de Justiça do Espírito Santo TJMG - Tribunal de Justiça de Minas Gerais TJRJ - Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro TJRS - Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul TJSP - Tribunal de Justiça de São Paulo V. - venerando v.u. - votação unânime vol. - volume X PREFÁCIO A grande industrialização, os grandes inventos, as grandes descobertas, a captação e o aproveitamento, pelos homens, de grandes e desconhecidas energias, os adensamentos populacionais nos grandes centros, tudo isso que, via de regra, se traduz em novos confortos para a humanidade, em novos progressos, em novas melhorias das condições de vida, traz, porém, consigo a multiplicação dos riscos. O acidente, além de se tornar anônimo surge, também, como acontecimento inevitável em virtude das novas atividades e dos progressos novos. O homem emerge do individualismo para o socialismo jurídico e seu trabalho, do simples artesanato, abruptamente ingressa no da produção em série, deixando para trás o “laisse faire” da economia liberal. Mudou-se, de inopino, para um regime econômico novo, solidarista, onde a produção se concretiza à base de coordenação de aptidões e esforços. O homem passou a ser a unidade econômica que se faz mister preservar a todo custo, já que um dano a ele poderia resultar numa ruptura geral do equilíbrio. Os riscos criados não se consideram mais simples riscos individuais. São riscos sociais e não é justo que apenas o homem, individualmente, responda pelo sinistro. Desta forma, se todos se beneficiam com o progresso e com os resultados obtidos em termos de viver-se melhor e mais intensamente, compreensível que, XI pelos danos, todos respondam também, e não, restritivamente, esse ou aquele apenas. Fazer do evento danoso o fruto do mero acaso, do simples fortuito, que a ninguém obriga, nos termos da teoria clássica, talvez fosse mais simples e mais fácil, mas, evidentemente, muito mais injusto. Observa-se, então que o conceito de culpa se revela estreito demais para transmitir a idéia de justiça inserida no consciente coletivo. O problema tem de ser enfocado de um plano mais alto, segundo um critério mais largo e mais generoso, uma vez que tão digna de proteção jurídica é a vítima, como também, o autor do dano. A tendência em se repartir entre a vítima e o agente os ônus do ressarcimento é solução simplista que não resolve o problema. Todos têm o direito de permanecer indene. Assim, a teoria do risco, seria a que melhor se aproxima do ideal e isso por fazer atribuir ao autor do evento o encargo da reparação por um motivo de superior interesse social. O risco provoca uma atitude civil mais preventiva e não sancionatória. Nem sempre o dano decorre da culpa, sendo que entre a teoria individualista, condutora, em nome da lógica jurídica, a uma situação de não ressarcimento e a teoria que leve o agente a uma reparação, esta última parece preferível. E todas essas razões seriam apenas justificativas já que, evidentemente, o que se tem em vista, no caso, é a sociedade mesma, sobre a qual se refletem de um modo ou de outro, direta ou indiretamente, as conseqüências sempre prejudiciais dos danos. XII A sociedade e não os indivíduos é que deve ser trazida ao debate das soluções concretas. Pouco importa que os danos tenham sido causados por esse ou aquele: o que importa é que entre todos os membros da coletividade se repartam suas conseqüências. O risco, portanto, se coletiviza. Socializa-se a responsabilidade. E embora não se possa ignorar o fator culpa, para as fraquezas individuais inerentes à natureza humana toda condenação aparece como uma desgraça imerecida. O melhor meio de se acautelarem todos contra essa desgraça imerecida é apelar para o seguro. A idéia central desse comportamento têm seu fundamento no fenômeno chamado de mutualização dos riscos através dos seguros. Desta forma, a essência desse mecanismo assecuratório de garantia de reparação de danos, modernamente chamado de contrato de seguro é a comutatividade das prestações dos contratantes, afastando-se a idéia de álea que, definitivamente, a nosso ver, não se coaduna com esse instrumento jurídico, sendo essa a visão que extraímos da moderna doutrina relativa ao contrato de seguro. São Paulo, 30 de março de 2007. José Luiz de Queiroz 1 1. O MUTUALISMO OU SEGURO NO BRASIL No dizer de Munir Karam1, o seguro é um tema desafiador, pois compreende uma atividade extremamente complexa, que desborda do campo jurídico, para atender a exigências matemáticas, financeiras, econômicas e éticas. No dizer deste autor o homem nasce na incerteza. No ventre materno não é afetado nem pelo calor, nem pelo frio. A luz não o incomoda. Mas, já ao nascer, chora, sente a temperatura, perde o cordão umbilical. Só há duas certezas: mudança, porque nada é imutável e a morte, que é inevitável. Assim, como a morte é inevitável, o seguro é a maneira de obviar a incerteza da vida. E quais são os meios de auto defesa de que dispõe o homem? A Previdência, que é uma garantia no futuro, a tranqüilidade da velhice. O mutualismo, com o significado de uma realização comunitária. E, finalmente, a Seguridade, que é a busca da sobrevivência contra os infortúnios da vida. O mutualismo já era conhecido das primeiras civilizações e a história se encontra repleta de exemplos de sua prática entre os hebreus e fenícios, primeiramente, estendendo-se aos gregos e romanos, como a forma mais lógica e racional de suavizar, de forma coletiva, as perdas individuais2. 1 Munir Karam. Do contrato de seguro no Código Civil: noções fundamentais. RT 834/74, São Paulo: Ed. RT, 2005. 2 Nelson Borges. Os contratos de seguro e sua função social. A revisão securitária no novo código civil. RT 826/2004. 2 Não se pode ignorar que a mutualidade ou seguro, além de uma realização comunitária coletiva de garantia solidária, é fator de expansão econômica, porque agregadora de poupança e de tranqüilidade social. Na visão de Sérgio Cavalieri Filho3, quando falamos em mutualismo estamos falando de uma comunidade submetida aos mesmos riscos, às mesmas probabilidades de danos, razão pela qual decidem contribuir para a formação de um fundo capaz de fazer frente aos prejuízos sofridos pelo grupo. Nos tempos pretéritos, na hipótese de um sinistro qualquer ninguém duvidava de que todo o peso de sua carga devesse se abater exclusivamente sobre a vítima, a menos que alguém pudesse ser moralmente responsabilizado por ele. Hoje em dia, no entanto, nem a vítima, nem a opinião pública, raciocinam da mesma forma. Aquilo que todos concordam é que o fato do sinistro rompe o equilíbrio da justiça, impondo a idéia da reparação. Em verdade, o que se observa é de um lado o desejo de se atribuir a alguém a responsabilidade pelo dano e, do outro, a generalizada tendência de se precaverem todos contra o dano. Essa maneira de pensar e proceder é perfeitamente compreensível, basta não esquecermos que, antigamente, os riscos se verificavam em menor escala e eram de controle relativamente fácil. A idéia do seguro como fator de proteção diante das fatalidades da vida surge quando o homem se preocupa em neutralizar os efeitos de um 3 Sérgio Cavalieri Filho. Visão panorâmica do contrato de seguro e suas controvérsias. Revista do Advogado. São Paulo. n. 47, p. 7-13. 3 acontecimento que pode ocorrer ou não. É muito comum mencionar a esse respeito o exemplo dos cameleiros da Babilônia, treze séculos antes de Cristo4. Um grupo de cem cameleiros saía, indo de uma cidade a outra, mas tendo que atravessar o deserto. Numa viagem dessas, que durava, aproximadamente, uma semana, perdiam-se, por exemplo, dez camelos. Ao chegar a seu destino, os integrantes do grupo faziam uma "conta de restaurante" e dividiam entre si os prejuízos, comprando novos camelos para os proprietários daqueles que faleceram. Na época, eles não tinham conhecimento matemático para fazer uma previsão estatística do número de acidentes. Além disso, nem havia a figura da seguradora, que se confundia com o grupo de cameleiros. Contudo, eles eram ao mesmo tempo segurados e seguradora. A figura do prêmio, que é aquela contribuição que o segurado dá à seguradora, não existia. O prêmio se confundia com a indenização. A inexistência de companhias de seguros na antigüidade significava a ausência de uma empresa especializada em gerenciar os riscos das outras pessoas. Neste passado distante, remediava-se os sinistros depois que eles ocorriam, bem diferente do que é hoje, quando o prêmio significa exatamente a prevenção de uma fatalidade através do pagamento antecipado de uma pequena remuneração. No século XII, por exemplo, apareceu o Contrato de Dinheiro e Risco Marítimo. Por força das suas cláusulas, um financiador emprestava ao navegador o dinheiro correspondente ao valor da embarcação e das mercadorias transportadas.5 4 Nelson Borges. Os contratos de seguro e sua função social. a revisão securitária no novo código civil. RT 826/2004. 5 Silney de Souza. Seguros: contabilidade, atuária e auditoria. São Paulo. Editora: Saraiva. 2001. p. 4. 4 Se não houvesse acidente, o navegador devolvia o dinheiro ao financiador acrescido de juros. Em caso de acidente, o dinheiro não era devolvido. Durante muito tempo, a atividade seguradora esteve vinculada a operações bancárias. As primeiras sociedades de socorros mútuos, embrião das seguradoras de vida, surgiram por volta do século XVII justamente pela iniciativa de um banqueiro, o italiano Tonti (daí o nome dessas sociedades, as tontinas.) E mesmo o primeiro contrato de seguro, firmado em 1347, em Gênova, na Itália ainda não contava com a figura da seguradora como gerente do risco. O seguro só se estabeleceu nas bases em que é conhecido atualmente na Inglaterra, durante a Revolução Industrial, quando foram criadas as primeiras sociedades de seguros. A mais significativa delas foi a Lloyd's. Em 1666, com o grande incêndio que destruiu a cidade de Londres, surgiu o seguro contra fogo6. Os avanços de Pascal na Estatística, nesta época, também foram fundamentais para a atividade seguradora decolar. Enquanto que no Brasil o início da atividade seguradora teria que esperar a eclosão do conflito deflagrado na Europa, como conseqüência da Revolução Francesa. Com efeito, o marco inicial da atividade seguradora no Brasil está ligada à vinda da corte portuguesa para o País em 1808, devido à ofensiva de Napoleão Bonaparte na Europa. 6 Munir Karam. Do contrato de seguro no Código Civil: noções fundamentais. RT 834/74, p. 75. 5 A necessidade de proteger as embarcações marítimas era premente e isso levou à formação das primeiras companhias, voltadas exatamente para o seguro marítimo. Assim, quando o sistema produtivo nacional tinha feições semi-coloniais, em um Estado com economia baseada na agricultura e pouco desenvolvido, as seguradoras operavam exclusivamente o seguro marítimo, sendo fiscalizadas e normatizadas pela Casa de Seguros de Lisboa. Com esta característica, atuavam a Companhia de Seguros Boa Fé, a pioneira, fundada em 1808, a Companhia de Seguros Conceito Público, Bahiana, como a primeira e inaugurada no mesmo ano daquela e a Companhia de Seguros Identidade do Rio de Janeiro, surgida em 1810. Penetrou paulatinamente nas práticas civis, vencendo pouco a pouco as resistências e preconceitos, sobretudo em relação ao seguro de vida, pois se entendia que era imoral que alguém lucrasse com a morte de alguém, motivo pelo qual, admitia-se apenas o seguro de escravos, porque eles eram considerados coisas, objetos. A legislação brasileira haveria de disciplinar primeiramente o seguro marítimo, no Código Comercial de 1850. No entanto, o mercado segurador alcançou efetivo avanço com o advento do Código Civil de 1916 (arts. 1.432 e ss.), que pretendeu dar-lhe ordenamento definitivo, isto considerando-se a sua atipicidade em vários sistemas e a ausência de maior desenvolvimento no campo doutrinário7. Ao longo dos anos o mercado segurador brasileiro como fenômeno econômico recebeu grande incremento, com os riscos seguráveis atingindo 7 Munir Karam. Do contrato de seguro no Código Civil: noções fundamentais. RT 834/74, p. 75. 6 variedade enorme e aplicação corrente em numerosas atividades, apesar da má distribuição de renda e por inexistir entre nós uma cultura de seguro. No governo de Epitácio Pessoa, com o rápido desenvolvimento das atividades comerciais e industriais, haveria de surgir o ramo de acidentes do trabalho. A partir da gestão de Washington Luiz, o governo começou a se preocupar com as concorrências nas angariações dos seguros, que estavam levando as sociedades seguradoras a ficarem desprotegidas. Assim, o Poder Executivo obrigou as companhias a apresentar à Inspetoria de Seguros (órgão do Executivo responsável pelo controle das operações de seguros), para a devida aprovação, as suas taxas mínimas de prêmios. E, ainda na segunda década do século XX, surgem as primeiras operações dos chamados seguros de vida em grupo, uma modalidade de seguros norte-americana, que obteve êxito em nosso país. Uma grande e significativa mudança foi registrada na primitiva forma de indenização: no início, os sinistros eram remediados após sua ocorrência; hoje, a prevenção das perdas é estimada por antecipação atuarial, por via de um pagamento, denominado prêmio, considerado como conditio sine qua non para a contrapartida indenizatória das seguradoras. Verifica-se, pois, que as contratações securitárias só têm razão de ser quando o risco é praticamente suprimido por via de sua diluição na mutualidade. Por tal prisma, constata-se que, a rigor, não existe a assunção de risco direto por parte da empresa seguradora, mas apenas responsabilidade pela segurança da outra parte, consubstanciada na garantia de sua indenização, na ocorrência do sinistro.8 8 Marcello Teixeira Bittencourt. O contrato de seguro. Rio de Janeiro: Idéia Jurídica. 2000. p. 21. 7 Assim, os contratos de seguro são verdadeiras redes jurídico-econômicas de proteção que objetivam amparar os contratantes quando em confronto com os riscos a que estão sujeitos na vida diária. 9 Mas uma visão razoavelmente fiel desse mecanismo assecuratório da plena responsabilidade civil, destinado a cobertura de riscos relacionados à garantia de obrigações contratuais, exige, primeiramente, uma análise dinâmica das obrigações envolvidas. 9 Nelson Borges. Os contratos de seguro e sua função social. a revisão securitária no novo código civil. RT 826/2004. 8 2. A OBRIGAÇÃO COMO PROCESSO Em lugar da antiga visão estática da relação obrigacional, o direito moderno a encara do ponto de vista dinâmico. Além, pois, da estrutura (elementos que a compõem), considera as funções que deve desempenhar (finalidades visadas pelo vínculo jurídico). 10 Nesta perspectiva dinâmica, a obrigação se apresenta como um processo em que a relação obrigacional se configura como algo complexo que se encadeia e se desdobra numa sucessão de atos em direção a um fim: o adimplemento, ou satisfação, dos interesses do credor. O direito das obrigações se movimenta no sentido de impedir explorações, em promover o equilíbrio, há uma preocupação moral de se buscar a harmonia social em detrimento aos interesses de cunho meramente egoístico. Tende-se para a socialização e a moralização, na conformidade das convicções a esse respeito dominantes. 11 O adimplemento atrai e polariza a obrigação. É o seu fim. O tratamento teleológico da obrigação deve, por isso, permear todo o estudo da relação obrigacional, permitindo detectar todos os seus elementos – deveres e poderes – bem como lhes definir o sentido e os limites. 12 Como processo, anota Clóvis do Couto e Silva13, a obrigação compõese, em sentido lato, do conjunto de atividades necessárias à satisfação do interesse do credor. Explica mais o civilista: “(...) os atos praticados pelo devedor, bem assim como os realizados pelo credor, repercutem no mundo 10 Fernando Noronha. Direito das obrigações. São Paulo: Saraiva, 2003, vol. I, n. 1.6.1., p. 76. Orlando Gomes. Transformações gerais do direito das obrigações. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1980, p. 1-8. 12 Clóvis do Couto e Silva. A obrigação como processo. São Paulo: José Bushatsky Editor, 1976, p. 5. 13 Clovis do Couto e Silva. A obrigação como processo. p. 10. 11 9 jurídico, nele ingressam e são dispostos e classificados segundo uma ordem, atendendo-se aos conceitos elaborados pela teoria do direito. Esses atos, evidentemente, tendem a um fim. É precisamente a finalidade que determina a concepção da obrigação como processo”. A finalidade é imprescindível a todo e qualquer ato jurídico, em alguns, sua menção expressa é condição necessária. Há figuras jurídicas nas quais a finalidade compõe o suporte fático, em outras isso não se sucede. Contudo, não se deve pensar que a complexidade do desenvolvimento do vínculo esteja condicionada à extensão da inserção do fim no suporte fático do negócio. A hermenêutica e a categoria jurídica do ato é que darão a medida do desenvolvimento do processo até o adimplemento total. 14 Nessa linha de raciocínio, Fernando Noronha15 esclarece que podem ser detectadas, em função da finalidade da relação obrigacional, deveres principais (ou primários), deveres secundários (ou acessórios) e deveres fiduciários (ou anexos, laterais, meros deveres de conduta). Os deveres principais ou essenciais são os que dizem respeito às prestações nucleares da obrigação, isto é, aquelas que satisfazem diretamente o interesse do credor, ou quando haja duas ou mais partes, os interesses de cada uma delas. Por isso os deveres principais são a razão de ser da própria relação obrigacional, que sem eles não existiria. 16 Deveres acessórios referem-se a prestações determinadas e exigíveis em razão do vínculo obrigacional, mas que são diversas daquelas que 14 Clovis do Couto e Silva. A obrigação como processo. p. 71-142. Fernando Noronha. Direito das obrigações. São Paulo: Saraiva, 2003, vol. I, n. 1.6.1. p. 79. 16 Fernando Noronha. Direito das obrigações. p. 79. Na compra e venda, por exemplo, são deveres principais a transferência do domínio e o pagamento do preço. 15 10 caracterizam a obrigação, muito embora estejam diretamente ligadas à realização destas. Admitem, porém, exigibilidade autônoma. 17 Os deveres secundários são resultantes da incidência do princípio da boa-fé. Tais deveres secundários comportam tratamento que abranje toda a relação jurídica. Assim, podem ser examinados durante o curso ou o desenvolvimento da relação jurídica e, em certos casos, posteriormente ao adimplemento da obrigação principal (atos de proteção, como o dever de afastar danos, atos de vigilância, de guarda, cooperação, assistência). 18 Por fim, os deveres fiduciários ou anexos não se referem propriamente a prestações especificadas, mas apontam para modelos de comportamento que legitimamente são esperados de acordo com os padrões socialmente recomendados e que se traduzem nas idéias de correção, lisura e lealdade entre os sujeitos do vínculo obrigacional, caracterizando o denominado princípio da boa-fé contratual. 19 Entre os deveres anexos ou fiduciários, citam-se os deveres de cuidado, previdência e segurança, os deveres de aviso e esclarecimento, os deveres de informação, o dever de prestar contas, os deveres de colaboração e cooperação, os deveres de proteção e cuidado com a pessoa e o patrimônio da contraparte, os deveres de omissão e de segredo. 20 Não é possível relacionar todas as hipóteses em que se desdobra o dever de boa-fé, nem estabelecer uma fórmula de fixação do seu conteúdo aplicável a todas as situações que surgem na convivência social. Tal fixação somente se dará caso a caso, segundo as circunstâncias em que a atuação das 17 Fernando Noronha. Direito das obrigações. p. 79. Em qualquer obrigação ao credor compete, por exemplo, dever acessório de, após o adimplemento, dar a quitação ao devedor. É também o caso de sujeição à multa contratual ou aos juros de mora, quando se descumpre a prestação devida ou se retarda a sua satisfação. 18 Clovis do Couto e Silva. A obrigação como processo. p. 71-142. 19 Fernando Noronha. Direito das obrigações. p. 80. 20 Judith Martins Costa. A boa-fé no direito privado. São Paulo: Ed. RT, 1999, p. 439. 11 partes se concretizou, conforme a natureza da relação, a situação socioeconômica dos agentes e muitos outros fatores. 21 No fundo e em síntese, os deveres anexos ou de mera conduta, a que se refere o princípio da boa-fé objetiva, traduzem-se em deveres de cooperação com a contraparte. Como não se pode antecipadamente especificar, diante do negócio jurídico qual seria o dever anexo exigível, seu cumprimento somente pode ser analisado e detectado depois de consumada a infração da conduta leal necessária. Nessa altura, a comprovação do comportamento contrário à boa-fé representará ato ilícito, cuja sanção será, em regra, a imposição do dever de reparar o prejuízo causado à contraparte. 22 Quando o dever de boa-fé é violado, anterior ou concomitantemente à consumação do negócio jurídico, a ilicitude configurará dolo, que, como vício de consentimento, autorizará sua invalidação. Quando, outrossim, o dever anexo violado se apresenta como uma obrigação de fazer (prestar uma informação, exibir um documento ou uma coisa etc.) poderá a parte prejudicada adotar as providências coercitivas próprias destas obrigações, inclusive a multa cominatória. O alargamento do conteúdo do contrato, para além da vontade expressa das partes, por meio de uma intervenção heterônoma (legal ou judicial), no campo dos deveres paralelos (sob inspiração em finalidades sociais e éticas), atenua a distinção entre a responsabilidade contratual e a responsabilidade extracontratual. Outro fator decisivo que não pode ser olvidado é a despersonalização histórica da obrigação, com o reconhecimento da admissibilidade do 21 Regis Fichtner Pereira. A responsabilidade civil pré-contratual: teoria geral e responsabilidade pela ruptura das negociações contratuais. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 86-87. 22 Fernando Noronha. Direito das obrigações. p. 80-82. 12 adimplemento por outra pessoa, diversa daquela que originariamente se obrigou.23 A respeito do conteúdo do contrato, aduz Tereza Negreiros24 que, de fato, o conteúdo do contrato amplia-se, por força da boa-fé, para além das obrigações estritamente contratuais. Ao lado das obrigações que não existiriam fora do contrato, a boa-fé passou a incluir no contexto contratual o dever geral de não causar dano, em todas as suas múltiplas especificações. Este o campo de atuação dos deveres instrumentais. Tal visão da relação obrigacional também encontramos no direito comparado. Conforme ressalta Massimo Bianca25, ninguém está isolado no mundo jurídico. Os direitos e obrigações se concretizam em relação a outras pessoas. A pessoa não pode constituir, modificar ou extinguir suas relações sem modificar a esfera jurídica de outrem. Em geral o problema da relação contratual de fato deve ser localizado na base do significado social do comportamento do sujeito. Dieter Medicus26, por sua vez, destaca que a relação obrigacional se manifesta, em sentido amplo, como um conjunto composto por uma multiplicidade de pretensões e obrigações, que se tem designado como organismo ou processo. O autor observa que a utilização de tais nomenclaturas (organismo, processo) deve significar outra peculiaridade da relação obrigacional em sentido amplo: esta relação não permanece estática, no mesmo estado, ao contrário, pode alterar-se no curso do tempo. 23 Roberto Senise Lisboa. Contratos difusos e coletivos: consumidor, meio ambiente, trabalho, agrágio, locação. São Paulo. Ed. Revista dos Tribunais. 2000. p. 276. 24 Teresa Negreiros. Teoria do contrato. Novos paradigmas. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 153-154. 25 Massimo Bianca. Diritto civile – il contratto. Milano: Dott. Giuffré Editore, p. 1-51. 26 Dieter Medicus. Tratado de las relaciones obligacionales. Tradução de Ángel Martínez Sarrión. Barcelona: Bosch, 1995, v. 1, p. 5-8. 13 Verifica-se, portanto, que o direito moderno não se contenta com a descrição dos elementos da relação obrigacional. A sua face mais importante reside no seu aspecto dinâmico, nas fases de seu desenvolvimento e na interligação e interdependência entre elas. 27 Karl Larenz, examinando os elementos essenciais da relação obrigacional, identifica esta como um todo, englobando uma série de deveres de prestação e conduta. Um conjunto de direitos e de acontecimentos do mundo exterior perceptível aos sentidos, com conseqüências jurídicas. Lembra o autor que a ordem jurídica é algo vivo, não enclausurado no imaginário das partes envolvidas, com espírito objetivo. 28 Para esse autor alemão, a relação obrigacional, como relação jurídica concreta entre pessoas determinadas, existente no tempo é formada por um conjunto de direitos, obrigações e situações jurídicas, um todo, um conjunto (Gefüge), subsistindo como tal ainda que alguns dos deveres hajam desaparecido com o cumprimento, ou prescritos. Toda a relação de obrigação persegue, quanto possível, a mais completa e adequada satisfação do credor ou dos credores. Para Karl Larenz29 os deveres principais ou primários fornecem o conteúdo e significado da relação obrigatória e determina o caráter típico desta. É a prestação determinada. A obrigação está dirigida à prestação determinada do devedor (ou a prestação de ambas as partes) e quando isto é produzido foi alcançada a finalidade da obrigação e esta, em geral, é extinta. 27 A respeito de como o direito inglês encara o direito obrigacional, vide René Davi, O direito inglês, tradução de Eduardo Brandão; revisão técnica e da tradução Isabella Soares Micali – São Paulo: Editora Martins Fontes, 1997. p. 111/118. 28 Kart Larenz. Derecho de obligaciones. Tradução de Jaime Santos Briz. Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado, 1958, v. 1, p. 13-45. 29 Karl Larenz. Derecho de obligaciones. p. 13-45. 14 Relativamente aos deveres secundários, esclarece que a relação obrigatória não se esgota no dever de prestação. Para toda a relação jurídica, qualquer que seja sua estrutura, vige o dever de não defraudar a confiança nem mesmo a boa-fé. Na preparação em cumprimento da prestação, por exemplo, o devedor deve utilizar a diligência necessária para alcançar o objeto da prestação, etc. 30 Não é só o devedor que deve observar esses deveres, mas também o credor (ex: não pode fazer exigências contrárias a equidade, fazendo exigências, por exemplo, atentatórias à integridade física do devedor). São deveres de conduta: excedem o próprio e estrito dever de prestação (cujo cumprimento constitui normalmente objeto de demanda) e que resultam para ambas as partes, além do expressamente pactuado, agir de acordo com a boa-fé e conforme as exigências do tráfico. Desta forma dado o fato de que a relação obrigacional tem por fim a satisfação do interesse da prestação do credor pode e deve se considerar a relação obrigacional como um processo. No mesmo sentido a lição de Mario Allara31, para quem os contratos devem ser estudados não só em uma visão estática, mas em uma perspectiva dinâmica, no estudo do movimento e das vicissitudes da relação obrigacional. De um lado, compreende-se o estudo do conteúdo do contrato ou da relação jurídica; do outro, o estudo das vicissitudes da relação em si mesma (extinção, modificação, constituição da relação, estudo da causa, do nexo entre a “fattispecie” e a hipótese etc). 30 Karl Larenz. Derecho de obligaciones. p. 13-45. Mario Allara. Corso de diritto civile - la teoria generale del contratto. Torino: G. Giappichelli – Editore, p. 7 a 39. 31 15 Francesco Messineo32 aponta como um efeito constante porque comum a todos os contratos o de dar vida a uma relação obrigacional. Desta forma, cada contrato tem como efeito inevitável a constituição ou modificação de uma relação jurídica patrimonial, ou seja, a construção de uma situação jurídica patrimonial nova. Portanto, o contrato é, antes de tudo, e em cada tipo, obrigatório. No dizer desse autor o contrato enquanto fonte de deveres para o devedor é ao mesmo tempo fonte de direitos para o credor, motivo pelo qual se fala em contrato sinalagmático. No caso de relação obrigacional, Messineo menciona uma função denominada de sinalagma genético, onde o contrato se limita a gerar e a legitimar a relação obrigacional ou a relação originária de um direito real. Quando o contrato permanece em vigor depois da constituição da relação, nos casos de execução continuada ou periódica, o autor fala em sinalagma funcional. Enquanto sinalagma genético o contrato estabelece a interdependência entre as obrigações no momento de seu aperfeiçoamento, enquanto no sinalagma funcional estabelece tal interdependência, também, entre as prestações. Tratando dos efeitos negociais ou fundamentais dos contratos, Messineo33 afirma que o contrato constitui o produto do respectivo processo de formação. A vida do contrato culmina nos seus efeitos, o contrato constitui, portanto, o instrumento para conseguir aquele resultado de índole patrimonial pretendido pelas partes. 32 33 Francesco Messineo. Il contrato in genere. 2º Volume. Editora Giuffrè. p. 47 a 111. Francesco Messineo. Il contrato in genere. p. 47 a 111. 16 O autor define o efeito negocial como aquele que estabelece um compromisso entre as partes, assumindo força de lei, no sentido de que cada contraente, no momento da conclusão do contrato, é obrigado a observar um dado comportamento, como conseqüência imediata do limite que, ambos estipularam espontaneamente, tirando a própria liberdade de agir. Trata-se de circunstância em que existe agora, um dever, o qual não existia. Assim sendo, efeito final é um elemento teleológico, que visa constituir, regular ou extinguir uma relação jurídica, da qual fala a lei, ou seja, consiste na modificação de uma situação jurídica. 34 Em outras palavras, o efeito final do contrato é constituído daquela relação que se estabelece entre as partes (e, também, no confronto de um terceiro), seguida da execução do contrato, enquanto que o efeito negocial diz respeito à irresolubilidade. A finalidade útil da relação contratual também aparece na obra de Emilio Betti35, que distingue na prestação um elemento subjetivo que tem um conteúdo de cooperação exigido do devedor e um momento objetivo que diz respeito à utilidade da prestação para o credor. Assim a existência, na prestação, de um conteúdo valorável de uma regra deontológica de diligência, e, eventualmente, também, de uma regra de habilidade técnica exigível do devedor, bem como, de outro lado, a prestação pode ter por conteúdo apenas um resultado útil ao credor. Num contrato envolvendo a figura do advogado, a prestação consiste numa atividade a ser desenvolvida em favor do credor, sem o compromisso de que essa atividade lhe traga um resultado útil. 34 35 Francesco Messineo. Il contrato in genere. p. 47 a 111. Emílio Betti. Teoria generale delle obbligazioni. Milano: Giuffrè, 1955, v.4, p.40-44. 17 Há contratos onde se pode exigir uma prestação que implique em colocar à disposição do credor o resultado útil de uma prestação, como por exemplo, a construção de um prédio ou um contrato de transporte. Enquanto ausente o resultado útil, ausente a prestação. 36 Relativamente às relações estabelecidas no contrato de seguro, para Emilio Betti o credor possui uma expectativa a uma utilidade que escapa ao conteúdo de uma diligência ou ao resultado de uma operação, motivo pelo qual o autor comenta a existência do que chama de um terceiro tipo de prestação. Tal prestação consiste, de um lado, no pagamento de um determinado prêmio e de outro uma utilidade consistente em garantia de que a ocorrência de um evento temido pelo credor, acarretará o pagamento de uma indenização ou uma compensação que o proteja de um dano que venha a sofrer. Desta forma, a prestação do devedor consiste em assumir um risco temido pelo credor de um dano irreparável ou de difícil reparação. Assim, a assunção de um risco que gravita na esfera jurídica do segurado é a essência do contrato de seguro. O pensamento de Emilio Betti37 aponta uma cooperação virtual do segurador, em favor do credor segurado, consistente em assegurar-lhe uma tranqüilidade, uma liberação de preocupações, que sem essa cooperação não seria possível. Porém, a segurança sobre um interesse vital do segurado não se exaure no pagamento de uma soma estipulada, como um crédito pecuniário abstrato, mas, também, na possibilidade de um pagamento ao beneficiário, em caso de morte do estipulante. 36 Emílio Betti. Teoria generale delle obbligazioni. Milano: Giuffrè, 1955, v.4, p.40-44. 18 No contrato de seguro, tendo em vista a necessidade de cooperação virtual do devedor/segurador, se destaca a boa fé como requisito intrínseco. Abordando o aspecto de socialização da relação presente no contrato de seguro, verifica-se que as relações jurídicas envolvendo seguro levam em conta cálculos de probabilidade e pagamento de prêmios, que interessam a toda a sociedade, reforçando a idéia de que a prestação escapa ao conteúdo valorável de uma diligência, e, eventualmente, a uma regra de habilidade técnica exigível do devedor, bem como que a prestação possa ter por conteúdo apenas um resultado útil ao credor, pois toda a sociedade tem interesse na celebração e cumprimento do contrato. Diante de uma visão estática imobilizante pode ser difícil distinguir a obrigação de pagar uma soma (a título de indenização ou de ressarcimento) do precedente empenho de cooperação de caráter puramente virtual, por isso recomenda-se ao jurista uma visão dinâmica do fenômeno jurídico. Em qualquer outro contrato que tenha por conteúdo implícito ou explícito uma garantia de risco é necessário distinguir-se uma fase potencial que precede a fase de ocorrência do evento temido, sendo que, às vezes, a própria lei considera ínsita em certos tipos de contrato prestações desta ordem. Na opinião de Manuel Garcia Amigo38, polarizada a relação obrigacional pela finalidade do processo, o conteúdo da obrigação (direitos e obrigações das partes) não se restringe às previsões expressas dos contratantes. Vai além e inclui prestações e comportamentos impostos pela lei e pelos costumes como necessários ao perfeito adimplemento (finalidade da obrigação). 37 Emílio Betti. Teoria generale delle obbligazioni. Milano: Giuffrè, 1955, v.4, p.40-44. Manuel Garcia Amigo. El contrato em la perspectiva comunitária. In: Antonio Pinto Monteiro (Coord.). Contratos: actualidade e evolução. Porto: Universidade Católica Portuguesa, 1997, p. 300. 38 19 No magistério de Antunes Varela39, todas as diversas facetas que reveste o poder do credor e, correlativamente o dever do obrigado são elementos do mesmo processo, parcelas da mesma unidade global, moléculas do mesmo corpo. Segundo o autor português40, a dificuldade que muitos autores experimentam para reconduzir os elementos (poder de exigir e ação creditória) à mesma unidade conceitual provém da tendência generalizada para se considerar esta relação como una e simples, e não como relação complexa como ela é na realidade, ou como um verdadeiro processo que se desenrola no tempo. Todavia, só a concepção unitária da relação obrigacional se mostra capaz de retratar a unidade ontológica da obrigação. Como se vê, também no direito comparado, a integração das normas escritas e costumeiras com a finalidade da relação obrigacional, revelam todo um conjunto de deveres instrumentais. Tais deveres instrumentais estão presentes durante toda a vigência da relação contratual, e, no contrato de seguro, entre os deveres assumidos pelo segurador alcança especial importância o dever de prestar garantia ao segurado, o que nos leva a analisar o alcance dessa prestação de garantia. 2.1. O DEVER DE PRESTAR GARANTIA O dever contraído pelo segurador é de imediato prestar garantia ao segurado contra o risco de dano previsto no contrato de seguro. Com isto, a 39 40 Antunes Varela. Das obrigações em geral. Coimbra: Livraria Almedina, v. 1, p. 41 a 56. Antunes Varela. Das obrigações em geral. p. 113 a 148. 20 preocupação econômica com a possibilidade do prejuízo sai da esfera do segurado e passa para a do segurador. 41 A obrigação do segurador, assim, não consiste apenas no pagamento de uma eventual indenização, mas também, e principalmente, em prestar garantia e segurança ao segurado. Assim sendo, a indenização do prejuízo é eventual e somente será obrigação do segurador se e quando ocorrido o dano previsto no contrato. Aí, então, o dano temido, tornando-se realidade, fará nascer para o segurado o direito de exigir a competente obrigação de prestá-la. Como os recursos utilizáveis para promover a indenização integram o sistema da mutualidade, mantido pelo fundo comum formado por todo o grupo de segurados, incumbe ao gestor desse fundo agir com rigor para que apenas os sinistros realmente encontrados nas condições e limites do seguro sejam ressarcidos. Qualquer fraude ou desvio nessas reparações pode comprometer ou ameaçar os interesses coletivos ou transindividuais presentes no fundo administrado pelo segurador. Para exigir a indenização, por isso, não basta para o segurado a ocorrência do dano. É preciso que o sinistro seja averiguado e analisado pelo segurador, de modo que a indenização somente ocorra depois que este esteja convicto de que realmente o dano atingiu o bem segurado e se deu em conformidade com os termos e condições da cobertura securitária. Entre a participação do sinistro e o pagamento da indenização haverá um procedimento destinado a definir o cabimento, ou não, da reparação ao segurado. A esse procedimento, que não é contencioso, nem se passa em juízo, dá-se o nome de regulação de sinistro. 41 Artigo 757 do Código Civil de 2002: “Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados”. 21 A situação do direito do segurado a exigir a indenização pelo sinistro é como a do Fisco diante da obrigação tributária. Não basta ter ocorrido o fato gerador. A exigibilidade do tributo só acontecerá depois de acertada a obrigação do contribuinte por meio do procedimento do lançamento (Código Tributário Nacional, art. 142). 42 43 Dentro da sistemática da relação obrigacional do contrato de seguro, a regulação do sinistro é o instrumento e a condição para que a indenização seja paga ao segurado. Como é o segurador que tem de proceder à regulação, tornase esta não só um poder, mas igualmente um dever, podendo-se falar que, dentro do contrato de seguro, a realização da regulação do sinistro é parte integrante do cumprimento do contrato de que se cuida. 44 Em outras palavras ocorrido o sinistro, surge o direito do segurado à indenização, mas para exigir seu cumprimento, tem de ser superado o estágio da regulação, a ser praticado, por provocação do segurado e mediante diligência do segurador. Eis por que, funcionalmente, o procedimento regulatório integra a ‘conduta a prestar’, a cargo do segurador. 45 Manobras maliciosas, caprichosas ou infundadas para obstar ou retardar a liquidação do sinistro representam descumprimento ou cumprimento defeituoso do contrato e, dessa maneira, provocam a responsabilidade do 42 Humberto Theodoro Júnior. O contrato de seguro e a regulação do sinistro. RT832/79. São Paulo: Ed. RT, 2005. 43 Código Tributário Nacional: Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível. Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional. 44 Ernesto Tzirulnik. Regulação de sinistro. 3. ed. São Paulo: Max Limonad, 2001. p. 35. 45 Maria M. Agoglia. Responsabilidad por incumplimiento contractual. Buenos Aires: Hammurabi, 1993. p. 47. 22 segurador pelas perdas e danos oriundas do atraso na satisfação do direito do segurado46. Por sua natureza consensual, o procedimento regulatório, que se finaliza com o acordo entre as partes, assume força vinculante para ambas, configurando o negócio jurídico perfeito para impedir litígios futuros, visto que se apresenta como irretratável e só se pode anular por dolo, coação ou erro essencial. Assim sendo o dever instrumental assumido pelo segurador durante toda a relação contratual, chamado de prestação de garantia consiste, na verdade, na prestação de solvabilidade perante um conjunto de unidades econômicas (a massa de segurados) sujeitas a determinado risco homogêneo, a qual permitirá a supressão, até um determinado limite, dos efeitos negativos (prejuízos) sofridos por determinadas unidades. No direito comparado também encontramos esse ponto de vista. No dizer de J.C. Moitinho de Almeida47, a prestação do segurador é uma prestação de suportação do risco, de que a prestação material relacionada com a ocorrência do sinistro constitui mero aspecto, sem autonomia. De fato, tão integrado à prestação indenizatória, o procedimento regulatório deve ser considerado como parte do objeto obrigacional, que, juridicamente, corresponde a toda atividade projetada para satisfação do credor. 48 46 Configura ato ilícito a mora da seguradora em efetuar a cobertura de sinistro ocorrido em estabelecimento comercial. Se, em conseqüência, o segurado tem que desativar seu negócio por longo período, deve ser indenizado por perdas e danos, incluindo-se os lucros cessantes (TJSP, Ap. 69.057-1, rel. Des. Luís de Macedo, ac. 02.12.1986, RT 618/50). 47 J.C. Moitinho de Almeida. O contrato de seguro no direito português e comparado. Lisboa: Livraria Sá da Costa, 1971, p. 26 a 28. 48 Alberto J. Bueres. Responsabilidad civil de las clinicas y estabelecimientos médicos. 2. ed. Buenos Aires: Ábaco, 1981. p. 130 e 140. 23 Na lição de Juan Carlos Félix Morandi49 a regulação do sinistro é um procedimento de prestação de serviço integrante da dívida do segurador perante o segurado, nascida do contrato de seguro. Afastando o pagamento da indenização, em casos de fraude ou de não enquadramento do sinistro na cobertura do seguro, ou reduzindo o quantum ressarcível aos limites do contrato, a regulação tutelará não só o interesse individual do segurador, mas também, e, sobretudo, os interesses transindividuais dos diversos segurados integrantes da coletividade acobertada pelo segurador. Cumprindo-se, assim, a função social atribuída ao negócio do seguro. Verifica-se, portanto, que a conduta das partes contratantes, especialmente no contrato de seguro, assume dimensões extraordinárias principalmente na hipótese de não ser alcançado o consenso no final do procedimento regulatório, motivo pelo qual passaremos à sua análise. 2.2. A CONDUTA DAS PARTES CONTRATANTES Através do pensamento de Humberto Theodoro Júnior50, temos uma visão clara sobre o problema relativo à conduta dos interessados na relação obrigacional contida no contrato de seguro. Não se alcançando o resultado consensual no término do procedimento de regulação do sinistro, e sendo o problema da indenização 49 Juan Carlos Félix Morandi. El riesgo en el contrato de seguro. Buenos Aires: Astrea, 1974, p. 27. Humberto Theodoro Júnior. O contrato de seguro e a regulação do sinistro. RT832/79. São Paulo: Ed. RT, 2005. 50 24 levado a juízo, assume importante influência na formação do convencimento do magistrado a conduta dos interessados durante as diligências extrajudiciais da apuração do evento danoso. Com efeito, não se admite que, no litígio, alguém venha a negar seus próprios atos, ou como já proclamava a glosa do direito romano: venire contra factum proprium non valet. Mesmo sem regra expressa no direito positivo nacional, doutrina e jurisprudência atuais reconhecem que as partes não podem contradizer em juízo seus próprios atos anteriores, voluntários, juridicamente relevantes e plenamente eficazes, bem como se tornam inadmissíveis pretensões que coloquem a parte em contradição com seu comportamento anterior juridicamente relevante. Segurado e segurador estão vinculados às declarações e informações prestadas durante o procedimento de regulação do sinistro, bem como a todas as atitudes e comportamentos de significado jurídico então adotados. Não lhes sendo lícito inovar em seus posicionamentos em juízo, os eventos protagonizados diretamente pelas partes no procedimento pré-processual transformam-se em importantes elementos para a instrução da causa em juízo. Na formação e execução do contrato de seguro o dever de observância da mais estrita boa-fé e lealdade é imposto por preceito legal categórico (Código Civil, artigo 765). Instaurado o procedimento regulatório, esse dever traduz-se na necessidade de cooperação legal e veraz entre segurado e segurador, para a precisa e justa apuração do sinistro. Por isso, tudo que uma parte pratica em relação à outra, cria-lhe a expectativa de confiança e veracidade. 25 Teresa Negreiros51 ensina que a repulsa contida no princípio do venire contra factum proprium volta-se justamente contra o exercício de uma nova posição jurídica que se ponha em contradição com o comportamento anterior, com quebra da boa-fé porque se volta contra as expectativas criadas. É claro que o princípio não é absoluto e pode ser afastado quando houver motivo para justificar, convenientemente, a inovação de comportamento, tal como o advento de fato novo ou a descoberta de fato anterior desconhecido ao tempo do comportamento pretérito que agora já não mais se sustenta. Inexistindo, todavia, causa para justificar a contradição, há de prevalecer, em nome da boa-fé e da lealdade, a atitude primitiva, que, no caso em análise, seriam as declarações e comportamentos adotados no curso do procedimento liqüidatório. Inaceitável seria, portanto, simplesmente a postura de dar em juízo versão diversa da que voluntariamente se adotara na regulação do sinistro. O mesmo rigor na interpretação e análise do comportamento manifestado pelas partes encontramos no direito comparado. Na lição de Luis Diez-Picazo52, o princípio estabelecido no brocardo venire contra factum proprium nulli conceditur, foi acolhido pelos pósglosadores do século XIV, pelos canonistas, pelos práticos e pelos tratadistas do século XVII53, encontrando larga consagração nos direitos anglo-saxônicos e alemão contemporâneos54. 51 Teresa Negreiros. Teoria do contrato. Novos paradigmas. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 147. Por exemplo, a jurisprudência já decidiu que o segurador que consentiu em receber pagamento do prêmio em atraso, sem qualquer ressalva, não pode invocar esse mesmo atraso como exceptio non adimpleti contractus para não cumprir a indenização do sinistro (STJ, 4ª T., REsp. 36.022-6-SP, rel. Min. Sálvio de Figueiredo, ac. 16.05.1995, STJ- Lex 79/146). 52 Luis Diez-Picazo. La doctrina de los propios actos. Um estúdio crítico sobre la jurisprudência del Tribunal Supremo. Barcelona: Bosch, 1963. p. 45. 53 Luis Diez-Picazo. La doctrina de los propios actos. Um estúdio crítico sobre la jurisprudência del Tribunal Supremo. p. 52-54. 54 Puig Brutau. Estúdios de derecho comparado. La doctrina de los actos propios. Barcelona: Ariel, 1951. p. 104. 26 Deve-se ressaltar que entre os romanos reconhecia-se grande valor à palavra dada e sancionava-se o ir contra ela. Assim, quem se obrigava contratualmente ou por meio de um pacto, não podia desconhecer a obrigação assumida. Do mesmo modo, não podia desconhecer sua anterior declaração de vontade nem tampouco exigir a prova de causa quando se havia obrigado documentalmente. 55 Foi na Idade Média que os glosadores, no afã de sintetizar a sabedoria romana em brocardos, chegaram ao aforisma: venire contra factum proprium nulli conceditur; que também se expressava como: adversus factus suum quis venire non potest. 56 Refletindo o pensamento dominante, no direito comparado do século XX, ensina Enneccerus57 que não é lícito fazer valer um direito em contradição com sua anterior conduta, quando esta conduta interpretada objetivamente segundo a lei, segundo os bons costumes ou a boa-fé, justifica a conclusão de que não se fará valer o direito, ou quando o exercício posterior choque contra a lei, os bons costumes ou a boa-fé. A aplicação da teoria dos atos próprios, enfim, não depende de norma legislada, porque constitui uma regra derivada do princípio geral da boa-fé. 58 São as regras objetivas da honradez no comércio ou no tráfico, que levam a crer na palavra empenhada e em que o ato seja ajustado lealmente, obrando com retidão. A boa-fé e confiança na lealdade são essenciais para resolver o problema colocado pelo tema dos atos próprios, porque ela impõe o 55 Alejandro Borda. La teoria de los actos propios. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1987. n. 7-f, p. 21 a 22. Vallet de Goytisolo. Notas críticas a la doctrina de los actos propios. Anuário de derecho civil. T. XVI, Fasc. II, p. 467. 57 Ludwig Enneccerus. Hans Carl Niperdey. Tratado de derecho civil – Parte general. Barcelona: Bosch, 1947. vol. II, t. I, n. 208, p. 482. No original: “A nadie le es lícito hacer valer um derecho em contradicción com su anterior conducta, cuando esta conducta interpretada objetivamente según la ley, según las buenas costumbres o la buena fé, justifica la conclusión de que nos se hará valer el derecho, o cuando el ejercicio posterior choque contra la ley, las buenas costumbres o la buena fé”. 58 Alejandro Borda. La teoria de los actos propios. p. 21 a 22 56 27 dever de proceder com retidão e honradez no desenvolvimento das relações jurídicas e na celebração, interpretação e execução dos negócios jurídicos. Por isso, é inadmissível a conduta contraditória59. É como conseqüência lógica da necessidade de um comportamento coerente que o direito veta a conduta contraditória, qualificando-a de contrária ao princípio geral da boa-fé. 60 Entre as mesmas partes, e acerca da mesma relação jurídica, portanto, a primeira conduta de uma delas, sendo relevante para a realização e execução do negócio, vincula o respectivo agente, de modo a impedir-lhe qualquer outra futura atitude que não seja coerente com a primitiva. Assim, quando o juiz se depara com duas atitudes contraditórias da mesma parte, deve solucionar a lide levando em conta a que primeiro foi manifestada, porque, na relação com a outra parte do negócio jurídico, ela assumiu força vinculante. Do contrário, prevaleceria a deslealdade, e não é admissível que se premie conduta contraditória, porque se violaria o princípio geral da boa-fé. 61 A incidência da regra “ninguém pode ir contra seus próprios atos” não depende de previsão expressa ou literal na legislação porque é uma derivação do princípio geral de direito da boa-fé, do qual constitui uma aplicação. 62 59 Alejandro Borda. La teoria de los actos propios. p. 63 a 64. No original: “Son las reglas objetivas de la honradez en el comercio o en tráfico, que llevan a creer en la palabra empeñada y en que el acto sea concertado lealmente, obrando con rectitud (...) La buena y fe lealtad es esencial para resolver el problema planteado por el tema de los actos propios, porque ella impone – como hemos dicho – el deber de proceder con rectitud y honradez en el desenvolvimiento de las relaciones jurídicas y en la celebración, interpretación y ejecución de los negocios jurídicos. Por ello, es inadmisible la conducta contradictoria”. 60 Luis Diez-Picazo. La doctrina de los propios actos. Um estúdio crítico sobre la jurisprudência del Tribunal Supremo. p. 142. 61 Alejandro Borda. La teoria de los actos propios. p. 131. No original: “no es admisible que se premie la conducta contradictória, porque se violaria el principio general de la buena fé”. 62 Juan M. Dobson. El abuso de la personalidad jurídica en el derecho privado. Buenos Aires: Depalma, 1985, n. 162.p. 281. 28 Estabelecida a visão dinâmica da relação obrigacional, a qual deve ser vislumbrada como um processo, onde se constata a existência de fases de desenvolvimento de um organismo vivo, que nasce, cresce, se desenvolve e morre, bem como a relevância da coerência na conduta das partes contratantes, parece-nos necessário, a partir de agora, traçarmos o perfil desse instrumento jurídico a que chamamos de contrato de seguro. 29 3. NATUREZA JURÍDICA DO CONTRATO DE SEGURO63 O conceito moderno de contrato formou-se em conseqüência da confluência de diversas correntes de pensamento, dentre as quais a dos canonistas e a da escola do Direito Natural. 64 Assim, a contribuição dos canonistas consistiu basicamente na relevância que atribuíram, de um lado, ao consenso, e, do outro, à fé jurada. Em valorizando o consentimento, preconizaram que a vontade é a fonte da obrigação, abrindo caminho para a formulação dos princípios da autonomia da vontade e do consensualismo. A estimação do consenso leva à idéia de que a obrigação deve nascer fundamentalmente de um ato de vontade e que, para criálo, é suficiente a sua declaração. O respeito à palavra dada e o dever da veracidade justificam, de outra parte, a necessidade de cumprir as obrigações pactuadas, fosse qual fosse a forma do pacto, tomando necessária à adoção de regras jurídicas que assegurassem a força obrigatória dos contratos, mesmo os nascidos do simples consentimento dos contraentes. 65 De outro lado a Escola do Direito Natural, racionalista e individualista, influiu na formação histórica do conceito moderno de contrato ao defender a concepção de que o fundamento racional do nascimento das 63 Vide: Eric Savaux. La Theorie Genérale Du Contrat, Mythe ou Réalité. Librairie Générale de Droit et de Jurisprudence – E.J.A. – págs. 1 a 71; 377 a 382; Fernando Noronha. O direito dos contratos e seus princípios fundamentais (autonomia privada, boa-fé, justiça contratual), Editora Saraiva. 1994. págs. 1 a 15; Arnold Wald. O contrato no projeto de Código Civil. Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo, Ano 1. nº 1. 1998. Grant Gilmore. La morte del contratto. Ed. Giuffrè Milão. 1999. p. 79/92. Patrick Selin Atiyah. An introduction to the law of contract. Ed. Oxford. New York. 2000; Guido Alpa, Remo Danovi e Emilio Nicola Buccico. Il Código Civile europeo. Materiali dei Seminari 1999-2000. Ed. Giuffrè. Milão. 2001; John Gilissen. Introdução histórica ao direito. Editora Fundação Calouste Gulbenkian. 1988, págs. 731 a 750; Daniel Guggenheim. Le Droit Suisse des contrats príncipes géneraux. Ed. Georg. Genève. 1991; Giuseppe Grisi. L’autonomia privata: diritto dei contratti e disciplina costituzione dell’economia. Ed. Giuffrè, Milão. 1999; Ricardo Luis Lorenzetti. Fundamentos do direito privado. Editora Revista dos Tribunais. 1998. págs. 534 a 546; Pedro Arruda França. Contratos atípicos. Rio de Janeiro. Ed. Forense. 2000. p. 28; Fran Martins. Contratos e obrigações comerciais. Rio de Janeiro. Ed. Forense. 2000. p. 61. 64 Orlando Gomes. Contratos. 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense. 1992. p. 5. 65 Orlando Gomes. Contratos. 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense. 1992. p. 6. 30 obrigações se encontrava na vontade livre dos contratantes. Desse juízo, inferiram seus pregoeiros o princípio de que o consentimento basta para obrigar (solus consensus obrigat). A respeito do tema, oportuna a lição de Vera Helena de Mello Franco 66 que, citando Ascarelli, assinala a dificuldade de uma definição única para o instrumento jurídico. Algumas teorias, segundo essa autora, foram elaboradas para justificar uma conceituação unitária: teoria da necessidade eventual, teoria da empresa, nova teoria indenitária, teoria do risco: • Teoria da necessidade eventual: a função do contrato de seguro consistiria na satisfação de eventual necessidade do segurado; 67 • Teoria da empresa (proposta por Vivante): ressalta a existência, em todo contrato de seguro, de uma atividade organizada; • Nova teoria indenitária: segundo a qual estão sempre presentes no contrato de seguro o interesse, a necessidade e o dano; • Teoria do risco: consiste a função do contrato de seguro, segundo os adeptos dessa teoria, na transferência do risco para a seguradora. 68 66 Vera Helena de Mello Franco. Lições de direito securitário. São Paulo: Maltense, 1993. p. 28. Foi concebida pelos juristas clássicos, quando o contrato de seguro se restringia às operações marítimas. Parte do pressuposto de que todo seguro cobre um dano eventual. 68 A nosso ver, a teoria do risco esclarece melhor a fundamentação do princípio indenitário que domina os seguros de dano, segundo o qual o segurado não pode receber mais do que perdeu. A transferência que faz ao segurador é das conseqüências econômicas do risco, isto é, os prejuízos. Qualquer quantia superior, mesmo que houvesse sido pago o prêmio, constante da prestação do segurador, desfiguraria o contrato de seguro. Seria uma especulação própria do contrato de jogo ou aposta. 67 31 O mérito de todas reside no realce dos elementos essenciais do contrato, permitindo um melhor conhecimento do instituto. Cumpre salientar, ainda, que a atividade do segurador, aquele que suporta o risco, assumido mediante o recebimento do prêmio, obrigandose a pagar uma indenização, é exercida, no Brasil, por sociedades anônimas ou cooperativas devidamente autorizadas, motivo pelo qual há autores que entendem pertencer o contrato de seguro ao campo do Direito Comercial. 69 Na opinião de Munir Karam, o novo Código Civil alterou o conceito de seguro e, também, sua estrutura, no Capítulo referente a este contrato 70. Explica esse autor que o Código Civil de 1916 trazia, por assim dizer, dois conceitos de seguro. A operação de seguros era qualificada como forma de prevenção de riscos, dando ênfase, portanto, ao seu caráter indenitário. O contrato de seguro era definido legalmente pelo art. 1432 do Código Civil de 1916, da seguinte forma: “Art. 1.432. Considera-se contrato de seguro aquele pelo qual uma das partes se obriga para com a outra, mediante a paga de um prêmio, a 69 “O contrato de seguro, tal como se pratica na atualidade, pertence ao campo do Direito Comercial, pois somente empresas organizadas sob a forma de sociedade anônima podem celebrá-lo na qualidade de segurador. Essa imposição legal decorre da própria função econômico-social do contrato. Para cobrir inúmeros riscos que podem ser objeto de seguro, mister se faz uma organização econômica que, utilizando técnica especial, possa atender ao pagamento das indenizações prováveis com o produto da arrecadação das contribuições pagas por grande número de seguradoras. A natural exigência de que o segurador seja uma sociedade por ações desloca o contrato do Direito Comercial, tornando-o um contrato mercantil.” Orlando Gomes. Contratos. p. 462. 70 Munir Karam. Do contrato de seguro no código civil: noções fundamentais. RT 834/74. p. 76. 32 indenizá-lo do prejuízo resultante de riscos futuros, previstos no contrato”. Para Silvio Rodrigues, tratava-se de uma definição adequada aos contratos de seguro de coisas, não abrangendo o seguro de vida71. De outro lado no art. 1471, o Código Civil de 1916, definia o contrato de seguro como aquele que tem por objeto garantir, mediante o prêmio anual que se ajustar o pagamento de certa soma (capital) a determinada ou determinadas pessoas por morte do segurado. In verbis: “Art. 1.471. O seguro de vida tem por objeto garantir, mediante o prêmio anual que se ajustar, o pagamento de certa soma a determinada ou determinadas pessoas, por morte do segurado, podendo estipular-se igualmente o pagamento dessa soma ao próprio segurado, ou a terceiro, se aquele sobreviver ao prazo de seu contrato. Parágrafo único. Quando a liquidação só deva operar-se por morte, o prêmio se pode ajustar por prazo limitado ou por toda a vida do segurado, sendo lícito às partes contratantes, durante a vigência do contrato, substituírem, de comum acordo, um plano por outro, feita a indenização de prêmios que a substituição exigir”. Não se cuida apenas de reparar um prejuízo, pela perda de pessoa da família, mas de eventualmente instituir um benefício em favor de terceiro. Para Munir Karam, o novo Código Civil adotou a unidade de conceito 72, com base na teoria do interesse, pois o legislador incluiu no artigo 757 a seguinte definição: 33 “Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa contra riscos predeterminados. Parágrafo único. Somente pode ser parte, no contrato de seguro, como segurador, entidade para tal fim legalmente autorizada.” Mas, se o interesse é compreensível no seguro de dano, no de pessoa a noção se confunde com a de foro íntimo, porque o segurado não se beneficiará com a indenização, mas sim um terceiro (esposa, filhos ou parentes), não se sabendo os motivos que o levaram a contratar. 73 Fabio konder Comparato 74, na vigência do Código Civil de 1916, já recomendava uma concepção unitária do contrato de seguro, aceitandose a comunhão de gênero econômico do interesse, tanto nos seguros de dano como nos seguros de pessoas, mas mantendo-se a sua diferença específica. Para esse autor, mesmo no chamado seguro de coisas determinadas, como o seguro de incêndio ou o seguro contra o furto, o que o segurado garante pelo contrato não é propriamente uma coisa, mas o interesse que possui em relação a esta coisa. 71 Silvio Rodrigues. Direito Civil – dos contratos e das declarações unilaterais de vontade: v. III, 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 1977. p. 355. 72 Ensina Munir Karam que embora adotando um conceito unitário, o Código Civil dele se afastou, disciplinando em seções distintas o seguro de dano e o seguro de pessoa. Não seção II tratou do seguro de dano, de natureza ressarcitória, não podendo ultrapassar o valor do interesse segurado e, na seção III, tratou do seguro de pessoa, onde o capital segurado pode ser livremente estipulado. O Código Civil de 1916 regulava apenas o seguro de vida. O seguro de coisa vinha esparso nas disposições gerais e nas seções relativas às obrigações do segurado e segurador. O seguro de dano, pois, está submetido a uma sessão própria. A terminologia também se alterou. O Código Civil de 1916 fazia referência a seguro da coisa e a seguro de vida. O novo Código Civil trata do seguro de dano e do seguro de pessoa. São denominações mais abrangentes, porque o primeiro tipo compreende o dano à coisa e ao terceiro, enquanto ao segundo se incluem a vida e acidentes pessoais (Munir Karam. Do contrato de seguro no código civil: noções fundamentais. RT 834/74, p. 77). 73 Munir Karam. Do contrato de seguro no código civil: noções fundamentais. RT 834/74. p. 76 74 Fabio Konder Comparato. O seguro de crédito. Estudo jurídico. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1968. p. 24-25. 34 Desta forma, o interesse segurável, como objeto material do contrato de seguro, não é, pois, uma coisa, mas uma relação, como o indica a própria etimologia (inter esse); mais precisamente ele é a relação existente entre o segurado e a coisa ou pessoa sujeita ao risco. Assim, podemos dizer que ocorreu uma evolução no tratamento do contrato de seguro, na qual o instituto mudou de dimensão e de estrutura exigindo novo estudo por parte do legislador, da doutrina e da jurisprudência. 75 A nosso ver, dentre inúmeros autores nacionais 76, a melhor definição jurídica do contrato de seguro encontramos na obra de Ernesto Tzirulnik 77, para quem o seguro é um contrato de direito privado através do qual uma companhia de seguros, mediante a aplicação de cálculos atuariais (cálculos de compensação), recolhe junto a uma coletividade de unidades econômicas (os segurados) contribuições individuais (prêmios) aptas a formar um fundo (reservas), que possibilite restabelecer a perda 75 Arnold Wald. Novos aspectos do contrato de seguro. In Revista de Direito Mercantil-113. 1998. p. 63. Maria Helena Diniz definiu o contrato de seguro como sendo aquele pelo qual uma das partes (segurador) se obriga para com outra (segurado), mediante o pagamento de um prêmio, a garantirlhe interesse legítimo relativo a pessoa ou a coisa e a indenizá-la de prejuízo decorrente de riscos futuros, previsto no contrato (Curso de direito civil brasileiro, v. III, 21ª Ed. São Paulo: Saraiva. 2005. p. 515). Orlando Gomes, com base no Código Civil de 1916, definia o contrato de seguro como sendo o contrato através do qual uma empresa especializada obriga-se para com uma pessoa, mediante contribuição por esta prometida a lhe pagar certa quantia, se ocorrer o risco previsto (Contratos. 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992. p 462). Caio Mário da Silva Pereira afirmava que seguro é o contrato por via do qual uma das partes (segurador) se obriga para com a outra (segurado), mediante o recebimento de um prêmio, a indenizá-lo, ou a terceiros, de prejuízos resultantes de riscos futuros, previstos. (Instituições de Direito Civil, 10ª Ed., Forense, Rio de Janeiro, 1997, p. 302). Segundo a lição de Pedro Alvim seguro é o contrato pelo qual o segurador, mediante o recebimento de um prêmio, assume perante o segurado a obrigação de pagamento de uma prestação, se ocorrer o risco a que está exposto. (O contrato de seguro. 2ª Ed. São Paulo: Forense. 1986. p. 462). Marcello Teixeira Bittencourt esclareceu que o contrato de seguro "(...) é o acordo de vontades firmado entre as sociedades de seguro (seguradoras) e o consumidor (segurado), cujo objetivo é a promessa de uma prestação futura pela seguradora (indenização), mediante pagamento de uma quantia pecuniária pelo segurado (prêmio), em face da ocorrência de um risco coberto pela apólice" (O contrato de seguro. Rio de Janeiro: Idéia Jurídica. 2000. p. 21.). 77 Ernesto Tzirulnik. Notas sobre prescrição em direito do seguro. RT 674/88, p. 88. 76 35 econômica que vierem a sofrer determinadas unidades econômicas ou 78 segurados. No direito comparado a doutrina enxerga o contrato de seguro de uma maneira muito semelhante. No direito italiano o contrato de seguro, no entender de Torrente e 79 Schlesinger seria o contrato com o qual uma parte (segurador) mediante o pagamento de uma soma, dita prêmio, se obriga a reembolsar o segurado, dentro dos limites do convencionado do dano como produto de um sinistro, ou a pagar um capital ou uma renda ao verificar-se um evento atinente à vida humana (por exemplo a morte de uma pessoa) (seguro de vida) (art. 1882 do Código Civil Italiano), ou a ressarcir a terceiros o dano que deveria ser ressarcido pelo segurado (seguro de responsabilidade civil) (art. 1917 do Código Civil Italiano). No dizer de Emilio Betti80, o contrato de seguro vem a ser aquele no qual a prestação consiste, de um lado, no pagamento de um determinado prêmio e do outro uma utilidade consistente em garantia de que a ocorrência de um 78 Não se pode deixar de registrar a interessante lição de Orlando Gomes, quando comenta a hipótese da ocorrência dos chamados contratos necessários, nos quais não está eliminada a faculdade de escolha da outra parte, porém, a pessoa é livre para eleger o outro contratante. O renomado autor menciona as principais hipóteses em que se configura ta1 situação, como a dos construtores que devem cobrir com um seguro o risco das conseqüências pecuniárias de sua responsabilidade profissional, a dos armazéns gerais que são obrigados a segurar as mercadorias warrantadas, a dos transportadores de pessoas ou de mercadorias, igualmente obrigados a realizar o contrato de seguro. Nenhum deles está obrigado a celebrar o contrato de seguro com pessoa determinada. Esse contrato é necessário, mas a companhia seguradora pode ser livremente escolhida pela parte obrigada a concluí-lo (Orlando Gomes. Transformações gerais do direito das obrigações. Ed. Revista dos Tribunais. 1980. p. 21.; No mesmo sentido da coatividade na celebração do contrato de seguro: Eros Grau in A ordem econômica na constituição de 1988. Ed. Malheiros. São Paulo. 2001. p. 88. 79 Torrente e Schlesinger, Manuale di Diritto Privado. 15ª Edizione, Ed. Milano Dott, 1997. p. 593. No original: “L`assicurazione è il contrato com il quale una parte (assicuratore), verso pagamento di uma somma, detta premio, si obbligia a rivalere l`assicurato, entre i limiti convenuti, del danno ad esso prodotto da um sinistro (per es. Incendio dell´immobile) (assicurazione contro i danni), ovvero a pagare um capitale o uma rendita al verificarsi di um evento attinente alla vita umana (per es. Morte di uma persona) (assicurazionbe sulla vita) (art. 1882 cod. Civ.), ovvero a risarcire a terzi il danno che dovrebbe essere risarcito dalla`assicurato (assicurazione contro la responsabilitá civile) (art. 1917)”. Tradução livre: O seguro é um contrato coim o qual uma parte (segurador) promete o pagamento de uma soma, dita prêmio, se obriga a proteger o segurado, dentro dos limites convencionados, do dano produto de um sinistro (por exemplo incêndio de um imóvel) (seguro contra danos), ou a pagar um capital ou uma renda a verificar-se por força de um evento referente à vida humana (por exemplo morte de uma pessoa) (seguro sobre a vida) (art. 1882 do Código Civil) ou a ressarcir a um terceiro os danos que deveriam ser ressarcidos pelo segurado (seguro contra responsabilidadade civil) (art. 1917). 80 Emílio Betti. Teoria generale delle obbligazioni. Milano: Giuffrè, 1955, v.4, p.5-14. 36 evento temido pelo credor, acarretará o pagamento de uma indenização ou uma compensação que o proteja de um dano que venha a sofrer. Tratando do contrato de seguro, previsto na Lei argentina no 17.418, assevera Carlos Alberto Ghersi81 que o art. 1º da mencionada lei diz que há contrato de seguro quando o segurador se obriga, mediante uma escolha ou cotação, a ressarcir um dano ou cumprir a prestação convencionada se ocorrer o evento previsto. A finalidade perseguida consiste no traslado dos riscos que tem um terceiro mediante a assunção das conseqüências provocadas por um fato determinado e dentro dos limites acordados. O seguro cumpre desse modo, uma função ressarcitória por meio da indenização pactuada frente aos danos que esse acontecimento futuro e incerto pode produzir. Para Yvonne Lambert-Faivre82, no direito francês a definição legal do contrato de seguro exige o complemento da definição técnica da operação de seguro. 81 Carlos Alberto Ghersi. Contratos civiles y comerciales – partes general y especial. tomo 2°. 3ª. ed. Buenos Aires: Astrea, 1994. p. 395. No original: “El art. 1º. de la ley de seguros 17.418 dice que hay contrato de seguro cuando el asegurado se obliga, mediante una prima o cotización, a resarcir un daño o cumplir la prestación convenida si ocurre el evento previsto. La finalidad perseguida consiste en el traslado de los riesgos hacia un tercero mediante la asunción de las consecuencias provocadas por un hecho determinado y dentro de los límites acordados. El seguro cumple, de ese modo, una función resarcitoria por medio de la indemnización pactada frente a los daños que ese acontecimiento futuro e incierto puede producir.” 82 Yvonne Lambert-Faivre. Droit des assurances. Paris: Dalloz, 1995. p. 35/36. No original: “La définition juridique du contrat d'assurance serait peu significative si elle n'était complétée par la définition technique de l'opération d'assurance. Définition juridique: envisagée dans les relations contractuelles bilatérales assureursouscripteur l'assurance, est une convention par laquelle, en contrepartie d'une prime, l'assureur s'engage à garantir le souscripteur en cas de réalisation d'un risque aléatoire prévu au contrat. Cette définition souligne les trois éléments constitutifs de la nature spécifique du contrat d'assurance: un risque, une prime, une prestation de garantie en cas de sinistre. Cette définition juridique et purement contractuelle est cependant trop étroite, car ainsi limitée l'assurance semble un simple pari entre deux personnes. Or, le contrat d'assurance n'est qu'un instrument juridique très parcellaire, qui doit être replacé dans un contexte global hors duquel il est dépourvu de sens. L'aspect juridique s'efface alors devant l'aspect proprement technique qui est l'organisation d'une mutualité. Définition technique: sous son aspect technique qui est fondamental, l'assurance est l'opération par laquelle un assureur organise en mutualité une multitude d'assurés exposés à la réalisation de certains risques et indemnise ceux d'entre eux qui subissent un sinistre grâce à la masse commune des primes collectées. Alors que le contrat d'assurance prend l'aspect d'un pari ou d'un jeu de hasard, l'opération anti-aléatoire de lutte collective contre le hasard. Isolé, l'homme est très vulnérable aux coupas du sort qui le main-tiennent dans un état d'insecurité moralement pénible et économiquement néfaste. Entreprendre et assumer des responsabilités exige une certaine confiance en l'avenir; or, si l'assurance n'évite pas les sinistres, elle dilue leurs effets entre tous les assurés. Néanmoins, pour que l'entreprise d'assurance puisse effectivement indemniser tous les sinistres garantis, il faut qu'elle organise la mutualité des risques selon des régles mathématiques rigoureuses qui sont le fondement de sa technique; la coassurance et la réassurance obéissent aux mêmes impératifs.” 37 Assim, o seguro, em sua definição jurídica, é uma convenção pela qual, em contrapartida de um prêmio, o segurador se compromete a garantir83 o segurado, em caso de concretização de um risco aleatório previsto no contrato. Esta forma de definir o seguro evidencia os três elementos constitutivos da natureza específica do contrato de seguro: um risco, um prêmio, uma prestação de garantia em caso de sinistro. Entretanto, a própria autora esclarece que esta definição jurídica e puramente contratual é, entretanto, muito estreita, porque assim limitado o seguro parece uma simples aposta entre duas pessoas, sendo que o contrato de seguro é um instrumento jurídico pluriparcial84 que deve ser situado num contexto global fora do qual ele resta desprovido de sentido. Assim sendo, o aspecto jurídico se ofusca diante do aspecto propriamente técnico que é a organização de uma mutualidade85. Tradução livre: A definição jurídica do contrato de seguro seria pouco significativa se ela não fosse complementada pela definição técnica da operação de seguro. Definição jurídica: considerado dentre as relações contratuais bilaterais segurador-segurado, o Seguro é uma convenção pela qual, em contrapartida de um prêmio, o segurador se compromete a garantir o segurado, em caso de concretização de um risco aleatório previsto no contrato. Esta definição evidencia os três elementos constitutivos da natureza específica do contrato de seguro: um risco, um prêmio, uma prestação de garantia em caso de sinistro. Esta definição jurídica e puramente contratual é, entretanto, muito estreita, porque assim limitado o Seguro parece uma simples aposta entre duas pessoas. Ora, o contrato de seguro é um instrumento jurídico pluriparcial que deve ser situado num contexto global fora do qual ele resta desprovido de sentido. O aspecto jurídico se ofusca diante do aspecto propriamente técnico que é a organização de uma “mututualidade”. Definição técnica: sob seu aspecto técnico que é fundamental, o Seguro é a operação pela qual o segurador organiza em “mutualidade” um grande número de segurados expostos à concretização de certos riscos e indeniza aqueles dentre os segurados que vierem a sofrer um sinistro, graça à massa comum dos prêmios coletados. Embora pareça uma aposta ou um “jogo de azar”., o contrato de Seguro é uma operação anti-aleatória de luta coletiva contra o acaso. Isolado, o homem é muito vulnerável aos golpes do acaso, que o mantêm em um estado de insegurança moralmente penível e economicamente nefasto. Emprender e assumir responsabilidades exige uma certa confiança no futuro; ora, se o Seguro não evita os sinistros, ele dilui seus efeitos entre todos os segurados. Mas, para que a empresa de seguro possa efetivamente indenizar todos os sinistros que tenham cobertura contratual, é necesario que ela organize a “mutualidade” dos riscos segundo regras matemáticas rigorosas que são o fundamento de sua técnica; o cosseguro e o resseguro obedessem aos mesmos imperativos. 83 “Garantia” aqui deve ser entendida como “compensação de um dano sofrido”. 84 Embora bilateral o contrato, a operação securitária exige, para ter sustentação econômico-financeira, uma pluralidade de segurados (daí falar-se em “pluriparcialidade”=muitas partes). 85 Enquanto “bilateral”, o contrato de seguro envolve “duas” partes (o segurador e o segurado). Entretanto, esse contrato individualizado “segurador-segurado” só subsiste economicametne se houver uma grande quantidade de outros contratos individualizados que dêem sustentação econômica/equilíbrio financeiro à operação securitária. A “mutualidade”, nesse caso, significa a reunião necessária de vários aportes pecuniários (os prêmios) feitos por várias pessoas (os segurados), aportes esses que são feitos ao outro pólo da relação contratual (o segurador). 38 Portanto, sob seu aspecto técnico, o seguro é a operação pela qual o segurador organiza em mutualidade um grande número de segurados expostos à concretização de certos riscos e indeniza aqueles dentre os segurados que vierem a sofrer um sinistro, graça à massa comum dos prêmios coletados. Embora pareça uma aposta ou um jogo de azar86, o contrato de seguro é uma operação antialeatória de luta coletiva contra o acaso. Ensina Ivonne Lambert-Faivre87 que, isolado, o homem é muito vulnerável aos golpes do acaso, que o mantêm em um estado de insegurança moralmente apenável e economicamente nefasto. Empreender e assumir responsabilidades exige uma certa confiança no futuro; ora, se o seguro não evita os sinistros, ele dilui seus efeitos entre todos os segurados. Mas, para que a empresa de seguro possa efetivamente indenizar todos os sinistros que tenham cobertura contratual, é necessário que ela organize a mutualidade dos riscos segundo regras matemáticas rigorosas que são o fundamento de sua técnica; o cosseguro e o resseguro obedecem aos mesmos imperativos. Em países como Uruguai, Chile e Espanha, ambas as modalidades de seguro (de dano e de pessoa) estão submetidas a um mesmo regime jurídico, enquanto em outros, como Brasil (novo Código Civil), França, Itália, México, regem os institutos, distintos artigos de lei. Com efeito, tendo em vista a atual concepção dinâmica do direito obrigacional, para entendermos mais claramente e da forma mais fiel possível as novas dimensões do instrumento jurídico chamado contrato de seguro, o estudo de seus elementos conceituais, bem como suas características revela-se de rigor. Esses aportes pecuniários formam uma espécie de “fundo”, uma “massa comum”, que é administrado pelo segurador, fundo esse que servirá para indenizar os segurados que eventualmente vierem a sofrer algum dos sinistros previstos no contrato. 86 “Jogo de azar” não tem aqui aquela conotação pejorativa comumente empregada no Brasil, mas simples jogo no qual o jogador sujeita-se à sorte, ao fortuito. 39 87 Yvonne Lambert-Faivre. Droit des assurances. Paris: Dalloz, 1995. p. 35/36. 40 4. ELEMENTOS CONCEITUAIS Para Maria Helena Diniz88, o contrato de seguro possui os seguintes elementos conceituais: segurador, segurado, prêmio, indenização e riscos. Outros juristas pátrios e até mesmo os estrangeiros, como os já citados Carlos Alberto Ghersi89 e Yvonne Lambert-Faivre90, identificam os seguintes elementos no contrato de seguro: prêmio, risco e indenização. Para Munir Karam91 e Pedro Alvim92, haveriam, na verdade, quatro elementos conceituais do contrato de seguro, quais sejam: segurador, segurado, risco e prêmio. A seguir passaremos a analisar cada um desses elementos, segundo a doutrina pátria e o direito comparado. 4.1. SEGURADOR No dizer de Maria Helena Diniz93 O segurador é aquele que suporta o risco, assumido mediante o recebimento do prêmio, por isso deve ter capacidade financeira e seu funcionamento deve estar autorizado pelo Poder Público. 88 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. v. 3, 21ª ed. São Paulo: Saraiva. 2005. p. 515. Carlos Alberto Ghersi. Contratos civiles y comerciales – partes general y especial. tomo 2°. 3ª. ed. Buenos Aires: Astrea, 1994. p. 395 90 Yvonne Lambert-Faivre. Droit des assurances. Paris: Dalloz, 1995. p. 35. No original: “Cette définition souligne les trois éléments constitutifs de la nature spécifique du contrat d’assurance: un risque, une prime, une prestations de garantie en cas de sinistre.” Tradução livre: Esta definição sublinha os três elementos constitutivos da naturaza específica do contrato de seguro: um risco, um prêmio, uma prestação de garantia em caso de sinistro. 91 Munir Karam. Do contrato de seguro no código civil: noções fundamentais. RT 834/74. p. 76. 92 Pedro Alvim. O contrato de seguro. p. 268. 93 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro, v. 3, 21ª ed. São Paulo: Saraiva. 2005. p. 515. 89 41 A atividade do segurador é exercida, no Brasil, por companhias especializadas, isto é, por sociedades anônimas, mediante prévia autorização do governo federal94. A autorização para funcionamento será concedida por meio de portaria do Ministro do Desenvolvimento, da Indústria e do Comércio Exterior, mediante requerimento firmado pelos incorporadores, dirigido ao Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP, Resolução n. 14/91; Decreto n. 4.986/2004) e apresentado por intermédio da Superintendência de Seguros Privados (SUSEP — Deliberação n. 59/2001) instruído com a prova da regularidade da constituição da sociedade, do depósito no Banco do Brasil da parte já realizada do capital e o exemplar do estatuto95 (Dec.-lei n. 2.063/40, art. 1º). Para os efeitos de constituição, organização e funcionamento das sociedades seguradoras, deverão ser obedecidas as condições gerais da legislação das 94 Código Civil: Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados. Parágrafo único. Somente pode ser parte, no contrato de seguro, como segurador, entidade para tal fim legalmente autorizada. Lei n. 8.177/91: Art. 29. As entidades de previdência privada, as companhias seguradoras e as de capitalização são equiparadas às instituições financeiras e às instituições do sistema de distribuição do mercado de valores mobiliários, com relação às suas operações realizadas nos mercados financeiro e de valores mobiliários respectivamente, inclusive em relação ao cumprimento das diretrizes do Conselho Monetário Nacional quanto às suas aplicações para efeito de fiscalização do Banco Central do Brasil e da Comissão de Valores Mobiliários e da aplicação de penalidades previstas nas Leis n°s 4.595, de 31 de dezembro de 1964, e 6.385, de 7 de dezembro de 1976. Parágrafo único. O disposto neste artigo não modifica o tratamento tributário definido em lei nem a competência específica, relativamente àquelas entidades, do Ministério do Trabalho e da Previdência Social e da Superintendência de Seguros Privados, que deverão ser comunicadas sobre quaisquer irregularidades constatadas pelo Banco Central do Brasil e pela Comissão de Valores Mobiliários. 95 Código Civil: Art. 983. A sociedade empresária deve constituir-se segundo um dos tipos regulados nos arts. 1.039 a 1.092; a sociedade simples pode constituir-se de conformidade com um desses tipos, e, não o fazendo, subordina-se às normas que lhe são próprias. Parágrafo único. Ressalvam-se as disposições concernentes à sociedade em conta de participação e à cooperativa, bem como as constantes de leis especiais que, para o exercício de certas atividades, imponham a constituição da sociedade segundo determinado tipo. Art. 984. A sociedade que tenha por objeto o exercício de atividade própria de empresário rural e seja constituída, ou transformada, de acordo com um dos tipos de sociedade empresária, pode, com as formalidades do art. 968, requerer inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da sua sede, caso em que, depois de inscrita, ficará equiparada, para todos os efeitos, à sociedade empresária. Parágrafo único. Embora já constituída a sociedade segundo um daqueles tipos, o pedido de inscrição se subordinará, no que for aplicável, às normas que regem a transformação. Art. 985. A sociedade adquire personalidade jurídica com a inscrição, no registro próprio e na forma da lei, dos seus atos constitutivos (arts. 45 e 1.150). Decreto n. 6.459/67 - Art 42. A autorização para o funcionamento será concedida através de Portaria do Ministro da Indústria e do Comercio, mediante requerimento firmado pelos Incorporadores, dirigido ao CNSP e apresentado por intermédio da SUSEP. Parágrafo único. O pedido será instruído com a prova da regularidade da constituição da Sociedade do depósito no Banco do Brasil da parte já realizada do capital e exemplar do estatuto. 42 sociedades anônimas e as estabelecidas pelo Conselho Nacional de Seguros Privados96. Relativamente aos agentes autorizados pelo segurador estabelece o art. 775 do Código Civil de 2002 que: "Os agentes autorizados do segurador presumem-se seus representantes para todos os atos relativos aos contratos que agenciarem", pois atuam em nome e no interesse da empresa securitária. Tal presunção, adverte Maria Helena Diniz97, é juris tantum; provado que os agentes praticaram atos fora dos limites de suas atribuições, eles responsabilizar-se-ão perante o segurado pelos danos que lhe causaram. A regulamentação do contrato de seguro, durante longo período, cuidou exclusivamente das relações entre segurado e segurador, disciplinando suas cláusulas, de modo a reduzir os conflitos e resguardar a segurança das operações. Do ponto de vista técnico qualquer indivíduo podia operar em seguro. Bastava dispor de meios para satisfazer suas exigências financeiras e seguir as normas técnicas do negócio. Com o tempo poderia reunir um grande número de segurados e manter a estabilidade das operações com a criação de reservas técnicas e outras provisões. A experiência revelou, todavia, ao longo dos séculos, que o segurador individual carecia, por diversas razões, das condições favoráveis para estruturar, 96 Decreto n. 60.459/67 - Art 48. Para os efeitos de constituição, organização e funcionamento das Sociedades Seguradoras, deverão ser obedecidas as condições gerais da legislação das sociedades anônimas, as estabelecidas pelo CNSP e, especialmente, as seguintes: I - capital inicial mínimo de NCr$500.000; II - capital adicional de NCr$500.000, para operar em seguros de responsabilidades; III - capital adicional de NCr$500.000, para operara em seguros de garantias; IV - capital adicional de NCr$100.000, para operar em seguros de acidentes pessoais; V - capital adicional de NCr$200.000, para operar em seguros de saúde; VI - capital adicional de NCr$600.000, para operar em seguros de pessoas. § 1º O cumprimento das condições deste artigo e a realização do capital inicial mínimo permitirão operar nos seguros de direitos, coisas, obrigações e bens. § 2º Os capitais previstos neste artigo serão corrigidos monetariamente pelo CNSP, com a periodicidade mínima de dois anos. 97 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. p. 515. 43 técnica e economicamente, uma empresa de seguros. Já observava Vivante98 que o seguro precisa de muitos anos para conquistar a confiança dos segurados e fortalecer suas operações. É obra que excede as forças e a vida de um indivíduo e de qualquer sociedade que repouse sobre o crédito pessoal. O perigo de alterações por morte do empresário ou seus abusos podem comprometer a solvabilidade da empresa, quando esta não desfruta da confiança do público. Coube a Vivante o mérito de iniciar a luta contra os seguradores individuais, mostrando que se tratava de uma atividade que não comporta as operações isoladas ou eventuais. Só a empresa de seguros com suporte econômico-técnico e um trabalho permanente pode consolidar suas operações e oferecer garantia a seus segurados. 99 Tal é a importância que o autor via na atividade empresarial do seguro que chegou a considerá-la um dos elementos essenciais do contrato. Não obstante ter parecido a muitos uma impropriedade jurídica essa afirmação de Vivante, o fato é que sua obra exerceu influência decisiva na colocação doutrinária da questão. Ninguém mais contesta, do ponto de vista técnico e econômico, que o seguro deve ser explorado como atividade empresarial. Praticamente nenhuma indústria de seguros, como em toda outra manifestação de atividade econômica, a empresa, a coletividade, a reunião de muitas energias singulares têm substituído a especulação singular, o empreendedor único e isolado. Foram desaparecendo, aos poucos, os seguradores individuais em todos os países. O desenvolvimento e a segurança das nações dependem de sua potencialidade econômica, por isso é conferida à empresa moderna uma 98 Cesare Vivante. Del contrato de seguro, de la prenda, del deposito en los almacenes generales. Trad. Argentina, 1952. p. 40. 99 Cesare Vivante. Del contrato de seguro, de la prenda, del deposito en los almacenes generales. p. 40. 44 posição que transcende seus objetivos imediatos de lucro. Recebe dos governos estímulo e apoio para adquirir vigor e pujança, a fim de desempenhar a função social que dela se espera. Entre as diferentes modalidades de empresas a de seguro ocupa uma posição especial, porque é dela que provém o melhor sistema de garantia da atividade econômica contra os inúmeros riscos que a ameaçam de aniquilamento. O seguro exerce uma função social relevante, amealhando fundos com que organiza de modo racional a luta contra os fatores que perturbam o desenvolvimento normal da economia. Eis por que sempre mereceu de todos os governos cuidados que se patenteiam numa legislação especial, objetivando resguardar a instituição empresarial dos efeitos maléficos de uma orientação mal sucedida. 100 Essa legislação especial é hoje bastante complexa, constituindo o que se denomina atualmente direito da empresa de seguros. Além das normas comuns a todas as empresas, deve o segurador atender a uma disciplina jurídica. Submete sua atividade a um regime de fiscalização muito rígida. Forma um conjunto de normas específicas do exercício profissional da atividade seguradora. Estabelece as condições para sua organização, funcionamento, planos técnicos, gestão financeira, formação de fundos de reservas técnicas, transformações de estatutos, obrigações administrativas e 100 Nicola Gasperoni. Assicurazioni Private, Padova, 1972, pág. 107. No original: "L’impresa assicurativa, intesa come esercizio professional ed organizzato dell’attività assicurativa svolta per il mercato, oltre ai problemi comuni ad ogni impresa, presenta problemi specifici, che la legislazione speciale vigente mira a risolvere. II fine econômico dell'assicurazione, fine che consiste nella prestazione dí una sícurezza all'assicurato per eliminare 1'alea che grava su di lui, può essere raggiunto solo mediante un'impresa tecnicamente capace ed organizzata, che dia garanzia di soliditá finanziaria e che tuteli la parte più debole nel dibattito contrattuale e, cioè, 1'assicurato." Tradução livre: A empresa que exerce profissionalmente a atividade seguradora voltada para o mercado, além dos problemas comuns de qualquer empresa, enfrenta problemas específicos que uma legislação especial vigente procura resolver. Os fins econômicos do seguro que consistem na prestação de uma segurança ao segurado visando eliminar a álea que lhe onera, somente pode ser prestado por uma empresa tecnicamente capaz e organizada, que dê garantia de solidez financeira e que tutele a parte mais debilitada na relação contratual, isto é, o segurado. 45 fiscais etc. As relações das empresas entre si disciplinam vários institutos inerentes à sua atividade, tais como o co-seguro, o resseguro, os pools etc. 101 Com relação a seus colaboradores, a empresa de seguros pode manter um quadro exclusivo, quando a legislação do país permite, remunerado sob a forma de salário ou de comissões sobre os contratos angariados. Podem esses colaboradores formar também uma classe autônoma, com estatuto profissional próprio, prevendo a legislação especial seu relacionamento com a empresa de seguros. Finalmente, o direito empresarial não exclui, senão excepcionalmente, a obrigação comum a todas as empresas no relacionamento com o público, com os sócios, com o Estado e com outras empresas. Não há notícia de ter operado em nosso país algum segurador individual, explorando essa atividade em caráter esporádico ou regular. A legislação portuguesa, mantida durante algum tempo, mesmo depois da Independência, não proibia a prática do seguro por qualquer pessoa, desde que fosse negociante de boa fama e crédito, com registro na Casa de Seguros de Lisboa. A primeira seguradora, criada em princípios de 1808, na Bahia, já surgiu sob a forma empresarial, como sociedade de capital. Outras se constituíram pelo mesmo processo, sob a tutela da legislação comum sobre sociedades anônimas. 101 Antígono Donati. Manuale di diritto delle assicurazioni private.Milano, 1960, pág. 111: "In linea generale possiamo distinguere: rapporti relativi al coordinamento e al rafforzamento dell’attività economica (coalizioni tra Imprenditori), che nella loro portata piú ampia vanno da quelli di coordinamento (unioni di primo grado o consorzi) a quelli di raggruppamento (unioni di scondo grado o gruppi), a quelli di concentrazione di aziende (unioni di terzo grado); rapporti specifici del nostro settore relativi alla ripartizione dei rischi assunti (coassicurazione e riassicurazione), sia per libera iniziativa, sia in esecuzione dei rapporti di coordinamento." Tradução livre: Em linhas gerais podemos distinguir: relações relativas à coordenação e reforço da atividade econômica (coalização entre empreendedores), que nelas colocam a mais ampla esperança daquelas de coordenação (união de primeiro grau ou consórcio) aquelas de agrupamento ( união de segundo grau ou grupos) aquelas de concentração de fazer (união de terceiro 46 O Código Comercial, de 1850, ao disciplinar o contrato de seguros marítimos, não fez qualquer restrição quanto à capacidade jurídica para alguém operar como segurador. Depois de sua publicação, os seguros começaram a desenvolver-se, em virtude de autorização a diversas companhias estrangeiras que iniciaram sua atividade no país. Somente por volta de 1895 o governo foi induzido pela experiência do mercado a prescrever as primeiras normas jurídicas especificas sobre as operações das companhias de seguros, procurando discipliná-las em proveito dos interesses nacionais. Posteriormente, surgiram outros regulamentos em substituição aos anteriores, sempre acrescidos de novas disposições legais, restringindo a liberdade de ação das empresas e procurando orientar sua atividade, em atenção às condições peculiares ao nosso meio. A legislação atualmente em vigor a respeito do mercado segurador brasileiro segue anexa a este trabalho e contém a regulamentação emanada dos órgãos oficiais que integram o Sistema Nacional de Seguros Privados, constante de resoluções, portarias, circulares e instruções. 102 O Conselho Nacional de Seguros Privados — CNSP — tem amplos grau); relações específicas desse setor relativas à repartição dos riscos assumidos (cosseguro e resseguro), seja pela livre iniciativa, seja em execução de uma relação de coordenação. 102 Anexo I: Lei n. 8.177/91 – estabelece as regras pra a desindexação da economia e dá outras providências; Decreto-Lei n. 73/66 – dispõe sobre o sistema nacional de seguros privados, regula as operações de seguros e resseguros e dá outras providências; Lei Complementar n. 109/01 – dispõe sobre o regime de previdência complementar e dá outras providências; Lei n. 10.190/01 – altera dispositivos do decreto-lei n. 73, de 21 de novembro de 1966, da Lei n. 6.435, de 15 de julho de 1977, da Lei n. 5.627, de 1º de dezembro de 1970 e dá outras providências; Lei n. 7.944/89 – institui a taxa de fiscalização dos mercados de seguro, de capitalização e da previdência privada aberta e dá outras providências; Lei n. 6.194/74 – dispõe sobre seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, ou por sua carga, a pessoas transportadas ou não; Decreto-lei n. 802/69 – declara a Rede Ferroviária Federal S.A. e as demais ferrovias existentes no país isentas das obrigações estabelecidas no Decreto-lei n. 73/66; Decreto-lei n. 261/67 – dispõe sobre as sociedades de capitalização e dá outras providências; Decreto n. 85.266/80 – dispõe sobre a atualização dos valores monetários dos seguros obrigatórios a que se refere o Decreto n. 61.867/67; Decreto n. 60.459/67 – regulamenta o Decreto-lei n. 73, com as modificações introduzidas pelos Decretos-lei n. 168/67 e n. 296/67; Decreto n. 61.867/67 – regulamenta os seguros obrigatórios previstos no artigo 20 do Decreto-lei n. 73/66 e dá outras providências. 47 poderes discricionários para regular a constituição, organização, funcionamento e fiscalização dos que exercerem atividades subordinadas ao Sistema Nacional de Seguros Privados. Cabe a outro órgão — a Superintendência de Seguros Privados, Susep — promover a execução das resoluções baixadas pelo Conselho, fiscalizando diretamente as atividades das seguradoras. Um terceiro órgão — o Instituto de Resseguros do Brasil, IRB — estruturado sob a forma de economia mista, com participação das seguradoras em seu capital, opera com exclusividade em resseguros, com a transferência compulsória para ele dos excedentes de capacidade técnica das diferentes carteiras das seguradoras. No exercício de suas funções de natureza operacional, edita também normas gerais de regulamentação, a que estão submetidas as empresas de seguros. A lei instituiu no país o Sistema Nacional de Seguros Privados, integrado pelos três órgãos mencionados e mais as Sociedades autorizadas a operar em seguros privados e os corretores habilitados. Prevê uma série de disposições para cada um de seus componentes, definindo suas atribuições, formas de Constituição, operação etc. As seguradoras exercem com exclusividade as operações de seguros privados, compreendendo os seguros de coisas, pessoas, bens, responsabilidades, obrigações, direitos e garantias. Os seguros sociais, inclusive o de acidentes do trabalho, estão excluídos de seu âmbito de atuação. São regidos por legislação própria. Qualquer pessoa, jurídica ou física, que pretender realizar operações de seguro, co-seguro ou resseguro, se não for uma empresa organizada exclusivamente para esse fim e devidamente autorizada, fica sujeita à pena de 48 multa igual ao valor da importância segurada ou ressegurada no país ou no exterior. A critério do Conselho Nacional de Seguros Privados, o Governo Federal poderá assumir riscos catastróficos e excepcionais, por intermédio do Instituto de Resseguros do Brasil, desde que interessem à economia e segurança do país. O Banco Nacional da Habitação poderá, também, assumir riscos decorrentes das operações do Sistema Financeiro da Habitação que não encontrarem cobertura no mercado nacional, a taxas e condições compatíveis com as necessidades do referido sistema. Para operar em seguros privados as empresas hão de assumir a forma de sociedade anônima ou cooperativa; esta terá sua atividade restrita aos seguros agrícolas e de saúde. As pessoas físicas e as sociedades jurídicas de outra natureza, como as de pessoa e as por cota de responsabilidade limitada não têm autorização para funcionar. As seguradoras não poderão explorar outro ramo de comércio ou indústria. E mesmo no campo de seguros privados só poderão operar em seguros para os quais tenham a necessária autorização, segundo os planos, tarifas e normas aprovadas pelo Conselho Nacional de Seguros Privados. Para funcionar precisam de autorização do Ministério da Fazenda e comprovar perante a SUSEP o cumprimento de todas as formalidades ou exigências feitas no ato da autorização. 49 4.2. SEGURADO Segurado é a denominação técnica e jurídica do titular do risco. Para Fábio Konder Comparato103, o segurado é em princípio o credor. Segundo a lição de Maria Helena Diniz104, é o que tem interesse direto na conservação da coisa ou da pessoa, fornecendo uma contribuição periódica e moderada, isto é, o prêmio, em troca do risco que o segurador assumirá de, em caso de incêndio, abalroamento, naufrágio, furto, falência, acidente, morte, perda das faculdades humanas etc., indenizá-lo pelos danos sofridos. Os sucessores moverão ação contra a seguradora, porque o pagamento das indenizações fixadas nas apólices não dependerá de prova de culpa do causador do dano. A única averiguação a ser feita será a da existência do dano, por força da teoria do risco. 105 Penetrando no mundo jurídico sob a forma de contrato, o seguro só pode ser concluído se as partes contratantes forem capazes, isto é, puderem exercer direitos e obrigações. Qualquer pessoa poderá fazer seguro de vida, e em qualquer valor, pessoalmente ou por meio de representante. Se o segurado contratar mediante procurador, este também se responsabilizará perante o segurador pelas inexatidões ou lacunas que possam influir no contrato. No seguro à conta de outrem, o segurador pode opor ao segurado quaisquer defesas que tenha contra o 103 Fábio Konder Comparato. O seguro de crédito. Estudo jurídico. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1968. p. 105. 104 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. v.3, 21ª ed. p. 515 a 517. 105 Consagrada no Decreto-lei n. 73/66, regulamentado pelo Decreto n. 61.867/67, com as alterações do Decretolei n. 814/69, revogado pela Lei n. 6.194/74, que no art. 5º preceitua: "O pagamento das indenizações será efetuado mediante a simples prova do acidente e do dano decorrente e independentemente da existência da culpa, haja ou não resseguro, abolida qualquer franquia de responsabilidade do proprietário do veículo". Vide texto completo no anexo. 50 estipulante, por descumprimento das normas e conclusão do contrato, ou de pagamento do prêmio. 106 Com relação ao segurado, pessoa física, também denominadas naturais, sua capacidade jurídica para contratar está regulada pelo direito comum e por normas especiais aplicáveis ao seguro. Todas as pessoas naturais, são capazes de direito, mas nem todas podem exercê-lo. Existe, pois, a capacidade de direito e a capacidade de fato. A primeira é imanente a todo ser humano. A segunda depende da aptidão para exercitar direitos. O exercício pressupõe consciência e vontade, por isso a capacidade se acha vinculada a determinados fatores objetivos: idade, sexo e estado de saúde. A incapacidade de exercício ou de fato não elimina a capacidade de direito, suprida pelo instituto de representação. O incapaz exerce seus direitos através dos respectivos representantes legais107. Prevê a lei duas espécies de incapacidade: a absoluta108 e a relativa109. É nulo de pleno direito o contrato celebrado com os absolutamente incapazes, mas é apenas anulável, se a incapacidade for relativa. A nulidade pode ser arguida por qualquer interessado ou pelo Ministério Público. A anulabilidade só pode ser alegada pelos interessados e não tem efeito antes de julgada por sentença. 106 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. v. 3. 21ª ed. p. 522. Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. V. 1. 18ª ed. São Paulo: Saraiva. 2002. p. 138-139 e Washington de Barros Monteiro, Curso de Direito Civil. v. 1. 31ª ed. São Paulo. 1997, Parte Geral, pág. 68. 108 Código Civil - Art. 3o São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: I - os menores de dezesseis anos; II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos; III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade. 109 Código Civil - Art. 4o São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer: I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; II - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido; III - os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo; IV - os pródigos. Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial. 107 51 Adverte Maria Helena Diniz110 que nem todos poderão ser beneficiários, pois, no seguro de coisas ou de prejuízos, será preciso provar o interesse em relação à coisa segurada. A pessoa jurídica, de outro lado, é uma ficção da lei. Não tem existência real, como a pessoa física. Sua capacidade depende, então, de sua existência legal. Concebida e organizada segundo a legislação comum ou especial, precisa de autorização formal ou de cumprir todas as exigências regulamentares para poder exercer direitos e obrigações, como se fosse um ente dotado de vontade própria. 111 4.3. PRÊMIO E SEU CÁLCULO O segurado transfere o risco para o segurador que assume a obrigação de pagar determinada quantia, caso o evento previsto se concretize. Recebe em contraprestação dessa responsabilidade o prêmio que constitui o preço do risco. 112 Portanto, podemos definir prêmio como sendo a remuneração que o segurado deve pagar ao segurador pela garantia que lhe dá pela cobertura de 110 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. v. 3. 21ª ed. p. 522. Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. V. 1. 18ª ed. São Paulo: Saraiva. 2002. p. 237. 112 Fabio Konder Comparato, ressalta que o prêmio de seguro não representa, de modo algum, para o segurador, a contrapartida do risco assumido em determinado contrato, mas sim a cota-parte cabível ao segurado na repartição do montante global dos riscos que pesam sobre a própria mutualidade. (Comentário. Revista de Direito Mercantil, n. 7, ano XI, São Paulo: Ed. RT, Nova Série, 1972. p. 108). 111 52 certo risco. É a compensação pela assunção do risco, com o sentido de recompensa. 113 É com a receita de prêmios que o segurador constitui o fundo comum de onde retira as verbas para cumprir suas obrigações perante os segurados. É portanto, um elemento imprescindível à estabilidade de suas operações. Quer técnica, quer juridicamente, ensina Amilcar Santos114, sua importância é manifesta, constituindo mesmo, pode-se dizer, a base sobre a qual repousa toda operação. Em hipótese alguma, portanto, pode o segurador dispensar o segurado do pagamento do prêmio. Exercendo a função de administrar esse fundo comum, pertencente aos segurados, pois é formado com a contribuição deles, o segurador não pode e não deve praticar liberalidades à custa desse fundo, como, por exemplo, dispensar o segurado do pagamento do prêmio. 115 113 Maria Helena Diniz define tal elemento como sendo a quantia pecuniária que o segurado paga à seguradora para obter o direito a uma indenização se ocorrer o sinistro oriundo do risco garantido e previsto no contrato; daí ser denominado por alguns autores, ágio do seguro; o risco consistirá num acontecimento futuro e incerto, que poderá prejudicar os interesses do segurado, provocando-lhe uma diminuição patrimonial evitável pelo seguro, e a indenização é a importância paga pela seguradora ao segurado, compensando-lhe o prejuízo econômico decorrente do risco e assumido na apólice pela seguradora (Tratado teórico e prático dos contratos. São Paulo: Saraiva. 2002. v. IV. p. 437). Silvio Rodrigues define o prêmio como a contraprestação devida pelo segurado, ao segurador, em troca do risco por ele assumido (Direito Civil – dos contratos e das declarações unilaterais de vontade: v. 3, 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 1977. p. 364). Para Munir Karam, prêmio é o preço do risco, a contraprestação que a seguradora recebe pela responsabilidade assumida (Do contrato de seguro no código civil: noções fundamentais. Cit. RT 834/74. p. 76). No dizer de Pedro Alvim, o prêmio corresponde à contraprestação do segurado. O preço pago para livrar-se das consequências do risco. É uma obrigação certa, devida ao segurador, haja ou não a ocorrência do risco (O contrato de seguro. Cit., p. 113). Para Rubens Limongi França prêmio é a importância paga pelo segurado ao segurador para fazer jus à indenização (Manual de direito civil. v. 4 – tomo 2. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1969. p. 239). 114 Amilcar Santos, Dicionário de Seguros, Publicação n. 23, IRB, 2.ª ed. 115 Picard et Besson, cit., tomo I, pág. 69 - Explica: La prime est en effet aussl essentielle que lê risque. Bans primes, 1'assureur ne pourraít pás constituer lê fonds nécessalre au paiement dês indemnités: I1 y aurait peu-étre donation condltionnelle; il n'y auralt pás assurance, préciséraent parce que lês sinistres ne peuvent être réglés que grace à 1'ensamble dês contrlbutions dês assurés. Vivante en déduit logiquement cette conséquence que si, par libéralité, Ia compagnle veut accorder à sés propres agents lê benéfice d'une assurance, elle dolt se déblter de Ia prime equivalente; cette somme será prélevée sur lês Trais généraux de 1'entreprise, pour compléter lê fonds dês primes. Tradução livre: (No contrato de seguro) o prêmio é, com efeito, tão essência/relevante quanto o (próprio) risco. Sem prêmios, o segurador não poderia constituir os fundos necessários ao pagamento das indenizações. (Sem os prêmios) haveria, talvez, doação condicional; não haveria precisamente um seguro porque os sinistros só podem ser suportados (pelo segurador) graças ao conjunto das contribuições dos segurados. Vivante inferiu essa mesma conclusão lógica do seguinte exemplo: se por liberalidade, a companhia (seguradora) quiser conceder aos seus próprios empregados o benefício do seguro, ela 53 Desta forma, sendo o prêmio o preço do risco, faz-se mister a análise e seu cálculo para que possamos compreender o seu valor final. O prêmio é uma função do risco116. Varia de acordo com sua periculosidade. Aumenta ou diminui, segundo sua gravidade. Quanto maior a probabilidade do risco, maior o prêmio. Há uma correlação necessária entre os dois elementos de forma a manter a fonte de recursos para as obrigações do segurador. Não seria justo que o prêmio fosse igual para todos. O risco de cada segurado varia, segundo uma série de fatores que aumentam ou diminuem a probabilidade de ocorrência. Uma indústria de explosivos ou de inflamáveis, por exemplo, tem maior possibilidade de ser destruída por um incêndio que uma casa residencial. Pagar-se-á, portanto, para aquela um prêmio superior ao desta. Durante longo período, o cálculo do prêmio dependeu exclusivamente da experiência do segurador, nem sempre bem sucedida, por isso acabava comprometendo a estabilidade de seus negócios. Com o aprimoramento dos conhecimentos técnicos, a atividade seguradora dispôs de novos processos para sua fixação com relativa segurança. Segundo esclarece Pedro Alvim117, o prêmio se decompõe em duas partes: o prêmio puro, também chamado teórico ou estatístico, e o carregamento, constituído das despesas administrativas de exploração do negócio e do lucro do segurador. O prêmio puro, fixado geralmente por cálculos, às vezes complicados, como acontece nos seguros de vida, depende de conhecimentos especializados deve recolher os correspondentes prêmios (ao fundo securitário), soma essa que, para completar os fundos dos prêmios, será imputada aos custos gerais da empresa. 116 Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil. 10ª Ed., Forense, Rio de Janeiro, 1997. p. 304. 117 Pedro Alvim. O contrato de seguro. p. 270. 54 de matemática atuarial, isto é, matemática aplicada ao seguro. Mas, em linhas gerais, faz-se o levantamento estatístico, durante determinado período de tempo, da incidência de casos ocorridos para o total de casos observados. Esses dados dão a conhecer a probabilidade de sinistros. É fixada matematicamente sob a forma de uma fração, cujo numerador exprime os fatos ocorridos (chances favoráveis) e o denominador, os casos observados (chances possíveis). Em outras palavras, se os estudos estatísticos revelaram, por exemplo, de mil riscos observados cinco ocorreram, em média, por ano, a probabilidade de sinistro desses riscos é de 5/1000 (cinco por mil). O prêmio puro seria, então, no exemplo dado, de cinco por mil do valor de cada um dos riscos observados. Está o cálculo sujeito à correção de outros fatores importantes, como, por exemplo, a intensidade do sinistro. Pode o risco não destruir inteiramente os bens danificados, reduzindo-se, então, a intensidade de seus efeitos. No seguro de responsabilidade civil influi na redução do prêmio a possibilidade de recuperação dos prejuízos pagos pelo segurador através de subrogação contra o terceiro responsável pela ocorrência. Outro fator de redução é a taxa de juros, sobretudo nos planos de seguro de vida. Como o prêmio é pago antecipadamente, o segurador deve descontar a parcela correspondente aos juros do dinheiro que ficou em seu poder. O cálculo do prêmio é feito separadamente para cada ramo de seguro, depois da análise estatística de grande massa dos riscos que entram na cobertura. Há fatores peculiares a cada um desses ramos que podem reduzir ou aumentar o coeficiente de sinistro-prêmio. O prêmio puro é a resultante da ponderação de todos os elementos que possam incidir, favorável ou negativamente, no comportamento do risco. 55 O carregamento leva em conta outros valores influentes no cálculo do prêmio, mas independentes do risco. Inclui as despesas administrativas da empresa, os gastos com agenciamento de clientes por corretores, a porcentagem do lucro para pagamento a acionistas e à diretoria, depois de formadas as reservas técnicas exigidas por lei etc. O prêmio puro acrescido do carregamento dá origem ao prêmio comercial. Aparece sob a forma de um percentual que, multiplicado pela importância segurada, dá o prêmio final a ser pago pelo segurado. Esse percentual é conhecido pela denominação de taxa. Cada risco tem sua taxa. O conjunto de taxas de cada ramo de seguro forma o que se chama tarifa. Em determinados ramos, como, por exemplo, o de seguro incêndio, a tarifa constitui trabalho bastante complexo. Chega a formar um volume com muitas páginas. A taxa é calculada em função da ocupação, da construção e da localização do risco. As diferentes ocupações estão classificadas na ordem alfabética em rubricas. As rubricas, por sua vez, se subdividem em sub-rubricas. Na atividade vinícola, por exemplo, vinho contém as seguintes sub-rubricas: a) sem destilaria, nem manipulação do álcool ou aguardente, sem engarrafamento; b) a anterior, com engarrafamento; c) com manipulação de álcool; d) depósito em tonéis ou barris; e) em garrafas; f) engarrafamento. Essas ocupações são condensadas em 13 classes. O valor estabelecido para cada classe sofre a correção dos diferentes tipos de construção, ao todo quatro, e da localização do risco no território nacional, dividido também em quatro classes. Depois de ponderados todos esses fatores, a taxa ainda sofre variações para mais ou para menos, em função de peculiaridades do risco. 56 Essa multiplicidade de fatores ponderados na fixação da taxa de prêmio do seguro-incêndio torna difícil o manuseio de sua tarifa por pessoas não familiarizadas com o ramo. As de outras modalidades são geralmente mais simples. Em todas há sempre a preocupação técnica de avaliar os diferentes aspectos do risco para fixação da taxa com o necessário rigor. 4.4. RISCO O elemento risco é um elemento clássico do contrato de seguro. 118 O conceito de risco119 é multidisciplinar. É tema de estudo, senão de modo totalmente distinto, mas pelo menos não com a mesma metodologia e visão, de duas ciências: a econômica e a jurídica; é composto por diversos fatores que devem ser identificados e considerados; é classificável quanto ao seu resultado, o inadimplemento absoluto ou a diminuição da satisfação da prestação e o critério para a sua distribuição é fruto de uma concepção das estruturas e fins do contrato, e, portanto, do direito contratual. 120 118 Veja-se, por exemplo: Véronique Nicolas, Essai d'une nouvelle analyse du contrat d'assurance, Paris : LGDJ. 1996, p. 29; também J. C. Moitinho de Almeida, O contrato de seguro no direito português e comparado, Lisboa, l971, p. 18 e 29. 119 Para Munir Karam, o risco é o acontecimento que não depende exclusivamente da vontade das partes. Sem risco preexistente, não pode haver seguro, por falta de objeto (Do contrato de seguro no código civil: noções fundamentais. RT 834/74). Para Fábio Konder Comparato 119, o risco é antes de tudo uma possibilidade, ou seja, ele deve referir-se a um evento de realização incerta (O seguro de crédito. Estudo jurídico. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1968. p. 40). 120 Fernando Marquezini. Contribuição ao estudo dos riscos contratuais e de sua distribuição, no direito privado. (dissertação de mestrado apresentada em 09 de junho de 2003) USP. São Paulo. pág. 59. 57 Maria Helena Diniz121, acompanhada de Orlando Gomes 122 e Silvio Rodrigues 123, salienta que o risco é de importância capital para o contrato de seguro: “A noção de seguro supõe a de risco, isto é, o fato de estar o sujeito exposto à eventualidade de um dano à sua pessoa, ou ao seu patrimônio, motivado pelo acaso. Com a verificação do evento a que está condicionada a execução do dever do segurador, ele pagará a indenização, se o dano atingir a pessoa ou os bens do segurado”. Todavia, não estará incluído na garantia o sinistro causado por vício intrínseco, ou defeito próprio, do bem segurado que não se encontra normalmente em outros da mesma espécie, não declarado pelo segurado, visto não ser objeto do contrato. 124 Assim sendo, o contrato de seguro é o meio pelo qual a pessoa física ou jurídica se protege contra os riscos que impendem sobre sua vida, ou sobre o objeto de seus negócios. Por outro lado, permite a formação de capitais pelo acúmulo dos prêmios pagos pelo segurado, representando uma forma de economia, uma garantia de execução das obrigações contraídas, um reforço do crédito público, pois as dívidas do segurado estarão garantidas pelo contrato de seguro. 125 O seguro, nessa linha de raciocínio, é um direito resultante do mútuo consenso do segurado e do segurador, que estabelecem entre si direitos e obrigações. É, portanto, um direito que alguém adquire, mediante certo pagamento, de exigir da outra parte uma indenização, caso ocorra o risco assumido. 121 Maria Helena Diniz. Tratado teórico e prático dos contratos. São Paulo: Saraiva. 2002. p. 439. Orlando Gomes. Contratos. p. 462 123 Silvio Rodrigues. Direito Civil – dos contratos e das declarações unilaterais de vontade. p. 364. 124 Código Civil - Art. 784. Não se inclui na garantia o sinistro provocado por vício intrínseco da coisa segurada, não declarado pelo segurado. Parágrafo único. Entende-se por vício intrínseco o defeito próprio da coisa, que se não encontra normalmente em outras da mesma espécie. 125 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. p. 517. 122 58 Diversamente da ciência econômica que possui um conceito muito amplo de risco, indicando a sua origem – a mais diversa possível – e a sua importância como um meio de auferir lucro, na medida em que não é assegurável, o direito preocupa-se por classificá-lo, a fim de dar a cada espécie de risco um tratamento diferente, incidência de diferentes normas jurídicas e conseqüências distintas com aplicação de diferentes sanções126. Enquanto no seguro de coisas o risco é representado pela circunstância de estar a pessoa exposta à eventualidade de um dano, ou de ter de reparar um dano causado a outrem, no seguro de vida o risco consiste no fato de a pessoa vir a morrer mais cedo ou mais tarde, e, no caso de seguro de acidente, o risco se encontra na possibilidade de o segurado vir a sofrê-lo. Numa visão ampla do fenômeno, podemos afirmar que todo ato econômico e, por conseqüência, todo contrato, é sempre sujeito à influência da incerteza das circunstâncias. O tema do risco contratual não é criação recente da dogmática civilística. Na tradição romana já se colocava o problema em termos de periculum, com a finalidade de individuar, principalmente com relação ao contrato de compra e venda a potencial impossibilidade da prestação derivante do perecimento do objeto. De tal formulação derivam princípios que, por longo tempo, tiveram um peso significativo na solução de conflitos originados com circunstâncias que impediam a execução da prestação deduzida do contrato, tais como os conhecidos euremas do direito romano casum sentit debitur, res perit domino etc.127 126 Fernando Marquezini. Contribuição ao estudo dos riscos contratuais e de sua distribuição, no direito privado. (dissertação de mestrado apresentada em 09 de junho de 2003) USP. São Paulo. p. 59. 127 Alberto Giampieri. Rischio ed common law. in Contratto e impresa, ano 2, Padova: CEDAM, 1996, págs. 600-601. 59 Genericamente, o risco pode ser a ocorrência do inadimplemento, quando uma das prestações não é mais suscetível de ser exigida por motivo de culpa ou dolo do devedor, por uma intervenção de um terceiro ou por um caso fortuito. Nos dois primeiros casos, fica claro a quem deve ser atribuída a responsabilidade, o que, definitivamente, não ocorre no caso de um evento superveniente (caso fortuito ou força maior). Além disso, deve-ser considerar que na tradição da civil law, a distinção entre as circunstâncias externas preexistentes e supervenientes e inadimplemento imputável exclui que esta última figura possa ser reconduzida à área do risco contratual. 128 Para José de Aguiar Dias129, tendo em vista a adoção integral do princípio do risco, banir a culpa do sistema da responsabilidade civil talvez seja uma temeridade, dadas as repercussões econômicas que acarretaria. Mas, salienta que já é tempo de consagrar a responsabilidade objetiva para atividades que resultem, só pelo seu exercício, com freqüência considerável, em dano injusto para a comunidade. A reintegração do patrimônio do lesado elimina o dano deste, mas não o sofrido pela sociedade. O deslocamento desta preocupação é justificável, na hipótese em que o dano seja realização de um risco de uma empresa. Dentro desta concepção, parece ser correto a teoria econômica da distribuição dos custos e lucros. O quê produzir e como produzir são elementos econômicos que entram neste raciocínio. Assim, a assunção de um risco, que gravita na esfera jurídica do segurado, é a essência do contrato de seguro. 128 130 Fernando Marquezini. Contribuição ao estudo dos riscos contratuais e de sua distribuição, no direito privado. (dissertação de mestrado) PUC, p. 56. 129 José de Aguiar Dias. Da responsabilidade Civil. Revista do Advogado nº 19, p. 33/39. 130 Sérgio Cavalieri Filho, analisando a posição da seguradora na relação jurídica, como mera administradora de um monte previdenciário, nascido pela importância da idéia básica de um mutualismo, de uma visão social basicamente solidarista, ensina que o segurador nada mais é que um garante do risco do segurado, uma espécie de avalista ou fiador dos prejuízos que dele podem decorrer. Tão forte é essa garantia que é costume 60 Fábio Konder Comparato131, tendo por base o Código Civil de 1916, discorre com precisão sobre a complexa equação subjacente aos contratos de seguro. No dizer desse autor, o contrato de seguro não pode ser desligado do conjunto operacional no qual se insere, sem ser desfigurado em sua natureza. O caráter de mera unidade de um conjunto homogêneo de contratos do mesmo tipo é-lhe essencial. Não basta, com efeito, dizer que o segurador assume o risco que pesava sobre o segurado. Essa translação de risco, por si só, não se verifica com exclusividade na operação de seguro, podendo encontrar-se em outras figuras contratuais, como, por exemplo, a comissão del credere (em relação ao comissário) ou a fiança (em relação ao credor garantido), no que se refere ao risco de não pagamento de determinado crédito. Ensina Fábio Konder Comparato132 que, na verdade, a operação de seguro implica a organização de uma mutualidade, ou o agrupamento de um número mínimo de pessoas, submetidas aos mesmos riscos, cuja ocorrência e intensidade são suscetíveis de tratamento atuarial, ou previsão estatística segundo a lei dos grandes números, o que permite a repartição proporcional das perdas globais, resultantes dos sinistros, entre os seus componentes. A atividade do segurador consiste justamente na organização dessa mutualidade, segundo a dizer que o seguro transfere os riscos do segurado para o segurador. No entanto, esclarece esse autor que, na realidade, não é bem isso o que acontece. Explica que o risco, de acordo com as leis naturais, é intransferível. Com o seguro ou sem seguro, quem continua exposto a risco é a pessoa ou coisa. É o operário que trabalha na máquina perigosa ou lá no andaime no 10.º andar de uma obra; é o carro que circula numa cidade infestada de ladrões; é a pessoa que vive numa cidade violenta e assim por diante. O que o seguro faz é transferir as conseqüências econômicas do risco caso ele venha a se materializar em sinistro. O segurado compra a sua segurança mediante o pagamento do prêmio de seguro. Que segurança? De natureza patrimonial, pois sabe que, se ocorrer o sinistro, terá os recursos econômicos necessários para reparar seu prejuízo e recompor seu patrimônio (1º Fórum do Direito do Seguro – José Sollero Filho. Estudos de direito do seguro. coordenado pelo Instituto Brasileiro de Direito do Seguro - IBDS. São Paulo: Max Limonad. 1998. p. 86). 131 Fabio Konder Comparato. Comentário. Revista de Direito Mercantil, n. 7, ano XI, São Paulo: Ed. RT, Nova Série, 1972. p. 108. 61 exigência técnica de compensação do conjunto de sinistros previsíveis pela soma total de contribuições pagas pelos segurados. Para exemplificar seu pensamento cita o seguro de incêndio, e, supondo, de acordo com as observações estatísticas sobre riscos homogêneos desse setor, que em cada conjunto de 100.000 prédios, 12 queimem totalmente no decurso de um ano. O valor desse risco será determinado fundamentalmente pela fração 12/100.000, isto é, 0,00012. Por conseguinte, para a unidade de valor segurado (Cr$ 1.000,00) e de tempo estipulado (um ano), cada segurado deverá contribuir com 12/100.000 para a formação da massa comum, o que permitirá teoricamente ao segurador pagar integralmente os 12 segurados que, naquele período de tempo, serão sinistrados. Sucede, porém, que os riscos não são apenas considerados em sua frequência de realização mas também em sua intensidade. Assim, a observação estatística poderá, portanto, indicar que para o risco em causa a intensidade dos sinistros é de apenas 2/3, ou seja, que os prédios sinistrados, em seu conjunto, não queimam totalmente, mas apenas numa média de dois terços do valor global. Em consequência, a fração acima indicada deverá ser corrigida como segue: 12/100.000 x 2/3 = 0,00008. Supondo-se, assim, que os 100.000 prédios englobados na mutualidade sejam de valor unitário igual a Cr$ 80.000,00, o montante global de sinistros a indenizar, no período considerado, será de Cr$ 640.000,00 (isto é, 2/3 de Cr$ 960.000,00, que representam 12 x Cr$ 80.000,00). Em consequência, que o segurador esteja em condições de pagar essa soma, cada segurado deverá contribuir com a quantia mínima de Cr$ 51,20 (0,00008 x Cr$ 640.000,00). Quantia mínima, bem se vê, equivalente ao chamado prêmio puro, ao qual se acrescerá evidentemente o montante correspondente ao custo do serviço e à margem de lucro do segurador. 132 Fabio Konder Comparato. Comentário. Revista de Direito Mercantil, n. 7, ano XI, São Paulo: Ed. RT, Nova Série, 1972. p. 109. 62 Tendo em vista a grande precisão e clareza na narrativa, pedimos venia para transcrever o seguinte trecho da obra de Fabio Konder Comparato133: “As conseqüências desse fato técnico são de grande relevância jurídica. Como disse Ferri 'no contrato de seguro, os dois termos do sinalagma não se determinam em função um do outro, mas passam necessariamente através do diafragma da empresa; embora tratando-se de um contrato oneroso, a relação entre prestação e contraprestação não se coloca em referência a um seguro isolado, mas em relação à massa dos seguros daquele tipo realizados pela empresa' (Manuale di diritto commerciale, 2. ed., p. 720). O seguro, portanto, como afirmou Vivante de modo pioneiro, é essencialmente um contrato de empresa, não apenas porque a existência desta última constitui um dos seus pressupostos subjetivos, mas também e sobretudo porque a inserção de cada contrato num conjunto operacional organizado representa um dos seus requisitos ou elementos intrínsecos, adentrando no 'esquema casual do negócio'. A concepção do seguro como contrato aleatório se ressente, portanto, hoje em dia, de um certo anacronismo (contra, porém, recentemente, Agostino Gambino, L'assicurazione nella teoria del contratti aleatori, Milão, 1964). Para o segurador, em qualquer ramo de seguro, a supressão da álea em sua atividade operacional é exigência da própria natureza dessa atividade, não se podendo nunca considerar cada relação contratual isolada do conjunto. Quanto ao segurado, o pagamento de indenização, no seguro de dano, não pode nunca representar um enriquecimento, e o prêmio pago aparece como o preço da supressão do risco que pesava sobre o seu patrimônio. 133 Fabio Konder Comparato. Comentário. Revista de Direito Mercantil, n. 7, ano XI, São Paulo: Ed. RT, Nova Série, 1972. p. 110. 63 É com base nisto, e tão-somente nisto, que se pode juridicamente distinguir, por exemplo, o seguro de renda vitalícia do contrato oneroso de constituição de renda (CC, art. 1.424 et seq.)134, o seguro de coisas determinadas da assunção individual - ainda que onerosa - da obrigação de indenizar. Fora dessa mutualística, tecnicamente estruturada, não há propriamente seguro, mas um ajuste bilateral assemelhado ao jogo ou à aposta". Como se vê, a relação entre seguradora e segurado é presidida por uma equação de retribuição proporcional expressiva de comutatividade. Esta visão do contrato de seguro também encontramos na obra de Ernesto Tzirulnick135, para quem, comete-se uma série de equívocos ao apegarse de modo intenso à questão de ser ou não súbito o evento, e, portanto imprevisto136. Para Calmon de Passos137, a par desse fenômeno da incorporação do risco à dinâmica da sociedade de nossos dias, fala-se também, hoje, com total procedência, em produção de massa, consumo de massa, comunicação de massa, 134 Código Civil de 1916 - Art. 1.424. Mediante ato entre vivos, ou de última vontade, e título oneroso, ou gratuito, pode constituir-se, por tempo determinado, em benefício próprio ou alheio, uma renda ou prestação periódica, entregando-se certo capital, em imóveis ou dinheiro, a pessoa que se obrigue a satisfazê-la. Código Civil de 2002 - Art. 803. Pode uma pessoa, pelo contrato de constituição de renda, obrigar-se para com outra a uma prestação periódica, a título gratuito. Art. 804. O contrato pode ser também a título oneroso, entregando-se bens móveis ou imóveis à pessoa que se obriga a satisfazer as prestações a favor do credor ou de terceiros. 135 Para esse autor, o primeiro equívoco é pensar o acidente como "pequena tragédia individual", quando em verdade ele é um fato social, cujo tratamento são justamente o seguro e a indenização dele advinda. Um outro equívoco inaceitável no direito securitário contemporâneo é que tal concepção distancia-se da vida real, isolando-se em frases feitas e congeladas em outras situações. Portanto, o posicionamento adequado não pode ser apartado da concretude material dos fatos (Ernesto Tzirulnik. Seguro contra todos os riscos de engenharia. Regulação de sinistro – conceito de dano material. RT 827/105. 2004. p. 142). Françoi Ewald, por sua vez, afirma que o acidente moderno têm um tipo de objetividade absolutamente singular, pois ele não remete à natureza (não é uma minicatástrofe, uma catástrofe individualizada); não remete nem mesmo aos objetos, às técnicas, às máquinas, mas, por intermédio deles, à sociedade (Introdução. L’État providence. Paris: Grasset, 1986. p. 50). 136 Contra tal pensamento, veja-se: Munir Karam. Do contrato de seguro no código civil: noções fundamentais. RT 834/74. p. 77. 64 contrato de massa, evidenciando-se o que já não pode mais ser ignorado por ninguém, ou seja, um nível de interdependência entre os homens como jamais existiu antes. No universo delimitado por essas duas coordenadas, a velha responsabilidade civil teria que buscar outros fundamentos que não a culpa individual, deduzida de um comportamento sobre o qual teria o agente algum poder de opção. Adverte Calmon de Passos138 que é preciso deslocar do agente e de sua culpa o ponto principal. Assim o dano emerge como o centro de preocupações, pois é ele que deve ser reparado, independentemente da investigação de quem seja seu causador e de sua culpabilidade, dado que a própria atividade produtiva, necessária e lícita, se tornou produtora de danos no capitalismo avançado, utilizando a tecnologia disponível. Os danos que decorrem de atividades cuja licitude foi admitida em proveito do progresso, conseqüentemente em benefício da convivência social, em que pese seu componente de risco, devem ser por essa mesma sociedade suportados.139 Para se tornar efetivável a teoria do risco, sem disfuncionalidade, impôs-se a solução pela técnica do seguro. O que antes fora pensado como um contrato entre pessoas, no qual uma delas assumia os riscos de indenizar a outra 137 J. J. Calmon de Passos. A atividade securitária e sua fronteira com os interesses transindividuais. Responsabilidade da Susep e competência da Justiça Federal, RT 763/95, São Paulo: Ed. RT, 1999. p. 97-98. 138 J. J. Calmon de Passos. A atividade securitária e sua fronteira com os interesses transindividuais. Responsabilidade da Susep e competência da Justiça Federal, RT 763/95, São Paulo: Ed. RT, 1999. p. 97-98. 139 Para Calmon de Passos, revelou-se induvidoso que admitir a responsabilidade pelo risco de matiz social, mantendo-se a antiga técnica de ressarcimento às custas do patrimônio individual do responsável, significaria inviabilizar a atividade produtiva, incapaz de arcar com os riscos inerentes a essa mesma atividade, caso conservada a velha perspectiva (J. J. Calmon de Passos. A atividade securitária e sua fronteira com os interesses transindividuais. Responsabilidade da Susep e competência da Justiça Federal, RT 763/95, São Paulo: Ed. RT, 1999. p. 97-98). 65 por força de algum sinistro que viesse a atingir o seu patrimônio ou a sua pessoa, bem mais próximo do jogo e da aposta que de algo relacionado com algum interesse social relevante, tornou-se uma técnica a serviço do interesse geral, mais adequadamente definível como seguridade social ou segurança social, publicizando-se. Deixou de ser possível, por conseguinte, entender a atividade securitária como de natureza estritamente privada, passando a ser vista como vinculada ao interesse público, retirada do campo da pura autonomia da vontade, passando a ser regulada, de forma cogente e minuciosa, pelo Poder Público. Os negócios que formaliza entram na categoria também nova dos chamados contratos de massa. Segundo Calmon de Passos140, a Constituição Federal aponta, em vários de seus dispositivos, para essa compreensão. Coloca no âmbito do sistema financeiro nacional as empresas de seguro, dizendo a Lei Maior que este sistema é estruturado para servir aos interesses da coletividade141, reservando-se, com exclusividade, para a União, a competência legislativa sobre a matéria142. Essa perspectiva conduz ao entendimento necessário de que todo aporte financeiro atribuído pelo segurado à seguradora com que contrata, intitulado prêmio, é, em verdade, parcela que, integrada a outras, constitui um fundo comum de propriedade e destinação comunitária ou coletiva de todos os segurados. Dessa universalidade apenas são extraídos os valores indispensáveis para sua administração, que inclui a justa retribuição do empreendedor, tudo isso regulado por disposições legais de natureza cogente que objetivam, precisamente, acentuar e 140 J. J. Calmon de Passos. A atividade securitária e sua fronteira com os interesses transindividuais. Responsabilidade da Susep e competência da Justiça Federal, RT 763/95, São Paulo: Ed. RT, 1999. p. 97-98. 141 Constituição Federal - Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 40/2003). 142 Constituição Federal - Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: VII - política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores; 66 resguardar a propriedade coletiva desse patrimônio e sua destinação social e específica. Decorrência disso é a exigência legal de serem instituídas reservas técnicas, mediante as quais se dá ao sistema, como um todo, a estabilidade e segurança de que necessariamente se deve revestir. Vistos tais recursos com o caráter de patrimônio coletivo, público não estatal, configura-se o que poderemos chamar de uma universalidade de interesses que se transindividualizam por força de sua destinação, ainda quando diferentes dos que têm uma abrangência universal e derivam da própria natureza das coisas. Relativamente ao seguro de dano, Pedro Alvim143 adverte que a especulação é contrária à natureza do contrato de seguro, visto que este tipo de contrato não constitui fonte de renda, mas apenas garantia e segurança. Não constitui uma operação de jogo ou aposta, mas de previdência. Nessa linha de raciocínio, o risco é algo indesejável nos seguros de dano. Não deve ser querido pelo segurado, pois se a operação der margem a que possa tirar algum proveito da ocorrência, poderá haver mudança no seu comportamento. A instituição do seguro estará comprometida, pois o risco deixará de ser uma eventualidade temida para tornar-se um estímulo ao enriquecimento do segurado. Resume seu pensamento lembrando que ninguém pode receber mais do que perdeu, e, portanto, ninguém pode lucrar com a ocorrência do risco. Essa visão de risco também encontramos no direito comparado. Jean Marc Mousserron144 fala da possível divisão entre os riscos endógenos e os riscos exógenos. 143 Pedro Alvim. O contrato de seguro. Rio de Janeiro: Ed. Forense. 1986. p. 303. Jean Marc Mousserron. La gestion des risques par le contrat. in Revue Trimestrielle de Droit civil, nº 3, juillet-septembre 1988, ano 87, págs. 487 e seguintes. 144 67 Segundo esse autor a primeira família de riscos origina-se da inexecução das obrigações desta ou daquela parte. Enquanto a execução for útil para o outro e por ele desejada, estar-se-á em uma situação de inexecução temporária para a qual as partes poderiam tentar prevenir, se não a aparição, mas ao menos a prolongação da perturbação. A teoria clássica atribui na imensa maioria dos casos a inexecução de uma obrigação a uma falta do devedor; neste caso, ocorrerá o mesmo, a não ser que este demonstre, e somente na medida em que o demonstrar, que a inexecução da obrigação tem a sua origem num evento de força maior muito claramente determinado. Enquanto a outra modalidade de riscos, chamada por ele de riscos exógenos, situam-se fora do âmbito interno das partes envolvidas causando a inexecução das obrigações por motivos alheios à vontade das partes. Nesse sentido, Guido Alpa145 afirma que há: a) modos extrínsecos pelos quais o risco atua e é distribuído; trata-se da cláusula de exoneração de responsabilidade; b) modos intrínsecos que dependem das técnicas elaboradas doutrinariamente, por exemplo, a teoria da pressuposição e a da base do negócio, e também da interpretação do contrato; c) modos ocultos, praticados pela jurisprudência, que atua controlando a operação econômica, distribuindo os riscos mediante o recurso aos critérios tradicionais. Na lição de Pietro Trimarchi146, a responsabilidade objetiva pelo risco também busca a reparação do patrimônio do lesado, mas, por outro lado, representa uma pressão econômica sobre quem exerce uma atividade de risco, também para induzir e forçar que esta seja racionalizada. A diferença entre a tradicional dicotomia está nesta vertente, propiciando o estímulo à redução de “fatos danosos”, mas não a um simples e isolado “ato ilícito”, mas atribuindo-se 145 146 Guido Alpa. Enciclopédia Del diritto (verbete rischio). Milano, Giuffrè Editore, 1961. t. XX. p, p. 1147. Pietro Trimarchi. Causalità e danno. Milano: Giuffrè, 1967, p. 133-163. 68 responsabilidade do custo de um risco consentido e pertinente a uma dada atividade. Para esse autor italiano, se o risco se realiza em dano, a responsabilidade objetiva não pode utilmente operar-se se este dano é esporádico e ocasional. Não sendo manifestação de um risco constante, calculado e pertinente a uma atividade programada. Adverte, porém, que se a responsabilidade objetiva visa propiciar a reintegração do patrimônio do lesado, não deve gerar um enriquecimento deste, não sendo admissível que se supere o montante do dano emergente, não tendo direito de se ressarcir contra os riscos que, de qualquer forma, seria exposto. 147 Giovana Visintini148 observa que o mecanismo de seguro é, precisamente, o instrumento que se apresenta como complemento da responsabilidade objetiva pelo risco criado, porque transforma o risco em custo e permite ao empresário calculá-lo sob a forma de primas seguradoras no marco de seu pressuposto econômico e de suas possibilidades de produção. Desta forma, a prestação do devedor consiste em assumir um risco temido pelo credor de um dano irreparável ou de difícil reparação. Emilio Betti149 aponta, ainda, uma cooperação virtual do segurador em favor do credor segurado, consistente em assegurar-lhe uma tranqüilidade, uma liberação de preocupações, que sem essa cooperação não seria possível. Pondera, porém, que a segurança sobre um interesse vital do segurado não se exaure no pagamento de uma soma estipulada, como um crédito 147 Pietro Trimarchi. Causalità e danno. pág. 138. Giovanna Visintini. Tratado de la Responsabilidad Civil. Ciudad de Buenos Aires. Volume II, Editora Astrea. 1999. p. 361 a 381. 149 Emílio Betti. Teoria generale delle obbligazioni. p.5-14. 148 69 pecuniário abstrato, mas, também, na possibilidade de um pagamento ao beneficiário, em caso de morte do estipulante. Assim, principalmente ao final do século XIX, o fenômeno social do acidente passou a receber tratamento, teórico e prático, mais adequado: deixaria de ser obra do imponderável para ser uma variável da vida em sociedade, enquadrável em técnicas de prevenção, objeto de políticas compensatórias das danosas conseqüências. Esse processo é explicado por François Ewald150, que lembra o fato de que sempre existiram acidentes. Esclarece que somente ao final do século XIX é que o termo acidente perde seu sentido abstrato de 'aquilo que acontece por acaso' para associar-se à idéia de um dano a compensar, isto é, para não mais somente designar um tipo de acontecimento, mas uma forma de relação com outrem. Neste sentido, entende que as revoluções industriais e as transformações subjacentes posicionaram o acidente como uma das mais marcantes características da contemporaneidade. Para François Ewald151 a notável regularidade do acidente dota-o de uma cor nitidamente social ou coletiva. Assim sendo, o acidente moderno não tem seu assento precisamente nem nos perigos da natureza, nem no comportamento dos indivíduos; ele tem a objetividade do social. Nesse sentido o acidente, fenômeno social por excelência, não poderia ser imaginado como a exceção, como acontecimento periférico ou anexo em nossas 150 François Ewald. Introdução. L’État providence. Paris: Grasset, 1986. p. 50. Ensina esse autor que foi somente no século XIX, aparentemente, com a questão dos acidentes de trabalho, que o acidente isolou-se como problema social específico, implicando ao mesmo tempo uma elaboração conceitual e medidas práticas próprias. 151 François Ewald. Introdução. L’État providence. Paris: Grasset, 1986. p. 50. 70 sociedades. Constituiria, na verdade, em regra, na medida mesmo onde a formação da noção moderna de sociedade está ligada à objetivação de certos acontecimentos como acidentes. É pelo mesmo gesto epistemológico que se constituíram, em correlação, as noções de acidente, como sendo o mal a distribuir, e de sociedade, não mais como elemento natural de vida de um animal social, nem como órgão de defesa, de proteção ou de garantia, mas como titular de uma riqueza coletiva produzida com a ajuda de uma multiplicidade, mais ou menos ordenada, de atividades individuais. Dentro de tal processo evolutivo, no qual a categoria "acidente" é elevada ao estatuto de paradigma, outras noções, amplamente complementares, ganham notável importância: risco, dano, indenização etc. Quanto ao risco, o célebre pensador francês ensina que originalmente categoria de seguro, ele iria tornar-se uma categoria social geral, pois não serve somente para pensar o que seriam, em si, os acidentes, mas, é principalmente porque certos acontecimentos são imaginados como riscos que eles se tornam acidentes. 152 Desta forma, o risco torna-se cada vez mais sofisticado, apresentando a tendência natural de proliferar em todo lugar, pois ele se coloca em todas as coisas, mesmo naquela que, na aparência, parece a mais inocente.153 152 No dizer de François Ewald, o processo de acidentalização dos acontecimentos individuais e sociais está diretamente ligado à difusão da noção e das práticas do risco. Por esta característica, nada sendo em si um risco, tudo pode vir a ser um. A vida, a morte, a doença, a saúde são riscos; mas também a conquista e a derrota escolares, toda forma de deficiência, o perigo, a criminalidade etc. Lembra que o risco estende-se hoje desde o infinitamente pequeno da existência cotidiana até o infinitamente grande do risco tecnológico maior (Amoco Cadiz, Seveso, Three Miles Island...), com, pano de fundo, a catástrofe nuclear (Introdução. L’État providence. p.53). 153 Assim, o risco está em nós mesmos: nós somos todos, quaisquer que sejam a nossa boa saúde ou a absoluta moralidade do nosso comportamento, riscos uns para os outros. O risco é a forma moderna de relação com o outro: ao mesmo tempo princípio social de identificação e forma geral de avaliação da moralidade dos comportamentos. Assim é que se passa a compreender como "risco" passível de proteção pelo seguro não apenas a morte, como o bem aventurado nascimento de um filho, não apenas a doença, mas a saúde que persiste invicta durante a velhice, não apenas o atropelamento, como a sub-reptícia perda de audição ao longo de anos de trabalho. 71 Na esteira do pensamento do direito pátrio e comparado não é metodologicamente correto pensar que o acidente seja somente aquilo que repentinamente rompe uma coisa ou faz derramar o sangue da vítima, do mesmo modo que também não é aceitável que se entenda que o imprevisível, o súbito (como o rompimento e a ferida podem parecer em alguns casos), sejam tomados na acepção envelhecida que se adotava antigamente. Mas, tendo em vista as importantes colocações retro, parece-nos importante esclarecer o que a doutrina quer dizer com a expressão interesse segurado. 4.4.1. INTERESSE SEGURADO É hoje indiscutível que o seguro recai, protege, ou visa garantir o interesse enquanto relação econômica, atribuindo-lhe a qualidade de elemento essencial do seguro. Para contratar o seguro não é suficiente a capacidade do direito comum. Precisa ainda a pessoa, seja ela natural ou jurídica, manifestar interesse na operação, segundo o entendimento doutrinário e as disposições legais a respeito. 154 O sofrimento íntimo passa a ser enquadrado como dano (moral), entre inúmeras outras formas de "sinistro" que convivem e se multiplicam permanentemente alimentando o crescimento da chamada indústria do seguro, seja público ou privado. Percebe-se como a noção de acidente e risco é muito mais rica do que podemos pensar. Se levarmos em conta que a atividade securitária foi responsável pelo desenvolvimento vigoroso desta noção contemporânea de acidente e risco, não deixa de ser um tanto estranho que empresas gigantes deste mercado atuem com concepções ainda tão antiquadas e inaplicáveis. (François Ewald. Introdução. L’État providence. cit. p.53-55). 154 Ernesto Tzirulnik adverte que à luz do direito brasileiro não se pode compreender a palavra “dano” unicamente como “dano físico”, mas sim como a lesão a um interesse do segurado (Seguro contra todos os riscos de engenharia. Regulação de sinistro – conceito de dano material. RT 827/105. 2004. p. 135). Caio Mário da Silva Pereira lembra que “a noção de dano supõe, como esclarecem Marty e Raynald, que a vítima seja atingida em ‘uma situação de que ela se beneficiava, lesada em uma vantagem que possuía’” (Responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense. 1989. p. 42.). Para José de Aguiar Dias tudo quanto represente o anseio de satisfazer uma 72 Quando o bem a segurar é de propriedade do contratante, seu interesse na garantia contra o risco se presume como normal. A questão aflora, quando o bem é de terceiro. As pessoas, de um modo geral, cuidam da preservação daquilo que lhes pertence, por isso devem justificar as razões de seu interesse pelo seguro de uma coisa cuja perda procuram garantir, embora ela não afete seu patrimônio. Levando a análise ao extremo, podemos considerar que o relevante não são os bens, mas sim os direitos, não é a coisa, mas sim o direito que recai sobre a coisa, na medida em que os bens são objeto de um direito subjetivo. Desta forma, o que se segura não é um bem material, mas sim a relação entre o sujeito e um objeto, ou seja, o interesse, relação que se valora em termos econômicos e, como qualquer relação patrimonial, plenamente transferível. 155 Assim sendo, não deveríamos falar de objeto segurado, mas de interesse segurado. Se faltar esse interesse o contrato é nulo. A posição adotada tem a justificativa de que se trata de uma relação de valor em sentido amplo e, perante o direito securitário, apresenta-se como uma necessidade, extinguir uma situação dolorosa, ou surgir uma sensação agradável tendendo à felicidade e ao bemestar do homem, constitui relação entre o sujeito e o objeto que atende a essas noções (Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense. 1997. p. 714-715). Adriano de Cupis demonstra que “dano” e “prejuízo” são sinônimos e que “objeto do dano” é sempre um “interesse humano” (El daño: teoria general de la responsabilidad civil. Barcelona: Bosch, 1975. p. 81). Alexandre del Fiori define o dano como o termo utilizado para definir o resultado da efetivação do evento previsto no contrato de seguro, podendo ser material ou pessoal (Dicionário de seguros. São Paulo: Editora de Manuais Técnicos de Seguros, 1996). Para Amilcar Santos o mesmo verbete tem o seguinte significado: prejuízo sofrido pelo segurado e indenizável de acordo com as condições da apólice (Dicionário de Seguros, Publicação n. 23, IRB, 2.ª ed.). Código Civil de 2002: Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados. Parágrafo único. Somente pode ser parte, no contrato de seguro, como segurador, entidade para tal fim legalmente autorizada. (grifo nosso). 155 Ver a respeito: Antônio Márcio da Cunha Guimarães. Contrato de seguro contra seqüestro. RT 806/731. 2002. p. 731; Carlos Alberto Ghersi Contratos civiles y comerciales – partes general y especial. p. 395. e Vera Helena de Mello Franco Lições de direito securitário. p. 39. 73 situação de vantagem ou desvantagem para o segurado, quer com relação a uma pessoa, quer com relação a uma coisa (material ou imaterial). Note-se bem. Não é a coisa em si, mas a relação entre o sujeito e o bem. Esta é a posição defendida entre nós por Fábio Konder Comparato156, ainda sob a égide do Código Civil de 1916, para quem o interesse constitui o objeto do negócio jurídico securitário. Conforme esse ponto de vista, o objeto do contrato, o que o segurado garante, não é a coisa; mas o interesse que possui em relação a essa coisa. O interesse segurado, além de ser lícito, pode apresentar um conteúdo econômico objetivamente determinado, como nos seguros de dano, ou livremente estimável pelo segurado nos seguros de pessoas157. Na visão de Fabio Konder Comparato158, a distinção entre o interesse segurável e a coisa ou objeto a que este interesse se refere explica o fato de que possa existir, às vezes, uma multiplicidade de seguros do mesmo tipo referentes à mesma coisa, com titulares diferentes. É o caso, por exemplo, do seguro de incêndio contratado pelo proprietário (ou credor hipotecário), pelo usufrutuário e pelo locatário com referência ao mesmo imóvel, cada qual protegendo um interesse econômico diverso. Essa visão do interesse segurado também encontramos no direito comparado. 156 Fabio Konder Comparato. O seguro de crédito. Estudo jurídico. Rio de Janeiro: Forense. 1999. p. 24-26. Sobre o tema leia-se o estudo de Ascarelli: O conceito unitário do contrato de seguro, publicado em português em Problemas das sociedades anônimas e direito comparado, São Paulo, 1945, e em italiano em Studi in tema di contratti, Milão, 1952. 158 Fabio Konder Comparato. O seguro de crédito. Estudo jurídico. p. 24-25. 157 74 Antigono Donati159 destaca a importância do conceito de interesse para a compreensão jurídica do contrato de seguro e muitas de suas manifestações particulares, e acentua que o interesse poderá ter por objeto qualquer bem, quer material ou imaterial. Para esse autor pode ser objeto do interesse (coisa segurada) qualquer coisa apta a satisfazer uma necessidade, quer dizer, que tenha uma utilidade e, portanto, suscetível de valor ou, mais brevemente, qualquer bem. Pontes de Miranda160 esclarece que o interesse pode recair tanto nas relações com coisas materiais quanto nas relações com atividades, como é o caso de uma obra de engenharia, que envolve ambos objetos de interesse. Assim, o interesse garantido por meio do contrato de seguro compreende a expressão econômica de todos os bens, trabalhos e atividades inerentes à execução da obra de engenharia. Logo, qualquer perda suportada pelos segurados caracterizase como dano à sua relação econômica com a obra. Para Calmon de Passos161 interesse é conceito vinculado a determinada necessidade e ao bem que a satisfaz. Na verdade, é ele o vínculo entre o bem e a necessidade a que atende, na perspectiva do sujeito que a experimenta. Assim, nenhuma necessidade pode ser satisfeita sem que o bem a ela associado se tome disponível para o sujeito da necessidade. Ensina que se este bem, para cumprir sua destinação, reclama ser apropriado ou consumido pelo sujeito da necessidade, temos um interesse individual, capaz, inclusive, de revestir-se do caráter de interesse geral ou social, dada a massa dos que experimentam igual necessidade, nunca suscetíveis, entretanto, de se mostrarem 159 Antígono Donati. Los seguros privados: manual de derecho. Barcelona: Bosch, 1960. p. 229-231. Pontes de Miranda. Tratado de direito privado: parte especial. 3. ed. São Paulo: Ed. RT, 1984, vol. 45, p. 318 e 357. 161 J. J. Calmon de Passos. A atividade securitária e sua fronteira com os interesses transindividuais. Responsabilidade da Susep e competência da Justiça Federal, RT 763/95, São Paulo: Ed. RT, 1999. p. 98. 160 75 transindividuais, por força da satisfação individual que reclamam, via apropriação ou consumação destrutiva. Explica que há situações, entretanto, em que a necessidade que o bem salisfaz reclama esteja ele acessível ao sujeilo que a experimenta, mas sua satisfação se dá sem apropriação, permanecendo o bem sempre e necessariamente disponível para a satisfação de iguais necessidades de quantos venham a experimentá-las no futuro ou concomitantemente. Desta forma, o bem é em si mesmo indivisível e inapropriável. A sua utilização só é admissível se não afeta sua disponibilidade para atender às necessidades de outros sujeitos. Essa indivisibilidade e inapropriabilidade, Calmon de Passos162 chama de universal ou natural, porque permanentemente disponível o bem e ao alcance de quantos dele venham a necessitar, os nascidos e os por nascer, os que estão e os que vierem a estar em relação com ele, hoje e amanhã. Assim, o bem é permanentemente recomposto para ensejar satisfação ao universo dos interessados, sendo inadmissível se dê sem a recomposição do equilíbrio reclamado. O bem é de todos, não como na co-propriedade, em que se idealiza uma quota-parte destacável e disponível, admitida inclusive a divisão do que é comum, mas de um modo integrado e definitivo, sem possibilidade de divisão, predefinição de quota ou constituição de direito autônomo. 162 Isto é assim porque a fruição do bem só é possível se inviável excluir-se dela quem quer que seja, e isso é assim em virtude da própria natureza das coisas, o que toma o interesse insuscetível de delimitação em termos subjetivos e de divisibilidade em termos objetivos, sendo inapropriável por natureza. Cita que o exemplo mais típico é o do meio ambiente e sua pureza, que ou existe para todos ou não existe, sendo inatribuível a uns em detrimento de outros. Aponta, porém, a existência de um diverso tipo de interesse que tem de comum com o primeiro sua inapropriabilidade e indivisibilidade, derivada, entretanto, não da natureza das coisas, mas de decisão político-jurídica, pelo que se direciona para um universo delimitável de beneficiários, à disposição dos quais deve estar permanentemente. E nisso do outro se distingue. Mas, ainda quando comporte apropriação, esta se dá em termos peculiares, visto como é a apropriação incompatível com consumação destrutiva(J. J. Calmon de Passos. A atividade securitária e sua fronteira com os interesses transindividuais. Responsabilidade da Susep e competência da Justiça Federal, RT 763/95, São Paulo: Ed. RT, 1999. p. 98-99). 76 Nesse sentido torna-se válido falar em direito transindividual ou difuso de natureza jurídica. E dessa natureza são as reservas técnicas impostas por lei às empresas seguradoras. Daí por que a lei163, por coerência necessária, dispôs sobre sua inalienabilidade e sobre a impossibilidade de sua oneração. Ensina Maria Helena Diniz164, relativamente ao seguro de dano, que, durante a vigência contratual, nada obsta se faça novo seguro sobre o mesmo interesse e contra o mesmo risco junto a outro segurador, desde que o segurado comunique isso por escrito ao primeiro segurador, declarando a soma pela qual pretende segurar-se, para que se possa comprovar a obediência ao disposto no art. 778 do Código Civil. 165 Evita-se com isso o seguro excessivo e a má fé. Não se poderá, por exemplo, segurar uma casa que vale R$ 500.000,00, contra incêndio, por esse quantum com a seguradora A, e contratar novo seguro, contra o mesmo risco, e por igual valor, com a seguradora B, pois o primeiro seguro já cobre o valor integral do imóvel. Permitida está a cumulação de seguros, a duplicidade de seguros ou realização de dois seguros em seguradoras diversas de uma mesma coisa, desde que o valor dos dois seguros não seja superior ao do bem segurado. Essa cumulação de seguros visa integralizar o valor do seguro relativamente ao da coisa segurada ou interesse segurado. 163 Decreto n. 60.459/67 - Art 34. Compete à SUSEP, na qualidade de executora da política traçada pelo Conselho Nacional de Seguros Privados - CNSP, como órgão fiscalizador da constituição, organização, funcionamento e operações das Sociedades Seguradoras: (...) XIV - promover junto ao órgãos do Poder Público, Instruções Financeiras em geral e sociedades mercantis, providências necessárias à salvaguarda da inalienabilidade dos bens garantidores do capital, reservas técnicas e fundos das Sociedades Seguradoras. 164 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro, v.3. p. 533. 165 Código Civil - Art. 778. Nos seguros de dano, a garantia prometida não pode ultrapassar o valor do interesse segurado no momento da conclusão do contrato, sob pena do disposto no art. 766, e sem prejuízo da ação penal que no caso couber. 77 De outro lado é admissível alienar ou ceder o interesse segurado, a não ser que haja disposição em contrário, e a seguradora, não podendo se opor à transferência do contrato de seguro, deverá pagar a terceiro a indenização. 166 O interesse pode compreender a vida do próprio segurado ou a de outrem, todavia, nesta última hipótese, dever-se-á justificar o seu interesse jurídico, moral ou econômico (por exemplo, gratidão, afetividade, conveniência profissional, amizade etc.), pela preservação da vida que segura, sob pena de falsidade do motivo alegado. 167 A justificação será dispensada se o terceiro, cuja vida se pretende segurar, for descendente, ascendente ou cônjuge do proponente por haver presunção juris tantum daquele seu interesse para preservar a vida dessas pessoas, por estar com elas intimamente relacionado168. De qualquer forma é indispensável que o interesse pré-exista ao contrato, concluído justamente para protegê-lo, e não seja ao contrário criado pelo próprio contrato, como no jogo e na aposta, como passamos a demonstrar. 4.4.2. O RISCO NO CONTRATO DE SEGURO E NO JOGO OU APOSTA No dizer de Pedro Alvim169, o jogo é o contrato pelo qual uma pessoa (banqueiro) promete a outra (jogador) uma prestação subordinada à realização de um risco determinado (loteria, roleta etc.), mediante o pagamento de um prêmio. Há, sem dúvida, uma diferença entre os dois contratos que se percebe intuitivamente. Onde está, então, o elemento jurídico específico que os separa? 166 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro, v.3. p. 533. Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro, v. 3. p. 537. 168 Código Civil - Art. 790. No seguro sobre a vida de outros, o proponente é obrigado a declarar, sob pena de falsidade, o seu interesse pela preservação da vida do segurado. Parágrafo único. Até prova em contrário, presume-se o interesse, quando o segurado é cônjuge, ascendente ou descendente do proponente. 167 78 A resposta à indagação exige a análise dos elementos comuns aos dois contratos, para que se revele o ponto onde poderá encontrar-se a diferença entre eles. Com efeito, as partes contratantes podem ser as mesmas, num e noutro. Mudam apenas de nome. Chamam-se "segurador" e "segurado", no contrato de seguro; "banqueiro" e "apostador", no de jogo. Essencialmente a prestação é a mesma nos dois contratos. Denominase "prêmio", no de seguro, e "aposta", no de jogo. Em substância a prestação representa um valor econômico, geralmente em dinheiro, constituindo uma obrigação certa, nos dois contratos, para uma das partes, enquanto a da outra é incerta ou dependente de um acontecimento qualquer. Desta forma, a diferença específica entre eles só pode ser identificada no risco. A noção de risco é a mesma para ambos. Um acontecimento futuro, incerto e independente da vontade dos contratantes. Quanto à origem do risco, observa-se que no seguro ele provém sempre de um fato natural, como o incêndio, a inundação ou a morte de uma pessoa. Entretanto, a incerteza do fato natural serve também de fundamento para o jogo, mas ele admite o risco artificial, como, por exemplo, o da loteria, da roleta etc. Um dos critérios distintivos entre o jogo e o seguro reside no fato de que, no jogo, o risco é sempre criado artificialmente, ou seja, se cria uma 169 Pedro Alvim. O contrato de seguro. São Paulo: Forense. 1986. p. 106 a 110. 79 forma artificial de relação entre o evento e o jogador, de maneira que se este não houvesse jogado não teria interesse na produção do evento previsto. 170 Assinala-se outra diferença, não quanto à natureza do risco, mas quanto à sua motivação. No seguro ele é a causa do contrato. Pré-existe à sua formação. Constitui seu pressuposto. O segurado procura resolver uma situação que afeta seu patrimônio ou sua própria vida. Situação não querida cujos efeitos econômicos negocia com o segurador. No jogo o risco deixa de ser a causa do contrato para ser o seu efeito. Surge para os contratantes em função do próprio contrato. Não se configura um perigo para eles e, sim, um acontecimento desejado na expectativa do lucro. O seguro se aproxima de uma previdência, o jogo, uma especulação. Naquele o risco pode influir no patrimônio do segurado; neste é economicamente indiferente. O seguro repara o dano, o jogo visa apenas o lucro. O seguro exerce uma função social relevante. Ameniza os efeitos econômicos do risco que são repartidos com a comunidade. O jogo manipula o risco para fins egoísticos sem proveito para o meio social. Finalmente, as estruturas empresariais de exploração do seguro e do jogo se aproximam. Ambas têm por objetivo um negócio que se realiza em massa para garantia de sua estabilidade. Dependem da lei e das probabilidades reveladas pelos processos estatísticos. 170 Morandi (Estudios de derecho de seguros. Buenos Aires, 1971, p. 62) pondera: "Nos es que el evento que constituye la condición sea natural en vez de artificial lo que distingue el juego del seguro, porque el evento puede ser natural hasta en el juego. Lo que sirve como critério de distinción es que el riesgo en el juego es siempre "creado artificialmente", es decir, se crea en forma artificial da relación entre el evento y el jugador, de manera tal que si este no hubiese jugado no tendria interés en que se produjese o no el evento previsto". 80 Segundo Pedro Alvim171, não obstante essa diversidade de aspectos revestidos pelo risco enquanto fundamento do seguro e do jogo, a verdade é que nenhum deles é capaz de constituir o elemento específico de um dos contratos para sua definição jurídica. O autor exemplifica, para esclarecer seu pensamento, que o mesmo acontecimento pode ser objeto dos dois contratos, dependendo das circunstâncias. O risco de vida de uma pessoa, por exemplo. O contrato será de jogo, se for celebrado por um terceiro. Se fizermos o seguro do Papa, estaremos especulando sobre sua vida com o objetivo de lucro. Sua denominação de contrato de seguro não modifica sua natureza de contrato de jogo. Mas, se o Papa autorizá-lo, deixará de ser de jogo para ser seguro. Onde está, então, a diferença entre os dois contratos? A simples autorização de terceiro modifica sua natureza jurídica. A lei francesa prevê a hipótese, admitindo o seguro de vida de terceiro, mediante autorização sua. A morte do terceiro que autorizou seu seguro, enseja um resultado lucrativo e não danoso para o beneficiário. Sem autorização, o resultado seria o mesmo, mas o contrato mudaria de natureza jurídica. A teoria do interesse legítimo ou interesse segurável parece elucidar o problema. Dir-se-á que a autorização envolve uma vinculação econômica ou afetiva, pois, ninguém daria tal autorização sem um interesse qualquer. É de caráter econômico tanto o objeto do seguro, como o do jogo, embora um persiga o lucro e o outro a reparação de um prejuízo. Mas, visto por esse ângulo, qual teria sido o motivo que inspirou a criação do contrato de seguro? A indagação reporta às suas origens, onde se verifica que o seguro, reduzido à expressão mais simples, nada mais é que a transferência dos efeitos 171 Pedro Alvim. O contrato de seguro. p. 106 a 110. 81 do risco na vida do segurado para o segurador. Os dois negociam as conseqüências econômicas do risco, mediante a promessa do segurador de reparálas. O segurado compra sua garantia, pagando uma estipulação prefixada. Foi esse aspecto econômico do contrato que induziu os antigos juristas a identificá-lo como o de compra e venda. O risco era o valor negociável. Uma pessoa assumia por outra as conseqüências econômicas da ocorrência temida. E com relação ao jogo ou aposta a situação é a mesma? Não. O jogador não transfere o risco, porque não existe para ele. E se não existe, não pode negociá-lo com terceiro. O risco é criado pelos parceiros, por efeito do contrato. Surge simultaneamente para ambas as partes. Tanto, uma, como a outra, estão sujeitas às mesmas conseqüências, perder ou ganhar. Esta análise de Pedro Alvim172, mostra com nitidez a diferença especifica entre os dois contratos. No de seguro, o segurado negocia seu próprio risco, transferindo seus efeitos para o segurador, no de jogo ou aposta, esta operação não existe. Portanto, todas as vezes que alguém celebra um contrato, deixando a cargo de outro as conseqüências de um risco próprio, estará configurado o contrato de seguro. Risco próprio é o que pode acontecer ao segurado e não a terceiro. Quem segura um risco, de outrem, estará especulando com a sorte, realizando apenas um jogo. Ninguém pode interferir em negócio alheio, salvo quando autorizado por lei ou por mandato. As conseqüências econômicas do risco constituem um valor para o segurado e somente ele poderá dispor a respeito. Ao terceiro não é lícito tirar proveito de uma situação gerada por um fato que interessa a outrem e não a ele. 172 Pedro Alvim. O contrato de seguro. p. 106 a 110. 82 O segurado deve comprovar seu interesse no risco e o terceiro se legitimará, se houver alguma vinculação com o segurado. A tônica da teoria do interesse recai, porém, na pessoa do estipulante, seja ele o segurado ou o terceiro. Desde que se manifeste o interesse segurável, qualquer um dos dois poderá contratar o seguro. Mas a teoria da transferência só reconhece capacidade para realizar-se o seguro na pessoa do segurado e não do terceiro. É de sua exclusiva competência resolver se suportará sozinho os efeitos do risco a que está sujeito, ou transferi-lo para o segurador. Qualquer outra pessoa só poderá fazê-lo, como seu representante. O interesse, na visão de Pedro Alvim173, constitui para o segurado apenas o motivo de foro íntimo que o leva à manifestação de vontade para contratar. Resulta para o terceiro de sua vinculação com o segurado, seja ela de natureza econômica, como a de credor; seja de natureza afetiva, como a de familiar; seja, finalmente, de natureza jurídica, como a de mandatário, comissário, gestor de negócios etc., situações estas em que por lei a vontade do terceiro substitui a do segurado. Esta a opinião do escritor português, J. C. Moitinho de Almeida174, que identifica na transferência do risco o elemento unificador do contrato de seguro. Segundo esse autor o segurador assume, mediante um correspectivo (prêmio), a obrigação de prover os meios pecuniários considerados necessários para a satisfação de uma necessidade prevista relativamente a um certo evento. O segurado descarrega sobre o segurador a incerteza do antes ou do quando da verificação do evento, recebendo em troca do prêmio a segurança ou cobertura do risco. Este é assim considerado, não como a possibilidade de um evento danoso, mas como a possibilidade de um evento futuro e incerto tanto 173 Pedro Alvim. O contrato de seguro. p. 112. 83 capaz de afetar coisas, em cuja conservação o segurado se interessa, como de obstacular a formação de determinados capitais, tratando-se de acontecimento relativo à vida humana. Assim, a teoria da transferência do risco consiste numa formulação mais precisa da teoria da necessidade eventual e que, como está, é capaz de identificar, não a causa dos subtipos do contrato de seguro (seguros de danos, seguros de pessoas), mas o tipo contratual. Como a teoria da necessidade eventual, a da transferência do risco permite distinguir o seguro de outros contratos aleatórios, como o jogo e a aposta. No contrato de seguro o risco preexiste à sua conclusão, enquanto no jogo e na aposta é artificialmente criado pelas partes. Desta forma, pode-se afirmar que a prestação do segurador é a razão de ser do contrato. Correspondendo aos efeitos econômicos do risco. Embora as conseqüências econômicas do risco sejam suportadas pelo segurado, pode ele transferir, através do contrato, suas conseqüências financeiras para o segurador, consituindo a indenização nos seguros de dano e a soma prevista no contrato dos seguros de pessoa. Consiste, geralmente, num pagamento em dinheiro, mas pode ser também sob a forma de reposição, como acontece nos seguros de automóveis. O segurador manda reparar o veículo em oficina de sua confiança e o entrega ao segurado nas condições em que se achava antes do sinistro. Essa prestação não tem a mesma natureza jurídica do prêmio. Enquanto o prêmio é uma obrigação certa, a indenização é condicional. Depende da ocorrência do risco. 174 J. C. Moitinho de Almeida. O contrato de seguro no direito português e comparado. Lisboa, 1971. p. 18. 84 Necessário lembrar que o segurador só se responsabiliza pelo risco determinado nas condições do contrato. A incidência do risco sobre a pessoa ou os bens do segurado é o pressuposto necessário do contrato de seguro. Caso contrário, não poderia negociar a transferência de suas conseqüências para o segurador. O risco é inerente ao segurado; é algo que afeta sua pessoa ou seus bens. A doutrina até aqui mencionada assinala sua anterioridade, sua existência real e sua função, como causa do contrato. O risco do contrato de seguro é exclusivamente do segurado; no contrato de jogo é das partes contratantes, como se viu antes, razão por que não se pode falar de transferência do mesmo de uma para outra parte. 4.5. INDENIZAÇÃO Segundo Pedro Alvim175, a palavra indenização conserva, na técnica de seguro, onde é largamente usada, sua acepção comum: reparação, compensação, satisfação de dano. O segurador se obriga a indenizar, isto é, a reparar os danos sofridos pelo segurado em razão dos riscos contemplados no contrato. Garante a compensação pelos danos ocorridos. Indenizar é tornar indene, sem dano ou sem prejuízo. A reposição do bem ou o pagamento em moeda do montante correspondente ao seu valor real são medidas absolutamente equivalentes, que propiciam ao segurado transferir o prejuízo para o fundo conformado pelos 175 Pedro Alvim. O contrato de seguro. p. 437. 85 aportes de prêmios feitos pela coletividade segurada de que participa, através do denominado princípio da mutualidade. Para Ernesto Tzirulnik176 é preciso distinguir a garantia da indenização. Com efeito, para esse autor a garantia consiste na prestação de solvabilidade perante um conjunto de unidades econômicas (a massa de segurados) sujeitas a determinado risco homogêneo, a qual permitirá a supressão, até um determinado limite, dos efeitos negativos (prejuízos) sofridos por determinadas unidades. A indenização será a prestação ressarcitória feita pelo segurador à unidade econômica (segurado) que concretamente sofreu prejuízo ante a realização do risco garantido. A medida da garantia constará da apólice sob o título de importância garantida ou importância segurada. Servirá como base para a incidência da taxa para cálculo do prêmio obtida com base na complexa verificação atuarial do risco. A medida da indenização, logicamente limitada pela medida da garantia, obtém-se com maior facilidade. É, nos seguros de danos, a própria medida do dano ou prejuízo. O limite da indenização ao dano efetivo materializa o que se denomina princípio indenizatório. O princípio é revelado pelos modos alternativos de prestação da indenização. Paga-se em dinheiro ou mediante a reposição do bem. 176 Ernesto Tzirulnik. Princípio indenitário no contrato de seguro. RT 759/89. 1999. p. 97. 86 Com efeito, tendo em vista o princípio indenitário o contrato de seguro não se presta a produzir o enriquecimento do segurado, mas sim e exclusivamente a repor perdas efetivamente suportadas. Amilcar Santos177, ao definir o vocábulo indenização, salienta que a indenização pode ser paga em dinheiro ou em espécie, isto é, repondo o segurador a coisa danificada nas mesmas condições em que se encontrava antes de haver ocorrido o sinistro. Arnoldo Wald178 assevera que o segurador deve pagar a indenização devida em dinheiro, salvo estipulação que permita a restituição da coisa in natura. Clóvis Beviláqua179, já nos dava o mesmo ensinamento categórico de que embora a regra seja o pagamento em dinheiro, a apólice poderá estipular que, no caso de sobrevir o dano ou a perda total, o ressarcimento se opere pela reparação ou reconstrução da coisa segura. Podemos então concluir que visa o contrato de seguro de dano à garantia do segurado pertinente a determinado risco, possibilitando-lhe, na hipótese de sua verificação (sinistro), a reparação da efetiva diminuição patrimonial suportada. Decorre pois, daí, a previsão de pagamento da indenização em dinheiro, diante do caráter liberatório da moeda que propicia a reposição do bem perdido por outro de iguais conformações, reparando-se a perda e tornando indene o segurado. 177 Amílcar Santos. Dicionário de seguros. Rio de Janeiro: Instituto de Resseguros do Brasil, 1944. p. 99. Arnold Wald. Curso de direito civil brasileiro: obrigações e contratos. 11. ed. São Paulo: Ed. RT, 1994. p. 430. 179 Clovis Bevilaqua. Código civil dos estados unidos do Brasil. Ed. Histórica. Rio de Janeiro: Ed. Rio, 1979, v. II, p. 586. No mesmo sentido, Carvalho Santos, Código civil brasileiro interpretado. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1981. v. XIX, p. 356. 178 87 Portanto, é a reposição que se tem em mira, e não o ato da entrega de papel moeda em si mesmo, razão pela qual no mundo inteiro é admitida e praticada, ao longo dos séculos, a denominada cláusula de reposição. Adverte Ernesto Tzirulnik180 que a eventual lucratividade decorrente do recebimento de indenização securitária seria sem dúvida um estímulo para a fraude, à medida que se mostraria economicamente mais interessante para o segurado vitimar-se do sinistro que permanecer com o bem em condições normais. A ocorrência do infortúnio passaria a ser um fato desejado, incitando, se não sua provocação pelo próprio segurado, ao menos o aumento voluntário do risco. Imagine-se que um indivíduo segurasse seu veículo zero quilômetro contra perda total, furto e roubo, atribuindo-lhe o valor de R$ 30.000,00. Passado um ano de uso (tendo o automóvel desvalorizado significativamente, alcançando perante o mercado de usados valor máximo de R$ 20.000,00), o segurado - não fosse a regra de indenização pelo valor médio de mercado poderia predispor-se a não cuidar como se lhe requer do veículo, ou, ainda, agir com dolo direto para a tentativa de enriquecimento. Em outros termos, estar-se-ia oferecendo ao segurado um benefício, um plus, uma vantagem decorrente do infortúnio, fazendo com que o mesmo, no mínimo, deixasse de adotar as medidas de cautela necessárias, elevando sobremaneira o risco segurado, ou até mesmo que este provocasse o sinistro, rompendo de modo inevitável com as bases atuariais, e, conseqüentemente, impondo ao fundo comum um gravame inaceitável. Esse, também, o ponto de vista de Maria Helena Diniz181, para quem no seguro de dano sofrido pelo bem, a garantia prometida não pode ultrapassar o 180 181 Ernesto Tzirulnik. Princípio indenitário no contrato de seguro. RT 759/89. 1999. p. 108. Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. v.3, 21ª Ed. p. 531 a 533. 88 valor do interesse segurado no instante da conclusão do contrato, sob pena de perda do direito à garantia, além de ficar o segurado obrigado ao prêmio vencido. Se a inexatidão na declaração daquele quantum não resultou de má fé do segurado, o segurador poderá rescindir o contrato ou cobrar, mesmo depois do sinistro, a diferença do prêmio (CC, arts. 778 c/c 766 e parágrafo único). A indenização não poderá ser superior ao valor do interesse segurado no momento do sinistro, e, em caso algum, ao limite máximo da garantia estipulado na apólice, exceto se o segurador estiver em mora (ex persona) (CC, art. 781). Se o objeto for segurado por 10 mil reais pelo prazo de um ano, e veio a se perder depois de oito meses, o quantum indenizatório deverá ser correspondente ao valor mercadológico que ele teria no momento do sinistro. Se sofrer deterioração, pagar-se-á a importância resultante da soma dos danos sofridos, tendo por base o valor da garantia estabelecido na apólice. Apenas será permitida a indenização excedente ao valor da coisa no instante do sinistro ou ao limite máximo fixado na apólice, se o segurador estiver em atraso no pagamento da verba indenizatória. Nesse sentido o magistério de Fábio Konder Comparato182. No seguro de crédito, ao contrário, como em todo seguro de dano, a relação de garantia é sempre subordinada ao princípio indenitário, segundo o qual o segurado não pode, em hipótese alguma, se enriquecer com o contrato, pois que este é exclusivamente reparatório. Aqui, para exigir o cumprimento da prestação devida pelo segurador, não basta ao segurado demonstrar que houve sinistro; ainda é preciso que prove o prejuízo efetivamente sofrido. 182 Fábio Konder Comparato. Direito empresarial: estudos e pareceres. 1990. p. 445. 89 Não é outra a opinião de Antônio Carlos Otoni Soares183: "Sempre se entendeu que o seguro, não podendo ser motivo de lucro para o segurado, deve indenizar, exclusivamente, 'o prejuízo resultante do risco assumido' ou, em outras palavras, o prejuízo resultante do sinistro, sempre, é claro, levando-se em consideração o valor do seguro". Adverte, porém, Maria Helena Diniz que se se fizer, salvo disposição em contrário, seguro de um interesse por menos do que valha, ter-se-á redução proporcional da indenização, no caso de sinistro parcial (Código Civil de 2002, art. 783). Logo, somente havendo o silêncio das partes nesse sentido será aplicada a proporcionalidade indenizatória prevista no art. 783, que confrontará o valor pelo qual se segurou a coisa e o que realmente tinha quando se efetivou o contrato. Por exemplo, se se segurou um automóvel que vale R$ 80.000,00, por R$ 40.000,00, ocorrido o acidente, que lhe causa dano de R$ 1.000,00, o segurador pagará R$ 500,00, pois a proporção entre o valor do veículo e o que lhe foi dado para fins securitários: de 50%, limite da responsabilidade do segurador pela indenização, na hipótese de haver sinistro parcial. Se o sinistro fosse total, a seguradora deveria pagar, integralmente, o montante indenizatório previsto (R$ 40.000,00), sem qualquer desvantagem para o segurado, pois, ao segurar a coisa por valor menor do que o real, sujeitou-se, contratualmente, a receber quantum indenizatório insuficiente para a cobertura do prejuízo sofrido. Assim sendo, se por um lado a estrita obediência ao princípio indenitárío é um axioma decorrente da complexa estrutura securitária, por outro 183 Antonio Carlos Otoni Soares. Fundamento jurídico do contrato de seguro. São Paulo: Maltese, 1993. p. 173. 90 muitas vezes pode ser apreendido isoladamente dessa estrutura e figurar injustiçoso. Com efeito, não é possível apreender o instituto, integralmente, sob o aspecto jurídico, sem o exame de seus fundamentos extrajurídicos. O exame da mecânica operacional do seguro e da sua base econômica é determinante para a compreensão do contrato como uma operação de prevenção, muito além da mera transferência do risco. E é essa compreensão que vai permitir, do ponto de vista jurídico, afirmar o caráter sinalagmático (comutativo e não aleatório) da relação. Prossegue a mesma autora alertando que está, justamente, na ausência dessa visão extrajurídica a razão do erro de alguns estudiosos. Isso não só quanto à classificação do contrato, como quanto à determinação da sua causa (no sentido objetivo, isto é, conforme a função econômico-social visada) e à natureza da prestação da seguradora, além de outros aspectos jurídicos. A análise do seguro, partindo dessa premissa, tem início, não pelo exame do instrumento jurídico, mediante o qual se garante aquela finalidade de prevenção do risco, mas, justamente, pela análise da relação subjacente, consubstanciada na operação de seguros. Lembra Ernesto Tzirulnik184, que é justamente por esse motivo, a necessária estruturação técnica como garantia da operação securitária, que as cláusulas contratuais na relação securitária seguem o padrão definido pela Superintendência de Seguros Privados (SUSEP). 184 Ernesto Tzirulnik. Princípio indenitário no contrato de seguro. RT 759/89. 1999. p. 105. 91 E, tendo em vista a padronização estabelecida nessa atividade, destaca-se o caráter de adesão que se atribui aos contratos de seguro, que decorre de sua própria natureza mutualística. Ambas as partes aderem ao padrão, e não apenas o segurado. Observa o mesmo autor que nos pactos securitários ocorre a substituição do controle interno exercido pelas partes pelo controle externo realizado pelo Poder Público na qualidade de regulador dessas relações, no sentido de proporcionar o imprescindível caráter equitativo, evitando-se a ocorrência de abusos por qualquer dos interessados. Oportuna a opinião de Maria Helena Diniz185, ao asseverar que os contratos de seguro de vida não são contratos de indenização, pois não se pretende eliminar as conseqüências patrimoniais de um sinistro, mas sim pagar certa soma ao beneficiário designado pelo segurado. Esclarece Maria Helena Diniz que o seguro de vida tem por fim garantir, mediante o prêmio anual que se ajustar, o pagamento de certa soma a determinada ou determinadas pessoas, por morte do segurado. No seguro de vida para o caso de morte será lícita a estipulação de um prazo de carência, durante o qual a seguradora não responderá pela ocorrência do sinistro; logo se ele se der durante o lapso carencial, o segurador deverá restituir ao beneficiário o montante da reserva técnica já formada (CC, art. 797, parágrafo único). Somente depois do término daquele período, havendo o sinistro, o beneficiário poderá reclamar judicialmente o cumprimento da obrigação de indenizar por parte do segurador. 185 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. v. 3, 21ª Ed. p. 531. 92 5. CARACTERES Maria Helena Diniz186 aponta os seguintes caracteres do contrato de seguro: bilateral, oneroso, aleatório, formal, de execução sucessiva ou continuada, por adesão, de boa-fé. Bilateral, por gerar obrigações para o segurado e para o segurador, já que o segurador deverá pagar a indenização, se ocorrer o sinistro, e o segurado deverá continuar a pagar o prêmio, sob pena do seguro caducar (Dec.-lei n. 73/66, art. 12, parágrafo único)sendo que o segurador tem direito de haver o prêmio do risco transcorrido, mesmo que este não se verifique (CC, art. 764). Oneroso, pois traz prestações e contraprestações, uma vez que cada um dos contraentes visa obter vantagem patrimonial. Aleatório, por não haver equivalência entre as prestações; o segurado não poderá antever, de imediato, o que receberá em troca da sua prestação, pois o segurador assume um risco, elemento essencial desse contrato, devendo ressarcir o dano sofrido pelo segurado, se o evento incerto e previsto no contrato ocorrer. Daí a aleatoriedade desse contrato, pois tal acontecimento pode verificar-se ou não. Desse modo, a vantagem do segurador dependerá de não ocorrer o sinistro, hipótese em que receberá o prêmio sem nada reembolsar. Se advier o sinistro, deverá pagar uma indenização, que poderá ser muito maior do que o prêmio recebido. O ganho ou a perda dos contraentes dependerá de fatos futuros e incertos, previstos no contrato, que constituem o risco. Formal, visto ser obrigatória a forma escrita, já que não obriga antes de reduzido a escrito, considerando-se perfeito o contrato desde o momento em que o segurador remete a apólice ao segurado, ou faz nos livros o lançamento usual da 93 operação (CC, arts. 758 e 759). A forma escrita é exigida para a substância do contrato. Execução sucessiva ou continuada, destinando-se a subsistir durante um período de tempo, por menor que seja, pois visa proteger o bem ou a pessoa. Sua execução se realiza escalonadamente, sendo necessário que a obrigação do segurado seja satisfeita dentro dos termos convencionados, sob pena de rescindir-se por tratar-se de obrigação de trato sucessivo. Os efeitos passados serão mantidos, cessando-se os que decorrerem dali para a frente. Por adesão, tendo em vista que é formado com a aceitação pelo segurado, sem qualquer discussão, das cláusulas impostas ou previamente estabelecidas pelo segurador na apólice impressa, e as modificações especiais que se lhe introduzirem são ressalvas que o segurador insere por carimbo ou justaposição. Isto porque o seguro, por ser indenizatório, não pode dar vantagens ao beneficiário, de modo que se locuplete às custas do segurador. Em vista disso, o segurado não poderá receber indenização que supere o valor do interesse ou objeto segurado no momento da conclusão do contrato, sob pena de perder o direito à garantia, além de ficar obrigado ao prêmio vencido (CC, arts. 778 e 766), com exceção de seguro sobre a vida (CC, art. 789), que, por ser bem inestimável, se permitirá convencionar livremente a fixação do valor e fazer mais de um seguro, com o mesmo ou diversos seguradores. A seguradora está submetida ao controle governamental, ao preestabelecer as condições a que o segurado adere. Como a policitação da seguradora já obedece a normas que lhe são traçadas, infere-se que há uma adesão bilateral. Boa fé (CC, arts. 765, 766 e parágrafo único), pois o contrato de seguro, por exigir uma conclusão rápida, requer que o segurado tenha uma conduta sincera e leal em suas declarações a respeito do seu conteúdo, do objeto e dos riscos, sob 186 Maria Helena Diniz. Tratado teórico e prático dos contratos. São Paulo: Editora Saraiva, São Paulo: Saraiva, 94 pena de receber sanções se proceder com má fé, em circunstâncias em que o segurador não pode fazer as diligências recomendáveis à sua aferição, como vistorias, inspeções ou exames médicos, fiando-se apenas nas afirmações do segurado, que por isso deverão ser verdadeiras e completas, não omitindo fatos que possam influir na aceitação do seguro. P. ex.: no seguro de vida, deverá indicar moléstia de que sofre, pois se se provar que ocultou qualquer coisa perderá o direito ao valor do seguro e pagará o prêmio vencido. Maria Helena Diniz187 ressalta que a boa fé é exigida também do segurador; p. ex.: se ele, ao tempo do contrato, souber que o risco passou, e mesmo assim expedir a apólice, pagará em dobro o prêmio estipulado (CC, art. 773). Deve fornecer as informações solicitadas pelo segurado, sem nada ocultar, e procurar cumprir a avença, com probidade. Todavia, a má fé de ambos deverá ser comprovada, pois, se o segurador ignorava que o risco passara, nulo será o contrato, repondo-se a situação ao estado anterior, sem qualquer sanção. Tanto o segurado como o segurador deverão agir com probidade e lealdade, guardando, na conclusão e na execução do contrato, a mais restrita boa fé e veracidade. No mesmo sentido a análise de Carlos Alberto Ghersi188 ao descrever o contrato de seguro regido pela lei Argentina, como possuindo os seguintes caracteres: bilateral, consensual, oneroso, formal probatório, aleatório, de trato sucessivo ou de execução continuada, de adesão. 2002. p. 440/441 e Curso de direito civil brasileiro, v. 3, 21ª ed. São Paulo: Saraiva. 2005. p. 518 a 521. 187 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro, v.3. p. 520. 188 Carlos Alberto Ghersi. Contratos civiles y comerciales – partes general y especial. p. 398 e ss. 95 Segundo Yvonne Lambert-Faivre189, para o direito francês, o contrato de seguro é um contrato nominal, consensual, sinalagmático, aleatório, oneroso, de trato sucessivo, de adesão e de boa fé. Como se pode notar o seguro, sob todos os aspectos, é uma operação coletiva de garantia solidária, o que denota duas funções presentes no contrato de seguro, ou seja, a função social e a função econômica, o que nos leva à necessidade de abordar a boa-fé, bem como esses dois aspectos em sua dinâmica obrigacional. 5.1. A BOA-FÉ Merece relevo, diante do atual questionamento da concepção tradicional do contrato, “que tem na vontade a única fonte criadora de direito e obrigações, formando lei entre as partes, sobrepondo-se à própria lei” 190, a boafé. O Código Civil de 1916 já trazia no artigo 1443 a exigência da boa-fé no contrato de seguro191: 189 Yvonne Lambert-Faivre. Droit des assurances. p. 182 e ss. No original: “Les caractères du contrat d'assurance: 1o. C'est un contrat nommé; 2o. C'est un contrat consensuel; 3o. C'est un contrat synallagmatique; 4o. C'est un contrat aléatoire; 5o. C'est un contrat à titre onéreux; 6o. C'est un contrat successif; 7o. C'est un contrat d'adhésion; 8o. C'est un contrat de bonne foi.” Tradução livre: As características do contrato de seguro: 1º É um contrato nominal; 2º É um contrato consensual; 3º [E um contrato sinalagmático; 4º É um contrato aleatório; 5º É um contrato oneroso; 6º É um contrato sucessivo; 7º É um contrato de adesão; 8º É um contrato de boa-fé. 190 Alinne Arquette Leite Novais. Os novos paradigmas da teoria contratual: o princípio da boa-fé objetiva e o princípio da tutela do hipossuficiente. In: Gustavo Tepedino (coord.). Problemas de direito civil-constitucional. São Paulo: Renovar, 2000. p. 17. 191 No novo Código Civil o princípio da boa-fé foi consagrado como um mandamento geral, dispondo seu artigo 422 que: “Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.” 96 “Art. 1.443 – O segurado e o segurador são obrigados a guardar no contrato a mais estrita boa-fé e veracidade, assim, a respeito do objeto, como das circunstâncias e declarações a ele concernentes.” Trata-se, portanto, de imposição legal aos contratantes, de pautarem sua conduta “de acordo com os ideais de honestidade e lealdade, isto é, as partes contratuais devem agir conforme um modelo de conduta social, sempre respeitando a confiança e os interesses do outro”. 192 Clóvis Bevilaqua193 assinalava esse elemento ao comentar o artigo de lei supra transcrito: “Diz-se que o seguro é um contrato de boa-fé. Aliás todos os contratos devem ser de boa fé.” Esclarece Maria Helena Diniz194 que o contrato de seguro: é um contrato de boa-fé (Código Civil, arts. 765, 766 e parágrafo único), pois o contrato de seguro, por exigir uma conclusão rápida, requer que o segurado tenha uma conduta sincera e leal em suas declarações a respeito do seu conteúdo e dos riscos, sob pena de receber sanções se proceder com má-fé, em circunstâncias em que o segurador não pode fazer as diligências recomendáveis à sua aferição, como vistorias, inspeções ou exames médicos, fiando-se apenas nas afirmações do segurado, que por isso deverão ser verdadeiras e completas, não omitindo fatos que possam influir na aceitação do seguro. A Constituição Federal traz a seguinte disposição: 192 Alinne Arquette Leite Novais. p. 22/23. Clóvis Bevilaqua. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil: comentado por Clóvis Bevilaqua. Obrigações. Tomo II, v. 5. 3ed. São Paulo: Francisco Alves, 1934, p. 203. 194 Maria Helena Diniz. Tratado teórico e prático dos contratos. p. 441. 193 97 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. (grifos nossos) O artigo 3º da Constituição de 1988 informa: Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. (grifos nossos) Ou seja, estamos diante de princípios que informam o comportamento das pessoas e a atividade do operador do direito. 98 A incidência da boa-fé objetiva sobre a disciplina obrigacional determina uma valorização da dignidade da pessoa, em substituição à autonomia do indivíduo, na medida em que se passa a encarar as relações obrigacionais como um espaço de cooperação e solidariedade entre as partes e, sobretudo, de desenvolvimento da personalidade humana. 195 Na opinião de Antonio Junqueira de Azevedo196, hoje, diante do toque de recolher do Estado intervencionista, o jurista com sensibilidade intelectual percebe que está havendo uma acomodação das camadas fundamentais do direito contratual. Estamos em época de hipercomplexidade, os dados se acrescentam, sem se eliminarem. Para esse autor, os novos tempos acrescentaram três novos princípios no direito contratual, além do princípio da autonomia da vontade, ou seja, a boa-fé objetiva, o equilíbrio econômico do contrato e a função social do contrato. O contrato torna-se assim um ato, a um só tempo, público e privado, tendo por fonte não apenas a vontade das partes, mas igualmente o preceito legal.197 5.1.1. HISTÓRICO DA BOA-FÉ OBJETIVA A aplicação do princípio da boa-fé nos contratos de seguro já vem de longa data. No direito estrangeiro, segundo Clark198 já em 1766, no caso Carter x Boehm, julgado por Lord Mansfield, CJ, entendeu-se que nos contratos de 195 Tereza Negreiros. Fundamentos para uma interpretação constitucional do princípio da boa-fé. São Paulo: Ed. Renovar. 1998. p. 281. 196 Antonio Junqueira de Azevedo. Princípios do novo direito contratual e desregulamentação do mercado”, p.115. 197 Heloisa Carpena. Abuso de direito nos contratos de consumo. Editora Renovar. 2001. p. 29. 198 Malcolm A. Clark. The Law of the insurances contract apud Márcio da Cunha Guimarães, Contratos Internacionais de Seguros, 2002, p.56. 99 seguro deveria haver transparência na apresentação dos fatos materiais quando da formação do contrato. Também Macdonald e Foss199 observam que a aplicação do princípio é bastante antiga, pois em 1690, na Inglaterra, no caso Whittingham x Thoroborouugh a boa-fé foi exigida na celebração de um contrato de seguro de vida. Em 1952, San Tiago Dantas diagnosticava a repercussão da transformação social em matéria de contratos. Segundo esse autor, a constituição da doutrina clássica dos contratos, sob a ótica do liberalismo, completou-se em fins do século XVIII, incitando as codificações do século seguinte a propiciar o surto econômico do capitalismo moderno: “Não há exagero em dizer que o direito contratual foi um dos instrumentos mais eficazes da expansão capitalista em sua primeira etapa” (...) “e se é certo que deixou de proteger os socialmente fracos, criou oportunidades amplas para os socialmente fortes, que emergiram de todas as camadas sociais, aceitando riscos e fundando novas riquezas”. 200 Prossegue esse autor, afirmando que a teoria liberal clássica perdeu terreno ao longo dos anos, por duas ordens de razões: a) o sentido solidarista, que prepondera na política contemporânea dos Estados democráticos; b) a intervenção crescente do Estado nas relações econômicas, para exercer, por órgãos próprios, um número cada vez maior de atividades. O testemunho histórico de San Tiago Dantas merece ser transcrito: “A primeira transformação de longo alcance, observada na matéria, surge quando os particulares se prevalecem da liberdade contratual justamente para eliminarem de suas atividades e relações econômicas a lei da oferta e 199 Peter Macdonald e Patrick Foss. Good faith and insurance contracts apud Márcio da Cunha Guimarães, Contratos Internacionais de Seguros, 2002, p.57. 200 San Tiago Dantas. Evolução contemporânea do direito contratual, in Revista Forense, v. 139, p. 5 e seguintes. 100 da procura e o regime de concorrência, iniciando os consórcios de empresas, que viriam a assumir as formas de trusts e cartéis. Antes de chegar a um estado de saturação econômica, em que voltaria a ser benevolente para com os consórcios, a sociedade capitalista reagiria contra eles, condenando os contratos destinados a eliminar ou modificar arbitrariamente as condições da concorrência. As leis anti-trust exprimem a concepção, já mais clara, de que a liberdade econômica não é um princípio absoluto, em nome do qual se possam admitir os próprios pactos que excluem tal liberdade, mas é um regime social e econômico a defender mesmo contra a liberdade individual, se esta o ameaçar”. 201 Nesse contexto não é difícil entender que a crescente intervenção estatal em matéria de contratos operou não apenas a mitigação do princípio da autonomia da vontade, como também, por via reflexa, acabou atingindo a idéia de obrigatoriedade das convenções, com a crescente admissão da revisão dos contratos. Com o fim do individualismo do século XIX, o paradigma do dirigismo contratual trouxe consigo alguns conceitos vagos, como a ordem pública, a função social, o interesse público e a boa-fé. 202 Em verdade, o direito das obrigações é o palco da harmonização dos interesses contrapostos. Respeitando a lei e os bons costumes, os contratantes podem controverter-se na luta das vontades egoísticas, cada um esforçando-se para obter o maior número de vantagens e o menor contingente de sacrifícios. 203 É inimaginável um palco de igualdade absoluta entre os contendores. Por esta razão, desde que a superioridade de um deles esteja sujeita aos limites 201 San Tiago Dantas. Evolução contemporânea do direito contratual. in Revista Forense, v. 139, p. 5 e seguintes. Cibele Pinheiro Marçal Cruz e Tucci. Teoria geral da boa-fé objetiva. in Revista do Advogado, n. 68, p. 100 e seguintes. 203 George Ripert, La règle morale dans les obligations civiles, LGDJ, Paris, 1935, p. 79. 202 101 impostos pela formação sociocultural da parte contrária, se houver moderação de propósitos, e se for respeitada a dignidade da pessoa humana, a moral se conformará com a prevalência dos interesses do contendor mais forte. Inversamente é inaceitável que a superioridade de um dos contendores se imponha sempre, sem quaisquer condições, bastando que o agente seja capaz, o objeto lícito, e observada a forma prescrita em lei. 204 O princípio da boa-fé objetiva é justamente um desses meios, e a sua positivação no direito civil deu-se através do artigo 422 do novo Código Civil, assim redigido: “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.” 5.1.2. DEFINIÇÃO DE BOA-FÉ OBJETIVA Antonio Márcio da Cunha Guimarães, citando Alípio Silveira e Fernando Noronha, acompanhando a doutrina alemã, defende a existência de dois tipos de boa-fé, ambas jurídicas: a objetiva e a subjetiva. Afirma o autor: “Vê-se que a boa-fé objetiva consiste em um dever de conduta contratual ativo, um dever jurídico que obriga a uma conduta determinada. Podemos chamar também de boa-fé princípio, conceito denominado no alemão como ‘Treu und Glauben’ (lealdade e crença), não se confundindo com outro conceito – ‘Guter Glaube’ (boa crença), que é a situação ou fato psicológico de boa-fé, daquele que ignora a real situação jurídica, ou seja, a boa-fé estado, ou também, subjetiva. Algo muito importante no estudo dos contratos de seguros é 204 Ver nesse exato sentido, George Ripert, La regle morale, p.80: “Consacrer la liberte de contracter sous le pretexte que ni l’objet, ni la cause de l’obligation nem sont illicites, ce serait en réalité permettre l’exploration de l’homme que la morale réprouve.”. Tradução livre: Consagrar a liberdade de contratar sob o pretexto de que 102 a análise dessa questão acerca da boa-fé ou sua ausência: enquanto na concepção subjetiva a boa-fé contrapõe-se à má-fé, o mesmo não ocorre com relação à boa-fé objetiva, a qual se contrapõe a ausência de boa-fé, e não necessariamente, a má-fé”. 205 A boa-fé objetiva constitui um princípio geral, aplicável ao direito das obrigações, através do qual se produz nova delimitação do conteúdo objetivo do negócio jurídico, especialmente o contrato, mediante inserção de deveres e obrigações acessórios, ou produzindo a restrição de direitos subjetivos, ou ainda através da aplicação de método hermenêutico integrativo, para interpretação da declaração de vontade, sempre com vistas a ajustar a relação jurídica econômico-social determinável no caso concreto. 206 A teoria da boa-fé objetiva ajusta-se melhor à idéia de que o contrato, muito mais do que uma relação jurídica bipolarizada, constitui um processo através do qual as partes buscam a consecução de fins previamente estabelecidos, mediante a reunião de esforços e a cooperação mútua. 207 O fim comum do contrato é a satisfação dos interesses contrapostos das partes. Escreve Orlando Gomes208 que nos contratos há sempre interesses opostos das partes contratantes, mas sua harmonização constitui o objetivo mesmo da relação jurídica contratual. Assim, há uma imposição ética que domina a matéria contratual, vedando o emprego da astúcia e da deslealdade e impondo a observância da boa-fé e lealdade, tanto na manifestação da vontade nem o objeto nem a causa da obrigação não podem ser ilícitas é, na realidade, permitir a exploração do homem que a moral reprova. 205 Antônio Márcio da Cunha Guimarães. Contrato de seguro contra seqüestro. RT 806/731. 206 Cibele Pinheiro Marçal Cruz e Tucci, “Teoria geral da boa-fé objetiva”, in Revista do Advogado, n. 68, pp. 100 e seguintes. 207 A propósito v., por todos, Clóvis do Couto e Silva, A obrigação como processo, São Paulo, Bushatsky, 1976; e reproduzindo as lições da mestre gaúcha, Judith Martins Costa, A boa-fé no direito privado, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2000, especialmente p. 383 e segs. 208 Orlando Gomes. Contratos, 18 ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1988, p. 42. 103 (criação do negócio jurídico) como, principalmente, na interpretação e execução do contrato. A segurança dos contratantes repousa justamente no fato de ser havido como antijurídico que qualquer deles extraia, em detrimento do outro, vantagens desarrazoadas e injustificáveis, ou que veja frustradas as suas justas expectativas. 209 A boa-fé objetiva constitui, pois, um preceito de conduta a ser observado nas relações obrigacionais, não como um apelo inócuo a valores de ética formal, nem por imposições abstratas de eqüidade ou de solidariedade humana, mas como um princípio jurídico, produtor de efeitos sancionados pelo sistema. 210 Não se trata de aferir, no caso concreto, se o contratante agiu com ardil ou astúcia para ludibriar a outra parte ou se, por outro lado, fiou-se na crença errônea acerca da existência ou inexistência de certos elementos de fato e de direito. Qualquer uma dessas averiguações dependeria do exame subjetivo da manifestação de vontade, vale dizer, a avaliação anímica do sujeito. A aplicação da teoria da boa-fé objetiva parte do exame externo do caso concreto, sem qualquer consideração sobre os motivos subjetivos que levaram o agente a contratar.211 Em verdade, busca-se o enquadramento da declaração de vontade em sua conjuntura histórica e no contexto sociocultural 209 No dizer de Bruno Lewicki: “Reduz-se a margem de discricionariedade da atuação privada: o sujeito, para consecução de seus objetivos individuais, têm de agir com lealdade, observando e respeitando não só os direitos, mas também os interesses legítimos e as expectativas razoáveis de seus parceiros na aventura social.” (“Panorama da boa-fé objetiva”, in Problemas de direito civil-constitucional, sob a coordenação de Gustavo Tepedino, São Paulo-Rio de Janeiro, Renovar, 2000, p. 75). 210 Cibele Pinheiro Marçal Cruz e Tucci, “Teoria geral da boa-fé objetiva”, in Revista do Advogado, n. 68, p. 100 e seguintes. 211 Para compreensão perfeita da matéria tratada nesse tópico, seja o fim típico do negócio jurídico, antes referido, ou os ora denominados motivos subjetivos do contratante, veja-se a questão da causa do negócio jurídico, versada por Emílio Betti, de maneira perfunctória, in Teoria geral do negócio jurídico, trad. Fernando de Miranda, Coimbra, Coimbra Ed., 1969, t. II, pp. 329 e segs. No texto a expressão motivos subjetivos é empregada como a causa subjetiva, ou seja, ”as representações psicológicas íntimas, individuais, da mais variada 104 pertinente, para averiguar, de modo estritamente objetivo, qual seria o padrão de conduta normalmente exigível dos sujeitos de direito e quais são os efeitos jurídicos que razoavelmente deveriam ser esperados pelos contratantes. A resposta a essas duas indagações estabelecerá o conteúdo objetivo do negócio jurídico, ao qual estarão vinculadas as partes. Segundo a acurada observação de Menezes Cordeiro: “O bom pai de família constitui um padrão jurídico, na acepção técnica acima firmada, corresponde à actuação do homem normal, colocado nas circunstâncias do sujeito. A boa-fé, embora comporte, nos seus modelos de decisão, a inclusão de padrões jurídicos, não se esgota num deles. No que toca ao cumprimento das obrigações, a boa-fé é chamada a precisar e complementar a fonte negocial respectiva, actuando, depois, no conteúdo, seja para precisar a prestação, seja para lhe acrescentar os deveres acessórios”. 212 Nesse passo é importante notar que a aplicação da teoria da boa-fé objetiva, guindada à condição de cláusula geral, produz um sistema obrigacional aberto, mediante a flexibilização das normas aplicáveis, de modo que o intérprete transmuda-se em criador do direito para o caso concreto. 213 Segundo o Min. Ruy Rosado de Aguiar Junior214, a utilização de cláusula de boa-fé implica a criação de uma norma para o caso concreto de acordo com os dados objetivos que ele mesmo apresenta, atendendo à realidade natureza, que agem no ânimo do sujeito e o levam a contratar”, na sintética explicação de Custódio Piedade Ubaldino Miranda, in Teoria geral do negócio jurídico, São Paulo, Atlas, 1992, p. 155. 212 Menezes Cordeiro. Da boa-fé no direito civil, Coimbra, Almedina, 1984, v. 2, p. 1.230. 213 O quadro contemporâneo do direito contratual parece que vem apontando para uma nova mudança de paradigma. As exigências da vida moderna, em termos de celeridade, eficiência, simplificação dos meios e maximização dos resultados acaba produzindo aquilo que Antonio Junqueira de Azevedo denomina de “fuga do juiz” (in “Insuficiência, deficiência e desatualização do projeto de Código Civil, na questão da boa-fé objetiva nos contratos”, Revista dos Tribunais, v.775, p. 11 e segs.). 214 Paulo Jorge Scartezzini Guimarães, A publicidade ilícita e a responsabilidade civil das celebridades que dela participam, São Paulo:Revista dos Tribunais, p. 67, nota 63. 105 social e econômica em que o contrato opera, ainda que isso o leve para fora do círculo da vontade. No dizer de Cibele Pinheiro Marçal Cruz e Tucci215, aparentemente, produz-se o desprestígio da autonomia da vontade, tão difundida em tempos de predomínio do liberalismo. Na verdade, a autonomia da vontade não perdeu o seu valor intrínseco, no terreno das obrigações, mas sofreu paulatinamente a delimitação imposta pela denominada função social do contrato. Assim sendo, enquanto não houver conflito entre o auto-regramento das partes e a consecução dos fins sócio econômicos do negócio jurídico, prevalecerá o conteúdo da manifestação de vontade e os efeitos jurídicos previstos, em abstrato, para o modelo jurídico. Quando, todavia, a prevalência do interesse público o determinar, o princípio da autonomia da vontade cederá terreno ao princípio da boa-fé objetiva, de modo a ser integralmente preservada a função social do contrato, entendida como um processo de harmonização dos interesses contrapostos, para garantia da justiça e da paz social. A teoria da boa-fé objetiva constitui um mecanismo técnico jurídico de aferição da abusividade das cláusulas contratuais expressas ou de inaplicabilidade parcial dos efeitos do negócio jurídico, ou ainda de interpretação integrativa da declaração de vontade, sempre que seja preciso restabelecer o equilíbrio contratual. 216 A nosso ver, a boa-fé objetiva aproxima-se de um conceito legal indeterminado por estar prevista na lei, bem como é um conceito de alto grau de indeterminabilidade, porém a lei prevê conseqüências para sua não observação. Ao contrário de uma cláusula geral, cuja característica pressupõe não haver conseqüências previstas em lei para o não cumprimento. 215 Cibele Pinheiro Marçal Cruz e Tucci. Teoria geral da boa-fé objetiva. p. 103. Ver sobre a causa do negócio jurídico, a evolução do conceito noticiada por Vincenzo Roppo, Il contrato, Milano, Giuffrè, 2001, p. 361 e segs. 216 106 No entanto é preciso reconhecer que no caso concreto essa boa-fé pode ser conceito legal indeterminado ou não, isso vai depender de como o assunto é tratado em cada caso na lei. Ex.: a boa-fé é exigida para adquirir a propriedade por usucapião e nesse caso é um conceito legal indeterminado. De outro lado o art. 422 menciona a boa-fé, porém não há sanção ou conseqüência, portanto, nesse caso, é uma cláusula geral, ou seja, a conseqüência será dada pelo Juiz, caso a caso. Podemos afirmar, então, que o legislador pátrio adotou um sistema misto de caracterização da boa-fé. O sistema misto é casuístico e prevê mobilidade de interpretação (cláusulas gerais e conceitos legais indeterminados). 5.1.3. A BOA-FÉ OBJETIVA E O CONTRATO No dizer de Junqueira de Azevedo217, o pensamento, infelizmente, ainda muito difundido, de que somente a vontade das partes conduz o processo contratual, deve ser definitivamente afastado. É preciso que na fase précontratual, os candidatos a contratantes ajam, nas negociações preliminares e na declaração da oferta, com lealdade recíproca, dando as informações necessárias, evitando criar expectativas que sabem destinadas ao fracasso, impedindo a revelação de dados obtidos em confiança, não realizando rupturas abruptas e inesperadas das conversações, etc. Aos vários deveres dessa fase, seguem-se deveres acessórios à obrigação principal na fase contratual – quando a boa-fé serve para interpretar, completar ou corrigir o texto contratual – e, até mesmo, 107 na fase pós-contratual, a boa-fé também cria deveres, os posteriores ao término do contrato – são os deveres post pactum finitum, como o do advogado de guardar os documentos do cliente, o do fornecedor de manter a oferta de peças de reposição, o do patrão de dar informações corretas sobre o ex-empregado idôneo etc. Assim, a prestação há de ser adimplida a tempo e a hora, com todos os cuidados necessários ao seu mais perfeito aproveitamento pelo accipiens. Incluem-se, então, obrigações acessórias como a guarda e o armazenamento do objeto devido, até o momento da tradição; o seu transporte e embalagem adequados; a certificação de que chegou intacto ao seu destino, etc. 218 Finalmente, e mesmo após o integral cumprimento das prestações devidas, e da aparente extinção do vínculo obrigacional, as partes ainda se devem mutuamente a preservação dos resultados úteis decorrentes do negócio, de modo a impor-lhes a abstenção de quaisquer práticas que pudessem redundar na alteração imediata e nociva dos benefícios experimentados pela outra parte. A boa-fé objetiva resume-se a lealdade e retidão de conduta exigíveis em um contexto social sadio, sem sacrifícios de parte a parte. 5.1.4. NORMATIZAÇÃO DA BOA-FÉ OBJETIVA 217 Junqueira de Azevedo. Responsabilidade pré-contratual no Código de Defesa do Consumidor: estudo comparativo com a responsabilidade pré-contratual no direito comum. in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 1995, v. 90, p. 125. 218 Um vez estabelecido o vínculo contratual, já não se trata apenas de deveres, mas de obrigações acessórias à obrigação principal; v. Cláudia Lima Marques, Contratos no Código de Defesa do Consumidor, São Paulo:Revista dos Tribunais, 1999, p. 67. 108 Para Junqueira de Azevedo a teoria da boa-fé objetiva constitui princípio geral de direito e deve ser aplicada pela jurisprudência no seu papel intermediário entre a lei e o caso concreto. 219 Como princípio, a idéia de boa-fé objetiva constitui fundamento de um conjunto de normas já emanadas ou ainda a serem emanadas (na acepção de princípio programático). 220 Como fonte clássica da teoria da boa-fé objetiva, os autores referem, reiteradas vezes, ao direito alemão, não sem antes ressaltar que a promulgação do BGB, em 1900, não produziu o efeito monumental, em relação à matéria, que só seria sentido no cenário Pós-Guerra, com a promulgação da Constituição de Weimar, 1919. 221 A boa-fé objetiva teve seu conceito advindo do Código Civil Alemão, que em seu parágrafo 242 já determinava um modelo de conduta. Cada pessoa deve agir como homem reto: com honestidade, lealdade e probidade. Leva-se em conta os fatores concretos do caso, não sendo preponderante a intenção das partes, a consciência individual da lesão ao direito alheio ou da regra jurídica. O importante é o padrão objetivo de conduta. Conforme lembra Clóvis do Couto e Silva, não se pense, contudo, ser o aludido § 242, no pensamento dos autores do Código Civil alemão, algum dispositivo específico, conferindo ao juiz poderes extraordinários de criação jurídica, ao ponto de transformar a sua figura no símile moderno do pretor romano. Nada mais inexato: o § 242 não significava outra coisa senão o mero reforço ao § 157, no qual se determinava a regra tradicional de interpretação dos negócios jurídicos segundo a boa-fé. Não se pensou, de modo nenhum, em atribuir ao juiz a função fundamental de criar o direito, por meio da aplicação, 219 Na precisa lição de Junqueira de Azevedo, “Responsabilidade pré-contratual”. p. 126. Sobre a matéria v., Judith Martins-Costa, A boa-fé no direito privado. p.321. 221 Bruno Lewicki, Panorama da boa-fé objetiva, in Problemas de Direito Civil Constitucional. p. 61. 220 109 muito embora expressasse a regra de que: ‘o devedor é obrigado a realizar a prestação do modo como exige a boa-fé levando em conta o uso do tráfico’.222 Antes do BGB, o Código Civil Napoleônico e o Código Civil italiano de 1865 também faziam referência à boa-fé objetiva, mas sem despertar no espírito de seus comentadores a visão exata da magnitude dos respectivos preceitos. Antes do Código Alemão, o Código Civil Napoleônico e o Código Civil Italiano também faziam referencia à boa-fé objetiva. Mas, somente após a Segunda Guerra Mundial a jurisprudência alemã construiu a teoria da boa-fé objetiva, que veio a ser guinada à condição de princípio geral. O parágrafo 242 do Código Civil Alemão, o mais célebre exemplo de clausula geral, é assim redigido: "§ 242 : O devedor deve (está adstrito a) cumprir a prestação tal como o exija a boa-fé, com consideração pelos costumes do trafego jurídico". O Direito Civil Americano tem legislação própria que trata de toda a matéria comercial e de parte do direito contratual. Nesse Código Comercial Uniforme (UCC) há um artigo que trata da boa-fé: "Cada contrato ou obrigação no quadro da presente lei impõe uma obrigação de boa-fé no adimplemento ou execução do contrato". Para Junqueira de Azevedo, uma das mais interessantes disposições sobre a boa-fé objetiva, no direito comparado, é a do artigo 2º do Código Civil suíço: ‘Todos devem exercer e executar suas obrigações segundo as regras da boa-fé. O abuso de direito não é protegido pela lei’.223 222 Apud Alinne Arquete Leite Novais, “Os novos paradigmas da teoria contratual: o princípio da boa-fé objetiva e o princípio da tutela do hipossuficiente”, in Problemas de Direito Civil-Constitucional. p. 25. 223 Junqueira de Azevedo. Responsabilidade pré-contratual. p. 125. 110 A par desse, muitos são os sistemas estrangeiros que recepcionaram a teoria da boa-fé objetiva em seus ordenamentos jurídicos, ora como cláusulas gerais, ora através de normas especiais inspiradas naquele princípio geral. 224 O Código Civil Português, em seu artigo 227, dispõe: “Quem negocia com outrem para a conclusão de um contrato deve, tanto nas preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras de boa-fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte”. No mesmo sentido, o Código Civil italiano225: Art. 1.337 – Tratativa e responsabilidade precontratual – As partes, no desenvolvimento das tratativas e na formação do contrato devem comportar-se segundo a boa fé. Art. 1.375 – Execução de boa fé – O contrato deve ser executado segundo a boa fé. O Código Civil francês já previa, em seu art. 1.134226, que as convenções legalmente formadas têm fundamento na lei e nos fatos. Elas não 224 Por exemplo: Código Civil Espanhol – artigo 7.1 “Los derechos deberán ejercitarse conforme a las exigencias de la buena fe”; Código Civil do Chile – art. 1.546 “Los contratos deben ejecutarse de buena fe, y por consiguiente obligan no sólo a lo que en ellos se expresa, sino a todas las cosas que emanan precisamente de la naturaleza de la obligación, o que por la ley o la costumbre pertenecen a ella”; Código Civil Boliviano – art. 465 “En los tratos preliminares y en la formación del contrato las partes deben conducirse conforme a la buena fe, debiendo resarcir el daño que ocasionen por negligencia, imprudencia u omisión en advertir las causales que invaliden el contrato”; Código Civil Peruano – artigo 1.362 “Los contratos deben negociarse, celebrarse y ejecutarse segun las reglas de la buena fe y comun intencion de las partes”; Código Civil Argentino – artigo 1.198 “Los contratos deben celebrarse, interpretarse y ejecutarse de buena fe y de acuerdo con lo que verosímilmente las partes entendieron o pudieron entender, obrando con cuidado y previsión”; Código Civil Venezuelano – artigo 1.160 “Los contratos deben ejecutarse de buena fe y obligan no solamente a cumplir lo expresado en ellos, sino a todas las consecuencias que se derivan de los mismos contratos, según la equidad, el uso o la Ley”; Código Civil Colombiano – artigo 1.603 “Los contratos deben ejecutarse de buena fe, y por consiguiente obligan no solo a lo que en ellos se expresa, sino a todas las cosas que emanan precisamente de la naturaleza de la obligación, o que por ley pertenecen a ella”. 225 No original: Art. 1.337 - Tratative e responsabilità precontrattuale – Lê parti, nello svolgimento delle tratative e nella formazione del contratto, devono comportarsi secondo buona fede. Art. 1.375 - Esecuzione di buona fede – Il contratto deve essere eseguito secondo buona fede. 111 podem ser revogadas a não ser pelo consentimento mútuo ou por causas que a lei autorize. Eles devem ser executados de boa fé. Importante notar que o preceito encerra em si mesmo certa contradição, na medida em que estabelece que o contrato têm força de lei entre as partes e não pode ser revogado salvo por consentimento mútuo ou por uma das causas em lei previstas. Dentro desse quadro, o conceito de boa-fé, relegado para a fase de execução dos contratos, viu-se espremido pela prevalência da autonomia da vontade e da obrigatoriedade das convenções, razão pela qual a doutrina e a jurisprudência francesas guindaram a segunda parte do artigo à condição de letra morta, durante muitos anos. 227 A nova interpretação atribuída ao artigo 1.134 do Código Napoleônico é, pois, concomitante à recodificação do Direito Civil em diversos países da Europa. Até mesmo a Convenção de Viena, datada de 1980, e que dispõe sobre o comércio internacional de mercadorias, estabelece, em sua cláusula 7, que: “Na interpretação da presente Convenção ter-se-á em conta o seu caráter internacional bem como a necessidade de promover a uniformidade de sua aplicação e de assegurar o respeito da boa-fé no comércio internacional”. O Código Civil Holandês também trata da cláusula geral da boa-fé, em seu artigo 248 do Livro das Obrigações, que prevê: "... que as partes devem respeitar não só aquilo que convencionaram como também tudo que resulta da natureza do contrato, da lei, dos usos e das exigências da razão e da equidade". 226 No original: Art. 1.134 - lês conventions légalement formées tiennent lieu de la loi a ceux que lês ont faites. Elles ne peuvent être revoquées que de leur consentement mutuel, ou pour les causes que la loi autorise. Elles doivent être exécutées de bonne foi. 227 No mesmo sentido, v. Bruno Lewicki, “Panorama da boa-fé objetiva”, in Problemas de Direito CivilConstitucional. p. 60, com respaldo em Laurent e Corradini. 112 No texto legal, os autores holandeses não utilizaram a palavra "boafé", evitando confusões com a chamada "boa-fé subjetiva". No Brasil, o Código Comercial de 1.850 já dispunha em seu artigo 131: “Sendo necessário interpretar as cláusulas do contrato, a interpretação, além das regras sobreditas, será regulada sobre as seguintes bases: 1- a inteligência simples e adequada, que for mais conforme à boa-fé e ao verdadeiro espírito e natureza do contrato, deverá sempre prevalecer à rigorosa e restrita significação das palavras”. O art. 85 do Código Civil, era visto por muitos doutrinadores, como expressão positivada do princípio: “Nas declarações de vontade se atenderá mais à sua intenção que ao sentido literal da linguagem”. O art. 1.443 do diploma de 1.916 refere-se à boa-fé, da seguinte forma: “O segurado e o segurador são obrigados a guardar no contrato a mais estrita boa-fé e veracidade, assim a respeito do objeto, como das circunstâncias e declarações a ele concernentes”. Clóvis Beviláqua, comentando referido artigo 1.443, admitiu explicitamente a prevalência do princípio da boa-fé objetiva no Direito Civil brasileiro, em texto reiteradamente citado: “Diz-se que o seguro é um contrato de boa-fé. Aliás todos os contratos devem ser de boa-fé”. Outras referências feitas à boa-fé no Código Civil de 1916: arts. 109, 112, 500, 510, 516, 622, 1.002, 1.073 e 1.405. 113 O novo Código Civil consagrou os artigos 113, 421 e 422 à positivação da boa-fé objetiva, como método técnico-operativo de delimitação do conteúdo dos negócios jurídicos. Mais de uma década antes da entrada em vigor do novo Código Civil, mas já sob a forte influência da Constituição de 1988, o Código de Defesa do Consumidor positivou a teoria da boa-fé objetiva, dando ensejo a uma profunda difusão da idéia no meio jurídico brasileiro. Há quem diga, e não sem razão, que o princípio da boa-fé objetiva informa todo o direito do consumidor, e constitui um de seus mais importantes pilares. Para Junqueira de Azevedo: “não é temerário dizer que a idéia de boa-fé constitui a inspiração da legislação sobre defesa do consumidor no Brasil”.228 O art. 4º, III, do Código de Defesa do Consumidor estabelece como princípio a ser seguido: “a harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores”. Igualmente, o artigo 51 do mesmo diploma legal, ao inquinar de nulidade absoluta as cláusulas abusivas, estatui, em seu inciso IV, que estarão enquadradas no preceito aquelas que: “estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada ou sejam incompatíveis com a boa-fé e à eqüidade”. 114 5.2. FUNÇÃO SOCIAL DO SEGURO229 A idéia da função social do Direito não é nova. Ao longo dos tempos, os mais renomados juristas formularam doutrinas em busca de uma socialização do Direito. Tais doutrinas surgiram, em todo o mundo, procurando despertar o homem para a solidariedade que deveria haver nas contratações, uma vez que além das partes implicadas, não raras vezes se encontra subjacentemente, o interesse de terceiros (e mesmo do próprio grupo societário). Função, em direito, designa um tipo de situação jurídica em que existe, previamente assinalada por um comando normativo, uma finalidade a cumprir e que deve ser obrigatoriamente atendida por alguém, mas no interesse de terceiro ou terceiros. 230 Para Nelson Borges231, quando a Constituição Federal, em seus arts. 182 e 184 fez referências (pela primeira vez em um texto constitucional) à função social da propriedade, importantes passos foram dados em direção à tão desejada 228 Junqueira de Azevedo. Responsabilidade pré-contratual. p. 125. Vide ainda: Tereza Negreiros. Teoria do Contrato. Novos Paradigmas. Ed. Renovar. Rio de Janeiro. 2002. p. 224.; Wilson Melo da Silva. Da responsabilidade civil automobilística. Ed. Saraiva. São Paulo. 1974.; Luiz Guilherme Loureiro. Contratos no novo Código Civil. Teoria geral e contratos em espécie. São Paulo. Ed. Método. 2004. p. 48. 230 José Marcelo Martins Proença. Concentração empresarial e o direito da concorrência. Dissertação de mestrado apresentada em 18 de junho de 1999. USP. 231 Nelson Borges. Os contratos de seguro e sua função social. A revisão securitária no novo Código Civil. São Paulo: RT 826/25. 2004. p. 27. 229 115 socialização do Direito ou ao seu correlato mais importante: a repersonalização do homem. Ensina esse autor que, talvez uma das primeiras idéias da função social dos contratos tenha surgido com a própria atividade mercantil do homem que, na era das navegações, trazia do outro lado do mundo tudo o que lá era abundante para trocar aqui pelo que lá era escasso, e aqui, não. Dessa primeira forma de contratação (permuta) surgiu entre os povos que negociavam o interesse pela língua, costumes, religião, culinária, vestuário, sendo que, a princípio, a função social dos pactos definiu-se pela aproximação dos homens e circulação de bens e riquezas. Esclarece que a normatização da função social, embora louvável, não chegou a ser propriamente uma novidade, uma vez que a liberdade de contratar nunca foi ilimitada. Doutrina e jurisprudência já haviam traçado coordenadas operacionais no campo do contratualismo, assentadas, principalmente, na ordem pública e nos bons costumes. Destaca que até certo ponto o dispositivo conflitou com a chamada "relatividade das convenções ou dos efeitos contratuais", presentes na principiologia clássica (ao lado da autonomia da vontade e da intangibilidade dos pactos). Isso porque, no Código revogado, os efeitos contratuais ocorriam apenas entre as partes e no novo Código, isso não se verificou, conseqüente à nova dimensão conferida aos efeitos reflexos da contratação. A idéia de proteção a terceiros (efeitos reflexos da contratação) contida na expressão "(...) em razão e nos limites da função social (...)" 232 já havia sido consagrada pela doutrina e jurisprudência pátrias, não como regra geral e com as 232 O novo Código Civil dispôs em seu art. 421: "A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato". 116 pretensões longitudinais de agora, mas apenas como exceção, assentada fundamentalmente na eqüidade. O Tribunal de Justiça de Santa Catarina233, ao decidir pela procedência da ação de indenização proposta pela vítima do segurado diretamente em face da companhia seguradora, nos termos em que esta se obrigara para com o seu cocontratante, o fez com fundamento na função social do contrato. O caso foi julgado em junho de 1999, o princípio da relatividade dos efeitos do contrato veio à tona a propósito da discussão acerca da legitimidade passiva de uma companhia de seguros em ação movida, não pelo segurado, mas pelo terceiro vitimado. A tese da seguradora, buscando a sua exclusão do pólo passivo da relação contratual, foi a de que: “... em nosso sistema jurídico, a vítima de acidente, sendo terceiro em relação ao seguro facultativo, tem direito próprio contra a seguradora, porque a obrigação decorrente do contrato de seguro só vincula as partes que nela figuram, sendo, por isso, inviável a ação direta do terceiro prejudicado contra a seguradora”. O acórdão, no entanto, entendeu descabida a tese da agravante, e assim o fez por considerar que a função social do contrato de seguro autorizava, na hipótese concreta, fosse excepcionado o princípio da relatividade. Para Nelson Borges234, embora hoje não tenha mais a força que lhe foi conferida pelo artigo 1.134 do CC francês (1904)235, o princípio pacta sunt servanda ainda é um dos vetores importantes da contratação, razão por que talvez a função social devesse ser considerada apenas como um limite para os efeitos do contrato e não — como pretendeu o art. 421 — sua razão de ser. 233 TJSC. Agravo de Instrumento nº 99.004.384-3 (Araranguá), 4ª CC, Re. Des. Pedro Manoel Abreu, 30/6/99. Nelson Borges. Os contratos de seguro e sua função social. A revisão securitária no novo Código Civil. p. 28. 235 Art. 1.134 do Código Civil Francês: “Les conventions légalement formées tiennent lieu de loi à ceux qui les ont faites. Elles ne peuvent être révoquées que de leur consentement mutuel, ou pour les causes que la loi autorise. Elles doivent être exécutées de bonne foi”. Tradução livre: As convenções (acordos de vontade) legalmente constituídas têm força de Lei entre as celebrantes. Elas não podem ser revogadas senão por mútuo acordo ou por causas que a Lei autorize. Elas devem ser executadas de boa fé. 234 117 Olímpio Costa Júnior236, a respeito do envolvimento de terceiros, explicou que se as normas jurídicas são regras de conduta, o sistema jurídico de Direito Positivo é o conjunto sistemático de normas que regulam situações da vida social, da conduta humana em sua interferência intersubjetiva, seja direta ou indireta. Direta quando envolve sujeito de direito e deveres correlatos, indireta quando se refere reflexivamente a terceiros. Verifica-se, assim, que o direito não está apenas centrado funcionalmente em torno do conceito de pessoa, mas também seu sentido e finalidade visando a sua proteção. 237 Sobre a verdadeira natureza das contratações, L. E. Fachin238 esclarece que quem contrata não contrata mais apenas com quem contrata, e quem contrata não contrata mais apenas o que contrata; há uma transformação subjetiva relevante nos negócios jurídicos. Na visão desse autor, os elementos representativos da função social dos contratos de seguro residem na comutatividade e, principalmente, na mutualidade. A esses elementos já, então, compondo os alicerces de sustentação dessa forma de convenção devem ser acrescentados, ainda, o risco e a boa-fé, identificada esta última como a “alma da contratação”. Embora a tendência das pessoas que já encontraram dificuldades no trato com as seguradoras seja a de não reconhecer que aqueles pactos desempenham relevante papel no contexto societário, há muitos séculos, equiparando aos bancos as empresas especializadas nesse ramo, injustamente, 236 Olímpio Costa Junior. A relação jurídica obrigacional. São Paulo: Saraiva. 1994. p. 10. E. Cortiano Junior. Alguns apontamentos sobre os chamados direitos da personalidade. In Luiz Edson Fachin (coord.), Repensando fundamentos do direito civil brasileiro contemporâneo. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. p. 53. 238 L. E. Fachin. Repensando fundamentos do direito civil brasileiro contemporâneo. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. p. 318. 237 118 diga-se, a realidade de nossos dias vem apontando, cada vez mais para o sentido contrário. De Plácido e Silva239 nos fornece uma idéia de mutualidade, nos seguintes termos: “(...) derivado de mutual (recíproco), exprime o regime de cooperação adotado em certas espécies de sociedades, em que os próprios sócios são aqueles que se inscrevem para concorrer aos benefícios distribuídos pela sociedade. Nelas, assim, em princípio, não há capital: este será composto pelas reservas constituídas pelos lucros da sociedade que, não possuindo sócios, não os distribui. Aos sócios dela, que são precisamente as pessoas que tomam inscrição para concorrer aos seus benefícios, em regra constante de seguros, construções de prédios, dáse o nome de mutualistas”. Nelson Borges240 destaca que mutualismo, além de implicar, no plano subjetivo, na idéia de solidariedade, induz, de pronto, sob o prisma objetivo, à concepção de um agrupamento sujeito aos mesmos riscos ou perigos, com as mesmas probabilidades de dano, razão da associação e formação de um colegiado aparelhado para o enfrentamento de eventuais prejuízos que possam sofrer os chamados mutualistas. A função da companhia seguradora será apenas de gerenciar o fundo previdenciário, de natureza eminentemente comunitária, verdadeira poupança coletiva, constituída pelos participantes por via do recebimento e gestão dos prêmios estabelecidos, pagando as indenizações devidas, depois de regularmente processadas e comprovadas suas legitimidades, recebendo uma remuneração por esse serviço. 239 De Plácido e Silva. Vocabulário Jurídico. Rio de Janeiro: Forense, 1986. p. 483. Nelson Borges. Os contratos de seguro e sua função social. A revisão securitária no novo Código Civil. São Paulo: RT 826/25. 2004. p. 29. 240 119 Esse também o pensamento de Sérgio Cavalieri Filho241 (1998: 86) para quem o segurador moderno é um administrador de fundos mutuais; a rigor, não entra com dinheiro próprio para cobrir ou garantir riscos dos outros, mas, sim com o trabalho, técnica e experiência capazes de propiciar adequada gestão a esses fundos. A mutualidade, portanto é suporte econômico essencial em toda operação de seguro: haverá sempre um grupo de pessoas expostas aos mesmos riscos que contribuem, reciprocamente, para reparar as conseqüências dos sinistros que possam atingir qualquer uma delas. A respeito do tema, Ernesto Tzirulnik242 afirma que o segurador é o administrador de um fundo coletivo, formado pela pluralidade de segurados expostos a riscos homogêneos, visando a garantir cada uma das unidades. A prestação devida pelo segurador desde cada vinculação é a garantia de que, realizando o risco previsto, haverá um aporte capaz de indenizar o dano dai decorrente, obviamente na medida dos limites de garantia desejados, quando da adesão individual ao vinculo geral securitário. A existência de dois elementos fundamentais nos contratos de seguro parece ser a prova definitiva da sua função social, desde que foram criados: a comutatividade e o mutualismo. Na comutatividade sempre se encontrou inserta uma louvável preocupação com o equilíbrio das prestações, mesmo no plano subjetivo, de forma que os contratantes pudessem, tanto quanto possível, se sentir seguros quanto ao fato de que a prestação de um deveria encontrar correspondência na contraprestação do outro. 241 Sérgio Cavalieri Filho. 1º Fórum do Direito do Seguro – José Sollero Filho. Estudos de direito do seguro. coordenado pelo Instituto Brasileiro de Direito do Seguro - IBDS. São Paulo: Max Limonad. 1998. p. 86. 242 Ernesto Tzirulnik. Regulação do sinistro. Ensaio Jurídico. 3. ed. São Paulo: Max Limonad, 2001. p. 58. 120 Para Ernesto Tzirulnik243, a comutatividade do contrato tem por base justamente o reconhecimento de que a prestação do segurador não se restringe ao pagamento de uma eventual indenização (ou capital), o que apenas se verifica no caso de sobrevir lesão ao interesse garantido em virtude da realização do risco predeterminado. Tal prestação consiste, antes de tudo, no fornecimento de garantia e é devida durante toda a vigência material do contrato. A comutação ocorre entre prêmio (prestação) e garantia (contraprestação). No mutualismo (ratio essendi das contratações securitárias), sempre existiu um alargamento implícito e consentido da responsabilidade e dos interesses de quantos fizessem parte do grupo, de tal sorte que a efetiva e pontual contribuição de cada um para a formação do fundo previdenciário solidificasse e energizasse a garantia de todos. O curioso da mutualidade é que uma empresa seguradora poderá ter cinqüenta mil associados, estar em plena atividade na mais perfeita e acabada regularidade atuarial de pagamentos dos prêmios mensais, sem que nenhum dos participantes tenha conhecimento — ou precise ter — da existência do outro, na comprovação da existência da mais elementar boa-fé, implícita na adesão silenciosa e não questionada das partes contratantes. Por este prisma, fica bastante claro que não existe seguro de uma só pessoa com uma empresa seguradora, porque nessa hipótese haveria a supressão de um de seus alicerces e principal elemento, que é sua natureza mutual. Eros Roberto Grau 244 faz uma distinção entre normas públicas voltadas para o estabelecimento de um regime de segurança social, fundado em princípios como o da publicidade, o da legalidade, o do processo devido, o da supremacia do interesse público, entre outros, de 243 Ernesto Tzirulnik. O contrato de seguro. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003. p. 30. Eros Roberto Grau. Responsabilidade do estado: sociedades de crédito imobiliário: isonomia e regulamentação. In Revista de Direito Público, São Paulo: RT, n. 92, p. 253. 244 121 uma outra ordem por igual cogente e relevante, mas que deriva do fenômeno da necessária intervenção do Estado no domínio econômico. Entende que a adoção de técnicas de intervenção do Estado no domínio econômico, em suas diversas modalidades, é conseqüente à disponibilidade de conhecimento que permitem a implementação de racionais políticas públicas. Para esse autor a dinamização de tais políticas (públicas) racionais envolve não meramente a preservação da paz social, porém a perseguição de determinados fins, nos mais variados setores da atividade econômica. O conjunto dessas técnicas importa a renovação dos princípios que ditam o liberalismo econômico, porque aí, a regulamentação das atividades empreendidas, por determinados agentes econômicos, em determinados setores, alinhada ao sentido de promover a realização de resultados econômicos que se projetem em benefício do conjunto social. Paradigmática foi a definição de contrato apresentada por Carlos Cossio245 quando disse que um contrato começa e termina como conduta compartilhada dentro de um mesmo projeto de existência que ambas as partes tenham co-projetado. Nessa linha pode ser incluído o solidarismo, de Louveau246, ao procurar demonstrar que as partes contratantes não deveriam se postar como adversários, mas sim como "companheiros associados", com vistas à obtenção de um fim, por eles determinado de comum acordo. 245 Carlos Cossio. La teoria de la imprevisión. Buenos Aires: Abeledo Perrot, 1961 (Colección Monografias Jurídicas, n. 56). p 41. No original “(...) un contrato comienza y termina como conducta compartida dentro de un mismo proyecto de existência que ambas as partes han coproyectado”. 246 R. Loveau. La revisión dês contrats para lê juge. Travaux de la semaine internationale de droit. Paris. Revista Forense. Vol XXXVI, 1937. p. 15-16. 122 Também para Emílio Betti247, o direito das obrigações deveria sofrer uma releitura e, conseqüentemente, ser traduzido como vínculos de cooperação social, idéia inicialmente desenvolvida por Francesco Ferrara248, na década de 30. Quando se fala em cooperação social, a primeira idéia que surge é a de auxílio mútuo no âmbito do comportamento societário. Neste sentido, a conclusão óbvia que se impõe é a de que no universo obrigacional o titular de um direito creditório não tem condições de satisfazer seus interesses sem a colaboração do devedor, e vice-versa. 249 Luiz Alberto de Carvalho Fernandes250 foi um dos grandes responsáveis pela teoria da socialização do Direito, também conhecida como de cooperação social. A concepção tinha como fulcro o viver com intensidade a existência em sociedade, deixando em segundo plano os interesses particulares, colocando acima de tudo os superiores reclamos do objetivo societário. Disseram seus autores que a justiça da doutrina surgiu na consciência como via de inspiração imperativa em muitos casos práticos, ainda que permanecessem ocultas as razões técnico-jurídicas de sua sustentação, às quais se poderia chegar por simples intuição. Para Carlos Cossio251, jurista argentino, autor da Teoria egológica do direito, todo contrato se encontra em uma determinada situação porque a existência humana está ontologicamente ligada a ela. A confirmação da assertiva pode ser obtida por via da simples tentativa de desvincular o homem — ou o contrato — do contexto situacional em que ele se encontre e, em 247 Emílio Betti. Teoria generale delle obbligazioni. p. 5-14. Francesco Ferrara. Trattato di diritto civile italiano. v. 1. Editora Athenaeum. Roma. 1921. p. 375 e seg. 249 Nelson Borges. p. 232. 250 Luís Alberto de Carvalho Fernandes. A teoria da imprevisão no direito civil português. Boletim do Ministério cia Justiça. Coimbra, n. 128. p. 128-129. jul. 1963. 251 Carlos Cossio. La teoria de la imprevisión. Buenos Aires: Abeledo Perrot, 1961 (Colección Monografias Jurídicas, n. 56). p 32. 248 123 seguida, pretender interpretá-lo ou aplicá-lo. De imediato se constatará ser esta uma verdadeira missão impossível. A doutrina de Cossio é de natureza fenomenológica (porque estrutura da consciência na constituição dos objetos) e cultural (por ser resultante de um conhecimento transmitido), considerada como uma das grandes formulações no campo do solidarismo consubstancia, em alto nível, a socialização do direito. Na opinião de Giuseppe Bavetta252, o seguro tem uma enorme relevância social, motivo pelo qual a proteção da massa de segurados se traduz, principalmente, na proteção de cada segurado. Assim sendo, na afirmação de que o contrato exerce uma função social, o que se quer significar, em suma, é que deve ser socialmente útil, de modo que haja interesse público na sua tutela. 5.3. FUNÇÃO ECONÔMICA DO SEGURO253 Ao lado da função social, destaca-se o fundamento econômico do seguro que é a mutualidade. 252 Giuseppe Bavetta. L’impeza di assicurazione. Milão: Giuffrè, 1972, p. 3. No original: Che in tal modo si finisca anche com il tutelare il singolo assicurato, rientra nei fini pratici programmati dal legislatore e consacrati nel complesso sistema delle assicurazione: che, com’è obbio, sul piano pratico, la tutela della massa deglis assicurati si traduce sostanzialmente e principalmente appunto nella tutela del singolo (assicurato): tutela, che nom viene ad esse pregiudicata ma che, anzi, ne esce rafforzata. Non può tuttavia perdersi di vista che al fenômeno assicurativo é stato dato um asseto del tutto speciale: esso riguarda non quest’altro assicurato, mas la massa di essi. De tale punto di vista, dunque, l’assicurazione há um’indubbia rilevanza social. Tradução livre: Que em tal modo se encerra também com a tutela ao segurado singular, entrando nos fins práticos e programáticos do legislador e consagrados no complexo sistema de seguros: que como é óbvio, sob plano prático, a tutela da massa dos segurados se traduz substancialmente e principalmente na tutela do singular (segurado): tutela que não vem a ser prejudicada mas que, também, não é reforçada. Não pode todavia perder-se de vista que o fenômeno do seguro é estabelecido a partir de um acerto todo especial: esse cuidado não está dirigido a qualquer dos segurados, mas à massa deles. De tal ponto de vista, portanto, o seguro tem indubitavelmente, uma relevância social. 124 Embora figurem no contrato de seguro apenas dois contratantes, segurador e segurado, o seguro é uma operação coletiva de garantia solidária; de um lado estão inúmeras pessoas reunidas por um processo de mutualismo, todas poupando pequenas quantias; de outro lado está o segurador, administrando essa poupança, por sua conta e risco, e destinando-a, quando preciso àqueles que dela necessitam em razão de prejuízos. Trata-se de um sistema não tão complexo, em que um grupo de pessoas com interesses comuns somam suas forças para a formação de um fundo único, cuja finalidade é suprir, em determinado momento, necessidades eventuais de alguns dos seus membros afetados por um acontecimento imprevisto. Sistema que se baseia na entidade mútua, na contribuição de todos para benefício individual de cada um dos contribuintes. 254 Esse grupo de pessoas, que se unirão, contribuindo para a formação do citado fundo, pode ser de diferentes países e nacionalidades. Da mesma forma que podem se aglutinar em razão de um fator único de concentração, como, por exemplo, funcionários de uma mesma empresa ou entidade, associados de um mesmo clube ou associação, podendo ser também pessoas totalmente desconhecidas umas das outras, sem nenhum outro fator de agregação que não o objetivo maior de prevenir riscos futuros através da criação de um fundo (mutualidade) específico. O mutualismo tem um sentido coletivo, ou seja, as cotas pagas por cada um, somadas, são as que garantem a substituição do bem perdido por alguns dos participantes. Para que isso ocorra, contudo, muitos segurados que participam deste fundo provavelmente nunca venham a ser atingidos por um 253 254 Vide: Pedro Arruda França. Contratos atípicos. Rio de Janeiro. Ed. Forense. 2000. p. 18. Dicionário Eletrônico Houaiss Da Língua Portuguesa, versão 1.0. 125 sinistro. Mas quando o seguro é contratado espera-se realmente que nem todos tenham o infortúnio de sofrer um prejuízo a ser ressarcido, porque senão os recursos arrecadados não serão suficientes para cobrir todos os prejuízos. O objetivo, sempre, é a prevenção de um evento futuro, que pode ou não acontecer. Na verdade, espera-se que não aconteça com todos os participantes do fundo. Todos contribuirão para que apenas alguns recebam as indenizações. Como o evento danoso não é sabido, é totalmente eventual, ninguém sabe quem sofrerá o infortúnio, todos têm interesse em participar e resguardar seus bens. Então pagamos uma quantia em dinheiro para formação de um fundo, que nos pagará uma indenização a fim de repormos aquele bem perdido. Muitas pessoas contribuem para esse fundo mútuo, sendo que, pelas probabilidades, nem todas sofrerão infortúnios, somente algumas, e assim esses recursos serão usados para reposição dos bens perdidos, de forma suficiente. Este é o princípio do mutualismo. 255 A prática desse princípio acompanha a história humana na face da terra desde que o homem começou a se preocupar com os efeitos dos acontecimentos que o afetam em sua vida cotidiana. Sérgio Cavalieri Filho256 esclareceu que: “(...) o segurador moderno é um administrador de fundos mutuais; a rigor, não entra com dinheiro próprio para cobrir riscos dos outros, mas, sim com o trabalho, técnica e experiência capazes de propiciar adequada gestão a esses fundos. A mutualidade, portanto, é suporte econômico essencial em toda operação de seguro: haverá sempre um grupo de pessoas expostas aos mesmos riscos que contribuem, reciprocamente, 255 Antônio Márcio da Cunha Guimarães. Contrato de seguro contra seqüestro. RT 806/731. 2002 Sérgio Cavalieri Filho. 1º Fórum do direito do seguro – José Sollero Filho. Estudos de direito do seguro, coordenado pelo Instituto Brasileiro de Direito do Seguro – IBDS. São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 86. 256 126 para reparar as conseqüências dos sinistros que possam atingir qualquer uma delas”. No mesmo sentido, Ernesto Tzirulnik257 ensina que: “O segurador é o administrador de um fundo coletivo, formado pela pluralidade de segurados expostos a riscos homogêneos, visando a garantir cada uma das unidades. A prestação devida pelo segurador desde cada vinculação é a garantia de que, realizando o risco previsto, haverá um aporte capaz de indenizar o dano daí decorrente, obviamente na medida dos limites de garantia desejados, quando da adesão individual ao vínculo geral securitário”. A mutualidade, no dizer de Munir Karam258, é suporte econômico essencial em toda operação de seguro, haverá sempre um grupo de pessoas expostas aos mesmos riscos, que contribuem, reciprocamente, para reparar as conseqüências dos sinistros que possam atingir qualquer uma delas. No entanto, adverte o mesmo autor, com a chamada funcionalização dos institutos jurídicos, não é mais possível deixar de conceber o contrato em seu aspecto intrínseco, regulando os interesses dos contratantes, e extrínseco, pois, atinge, sem dúvida, interesses de um todo, retraçado pelo caráter da mutualidade. Uma sociedade em que se superou o Estado puramente liberal para bradar os princípios de uma solidariedade social, o Estado social-democrático. Este é o sentido do novo Código Civil ao destacar a eficácia social dos negócios jurídicos: contrato do ponto vista intrínseco (lei entre as partes contratantes) e extrínseco (a sua repercussão no meio social), o que nos leva a reconhecer que tamanha é a importância dos contratos como fato econômico, que sua disciplina jurídica constitui a estereotipação do regime a que se subordina a economia de qualquer comunidade. 257 258 Ernesto Tzirulnik. Regulação de sinistro. 3. ed. São Paulo: Max Limonad, 2001. p. 58. Munir Karam. Do contrato de seguro no Código Civil: noções fundamentais. RT 834/74. 127 A função econômico-social do contrato foi reconhecida, ultimamente, como a razão determinante de sua proteção jurídica259. Mas para que a mutualidade acima descrita possa efetivamente ser identificada a comutatividade do contrato de seguro se apresenta como o ponto a ser destacado. 5.4. COMUTATIVIDADE A advertência acerca da comutatividade do contrato de seguro se afigura de especial importância, já que, sendo a prestação de garantia a atividade principal da seguradora, é esta exercida, desde o início da relação contratual, com base nas finanças colhidas junto à coletividade de segurados, nos ativos que imobiliza para assegurar a solvabilidade da empresa que exerce. Comutativo diz-se do contrato cujas prestações recíprocas a que se obrigam os contratantes são perfeitamente equivalentes. 260 Ensina Maria Helena Diniz261 que nos pactos comutativos, as partes podem antever o que receberão em troca das prestações que realizarem, por haver certeza quanto às prestações e cada prestação corresponder a uma contraprestação, não sendo, porém, necessário que haja uma absoluta igualdade entre tais valores, já que os bens que são objeto do contrato poderão não possuir uma valoração precisa. 259 Orlando Gomes. Contratos. 12ª ed. Editora Forense. 1992.p. 20. Dicionário Eletrônico Houaiss Da Língua Portuguesa, versão 1.0. 261 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. Teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 20ª. Ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2004. p. 89. 260 128 Hipótese que não vislumbra nos contratos aleatórios, onde com a intervenção do risco, há uma extensão indeterminada das prestações, dependente de um evento casual, incerto e desconhecido, sem o qual jamais serão exigíveis, uma vez que pode advir vantagem para uma parte e perda para a outra. O montante das prestações não pode ser previsto, e muito menos pode ser, desde logo, definido por ocasião da elaboração do contrato. Há incerteza para as duas partes sobre se a vantagem esperada será proporcional ao sacrifício, expondo os contratantes à alternativa de ganho ou de perda, podendo ser a contraprestação desproporcional ao valor da prestação. Aponta que os vícios redibitórios se referem, unicamente, aos contratos comutativos262 e que as regras do Código Civil, arts. 458 a 461 são aplicáveis tão somente aos contratos aleatórios. Lembra que a rescisão por lesão não tem lugar nos aleatórios, mas apenas nos comutativos, segundo as legislações que adotam esse instituto e explica que a lesão consiste na injusta exploração da situação econômica, jurídica ou moral de uma das partes, em razão da qual vem esta a receber contraprestação desproporcionada à que efetuara, permitindo a rescisão dos contratos comutativos. Todavia, adverte Maria Helena Diniz, conforme lição de Washington de Barros Monteiro263, que nosso legislador não mais considera esse instituto, de maneira que, se o contrato causar enorme prejuízo para um dos contraentes, tornando excessivamente oneroso o encargo assumido, não se tornará nulo, ressalvando-se a hipótese prevista na Lei n. 1.521/51, art. 4º, b, regulamentada pelo Decreto n. 48.450/60 (ora revogado pelo Decreto s/n., de 10-5-1991). 262 Código Civil: Art. 441. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor. Parágrafo único. É aplicável a disposição deste artigo às doações onerosas. 263 Washington de Barros Monteiro. Curso de direito civil. v. 5. 29ª. ed., São Paulo: Saraiva. 1997. p. 71 e 72. 129 Acrescenta que há contratos comutativos que podem ser transformados em aleatórios, se houver cláusula explícita, que introduza o elemento incerto, dependente da sorte. P. ex.: se o dono de um imóvel faz um contrato de empreitada com alguém para a abertura de um poço que deverá fornecer a quantidade mínima de 20 mil litros de água, ajustando que o empreiteiro nada receberá se o poço não produzir a quantidade desejada264. Segundo Nelson Borges265, os contratos de seguro, no campo classificatório, enquadram-se no gênero execução diferida, na espécie continuada ou sucessiva, em estreita correlação e dependência com a modalidade estabelecida para pagamento dos prêmios (à vista ou a prazo), livremente estabelecidas pelas partes. Assim, se a prestação do segurado for à vista, subsistirá como diferida apenas a obrigação da seguradora, que se renova a cada instante normalmente pelo prazo de doze meses, definindo-se a contratação diferida como inserta na modalidade em que uma das partes presta no ato da vinculação e a outra irá contraprestar no curso da execução, princípio, meio ou fim, mas sempre condicionada à ocorrência do sinistro; se o pagamento dos prêmios pelo segurador for dividido em prestações mensais (como é mais comum), o que se terá é a mesma execução diferida apenas com a diferença de que ambos irão cumprir suas respectivas obrigações no futuro, mas em tempos diferentes: o segurado, todos os meses, em datas prefixadas na contratação; a seguradora, apenas diante da comprovada ocorrência do sinistro e, logicamente, do regular cumprimento das obrigações assumidas pela outra parte. Enquanto isso permanece latente e viva a garantia da indenização que, de resto, representa a essência do objeto da relação contratual securitária. 264 Washington de Barros Monteiro. Curso de direito civil. v. 5. 29ª. ed., São Paulo: Saraiva. 1997. p. 72. Nelson Borges. Os contratos de seguro e sua função social. A revisão securitária no novo Código Civil. RT 826/25. São Paulo: Ed. RT, 2004. p. 35. 265 130 Para esse autor a aleatoriedade dos contratos de seguro por muito tempo foi a corrente dominante na doutrina brasileira. Explica que entenderam seus defensores que o caráter de incerteza, a dúvida contida na ocorrência ou não do sinistro é que deveria ser o objeto da contratação. Este, conseqüente a seu caráter indeterminado, deveria ser classificado como aleatório, uma vez que a álea, que a tudo se sobrepunha, assentava-se na "sorte", na imprecisão dos fatos (ocorrência ou não do sinistro), única razão de ser da contratação, postura então aceita majoritariamente pelos juristas. Nelson Borges chama essa visão de distorcida e pouco fiel à verdadeira identificação sobre qual seria o real objeto da convenção e que aos poucos perdeu sentido e espaço, podendo, hoje, ser afirmado com absoluta segurança: os contratos de seguro, por sua natureza, são pactos comutativos de garantia. A comutatividade e a mutualidade neles contida leva a essa conclusão, sem grande esforço. Na visão desse autor, o que houve, na velha concepção, foi nada mais do que um desvio do real enfoque sobre qual seria o verdadeiro objeto daquelas convenções. Destaca que não é a ocorrência ou não do sinistro que dá corpo e alma ao objeto da contratação, mas sim a garantia da indenização, que é constante e imutável ao longo de toda a vida contratual. A verdade incontestável é a de que a seguradora contrapresta no momento em que celebra o contrato. E isso pode ser observado nas convenções securitárias ao ser determinado por elas prazos fixos e determinados para o início da segurança, da garantia contratada. E isso se constata na diligente preocupação dos corretores em informar que mesmo depois de assinado o contrato, a validade da cobertura só se inicia a partir da meia-noite daquele dia. E essa garantia, essa 131 segurança, vai existir ao longo da contratação, independentemente da ocorrência ou não do sinistro que, a rigor, nada mais é do que o ponto de referência, a efetiva pedra de toque para o desencadeamento do processo indenizatório. Sérgio Cavalieri Filho266 observa que essa segurança é mais importante para o segurado do que a própria indenização a que eventualmente terá direito. Assim, cumpre sua obrigação contratual a seguradora que mantém, durante o curso de suas atividades, a solvabilidade necessária para garantir a coletividade segurada contra a verificação dos riscos cobertos. É preciso sempre lembrar que a seguradora exerce a administração de um fundo comum, formado pela soma das contribuições individuais das unidades econômicas conformadoras da coletividade segurada. O gerenciamento irregular ou malversação desse fundo gera prejuízos não somente para o segurador, mas, em especial, para os próprios segurados, à medida que ameaça o tesouro destinado a assegurá-los. Uma das mais graves ameaças à necessária solvabilidade do sistema segurador é a quebra da sua base técnico-atuarial. E dentre as causas dessa ameaçadora ruptura está a imperita gestão dos fundos, que certamente ocorre quando há manuseio não técnico da garantia, quando se troca a solução adequada à mutualidade pela solução típica das relações individualizadas. O pagamento de indenizações além do previsto diminui o fundo comum e, via de consequência, projeta revisão futura dos prêmios, que acabam sendo majorados. As vezes leva seguradores à bancarrota. Mas é compreensível hodiernamente essa situação. Compreende-se, por exemplo, que o pagamento de 266 Sérgio Cavalieri Filho. 1º Fórum do direito do seguro – José Sollero Filho. Estudos de direito do seguro, coordenado pelo Instituto Brasileiro de Direito do Seguro – IBDS. São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 87. 132 indenizações excedentes ao previsto atuarialmente tenha ocorrido porque o presumidamente inofensivo sinistro acabou revelando magnífico potencial danoso. Já o pagamento que excede porque foi feito além do devido, não há suporte que possa justificá-lo. Consiste em tratamento injustiçoso da massa de prêmios formada pela coletividade. Tem o segurador o dever contratual e normativo de zelar pela mais absoluta preservação da estabilidade do fundo comum. Tal implica adotar medidas que, de um lado, confiram ao segurado vítima de sinistro a imediata reconstituição do status quo ante e, de outro, imponham ao fundo administrado o menor gravame possível. Assim, deve o segurador cuidar para que a indenização seja o mais rapidamente possível prestada ao segurado e, igualmente, deve envidar esforços para que o fundo comum seja diminuído o menos possível, evitando, em exemplo que é oportuno, prestar ao segurado mais do que o sinistro lhe tirou. Conrado Etchebarne267 ressalta as seguintes considerações imprescindíveis para o exato entendimento do direito do seguro e seu alcance social: a) as reservas que manipulam as companhias de seguros são muito superiores aos capitais nelas aportados; b) as enormes somas de dinheiro de que dispõem as empresas de seguro são provenientes de poupança pública, que merece a máxima proteção; e c) a diferença que ocorre em outras atividades, onde quem adquire um produto pude examiná-lo e controlar sua qualidade, no seguro, o segurado é um comprador de segurança ou de garantia e não se fala 267 Conrado Etchebarne. El control por el estado de las empresas de seguro. Revista Del Derecho Comercial y de Las Obligaciones. Buenos Aires: Depalma, 1970, ano 3, p. 675. No original: "a) las reservas que manejan las companhias de seguros son muy superiores a los capitales en ellas aportados; b) las enormes sumas de dinero de que disponen las empresas de seguro provienen dei ahorro público, que merece la máxima protección; y c) a diferencia de lo que ocurre en otras actividades, donde quien adquiere un producto puede examinarlo y controlar su calidad, en el seguro, el asegurado es un comprador de seguridad o de garantia y no se halla en condiciones de conocer si tal garantia es real o ilusória, ya que ninguna intervención le compete en la actividad de la empresa aseguradora". 133 em condições de conhecer se tal garantia é real ou ilusória, já que nenhuma intervenção lhe compete na atividade da empresa seguradora. Ernesto Tzirulnik268 sublinhou ser indispensável a advertência sobre a comutatividade do seguro, pois se a obrigação da seguradora é prestar garantia, logo ela o faz desde o início da relação contratual, com base nas finanças colhidas junto à coletividade de segurados, nos ativos que imobiliza para assegurar a solvabilidade da empresa que exerce, em geral e, também, em relação a cada contrato que celebra. E não, essencialmente, pagando ou deixando de pagar determinada indenização. Ao negar a aleatoriedade nesses pactos, reconhecendo neles apenas uma natureza comutativa de garantia, acertadamente muitos juristas entenderam que a responsabilidade da seguradora é garantir a indenização do segurado, inexistindo nessa operação quaisquer indeterminações conseqüente à predeterminação pelas partes do objeto da contratação, específica e identificada aprioristicamente, estabelecida por via de cálculos atuariais que, em momento algum, abrem espaços para dúvidas ou incertezas. Em conclusão: os contratos de seguro são pactos comutativos de garantia em que uma das partes (seguradora) se compromete a indenizar a outra (segurado) ocorrendo o sinistro previamente determinado, desde que esta se encontre regularmente em dia com suas obrigações securitárias (pagamento dos prêmios), sendo essa garantia a própria contraprestação estabelecida, comportando revisão normal na forma do art. 6.°, V, do Código de Defesa do Consumidor, ou anormal quando atingidos por evento reconhecidamente imprevisível (arts. 317, 478 a 480 do CC), desde que presentes também seus outros pressupostos de admissibilidade, nos quais comutatividade e mutualidade consubstanciam funções sociais perfeitas e acabadas, uma vez que neles não existe qualquer álea, dúvidas ou espaços cinzentos encobertos por sombras de incerteza, porque o objeto da contratação é 134 a garantia de indenização que uma das partes oferece à outra, previamente estabelecida e identificada, diante da ocorrência de sinistro constante do elenco probabilístico, expresso na vinculação que deu origem àquela convenção sui generis. 5.5. CONTRATO POR ADESÃO O contrato de seguro está incluído entre os contratos por adesão.269 Realmente, o segurado não participa da elaboração de suas condições gerais. Foram elas preparadas pelo segurador, tendo em vista a experiência de cada ramo. Em alguns casos, como o seguro marítimo, foram elaboradas durante séculos. Em todo contrato de seguro, além das condições gerais, geralmente impressas, há também condições datilografadas que podem modificar as condições impressas para atender a peculiaridades dos riscos cobertos. Não chegam, todavia, a alterar a feição do contrato que continua sendo por adesão. Maria Helena Diniz270, prefere a expressão por adesão, como sendo mais consentânea com a natureza do instituto, pois forma-se com a aceitação pelo segurado, sem qualquer discussão, das cláusulas impostas ou previamente estabelecidas pelo segurador na apólice impressa, e as modificações especiais que se 268 Ernesto Tzirulnick. Apontamentos sobre a operação de seguros. Revista Brasileira de Direito de Seguros. São Paulo. 1998. p. 43. 269 César Fiúza. Contratos de adesão de acordo com o Código Civil. Belo Horizonte. Ed. Mandamentos. 2002. p. 64. 270 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro, v.3. p. 519. 135 lhe introduzirem são ressalvas que o segurador insere por carimbo ou justaposição, ou seja, se constitui pela adesão da vontade de um oblato indeterminado à oferta permanente do proponente ostensivo. Isto porque o seguro, por ser indenizatório, não pode dar vantagens ao beneficiário, de modo que se locuplete às custas do segurador. Em vista disso, o segurado não poderá receber indenização que supere o valor do interesse ou objeto segurado no momento da conclusão do contrato, sob pena de perder o direito à garantia, além de ficar obrigado ao prêmio vencido (CC, arts. 778 e 766), com exceção de seguro sobre a vida (CC, art. 789), que, por ser bem inestimável, se permitirá convencionar livremente a fixação do valor e fazer mais de um seguro, com o mesmo ou diversos seguradores. Ensina Maria Helena Diniz271 que os contratos por adesão constituem uma oposição à ideia de contrato paritário, por inexistir a liberdade de convenção, visto que excluem a possibilidade de qualquer debate e transigência entre as partes, uma vez que um dos contratantes se limita a aceitar as cláusulas e condições previamente redigidas e impressas pelo outro, aderindo a uma situação contratual já definida em todos os seus termos. Assim, esses contratos ficam, portanto, ao arbítrio exclusivo de uma das partes — o policitante —, pois o oblato não pode discutir ou modificar o teor do contrato ou as suas cláusulas. No dizer de Maria Helena Diniz, é o que ocorre com: os contratos de seguro (RT, 487:181); os de venda das grandes sociedades; os de transporte; os de fornecimento de gás, eletricidade, água (estes são tidos como contratos coativos); os de diversões públicas; os de financiamento bancário. 271 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. Teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. v.3. p. 93. 136 Aponta Maria Helena Diniz272 que os contratos por adesão supõem: 1°) uniformidade, predeterminação e rigidez da oferta. A uniformidade é uma exigência imprescindível, pois, se o ofertante pretende obter número indeterminado de aderentes para que haja aceitação passiva, será preciso que o conteúdo do contrato seja invariável. A predeterminação unilateral das cláusulas contratuais e a rigidez das condições gerais caracterizam os contratos por adesão. As suas cláusulas deverão ser rígidas, porque deverão ser uniformes; portanto, o ofertante não poderá alterar o teor da policitação senão precedendo-o de ampla divulgação ou aprovação das autoridades (nas hipóteses em que estas controlem tais contratos, como ocorre com as tarifas de transportes, de serviços de luz, telefone etc.). Esses três traços possibilitarão identificar esses contratos; 2º) proposta permanente e geral, aberta a quem se interessar pelos serviços do proponente, dirigindo-se a um grupo indeterminado de pessoas. Assim sendo, o contrato se forma com qualquer pessoa, a não ser naqueles casos em que se permitem ressalvas, como, p. ex., no da empresa de transporte, que não pode ser obrigada a admitir passageiro além da lotação do veículo; 3º) aceitação pura e simples do oblato, simplificando, desse modo, a maneira de produzir-se o consentimento; 4°) superioridade econômica de um dos contratantes, que desfruta de um monopólio de fato ou de direito; 5º) cláusulas do contrato são predispostas e fixadas unilateralmente e em bloco pelo policitante, visto que se dirigem a um número indeterminado de pessoas. Lembra Maria Helena Diniz273 que: a) pelo art. 424 do Código Civil, serão nulas as cláusulas, apostas nos contratos por adesão, que estipularem a re272 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. Teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. v.3. p. 93 e seguintes. 137 núncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio, pois a liberdade de contratar deverá ser exercida dentro dos princípios da função social do contrato, probidade e boa fé objetiva e tais cláusulas, além de serem abusivas ou leoninas, geram insegurança contratual; e b) pelo art. 423, resguarda-se a posição do aderente, em relação a cláusulas ambíguas ou contraditórias, adotando-se a interpretação que mais o beneficie, porque o ofertante está em situação mais vantajosa. Para atenuar os excessos, protegendo os mais fracos, o Estado passou a controlar esse contrato, exigindo uma padronização. Assim sendo, as operações de seguro passaram a ser reguladas pelo Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), que estipula índices e condições técnicas sobre tarifas e fixa as características gerais do contrato de seguro274. Competirá à Superintendência de Seguros Privados (SUSEP) "fixar as condições de apólices, planos de operações e tarifas a serem utilizadas obrigatoriamente pelo mercado segurador nacional e aprovar condições de coberturas especiais" (Dec.-lei n. 73/66, art. 36, c e e). A seguradora está submetida ao controle governamental, ao preestabelecer as condições a que o segurado adere. Como a policitação da seguradora já obedece a normas que lhe são traçadas, infere-se que há uma adesão bilateral. Pedro Alvim275 enfatiza que o contrato de adesão, ou por adesão, não surge como o capricho de uma das partes para fazer valer sua vontade preponderante. É a própria natureza da atividade econômica que inspira sua criação. 273 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. Teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. v.3. p. 93 e seguintes. 274 Decreto-lei n. 73/66: Art 32. É criado o Conselho Nacional de Seguros Privados - CNSP, ao qual compete primitivamente: (...) III - Estipular índices e demais condições técnicas sobre tarifas, investimentos e outras relações patrimoniais a serem observadas pelas Sociedades Seguradoras; IV - Fixar as características gerais dos contratos de seguros; (...). 275 Pedro Alvim. O contrato de seguro. p. 437. 138 Na verdade, o aspecto complexo, assumido por algumas relações contratuais (transporte, seguros, diversões públicas etc.), é que as submete a uma regulamentação uniforme, imposta pela conveniência e celeridade na conclusão dos negócios. A intervenção do Estado nas operações de seguros restituiu às partes contratantes a desejada paridade contratual. Nenhuma cláusula de importância é admitida sem a aprovação prévia das autoridades, que levam em conta não só a segurança das operações técnicas, mas, sobretudo, o interesse da coletividade segurada. As apólices são padronizadas. Sua redação obedece a um modelo oficial cujas cláusulas atendem ao interesse da comunidade e da segurança técnica das operações. Nem o segurador, nem o segurado têm liberdade de modificá-las, salvo em questões de menor importância para satisfazer peculiaridades do risco. Não se justifica, pois, qualquer tendência para forçar a inteligência clara das demais condições, com o propósito de favorecer o segurado. No entanto, exatamente porque tem suas cláusulas padronizadas pelo Estado, às quais submetem-se igualmente segurados e seguradores, Ernesto Tzirulnik276 entende que não se trata o contrato de seguro de contrato de típica adesão, na acepção que toma para este gênero contratual os pactos unilateralmente elaborados por uma das partes contratantes, o que, adverte, não retira por si só, sua legitimidade. Como ensina Nelson Nery Júnior277, ao discorrer sobre a tutela contratual do consumidor mediante o controle das cláusulas gerais dos contratos, tal governo tanto pode ser judicial quanto administrativo, sendo que a 276 Ernesto Tzirulnik. Princípio indenitário no contrato de seguro. RT 759/89. 1999. p. 107. Nelson Nery Junior. Da proteção contratual. In Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. Rio de Janeiro: Forense Universitária. CapítuloVI, p. 369. 277 139 segunda forma de controle administrativo se dá pela possibilidade de a administração pública poder exercer seu poder de fiscalização e regulamentação, por meio de decretos, portarias e outros atos administrativos, dirigidos ao estabelecimento de padrões para que os administrados possam exercer a atividade controlada e fiscalizada pelo poder público. E, especificamente a respeito dos contratos de seguro, continua Nelson Nery: “Isso ocorre, por exemplo, com o setor de seguros, que deve obedecer às normas traçadas pela SUSEP (Superintendência de Seguros Privados) ...”. Como se observa, deve a análise da regularidade ou não de determinados dispositivos dar-se em função dos elementos temáticos ali tratados, e não do fato de estarem sendo pactuados através de contrato de tal ou qual conformação. E é justamente semelhante apreciação que confere ao contrato de seguro absoluta legitimidade. Ruben S. Stiglitz278 a propósito, no esteio da melhor doutrina argentina, ensina que o contrato de adesão deve ser examinado desprezandose uma visão prejudicial, pois o fato de ser de adesão é uma característica e não um defeito do contrato. Giorgio Pietro Vianello279, em monografia que dedica ao estudo do controle público sobre o seguro privado, ao tratar sobre os requisitos e medidas da indenização, ressalta que a indenização não deve constituir-se ocasião de lucro para o segurado. 278 Ruben S. Stiglitz. Cláusulas abusivas en el contrato de seguro. Buenos Aires: Abelero-Perrot. p. 27. No original: Se hace indispensable, a esta altura, advertir al lector que el contrato por adhesión debe ser examinado sin una actitud prejuciosa, pues, como se tiene expresado, 'el ser de adhesión es una característica y no uno defecto del contrato. 279 Giorgio Pietro Vianello. Assicurazione privata e controllo pubblico – profili istituzionali di diritto dell’impresa e del contrato di assicurazione. Milão: Giuffrè, 1989. p. 133. No original: Uindennizzo non deve costituire occasioni di lucro per 1'assicurato (cosiddetto 'principio indennitario'). Tradução livre: A indenização não deve constituir ocasião de lucro para o segurado. 140 Note-se a precisa lição de Aurélio Donato Candian280, para quem no seguro de dano é expressa, sob a denominação de princípio indenitário, uma regra que pode ser considerada paralela àquela que preside o critério de ressarcimento do dano na responsabilidade civil, previsão, esta, não isolada mas repetida de tal forma que se eleva à condição de princípio geral de direito dos seguros de dano. Normalmente se sustenta que a referência ao conteúdo da prestação de uma empresa de seguros no ressarcimento do dano individua a função indenitária do contrato de danos. Tal fim indenitário do contrato é deduzido da primeira parte do art. 1882 inspirado nos arts. 1904 e seguintes, cuja razão é essenciamente a de impedir que o contrato seja um meio de obter um enriquecimento ilícito ou estimular a destruição do bem. O princípio indenitário, portanto, previne a degeneração da função do contrato, possível no caso em que 280 Aurélio Donato Candian. Responsabilità civile e assicurazione. Milão: EGEA, 1993; Quantificazione del danno e assicurazione R.C. p. 111-112. No original: (...)"nell'assicurazione del danni è espressa - sotto la denominazione di 'principio indennitario' - una regola che può essere considerata parallela a quella che presiede al critério di risarcimento del danno nella responsabilità civile" ou, ainda, "previsione, questa, non isolata, ma ripetuta in varie forme si da elevaria a principio generalli del diritto delia assicurazioni del danni". "Normalmente si sostiene che il riferimento al contenuto delia prestazione de U'impresa di assicurazioni nel risarcimento del danno individua la funzione indennitaria del contralto di assicurazioni del danni. Tale fine indennitario del contralto desumibile dália prima parte deli' art. 1882 c/c ispira poi gli art. 1904 et seq., la cui ratio è essenziamente quella di impedire che il contrato divenga mezzo per ottenere un illecito arricchimento o per stimolare la distruzioni di beni. Il principio indennitario, quindi, previene la degenerazione delia funzione del contratto, ipotizzabile nel caso in cui esso, invece di essere strumento di reparazioni delia lesione di interessi patrimoniali, provochi 1'eliminazione deli'interesse dell'assicurato a che la lesione no si verifichi o addirittura il sorgere di un suo interesse ai verificarsi delia lesione stessa". "La rivelanza del principio indennitario è stata evidenziata anche con riferimento al principi tecnici deli'assicurazione. L'eventualità, infatti, di un risarcimento superiore al danno efetivo falserebbe gli elementi determinanti del calcoli attuariali. In questo ordine di idee può essere attributo al principio indennitario un significato ancora diverso, cioè di salvaguardia delia funzione previdenziale deli'assicurazione contro i danni". Tradução livre: nos seguros de dano é expresso – sob a denominação de princípio indenitário – uma regra que pode ser considerada paralela àquela que preside ao critério de ressarcimento do dano na responsabilidade civil, ou ainda, previsão esta não isolada, mas repetida em várias formas elevando-se a princípio geral de direito do seguro de dano. Normalmente se sustenta que a referência ao conteúdo da prestação de uma empresa de seguros no ressarcimento do dano individualiza a função indenitária do contrato de seguro de dano. Tal fim indenitário do contrato decorre da primeira parte dos arts. 1882 e 1904 e seguintes, cuja razão é essencialmente aquela de impedir que o contrato seja usado para obter um ilícito enriquecimento ou para estimular a destruição dos bens. O princípio indenitário, depois, previne a degeneração das funções do contrato, hipótese em que este, ao invés de ser instrumento de reparação das lesões dos interesses patrimoniais, provoca a eliminação do interesse do segurado a que a lesão não se verifique ou povoque o surgimento de um seu interesse em que a lesão aconteça. A relevância do princípio indenitário é evidenciada, também, com referência aos princípios técnicos do seguro. A eventualidade de um ressarcimento superior ao dano efetivo violariam os elementos determinados de cálculo atuarial. Nesta ordem de idéias pode ser atribuído ao princípio indenitário um significado ainda diverso, isto é de salvaguarda da função previdenciária do seguro contra dano. 141 o contrato ao invés de ser instrumento de reparação da lesão de interesse patrimonial, provoca a eliminação do interesse do segurado a que a lesão não se verifique ou provoque o surgimento de outro interesse no sentido de que a lesão aconteça. A relevância do princípio indenitário é evidenciada também com referência ao princípio técnico do seguro. Na eventualidade de um ressarcimento superior ao dano efetivo faltariam os elementos determinantes do cálculo atuarial. Nessa ordem de idéias pode ser atribuído ao princípio indenitário um significado ainda diferente, isto é, de salvaguarda da função previdenciária do seguro contra dano. É evidente, insista-se, que o objetivo do contrato de seguro não é a locupletação do segurado. A sua função é a estável garantia contra riscos e, realizando-se, a reparação de perdas, proporcionando ao segurado o retorno à situação pretérita, tornando-o indene. Dessa forma, observada a ocorrência de um determinado sinistro, obriga-se a companhia seguradora a indenizar o segurado com base nas perdas efetivamente suportadas (o que implica avaliação do valor correspondente ao bem no momento do sinistro), até o limite máximo expresso na apólice (o qual se caracteriza como um teto e não como montante fixo de indenização para as hipóteses de perda total), quando não optado pela reposição de outro bem de idêntica conformação. E também o de Luis Benitez de Lugo Reymundo281: 281 Luis Benitez de Lugo Reymundo. Tratado de seguros. Madri: Réus, 1955, v. 2, p. 7. No original: "Este principio indeclinable del seguro está sancionado por el texto de la póliza espanola, en la qual se consigna: 'El seguro no puede ser nunca una ocasión de beneficio para el assegurado, sino una indemnización de las perdidas materiales y reales que haia experimentado; por consiguiente, las sumas aseguradas, las primas pagadas y las designaciones y evaluaciones consignadas en la póliza no pueden ser aducidas por el asegurado como prueba o reconocimiento de la existência y del valor de los objetos asegurados, sea en el acto del seguro o en el momento del incêndio"'. 142 Este princípio indeclinável do seguro está sancionado pelo texto da apólice espanhola, na qual se consigna: o seguro não pode ser nunca uma ocasião de benefício para o segurado, senão uma indenização das perdas materiais e reais que haja experimentado; por conseguinte, as somas seguradas, as parcelas pagas e as designações e evoluções consignadas na apólice não podem ser aduzidas pelo segurado como prova ou reconhecimento da existência e de valores dos objetos segurados, seja no ato do seguro ou no momento do incêndio. 5.6. CONTRATO ALEATÓRIO Maria Helena Diniz282 ensina que o vocábulo aleatório é originário do latim álea, que significa sorte, perigo, azar, incerteza de fortuna, indicando, portanto, um ato dependente do acaso.283 Para Maria Helena Diniz284 aleatório será o contrato se a prestação depender de um evento casual, sendo, por isso, insuscetível de estimação prévia, dotado de uma extensão incerta. Com a manifestação de vontade dos contraentes, formado estará esse contrato, apesar de se relegar a prestação para implemento posterior, dependente de algum fato incerto; logo, os efeitos do negócio submetem-se a esse acontecimento incerto. As partes colocam-se, portanto, sob a perspectiva de uma álea, que se irá refletir na existência ou na 282 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. Teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. v.3. p. 87. 283 Essa também a posição de Nelson Rosenvald in Direito das obrigações e responsabilidade civil. Niterói – Rio de Janeiro. Ed. Impetus. 2001. p. 290. 284 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. Teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. v.3. p. 88. 143 quantidade da prestação combinada, expondo-se elas à eventualidade recíproca de perda ou de ganho. Exemplifica seu pensamento através do contrato de seguro, no qual o segurado, em troca do prêmio, poderá vir a receber a indenização, se ocorrer um sinistro, ou nada receber, se aquele não advier285. As vantagens do contrato subordinar-se-ão a um acontecimento futuro e incerto; assim, conforme Serpa Lopes, se um dos contraentes assumiu um risco, não poderá reclamar do que lhe possa resultar, em sobrevindo aquele evento, pois será inadmissível dizer-se prejudicado por um risco que constituiu a própria essência do contrato por ele firmado286. Na lição de Maria Helena Diniz287, citando Silvio Rodrigues, o risco pode ser: a) total ou absolulo, quando só uma das partes cumpre sua prestação, sem nada receber em troca; e b) parcial ou relativo, quando, apesar de serem desproporcionados os montantes, cada um dos contraentes fornece alguma prestação. Esse risco de perder ou de ganhar pode sujeitar um ou ambos os contratantes; porém, a incerteza do evento terá de ser dos dois, sob pena de não subsistir a obrigação288, uma vez que tal lucro ou perda está na dependência do acontecimento incerto para ambos os contratantes. Cada um deles se encontra adstrito a pagar sem nada receber, ou a receber sem nada pagar, ignorando, desde o momento da formação do contrato, de quem será a vantagem ou de quem será a perda289. Se a álea ficar a cargo exclusivo de um dos contraentes, 285 Silvio Rodrigues. Direito Civil. 3. ed., São Paulo: Max Limonad, 1982. v.3, p. 40 e 41. Serpa Lopes. Curso de direito civil. 4. ed., São Paulo: Freitas Bastos, 1964, p. 39. 287 Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro. Teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. v.3. p. 88. 288 Caio Mário da Silva Pereira. Instituições de direito civil. Rio de Janeiro: Forense. 1978. p. 61. 289 Washington de Barros Monteiro. Curso de direito civil. v. 5. 29ª. ed., São Paulo: Saraiva. 1997. p. 73. 286 144 nulo será o negócio, pois é inadmissível a celebração desse contrato por uma das partes na certeza de ganhar290. Percebe-se nitidamente que no contrato aleatório, afasta-se a idéia de uma equivalência originária, pois o proveito que uma das partes terá com esse contrato se subordina a um evento incerto291. Na opinião de Nelson Borges292, como linha de princípio, todo contrato contém uma álea normal na qual se espera que ocorram eventos próprios da contratação. Por esse ângulo, quando as partes celebram um pacto acompanha-as a consciência plena de que, com a vinculação, assumem determinados riscos e todos eles encerram uma idéia probabilística. De início, a contratação infunde a convicção de que no seu curso regular poderá haver transformação de uma incerteza em certeza, em algo perfeitamente concreto e mensurável. Assim, o locador sabe que seu locatário poderá desviar a finalidade da contratação, deixar de pagar os aluguéis, causar danos ao imóvel, sublocá-lo sem consentimento, não pagar encargos, enfim, descumprir cláusulas, tudo dentro de um espectro de riscos previsíveis, inseridos na chamada álea normal da contratação. Se os acontecimentos supervenientes são os previsíveis, a alteração que trarão à pretensão das partes poderá ser minimizada pelos mecanismos de proteção constantes da lei, estabelecidos para enfrentar o risco inicial de caráter subjetivo, agora transmudado em objetivo. Nos contratos aleatórios, na visão de Nelson Borges293, esse campo possui características diversas, pois nasce impregnado pela dúvida, pela 290 Orlando Gomes. Contratos. 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992. p. 87. Maria Helena Diniz. Venda aleatória, in Enciclopédia Saraiva do Direito. v. 76, p. 480 e 481. 292 Nelson Borges. A teoria da imprevisão e os contratos aleatórios. RT 782/78. 2000. 293 Nelson Borges. A teoria da imprevisão e os contratos aleatórios. RT 782/78. 2000. 291 145 incerteza, pela indeterminação quanto à ocorrência dos fatos previstos contratualmente e à sua data de efetivação. A aleatoriedade poderá ocorrer, ainda, na compra e venda de coisas futuras sujeitas a incertezas quanto à entrega, ou em fase de litígio, cujos riscos foram assumidos pelo comprador. São os casos, por exemplo, da aquisição de uma colheita futura de cereais, com a aceitação do risco de nada ser colhido; da busca de um tesouro no oceano, na selva ou em qualquer lugar, ou ainda, de relíquias sagradas ou arqueológicas; da dependência de decisão favorável (judicial ou extrajudicial), que poderá ser contrária, sobre um determinado bem que, à época da contratação, se encontre sob discussão. Nelson Borges294 afirma que os pactos aleatórios poderão ter como objeto: a) Coisa certa, mas duvidosa quanto à efetiva ocorrência e a quando isso se dará (seguro, jogo, aposta, danos materiais); b) Coisa futura, sujeita a desaparecimento ou frustração da procura (aquisição de safra a ser colhida, busca de tesouros ou relíquias); c) Coisa existente, mas exposta a risco (aquisição de coisa em litígio). Ensina esse autor que sobre todas estas situações pairam: a) imprecisão e dúvida quanto à efetiva ocorrência e quando o fato se dará; b) probabilidade de frustração do esperado; c) decisão judicial contrária que liquide de vez com as expectativas do adquirente da coisa. 294 Nelson Borges. A teoria da imprevisão e os contratos aleatórios. cit. RT 782/78. 2000. 146 Segundo Castro Mendes295, um contrato é considerado aleatório quando tem como característica a incerteza ou álea, que se define por um fato incerto quanto à sua verificação e ou quanto ao momento da sua verificação. Da possibilidade de efetivação do fato incerto é que nasceu o nome aleatório, significando pactos caracterizados pela dúvida, incerteza, imprecisão, indeterminação, por se encontrarem ligados a acontecimentos futuros, regidos por duas exigências condicionantes: a) efetivo surgimento do fato previsto; e b) se efetivo, quando ocorreria. A origem latina do termo aleatório significa "dado de jogar" (regido pela sorte), que os dicionários registram como a "probabilidade de perda concomitante à probabilidade de lucro". 296 Caio Mário da Silva Pereira297 considerou como aleatórios todos os contratos em que a prestação de uma das partes não fosse precisamente conhecida e susceptível de estima prévia, inexistindo equivalência com a da outra parte. No entanto, as abalizadas opiniões retro mencionadas, a nosso ver, não podem prevalecer na atualidade, relativamente ao contrato de seguro. Com efeito, ensina Humberto Teodoro Junior298 que o seguro, tal como praticado em nosso tempo, deixou de ser contrato aleatório para ser tratado como negócio comutativo em que o segurador assume a obrigação de prestar garantia ao segurado mediante o pagamento de determinado preço, garantia esta que se apóia numa poupança programada e realizada com recursos captados junto a um grupo de participantes de cobertura similar proporcionada pelo mesmo segurador. 295 João de Castro Mendes. Teoria geral do direito civil. Lisboa: Editora da Associação Acadêmica, 1978/1979. vol. 3. p. 747. 296 Aurélio Buarque de Holanda Ferreira. Novo Dicionário Aurélio. Rio de Janeiro:Nova Fronteira, 1976. p. 64. 297 Caio Mário da Silva Pereira. Instituições de direito civil. Rio de Janeiro: Forense, 1974. vol. II, p. 47. 298 Humberto Theodoro Junior. O contrato de seguro e a regulação do sinistro. RT 832/67. 2005. p. 67-82. 147 Se entre a eventual indenização no caso de sinistro e o prêmio pago não existe equivalência econômica, o certo é que nenhum contrato de seguro se pratica isoladamente, mas sempre dentro de um conjunto de operações, onde várias pessoas sujeitas ao mesmo risco integram um plano comum de cobertura. A seguradora, fundando-se nos princípios da mutualidade e da estatística atuarial, estipula prêmios que formam um capital capaz de cobrir os danos previsíveis e proporcionar-lhe um lucro para remunerar os serviços de gestão do fundo comum. Outrossim, só pode atuar no mercado de seguro empresa autorizada pelo governo e que observe planos de seguridade previamente aprovados pelo órgão público competente. Para Humberto Teodoro Junior299, dentro desse esquema funcional, o contrato de seguro não pode ser analisado isoladamente, sob pena de desnaturá-lo em simples negócio de jogo ou aposta, aí sim negócio puramente aleatório. Uma vez, porém, inserido na mutualidade global do sistema, o seguro corresponde a uma atividade empresarial cujo exercício nada tem de aleatório e que se desenvolve técnica e profissionalmente em clima de comutatividade estabelecido à base da comunhão dos riscos e dos respectivos custos. Não há especulação sobre sorte ou azar. As prestações dos diversos participantes, segurador e segurados, aparecem de plano determinados, desde o momento da celebração do contrato. Calmon de Passos300 muito bem demonstra a natureza jurídica da atividade securitária, destacando sua correlação com o terreno dos interesses coletivos e transindividuais. Para esse autor a doutrina contemporânea já precisou a natureza peculiar do contrato de seguro. É ele um contrato comutativo, em verdade um 299 Humberto Theodoro Junior. O contrato de seguro e a regulação do sinistro. cit. RT 832/67. p. 67-82. J. J. Calmon de Passos. A atividade securitária e sua fronteira com os interesses transindividuais. Responsabilidade da Susep e competência da Justiça Federal. RT 763/95, São Paulo: Ed. RT, 1999. 300 148 negócio jurídico coletivo, integrado pelos muitos atos individuais que aportam para o fundo comum os recursos tecnicamente exigidos para segurança de todos em relação às incertezas do futuro. A massa comum dos recursos financeiros a ninguém pertence, em termos de propriedade individual, sendo algo em aberto e permanentemente disponível para atender às necessidades que surjam e para cuja satisfação foi constituída. No dizer de Pontes de Miranda301, logo que pactuado o seguro, ambas as partes prestam e contraprestam. Não é a indenização do sinistro o objeto da prestação do segurador. Esse pagamento é eventual. O certo é que, por força do contrato o segurado presta, pagando o prêmio, e o segurador contrapresta segurando, assumindo a álea. Como o valor dos prêmios e a cobertura dos sinistros previsíveis determinam a formação do capital comum, sobre cuja liquidez se assenta a garantia dos segurados, é fácil entrever o forte cunho social de que se reveste o sistema. Natural, portanto, que se exija maior rigor na submissão dos contratantes aos ditames da boa-fé. Qualquer liberalidade indevida ou fraude na indenização de um sinistro ou na determinação do prêmio individual pode comprometer o sucesso da operação coletiva. Para Humberto Teodoro Junior302, ao segurador, nessa ordem de idéias, cumpre não apenas pagar as indenizações previstas, mas também controlar e zelar para que somente se indenizem os sinistros previstos no seguro e apenas dentro dos limites e condições nele estatuídos. Assim, do ponto de vista coletivo, cabe ao segurador, administrar os valores constitutivos do capital comum, de modo a tornar tecnicamente possível o funcionamento do mecanismo securitário. Este será normal desde que mantido 301 Pontes de Miranda. Tratado de direito privado. v. 3. ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais. 1984. vol. 45, p. 286. 302 Humberto Theodoro Junior. O contrato de seguro e a regulação do sinistro. RT 832/67. 2005. p. 67-82. 149 em nível suficiente para proporcionar lucro ao segurador e, acima de tudo, garantir a prestação de segurança devida aos segurados. 303 Os interesses em jogo no negócio de seguro, dessa maneira, ultrapassam os dos signatários de cada contrato, para abarcar todo o grupo que necessariamente se forma em torno do risco comum assumido pelo segurador. Daí se poder falar numa função social relevante desempenhada pelo contrato de seguro, em atenção à tarefa catalisadora desempenhada pelo segurador para tornar operacional a mutualidade em torno da cobertura do risco comum. 303 Antonio La Torre. "La disciplina giuridica dell'attività assicurativa". Dirito delle assicurazioni. Milano: Giuffrè, 1987. vol. 1, p. 4. 150 6 . CONCLUSÕES Assim, podemos afirmar: 1. O conceito tradicional da culpa subjetiva, nos domínios da responsabilidade civil, já se teria revelado um critério técnico insuficiente; 2. Tal insuficiência do conceito clássico da culpa teria resultado: 2.1. De condições sociais e econômicas ditadas pelos grandes inventos, pelas grandes energias captadas, pela mecanização e pela motorização, pelos maiores adensamentos populacionais nos grandes centros, etc. e 2.2. De motivos de ordem filosófico-política e jurídica, conseqüentes do individualismo e do surgimento da socialização. 3. Ganhou terreno o risco que, após os exageros iniciais de muitos daqueles que pretendiam fazer dele um sucedâneo da culpa na teoria da responsabilidade civil, acabou por consolidar sua posição ao lado da culpa, pelo que podemos afirmar que hoje a responsabilidade civil gravita em torno de dois pólos: culpa e risco. 4. Todo seguro implica uma comunhão de riscos, uma mutualidade de pessoas que se cotizam para garantir coletivamente conseqüências do conjunto de sinistros que ocorrem em seu seio. 5. As deficiências e percalços dos seguros privados levaram, então, à idéia da mutualização, ampla, geral e compulsória dos danos por meio do Estado, o que já se pratica, embora em escala reduzida e envolvendo apenas determinadas classes. 151 6. A assunção dos riscos pelo Estado participaria da própria justiça social, como parcela integrante dela. Viria ao encontro à realidade apontada por muitos de que o dano deixa de ser um dano às pessoas para se tornar um dano à própria coletividade, ensejando perspectivas amplas e inovadoras na responsabilidade civil, evitando arruinamentos, injustiças e iniqüidades. Promovendo um melhor entendimento entre os homens e uma garantia maior de harmonia, de segurança e de paz social para todos. 7. Verificamos, assim, que ocorreu uma evolução na qual o seguro mudou de dimensão e estrutura e exige novo estudo por parte do legislador, da doutrina e da jurisprudência. 8. A relação entre seguradora e segurado é presidida por uma equação de retribuição proporcional expressiva de comutatividade. 9. Os contratos de seguro são pactos comutativos de garantia em que uma das partes (seguradora) se compromete a indenizar a outra (segurado) ocorrendo o sinistro previamente determinado, desde que esta se encontre regularmente em dia com suas obrigações securitárias (pagamento dos prêmios), sendo essa garantia a própria contraprestação estabelecida, comportando revisão normal na forma do art. 6.°, V, do Código de Defesa do Consumidor, ou anormal quando atingidos por evento reconhecidamente imprevisível (arts. 317, 478 a 480 do CC), desde que presentes também seus outros pressupostos de admissibilidade, nos quais comutatividade e mutualidade consubstanciam funções sociais perfeitas e acabadas, uma vez que neles não existe qualquer álea, dúvidas ou espaços cinzentos encobertos por sombras de incerteza, porque o objeto da contratação é a garantia de indenização que uma das partes oferece à outra, previamente estabelecida e identificada, diante da ocorrência de sinistro constante do elenco probabilístico, expresso na vinculação que deu origem àquela convenção sui generis. 152 153 7. 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Art 2º O controle do Estado se exercerá pelos órgãos instituídos neste Decretolei, no interesse dos segurados e beneficiários dos contratos de seguro. Art 3º Consideram-se operações de seguros privados os seguros de coisas, pessoas, bens, responsabilidades, obrigações, direitos e garantias. Parágrafo único. Ficam excluídos das disposições deste Decreto-lei os seguros do âmbito da Previdência Social, regidos pela legislação especial pertinente. Art 4º Integra-se nas operações de seguros privados o sistema de cosseguro, resseguro e retrocessão, por forma a pulverizar os riscos e fortalecer as relações econômicas do mercado. Parágrafo único. Aplicam–se aos estabelecimentos autorizados a operar em resseguro e retrocessão, no que couber, as regras estabelecidas para as sociedades seguradoras.’’ (Redação da LEI Nº 9.932/20.12.1999) Art 5º A política de seguros privados objetivará: I - Promover a expansão do mercado de seguros e propiciar condições operacionais necessárias para sua integração no processo econômico e social do País; II - Evitar evasão de divisas, pelo equilíbrio do balanço dos resultados do intercâmbio, de negócios com o exterior; 163 III - Firmar o princípio da reciprocidade em operações de seguro, condicionando a autorização para o funcionamento de empresas e firmas estrangeiras a igualdade de condições no país de origem; IV - Promover o aperfeiçoamento das Sociedades Seguradoras; V - Preservar a liquidez e a solvência das Sociedades Seguradoras; VI - Coordenar a política de seguros com a política de investimentos do Governo Federal, observados os critérios estabelecidos para as políticas monetária, creditícia e fiscal. Art. 6º A contratação de seguros no exterior dependerá de autorização da SUSEP e será limitada aos riscos que não encontrem cobertura no País ou que não convenham aos interesses nacionais." (NR)(Redação da LEI Nº 9.932/ 20.12.1999) Parágrafo único. O CNSP disporá sobre a colocação de resseguro no exterior.’’(Redação da LEI Nº 9.932/ 20.12.1999) Art 6º A colocação de seguros e resseguros no exterior será limitada aos riscos que não encontrem cobertura no País ou que não convenham aos interesses nacionais. CAPÍTULO II Do Sistema Nacional De Seguros Privados Art 7º Compete privativamente ao governo Federal formular a política de seguros privados, legislar sobre suas normas gerais e fiscalizar as operações no mercado nacional; Art 8º Fica instituído o Sistema Nacional de Seguros Privados, regulado pelo presente Decreto-lei e constituído: a) do Conselho Nacional de Seguros Privados - CNSP; b) da Superintendência de Seguros Privados - SUSEP; c) do Instituto de Resseguros ao Brasil - IRB; d) das Sociedades autorizadas a operar em seguros privados; e) dos corretores habilitados. CAPÍTULO III Disposições Especiais Aplicáveis ao Sistema 164 Art 9º Os seguros serão contratados mediante propostas assinadas pelo segurado, seu representante legal ou por corretor habilitado, com emissão das respectivas apólices, ressalvado o disposto no artigo seguinte. Art 10. É autorizada a contratação de seguros por simples emissão de bilhete de seguro, mediante solicitação verbal do interessado. § 1º O CNSP regulamentará os casos previstos neste artigo, padronizando as cláusulas e os impressos necessários. § 2º Não se aplicam a tais seguros as disposições do artigo 1.433 do Código Civil. Art 11. Quando o seguro for contratado na forma estabelecida no artigo anterior, a boa fé da Sociedade Seguradora, em sua aceitação, constitui presunção " juris tantum ". 1º Sobrevindo o sinistro, a prova da ocorrência do risco coberto pelo seguro e a justificação de seu valor competirão ao segurado ou beneficiário. § 2º Será lícito à Sociedade Seguradora argüir a existência de circunstância relativa ao objeto ou interesse segurado cujo conhecimento prévio influiria na sua aceitação ou na taxa de seguro, para exonerar-se da responsabilidade assumida, até no caso de sinistro. Nessa hipótese, competirá ao segurado ou beneficiário provar que a Sociedade Seguradora teve ciência prévia da circunstância argüida. § 3º A violação ou inobservância, pelo segurado, seu preposto ou beneficiário, de qualquer das condições estabelecidas para a contratação de seguros na forma do disposto no artigo 4º exonera a Sociedade Seguradora da responsabilidade assumida. § 4º É vedada a realização de mais de um seguro cobrindo o mesmo objeto ou interesse, desde que qualquer deles seja contratado mediante a emissão de simples certificado, salvo nos casos de seguros de pessoas. Art 12. A obrigação do pagamento do prêmio pelo segurado vigerá a partir do dia previsto na apólice ou bilhete de seguro, ficando suspensa a cobertura do seguro até o pagamento do prêmio e demais encargos. Parágrafo único. Qualquer indenização decorrente do contrato de seguros dependerá de prova de pagamento do prêmio devido, antes da ocorrência do sinistro. 165 Art 13. As apólices não poderão conter cláusula que permita rescisão unilateral dos contratos de seguro ou por qualquer modo subtraia sua eficácia e validade além das situações previstas em Lei. Art 14. Fica autorizada a contratação de seguros com a cláusula de correção monetária para capitais e valores, observadas equivalência atuarial dos compromissos futuros assumidos pelas partes contratantes, na forma das instruções do Conselho Nacional de Seguros Privados. (Revogado pela LEI Nº 9.932/20.12.1999) - Art 15. A critério do CNSP, o governo Federal poderá assumir riscos catastróficos e excepcionais por intermédio do IRB, desde que interessem à economia e segurança do País. Parágrafo único. O Banco Nacional de Habitação poderá assumir os riscos decorrentes das operações do Sistema Financeiro da Habitação que não encontrem cobertura no mercado nacional, a taxas e condições compatíveis com as necessidades do Sistema Financeiro da Habitação. Art 16. É criado o Fundo de Estabilidade do Seguro Rural, com a finalidade de garantir a estabilidade dessas operações e atender à cobertura suplementar dos riscos de catástrofe. Parágrafo Único. O Fundo será administrado pelo IRB e seus recursos aplicados segundo o estabelecido pelo CNSP. Art 17. O Fundo de Estabilidade do Seguro Rural será constituído: a) dos excedentes do máximo admissível tecnicamente como lucro nas operações de seguros de crédito rural, seus resseguros e suas retrocessões, segundo os limites fixados pelo CNSP; b) dos recursos previstos no artigo 28 deste decreto-lei; c) por dotações orçamentárias anuais, durante dez anos, a partir do presente decreto-lei, mediante o crédito especial necessário para cobrir a deficiência operacional do exercício anterior. Art 18. As instituições financeiras do sistema nacional de Crédito Rural enumeradas no art. 7º da Lei número 4.829, de 5.11.65, que concederem financiamento à agricultura e à pecuária, promoverão os contratos de financiamento e de seguro rural concomitante e automaticamente. § 1º O seguro obedecerá às normas e limites fixados pelo CNSP, sendo obrigatório o financiamento dos prêmios pelas instituições de que trata este artigo. 166 § 2º O seguro obrigatório ficará limitado ao valor do financiamento, sendo constituída a instituição financiadora como beneficiaria até a concorrência de seu crédito. Art 19. As operações de Seguro Rural gozam de isenção tributária irrestrita, de quaisquer impostos ou tributos federais. Art 20. Sem prejuízo do disposto em leis especiais, são obrigatórios os seguros de: a) danos pessoais a passageiros de aeronaves comerciais; b ) responsabilidade civil do proprietário de aeronaves e do transportador aéreo (Redação da LEI Nº 8.374/ 30.12. 1991) (Redação anterior) - b) - Responsabilidade civil dos proprietários de veículos automotores de vias fluvial, lacustre, marítima, de aeronaves e dos transportadores em geral." ( Redação da LEI Nº 6.194/19.12.1974) (Redação anterior) b) responsabilidade civil dos proprietários de veículos automotores de vias terrestre, fluvial, lacustre e marítima, de aeronaves e dos transportadores em geral; c) responsabilidade civil do construtor de imóveis em zonas urbanas por danos a pessoas ou coisas; d) bens dados em garantia de empréstimos ou financiamentos de instituições financeiras pública; (Revogada pela MPV N° 2.221/04.09.2001) - e) garantia do cumprimento das obrigações do incorporador e construtor de imóveis; f) garantia do pagamento a cargo de mutuário da construção civil, inclusive obrigação imobiliária; g) edifícios divididos em unidades autônomas; h) incêndio e transporte de bens pertencentes a pessoas jurídicas, situados no País ou nele transportados; i) crédito rural; j) crédito à exportação, quando concedido por instituições financeiras públicas. 167 l ) danos pessoais causados por veículos automotores de vias terrestres e por embarcações, ou por sua carga, a pessoas transportadas ou não; (Redação e Regulamento pela LEI Nº 8.374/ 30.12. 1991) (Redação anterior) - l) - Danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, ou por sua carga, a pessoas transportadas ou não." (Introduzido pela LEI Nº 6.194/ 19.12. 1974) m ) responsabilidade civil dos transportadores terrestres, marítimos, fluviais e lacustres, por danos à carga transportada." (Redação da LEI Nº 8.374/ 30.12. 1991) Parágrafo único. Não se aplica à União a obrigatoriedade estatuída na alínea "h" deste artigo." (NR)(Redação da LEI Nº 10.190/ 14.02.2001) Art 21. Nos casos de seguros legalmente obrigatórios, o estipulante equipara-se ao segurado para os eleitos de contratação e manutenção do seguro. § 1º Para os efeitos deste decreto-lei, estipulante é a pessoa que contrata seguro por conta de terceiros, podendo acumular a condição de beneficiário. § 2º Nos seguros facultativos o estipulante é mandatário dos segurados. 3º O CNSP estabelecerá os direitos e obrigações do estipulante, quando for o caso, na regulamentação de cada ramo ou modalidade de seguro. § 4º O não recolhimento dos prêmios recebidos de segurados, nos prazos devidos, sujeita o estipulante à multa, imposta pela SUSEP, de importância igual ao dobro do valor dos prêmios por ele retidos, sem prejuízo da ação penal que couber." (Acrescido pela LEI Nº 5.627/01.12.1970) Art 22. As instituições financeiras públicas não poderão realizar operações ativas de crédito com as pessoas jurídicas e firmas individuais que não tenham em dia os seguros obrigatórios por lei, salvo mediante aplicação da parcela de crédito, que for concedido, no pagamento dos prêmios em atraso. Parágrafo único. Para participar de concorrências abertas pelo Poder Público, é indispensável comprovar o pagamento dos prêmios dos seguros legalmente obrigatórios.' Art 23. Os seguros dos bens, direitos, créditos e serviços dos órgãos do Poder Público, bem como os de bens de terceiros que garantam operações dos ditos órgãos, serão contratados diretamente com a Sociedade Seguradora Nacional que for escolhida mediante sorteio. 168 § 1º Nos casos de seguros não tarifados, a escolha da Sociedade Seguradora será feita por concorrência Pública. § 2º Para os sorteios e concorrências públicas, o IRB determinará anualmente as faixas de cobertura de mercado nacional para cada ramo ou modalidade de seguro, fixando o limite de aceitação das Sociedades Seguradoras conforme as respectivas situações econômico-financeiras e o índice de resseguro que comportarem. § 3º As Sociedades Seguradoras responsáveis pelos seguros previstas neste artigo recolherão ao IRB as comissões corretagem admitidas pelo CNSP, para crédito do Fundo de Estabilidade do Seguro Rural. Art 24. Poderão operar em seguros privados apenas Sociedades Anônimas ou Cooperativas, devidamente autorizadas. Parágrafo único. As Sociedades Cooperativas operarão unicamente em seguros agrícolas, de saúde e de acidentes do trabalho. Art 25. As ações das Sociedades Seguradoras serão sempre nominativas. Art. 26. As sociedades seguradoras não poderão requerer concordata e não estão sujeitas à falência, salvo, neste último caso, se decretada a liquidação extrajudicial, o ativo não for suficiente para o pagamento de pelo menos a metade dos credores quirografários, ou quando houver fundados indícios da ocorrência de crime falimentar." (NR)(Redação da LEI Nº 10.190/ 14.02.2001) (REdação anterior) - Art 26. As Sociedades Seguradoras não estão sujeitas a falência, nem poderão impetrar concordata. Art 27. Serão processadas pela forma executiva as ações de cobrança dos prêmios dos contratos de seguro. Art 28. A partir da vigência deste Decreto-Lei, a aplicação das reservas técnicas das Sociedades Seguradoras será feita conforme as diretrizes do Conselho Monetário Nacional. Art 29. Os investimentos compulsórios das Sociedades Seguradoras obedecerão a critérios que garantam remuneração adequada, segurança e liquidez. Parágrafo único. Nos casos de seguros contratados com a cláusula de correção monetária é obrigatório o investimento das respectivas reservas nas condições estabelecidas neste artigo. 169 Art 30. As Sociedades Seguradoras não poderão conceder aos segurados comissões ou bonificações de qualquer espécie, nem vantagens especiais que importem dispensa ou redução de prêmio. Art 31. É assegurada ampla defesa em qualquer processo instaurado por infração ao presente Decreto-Lei sendo nulas as decisões proferidas com inobservância deste preceito. CAPÍTULO IV Do Conselho Nacional de Seguros privados Art 32. É criado o Conselho Nacional de Seguros Privados - CNSP, ao qual compete primitivamente: I - Fixar as diretrizes e normas da política de seguros privados; II - Regular a constituição, organização, funcionamento e fiscalização dos que exercerem atividades subordinadas a este Decreto-Lei, bem como a aplicação das penalidades previstas; III - Estipular índices e demais condições técnicas sobre tarifas, investimentos e outras relações patrimoniais a serem observadas pelas Sociedades Seguradoras; IV - Fixar as características gerais dos contratos de seguros; V - Fixar normas gerais de contabilidade e estatística a serem observadas pelas Sociedades Seguradoras; VI - Delimitar o capital do IRB e das Sociedades Seguradoras, com a periodicidade mínima de dois anos, determinando a forma de sua subscrição e realização; VII - Estabelecer as diretrizes gerais das operações de resseguro; VIII - Disciplinar as operações de cosseguro, nas hipóteses em que o IRB não aceite resseguro do risco ou quando se tornar conveniente promover melhor distribuição direta dos negócios pelo mercado; IX - Conhecer dos recursos de decisão da SUSEP e do IRB, nos casos especificados neste Decreto-Lei; X - Aplicar às Sociedades Seguradoras estrangeiras autorizadas a funcionar no País as mesmas vedações ou restrições equivalentes às que vigorarem nos países da matriz, em relação às Sociedades Seguradoras brasileiras ali instaladas ou que neles desejem estabelecer-se; 170 XI - Prescrever os critérios de constituição das Sociedades Seguradoras, com fixação dos limites legais e técnicos das operações de seguro; XII - Disciplinar a corretagem de seguros e a profissão de corretor; XIII - Corrigir os valores monetários expressos neste Decreto-lei, de acordo com os índices do Conselho Nacional de Economia; XIV - Decidir sobre sua própria organização, elaborando o respectivo Regimento Interno; XV - Regular a organização, a composição e o funcionamento de suas Comissões Consultivas; XVI - Regular a instalação e o funcionamento das Bolsas de Seguro. Art. 33. 0 CNSP será integrado pelos seguintes membros: (Redação da LEI Nº 10.190/14.02.2001) I - Ministro de Estado da Fazenda, ou seu representante; II - representante do Ministério da Justiça; III - representante do Ministério da Previdência e Assistência Social; IV - Superintendente da Superintendência de Seguros Privados -SUSEP; V - representante do Banco Central do Brasil; VI - representante da Comissão de Valores Mobiliários - CVM. § 1º 0 CNSP será presidido pelo Ministro de Estado da Fazenda e, na sua ausência, pelo Superintendente da SUSEP. § 2º 0 CNSP terá seu funcionamento regulado em regimento interno" (NR) (Redação anterior) - Art. 33. O Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) será integrado pelos seguintes membros: (Redação da LEI N° 8.127/20.12.1990) I - Ministro de Estado da Economia, Fazenda e Planejamento, na qualidade de Presidente; II - Superintendente da Superintendência de Seguros Privados (Susep), na qualidade de Vice-Presidente; 171 III - Presidente do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB); IV - Presidente do Banco Central do Brasil; V - Presidente do Conselho Nacional de Defesa do Consumidor, do Ministério da Justiça; VI - um representante do Ministério do Trabalho e da Previdência Social; VII - um representante do Ministério da Infra-Estrutura; VIII - um representante do Ministério da Ação Social; IX - quatro representantes da iniciativa privada, e respectivos suplentes, nomeados pelo Presidente da República, escolhidos dentre brasileiros de ilibada reputação e notório saber nas matérias de competência do CNSP, com mandato de dois anos, prorrogável por igual período, e indicados, em lista tríplice, pelos órgãos superiores de classe que representem os estabelecimentos de seguro, de capitalização e de previdência privada aberta e a categoria profissional dos corretores de seguros. 1° Os membros a que se referem os incisos II a V serão substituídos, nos seus impedimentos e afastamentos, pelos respectivos substitutos eventuais e os indicados nos incisos VI a VIII serão designados pelo Ministro de Estado da Economia, Fazenda e Planejamento, mediante indicação dos Ministros a que estejam vinculados. 2° Os diretores da Susep e do IRB poderão participar das reuniões do CNSP, sem direito a voto. 3° Qualquer dos membros a que se refere o inciso IX deste artigo perderá seu mandato, se deixar de comparecer, sem motivo justificado, a três sessões ordinárias consecutivas ou a seis alternadas, durante o exercício. 4° O conselho deliberará mediante resoluções, por maioria de votos, com a presença de, no mínimo, nove membros. 5° O Presidente do conselho terá, além do voto ordinário, o de qualidade, cabendo-lhe, ainda, a prerrogativa de deliberar, nos casos de urgência e relevante interesse, ad referendum do conselho. 6° Quando deliberar ad referendum do conselho, o Presidente submeterá a decisão ao colegiado, na primeira reunião posterior à prática do ato. 172 7° O Presidente do conselho poderá convidar outros Ministros de Estado, bem como representantes de entidades públicas ou privadas, para participar das reuniões, não lhes sendo permitido, porém, o direito de voto. 8° O conselho reunir-se-á, ordinariamente, de dois em dois meses, e, extraordinariamente, sempre que for convocado por seu Presidente ou a requerimento de, pelo menos, nove de seus membros. 9° De cada reunião do conselho, será lavrada a respectiva ata. (Artigo anterior) - Art 33. O CNSP compor-se-á dos seguintes membros: I - Ministro da Indústria e do Comércio, que será seu presidente; II - Ministro da Fazenda ou seu representante; III - Ministro do Planejamento e da Coordenação Econômica ou seu representante; IV - Ministro da Saúde ou seu representante; V - Ministro do Trabalho e Previdência Social ou seu representante; VI - Ministro da Agricultura ou seu representante; VII - Superintendente da Superintendência de Seguros Privados; VIII - Presidente do Instituto de Resseguros do Brasil; IX - Um representante do Conselho Federal de Medicina; X - Três representantes da iniciativa Privada nomeados pelo Presidente da República, mediante escolha dentre brasileiros dotados das qualificações pessoais necessárias, com mandato de dois anos, podendo ser reconduzidos. § 1º O CNSP deliberará por maioria de votos, com o " quorum " mínimo de seis membros, desde que presentes quatro dos primeiros enumerados neste artigo cabendo ao Presidente também o voto de qualidade.' § 2º Em suas faltas ou impedimentos, o Presidente será substituído pelos Ministros de Estado integrantes do CNSP, na ordem estabelecida neste artigo. § 3º A SUSEP proverá os serviços da Secretaria do CNSP, sob o controle deste. 173 Art 34. Com audiência obrigatória nas deliberações relativas às respectivas finalidades específicas, funcionarão junto ao CNSP as seguintes Comissões Consultivas: I - de Saúde; II - do Trabalho; III - de Transporte; IV - Mobiliária e de Habitação; V - Rural; VI - Aeronáutica; VII - de Crédito; VIII - de Corretores. § 1º - O CNSP poderá criar outras Comissões Consultivas, desde que ocorra justificada necessidade. § 2º - A organização, a composição e o funcionamento das Comissões Consultivas serão regulados pelo CNSP, cabendo ao seu Presidente designar os representantes que as integrarão, mediante indicação das entidades participantes delas. CAPÍTULO V Da Superintendência de Seguros Privados SEÇÃO I Art 35. Fica criada a Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), entidade autárquica, jurisdicionada ao Ministério da Indústria e do Comércio, dotada de personalidade jurídica de Direito Público, com autonomia administrativa e financeira. Parágrafo único. A sede da SUSEP será na cidade do Rio de Janeiro, Estado da Guanabara, até que o Poder Executivo a fixe, em definitivo, em Brasília. Art 36. Compete à SUSEP, na qualidade de executora da política traçada pelo CNSP, como órgão fiscalizador da constituição, organização, funcionamento e operações das Sociedades Seguradoras: 174 a) processar os pedidos de autorização, para constituição, organização, funcionamento, fusão, encampação, grupamento, transferência de controle acionário e reforma dos Estatutos das Sociedades Seguradoras, opinar sobre os mesmos e encaminhá-los ao CNSP; b) baixar instruções e expedir circulares relativas à regulamentação das operações de seguro, de acordo com as diretrizes do CNSP; c) fixar condições de apólices, planos de operações e tarifas a serem utilizadas obrigatoriamente pelo mercado segurador nacional; d) aprovar os limites de operações das Sociedades Seguradoras, de conformidade com o critério fixado pelo CNSP; e) examinar e aprovar as condições de coberturas especiais, bem como fixas as taxas aplicáveis; f) autorizar a movimentação e liberação dos bens e valores obrigatoriamente inscritos em garantia das reservas técnicas e do capital vinculado; g) fiscalizar a execução das normas gerais de contabilidade e estatística fixadas pelo CNSP para as Sociedades Seguradoras; h) fiscalizar as operações das Sociedades Seguradoras, inclusive o exato cumprimento deste Decreto-lei, de outras leis pertinentes, disposições regulamentares em geral, resoluções do CNSP e aplicar as penalidades cabíveis; i) proceder à liquidação das Sociedades Seguradoras que tiverem cassada a autorização para funcionar no País; j) organizam seus serviços, elaborar e executar seu orçamento. SEÇÃO II Da Administração da SUSEP Art 37. A administração da SUSEP será exercida por um Superintendente, nomeado pelo Presidente da República, mediante indicação do Ministro da Indústria e do Comércio, que terá as suas atribuições definidas no Regulamento deste Decreto-lei e seus vencimentos fixados em Portaria do mesmo Ministro. (Artigo alterado pelo Del. 168/67). Parágrafo único. A organização interna da SUSEP constará de seu Regimento, que será aprovado pelo CNSP. (Parágrafo alterado pelo Del. 168/67). SEÇÃO III 175 Art 38. Os cargos da SUSEP somente poderão ser preenchidos mediante concurso público de provas, ou de provas e títulos, salvo os da direção e os casos de contratação, por prazo determinado, de prestação de serviços técnicos ou de natureza especializada. (Artigo alterado pelo Del. 168/67). Parágrafo Único. O pessoal da SUSEP reger-se-á pela legislação trabalhista e os seus níveis salariais serão fixados pelo Superintendente, com observância do mercado de trabalho, ouvido o CNSP. (Parágrafo alterado pelo Del. 168/67). SEÇÃO IV Dos Recursos Financeiros Art 39. Do produto da arrecadação do imposto sobre operações financeiras a que se refere a Lei nº 5.143, de 20-10-66, será destacada a parcela necessária ao custeio das atividades da SUSEP. Art 40. Constituem ainda recursos da SUSEP: I - O produto das multas aplicadas pela SUSEP; II - Dotação orçamentária específica ou créditos especiais; III - Juros de depósitos bancários; IV - A participação que lhe for atribuída pelo CNSP no fundo previsto no art. 16; V - Outras receitas ou valores adventícios, resultantes de suas atividades. CAPÍTULO VI Do Instituto de Resseguros do Brasil SEÇÃO I Da Natureza Jurídica, Finalidade, Constituição e Competência Art 41. O IRB é uma sociedade de economia mista, dotada de personalidade jurídica própria de Direito Privado e gozando de autonomia administrativa e financeira. Parágrafo único - O IRB será representado em juízo ou fora dele por seu Presidente e responderá no foro comum. Art 42. O IRB tem a finalidade de regular o cosseguro, o resseguro e a retrocessão, bem como promover o desenvolvimento das operações de seguro, segundo as diretrizes do CNSP. 176 Art 43. O capital social do IRB é representado por ações escriturais, ordinárias e preferenciais, todas sem valor nominal. (Artigo alterado pela Lei 9482/97). Parágrafo único. As ações ordinárias, com direito a voto, representam, no mínimo, cinqüenta por cento do capital social. (Parágrafo alterado pela Lei 9482/97). Art 44. Compete ao IRB: I - Na qualidade de órgão regulador de cosseguro, resseguro e retrocessão: a) elaborar e expedir normas reguladoras de cosseguro, resseguro e retrocessão; b) aceitar o resseguro obrigatório e facultativo, do País ou do exterior; c) reter o resseguro aceito, na totalidade ou em parte; d) promover a colocação, no exterior, de seguro, cuja aceitação não convenha aos interesses do País ou que nele não encontre cobertura; e) impor penalidade às Sociedades Seguradoras por infrações cometidas na qualidade de cosseguradoras, resseguradas ou retrocessionárias; f) organizar e administrar consórcios, recebendo inclusive cessão integral de seguros; g) proceder à liquidação de sinistros, de conformidade com os critérios traçados pelas normas de cada ramo de seguro; h) distribuir pelas Sociedades a parte dos resseguros que não retiver e colocar no exterior as responsabilidades excedentes da capacidade do mercado segurador interno, ou aquelas cuja cobertura fora do País convenha aos interesses nacionais; i) representar as retrocessionárias nas liquidações de sinistros amigáveis ou judiciais; j) Promover o pleno aproveitamento da capacidade do mercado nacional de seguros. (Alínea alterada pelo Del. 296/67). II - Na qualidade de promotor do desenvolvimento das operações de seguro, dentre outras atividades: a) organizar cursos para a formação e aperfeiçoamento de técnicos em seguro; b) promover congressos, conferências, reuniões, simpósios e deles participar; c) incentivar a criação e o desenvolvimento de associações técnico-científicas; 177 d) organizar plantas cadastrais, registro de embarcações e aeronaves, vistoriadores e corretores; e) compilar, processar e divulgar dados estatísticos; f) publicar revistas especializadas e outras obras de natureza técnica. (Revogado pela LEI Nº 9.932/20.12.1999)Art 45. Caberá ao IRB a administração das Bolsas de Seguro, destinadas a promover a colocação, no País ou no exterior, de seguros e resseguros especiais que não encontrem cobertura normal nas Sociedades Seguradoras participantes do mercado nacional. Parágrafo único. As Bolsas de Seguro poderão ser criadas nas capitais dos Estados, por ato do CNSP, mediante proposta do IRB. SEÇÃO II Da Administração e do Conselho Fiscal Art 46. São órgãos de administração do IRB o Conselho de Administração e a Diretoria. (Artigo alterado pela Lei 9482/97). § 1º O Conselho de Administração é composto por seis membros, eleitos pela Assembléia Geral, sendo. (Parágrafo acrescentado pela Lei 9482/97). I - três membros indicados pelo Ministro de Estado da Fazenda, dentre eles: a) o Presidente do Conselho; b) o Presidente do IRB, que será o Vice-Presidente do Conselho; II - um membro indicado pelo Ministro de Estado do Planejamento e Orçamento; III - um membro indicado pelos acionistas detentores de ações preferenciais; IV - um membro indicado pelos acionistas minoritários, detentores de ações ordinárias. § 2º A Diretoria do IRB é composta por seis membros, sendo o Presidente e o Vice-Presidente Executivo nomeados pelo Presidente da República, por indicação do Ministro de Estado da Fazenda, e os demais eleitos pelo Conselho, de Administração. (Parágrafo acrescentado pela Lei 9482/97). § 3º Enquanto a totalidade das ações ordinárias permanecer com a União, aos acionistas detentores de ações preferenciais será facultado o direito de indicar 178 até dois membros para o Conselho de Administração do IRB. (Parágrafo acrescentado pela Lei 9482/97). § 4º Os membros do Conselho de Administração e da Diretoria do IRB terão mandato de três anos, observado o disposto na Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. (Parágrafo acrescentado pela Lei 9482/97). Art 47. O Conselho Fiscal do IRB é composto por cinco membros efetivos e respectivos suplentes, eleitos pela Assembléia Geral, sendo; (Artigo alterado pela Lei 9482/97). I - três membros e respectivos suplentes indicados pelo Ministro de Estado da Fazenda, dentre os quais um representante do Tesouro Nacional; II - um membro e respectivo suplente eleitos, em votação em separado, pelos acionistas minoritários detentores de ações ordinárias; III - um membro e respectivo suplente eleitos pelos acionistas detentores de ações preferenciais sem direito a voto ou com voto restrito, excluído o acionista controlador, se detentor dessa espécie de ação. Parágrafo Único. Enquanto a totalidade das ações ordinárias permanecer com a União, aos acionistas detentores de ações preferenciais será facultado o direito de indicar até dois membros para o Conselho Fiscal do IRB. (Parágrafo alterado pela Lei 9482/97). Art 48. Os estatutos fixarão a competência do Conselho de Administração e da Diretoria do IRB. (Artigo alterado pela Lei 9482/97). Art 49. (Artigo revogado pela Lei 9482/97). Art 50. (Artigo revogado pela Lei 9482/97). Art 51. (Artigo revogado pela Lei 9482/97). Art 52. (Artigo revogado pela Lei 9482/97). Art 53. (Artigo revogado pela Lei 9482/97) Art 54. (Artigo revogado pela Lei 9482/97). SEÇÃO III Do Pessoal 179 Art 55. Os serviços do IRB serão executados por pessoal admitido mediante concurso público de provas ou de provas e títulos, cabendo aos Estatutos regular suas condições de realização, bem como os direitos, vantagens e deveres dos servidores, inclusive as punições aplicáveis. § 1º A nomeação para cargo em comissão será feita pelo Presidente, depois de aprovada sua criação pelo Conselho Técnico. § 2º É permitida a contratação de pessoal destinado a funções técnicas especializadas ou para serviços auxiliares de manutenção, transporte, higiene e limpeza. § 3º Ficam assegurados aos servidores do IRB os direitos decorrentes de normas legais em vigor, no que digam respeito à participação nos lucros, aposentadoria, enquadramento sindical, estabilidade e aplicação da legislação do trabalho. (Parágrafo retificado pelo Del. 296/67). § 4º Os vencimentos dos servidores do IRB constarão de quadro aprovado pelo Conselho Técnico, mediante proposta do Presidente. SEÇÃO IV Das operações (Revogado pela LEI Nº 9.932/20.12.1999) - Art 56. O IRB opera em qualquer tipo de resseguro ou de retrocessão, segundo as normas aprovadas pelo Conselho Técnico e dentro das diretrizes traçadas pelo CNSP, que regulamentará a realização dos seguros previstos no artigo 20 do CAPÍTULO III deste Decreto-lei. Art 57. As operações do IRB têm a garantia de seu capital e reservas e, subsidiariamente, a da União. Art 58. A aceitação de resseguro pelo IRB é obrigatória, em princípio, para as responsabilidades originárias e para os riscos acessórios. Art 59. O IRB poderá organizar e dirigir consórcios, inclusive deles participar, sendo considerado ressegurador e ficando as Sociedades Seguradoras, nesse caso, como retrocessionárias. Art 60. É obrigatória a aceitação da retrocessão do IRB pelas Sociedades Seguradoras autorizadas a operar no País. 180 § 1º A circunstância de não operarem em seguro, no ramo e modalidade da retrocessão não exime as Sociedades Seguradoras das obrigações estabelecidas neste artigo. (Parágrafo retificado pelo Del. 296/67). § 2º Na distribuição das retrocessões, o IRB levará em conta o volume e o resultado dos resseguros recebidos, bem como a orientação técnica e a situação econômico-financeira das Sociedades Seguradoras. Art 61. O IRB poderá efetuar adiantamentos às Sociedades Seguradoras, por conta de recuperação de indenizações provenientes de sinistros. § 1º No caso de receberem adiantamento, as Sociedades Seguradoras ficarão obrigadas a aplicá-lo na liquidação dentro de 30 dias. Constitui crime de apropriação indébita a falta de utilização dos adiantamentos recebidos, na forma e no prazo previstos neste parágrafo. § 2º Os diretores e administradores das Sociedades Seguradoras respondem civil e criminalmente pela inobservância do disposto no parágrafo anterior. Art 62. As Sociedades Seguradoras ficam obrigadas a constituir e a manter um Fundo de Garantia de Retrocessões - FGR, destinado a responder subsidiariamente pelas responsabilidades decorrentes das retrocessões do I.R.B. § 1º O FGR será considerado, para todos os efeitos, como reserva técnica. § 2º O FGR será constituído pela transferência anual de percentuais dos lucros líquidos apurados pelas Sociedades, da forma e nas condições estabelecidas pelo CNSP, que poderá determinar a transferência para o FGR da parte ou da totalidade dos saldos auferidos pelas Sociedades Seguradoras, na condição de retrocessionárias do IRB. § 3º O CNSP fixará o montante do FGR a ser recolhido ao IRB, sobre o qual este abonará juros, podendo efetuar a compensação dos seus créditos nos casos de liquidação das Sociedades Seguradoras. Art 63. Todas as informações e demais esclarecimentos necessários às operações do IRB serão obrigatoriamente fornecidos pelas autoridades e pelas Sociedades Seguradoras a que forem solicitadas. Art 64. Para a realização da política de seguros estabelecida pelo CNSP, o Ministério da Fazenda e os órgãos do Sistema Financeiro Nacional prestarão ao IRB a colaboração necessária e lhe proporcionarão os meios para a efetivação de suas operações no exterior. SEÇÃO V - Das liquidações de sinistros 181 Art 65. Nos casos de liquidação de sinistros, as normas e decisões do IRB obrigam as Sociedades Seguradoras. Art 66. As liquidações extrajudiciais só obrigarão o IRB quando ele houver homologado o acordo relativo à indenização e autorizado previamente seu pagamento, ressalvadas as exceções de cada ramo. Art 67. O IRB responderá perante as Sociedades Seguradoras diretas na proporção da responsabilidade ressegurada, inclusive na parte correspondente às despesas de liquidação, ficando com direito regressivo contra as retrocessionárias, para delas reaver a quota que lhes couber no sinistro. Art 68. O IRB será considerado litisconsorte necessário nas ações de seguro, sempre que tiver responsabilidade no pedido. § 1º A Sociedade Seguradora deverá declarar, na contestação, se o IRB participa na soma reclamada. Sendo o caso, o juiz mandará citar o Instituto e manterá sobrestado o andamento do feito até a efetivação da medida processual. § 2º O IRB responderá no foro em que for demandada a Sociedade Seguradora. § 3º O IRB não responde diretamente perante os segurados pelo montante assumido em resseguro. § 4º Nas ações executivas de seguro e nas execuções de sentença, não terá eficácia a penhora feita antes da citação da Sociedade Seguradora e do IRB. § 5º Nas louvações de peritos, caberá ao IRB a indicação, se não houver acordo com as Sociedades Seguradoras. § 6º As sentenças proferidas com inobservância do disposto no presente artigo serão nulas. Art 69. As Sociedades Seguradoras retrocessionárias acompanharão a sorte do IRB, que as representará nas liquidações amigáveis ou judiciais de sinistros SEÇÃO VI - Do balanço e distribuição de lucros Art 70. O IRB constituirá reservas, fundos e provisões necessárias à sua estabilidade econômico-financeira, não podendo as reservas técnicas ser inferiores às determinadas pelo CNSP para as Sociedades Seguradoras. Parágrafo único. As reservas, fundos e provisões, constituídas pelo IRB na forma deste artigo, não se consideram como lucros, para efeitos fiscais. 182 Art 71. Depois de constituídas as reservas técnicas e feitas as necessárias amortizações e depreciações, os lucros líquidos do IRB serão distribuídos da seguinte forma: a) o montante determinado pelo CT para um fundo de reserva suplementar, soma essa que até o fundo atingir valor igual ao do capital, deverá ser, no mínimo de vinte por cento; b) o montante necessário para distribuir um dividendo não superior a dez por cento do capital realizado e reservas patrimoniais do IRB, conforme deliberação do CT; c) o montante necessário para gratificação aos Conselheiros, ao Presidente e aos demais membros da administração e servidores. Parágrafo único. O saldo que se apurar será distribuído da seguinte forma: a) o montante necessário para fundos especiais, inclusive para difusão e aperfeiçoamento técnico do seguro, a critério do CT; b) até vinte e cinco por cento às Instituições de Previdência Social, proporcionalmente às respectivas participações nas ações da classe "A"; c) até vinte e cinco por cento a serem distribuídos pelas Sociedades Seguradoras, na proporção do resultado das operações que tenham efetuado com o IRB; d) até vinte e cinco por cento para a União Federal, destinados ao Ministério da Saúde, para o combate às endemias. CAPÍTULO VII Das sociedades seguradoras SEÇÃO I Legislação aplicável Art 72. As Sociedades Seguradoras serão reguladas pela legislação geral no que lhes for aplicável e, em especial, pelas disposições do presente Decreto-lei. Parágrafo Único. Aplicam-se às sociedades seguradoras o disposto no art. 25 da Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964, com a redação que lhe dá o art. 1º desta lei. (Parágrafo acrescentado pela Lei 5.710/71). Art 73. As Sociedades Seguradoras não poderão explorar qualquer outro ramo de comércio ou indústria. 183 SEÇÃO II Da autorização para funcionamento Art 74. A autorização para funcionamento será concedida através de Portaria do Ministro da Indústria e do Comércio, mediante requerimento firmado pelos incorporadores, dirigido ao CNSP e apresentado por intermédio da SUSEP. Art 75. Concedida a autorização para funcionamento, a Sociedade terá o prazo de noventa dias para comprovar perante a SUSEP, o cumprimento de todas as formalidades legais ou exigências feitas no ato da autorização. Art 76. Feita a comprovação referida no artigo anterior, será expedido a cartapatente pelo Ministro da Indústria e do Comércio. Art 77. As alterações dos Estatutos das Sociedades Seguradoras dependerão de prévia autorização do Ministro da Indústria e do Comércio, ouvidos a SUSEP e o CNSP. SEÇÃO III Das Operações das Sociedades Seguradoras Art 78. As Sociedades Seguradoras só poderão operar em seguros para os quais tenham a necessária autorização, segundo os planos, tarifas e normas aprovadas pelo CNSP. Art 79. É vedado às Sociedades Seguradoras reter responsabilidades cujo valor ultrapasse os limites técnicos, fixados pela SUSEP de acordo com as normas aprovadas pelo CNSP, e que levarão em conta: a) a situação econômico-financeira das Sociedades Seguradoras; b) as condições técnicas das respectivas carteiras; c) o resultado de suas operações com o IRB. § 1º As Sociedades Seguradoras são obrigadas a ressegurar no IRB as responsabilidades excedentes de seu limite técnico em cada ramo de operações e, em caso de cosseguro, a cota que for fixada pelo CNSP. § 2º Não haverá cobertura de resseguro para as responsabilidades assumidas pelas Sociedades Seguradoras em desacordo com as normas e instruções em vigor. Art 80. As operações de cosseguro obedecerão a critérios fixados pelo CNSP, quanto à obrigatoriedade e normas técnicas. 184 Art 81. A colocação de seguro e resseguro no estrangeiro será feita exclusivamente por intermédio do IRB. Parágrafo único. As reservas de garantia correspondentes aos seguros e resseguros efetuados no exterior ficarão integralmente retidas no País. Art 82. As Sociedades Seguradoras só poderão aceitar resseguros mediante prévia e expressa autorização do IRB. Art 83. As apólices, certificados e bilhetes de seguro mencionarão a responsabilidade máxima da Sociedade Seguradora, expressa em moeda nacional, para cobertura dos riscos neles descritos e caracterizados. Art 84. Para garantia de todas as suas obrigações, as Sociedades Seguradoras constituirão reservas técnicas, fundos especiais e provisões, de conformidade com os critérios fixados pelo CNSP, além das reservas e fundos determinados em leis especiais. 1º 0 patrimônio liquido das sociedades seguradoras não poderá ser inferior ao valor do passivo não operacional, nem ao valor mínimo decorrente do cálculo da margem de solvência, efetuado com base na regulamentação baixada pelo CNSP.(Redação da LEI Nº 10.190/ 14.02.2001) § 2º 0 passivo não operacional será constituído pelo valor total das obrigações não cobertas por bens garantidores..(Redação da LEI Nº 10.190/ 14.02.2001) § 3º As sociedades seguradoras deverão adequar-se ao disposto neste artigo no prazo de um ano, prorrogável por igual período e caso a caso, por decisão do CNSP." (NR).(Redação da LEI Nº 10.190/ 14.02.2001) (REdação anterior) - § 1º O patrimônio líquido das sociedades seguradoras não poderá ser inferior ao valor do passivo não operacional, nem ao valor mínimo decorrente do cálculo da margem de solvência, efetuado com base na regulamentação baixada pelo CNSP. § 2º O passivo não operacional será constituído pelo valor total das obrigações não cobertas por bens garantidores. § 3º As Sociedades Seguradoras deverão adequar-se ao disposto neste artigo no prazo de um ano, prorrogável por igual período e caso a caso, por decisão do CNSP. (NR) (Os parágrafos 1º, 2º e 3º foram acrescentados pela Lei 10.190/01). 185 Art 85. Os bens garantidores das reservas técnicas, fundos e provisões serão registrados na SUSEP e não poderão ser alienados, prometidos alienar ou de qualquer forma gravados sem sua prévia e expressa autorização, sendo nulas de pleno direito, as alienações realizadas ou os gravames constituídos com violação deste artigo. (Artigo retificado pelo Del. 296/67). Parágrafo único. Quando a garantia recair em bem imóvel, será obrigatoriamente inscrita no competente Cartório do Registro Geral de Imóveis, mediante simples requerimento firmado pela Sociedade Seguradora e pela SUSEP. Art 86. Os segurados e beneficiários que sejam credores por indenização ajustada ou por ajustar têm privilégio especial sobre reservas técnicas, fundos especiais ou provisões garantidoras das operações de seguro, cabendo ao IRB o mesmo privilégio após o pagamento aos segurados e beneficiários. Art 87. As Sociedades Seguradoras não poderão distribuir lucros ou quaisquer fundos correspondentes às reservas patrimoniais, desde que essa distribuição possa prejudicar o investimento obrigatório do capital e reserva, de conformidade com os critérios estabelecidos neste Decreto-lei. Art 88. As Sociedades Seguradoras obedecerão às normas e instruções da SUSEP e do IRB sobre operações de seguro, cosseguro, resseguro e retrocessão, bem como lhes fornecerão dados e informações atinentes a quaisquer aspectos de suas atividades. Parágrafo único. Os inspetores e funcionários credenciados da SUSEP e do IRB terão livre acesso às Sociedades Seguradoras, delas podendo requisitar e apreender livros, notas técnicas e documentos, caracterizando-se como embaraço à fiscalização, sujeito às penas previstas neste Decreto-lei, qualquer dificuldade oposta aos objetivos deste artigo. CAPÍTULO VIII Do Regime Especial de Fiscalização Art 89. Em caso de insuficiência de cobertura das reservas técnicas ou de má situação econômico-financeira da Sociedade Seguradora, a critério da SUSEP, poderá esta, além de outras providências cabíveis, inclusive fiscalização especial, nomear, por tempo indeterminado, às expensas da Sociedade Seguradora, um diretor-fiscal com as atribuições e vantagens que lhe forem indicadas pelo CNSP. § 1º Sempre que julgar necessário ou conveniente à defesa dos interesses dos segurados, a SUSEP verificará, nas indenizações, o fiel cumprimento do contrato, inclusive a exatidão do cálculo da reserva técnica e se as causas 186 protelatórias do pagamento, porventura existentes, decorrem de dificuldades econômico-financeira da empresa. (Revogado pela LEI Nº 9.932/20.12.1999)§ 2º Comprovada a viabilidade de recuperação econômico-financeira da sociedade, o IRB poderá conceder-lhe tratamento técnico e financeiro excepcional, de modo a propiciar aquela recuperação. (Parágrafo acrescentado pelo Del. 1.115/70). Art 90. Não surtindo efeito as medidas especiais ou a intervenção, a SUSEP encaminhará ao CNSP proposta de cassação da autorização para funcionamento da Sociedade Seguradora. Parágrafo único. Aplica-se à intervenção a que se refere este artigo o disposto nos arts. 55 a 62 da Lei nº 6.435, de 15 de julho de 1977." (NR)(Redação da LEI Nº 10.190/ 14.02.2001) Art 91. O descumprimento de qualquer determinação do Diretor-Fiscal por Diretores, administradores, gerentes, fiscais ou funcionários da Sociedade Seguradora em regime especial de fiscalização acarretará o afastamento do infrator, sem prejuízo das sanções penais cabíveis. Art 92. Os administradores das Sociedades Seguradoras ficarão suspensos do exercício de suas funções desde que instaurado processo-crime por atos ou fatos relativos à respectiva gestão, perdendo imediatamente seu mandato na hipótese de condenação. (Artigo retificado pelo Del. 296/67). Art 93. Cassada a autorização de uma Sociedade Seguradora para funcionar, a alienação ou gravame de qualquer de seus bens dependerá de autorização da SUSEP, que, para salvaguarda dessa inalienabilidade, terá poderes para controlar o movimento de contas bancárias e promover o levantamento do respectivo ônus junto às Autoridades ou Registros Públicos. CAPÍTULO IX Da Liquidação das Sociedades Seguradoras Art 94. A cessação das operações das Sociedades Seguradoras poderá ser: a) voluntária, por deliberação dos sócios em Assembléia Geral; b) compulsória, por ato do Ministro da Indústria e do Comércio, nos termos deste Decreto-lei. Art 95. Nos casos de cessação voluntária das operações, os Diretores requererão ao Ministro da Indústria e do Comércio o cancelamento da autorização para funcionamento da Sociedade Seguradora, no prazo de cinco dias da respectiva Assembléia Geral. 187 Parágrafo único. Devidamente instruído, o requerimento será encaminhado por intermédio da SUSEP, que opinará sobre a cessação deliberada. Art 96. Além dos casos previstos neste Decreto-lei ou em outras leis, ocorrerá a cessação compulsória das operações da Sociedade Seguradora que: a) praticar atos nocivos à política de seguros determinada pelo CNSP; b) não formar as reservas, fundos e provisões a que esteja obrigada ou deixar de aplicá-las pela forma prescrita neste Decreto-lei; b) acumular obrigações vultosas devidas ao IRB, a juízo do Ministro da Indústria e do Comércio; d) configurar a insolvência econômico-financeira. Art 97. A liquidação voluntária ou compulsória das Sociedades Seguradoras será processada pela SUSEP. Art 98. O ato da cassação será publicado no Diário Oficial da União, produzindo imediatamente os seguintes efeitos: a) suspensão das ações e execuções judiciais, excetuadas as que tiveram início anteriormente, quando intentadas por credores com privilégio sobre determinados bens da Sociedade Seguradora; c) vencimento de todas as obrigações civis ou comerciais da Sociedade Seguradora liquidanda, incluídas as cláusulas penais dos contratos; c) suspensão da incidência de juros, ainda que estipulados, se a massa liquidanda não bastar para o pagamento do principal; d) cancelamento dos poderes de todos os órgãos de administração da Sociedade liquidanda. § 1º Durante a liquidação, fica interrompida a prescrição extintiva contra ou a favor da massa liquidanda. § 2º Quando a sociedade tiver credores por salários ou indenizações trabalhistas, também ficarão suspensas as ações e execuções a que se refere a parte final da alínea a deste artigo. (Parágrafo acrescentado pelo Del. 296/67). § 3º Poderá ser argüida em qualquer fase processual, inclusive quanto às questões trabalhistas, a nulidade dos despachos ou decisões que contravenham o disposto na alínea a deste artigo, ou em seu parágrafo 2º. Nos processos sujeitos à suspensão, caberá à sociedade liquidanda, para realização do ativo, requerer o levantamento de penhoras, arrestos e quaisquer outras medidas de apreensão ou 188 reserva de bens, sem prejuízo do estatuído adiante no parágrafo único do artigo 103. (Parágrafo acrescentado pelo Del. 296/67). § 4º A massa liquidanda não estará obrigada a reajustamento salariais sobrevindos durante a liquidação, nem responderá pelo pagamento de multas, custas, honorários e demais despesas feitas pelos credores em interesse próprio, assim como não se aplicará correção monetária aos créditos pela mora resultante de liquidação. (Parágrafo acrescentado pelo Del. 296/67). Art 99. Além dos poderes gerais de administração, a SUSEP ficará investida de poderes especiais para representar a Sociedade Seguradora liquidanda ativa e passivamente, em juízo ou fora dele, podendo: a) propor e contestar ações, inclusive para integralização de capital pelos acionistas; b) nomear e demitir funcionários; c) fixar os vencimentos de funcionários; d) outorgar ou revogar mandatos; e) transigir; f) vender valores móveis e bens imóveis. Art 100. Dentro de 90 (noventa) dias da cassação para funcionamento, a SUSEP levantará o balanço do ativo e do passivo da Sociedade Seguradora liquidanda e organizará: a) o arrolamento pormenorizado dos bens do ativo, com as respectivas avaliações, especificando os garantidores das reservas técnicas ou do capital; b) a lista dos credores por dívida de indenização de sinistro, capital garantidor de reservas técnicas ou restituição de prêmios, com a indicação das respectivas importâncias; c) a relação dos créditos da Fazenda Pública, da Previdência Social, e do IRB; d) a relação dos demais credores, com indicação das importâncias e procedência dos créditos, bem como sua classificação, de acordo com a legislação de falências. (Revogado pela LEI Nº 9.932/20.12.1999) - Parágrafo único. O IRB compensará seu crédito com o valor das ações efetivamente realizadas pela Sociedade Seguradora liquidanda, acrescido do ágio, pagando-lhe o saldo, se houver, e procedendo à transferência como previsto no artigo 43 parágrafo 3º. 189 Art 101. Os interessados poderão impugnar o quadro geral de credores, mas decairão desse direito se não o exercerem no prazo de quinze dias. Art 102. A SUSEP examinará as impugnações e fará publicar no Diário Oficial da União, sua decisão, dela notificando os recorrentes por via postal, sob AR. Parágrafo único. Da decisão da SUSEP caberá recurso para o Ministro da Indústria e do Comércio, no prazo de quinze dias. Art 103. Depois da decisão relativa a seus créditos ou aos créditos contra os quais tenham reclamado, os credores não incluídos nas relações a que se refere o art. 100, os delas excluídos, os incluídos sem os privilégios a que se julguem com direito, inclusive por atribuição de importância inferior à reclamada, poderão prosseguir na ação já iniciada ou propor a que lhes competir. Parágrafo único. Até que sejam julgadas as ações, a SUSEP reservará cota proporcional do ativo para garantia dos credores de que trata este artigo. Art 104. A SUSEP promoverá a realização do ativo e efetuará o pagamento dos credores pelo crédito apurado e aprovado, no prazo de seis meses, observados os respectivos privilégios e classificação, de acordo com a cota apurada em rateio. Art 105. Ultimada a liquidação e levantado o balanço final, será o mesmo submetido à aprovação do Ministro da Indústria e do Comércio, com relatório da SUSEP. Art 106. A SUSEP terá direito à comissão de cinco por cento sobre o ativo apurado nos trabalhos de liquidação, competindo ao Superintendente arbitrar a gratificação a ser paga aos inspetores e funcionários encarregados de executálos. Art 107. Nos casos omissos, são aplicáveis as disposições da legislação de falências, desde que não contrariem as disposições do presente Decreto-lei. Parágrafo único. Nos casos de cessação parcial, restrita às operações de um ramo, serão observadas as disposições deste CAPÍTULO, na parte aplicável. CAPÍTULO Do Regime Repressivo X Art 108. As infrações aos dispositivos deste Decreto-lei sujeitam as Sociedades Seguradoras, seus Diretores, administradores, gerentes e fiscais às seguintes penalidades, sem prejuízo de outras estabelecidas na legislação vigente: I - Advertência; 190 II - Multa pecuniária; III - Suspensão do exercício do cargo; IV - Inabilitação temporária ou permanente para o exercício de cargo de direção, nas Sociedades Seguradoras ou no IRB; V - Suspensão da autorização em cada ramo isolado; VI - Perda parcial ou total da recuperação de resseguro; VII - Suspensão de cobertura automática; VIII - Suspensão de retrocessão; IX - Cassação de carta-patente. Art 109. Os Diretores, administradores, gerentes e fiscais das Sociedades Seguradoras responderão solidariamente com a mesma pelos prejuízos causados a terceiros, inclusive aos seus acionistas, em conseqüência do descumprimento de leis, normas e instruções referentes as operações de seguro, cosseguro, resseguro ou retrocessão, e em especial, pela falta de constituição das reservas obrigatórias. Art 110. Constitui crime contra a economia popular, punível de acordo com a legislação respectiva, a ação ou omissão, pessoal ou coletiva, de que decorra a insuficiência das reservas e de sua cobertura, vinculadas à garantia das obrigações das Sociedades Seguradoras. Art 111. Serão aplicadas multas de até Cr$50.000.000 (cinqüenta milhões de cruzeiros) às Sociedades Seguradoras que: a) infringirem disposições das normas e instruções baixadas pelo CNPS, pela SUSEP ou pelo IRB, nos casos em que não estejam previstas outras penalidades; a) retiverem cotas de responsabilidade fora de seus limites de retenção; c) alienarem eu onerarem bens em desacordo com este Decreto-lei; d) não mantiverem os registros aprovados pela SUSEP, de acordo com o presente Decreto-lei; e) transgredirem a proibição do art. 28 deste Decreto-lei; (Alínea retificada pelo Del. 296/67). 191 (Revogado pela LEI Nº 9.932/20.12.1999) - f) deixarem de fornecer informações ao IRB na forma prevista no artigo 63 deste Decreto-lei; g) fizerem declarações ou dissimulações fraudulentas nos relatórios, balanços, contas e documentos apresentados, requisitados ou apreendidos pela SUSEP ou pelo IRB; h) diretamente ou por interposta pessoa, realizarem ou se propuserem realizar, através de anúncios ou prospectos, contratos de seguro ou resseguro de qualquer natureza que interessem a pessoas e coisas existentes no País, sem a necessária carta-patente ou antes da aprovação dos respectivos planos, tabelas, modelos de propostas, de apólices e de bilhetes de seguro; i) divulgarem prospectos, publicarem anúncios, expedirem circulares ou fizerem outras publicações que contenham afirmações ou informações contrárias às leis, seus estatutos e planos, ou que possam induzir alguém em erro sobre a verdadeira importância das operações, bem como sobre o alcance da fiscalização a que estiverem obrigadas. Art 112. Será aplicada multa de até Cr$20.000.000 (vinte milhões de cruzeiros) às pessoas que deixarem de realizar os seguros legalmente obrigatórios, sem prejuízo de outras sanções legais. Art 113. As pessoas físicas ou jurídicas que realizarem operações de seguro, cosseguro ou resseguro sem a devida autorização, no País ou no exterior, ficam sujeitas à pena de multa igual ao valor da importância segurada ou ressegurada. Art 114. A suspensão do exercício do cargo e a inabilitação para a direção ou gerência de Sociedades Seguradoras caberão quando houver reincidência nas transgressões previstas nas letras d , f , e h do artigo 111. Art 115. A suspensão de autorização para operar em determinado ramo de seguro será aplicada quando verificada má condução técnica ou financeira dos respectivos negócios. (Revogado pela LEI Nº 9.932/20.12.1999) - Art 116. A perda parcial ou total da recuperação e a suspensão da cobertura automática e das retrocessões caberão nos seguintes casos: a) incapacidade técnica na condução dos negócios da Sociedade Seguradora; b) liquidação de sinistro sem autorização do IRB; c) contratação de seguro em desacordo com as normas da SUSEP; 192 d) falta de liquidação dos débitos de operações com o IRB por mais de sessenta dias; e) omissão do IRB como litisconsorte necessário nos casos em que este tiver responsabilidade no pedido; f) falta de aplicação dos adiantamentos concedidos pelo IRB, na forma e no prazo previsto no artigo 61, parágrafo 1º deste Decreto-lei; (Alínea retificada pelo Del 296/67). g) reincidência na proibição do artigo 30 do presente Decreto-lei; h) reincidência na proibição do artigo 79 deste Decreto-lei; (Alínea retificada pelo Del. 296/67). i) reincidência na proibição do artigo 111, letra a , deste Decreto-lei; (Alínea retificada pelo Del. 296/67). Art 117. A cassação da carta patente se fará nas hipóteses de infringência dos artigos 81 e 82, nos casos previstos no artigo 96 ou de reincidência na proibição estabelecida nas letras " c " e " i " do artigo 111, todos do presente Decreto-lei. Art 118. As infrações serão apuradas mediante processo administrativo que tenha por base o auto, a representação ou a denúncia positivando fatos irregulares, e o CNSP disporá sobre as respectivas instaurações, recursos e seus efeitos, instâncias, prazos, perempção e outros atos processualísticos. Art 119. As multas aplicadas de conformidade com o disposto neste CAPÍTULO e seguinte serão recolhidas aos cofres da SUSEP. Art 120. Os valores monetários das penalidades previstas nos artigos precedentes ficam sujeitos à correção monetária pelo CNSP. Art 121. Provada qualquer infração penal a SUSEP remeterá cópia do processo ao Ministério Público para fins de direito. CAPÍTULO XI Dos Corretores de Seguros Art 122. O corretor de seguros, pessoa física ou jurídica, é o intermediário legalmente autorizado a angariar e promover contratos de seguro entre as Sociedades Seguradoras e as pessoas físicas ou jurídicas de Direito Privado. 193 Art 123. O exercício da profissão, de corretor de seguros depende de prévia habilitação e registro. § 1º A habilitação será feita perante a SUSEP, mediante prova de capacidade técnico-profissional, na forma das instruções baixadas pelo CNSP. § 2º O corretor de seguros poderá ter prepostos de sua livre escolha e designará, dentre eles, o que o substituirá. § 3º Os corretores e prepostos serão registrados na SUSEP, com obediência aos requisitos estabelecidos pelo CNSP. Art 124. As comissões de corretagem só poderão ser pagas a corretor de seguros devidamente habilitado. Art 125. É vedado aos corretores e seus prepostos: a) aceitar ou exercer emprego de pessoa jurídica de Direito Público; b) manter relação de emprego ou de direção com Sociedade Seguradora. Parágrafo único. Os impedimentos deste artigo aplicam-se também aos Sócios e Diretores de Empresas de corretagem. Art 126. O corretor de seguros responderá civilmente perante os segurados e as Sociedades Seguradoras pelos prejuízos que causar, por omissão, imperícia ou negligência no exercício da profissão. Art 127. Caberá responsabilidade profissional, perante a SUSEP, ao corretor que deixar de cumprir as leis, regulamentos e resoluções em vigor, ou que der causa dolosa ou culposa a prejuízos às Sociedades Seguradoras ou aos segurados. Art 128. O corretor de seguros estará sujeito às penalidades seguintes: a) multa; b) suspensão temporária do exercício da profissão; c) cancelamento do registro. Parágrafo único. As penalidades serão aplicadas pela SUSEP, em processo regular, na forma prevista no art. 119 desta Lei. (Parágrafo retificado pelo Del 296/67). CAPÍTULO XII Disposições Gerais e Transitórias 194 SEÇÃO I Do Seguro-Saúde Art 129. Fica instituído o Seguro-Saúde para dar cobertura aos riscos de assistência médica e hospitalar. Art 130. A garantia do Seguro-Saúde consistirá no pagamento em dinheiro, efetuado pela Sociedade Seguradora, à pessoa física ou jurídica prestante da assistência médico-hospitalar ao segurado. § 1º A cobertura do Seguro-Saúde ficará sujeita ao regime de franquia, de acordo com os critérios fixados pelo CNSP. § 2º A livre escolha do médico e do hospital é condição obrigatória nos contratos referidos no artigo anterior. Art 131. Para os efeitos do artigo 130 deste Decreto-lei, o CNSP estabelecerá tabelas de honorários médico-hospitalares e fixará percentuais de participação obrigatória dos segurados nos sinistros. § 1º Na elaboração das tabelas, o CNSP observará a média regional dos honorários e a renda média dos pacientes, incluindo a possibilidade da ampliação voluntária da cobertura pelo acréscimo do prêmio. § 2º Na fixação das percentagens de participação, o CNSP levará em conta os índices salariais dos segurados e seus encargos familiares. Art 132. O pagamento das despesas cobertas pelo Seguro-Saúde dependerá de apresentação da documentação médico hospitalar que possibilite a identificação do sinistro. (Artigo retificado pelo Del. 296/67). Art 133. É vedado às Sociedades Seguradoras acumular assistência financeira com assistência médico-hospitalar. Art 134. As sociedades civis ou comerciais que, na data deste Decreto-lei, tenham vendido títulos, contratos, garantias de saúde, segurança de saúde, benefícios de saúde, títulos de saúde ou seguros sob qualquer outra denominação, para atendimento médico, farmacêutico e hospitalar, integral ou parcial, ficam proibidas de efetuar novas transações do mesmo gênero, ressalvado o disposto no art. 135, parágrafo 1º. (Artigo retificado pelo Del 296/67). § 1º As Sociedades civis e comerciais que se enquadrem no disposto neste artigo poderão continuar prestando os serviços nele referidos exclusivamente às pessoas físicas ou jurídicas com as quais os tenham ajustado ante da 195 promulgação deste Decreto-lei, facultada opção bilateral pelo regime do SeguroSaúde. § 2º No caso da opção prevista no parágrafo anterior, as pessoas jurídicas prestantes da assistência médica, farmacêutica e hospitalar, ora regulada, ficarão responsáveis pela contribuição do Seguro-Saúde devida pelas pessoas físicas optantes. § 3º Ficam excluídas das obrigações previstas neste artigo as Sociedades Beneficentes que estiverem em funcionamento na data da promulgação desse Decreto-lei, as quais poderão preferir o regime do Seguro-Saúde a qualquer tempo. Art 135. As entidades organizadas sem objetivo de lucro, por profissionais médicos e paramédicos ou por estabelecimentos hospitalares, visando a institucionalizar suas atividades para a prática da medicina social e para a melhoria das condições técnicas e econômicas dos serviços assistenciais, isoladamente ou em regime de associação, poderão operar sistemas próprios de pré-pagamento de serviços médicos e/ou hospitalares, sujeitas ao que dispuser a regulamentação desta Lei, às resoluções do CNSP e à fiscalização dos órgãos competentes. SEÇÃO II Art 136. Fica extinto o Departamento Nacional de Seguros Privados e Capitalização (DNSPC), da Secretaria do Comércio, do Ministério da Indústria e do Comércio, cujo acervo e documentação passarão para a Superintendência de Seguros Privados (SUSEP). (Artigo alterado pelo Del. 168/67). § 1º Até que entre em funcionamento a SUSEP, as atribuições a ela conferidas pelo presente Decreto-lei continuarão a ser desempenhadas pelo DNSPC. § 2º Fica extinto, no Quadro de Pessoal do Ministério da Indústria e do Comércio, o cargo em comissão de Diretor-Geral do Departamento Nacional de Seguros Privados e Capitalização, símbolo 2-C. § 3º Serão considerados extintos, no Quadro de Pessoal do Ministério da Indústria e do Comércio, a partir da criação dos cargos correspondentes nos quadros da SUSEP, os 8 (oito) cargos em comissão do Delegado Regional de Seguros, símbolo 5-C. (Os parágrafos 1º, 2º e 3º foram alterados pelo Del 168/67). 196 Art 137. Os funcionários atualmente em exercício no DNSPC continuarão a integrar o Quadro de Pessoal do Ministério da Indústria e do Comércio. (Artigo alterado pelo Del 168/67). Art 138. Poderá a SUSEP requisitar servidores da administração pública federal, centralizada e descentralizada, sem prejuízo dos vencimentos e vantagens relativos aos cargos que ocuparem.(Artigo alterado pelo Del. 168/67). Art 139. Os servidores requisitados antes da aprovação, pelo CNSP, do Quadro de Pessoal da SUSEP, poderão nele ser aproveitados, desde que consultados os interesses da Autarquia e dos Servidores. (Artigo alterado pelo Del 168/67). Parágrafo único. O aproveitamento de que trata este artigo implica na aceitação do regime de pessoal da SUSEP devendo ser contado o tempo de serviço, no órgão de origem, para todos os efeitos legais. (Parágrafo alterado pelo Del. 168/67). Art 140. As dotações consignadas no Orçamento da União, para o exercício de 1967, à conta do DNSPC, serão transferidas para a SUSEP excluídas as relativas às despesas decorrentes de vencimentos e vantagens de Pessoal Permanente. Art 141. Fica dissolvida a Companhia Nacional de Seguro Agrícola, competindo ao Ministério da Agricultura promover sua liquidação e aproveitamento de seu pessoal. Art 142. Ficam incorporadas ao Fundo de Estabilidade do Seguro Rural: a) Fundo de Estabilidade do Seguro Agrário, a que se refere o artigo 3º da Lei 2.168, de 11 de janeiro de 1954; (Alínea retificada pelo Del. 296/67). b) O Fundo de Estabilização previsto no artigo 3º da Lei nº 4430, de 20 de outubro de 1964. Art 143. Os órgãos do Poder Público que operam em seguros privados enquadrarão suas atividades ao regime deste Decreto-lei no prazo de cento e oitenta dias, ficando autorizados a constituir a necessária Sociedade Anônima ou Cooperativa. § 1º As Associações de Classe, de Beneficência e de Socorros mútuos e os Montepios que instituem pensões ou pecúlios, atualmente em funcionamento, ficam excluídos do regime estabelecido neste Decreto-lei, facultado ao CNSP mandar fiscalizá-los se e quando julgar conveniente. § 2º As Sociedades Seguradoras estrangeiras que operam no País adaptarão suas organizações às novas exigências legais, no prazo deste artigo e nas condições determinadas pelo CNSP. (Parágrafo alterado pelo Del. 296/67). 197 Art 144. O CNSP proporá ao Poder Executivo, no prazo de cento e oitenta dias, as normas de regulamentação dos seguros obrigatórios previstos no artigo 20 deste Decreto-lei. (Artigo retificado pelo Del. 296/67). Art 145. Até a instalação do CNSP e da SUSEP, será mantida a jurisdição e a competência do DNSPC, conservadas em vigor as disposições legais e regulamentares, inclusive as baixadas pelo IRB, no que forem cabíveis. Art 146. O Poder Executivo fica autorizado a abrir o crédito especial de Cr$500.000.000 (quinhentos milhões de cruzeiros), no exercício de 1967, destinado à instalação do CNSP e da SUSEP. Art 147. (Artigo revogado pelo Del. 261/67). Art 148. As resoluções do Conselho Nacional de Seguros Privados vigorarão imediatamente e serão publicadas no Diário Oficial da União. Art 149. O Poder Executivo regulamentará este Decreto-lei no prazo de 120 dias (cento e vinte dias), vigendo idêntico prazo para a aprovação dos Estatutos do IRB. (Artigo alterado pelo Del. 168/67). Art 150. (Artigo revogado pelo Del. 261/67). Art 151. Para efeito do artigo precedente ficam suprimidos os cargos e funções de Delegado do Governo Federal e de liquidante designado pela sociedade, a que se referem os artigos 24 e 25 do Decreto nº 22.456, de 10 de fevereiro de 1933, ressalvadas as liquidações decretadas até dezembro de 1965. Art 152. O risco de acidente de trabalho continua a ser regido pela legislação específica, devendo ser objeto de nova legislação dentro de 90 dias. Art 153. Este Decreto-lei entrará em vigor na data de sua publicação, ficando revogadas expressamente todas as disposições de leis, decretos e regulamentos que dispuserem em sentido contrário. Brasília, 21 de novembro de 1966; 145º da Independência e 78º da República. H. CASTELLO BRANCO Eduardo Lopes Rodrigues 198 DECRETO-LEI Nº 261, DE 28 DE FEVEREIRO DE 1967 Dispõe sobre as sociedades de capitalização e dá outras providências. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA , usando das atribuições que lhe confere o artigo 9º, § 2º, do Ato Institucional número 4, de 7 de dezembro de 1966, DECRETA: Art 1º Todas as operações das sociedades de capitalização ficam subordinadas às disposições do presente Decreto-lei. Parágrafo único. Consideram-se sociedades de capitalização as que tiverem por objetivo fornecer ao público de acordo com planos aprovados pelo Governo Federal, a constituição de um capital mínimo perfeitamente determinado em cada plano, e pago em moeda corrente em um prazo máximo indicado no mesmo plano, à pessoa que possuir um título, segundo cláusulas e regras aprovadas e mencionadas no próprio título. Art 2º O Controle do Estado se exercerá pelos órgãos referidos neste Decretolei, no interesse dos portadores de títulos de capitalização, e objetivando: I Promover a expansão do mercado de capitalização e propiciar as condições operacionais necessárias à sua integração no progresso econômico e social do País. II - Promover o aperfeiçoamento do sistema de capitalização e das sociedades que nele operam. III - Preservar a liquidez e a solvência das sociedades de capitalização. IV - Coordenar a política de capitalização com a política de investimentos do Governo Federal, observados os critérios estabelecidos para as políticas monetária, creditícia e fiscal, bem como as características a que devem obedecer as aplicações de cobertura das reservas técnicas. Art 3º Fica instituído o Sistema Nacional de Capitalização, regulado pelo presente Decreto-lei e constituído: I - Do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP). II - Da Superintendência de Seguros Privados (SUSEP). III Das sociedades autorizadas a operar em capitalização. § 1º Compete privativamente ao CNSP fixar as diretrizes e normas da política de capitalização e regulamentar as operações das sociedades do ramo, relativamente às quais exercerá atribuições idênticas às estabelecidas para as sociedades de seguros, nos seguintes incisos do art. 32 do Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966; I, II, III, IV, V, VI, IX, X, XI, XII, XIII. § 2º A SUSEP é o órgão executor da política de capitalização traçada pelo CNSP, cabendo-lhe fiscalizar a 199 constituição, organização, funcionamento e operações das sociedades do ramo, relativamente às quais exercerá atribuições idênticas às estabelecidas para as sociedades de seguros, nas seguintes alíneas do art. 36 do Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966: a ), b ), c ), g ), h) , i ). Art 4º As sociedades de capitalização estão sujeitas a disposições idênticas às estabelecidas nos seguintes artigos do Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, e, quando for o caso, seus incisos, alíneas e parágrafos: 7º, 25 a 31, 74 a 77, 84, 87 a 111, 113, 114, 116 a 121 Ar t. 5º O presente Decreto-lei entra em vigor na data de sua publicação. Art 6º Revogam-se o Decreto número 22.456, de 10 de fevereiro de 1933, os artigos 147 e 150 do Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, e as demais disposições em contrário. Brasília, 28 de fevereiro de 1967; 146º da Independência e 79º da República. H. CASTELLO BRANCO Octavio Bulhões Paulo Egydio Martins Roberto Campos 200 DECRETO No 60.459, DE 13 DE MARÇO DE 1967. Regulamenta o Decreto-Lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, com as modificações introduzidas pelos Decretos-Lei nº 168, de 14 de fevereiro de 1967, e nº 296, de 28 de fevereiro de 1967 O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, usando da atribuição que lhe confere o artigo 87, inciso I da Constituição, DECRETA: Art. 1º Fica aprovado o anexo Regulamento do Decreto-Lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Seguros Privados, regula as operações de seguros Privados, regula as operações e seguros e resseguros e dá outras providências, com as modificações feitas pelos DecretosLei nº 168, de 14 de fevereiro de 1967 e nº 296, de 28 de fevereiro de 1967, assinado pelo Ministro da Indústria e do Comércio. Art. 2º Revogam-se as disposições em contrário. Brasília, 13 de março de 1967, 146º da Independência e 79º da República. H. CASTELO BRANCO Paulo Egydio Martins REGULAMENTO DO DECRETO-LEI, Nº 73, DE 21 DE NOVEMBRO DE 1966, QUE DISPÕE SÔBRE O SISTEMA NACIONAL DE SEGUROS PRIVADOS REGULA AS OPERAÇÕES DE SEGUROS E RESSEGUROS E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS CAPÍTULO I Do Sistema Nacional de Seguros Privados Art. 1º O Sistema Nacional de Seguros Privados é constituído: a) do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP); b) da Superintendência de Seguros Privados (SUSEP); c) do Instituto de Resseguros do Brasil - (IRB); 201 d) das Sociedades Seguradoras autorizadas a operar em seguros privados; e) dos Corretores de Seguros habilitados. CAPÍTULO II Disposições Especiais Aplicáveis ao Sistema SEÇÃO I Do Contrato de Seguro Art. 2º A contratação de qualquer seguro só poderá ser feita mediante proposta assinada pelo interessado, seu representante legal ou por corretor registrado, exceto quando o seguro for contratado por emissão de bilhete de seguro. § 1º O início de cobertura do risco constará da apólice e coincidirá com a aceitação da proposta. § 2º A emissão da apólice será feita até 15 dias da aceitação da proposta. Art. 3º Além das condições previstas na legislação em vigor, as propostas e apólices deverão obedecer às instruções baixadas pela SUSEP. Art. 4º Poderão ser emitidas apólices de seguros com valor máximo determinado, para serem utilizadas por meio de averbação ou por declarações periódicas, mediante condições e normas aprovadas pela SUSEP. Parágrafo Único. Nos seguros desta espécie será devido, obrigatoriàmente, um prêmio inicial, fixado pela SUSEP, cujo valor será computado no ajustamento final do contrato. Art. 5º Nos casos de cosseguro é permitida a emissão de uma só apólice, cujas condições valerão integralmente para todas as cosseguradoras. Parágrafo Único. Além das demais declarações necessárias, a apólice conterá os nomes de todas as cosseguradoras, por extenso, os valores da respectiva responsabilidade assumida devendo ser assinada pelos representantes legais de cada Sociedade cosseguradora. SEÇÃO II Dos prêmios e outras obrigações dos segurados 202 Art. 6º A obrigação do pagamento do prêmio pelo segurado vigerá a partir do dia previsto na apólice ou bilhete de seguro, ficando suspensa a cobertura do seguro até o pagamento do prêmio e demais encargos. § 1º O prêmio será pago no prazo fixado na proposta. § 2º A cobrança dos prêmios será feita, obrigatoriamente, através de instituição bancária, de conformidade com as instruções da SUSEP e do Banco Central. § 3º Qualquer indenização decorrente do contrato de seguro dependerá de prova de pagamento do prêmio devido, antes da ocorrência do sinistro. § 4º A falta do pagamento do prazo do prêmio de suspensão da cobertura não prejudicará a indenização, desde que pago prêmio no prazo devido. § 5º A falta do pagamento do prêmio no prazo previsto no parágrafo 1º deste artigo determinará o cancelamento da apólice. Art. 7º A SUSEP disporá sobre as condições de fracionamento de prêmios de seguros. Parágrafo Único. É admitida a concessão de descontos nos prêmios, na hipótese de pagamento à vista, segundo os critérios estabelecidos pela SUSEP nas condições tarifárias. Art. 8º As Sociedades Seguradoras submeterão à aprovação da SUSEP as suas tarifas de prêmios mínimos, dependendo igualmente dessa aprovação quaisquer alterações a introduzir ou a inclusão de novas classes de riscos. Parágrafo Único. Esta obrigação abrange somente as modalidades de seguros para as quais não exista tarifa única já aprovada, para uso de todo o mercado segurador. CAPÍTULO III Dos seguros obrigatórios Art. 9º Sem prejuízo do disposto em leis especiais, são obrigatórios os seguros de: a) danos pessoais a passageiros de aeronaves comerciais; 203 b) responsabilidade civil dos proprietários de veículos automotores e vias terrestre, fluvial, acustre a marítima, de aeronaves e dos transportadores em geral; c) responsabilidade civil do construtor de imóveis em zonas urbanas por danos a pessoas ou coisas; d) bens dados em garantia de empréstimos ou financiamentos de instituições financeiras públicas; e) garantia do cumprimento das obrigações do incorporador e construtor de imóveis; f) garantia do pagamento a cargo de mutuário da construção civil, inclusive obrigação imobiliária, g) edifícios divididos em unidades autônomas; h) incêndio e transporte de bens pertencentes a pessoas jurídicas, situados no País ou nele transportados; i) crédito rural; j) credito à exportação, quando concedido por instituições financeiras públicas. Art. 10. As instituições financeiras do sistema nacional de Crédito Rural enumeradas no art. 7º da Lei número 4.829, de 5-11-65, que concederem financiamento à agricultura e à pecuária, promoverão os contratos de financiamento e de seguro rural concomitante e automaticàmente. § 1º O seguro obedecerá às normas e limites fixados pelo CNSP, sendo obrigatório o financiamento dos prêmios pelas instituições de que trata este artigo. § 2º O seguro obrigatório ficará limitado ao valor do financiamento, sendo constituída a instituição financiadora como beneficiária até a concorrência de seu crédito. Art. 11. As instituições financeiras públicas não poderão realizar operações ativas de crédito com as pessoas jurídicas e firmas individuais que não tenham em dia os seguros obrigatórios por lei, salvo mediante aplicação da parcela de crédito, que for concedido, no pagamento dos prêmios em atraso. Art. 12. Os bancos e demais instituições financeiras inscreverão a prova a realização dos seguros legalmente obrigatórios nas respectivas exigências cadastrais. 204 Parágrafo único. Na fixação os limites para operações ativas de crédito, os bancos e demais instituições financeiras não poderão considerar os bens sujeitos a seguro obrigatório por valores superiores ao segurado. Art. 13. Os balanços levantados pelas pessoas jurídicas deverão conter necessàriamente os valores segurados decorrentes das obrigações do artigo 20, do Decreto-lei 73/66, contabilizados nas contas de compensação. Art. 14. Para participar de concorrências abertas pelo Poder Público, é indispensável comprovar o pagamento dos prêmios dos seguros legalmente obrigatórios. Art. 15. Não poderá ser concedida licença, pelas autoridades competentes, para o exercício de atividades que importem na contratação de seguro obrigatório, sem a prova da existência desse seguro. Art. 16. Compete ao IRB realizar sorteios e concorrências públicas para colocação dos seguros dos bens, direitos, créditos e serviços dos órgãos centralizados da União, das Autarquias, Sociedades de Economia Mista e demais Empresas ou Entidades controladas direta ou indiretamente pelo Poder Público Federal, inclusive os seguros não obrigatórios de bens de terceiros abrangidos por qualquer contrato ou plano de cobertura de seguro em que ditas Empresas ou Entidades figurem como estipulantes ou beneficiárias. § 1º Os riscos tarifados serão distribuídos mediante sorteio e os não tarifados mediante concorrência pública. § 2º Tanto para o sorteio, quanto para a concorrência, deverá o IRB: a) determinar anualmente as faixas de cobertura do mercado nacional, para cada ramo ou modalidade de seguro; b) fixar o limite de aceitação das Sociedades, de acordo com a respectiva situação econômico-financeira e o índice de resseguro que comportarem; c) estabelecer as normas do respectivo processamento, disciplinando também os casos de distribuição em cosseguro. § 3º Na formalização dos seguros previstos neste artigo, é vedada a interveniência de corretores ou administradores de seguros sob qualquer forma, no ato da contratação e enquanto vigorar o ajuste. Art. 17. As Sociedades Seguradoras responsáveis pelos seguros previstos no artigo anterior recolherão ao IRB as comissões de corretagem admitidas pelo CNSP, para crédito do Fundo de Estabilidade do Seguro Rural, criado pelo artigo 16 do Decreto-lei nº 73/66. 205 Art. 18. O Banco Nacional de Habitação poderá assumir os riscos decorrentes das operações do Sistema Financeiro da Habitação que não encontrem cobertura no mercado nacional, a taxas e condições compatíveis com as necessidades do Sistema Financeiro da Habitação. Parágrafo único. A falta de cobertura prevista neste artigo deverá ser, necessàriamente, declarada pelo IRG e a incompatibilidade das taxas e condições pelo BNH. Art. 19. Nos casos de seguros legalmente obrigatórios, o estipulante equipara-se ao segurado para os efeitos de contratação e manutenção do seguro. § 1º Para os efeitos deste Regulamento, estipulante é a pessoa que contrata seguro por conta de terceiros, podendo acumular a condição de beneficiário. § 2º Nos seguros facultativos o estipulante é mandatário dos segurados. § 3º O CNSP estabelecerá os direitos e obrigações do estipulante quando for o caso, na regulamentação de cada ramo ou modalidade de seguro. Art. 20. As Sociedades Seguradoras indenizarão os sinistros decorrentes dos seguros obrigatórios dentro de 10 (dez) dias úteis, a contar do momento em que ficar apurado o valor da indenização, com acordo das partes interessadas. § 1º Não havendo acordo dos interessados quanto à fixação do valor da indenização, deverá ser este estabelecido em vistoria judicial, com arbitramento. § 2º A Sociedade Seguradora que deixar de indenizar os sinistros no prazo previsto neste artigo ficará sujeita à correção monetária do valor da indenização, nos casos fixados pelo CNSP. CAPÍTULO IV Do Conselho Nacional de Seguros Privados Art. 21. O Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) é órgão de deliberação coletiva ao qual compete privativamente: I - fixar as diretrizes e normas da política de seguros privados, tendo em conta as condições do mercado nacional de seguros; II - estabelecer as diretrizes gerais das operações de resseguro; 206 III - disciplinar as operações de cosseguro, nas hipóteses em que o IRB não aceite resseguro do risco ou quando se tornar conveniente promover melhor distribuição direta dos negócios pelo mercado; IV - conhecer dos recursos de decisões da SUSEP e do IRB, nos casos especificados no Decreto-lei nº 73/66. V- aplicar às Sociedades Seguradoras estrangeiras autorizadas a funcionar no país o tratamento correspondente que vigorar nos países da matriz em relação às Sociedades Seguradoras brasileiras neles instaladas ou que desejem instalar-se; VI - regular a instalação e o funcionamento das Bolsas de Seguro. VII - regular a constituição, organização, funcionamento e fiscalização dos que exercerem atividades subordinadas ao Decreto-lei nº 73/66; VIII - estipular índices e demais condições técnicas sobre tarifas, investimentos e outras relações patrimoniais a serem observadas pelas Sociedades Seguradoras; IX - fixar as características gerais dos contratos de seguros; X - fixar normas gerais de contabilidade e estatística a serem observadas pelas Sociedades Seguradoras; XI - delimitar o capital do IRB e das Sociedades Seguradoras, com a periodicidade mínima de dois anos, determinando a forma de sua subscrição e realização; XII - opinar na elaboração das diretrizes do Conselho Monetário Nacional sobre a aplicação do Capital e das Reservas Técnicas das Sociedades Seguradoras; XIII - prescrever os critérios de constituição das Sociedades Seguradoras, com fixação dos limites técnicos das operações de seguro; XIV - disciplinar a corretagem de seguros e a profissão de corretor; XV - corrigir os valores monetários expressos no Decreto-lei ora regulamentado, de acordo com os índices de correção que estiverem em vigor; XVI - opinar sobre a cassação da carta-patente das Sociedades Seguradoras; XVII - decidir sobre sua própria organização, elaborando o respectivo Regimento Interno; XVIII - regular a organização, a composição e o funcionamento de suas Comissões Consultivas; 207 XIX - baixar Resoluções, nos casos de suas atribuições específicas, a serem observadas pelos integrantes do Sistema Nacional de Seguros Privados; XX - Prescrever os critérios de constituição de reservas técnicas, fundos especiais e provisões das Sociedades Seguradoras; XXI - estabelecer o entendimento da legislação de seguros e dos regulamentos relativos às suas atribuições, decidindo os casos omissos e baixando os atos esclarecedores. Art. 22. O Conselho compor-se-á de doze membros, denominados Conselheiros, a saber: I - O Ministro da Indústria e do Comércio; II - O Ministro da Fazenda ou seu representante; III - O Ministro do Planejamento e da Coordenação Econômica ou seu representante; IV - O Ministro da Saúde ou seu representante; V - O Ministro do Trabalho e Previdência Social ou se representante; VI - O Ministro da Agricultura ou seu representante; VII - O Superintendente da Superintendência de Seguros Privados; VIII - O Presidente do Instituto de resseguros do Brasil; IX - Um representante do Conselho Federal de Medicina; X - Três representantes da iniciativa privada nomeados pelo Presidente da República, mediante escolha dentre brasileiro dotados das qualificações pessoais necessárias, com mandato de dois anos, podendo ser reconduzidos, e três suplentes igualmente nomeados por igual prazo de dois anos. Art. 23. Qualquer dos representantes de que trata o item X do artigo precedente perderá a condição de membro do Conselho, se deixar de comparecer, sem motivo justificado, a três sessões ordinárias consecutivas ou a seis interpoladas, durante o ano. Art. 24. O Conselho só poderá reunir-se com a presença de, no mínimo, seis de seus membros, desde que presentes quatro dos seis primeiros enumerados no art. 10, devendo as decisões ser tomadas por maioria simples. 208 Parágrafo único. As Resoluções do Conselho vigorarão imediatamente e serão publicadas no Diário Oficial da União, competindo à SUSEP sua divulgação. Art. 25. O Presidente do Conselho será o Ministro da Indústria e do Comércio. § 1º O Presidente do Conselho terá também o voto de qualidade. § 2º Em suas faltas ou impedimentos, o Presidente será substituído pelos Ministros de Estado integrantes do Conselho, na ordem estabelecida no art. 10 ou, à falta deles, pelos respectivos representantes, na mesma ordem. Art. 26. O Conselho realizará até oito sessões ordinárias por mês. § 1º Serão realizadas sessões extraordinárias, quando convocadas pelo Presidente ou mediante proposta aprovada por dois terços dos Conselheiros. § 2º A matéria discutida nas sessões poderá ser objeto de Resolução, facultativamente, e constará de ata lavrada pelo Secretário do Conselho. § 3º Qualquer Conselheiro poderá requerer a discussão de determinado assunto secretamente. Art. 27. Com audiência obrigatória nas deliberações relativas às respectivas finalidades específicas, funcionarão junto ao Conselho as Comissões Consultivas. Art. 28. As Comissões Consultivas a que se refere o artigo anterior são as seguintes: I - de Saúde; II - do Trabalho; III - de Transporte; IV - Imobiliária e de Habitação; V - Rural; VI - Aeronáutica; VII - de Crédito; VIII - de Corretores de Seguros. § 1º O CNSP poderá criar outras Comissões Consultivas, desde que ocorra justificada necessidade. 209 § 2º A organização, a composição e o funcionamento das Comissões Consultivas serão regulados pelo CNSP, cabendo ao seu Presidente designar os representantes que as integrarão mediante indicação das Entidades participantes delas. Art. 29. Compete ao Presidente do Conselho: I - presidir às sessões, convocar reuniões ordinárias e extraordinárias; II - representar o conselho perante os órgãos dos Poderes Públicos Entidades Privadas; III - assinar e mandar publicar as Resoluções. Art. 30. Para os trabalhos do Plenário, disporá o Conselho de uma Secretaria chefiada por um Secretário e provida pela SUSEP, sob seu controle. Art. 31. Ao Secretário incumbe: I - preparar a pauta dos trabalhos e secretariar as sessões do Conselho; II - elaborar as atas, submetendo-as à assinatura dos Conselheiros na sessão seguinte à das respectivas aprovações; III - chefiar a Secretaria e manter em dia o expediente; IV - distribuir aos Conselheiros cópias dos trabalhos em pauta e das atas das sessões; V - desempenhar quaisquer trabalhos extraordinários de que seja incumbido pelo Presidente do Conselho, desde que se relacionem com as suas atividades. Art. 32. Os membros do CNSP perceberão gratificação calculada nos termos do Decreto nº 55.090, de 26 de novembro de 1964, ficando classificado na categoria "A". CAPíTULO V SEÇÃO I Da Superintendência de Seguros Privados Art. 33. A Superintendência de Seguros Privados (SUSEP) é uma entidade autárquica criada pelo Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, jurisdicionada ao Ministério da Indústria e do Comércio, dotada de 210 personalidade jurídica de Direito Público e de autonomia administrativa e financeira, com sede na cidade do Rio de Janeiro, Estado da Guanabara, até sua fixação no Distrito Federal. Art. 34. Compete à SUSEP, na qualidade de executora da política traçada pelo Conselho Nacional de Seguros Privados - CNSP, como órgão fiscalizador da constituição, organização, funcionamento e operações das Sociedades Seguradoras: I - processar os pedidos de autorização, para constituição, organização, funcionamento, fusão, encampação, incorporação, grupamento, transferência de controle acionário e reforma dos Estatutos das Sociedades Seguradoras, opinar sobre tais pedidos e encaminhá-los ao CNSP; II - baixar instruções e expedir circulares relativas a regulamentação das operações de seguro, de acordo com as diretrizes do CNSP; III - fixar condições de apólices e de coberturas especiais, planos de operações e tarifas a serem utilizadas obrigatoriamente pelo mercado segurador nacional; IV - aprovar os limites de operações das Sociedades Seguradoras, de conformidade com os critérios fixados pelo CNSP; V - autorizar a movimentação e liberação dos bens e valores obrigatoriamente inscritos em garantia do capital, das reservas técnicas e fundos; VI - fiscalizar a execução das normas gerais de contabilidade e estatística fixadas pelo CNSP para as Sociedades Seguradoras; VII - fiscalizar as operações das Sociedades Seguradoras, inclusive o exato cumprimento deste Regulamento, das leis pertinentes, disposições regulamentares em geral, resoluções do CNSP e aplicar as penalidades cabíveis; VIII - fiscalizar, nos termos da legislação vigente, a exatidão dos tributos incidentes sobre as operações de seguros; IX - proceder à liquidação das Sociedades Seguradoras que tiverem cassada a autorização para funcionar no País; X - organizar seus serviços, elaborar e executar seu orçamento; XI - prover os serviços de secretaria do CNSP; XII - proceder à habilitação e ao registro dos corretores de seguros, fiscalizarlhes a atividade e aplicar-lhes as penalidades cabíveis; 211 XIII - propor ao CNSP as condições de idoneidade e capacidade que deverão satisfazer os administradores e membros dos Conselhos Fiscal e Consultivo das Sociedades Seguradoras; XIV - promover junto aos órgãos do Poder Público, Instruções Financeiras em geral e sociedades mercantis, providências necessárias à salvaguarda da inalienabilidade dos bens garantidores do capital, reservas técnicas e fundos das Sociedades Seguradoras. XV - participar de congressos, conferências, reuniões e simpósios no País ou no exterior. SEçãO II Do Superintende de Seguros Privados Art. 35. A Administração da SUSEP será exercida por um Superintendente, nomeado pelo Presidente da República, mediante indicação do Ministro da Indústria e do Comércio. Parágrafo único. A organização interna da SUSEP constará de um Regimento, que será aprovado pelo CNSP. Art. 36. São atribuições do Superintendente; I - Traçar as diretrizes gerais de trabalho, exercendo a orientação, coordenação e controle geral das atividades da SUSEP. II - superintender e dirigir, através dos órgãos principais e auxiliares, o funcionamento geral da SUSEP, em todos os setores de suas atividades. III - cumprir e fazer cumprir o Regimento Interno do Órgão, propondo ao CNSP as modificações que se impuserem; IV - representar a SUSEP em suas relações com terceiros, ativa ou passivamente, em juízo ou fora dele; V - propor ao CNSP o quadro do pessoal, fixando os respectivos padrões próprios de vencimentos e vantagens; VI - nomear ou designar os ocupantes de cargos e funções em comissão; VII - designar quem o deva substituir em suas ausências e impedimentos eventuais; 212 VIII - admitir, contratar, designar, nomear, requisitar, exonerar, dispensar, conceder vantagens e aplicar penalidades a servidores de qualquer categoria, de acordo com o Regimento Interno; IX - delegar poderes a servidores da SUSEP para a pátria de atos específicos da via administradora da Autarquia; X - elaborar os programas anuais e plurianuais, e seus respectivos orçamentos, submetendo-os à aprovação do CNSP; XI - movimentar e aplicar os recursos da SUSEP, na forma da legislação em vigor; XII - autorizar despesas, pagamentos e realizar operações de crédito, mediante prévio empenho orçamentário; XIII - assinar, em nome da SUSEP, contratos, convênios e acordos; XIV - apresentar anualmente ao Tribunal de Contas, para a sua apreciação, todas as contas e o balanço do ano anterior, com a comprovação indispensável, na forma da legislação em vigor; XV - impor aplicação de multas e outras penalidades, respeitadas as disposições legais em vigor; XVI - designar o Diretor-Fiscal para as Sociedades-Seguradoras, "ad referendum" do CNSP; XVII - criar e instalar Delegacias e Postos de Fiscalização da SUSEP nos Estados e Territórios; XVIII - criar Comissões Especiais para o estudo de questões de natureza técnica e jurídica de seguros. SEçãO III Dos Recursos da SUSEP Art. 37. Constituem recursos da SUSEP: I - Parcela do produto da arrecadação do imposto sobre operações financeiras a que se refere a Lei número 5.145, de 20 de outubro de 1966, e prevista do no artigo 39 do Decreto-lei nº 73-66; 213 II - O produto das multas aplicadas pela SUSEP; III - Dotação orçamentária especifica; IV - Créditos especiais; V - Juros de depósitos bancários; VI - Participação que lhe for atribuída pelo CNSP no Fundo previsto no art. 16 do Decreto-lei número 73, de 1966; VII - Outras receitas ou valores adventícios resultantes de suas atividades. SEÇÃO IV Do Pessoal da SUSEP Art. 38. Os serviços da SUSEP serão executados por: a) servidores admitidos por concurso público de provas ou de provas e títulos, cujo regime será o da C.L.T., e legislação complementar; b) pessoal requisitado; c) pessoal contratado para prestação de serviços de natureza especializada, no regime da legislação trabalhista; d) pessoal contratado, por prazo determinado, para prestação de serviços técnicos, sem vinculo empregatício com a SUSEP, mediante aprovação previa do CNSP, em cada caso; e) equipes orgânicas, contratadas por prazo certo. Art. 39. Os servidores requisitantes da aprovação, pelo CNSP, do Quadro de Pessoal da SUSEP, poderão a nele ser aproveitados, desde que consultados os interesses da Autarquia e dos Servidores. Parágrafo único. O aproveitamento de que trata este artigo implica na aceitação do regime de pessoal da SUSEP, devendo ser contado o tempo de serviço, no órgão de origem, para todos os efeitos legais. Art. 40. O CNSP, mediante proposta do Superintendente, satisfeitas as peculiaridades dos serviços de autarquia e assegurado o exercício de sua 214 autonomia administrativa e financeira, expedira o Estatuto do Pessoal da SUSEP, fixando os deveres, direitos e vantagens dos servidores. Art. 41. É vedado aos servidores da SUSEP prestar serviço, ainda que gratuito, a Sociedades Seguradoras e corretores ou a seus diretores, administradores e gerentes. CAPÍTULO VI Das Sociedades Seguradoras SEçÃO I Da Autorização para Funcionamento Art. 42. A autorização para o funcionamento será concedida através de Portaria do Ministro da Indústria e do Comercio, mediante requerimento firmado pelos Incorporadores, dirigido ao CNSP e apresentado por intermédio da SUSEP. Parágrafo único. O pedido será instruído com a prova da regularidade da constituição da Sociedade do deposito no Banco do Brasil da parte já realizada do capital e exemplar do estatuto. Art. 43. O pedido de autorização para funcionamento será encaminhado à apreciação do Conselho Nacional de Seguros Privados pela SUSEP, que opinará sobre: a) a conveniência e oportunidade da autorização, em face da política de seguros ditada pelo Conselho Nacional de Seguros Privados; b) a saturação e possibilidades do mercado segurador nacional; c) a regularidade da constituição da sociedade; d) probabilidade de êxito de suas operações; e) regime administrativo; f) inconveniências, omissões e irregularidades encontradas na constituição nos Estatutos ou plano s de operações. Art. 44. A Portaria que conceder autorização para o funcionamento indicará as modalidades que poderão ser exploradas pela Sociedade, bem como as exigências impostas à requerente para que possa funcionar, as quais farão parte inerente do estatuto, caso tenha caráter permanente. 215 Art. 45. Publicada a Portaria de autorização, a Sociedade interessada deverá comprovar perante a SUSEP, no prazo de 90 dias, sob pena de revogação: a) haver subscrito ações do capital do IRB; b) ter efetuado todos os registros e publicado os atos exigidos por lei para seu funcionamento; c) haver satisfeito às exigências porventura constantes da Portaria da autorização; d) cumprimento das exigências suplementares estabelecidas pela SUSEP. Art. 46. Cumpridas as formalidades referidas no artigo anterior, será expedida a Carta Patente para o funcionamento da Sociedade pelo Ministro da Indústria e do Comercio, a qual, depois de registrada na SUSEP, arquivada no órgão do Registro do Comercio da Sede da Sociedade e publicada a certidão de arquivamento no Diário Oficia l da União, dará direito ao inicio das operações, preenchidas as demais exigências legais e regulamentares. Art. 47. Caso a Sociedade não obtenha autorização para funcionar, a importância depositada no Banco do Brasil S.A. será restituída aos subscritores. SEçãO II Da Organização, Constituição e Funcionamento Art. 48. Para os efeitos de constituição, organização e funcionamento das Sociedades Seguradoras, deverão ser obedecidas as condições gerais da legislação das sociedades anônimas, as estabelecidas pelo CNSP e, especialmente, as seguintes: I - capital inicial mínimo de NCr$500.000; II - capital adicional de NCr$500.000, para operar em seguros de responsabilidades; III - capital adicional de NCr$500.000, para operar em seguros de garantias; IV - capital adicional de NCr$100.000, para operar em seguros de acidentes pessoais; V - capital adicional de NCr$200.000, para operar em seguros de saúde; 216 VI - capital adicional de NCr$600.000, para operar em seguros de pessoas. § 1º O cumprimento das condições deste artigo e a realização do capital inicial mínimo permitirão operar nos seguros de direitos, coisas, obrigações e bens. § 2º Os capitais previstos neste artigo serão corrigidos monetariamente pelo CNSP, com a periodicidade mínima de dois anos. Art. 49. Os subscritores de capital realizarão em dinheiro, no ato da subscrição, o mínimo de 50% (cinqüenta por cento) do valor nominal de suas ações, e os restantes 50% (cinqüenta por cento) dentro de um ano, a contar da publicação da Portaria de autorização para funcionamento, ou em menor prazo, se assim o exigir o CNSP. Parágrafo único. Igual procedimento será observado nos casos de aumento do capital em dinheiro. Art. 50. As listas de subscrição do capital das Sociedades Seguradoras serão firmadas pelos subscritores e conterão, em relação a cada um, o nome, a nacionalidade, o domicílio, bem como, se se tratar de pessoa física, o estado civil e a profissão; a quantidade, o valor das ações subscritas e respectivas realização; Art. 51. Não é permitido às Sociedades Seguradoras, fundir-se com outras, encampar ou ceder operações, modificar sua organização ou seu objeto bem como alterar seu estatuto, sem aprovação do Ministro da Indústria e do Comercio. Art. 52. Nos casos de fusão, incorporação, encampação ou cessão de operações, as Sociedades Seguradoras apresentarão aos seus balanços gerais, levantados no momento da operação, bem como quaisquer outros comprobatórios de sua situação econômico-financeira. § 1º Examinada a operação pela SUSEP, que efetuará as diligencias necessárias, será o processo encaminhado ao CNSP, com o parecer do seu Superintendente. § 2º Merecendo aprovação a pretendida operação, o Ministro da Indústria e do Comercio, mediante Portaria, habilitará as contratantes a ultimarem-na, satisfeitas as condições que julgue conveniente estabelecer. Art. 53. O pedido de aprovação de alterações estatutárias, instituídos pelos documentos necessários ao estudo da legalidade, conveniência e oportunidade da Resolução, será dirigido ao CNSP, por intermédio da SUSEP, podendo o Ministro da Indústria e do Comercio recusar a aprovação pedida, concede-la com restrições ou sob condições, que constatarão na respectiva Portaria. 217 Art. 54. As Sociedades Seguradoras não poderão estabelecer filiais ou sucursais no estrangeiro, sem prévia autorização do Ministro da Indústria e do Comércio, mediante requerimento apresentado por intermédio da SUSEP, a qual procederá como nos casos previstos no Art. 48. Art. 55. As Sociedades Seguradoras nacionais que mantiverem estabelecimento no estrangeiro destacarão, nos seus balanços gerais, contas de lucros e perdas e respectivos anexos, as suas operações realizadas fora do País e apresentarão à SUSEP relatório circunstanciado dessas operações. Parágrafo único. Para os efeitos do disposto neste artigo, as Sociedades Seguradoras comprovarão, por documento hábil, estarem aprovados os seus balanços e contas de lucros e perdas relativos às suas operações no estrangeiro, pela autoridade local competente. Art. 56. Ficam limitadas a 10% (dez por cento) do capital realizado as despesas de organização e instalação das Sociedades Seguradoras. Art. 57. A aplicação das Reservas Técnicas e Fundos das Sociedades Seguradoras será feita de acordo com as diretrizes do Conselho Monetário Nacional, ouvido previamente o Conselho Nacional de Seguros Privados. Art. 58. Metade do capital social realizado das Sociedades Seguradoras constituirá permanente garantia suplementar das Reservas Técnicas e sua aplicação será idêntica à dessas Reservas. Art. 59. Os bens garantidores da metade do capital social, reservas técnicas e fundos, não poderão ser alienados ou transacionados pela sociedade, sem prévia autorização da SUSEP, na qual serão inscritos. Art. 60. O capital social das Sociedades Seguradoras será comum a todas as operações, embora pertinente a mais de uma modalidade. Art. 61. Os seguros contratados com cláusulas de correção monetária terão as suas Reservas Técnicas aplicadas em títulos ou depósitos bancários, sujeitos também, no mínimo, à mesma correção monetária. Art. 62. As Sociedades Seguradoras não poderão conceder aos segurados comissões ou bonificações de qualquer espécie, nem vantagens especiais que importem dispensa ou redução de prêmio, observado o disposto do parágrafo único do art. 7º. Art. 63. As Sociedades Seguradoras são obrigadas a: I - publicar, anualmente, até 28 de fevereiro, no Diário Oficial da União ou no jornal oficial dos Estados, segundo o local da respectiva sede e, também em 218 outro jornal de grande circulação o relatório da Diretoria, o balanço, conta de lucros e perdas e o parecer do Conselho Fiscal; II - realizar a sua Assembléia Geral Ordinária ate 31 de março de cada ano; III - enviar à SUSEP, no prazo e na forma que ela determinar, a documentação pertinente as Assembléias Gerais, nomeação de agentes e representantes autorizados, modificações na Diretoria e no Conselho Fiscal, balanços e demais atos que forem exigidos. IV - manter na matriz, sucursais e agências os registros mandados adotar pela SUSEP, com escrituração completa das operações efetuadas; V - dentro de quarenta e cinco dias, independentemente de notificação, contados da terminação de cada trimestre, os dados estatísticos das operações efetuadas durante o referido período, organizados de acordo com as normas e instruções expedidas pela SUSEP. CAPÍTULO VII Do Regime Especial de Fiscalização Art. 64. Em caso de insuficiência de cobertura do capital, das reservas técnicas, de Fundos ou de má situação econômico-financeira da Sociedade Seguradora, a critério da SUSEP poderá esta, alem de outras providencias cabíveis, inclusive fiscalização especial, nomear, por tempo indeterminado, às expensas da Sociedade Seguradora, um Diretor-fiscal com mas atribuições e vantagens que lhe forem indicadas pelo CNSP. Art. 65. ao Diretor-fiscal compete especialmente: a) providenciar a execução de medidas que possam operar o restabelecimento da normalidade econômico-financeira da Sociedade; b) representar o Governo junto aos administradores da Sociedade, acompanhando-lhes os atos e vetando as propostas ou atos que lhe cheguem ao conhecimento e que não sejam convenientes ao reerguimento financeiro da Sociedade, ou que contrariem as determinações da SUSEP; c) dar conhecimento aos administradores, para as devidas providências, de quaisquer irregularidades que interessem à solvabilidade da empresa, ponham em risco valores sob sua responsabilidade ou guarda, ou lhe comprometam o crédito; 219 d) providenciar o recebimento de quaisquer créditos da Sociedade, inclusive de realização do capital; e) sugerir aos administradores as providências e práticas administrativas que facilitem o desenvolvimento dos negócios da Sociedade e concorram para consolidar sua estabilidade financeira, de acordo com as instruções do SUSEP; f) trazer a SUSEP no conhecimento perfeito do andamento dos negócios e da situação econômico-financeira da Sociedade, por meio de informações escritas, mensalmente; g) submeter à decisão da SUSEP os vetos que apuser aos atos dos diretores da Sociedade e propor, inclusive, o afastamento temporário de qualquer destes, podendo os interessados recorrer dessa decisão para o Ministro da Indústria e do Comercio, sem efeito suspensivo; h) promover, perante a autoridade competente, a responsabilidade criminal de diretores, funcionários ou de quaisquer pessoas responsáveis pelos prejuízos causados aos segurados, beneficiários, acionistas e sociedades congêneres; i) convocar e presidir Assembléias Gerais. Art. 66. O Diretor-fiscal poderá cassar os poderes de todos os mandatários ad negotia , cuja nomeação não seja por ele expressamente ratificada. Art. 67. O descumprimento de determinação do Diretor-fiscal, por parte de qualquer diretor da Sociedade dará lugar ao seu afastamento, nos termos do disposto na alínea g do art. 65. CAPÍTULO VIII Da Liquidação das Sociedades Seguradoras Art. 68. As Sociedades Seguradoras não estão sujeitas a falência e não poderão impetrar concordata, sendo o seu regime de liquidação regulado pelas disposições deste Capitulo. Art. 69. A cessação das operações das Sociedades Seguradoras poderá ser: a) voluntária, por deliberação dos sócios, em Assembléia-Geral; b) compulsória, por ato do Ministro da Indústria e do Comércio, nos termos do Decreto-lei nº 73-66. 220 Art. 70. Nos casos cessação voluntária das operações, os Diretores requererão ao Ministro da Indústria e do Comercio o cancelamento da autorização para o funcionamento da Sociedade Seguradora, no prazo de cinco dias da respectiva Assembléia-Geral. Parágrafo único. Devidamente instruído, o requerimento será encaminhado por intermédio da SUSEP que opinará sobre a cessação deliberada. Art. 71. No caso de cessação parcial voluntária, restrita as operações de modalidade de seguro, serão observadas as disposições deste Capítulo, na parte aplicável, considerando-se liquidantes os diretores em exercício. Art. 72. Poderá ser determinada a cessação compulsória das operações da Sociedade Seguradora que: a) praticar atos nocivos à política de Seguros determinada pela CNSP; b) não constituir as Reservas Técnicas e Fundos a que esteja obrigada ou deixar de aplicá-los pela forma devida; c) acumular obrigações vultosas devidas ao IRB, a juízo do Ministro da Indústria e do Comercio; d) considerar a insolvência econômico-financeira; e) colocar seguro e resseguro no estrangeiro, sem autorização do IRB; f) aceitar resseguro nas modalidades em que o IRB opere, sem prévia e expressa autorização do referido órgão; g) reincidir na alienação de bens ou onerá-los, em desacordo com as disposições legais e regulamentares; h) reincidir na divulgação de prospectos, na publicação de anúncios, na expedição de circulares ou em outras publicações que contenham afirmações ou informações contrárias às leis, regulamentos, seus estatuto e seus planos, ou que possam induzir alguém em erro sobre a verdadeira importância das operações, bem como sobre o alcance da fiscalização a que estiverem obrigadas. Art. 73. A liquidação voluntária ou compulsória das Sociedades Seguradoras será processada pela SUSEP que indicará o liquidante. Art. 74. O ato que determinar a cassação da Carta-Patente da Sociedade Seguradora será publicado no Diário Oficial da União, produzindo imediatamente os seguintes efeitos: 221 a) suspensão das ações e execuções judiciais, excetuadas as que tiveram início anteriormente, quando intentadas por credores com privilégio sobre determinados bens da Sociedade Seguradora; b) vencimento de todas as obrigações civis ou comerciais da Sociedade Seguradora liquidanda, incluídas as cláusulas penais dos contratos; c) suspensão da incidência de juros, ainda que estipulados, se a massa liquidanda não bastar para o pagamento do principal; d) cancelamento dos poderes de todos os órgãos de administração da Sociedade liquidanda. § 1º Durante a liquidação fica interrompida a prescrição extintiva contra ou a favor da massa liquidanda. § 2º Quando a Sociedade tiver credores por salários ou indenizações trabalhistas, também ficarão suspensas as ações e execuções a que se refere a parte final da alínea a deste artigo. § 3º Poderá ser argüida em qualquer fase processual, inclusive quando às questões trabalhistas, a nulidade dos despachos ou decisões que contravenham o disposto neste artigo. Nos processos sujeitos à suspensão, caberá à Sociedade, liquidanda, para realização do ativo, requerer o levantamento de penhoras, arrestos e quaisquer outras medidas de apreensão ou reserva de bens, sem prejuízo do estatuído no parágrafo único do artigo 103 do Decreto-lei nº 73-66. § 4º A massa liquidanda não estará obrigada a reajustamentos salariais sobrevindos durante a liquidação, nem responderá pelo pagamento de multas, custas, honorários e demais despesas feitas pelos credores em interesse próprio, assim como não se aplicará correção monetária aos créditos pela mora resultante de liquidação. Art. 75. O liquidante designado pela SUSEP será o responsável pela administração da Sociedade liquidanda e terá amplos poderes para representá-la, ativa e passivamente, em Juízo ou fora dele, inclusive os seguintes: a) propor, contestar e intervir em ações, inclusive para integralização do capital pelos acionistas; b) nomear e demitir funcionários; c) fixar os vencimentos de funcionários; d) outorgar ou revogar mandatos; 222 e) transigir; f) vender valores móveis e bens imóveis; g) pagar e receber, firmando os competentes recibos e dando quitação; h) convocar assembléia-geral dos acionistas, na hipótese de liquidação voluntária; i) abrir, movimentar e encerrar contas bancárias, assinando e endossando cheques, ordens de pagamento e outros papéis necessários. Art. 76. Dentro de noventa dias da cassação da Carta-Patente, o liquidante levantará o balanço do ativo e do passivo da Sociedade Seguradora liquidanda e organizará: a) o arrolamento pormenorizado dos bens do ativo, com as respectivas avaliações, especificando os garantidores das Reservas Técnicas, dos Fundos ou do capital; b) a lista dos credores por dívida de indenização de sinistro, capital garantido de Reservas Técnicas ou restituição de prêmios, com a indicação das respectivas importâncias; c) a relação dos créditos trabalhistas, da Fazenda Pública, da Previdência Social e do IRB; d) a relação dos demais credores, com indicação das importâncias e procedências dos créditos, bem como sua classificação, de acordo com a legislação de falências. Parágrafo único. O IRB compensará seu crédito com o valor das ações efetivamente realizadas pela Sociedade Seguradora liquidanda, acrescido do ágio, pagando-lhe o saldo, se houver, e procedendo à transferência como previsto no art. 43, § 3º, do Decreto-lei ora regulamentado. Art. 77. Os interessados poderão impugnar o quadro geral de credores, mas decairão desse direito se não o exercerem no prazo de quinze dias da respectiva publicação. Art. 78. A SUSEP examinará as impugnações e fará publicar no Diário Oficial da União sua decisão, dela notificando os recorrentes por via postal, sob Aviso de Recebimento. Parágrafo único. Da decisão da SUSEP caberá recurso para o Ministro da Indústria e do Comércio, no prazo de quinze dias. 223 Art. 79. Depois da decisão relativa a seus créditos ou aos créditos contra os quais tenham reclamado, os credores não incluídos nas relações a que se refere o art. 76, os delas excluídos, os incluídos sem os privilégios a que se julguem com direito, inclusive por atribuição de importância inferior à reclamada, poderão prosseguir na ação já iniciada ou propor a que lhes competir. Parágrafo único. Até que sejam julgadas as ações, o liquidante reservará cota proporcional do ativo para garantia dos credores de que trata, este artigo. Art. 80. O liquidante promoverá a realização do ativo e efetuará o pagamento dos credores pelo crédito apurado e aprovado, no prazo de seis meses, observados os respectivos privilégios e classificação, de acordo com a cota apurada em rateio, na ordem determinada pela legislação em vigor. Art. 81. Ultimada a liquidação e levantado o balanço final, será ele submetido à aprovação do Ministro da Indústria e do Comércio com relatório da SUSEP. Art. 82. A SUSEP terá direito à comissão de cinco por cento sobre o ativo apurado nos trabalhos de liquidação. Dessa comissão, o Superintendente arbitrará gratificação a ser paga ao liquidante e funcionários encarregados de executá-los. Art. 83. Ao liquidante compete publicar no Diário Oficial da União e arquivar no órgão do Registro do Comércio os atos relativos à dissolução da Sociedade Seguradora. Art. 84. Aos casos omissos são aplicáveis as disposições da legislação de falências, desde que não contrariem as disposições do Decreto-lei ora regulamentado. Art. 85. O liquidante publicará, na folha oficial e em jornal de grande circulação no Distrito Federal ou nas capitais dos Estados e Territórios em que a sociedade tiver tido agências emissoras de apólices, um aviso convidando os interessados a examinar, nas repartições da Superintendência de Seguros Privados ou nas que esta houver designado, o quadro geral dos credores e, dentro do prazo máximo de quinze dias, alegar seus direitos. Parágrafo único. As habilitações e reclamações dos credores mencionarão sua residência ou a de seus procuradores, ou a caixa postal para onde deverão ser dirigidos os avisos e comunicações. Art. 86. Os bens imóveis, integrantes do patrimônio da Sociedade Seguradora liquidanda, serão vendidos mediante autorização da SUSEP. Art. 87. As vendas de títulos da dívida pública e das ações de companhias e bancos serão feitas em bolsa, pelos corretores de Fundos Públicos. 224 Art. 88. Mediante proposta da SUSEP, será destituído pelo ministro da Indústria e do Comércio o liquidante que não cumprir os deveres que lhe impõe o decretolei nº 73-66. Parágrafo único. Além da pena de destituição, o liquidante responderá pelos prejuízos causados, no desempenho de suas funções, à massa liquidanda ou a terceiros, por negligência, abuso, má-fé ou infração de qualquer dispositivo do decreto-lei nº 73-66. Art. 89. As publicações obrigatórias por força do disposto neste Capítulo serão feitas em jornal oficial e em outro de grande circulação na sede da Sociedade. Parágrafo único. No Distrito Federal, o jornal oficial será o da União e nos Estados e territórios o que publicar o expediente dos respectivos Governos. CAPÍTULO IX Do Regime Repressivo Art. 90. As infrações aos dispositivos do Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, sujeitam as Sociedades Seguradoras, seus Diretores, administradores, Gerentes e fiscais, às seguintes penalidades, sem prejuízo de outras estabelecidas na legislação vigente: I - Advertência. II - Multa pecuniária. III - Suspensão do exercício do cargo. IV - Inabilitação temporária ou permanente para o exercício de cargo de direção, nas Sociedades Seguradoras ou no IRB. V - Suspensão da autorização em cada ramo isolado. VI - Perda parcial ou total da recuperação de resseguro. VII - Suspensão de cobertura automática. VIII - Suspensão de retrocessão. IX - Cassação de carta-patente. 225 Parágrafo único. É assegurada a ampla defesa em qualquer processo instaurado por infração ao Decreto-lei nº 73-66, sendo nulas as decisões proferidas com inobservância deste preceito. Art. 91. É da competência privativa da SUSEP a aplicação das penalidades previstas no art. 111, alíneas b, c, d, e, h e i, art. 112, art. 113, artigo 114 e art. 128 do Decreto-lei número 73-66. Art. 92. É da competência privativa do IRB, nos termos do disposto no art. 44, letra e do Decreto-lei número 73-66, a aplicação das penalidades previstas nos artigos 111, letra f e 116 do mesmo decreto-lei. Art. 93. É da competência privativa do Ministro da Indústria e do Comércio a aplicação das penalidades previstas nos Artigos 115 e 117 do Decreto-lei 73-66, ouvido o CNSP. Art. 94. É da competência da SUSEP ou do IRB, conforme a hipótese, a aplicação das penalidades previstas no art. 111, letras a e g , do Decreto-lei 7366. Art. 95. As penalidades de competência privativa do IRB serão aplicadas por seu Conselho Técnico, na forma estabelecida em seu Estatuto. Art. 96. As penalidades de competência privativa da SUSEP e do Ministro da Indústria e do Comércio serão apuradas na forma prevista no art. 118 do Decreto-lei nº 73-66. Art. 97. Os processos iniciados como prescreve o artigo precedente serão presentes na SUSEP, em suas delegacias ou postos de seguros em cuja jurisdição haja ocorrido a infração, os quais mandarão intimar o denunciado a alegar, no prazo de 15 dias, o que entender a bem de seus direitos, sob pena de revelia. § 1º A intimação para a defesa será feita na pessoa do infrator e, quando se tratar de pessoa jurídica, na do diretor ou representante legal, por meio de registrado postal com Aviso de Recebimento, devendo-se, na ausência de qualquer deles, fazer a intimação por edital, com prazo de quinze dias, publicado no Diário Oficial . 2º Decorrido o prazo determinado neste artigo e não comparecendo a parte intimada, subirá processo a julgamento, depois de certificada a revelia. Art. 98. Recebida a defesa, à qual todos os meios serão facultados, terão vista do processo o denunciante da infração e o fiscal a quem esteja afeta a fiscalização da Sociedade denunciada e, se forem apresentados novos documentos, deles terá vista o denunciado. 226 § 1º Quando o denunciante for um particular e nada disser, no prazo de dez dias, sobre a defesa, o processo prosseguirá, nos seus termos ulteriores. § 2º Subindo o processo a julgamento do Superintendente da SUSEP, poderá este determinar as diligências que julgar necessárias e, satisfeitas estas, proferirá sua decisão, impondo a penalidade em que tiver incorrido o contraventor ou julgando improcedente o auto de denúncia. § 3º Da decisão a que o parágrafo anterior alude será intimada a parte, na forma do artigo 97. Art. 99. Verificada a hipótese prevista no § 1º do art. 61 do Decreto-Lei 73-66, o IRB interpelará a Sociedade para apresentar a comprovação da aplicação do adiantamento na liquidação do respectivo sinistro, no prazo de 15 dias, findo o qual, sem que tenha ocorrido a comprovação ou devolução, o IRB remeterá ao Ministério Público os elementos essenciais para instauração do processo-crime respectivo. CAPÍTULO X Dos Corretores de Seguros Art. 100. O corretor de seguros, profissional autônomo, pessoa física ou jurídica, é o intermediário legalmente autorizado a angariar e promover contratos de seguro entre as Sociedades Seguradoras e as pessoas físicas ou jurídicas de direito Privado. Parágrafo único. O corretor de seguros poderá ter prepostos de sua livre escolha e designará, dentre eles, o que o substituirá. Art. 101. O exercício da profissão de corretor de seguros depende de prévia habilitação e registro na SUSEP. § 1º A habilitação técnico-profissional consistirá na aprovação em curso organizado conforme orientação do IRB, segundo as diretrizes do CNSP. § 2º O registro de novos corretores será feito mediante satisfação dos requisitos constantes deste Regulamento. § 3º Os corretores já registrados definitivamente até a presente data, de conformidade com o disposto na lei 4.594-64, estão dispensados de qualquer nova formalidade. 227 Art. 102. Para o registro, será necessária a apresentação de documentos comprovando os seguintes requisitos: a) ser brasileiro ou estrangeiro com residência permanente no País; b) estar quite com o serviço militar, quando se tratar de brasileiro; c) não haver sido condenado por crimes a que se referem as Seções II, III e IV do Capítulo VI do Título I; os Capítulos I, II, III, IV, V, VI e VII do Título II; o Capítulo V do Título VI; Capítulos I, II, III e IV do Título X e o Capítulo I do Título XI, parte especial do Código Penal. d) não ser falido; e) ter habilitação técnico-profissional; f) apresentar declaração assinada pelo candidato, com a firma reconhecida, de que não exerce nenhuma das atividades enumeradas no Art. 125 do Decreto-lei 73-66. § 1º Se se tratar de pessoa jurídica deverá a requerente provar que está organizada segundo as leis brasileiras ter sede no País e ações nominativas que seus diretores, gerentes, administradores, sócios ou acionistas não incidam na proibição o Art. 125 do Decreto-lei nº 73-66, devendo os responsáveis pelo negócio preencher as exigências do presente artigo. Art. 103. As comissões de corretagem só poderão ser pagas a corretor de seguros devidamente habilitado e registrado. Art. 104. Nos seguros diretos, contratados sem a intervenção de corretor a comissão de corretagem será recolhida ao IRB pelas Sociedades para os fins previstos no artigo 19, da Lei nº 4.594, de 29-12-64. Art. 105. Para os riscos situados em cidades de até 10.000 habitantes, é permitida a angariação de seguros por simples angariadores, desde que não haja no local corretores registrados. Art. 106. A representação de Corretores Estrangeiros, no Brasil, é privativa de corretores devidamente registrados. Art. 107. Não se poderá habilitar novamente como corretor aquele cujo título de habilitação profissional houver sido cancelado, nos termos do Artigo 109, deste Regulamento. 228 Art. 108. O corretor de seguros responderá civilmente perante os Segurados e as Sociedades Seguradoras pelos prejuízos que causar, por omissão, imperícia ou negligência no exercício da profissão. Art. 109. Caberá responsabilidade profissional, perante a SUSEP, ao corretor que deixar de cumprir as leis, regulamentos e resoluções em vigor, ou que der causa dolosa ou culposa a prejuízos às Sociedades Seguradoras ou ao segurados. Art. 110. O corretor de seguros estará sujeito às penalidades seguintes: a) multa; b) suspensão temporária do exercício da profissão; c) cancelamento de registro. Art. 111. A SUSEP baixará dentro de 90 dias as instruções necessárias ao registro de corretores, bem como as pertinentes aos livros registros, documentos e impressos necessários ao exercício da profissão. CAPÍTULO XI Disposições Gerais e Transitórias Art. 112. O Fundo de Estabilidade do Seguro Agrário, a que se refere o art. 3º da Lei 4.430-64, ficam incorporados ao Fundo de Estabilidade do Seguro Rural criado pelo art. 16 do Decreto-Lei 73-66, a ser administrado pelo IEB. § 1º O Banco do Brasil S.A. promoverá a transferência para o IRB, na conta do Fundo de Estabilidade do Seguro Rural, dos saldos dos Fundos referidos neste artigo. § 2º As dotações orçamentárias previstas no parágrafo único do artigo 3º da Lei nº 4.430-64 serão anualmente entregues ao IRB pelo Ministério da Agricultura. Art. 113. Os Órgãos do Poder Público a que se refere o art. 143 do Decreto-Lei 73-66 deverão apresentar à SUSEP para registro os documentos que comprovem haver cumprido aquela disposição legal. Art. 114. Se, prejuízo do disposto no artigo 113, anterior, é mantida a autorização para que o Serviço de Assistência e Seguro Social dos Economiários - SASSE, realize os seguros de que trata a Lei nº 3.149, de 21 de maio de 1957, através da sociedade a ser constituída para operar de conformidade com o estabelecido no Decreto-Lei nº 73-66. 229 Art. 115. A SUSEP apresentará ao CNSP, dento de 120 dias, o plano de fiscalização das associações de classe de beneficência e de socorros mútuos e dos montepios que instituem pensões ou pecúlios. Parágrafo único. A constituição de qualquer nova Entidade com as finalidades das referidas neste artigo dependerá de prévia autorização de Governo Federal de conformidade com a regulamentação a ser baixada pelo CNPS. Art. 116. O disposto no Capítulo III deste Regulamento constitui corpo de princípios gerais, que não exclui o disposto no art. 144 do Decreto-Lei 73-66. Art. 117. Todas as Sociedades autorizadas a operar no País sob pena de cassação da Carta Patente deverão enquadrar-se nas condições deste Regulamento, da seguinte forma: I - apresentar declaração, no prazo de seis meses dirigida ao CNSP e processada pela SUSEP, definindo as modalidades de seguro em que pretenderão operar e obrigando-se ao correspondente aumento de capital. II - realizar metade do capital mínimo e dos capitais adicionais, se for o caso, no prazo de seis meses, contados do final do prazo do inciso anterior. III - realizar o restante do capital mínimo e dos capitais adicionais se for o caso, no prazo de doze meses, contados do final do prazo do inciso II, anterior. Art. 118. As Sociedades Seguradoras estrangeiras autorizadas a operar no Brasil obedecerão os prazos e condições do artigo 117 deste Regulamento constituído e mantendo no país os valores correspondentes, sob pena de cassação das respectivas Cartas Patentes. Art. 119. Dentro de 120 dias, os Sindicatos de Corretores de Seguros apresentarão ao CNSP projeto de Código de Ética Profissional e constituição de Órgão de classe, destinado ao julgamento das infrações ao Código de Ética. Art. 120. Os pedidos de habilitação e registro de corretores, apresentados ao Ministério da Indústria e Comércio até 31 de dezembro de 1966, poderão ser deferidos a critério da SUSEP, desde que atendam às exigências legais. Art. 121. Consultados os interesses destas entidades, a SUSEP e o IRB poderão admitir em seus quadros os funcionários concursados da extinta Companhia Nacional de Seguro Agrícola, independente da prestação de novo concurso e contado o tempo de serviço do funcionário legais de aposentadoria e pensão. Art. 122. Enquanto não for aprovado o Quadro do Pessoal da SUSEP, os ocupantes dos cargos em comissão e funções gratificadas do extinto Departamento Nacional de Seguros Privados e Capitalização continuarão no 230 exercício de suas funções, sem prejuízo de seus vencimentos e vantagens, inclusive gratificações relativas ao regime de tempo integral. Art. 123. O presente Regulamento entrará em vigor na data de sua provação pelo Presidente da República. Brasília, 13 de março de 1967. PAULO EGYDIO MARTINS 231 DECRETO Nº 61.867, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1967. Regulamenta os seguros obrigatórios previstos no artigo 20 do Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, e dá outras providências. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA , usando da atribuição que lhe confere o art. 83, item II, da Constituição e cumprindo o disposto no artigo 144 do Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, sobre a regulamentação dos seguros obrigatórios, DECRETA: CAPÍTULO I Disposições Preliminares Art 1º Os seguros obrigatórios previstos no artigo 20, do Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, serão realizados com observância do disposto neste Decreto. Art 2º Não poderá ser concedida autorização, licença ou respectiva renovação ou transferência, a qualquer título, para o exercício de atividades que estejam sujeitas a seguro obrigatório, sem prova da existência desse seguro. Art 3º O Banco Nacional de Habitação (BNH) poderá assumir os riscos decorrentes das operações do sistema financeiro de habitação, que não encontrem cobertura no mercado nacional, a taxas e condições compatíveis com as necessidades desse sistema. § 1º Para esse fim, o BNH submeterá à aprovação da Superintendência de Seguros Privados (SUSEP) o plano da cobertura pretendida, compreendendo as condições de taxas do seguro e respectiva nota técnica, sob fiscalização daquela Superintendência. § 2º A falta da cobertura prevista neste artigo deverá ser declarada pelo Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), e a incompatibilidade das taxas e condições pelo BNH. Art 4º O Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) expedirá recomendações especiais sobre a liquidação de sinistros relativos aos seguros obrigatórios. CAPÍTULO II Dos seguros obrigatórios de responsabilidade civil dos proprietários de veículos automotores de via terrestre 232 Art 5º As pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, proprietárias de quaisquer veículos relacionados nos artigos 52 e 63, da Lei número 5.108, de 21 de setembro de 1966, referente ao Código Nacional de Trânsito, ficam obrigadas a segurá-los, quanto à responsabilidade civil decorrente de sua existência ou utilização. Art 6º O seguro obrigatório de responsabilidade civil a que se refere o artigo anterior garantirá os danos causados pelo veículo e pela carga transportada, a pessoas transportada, ou não, e a bens não transportados. Art 7º O seguro de que trata este Capítulo garantirá, no mínimo: I - Por pessoa vitimada, indenização de seis mil cruzeiros novos, no caso de morte; de até seis mil cruzeiros novos, no caso de invalidez permanente, e de até seiscentos cruzeiros novos, no caso de incapacidade temporária. II - Por danos materiais, indenização de até cinco mil cruzeiros novos, acima de cem cruzeiros novos, parcela essa que sempre correrá por conta do proprietário do veículo. CAPÍTULO III Do seguro obrigatório de responsabilidade civil dos proprietários de veículos automotores hidroviários Art 8º A responsabilidade civil do proprietário ou explorador de veículos automotores hidroviários terá condições e limites fixados pelo CNSP. Art 9º A responsabilidade civil do proprietário ou explorador de embarcações de turismo ou recreio será segurada, no mínimo, em importância igual ao valor da embarcação. CAPÍTULO IV Do seguro obrigatório de responsabilidade civil dos transportadores em geral Art 10. As pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado que se incumbirem do transporte de carga, são obrigadas a contratar seguro de responsabilidade civil em garantia das perdas e danos sobrevindos à carga que lhes tenha sido confiada para transporte, contra conhecimento ou nota de embarque. § 1º A obrigatoriedade a que se refere este artigo se restringirá aos casos em que os embarques sejam suscetíveis de um mesmo evento, e tenham valor igual ou superior a dez mil cruzeiros novos. (Ver art.2º, I do Dec. 85.266/80) § 2º Para apuração dessa importância, serão considerados os valores constantes das notas fiscais, faturas, conhecimentos de embarque ou outros documentos hábeis, para aquele fim, que acompanham as mercadorias ou bens. § 3º Os transportadores aéreos obedecerão, no que tange aos valores segurados ao que estabelece o Código Brasileiro do Ar. 233 CAPÍTULO V Do seguro obrigatório de responsabilidade civil do construtor de imóveis em zonas urbanas por danos a pessoas Art 11. Os construtores de Imóveis em zonas urbanas, são obrigados a contratar seguro de sua responsabilidade civil que garanta indenização mínima de vinte mil cruzeiros novos, por evento. (Ver art.2º, II do Dec. 85.266/80) § 1º O seguro de que trata este artigo não abrange a responsabilidade a que se refere o artigo 1.245 do Código Civil. § 2º Os órgãos do poder público federal, estadual e municipal de administração direta ou indireta estão sujeitos às disposições deste artigo. CAPÍTULO VI Do seguro obrigatório de transporte de bens pertencentes a pessoas jurídicas Art 12. As pessoas jurídicas, de direito público ou privado, são obrigadas a segurar os bens ou mercadorias de sua propriedade, contra riscos de força maior e caso fortuito, inerentes aos transportes ferroviários, rodoviários, aéreos e hidroviários, quando objeto de transporte no território nacional, e de valor igual ou superior a cinco mil cruzeiros novos. (Ver art.2º, III do Dec. 85.266/80) Parágrafo único. Para verificação da importância fixada neste artigo, serão considerados conforme o caso: a) os valores escriturados dos bens e mercadorias, limitados ao custo de aquisição, admitindo-se depreciação anual de dez por cento, quando os bens forem representados por móveis, utensílios ou maquinaria, e não tenham sido objeto de compra e venda; b) os valores constantes de notas fiscais, faturas, conhecimentos de embarque ou outro documento hábil que acompanha as mercadorias ou bens. Art 13. São excluídos da obrigatoriedade prevista no artigo anterior os bens e mercadorias objeto de viagem internacional. Art 14. A cobertura mínima para os seguros de transportes hidroviários é a Livre de Avaria Particular (LAP). CAPÍTULO VII De seguro obrigatório de danos pessoais a passageiros de aeronaves comerciais e de responsabilidade civil do transportador aeronáutico Art 15. O seguro obrigatório do transportador, proprietário ou explorador de aeronaves, garantirá, no mínimo: I - Danos pessoais a passageiros de aeronaves comerciais, suas bagagens, acompanhadas ou não - nos limites estabelecidos pelo Código Brasileiro do Ar. 234 II - Responsabilidade civil extracontratual do proprietário ou explorador de aeronaves - oitocentos mil cruzeiros novos, por acidente-aeronave, em se tratando de aeronaves pertencentes a linha regulares de navegação aérea e quatrocentos mil cruzeiros novos, por acidente-aeronave, nos demais casos. (Ver art.2º, IV do Dec. 85.266/80) CAPÍTULO VIII Do seguro rural obrigatório Art 16. O seguro rural obrigatório destina-se a ressarcir os danos causados por acidentes, fenômenos da natureza, praga ou doenças, a rebanhos, plantações e outros bens ligados à atividade ruralista. Parágrafo único. São segurados as cooperativas rurais e as pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, que explorem atividades agrícolas ou pecuárias. Art 17. O seguro de crédito rural será disciplinado pelo CNSP, nos termos da disposição do artigo 10 do Decreto número 60.459, de 13 de março de 1967. CAPÍTULO IX Do seguro obrigatório contra riscos de incêndio de bens pertencentes a pessoas jurídicas Art 18. As pessoas jurídicas, de direito público ou privado, são obrigadas a segurar, contra os riscos de incêndio, seus bens móveis e imóveis, situados no país, desde que, localizados em um mesmo terreno ou em terrenos contíguos, tenham, isoladamente ou em conjunto,valor igual ou superior a vinte mil cruzeiros novos. (Ver art.2º, II do Dec. 85.266/80) Parágrafo único. Para determinação da importância pela qual deverá ser realizado o seguro, serão adotados os valores de reposição dos bens. CAPÍTULO X Do seguro obrigatório de garantia do cumprimento das obrigações do incorporador e construtor de imóveis e de garantia do pagamento à cargo do mutuário Art 19. O seguro obrigatório de garantia do cumprimento das obrigações do incorporador e construtor de imóveis, quando responsáveis pela entrega das unidades, será efetuado pelo valor fixado contratualmente para a construção. Art 20. O seguro para garantia da obrigação contratual dos adquirentes de imóveis em construção, previsto no artigo 20 alínea " f ", do Decreto-lei número 73 de 21 de novembro de 1966, será contratado por valor igual ao dessa obrigação. 235 Art 21. O disposto neste capítulo só se aplica a incorporações ou construções de valor não inferior a vinte e um mil cruzeiros novos. (Ver art.2º, V do Dec. 85.266/80) CAPÍTULO XI Do seguro obrigatório de bens dados em garantia de empréstimos ou financiamentos de instituições financeiras públicas Art 22. O seguro obrigatório de bens dados em garantia de empréstimos ou financiamentos de instituições financeiras públicas deve ser contratado em montante correspondente ao respectivo valor de reposição. CAPÍTULO XII Do seguro obrigatório de edifícios divididos em unidades autônomas Art 23. O seguro obrigatório garantindo riscos provenientes de danos físicos de causa externa, de acordo com o artigo 13, do Decreto número 4.591, de 16 de dezembro de 1964, relativos a edifícios divididos em unidades autônomas, será contratado pelo valor de reposição. CAPÍTULO XIII Do seguro obrigatório de crédito à exportação Art 24. As firmas exportadoras estão obrigadas a efetuar o seguro de crédito à exportação instituído pela Lei número 4.678, de 16 de junho de 1965, e regulamentado pelo Decreto número 57.286, de 18 de novembro de 1965, sempre que o crédito for concedido por instruções financeiras públicas, e desde que as condições gerais das operações de seguros admitam cobertura para o risco. Parágrafo único. O seguro deverá cobrir os "riscos comerciais" e os "riscos políticos e extraordinários", como definidos em lei, regulamento e normas aprovadas pelo CNSP. Art 25. As instituições financeiras públicas e o IRB deverão estabelecer reciprocidade no fornecimento de informações cadastrais que tiverem, relativamente aos importadores e exportadores. Art 26. Ficam excluídas da obrigatoriedade do seguro, para os "riscos comerciais", as operações efetuadas: I - Com órgãos de administração pública estrangeira ou entidade a eles vinculada ou quando a operação for realizada com particular que a tiver garantida por um daqueles órgãos ou entidades. II - Com sucursais, filiais ou agências do exportador, ou com devedores em cujos negócios seja aquele interessado, como sócio ou credor. Parágrafo único. Para as operações referidas no inciso I deste artigo, poderá ser concedida cobertura conjuntamente com a de "riscos políticos e extraordinários". 236 Art 27. O recebimento dos prêmios de seguro e o pagamento de sinistros e despesas, quando em moeda estrangeira, far-se-ão segundo as diretrizes fixadas pelo Conselho Monetário Nacional. CAPÍTULO XIV Das Disposições Gerais e Transitórias Art 28.Nenhum veículo a que se refere o artigo 5º deste Decreto poderá ser licenciado, a partir de 1º de janeiro de 1968, sem que fique comprovada a efetivação do seguro ali previsto. Art 29. As autoridades políticas prestarão à SUSEP, ao IRB e às sociedades seguradoras, toda colaboração necessária ao levantamento da estatística, registro e apuração de responsabilidade dos acidentes que envolvam qualquer veículo a que se refere este Decreto. Art 30. Para a verificação do cumprimento da obrigatoriedade a que se refere o artigo 23 deste Decreto, as autoridades municipais ou estaduais exigirão que, ao efetuar-se o pagamento do imposto predial, seja feita pelo síndico ou pelo próprio condômino, a prova da realização do seguro. Parágrafo único. Dita comprovação poderá ser feita: a) pela exibição da respectiva apólice, ou sua cópia devidamente autenticada. b) pela entrega de declaração assinada pelo síndico, e da qual constem: número da apólice; nome da companhia seguradora; datas de inicio e término do seguro; número e rua em que se situa o edifício; valor total do seguro. Art 31. Nenhum veículo de transportador, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, poderá a partir da data fixada pelo CNSP trafegar com bens ou mercadorias sem que fique comprovada a efetiva realização dos seguros obrigatórios de responsabilidade civil do transportador. Art 32. Nenhum veículo, ou qualquer equipamento de transporte, a partir de 1º de janeiro de 1968, poderá transportar pessoas, bens e mercadorias, sem que fique comprovada a efetiva realização dos seguros obrigatórios a que se referem os capítulos III, IV, VI e VII deste Decreto. Art 33. Nenhuma operação de crédito rural poderá ser realizada a partir de 1 de março de 1968, sem que fique comprovada a efetiva realização do seguro rural. Art 34. As escrituras públicas que versarem sobre incorporação ou construção de imóveis a que se refere o artigo 20, alínea " e ", do Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966 não poderão, a partir da data fixada pelo CNSP, ser inscritas no Registro Geral de Imóveis, sem que delas conste expressa referência à comprovação do respectivo seguro, ou à isenção certificada pela SUSEP, na 237 hipótese de inexistência de cobertura, no mercado segurador, declarada pelo IRB. Art 35. Nenhum contrato de venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de direito relativos a imóveis, cujo preço for ajustado para pagamento a prazo, mediante financiamento concedido por instituições financeiras públicas ou sociedades de crédito imobiliário, poderá, a partir da data fixada pelo CNSP, ser registrado no Registro Geral de Imóveis, sem a prova da contratação dos seguros previstos no art. 20, alíneas " d " e " f " do Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966. Art 36. Caberá à instituição financeira pública exigir do exportador a comprovação do seguro referido no art. 24 e seu parágrafo único, deste Decreto. Art 37. A obrigatoriedade do seguro estabelecida no capítulo XIII deste Decreto se iniciará noventa dias da data de sua publicação, a partir de quando nenhum contrato de financiamento poderá ser assinado pelas entidades financeiras públicas, sem a comprovação da cobertura do seguro ali referido. Art 38. O CNSP expedirá normas disciplinadoras, condições e tarifas dos seguros de que tratam o presente Decreto e quaisquer disposições legais sobre seguros obrigatórios. Art 39. (Artigo revogado pelo Dec 85.266/80) Art 40. Este Decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogados o artigo 116 e o Capítulo III, exceto o artigo 16 e parágrafos, do Decreto nº 60.459, de 13 de março de 1967 e quaisquer disposições em contrário. Brasília, 7 de dezembro de 1967; 146º da Independência e 79º da República. A. COSTA E SILVA José Fernandes de Luna 238 DECRETO-LEI Nº 802, DE 28 DE AGOSTO DE 1969 Declara a Rede Ferroviária Federal S. A. e as demais ferrovias existentes no País isentas das obrigações estabelecidas no Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA , usando das atribuições que lhe confere o § 1º do artigo 2º do Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968, DECRETA: Art 1º A Rede Ferroviária Federal S. A. e as demais ferrovias existentes no País, ficam isentas das obrigações previstas nas alíneas b e h , do artigo 20, do Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966. Art 2º Este Decreto-lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário. Brasília, 28 de agosto de 1969; 148º da Independência e 81º da República. A. COSTA E SILVA Mário David Andreazza José Fernandes de Luna 239 LEI Nº 6.194, DE 19 DE DEZEMBRO DE 1974 Dispõe sobre Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, ou por sua carga, a pessoas transportadas ou não. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA , faço saber que o CONGRESSO NACIONAL decreta e eu sanciono a seguinte Lei: Art 1º A alínea b do artigo 20, do Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, passa a ter a seguinte redação: "Art. 20. ............................................................................................................................ b) - Responsabilidade civil dos proprietários de veículos automotores de vias fluvial, lacustre, marítima, de aeronaves e dos transportadores em geral." Art 2º Fica acrescida ao artigo 20, do Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, a alínea l nestes termos: "Art. 20 .................................................................................. ......................................... l) - Danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, ou por sua carga, a pessoas transportadas ou não." Art 3º Os danos pessoais cobertos pelo seguro estabelecido no artigo 2º compreendem as indenizações por morte, invalidez permanente e despesas de assistência médica e suplementares, nos valores que se seguem, por pessoa vitimada: a) - 40 (quarenta) vezes o valor do maior salário-mínimo vigente no País - no caso de morte; b) - Até 40 (quarenta) vezes o valor do maior saláriomínimo vigente no País - no caso de invalidez permanente; c) - Até 8 (oito) vezes o valor do maior salário-mínimo vigente no País - como reembolso à vítima - no caso de despesas de assistência médica e suplementares devidamente comprovadas. Art 4º A indenização no caso de morte será paga, na constância do casamento, ao cônjuge sobrevivente; na sua falta, aos herdeiros legais. Nos demais casos, o pagamento será feito diretamente à vítima na forma que dispuser o Conselho Nacional de Seguros Privados. § 1° Para fins deste artigo, a companheira será equiparada à esposa, nos casos admitidos pela lei previdenciária; o companheiro será equiparado ao esposo 240 quando tiver com a vítima convivência marital atual por mais de cinco anos, ou, convivendo com ela, do convívio tiver filhos. (Parágrafo alterado pela Lei 8441/92) § 2° Deixando a vítima beneficiários incapazes, ou sendo ou resultando ela incapaz, a indenização do seguro será liberada em nome de quem detiver o encargo de sua guarda, sustento ou despesas, conforme dispuser alvará judicial . (Parágrafo acrescentado pela Lei 8441/92) Art 5º O pagamento da indenização será efetuado mediante simples prova do acidente e do dano decorrente, independentemente da existência de culpa, haja ou não resseguro, abolida qualquer franquia de responsabilidade do segurado. § 1° A indenização referida neste artigo será paga com base no valor da época da liqüidação do sinistro, em cheque nominal aos beneficiários, descontável no dia e na praça da sucursal que fizer a liqüidação, no prazo de quinze dias da entrega dos seguintes documentos: (Parágrafo alterado pela Lei 8441/92) a ) certidão de óbito, registro da ocorrência no órgão policial competente e a prova de qualidade de beneficiários no caso de morte; b) Prova das despesas efetuadas pela vítima com o seu atendimento por hospital, ambulatório ou médico assistente e registro da ocorrência no órgão policial competente no caso de danos pessoais. § 2º Os documentos referidos no § 1º serão entregues à Sociedade Seguradora, mediante recibo, que os especificará. § 3° Não se concluindo na certidão de óbito o nexo de causa e efeito entre a morte e o acidente, será acrescentada a certidão de auto de necropsia, fornecida diretamente pelo instituto médico legal, independentemente de requisição ou autorização da autoridade policial ou da jurisdição do acidente. (Parágrafo acrescentado pela Lei 8441/92) § 4° Havendo dúvida quanto ao nexo de causa e efeito entre o acidente e as lesões, em caso de despesas médicas suplementares e invalidez permanente, poderá ser acrescentado ao boletim de atendimento hospitalar relatório de internamento ou tratamento, se houver, fornecido pela rede hospitalar e previdenciária, mediante pedido verbal ou escrito, pelos interessados, em formulário próprio da entidade fornecedora. (Parágrafo acrescentado pela Lei 8441/92) § 5° O instituto médico legal da jurisdição do acidente também quantificará as lesões físicas ou psíquicas permanentes para fins de seguro previsto nesta lei, em laudo complementar, no prazo médio de noventa dias do evento, de acordo com os percentuais da tabela das condições gerais de seguro de acidente suplementada, nas restrições e omissões desta, pela tabela de acidentes do trabalho e da classificação internacional das doenças. (Parágrafo acrescentado pela Lei 8441/92) 241 Art 6º No caso de ocorrência do sinistro do qual participem dois ou mais veículos, a indenização será paga pela Sociedade Seguradora do respectivo veículo em que cada pessoa vitimada era transportada. § 1º Resultando do acidente vítimas não transportadas, as indenizações a elas correspondentes serão pagas, em partes iguais, pelas Sociedades Seguradoras dos veículos envolvidos. § 2º Havendo veículos não identificados e identificados, a indenização será paga pelas Sociedades Seguradoras destes últimos. Art 7º A indenização por pessoa vitimada por veículo não identificado, com seguradora não identificada, seguro não realizado ou vencido, será paga nos mesmos valores, condições e prazos dos demais casos por um consórcio constituído, obrigatoriamente, por todas as sociedades seguradoras que operem no seguro objeto desta lei. (Artigo alterado pela Lei 8441/92) § 1° O consórcio de que trata este artigo poderá haver regressivamente do proprietário do veículo os valores que desembolsar, ficando o veículo, desde logo, como garantia da obrigação, ainda que vinculada a contrato de alienação fiduciária, reserva de domínio, leasing ou qualquer outro. (Parágrafo alterado pela Lei 8441/92) § 2º O Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) estabelecerá normas para atender ao pagamento das indenizações previstas neste artigo, bem como a forma de sua distribuição pelas Seguradoras participantes do Consórcio. Art 8º Comprovado o pagamento, a Sociedade Seguradora que houver pago a indenização poderá, mediante ação própria, haver do responsável a importância efetivamente indenizada. Art 9º Nos seguros facultativos de responsabilidade civil dos proprietários de veículos automotores de via terrestre, as indenizações por danos materiais causados a terceiros serão pagas independentemente da responsabilidade que for apurada em ação judicial contra o causador do dano, cabendo à Seguradora o direito de regresso contra o responsável. Art 10. Observar-se-á o procedimento sumaríssimo do Código de Processo Civil nas causas relativas aos danos pessoais mencionados na presente lei. Art 11. Terá suspensa a autorização para operar no seguro obrigatório de que trata o artigo 2º, sem prejuízo de outras penalidades previstas na legislação específica, a Sociedade Seguradora que infringir as disposições desta lei. Art 12. O Conselho Nacional de Seguros Privados expedirá normas disciplinadoras e tarifas que atendam ao disposto nesta lei. § 1° O Conselho Nacional de Trânsito implantará e fiscalizará as medidas de sua competência, garantidoras do não licenciamento e não circulação de veículos 242 automotores de vias terrestres, em via pública ou fora dela, a descoberto do seguro previsto nesta lei. (Parágrafo acrescentado pela Lei 8441/92) § 2° Para efeito do parágrafo anterior, o Conselho Nacional de Trânsito expedirá normas para o vencimento do seguro coincidir com o do IPVA, arquivando-se cópia do bilhete ou apólice no prontuário respectivo, bem como fazer constar no registro de ocorrências nome, qualificação, endereço residencial e profissional completos do proprietário do veículo, além do nome da seguradora, número e vencimento do bilhete ou apólice de seguro." (Parágrafo acrescentado pela Lei 8441/92) Art 13. Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogados o Decreto-lei nº 814, de 4 de setembro de 1969, e demais disposições em contrário. Brasília, 19 de dezembro de 1974; 153º da Independência e 86º da República. ERNESTO GEISEL Severo Fagundes Gomes 243 DECRETO Nº 85.266, DE 20 DE OUTUBRO DE 1980. Dispõe sobre a atualização dos valores monetários dos seguros obrigatórios a que se refere o Decreto nº 61.867, de 7 de dezembro de 1967. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA , no uso da atribuição que lhe confere o artigo 81, item III, da Constituição, DECRETA: Art 1º - Os valores monetários estabelecidos para fins de contratação dos seguros obrigatórios regulados pelo Decreto nº 61.867, de 7 de dezembro de 1967, passam a ser atualizados de acordo com o coeficiente de atualização da moeda a que se refere o parágrafo único do artigo 2º da Lei nº 6.205, de 29 de abril de 1975. Art 2º - Em decorrência do disposto no artigo anterior, os limites constantes dos artigos 10, § 1º, 11, 12, 15, inciso II, 18 e 21 do Decreto nº 61.867, de 27 de dezembro de 1967, passam a vigorar com os seguintes valores: I - 100 (cem) vezes o maior valor de referência, quanto aos seguros de que trata o artigo 10, § 1º; II - 200 (duzentas) vezes o maior valor de referência, quanto aos seguros de que tratam os artigos 11 e 18; III - 100 (cem) vezes o maior valor de referência, quanto aos seguros de que trata o art. 12; IV - quanto aos seguros de responsabilidade civil extracontratual do proprietário ou explorador de aeronaves, e por acidente-aeronave, prevista no art. 15, II: a) 8.000 vezes o maior valor de referência, no caso de linhas regulares de navegação aérea; b) 4.000 vezes o maior valor de referência, nos demais casos. V - 200 (duzentas) vezes o maior valor de referência, quanto aos seguros de que trata o art. 21. 244 Art 3º - Este decreto entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário, especialmente o artigo 39 do Decreto nº 61.867, de 7 de dezembro de 1967. Brasília, 20 de outubro de 1980; 159º da Independência e 92º da República. JOÃO FIGUEIREDO 245 LEI Nº 7.944, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1989. Institui a Taxa de Fiscalização dos mercados de seguro, de capitalização e da previdência privada aberta, e dá outras providências. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA , faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: Art. 1º É instituída a Taxa de Fiscalização dos mercados de seguro, de capitalização e da previdência privada aberta. Art. 2º Constitui fato gerador da Taxa o exercício do poder de polícia legalmente atribuído à Superintendência de Seguros Privados - SUSEP. Art. 3º São contribuintes da Taxa os estabelecimentos de seguro, de capitalização e de previdência privada aberta com ou sem fins lucrativos. Art. 4º Os valores da Taxa de Fiscalização, expressos em Ufir, são os constantes na tabela anexa por faixas de exigência de Patrimônio Líquido, devidos em cada trimestre, de acordo com o tipo de atividade do estabelecimento, apurados conforme os seguintes critérios: (Artigo alterado pela Lei 8981/95). I - unidade da federação (Estados e Distrito Federal) em que o estabelecimento tenha matriz - Coluna A; e II - por unidade da federação em que o estabelecimento opere adicionalmente Coluna B. § 1º Para efeito do enquadramento nas faixas de Patrimônio Líquido exigido, o estabelecimento deverá considerar sua Margem de Solvência, tal qual estabelecida em resolução própria do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP). (Parágrafo alterado pela Lei 8981/95). § 2º Exclusivamente com a finalidade da apuração da Taxa de Fiscalização, enquanto o Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) não definir a exigência e a forma de cálculo da Margem de Solvência para a realização das operações de seguro de vida individual, previdência privada e capitalização, deverá ser tomado como valor do Patrimônio Líquido exigido para tais operações o equivalente a oito por cento do saldo total das respectivas reservas e provisões matemáticas. (Parágrafo acrescentado pela Lei 8981/95). 246 Art. 5º A Taxa será recolhida, até o último dia útil do primeiro decêndio dos meses de janeiro, abril, julho e outubro de cada ano. § 1º A Taxa não recolhida no prazo fixado será atualizada na data do efetivo pagamento de acordo com o índice de variação do BTN Fiscal e cobrada com os seguintes acréscimos: a) juros de mora, na via administrativa ou judicial, contados no mês seguinte ao do vencimento, à razão de 1% (um por cento), calculados na forma da legislação aplicável aos tributos federais; b) multa de mora de 20% (vinte por cento), sendo reduzida a 10% (dez por cento) se o pagamento for efetuado até o último dia útil do mês subseqüente àquele em que deveria ter sido paga; c) encargo legal de 20% (vinte por cento), substitutivo da condenação do devedor em honorários de advogado, calculado sobre o total do débito inscrito como Dívida Ativa, que será reduzido para 10% (dez por cento) se o pagamento for efetuado antes do ajuizamento da execução. § 2º Os juros de mora não incidem sobre o valor da multa de mora. Art. 6º Os débitos referentes à Taxa, sem prejuízo da respectiva liquidez e certeza, poderão ser inscritos como Dívida Ativa, pelo valor expresso em BTN Fiscal. Art. 7º Os débitos relativos à Taxa poderão ser parcelados a juízo do Conselho Diretor da SUSEP, de acordo com os critérios fixados na legislação tributária. Art. 8º A Taxa será recolhida ao Tesouro Nacional, em conta vinculada à SUSEP, por intermédio de estabelecimento bancário integrante da rede credenciada. Art. 9º A Taxa será cobrada a partir de 1º de janeiro de 1990. Art. 10. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 11. Revogam-se as disposições em contrário. Brasília, 20 de dezembro de 1989; 168º da Independência e 101º da República. JOSÉ SARNEY Mailson Ferreira da Nóbrega 247 ANEXO TABELA A QUE SE REFERE O ART. 4, EM UFIR --------------------------------------------------------Tipo de Instituição/Faixas de Patrimônio Líquido Exigido AB --------------------------------------------------------Seguro do Ramo Vida - Abaixo de 5.000.000 7.000 350 - Entre 5.000.000 e 20.000.000 14.000 700 - Entre 20.000.000 e 100.000.000 28.000 1.400 - Acima de 100.000.000 56.000 2.800 Seguro dos Ramos Elementares - Abaixo de 5.000.000 7.000 350 - Entre 5.000.000 e 20.000.000 14.000 700 - Entre 20.000.000 e 100.000.000 28.000 1.400 - Acima de 100.000.000 56.000 2.800 Todos os Ramos de Seguros - Abaixo de 5.000.000 14.000 700 - Entre 5.000.000 e 20.000.000 28.000 1.400 - Entre 20.000.000 e 100.000.000 56.000 2.800 - Acima de 100.000.000 112.000 5.600 Previdência Privada Aberta - Abaixo de 5.000.000 7.000 350 - Entre 5.000.000 e 20.000.000 14.000 700 248 - Entre 20.000.000 e 100.000.000 28.000 1.400 - Acima de 100.000.000 56.000 2.800 Capitalização - Abaixo de 5.000.000 7.000 350 - Entre 5.000.000 e 20.000.000 14.000 700 - Entre 20.000.000 e 100.000.000 28.000 1.400 - Acima de 100.000.000 56.000 2.800 --------------------------------------------------------- 249 LEI N° 8.177, DE 1° DE MARÇO 1991 Estabelece regras para a desindexação da economia e dá outras providências (Alterada pelas LEI Nº 8.660/1993, MP Nº 2.181-45/24.08.2001, MP Nº 2.183-56/24.08.2001, MP Nº 321 \ 12.09.2006 já inseridas no texto) O PRESIDENTE DA REPÚBLICA , faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte lei: Art. 1° O Banco Central do Brasil divulgará Taxa Referencial (TR), calculada a partir da remuneração mensal média líquida de impostos, dos depósitos a prazo fixo captados nos bancos comerciais, bancos de investimentos, bancos múltiplos com carteira comercial ou de investimentos, caixas econômicas, ou dos títulos públicos federais, estaduais e municipais, de acordo com metodologia a ser aprovada pelo Conselho Monetário Nacional, no prazo de sessenta dias, e enviada ao conhecimento do Senado Federal. (Revogado pela LEI Nº 8.660, DE 28 DE MAIO DE 1993)1° A TR será mensalmente divulgada pelo Banco Central do Brasil, no máximo até o oitavo dia útil do mês de referência. 2° As instituições que venham a ser utilizadas como bancos de referência, dentre elas, necessariamente, as dez maiores do País, classificadas pelo volume de depósitos a prazo fixo, estão obrigadas a fornecer as informações de que trata este artigo, segundo normas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional, sujeitando-se a instituição e seus administradores, no caso de infração às referidas normas, às penas estabelecidas no art. 44 da Lei n° 4.595, de 31 de dezembro de 1964. 3° Enquanto não aprovada a metodologia de cálculo de que trata este artigo, o Banco Central do Brasil fixará a TR. Art. 2° O Banco Central do Brasil divulgará, para cada dia útil, a Taxa Referencial Diária (TRD), correspondendo seu valor diário à distribuição pro rata dia da TR fixada para o mês corrente. 1° Enquanto não divulgada a TR relativa ao mês corrente, o valor da TRD será fixado pelo Banco Central do Brasil com base em estimativa daquela taxa. 2° Divulgada a TR, a fixação da TRD nos dias úteis restantes do mês deve ser realizada de forma tal que a TRD acumulada entre o 1° dia útil do mês e o 1° dia útil do mês subseqüente seja igual à TR do mês corrente. Art. 3° Ficam extintos a partir de 1° de fevereiro de 1991: 250 I - o BTN Fiscal instituído pela Lei n° 7.799, de 10 de julho de 1989; II - o Bônus do Tesouro Nacional (BTN) de que trata o art. 5° da Lei n° 7.777, de 19 de junho de 1989, assegurada a liquidação dos títulos em circulação, nos seus respectivos vencimentos; III - o Maior Valor de Referência (MVR) e as demais unidades de conta assemelhadas que são atualizadas, direta ou indiretamente, por índice de preços. Parágrafo único. O valor do BTN e do BTN Fiscal destinado à conversão para cruzeiros dos contratos extintos na data de publicação da medida provisória que deu origem a esta lei, assim como para efeitos fiscais, é de Cr$126,8621. Art. 4° A partir da vigência da medida provisória que deu origem a esta lei, a Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística deixará de calcular o Índice de Reajuste de Valores Fiscais (IRFV) e o Índice da Cesta Básica (ICB), mantido o cálculo do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC). Art. 5° A partir de 1° de março de 1991, o valor nominal das Obrigações do Tesouro Nacional (OTN), emitidas anteriormente a 15 de janeiro de 1989 (art. 6° do Decreto-Lei n° 2.284, de 10 de março de 1986), dos Bônus do Tesouro Nacional (BTN), emitidos até a data de vigência da medida provisória que deu origem a esta lei, das Letras do Tesouro Nacional, de Série Especial (§ 1° do art. 11 do Decreto-Lei n° 2.376, de 25 de novembro de 1987), e dos Títulos da Dívida Agrária (TDA), será atualizado, no primeiro dia de cada mês, por índice calculado com base na TR referente ao mês anterior. 1° O disposto neste artigo aplica-se também aos BTN emitidos anteriormente à vigência da medida provisória que deu origem a esta lei, com cláusula de opção, ficando assegurada, por ocasião do resgate, a alternativa de atualização com base na variação da cotação do dólar norte-americano divulgada pelo Banco Central do Brasil. 2° Os BTN-Série Especial, emitidos em conformidade com o § 2° do art. 9° da Lei n° 8.024, de 12 de abril de 1990, passam a ser atualizados, a partir de 1° de fevereiro de 1991, pela TRD, acrescidos de juros de seis por cento ao ano, ou fração pro rata. 3º A partir de 5 de maio de 2000, os Títulos da Dívida Agrária - TDA emitidos para desapropriação terão as seguintes remunerações: (Redação da MP Nº 2.183-56/24.08.2001) I - três por cento ao ano para indenização de imóvel com área de até setenta módulos fiscais; (Redação da MP Nº 2.183-56/24.08.2001) 251 II - dois por cento ao ano para indenização de imóvel com área acima de setenta e até cento e cinqüenta módulos fiscais; e (Redação da MP Nº 2.18356/24.08.2001) III - um por cento ao ano para indenização de imóvel com área acima de cento e cinqüenta módulos fiscais. (Redação da MP Nº 2.183-56/24.08.2001) Redação anterior) - 3° Os Títulos da Dívida Agrária (TDA) terão remuneração de seis por cento ao ano ou fração pro rata , mantido o seu poder liberatório nos termos da legislação em vigor, podendo, a partir de seu vencimento, ser utilizados na aquisição de ações de empresas estatais incluídas no Programa Nacional de Desestatização. § 4º Os TDA emitidos até 4 de maio de 2000 e os a serem emitidos para aquisição por compra e venda de imóveis rurais destinados à implantação de projetos integrantes do Programa Nacional de Reforma Agrária, nos termos das Leis nº s 4.504, de 30 de novembro de 1964, e 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, e os decorrentes de acordo judicial, em audiência de conciliação, com o objetivo de fixar a prévia e justa indenização, a ser celebrado com a União, bem como com os entes federados, mediante convênio, serão remunerados a seis por cento ao ano. (Redação da MP Nº 2.183-56/24.08.2001) § 5º Os TDA a que se referem os §§ 3º e 4º terão remuneração anual ou fração pro rata , mantido o seu poder liberatório nos termos da legislação em vigor, podendo, a partir de seu vencimento, ser utilizados na aquisição de ações de empresas estatais incluídas no Programa Nacional de Desestatização." (NR) (Redação da MP Nº 2.183-56/24.08.2001) Art. 6° Para atualização de obrigações com cláusula de correção monetária pela variação do BTN, do BTN Fiscal, das demais unidades no art. 3° e dos índices mencionados no art. 4°, relativas a contratos em geral, exceto aqueles cujo objeto seja a venda de bens para entrega futura, a prestação de serviços contínuos ou futuros e a realização de obras, firmados anteriormente à medida provisória que deu origem a esta lei, deverá ser observado o seguinte: I - nos contratos que prevêem índice substitutivo deverá ser adotado esse índice, exceto nos casos em que esta lei dispuser em contrário; II - nos contratos em que não houver previsão de índice substitutivo, será utilizada a TR, no caso dos contratos referentes ao BTN ou a unidade corrigida mensalmente, ou a TRD, no caso daqueles referentes ao BTN Fiscal e a unidades corrigidas diariamente. Parágrafo único. Para atualização, no mês de fevereiro de 1991, dos contratos referentes ao BTN, a unidade de conta com correção mensal ou a índice de 252 preços, deverá ser utilizado índice resultante de composição entre o índice pro rata , no período decorrido entre a data de aniversário do contrato no mês de janeiro de 1991 e o dia 1° de fevereiro de 1991 e a TRD entre 1° de fevereiro de 1991 e o dia de aniversário do contrato no mês de fevereiro . Art. 7° Os saldos dos cruzados novos transferidos ao Banco Central do Brasil, na forma da Lei n° 8.024, de 12 de abril de 1990, serão remunerados, a partir de 1° de fevereiro de 1991 e até a data da conversão, pela TRD, acrescida de juros de seis por cento ao ano, ou fração pro rata , e serão improrrogavelmente, convertidos em cruzeiros, na forma da Lei n° 8.024, de 12 de abril de 1990. Art. 8° O art. 5° da Lei n° 7.862, de 30 de outubro de 1989, passa a vigorar com a seguinte redação: "Art. 5° O Banco Central do Brasil e as instituições financeiras a que se refere o § 2° deste artigo recolherão ao Tesouro Nacional, no último dia útil de cada decênio, remuneração incidente sobre os saldos diários dos depósitos da União existentes no decêndio imediatamente anterior. 1° Os saldos de que trata este artigo, a partir de 4 fevereiro de 1991, serão remunerados pela Taxa Referencial Diária (TRD), divulgada pelo Banco Central do Brasil. 2° No caso em que órgãos e entidades da União, em virtude de características operacionais específicas, não possam integrar o sistema de caixa único do Tesouro Nacional, os recursos destinados a atender suas necessidades poderão, excepcionalmente, ser depositados no Banco do Brasil S.A. ou na Caixa Econômica Federal." Art. 9° A partir de fevereiro de 1991, incidirá a TRD sobre os impostos, as multas, as demais obrigações fiscais e parafiscais, os débitos de qualquer natureza para com as Fazendas Nacional, Estadual, do Distrito Federal e dos Municípios, com o Fundo de Participação PIS-Pasep e com o Fundo de Investimento Social, e sobre os passivos de empresas concordatárias em falência e de instituições em regime de liquidação extrajudicial, intervenção e administração especial temporária. 1° (Vetado). 2° A base de cálculo do imposto de renda incidente sobre os rendimentos produzidos por títulos e aplicações de renda fixa será determinada mediante a exclusão, do rendimento bruto, da parcela correspondente à remuneração pela TRD, verificada no período da aplicação. 253 Art. 10. A partir da vigência da medida provisória que deu origem a esta lei, é vedado estipular, nos contratos referidos no art. 6°, cláusula de correção monetária com base em índice de preços, quando celebrados com prazo ou período de repactuação inferior a um ano. Art. 11. É admitida a utilização da Taxa Referencial (TR) como base de remuneração de contratos somente quando tenham prazo ou período de repactuação igual ou superior a três meses." (Redação da LEI Nº 8.660, DE 28 DE MAIO DE 1993) (Redação anterior) - Art. 11. Nas operações realizadas no mercado financeiro, é admitida a utilização da TR e da TRD como base para remuneração dos respectivos contratos, somente quando não tenham prazo ou período de repactuação inferior a noventa dias. Parágrafo único. O Banco Central do Brasil poderá alterar o prazo mencionado neste artigo, respeitados os contratos firmados. Art. 12. Em cada período de rendimento, os depósitos de poupança serão remunerados: I - como remuneração básica, por taxa correspondente à acumulação das TRD, no período transcorrido entre o dia do último crédito de rendimento, inclusive, e o dia do crédito de rendimento, exclusive; II - como adicional, por juros de meio por cento ao mês. 1° A remuneração será calculada sobre o menor saldo apresentado em cada período de rendimento. 2° Para os efeitos do disposto neste artigo, considera-se período de rendimento: I - para os depósitos de pessoas físicas e entidades sem fins lucrativos, o mês corrido, a partir da data de aniversário da conta de depósito de poupança; II - para os demais depósitos, o trimestre corrido a partir da data de aniversário da conta de depósito de poupança. 3° A data de aniversário da conta de depósito de poupança será o dia do mês de sua abertura, considerando-se a data de aniversário das contas abertas nos dias 29, 30 e 31 como o dia 1° do mês seguinte. 4° O crédito dos rendimentos será efetuado: I - mensalmente, na data de aniversário da conta, para os depósitos de pessoa física e de entidades sem fins lucrativos; e 254 II - trimestralmente, na data de aniversário no último mês do trimestre, para os demais depósitos. Art. 13. O disposto no artigo anterior aplica-se ao crédito de rendimento realizado a partir do mês de fevereiro de 1991, inclusive. Parágrafo único. Para o cálculo do rendimento a ser creditado no mês de fevereiro de 1991 - cadernetas mensais - e nos meses de fevereiro, março e abril - cadernetas trimestrais -, será utilizado um índice composto da variação do BTN Fiscal observado entre a data do último crédito de rendimentos, inclusive, e o dia 1° de fevereiro de 1991, e da TRD, a partir dessa data e até o dia do próximo crédito de rendimentos, exclusive. Art. 14. É o Banco Central do Brasil autorizado a instituir e disciplinar outras modalidades de cadernetas de poupança, para financiar programas habitacionais, observadas a periodicidade de crédito de rendimentos mínimos de um mês e a remuneração básica pela Taxa Referencial (TR) à respectiva data de aniversário." (Redação da LEI Nº 8.660, DE 28 DE MAIO DE 1993) (Redação anterior) - 14. É o Banco Central do Brasil autorizado a instituir e disciplinar novas modalidades de caderneta de poupança, observada periodicidade de crédito de rendimentos superior a trinta dias e remuneração básica pela TRD. Art. 15. Para os contratos já existentes, contendo cláusula expressa de utilização da Unidade Padrão de Capital (UPC) como fator de atualização, esta passa a ser atualizada mediante a aplicação do índice de remuneração básica dos depósitos de poupança com data de aniversário no dia 1°. Art. 16. O disposto no artigo anterior aplica-se à atualização da UPC a ser realizada em 1° de abril de 1991. Art. 17. A partir de fevereiro de 1991, os saldos das contas do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) passam a ser remunerados pela taxa aplicável à remuneração básica dos depósitos de poupança com data de aniversário no dia 1°, observada a periodicidade mensal para remuneração. Parágrafo único. As taxas de juros previstas na legislação em vigor do FGTS são mantidas e consideradas como adicionais à remuneração prevista neste artigo. Art. 18. Os saldos devedores e as prestações dos contratos celebrados até 24 de novembro de 1986 por entidades integrantes dos Sistemas Financeiros da Habitação e do Saneamento (SFH e SFS), com cláusula de atualização monetária pela variação da UPC, da OTN, do Salário Mínimo ou do Salário Mínimo de Referência, passam, a partir de fevereiro de 1991, a ser atualizados 255 pela taxa aplicável à remuneração básica dos Depósitos de Poupança com data de aniversário no dia 1°, mantidas a periodicidade e as taxas de juros estabelecidas contratualmente. 1° Os saldos devedores e as prestações dos contratos celebrados no período de 25 de novembro de 1986 a 31 de janeiro de 1991 pelas entidades mencionadas neste artigo, com recursos de depósitos de poupança, passam, a partir de fevereiro de 1991, a ser atualizados mensalmente pela taxa aplicável à remuneração básica dos Depósitos de Poupança com data de aniversário no dia de assinatura dos respectivos contratos. 2° Os contratos celebrados a partir da vigência da medida provisória que deu origem a esta lei pelas entidades mencionadas neste artigo, com recursos de Depósitos de Poupança, terão cláusula de atualização pela remuneração básica aplicável aos Depósitos de Poupança com data de aniversário no dia de assinatura dos respectivos contratos. 3° O disposto neste artigo aplica-se igualmente às operações ativas e passivas dos fundos vinculados ao SFH, ressalvado o disposto no parágrafo seguinte. 4° O disposto no § 1° deste artigo aplica-se às Letras Hipotecárias emitidas e aos depósitos efetuados a qualquer título, com recursos oriundos dos Depósitos de Poupança, pelas entidades mencionadas neste artigo, junto ao Banco Central do Brasil; e às obrigações do Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS). 5º As instituições financeiras detentoras de Carteira de Crédito Imobiliário ficam autorizadas a emitir letras hipotecárias, adotando-se, para efeito de remuneração básica, os índices abaixo relacionados, obedecendo o previsto na Lei nº 7.684, de 2 de dezembro de 1988: (Redação da MP Nº 2.181-45/24.08.2001) I - Índice de Remuneração da Poupança; (Redação da MP Nº 2.18145/24.08.2001) II - Índice Geral de Preços - Mercado (IGP-M), divulgado pela Fundação Getúlio Vargas; (Redação da MP Nº 2.181-45/24.08.2001) III - Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), divulgado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE; (Redação da MP Nº 2.181-45/24.08.2001) IV - Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI), divulgado pela Fundação Getúlio Vargas. (Redação da MP Nº 2.181-45/24.08.2001) § 6º As letras hipotecárias emitidas com base em índice de preços terão prazo mínimo de sessenta meses. (Redação da MP Nº 2.181-45/24.08.2001) 256 § 7º As instituições financeiras a que se refere o § 5º deverão determinar no ato da emissão da letra hipotecária um único índice de atualização, sendo vedada cláusula de opção." (NR) (Redação da MP Nº 2.181-45/24.08.2001) Art.18-A. Os contratos celebrados a partir de 13 setembro de 2006 pelas entidades integrantes dos Sistemas Financeiros da Habitação e do Saneamento (SFH e SFS), com recursos de Depósitos de Poupança, poderão ter cláusula de atualização pela remuneração básica aplicável aos Depósitos de Poupança com data de aniversário no dia de assinatura dos respectivos contratos, vedada a utilização de outros indexadores. (Redação da MP Nº 321 \ 12.09.2006) Parágrafo único. Na hipótese da celebração de contrato sem a cláusula de atualização mencionada no caput, ao valor máximo da taxa efetiva de juros de que trata o art. 25 da Lei no 8.692, de 28 de julho de 1993, poderá ser acrescido, no máximo, o percentual referente à remuneração básica aplicável aos Depósitos de Poupança, anualizado conforme metodologia a ser estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional.” (NR) (Redação da MP Nº 321 \ 12.09.2006) Art. 19. Os contratos celebrados a partir de 1° de fevereiro de 1991, relativos a operações realizadas por empresas construtoras e incorporadoras com adquirentes de imóveis residenciais e comerciais, poderão conter cláusula de remuneração pela taxa básica aplicável aos depósitos de poupança, desde que vinculados a financiamento junto a instituições integrantes do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE). Art. 20. O resultado apurado pela aplicação do critério de cálculo de atualização das operações de que trata o art. 18, lastreadas com recursos de Depósitos de Poupança e da atualização desses depósitos, na forma do disposto no parágrafo único do art. 13 desta lei, será incorporado ao Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS), nos termos das instruções a serem expedidas pelo Banco Central do Brasil. Art. 21. Os saldos dos contratos de financiamento celebrados até o dia 31 de janeiro de 1991, realizados com recursos dos depósitos de poupança rural, serão atualizados, no mês de fevereiro de 1991, por índice composto: I - da variação do BTN Fiscal observado entre a data de aniversário ou de assinatura do contrato no mês de janeiro de 1991 e o dia 1° de fevereiro de 1991; e II - da TRD acumulada entre 1° de fevereiro de 1991 e o dia do aniversário do contrato no mês de fevereiro de 1991. Parágrafo único. A partir do mês de março de 1991, os saldos dos contratos mencionados neste artigo serão atualizados pela remuneração básica aplicada 257 aos depósitos de poupança com data de aniversário no dia da assinatura dos respectivos contratos. Art. 22. Os contratos celebrados a partir de 1° de fevereiro de 1991 com recursos dos depósitos de poupança rural terão cláusulas de atualização pela remuneração básica aplicada aos depósitos de poupança com data de aniversário no dia da assinatura dos respectivos contratos. Art. 23. A partir de fevereiro de 1991, as prestações mensais dos contratos de financiamento firmados no âmbito do SFH, vinculados ao Plano de Equivalência Salarial por Categoria Profissional (PES/CP), serão reajustadas em função da data-base para a respectiva revisão salarial, mediante a aplicação: I - do índice derivado da taxa de remuneração básica aplicável aos depósitos de poupança livre no período, observado que: a) nos contratos firmados até 24 de novembro de 1986, o índice a ser utilizado corresponderá àquele aplicável às contas de poupança com data de aniversário no dia 1° de cada mês; b) nos contratos firmados a partir de 25 de novembro de 1986, o índice a ser utilizado corresponderá àquele aplicável às contas de depósitos de poupança com data de aniversário no dia da assinatura dos respectivos contratos; II - do índice correspondente ao percentual relativo ao ganho real de salário. 1° No caso de contratos enquadrados na modalidade plena do PES/CP, far-se-á, a partir do mês de fevereiro de 1991, o reajuste mensal das respectivas prestações, observado o disposto nas alíneas a e b do item I deste artigo. 2° Do percentual de reajuste de que trata o caput deste artigo será deduzido o percentual de reajuste a que se refere o parágrafo anterior. 3° É facultado ao agente financeiro aplicar, em substituição aos percentuais previstos no caput e § 1° deste artigo, o índice de aumento salarial da categoria profissional, quando conhecido. Art. 24. Aos mutuários com contratos vinculados ao PES/CP, firmados a qualquer tempo, é assegurado que, na aplicação de qualquer reajuste, a participação da prestação mensal na renda atual não excederá a relação prestação/renda verificada na data da assinatura do contrato de financiamento ou da opção pelo PES, desde que efetuem a devida comprovação perante o agente financeiro, podendo ser solicitada essa revisão a qualquer tempo. 258 1° Respeitada a relação de que trata este artigo, o valor de cada prestação mensal deverá corresponder, no mínimo, ao valor da parcela mensal de juros, calculado à taxa convencionada no contrato. 2º Não se aplica o disposto neste artigo às hipóteses de redução de renda por mudança de emprego ou por alteração na composição da renda familiar em decorrência da exclusão de um ou mais co-adquirentes, assegurado ao mutuário, nesses casos o direito à renegociação da dívida junto ao agente financeiro, visando a restabelecer o comprometimento inicial da renda. 3° Sempre que, em virtude da aplicação do PES/CP, a prestação for reajustada em percentagem inferior àquela referida no art. 23 desta lei, a diferença será incorporada em futuros reajustes de prestações, até o limite de que trata o caput deste artigo. Art. 25. Os recursos repassados ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), originários do Fundo PIS-Pasep e do Fundo de Amparo ao Trabalhador, e os saldos devedores dos financiamentos a que se destinam serão atualizados, de acordo com a periodicidade fixada contratualmente, pela TR, mantidas as taxas de juros contratadas. Parágrafo único. Para atualização, no mês de fevereiro de 1991, das obrigações e contratos de que trata este artigo, deverá ser utilizado o dia 1° como data. Art. 26. As operações de crédito rural contratadas junto às instituições financeiras, com recursos oriundos de depósitos à vista e com cláusula de atualização pelo Índice de Preços ao Consumidor (IPC), passam a ser atualizadas pela TR, observado o disposto no art. 6° desta lei. Art. 27. As obrigações contratuais e pecuniárias e os títulos de crédito, inclusive duplicatas, que tenham sido constituídos no período de 1° de setembro de 1990 a 31 de janeiro de 1991, sem cláusula de reajuste ou com cláusula de correção monetária prefixada, serão deflacionados, no dia do vencimento, dividindo-se o montante expresso em cruzeiros pelo fator de deflação a que se refere o § 1° deste artigo. 1° O fator de deflação será diário e calculado pela multiplicação cumulativa de 1,0116 para cada dia útil, a partir de 1° de fevereiro de 1991. 2° O Banco Central do Brasil poderá alterar e, a partir da data que fixar, tornar constante o fator de deflação de que trata este artigo, desde que, neste caso, seja observado o intervalo mínimo de trinta dias entre a divulgação da alteração e sua efetiva vigência. 259 3° Não estão sujeitas ao regime de deflação de que trata este artigo as obrigações tributárias, mensalidades escolares, mensalidades de clubes, associações e entidades sem fins lucrativos, despesas condominiais e os pagamentos em geral contra a prestação de serviços de telefonia, esgoto, fornecimento de água, energia elétrica e gás. Art. 28. As operações realizadas em mercados a termo e de opções das bolsas de valores e de mercadorias e de futuros sujeitam-se ao regime de deflação previsto no artigo anterior, nas seguintes condições: I - nos contratos a termo, o fator de deflação incidirá na data de vencimento, inclusive no caso de encerramento antecipado; II - nas operações com opções, o fator de deflação incidirá sobre o preço de exercício na data em que o direito for exercido. 1° O fator de deflação não incide sobre os preços das operações realizadas no mercado à vista ou disponível das bolsas de valores, de mercadorias e de futuros. 2° Os contratos futuros das bolsas de valores, de mercadorias e de futuros deverão ser liquidados, compulsoriamente, no primeiro dia de pregão após a publicação da medida provisória que deu origem a esta lei. Art. 29. As entidades de previdência privada, as companhias seguradoras e as de capitalização são equiparadas às instituições financeiras e às instituições do sistema de distribuição do mercado de valores mobiliários, com relação às suas operações realizadas nos mercados financeiro e de valores mobiliários respectivamente, inclusive em relação ao cumprimento das diretrizes do Conselho Monetário Nacional quanto às suas aplicações para efeito de fiscalização do Banco Central do Brasil e da Comissão de Valores Mobiliários e da aplicação de penalidades previstas nas Leis n°s 4.595, de 31 de dezembro de 1964, e 6.385, de 7 de dezembro de 1976. Parágrafo único. O disposto neste artigo não modifica o tratamento tributário definido em lei nem a competência específica, relativamente àquelas entidades, do Ministério do Trabalho e da Previdência Social e da Superintendência de Seguros Privados, que deverão ser comunicadas sobre quaisquer irregularidades constatadas pelo Banco Central do Brasil e pela Comissão de Valores Mobiliários. Art. 30. É criada a Nota do Tesouro Nacional (NTN), a ser emitida, respeitados a autorização concedida e os limites fixados na lei orçamentária, bem como em seus créditos adicionais, com a finalidade de prover o Tesouro Nacional de 260 recursos necessários para cobertura de seus déficits explicitados nos orçamentos ou para realização de operações de crédito por antecipação de receita. 1° Poderá ser autorizada a emissão da NTN com cláusula alternativa de opção, por ocasião do resgate, pela atualização cambial com base na variação da cotação do dólar norte-americano, divulgada pelo Banco Central do Brasil. 2° As Notas do Tesouro Nacional (NTN), a partir do seu vencimento, terão poder liberatório para pagamento de qualquer tributo federal, de responsabilidade de seus titulares ou de terceiros, pelo seu valor de resgate. Art. 31. Os bancos comerciais, os bancos de desenvolvimento, os bancos múltiplos e as caixas econômicas, com carteira comercial ou de investimento, poderão emitir Títulos de Desenvolvimento Econômico (TDE), para captação de recursos destinados ao financiamento de projetos no âmbito do Programa de Fomento à Competitividade Industrial (PFCI), aos quais terão acesso somente as empresas referidas no inciso II do art. 171 da Constituição Federal. 1° Os TDE terão as seguintes características: I - prazo: compatível com o cronograma financeiro dos projetos; II - remuneração: TR; III - colocação: por intermédio de instituições financeiras e do mercado de capitais, junto a investidores institucionais, pessoas físicas e jurídicas. 2° O Banco Central do Brasil expedirá as instruções necessárias ao cumprimento do disposto neste artigo. Art. 32. As receitas geradas pelos contratos de financiamentos de projetos aprovados no âmbito do PFCI não constituirão base de cálculo da contribuição para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep) e para o Programa de Integração Social (PIS}, bem como para o Finsocial. Art. 33. A partir de 1° de maio de 1991, são transferidas ao Banco Central do Brasil as atribuições previstas nos arts. 7° e 8° da Lei n° 5.768, de 20 de dezembro de 1971, no que se refere às operações conhecidas como consórcio, fundo mútuo e outras formas associativas assemelhadas, que objetivem a aquisição de bens de qualquer natureza. Parágrafo único. A fiscalização das operações mencionadas neste artigo, inclusive a aplicação de penalidades, será exercida pelo Banco Central do Brasil . Art. 34. (Vetado). 261 Art. 35. É, também, permitida a utilização dos saldos em cruzados novos, transferidos ao Banco Central do Brasil na forma do art. 9° da Lei n° 8.024, de 12 de abril de 1990, para fins de aquisição, exclusivamente por seus beneficiários, de unidades habitacionais de propriedade de fundações que integrem, por força da lei de sua criação, o Sistema Financeiro da Habitação (SFH), desde que tais recursos estivessem depositados, em 15 de março de 1990, em contas de poupança de titularidade do adquirente. Parágrafo único. As fundações mencionadas neste artigo aplica-se o disposto no art. 11 da Lei n° 8.024, de 12 de abril de 1990. Art. 36. No interesse da segurança do abastecimento de produtos agrícolas alimentares e da estabilização dos preços, é o Poder Executivo, por intermédio da Companhia Nacional de Abastecimento, autorizado a realizar operações de compra e venda de estoques de produtos básicos essenciais ao consumo da população, ao abrigo das disposições contidas no Decreto-Lei n° 2.300 de 21 de novembro de 1986, do art. 35 da Lei n° 8.171 de 17 de janeiro de 1991, do art. 3° da Lei n° 8.174, de 30 de janeiro de 1991, demais legislação pertinente a respectiva regulamentação . Art. 37. O Banco Central do Brasil enviará, trimestralmente, ao Senado Federal demonstrativos financeiros das aplicações em projetos com recursos do Programa de Fomento à Competitividade Industrial (PFCI). Art. 38. Os saldos das contas do Fundo de Participação PIS/Pasep e as obrigações emitidas pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento (FND) serão reajustados pela TR nas épocas estabelecidas na legislação pertinente. Art. 39. Os débitos trabalhistas de qualquer natureza, quando não satisfeitos pelo empregador nas épocas próprias assim definidas em lei, acordo ou convenção coletiva, sentença normativa ou cláusula contratual sofrerão juros de mora equivalentes à TRD acumulada no período compreendido entre a data de vencimento da obrigação e o seu efetivo pagamento. 1° Aos débitos trabalhistas constantes de condenação pela Justiça do Trabalho ou decorrentes dos acordos feitos em reclamatória trabalhista, quando não cumpridos nas condições homologadas ou constantes do termo de conciliação, serão acrescidos, nos juros de mora previstos no caput juros de um por cento ao mês, contados do ajuizamento da reclamatória e aplicados pro rata die , ainda que não explicitados na sentença ou no termo de conciliação. 2° Na hipótese de a data de vencimento das obrigações de que trata este artigo ser anterior a 1° de fevereiro de 1991, os juros de mora serão calculados pela composição entre a variação acumulada do BTN Fiscal no período 262 compreendido entre a data de vencimento da obrigação e 31 de janeiro de 1991, e a TRD acumulada entre 1° de fevereiro de 1991 e seu efetivo pagamento. Art. 40. O depósito recursal de que trata o art. 899 da Consolidação das Leis do Trabalho fica limitada a Cr$420.000,00 (quatrocentos e vinte mil cruzeiros), nos casos de interposição de recurso ordinário, e a Cr$840.000,00 (oitocentos e quarenta mil cruzeiros), em se tratando de recurso de revista, embargos infringentes e recursos extraordinários, sendo devido a cada novo recurso interposto no decorrer do processo. 1° Em se tratando de condenação imposta em ação rescisória, o depósito recursal terá como limite máximo, qualquer que seja o recurso, o valor de Cr$840.000,00 (oitocentos e quarenta mil cruzeiros). 2° Os valores previstos neste artigo poderão ser periodicamente alterados pelo Tribunal Superior do Trabalho. Art. 41. Os Fundos Constitucionais do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste, bem como os Fundos Regionais de Investimentos (Finam, Finor, Funres), serão atualizados segundo os critérios estabelecidos no art. 9°. Art. 42. O Poder Executivo enviará ao Congresso Nacional, até 31 de março de 1991, projeto de lei dispondo sobre a atualização das demonstrações financeiras das pessoas jurídicas de que trata a Lei n° 7.799, de 10 de julho de 1989, em virtude da extinção do BTN e do BTN Fiscal. Art. 43. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 44. Revogam-se o Decreto-Lei n° 75, de 21 de novembro de 1966, e demais disposições em contrário. Brasília, 1° de março de 1991; 170° da Independência e 103° da República. FERNANDO COLLOR Zélia M. Cardoso de Mello 263 LEI COMPLEMENTAR Nº 109, DE 29 DE MAIO DE 2001 Dispõe sobre o Regime de Previdência Complementar e dá outras providências. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei Complementar: CAPÍTULO I INTRODUÇÃO Art. 1º O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, é facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício, nos termos do caput do art. 202 da Constituição Federal, observado o disposto nesta Lei Complementar. Art. 2º O regime de previdência complementar é operado por entidades de previdência complementar que têm por objetivo principal instituir e executar planos de benefícios de caráter previdenciário, na forma desta Lei Complementar. Art. 3º A ação do Estado será exercida com o objetivo de: I - formular a política de previdência complementar; II - disciplinar, coordenar e supervisionar as atividades reguladas por esta Lei Complementar, compatibilizando-as com as políticas previdenciária e de desenvolvimento social e econômico-financeiro; III - determinar padrões mínimos de segurança econômico-financeira e atuarial, com fins específicos de preservar a liquidez, a solvência e o equilíbrio dos planos de benefícios, isoladamente, e de cada entidade de previdência complementar, no conjunto de suas atividades; IV - assegurar aos participantes e assistidos o pleno acesso às informações relativas à gestão de seus respectivos planos de benefícios; 264 V -fiscalizar as entidades de previdência complementar, suas operações e aplicar penalidades; e VI - proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios. Art. 4º As entidades de previdência complementar são classificadas em fechadas e abertas, conforme definido nesta Lei Complementar. Art. 5º A normatização, coordenação, supervisão, fiscalização e controle das atividades das entidades de previdência complementar serão realizados por órgão ou órgãos regulador e fiscalizador, conforme disposto em lei, observado o disposto no inciso VI do art. 84 da Constituição Federal. CAPÍTULO II DOS PLANOS DE BENEFÍCIOS Seção I Disposições Comuns Art. 6º As entidades de previdência complementar somente poderão instituir e operar planos de benefícios para os quais tenham autorização específica, segundo as normas aprovadas pelo órgão regulador e fiscalizador, conforme disposto nesta Lei Complementar. Art. 7º Os planos de benefícios atenderão a padrões mínimos fixados pelo órgão regulador e fiscalizador, com o objetivo de assegurar transparência, solvência, liquidez e equilíbrio econômico-financeiro e atuarial. Parágrafo único. O órgão regulador e fiscalizador normatizará planos de benefícios nas modalidades de benefício definido, contribuição definida e contribuição variável, bem como outras formas de planos de benefícios que reflitam a evolução técnica e possibilitem flexibilidade ao regime de previdência complementar. Art. 8º Para efeito desta Lei Complementar, considera-se: I - participante, a pessoa física que aderir aos planos de benefícios; e II - assistido, o participante ou seu beneficiário em gozo de benefício de prestação continuada. Art. 9° As entidades de previdência complementar constituirão reservas técnicas, provisões e fundos, de conformidade com os critérios e normas fixados pelo órgão regulador e fiscalizador. 265 § 1º A aplicação dos recursos correspondentes às reservas, às provisões e aos fundos de que trata o caput será feita conforme diretrizes estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional. § 2º É vedado o estabelecimento de aplicações compulsórias ou limites mínimos de aplicação. Art. 10. Deverão constar dos regulamentos dos planos de benefícios, das propostas de inscrição e dos certificados de participantes condições mínimas a serem fixadas pelo órgão regulador e fiscalizador. § 1º A todo pretendente será disponibilizado e a todo participante entregue, quando de sua inscrição no plano de benefícios: I - certificado onde estarão indicados os requisitos que regulam a admissão e a manutenção da qualidade de participante, bem como os requisitos de elegibilidade e forma de cálculo dos benefícios; II - cópia do regulamento atualizado do plano de benefícios e material explicativo que descreva, em linguagem simples e precisa, as características do plano; III - cópia do contrato, no caso de plano coletivo de que trata o inciso II do art. 26 desta Lei Complementar; e IV - outros documentos que vierem a ser especificados pelo órgão regulador e fiscalizador. § 2° Na divulgação dos planos de benefícios, não poderão ser incluídas informações diferentes das que figurem nos documentos referidos neste artigo. Art. 11. Para assegurar compromissos assumidos junto aos participantes e assistidos de planos de benefícios, as entidades de previdência complementar poderão contratar operações de resseguro, por iniciativa própria ou por determinação do órgão regulador e fiscalizador, observados o regulamento do respectivo plano e demais disposições legais e regulamentares. Parágrafo único. Fica facultada às entidades fechadas a garantia referida no caput por meio de fundo de solvência, a ser instituído na forma da lei. Seção II Dos Planos de Benefícios de Entidades Fechadas 266 Art. 12. Os planos de benefícios de entidades fechadas poderão ser instituídos por patrocinadores e instituidores, observado o disposto no art. 31 desta Lei Complementar. Art. 13. A formalização da condição de patrocinador ou instituidor de um plano de benefício dar-se-á mediante convênio de adesão a ser celebrado entre o patrocinador ou instituidor e a entidade fechada, em relação a cada plano de benefícios por esta administrado e executado, mediante prévia autorização do órgão regulador e fiscalizador, conforme regulamentação do Poder Executivo. § 1° Admitir-se-á solidariedade entre patrocinadores ou entre instituidores, com relação aos respectivos planos, desde que expressamente prevista no convênio de adesão. § 2° O órgão regulador e fiscalizador, dentre outros requisitos, estabelecerá o número mínimo de participantes admitido para cada modalidade de plano de benefício. Art. 14. Os planos de benefícios deverão prever os seguintes institutos, observadas as normas estabelecidas pelo órgão regulador e fiscalizador: I - benefício proporcional diferido, em razão da cessação do vínculo empregatício com o patrocinador ou associativo com o instituidor antes da aquisição do direito ao benefício pleno, a ser concedido quando cumpridos os requisitos de elegibilidade; II - portabilidade do direito acumulado pelo participante para outro plano; III - resgate da totalidade das contribuições vertidas ao plano pelo participante, descontadas as parcelas do custeio administrativo, na forma regulamentada; e IV - faculdade de o participante manter o valor de sua contribuição e a do patrocinador, no caso de perda parcial ou total da remuneração recebida, para assegurar a percepção dos benefícios nos níveis correspondentes àquela remuneração ou em outros definidos em normas regulamentares. § 1º Não será admitida a portabilidade na inexistência de cessação do vínculo empregatício do participante com o patrocinador. § 2º O órgão regulador e fiscalizador estabelecerá período de carência para o instituto de que trata o inciso II deste artigo. § 3º Na regulamentação do instituto previsto no inciso II do caput deste artigo, o órgão regulador e fiscalizador observará, entre outros requisitos específicos, os seguintes: 267 I - se o plano de benefícios foi instituído antes ou depois da publicação desta Lei Complementar; II - a modalidade do plano de benefícios. § 4° O instituto de que trata o inciso II deste artigo, quando efetuado para entidade aberta, somente será admitido quando a integralidade dos recursos financeiros correspondentes ao direito acumulado do participante for utilizada para a contratação de renda mensal vitalícia ou por prazo determinado, cujo prazo mínimo não poderá ser inferior ao período em que a respectiva reserva foi constituída, limitado ao mínimo de quinze anos, observadas as normas estabelecidas pelo órgão regulador e fiscalizador. Art. 15. Para efeito do disposto no inciso II do caput do artigo anterior, fica estabelecido que: I - a portabilidade não caracteriza resgate; e II - é vedado que os recursos financeiros correspondentes transitem pelos participantes dos planos de benefícios, sob qualquer forma. Parágrafo único. O direito acumulado corresponde às reservas constituídas pelo participante ou à reserva matemática, o que lhe for mais favorável. Art. 16. Os planos de benefícios devem ser, obrigatoriamente, oferecidos a todos os empregados dos patrocinadores ou associados dos instituidores. § 1º Para os efeitos desta Lei Complementar, são equiparáveis aos empregados e associados a que se refere o caput os gerentes, diretores, conselheiros ocupantes de cargo eletivo e outros dirigentes de patrocinadores e instituidores. § 2º É facultativa a adesão aos planos a que se refere o caput deste artigo. § 3º O disposto no caput deste artigo não se aplica aos planos em extinção, assim considerados aqueles aos quais o acesso de novos participantes esteja vedado. Art. 17. As alterações processadas nos regulamentos dos planos aplicam-se a todos os participantes das entidades fechadas, a partir de sua aprovação pelo órgão regulador e fiscalizador, observado o direito acumulado de cada participante. Parágrafo único. Ao participante que tenha cumprido os requisitos para obtenção dos benefícios previstos no plano é assegurada a aplicação das disposições regulamentares vigentes na data em que se tornou elegível a um benefício de aposentadoria. 268 Art. 18. O plano de custeio, com periodicidade mínima anual, estabelecerá o nível de contribuição necessário à constituição das reservas garantidoras de benefícios, fundos, provisões e à cobertura das demais despesas, em conformidade com os critérios fixados pelo órgão regulador e fiscalizador. § 1º O regime financeiro de capitalização é obrigatório para os benefícios de pagamento em prestações que sejam programadas e continuadas. § 2º Observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, o cálculo das reservas técnicas atenderá às peculiaridades de cada plano de benefícios e deverá estar expresso em nota técnica atuarial, de apresentação obrigatória, incluindo as hipóteses utilizadas, que deverão guardar relação com as características da massa e da atividade desenvolvida pelo patrocinador ou instituidor. § 3º As reservas técnicas, provisões e fundos de cada plano de benefícios e os exigíveis a qualquer título deverão atender permanentemente à cobertura integral dos compromissos assumidos pelo plano de benefícios, ressalvadas excepcionalidades definidas pelo órgão regulador e fiscalizador. Art. 19. As contribuições destinadas à constituição de reservas terão como finalidade prover o pagamento de benefícios de caráter previdenciário, observadas as especificidades previstas nesta Lei Complementar. Parágrafo único. As contribuições referidas no caput classificam-se em: I - normais, aquelas destinadas ao custeio dos benefícios previstos no respectivo plano; e II - extraordinárias, aquelas destinadas ao custeio de déficits, serviço passado e outras finalidades não incluídas na contribuição normal. Art. 20. O resultado superavitário dos planos de benefícios das entidades fechadas, ao final do exercício, satisfeitas as exigências regulamentares relativas aos mencionados planos, será destinado à constituição de reserva de contingência, para garantia de benefícios, até o limite de vinte e cinco por cento do valor das reservas matemáticas. § 1º Constituída a reserva de contingência, com os valores excedentes será constituída reserva especial para revisão do plano de benefícios. § 2º A não utilização da reserva especial por três exercícios consecutivos determinará a revisão obrigatória do plano de benefícios da entidade. 269 § 3º Se a revisão do plano de benefícios implicar redução de contribuições, deverá ser levada em consideração a proporção existente entre as contribuições dos patrocinadores e dos participantes, inclusive dos assistidos. Art. 21. O resultado deficitário nos planos ou nas entidades fechadas será equacionado por patrocinadores, participantes e assistidos, na proporção existente entre as suas contribuições, sem prejuízo de ação regressiva contra dirigentes ou terceiros que deram causa a dano ou prejuízo à entidade de previdência complementar. § 1º O equacionamento referido no caput poderá ser feito, dentre outras formas, por meio do aumento do valor das contribuições, instituição de contribuição adicional ou redução do valor dos benefícios a conceder, observadas as normas estabelecidas pelo órgão regulador e fiscalizador. § 2º A redução dos valores dos benefícios não se aplica aos assistidos, sendo cabível, nesse caso, a instituição de contribuição adicional para cobertura do acréscimo ocorrido em razão da revisão do plano. § 3º Na hipótese de retorno à entidade dos recursos equivalentes ao déficit previsto no caput deste artigo, em conseqüência de apuração de responsabilidade mediante ação judicial ou administrativa, os respectivos valores deverão ser aplicados necessariamente na redução proporcional das contribuições devidas ao plano ou em melhoria dos benefícios. Art. 22. Ao final de cada exercício, coincidente com o ano civil, as entidades fechadas deverão levantar as demonstrações contábeis e as avaliações atuariais de cada plano de benefícios, por pessoa jurídica ou profissional legalmente habilitado, devendo os resultados ser encaminhados ao órgão regulador e fiscalizador e divulgados aos participantes e aos assistidos. Art. 23. As entidades fechadas deverão manter atualizada sua contabilidade, de acordo com as instruções do órgão regulador e fiscalizador, consolidando a posição dos planos de benefícios que administram e executam, bem como submetendo suas contas a auditores independentes. Parágrafo único. Ao final de cada exercício serão elaboradas as demonstrações contábeis e atuariais consolidadas, sem prejuízo dos controles por plano de benefícios. Art. 24. A divulgação aos participantes, inclusive aos assistidos, das informações pertinentes aos planos de benefícios dar-se-á ao menos uma vez ao ano, na forma, nos prazos e pelos meios estabelecidos pelo órgão regulador e fiscalizador. 270 Parágrafo único. As informações requeridas formalmente pelo participante ou assistido, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal específico deverão ser atendidas pela entidade no prazo estabelecido pelo órgão regulador e fiscalizador. Art. 25. O órgão regulador e fiscalizador poderá autorizar a extinção de plano de benefícios ou a retirada de patrocínio, ficando os patrocinadores e instituidores obrigados ao cumprimento da totalidade dos compromissos assumidos com a entidade relativamente aos direitos dos participantes, assistidos e obrigações legais, até a data da retirada ou extinção do plano. Parágrafo único. Para atendimento do disposto no caput deste artigo, a situação de solvência econômico-financeira e atuarial da entidade deverá ser atestada por profissional devidamente habilitado, cujos relatórios serão encaminhados ao órgão regulador e fiscalizador. Secão III Dos Planos de Benefícios de Entidades Abertas Art. 26. Os planos de benefícios instituídos por entidades abertas poderão ser: I - individuais, quando acessíveis a quaisquer pessoas físicas; ou II - coletivos, quando tenham por objetivo garantir benefícios previdenciários a pessoas físicas vinculadas, direta ou indiretamente, a uma pessoa jurídica contratante. § 1º O plano coletivo poderá ser contratado por uma ou várias pessoas jurídicas. § 2º O vínculo indireto de que trata o inciso II deste artigo refere-se aos casos em que uma entidade representativa de pessoas jurídicas contrate plano previdenciário coletivo para grupos de pessoas físicas vinculadas a suas filiadas. § 3º Os grupos de pessoas de que trata o parágrafo anterior poderão ser constituídos por uma ou mais categorias específicas de empregados de um mesmo empregador, podendo abranger empresas coligadas, controladas ou subsidiárias, e por membros de associações legalmente constituídas, de caráter profissional ou classista, e seus cônjuges ou companheiros e dependentes econômicos. § 4º Para efeito do disposto no parágrafo anterior, são equiparáveis aos empregados e associados os diretores, conselheiros ocupantes de cargos eletivos e outros dirigentes ou gerentes da pessoa jurídica contratante. 271 § 5º A implantação de um plano coletivo será celebrada mediante contrato, na forma, nos critérios, nas condições e nos requisitos mínimos a serem estabelecidos pelo órgão regulador. § 6º É vedada à entidade aberta a contratação de plano coletivo com pessoa jurídica cujo objetivo principal seja estipular, em nome de terceiros, planos de benefícios coletivos. Art. 27. Observados os conceitos, a forma, as condições e os critérios fixados pelo órgão regulador, é assegurado aos participantes o direito à portabilidade, inclusive para plano de benefício de entidade fechada, e ao resgate de recursos das reservas técnicas, provisões e fundos, total ou parcialmente. § 1º A portabilidade não caracteriza resgate. § 2º É vedado, no caso de portabilidade: I - que os recursos financeiros transitem pelos participantes, sob qualquer forma; e II - a transferência de recursos entre participantes. Art. 28. Os ativos garantidores das reservas técnicas, das provisões e dos fundos serão vinculados à ordem do órgão fiscalizador, na forma a ser regulamentada, e poderão ter sua livre movimentação suspensa pelo referido órgão, a partir da qual não poderão ser alienados ou prometidos alienar sem sua prévia e expressa autorização, sendo nulas, de pleno direito, quaisquer operações realizadas com violação daquela suspensão. § 1º Sendo imóvel, o vínculo será averbado à margem do respectivo registro no Cartório de Registro Geral de Imóveis competente, mediante comunicação do órgão fiscalizador. § 2º Os ativos garantidores a que se refere o caput , bem como os direitos deles decorrentes, não poderão ser gravados, sob qualquer forma, sem prévia e expressa autorização do órgão fiscalizador, sendo nulos os gravames constituídos com infringência do disposto neste parágrafo. Art. 29. Compete ao órgão regulador, entre outras atribuições que lhe forem conferidas por lei: I - fixar padrões adequados de segurança atuarial e econômico-financeira, para preservação da liquidez e solvência dos planos de benefícios, isoladamente, e de cada entidade aberta, no conjunto de suas atividades; 272 II - estabelecer as condições em que o órgão fiscalizador pode determinar a suspensão da comercialização ou a transferência, entre entidades abertas, de planos de benefícios; e III - fixar condições que assegurem transparência, acesso a informações e fornecimento de dados relativos aos planos de benefícios, inclusive quanto à gestão dos respectivos recursos. Art. 30. É facultativa a utilização de corretores na venda dos planos de benefícios das entidades abertas. Parágrafo único. Aos corretores de planos de benefícios aplicam-se a legislação e a regulamentação da profissão de corretor de seguros. CAPÍTULO III DAS ENTIDADES FECHADAS DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR Art. 31. As entidades fechadas são aquelas acessíveis, na forma regulamentada pelo órgão regulador e fiscalizador, exclusivamente: I - aos empregados de uma empresa ou grupo de empresas e aos servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, entes denominados patrocinadores; e II - aos associados ou membros de pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial, denominadas instituidores. § 1º As entidades fechadas organizar-se-ão sob a forma de fundação ou sociedade civil, sem fins lucrativos. § 2º As entidades fechadas constituídas por instituidores referidos no inciso II do caput deste artigo deverão, cumulativamente: I - terceirizar a gestão dos recursos garantidores das reservas técnicas e provisões mediante a contratação de instituição especializada autorizada a funcionar pelo Banco Central do Brasil ou outro órgão competente; II - ofertar exclusivamente planos de benefícios na modalidade contribuição definida, na forma do parágrafo único do art. 7º desta Lei Complementar. § 3º Os responsáveis pela gestão dos recursos de que trata o inciso I do parágrafo anterior deverão manter segregados e totalmente isolados o seu patrimônio dos patrimônios do instituidor e da entidade fechada. 273 § 4º Na regulamentação de que trata o caput , o órgão regulador e fiscalizados estabelecerá o tempo mínimo de existência do instituidor e o seu número mínimo de associados. Art. 32. As entidades fechadas têm como objeto a administração e execução de planos de benefícios de natureza previdenciária. Parágrafo único. É vedada às entidades fechadas a prestação de quaisquer serviços que não estejam no âmbito de seu objeto, observado o disposto no art. 76. Art. 33. Dependerão de prévia e expressa autorização do órgão regulador e fiscalizador: I - a constituição e o funcionamento da entidade fechada, bem como a aplicação dos respectivos estatutos, dos regulamentos dos planos de benefícios e suas alterações; II - as operações de fusão, cisão, incorporação ou qualquer outra forma de reorganização societária, relativas às entidades fechadas; III - as retiradas de patrocinadores; e IV - as transferências de patrocínio, de grupo de participantes, de planos e de reservas entre entidades fechadas. § 1º Excetuado o disposto no inciso III deste artigo, é vedada a transferência para terceiros de participantes, de assistidos e de reservas constituídas para garantia de benefícios de risco atuarial programado, de acordo com normas estabelecidas pelo órgão regulador e fiscalizador. § 2º Para os assistidos de planos de benefícios na modalidade contribuição definida que mantiveram esta característica durante a fase de percepção de renda programada, o órgão regulador e fiscalizados poderá, em caráter excepcional, autorizar a transferência dos recursos garantidores dos benefícios para entidade de previdência complementar ou companhia seguradora autorizada a operar planos de previdência complementar, com o objetivo específico de contratar plano de renda vitalícia, observadas as normas aplicáveis. Art. 34. As entidades fechadas podem ser qualificadas da seguinte forma, além de outras que possam ser definidas pelo órgão regulador e fiscalizador: I - de acordo com os planos que administram: a) de plano comum, quando administram plano ou conjunto de planos acessíveis ao universo de participantes; e 274 b) com multiplano, quando administram plano ou conjunto de planos de benefícios para diversos grupos de participantes, com independência patrimonial; II - de acordo com seus patrocinadores ou instituidores: a) singulares, quando estiverem vinculadas a apenas um patrocinador ou instituidor; e b) multipatrocinadas, quando congregarem mais de um patrocinador ou instituidor. Art. 35. As entidades fechadas deverão manter estrutura mínima composta por conselho deliberativo, conselho fiscal e diretoria-executiva. § 1º O estatuto deverá prever representação dos participantes e assistidos nos conselhos deliberativo e fiscal, assegurado a eles no mínimo um terço das vagas. § 2º Na composição dos conselhos deliberativo e fiscal das entidades qualificadas como multipatrocinadas, deverá ser considerado o número de participantes vinculados a cada patrocinador ou instituidor, bem como o montante dos respectivos patrimônios. § 3º Os membros do conselho deliberativo ou do conselho fiscal deverão atender aos seguintes requisitos mínimos: I - comprovada experiência no exercício de atividades nas áreas financeira, administrativa, contábil, jurídica, de fiscalização ou de auditoria; II - não ter sofrido condenação criminal transitada em julgado; e III - não ter sofrido penalidade administrativa por infração da legislação da seguridade social ou como servidor público. § 4º Os membros da diretoria-executiva deverão ter formação de nível superior e atender aos requisitos do parágrafo anterior. § 5º Será informado ao órgão regulador e fiscalizador o responsável pelas aplicações dos recursos da entidade, escolhido entre os membros da diretoriaexecutiva. § 6º Os demais membros da diretoria-executiva responderão solidariamente com o dirigente indicado na forma do parágrafo anterior pelos danos e prejuízos causados à entidade para os quais tenham concorrido. 275 § 7º Sem prejuízo do disposto no § 1º do art. 31 desta Lei Complementar, os membros da diretoria-executiva e dos conselhos deliberativo e fiscal poderão ser remunerados pelas entidades fechadas, de acordo com a legislação aplicável. § 8º Em caráter excepcional, poderão ser ocupados até trinta por cento dos cargos da diretoria-executiva por membros sem formação de nível superior, sendo assegurada a possibilidade de participação neste órgão de pelo menos um membro, quando da aplicação do referido percentual resultar número inferior à unidade. CAPÍTULO IV DAS ENTIDADES ABERTAS DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR Art. 36. As entidades abertas são constituídas unicamente sob a forma de sociedades anônimas e têm por objetivo instituir e operar planos de benefícios de caráter previdenciário concedidos em forma de renda continuada ou pagamento único, acessíveis a quaisquer pessoas físicas. Parágrafo único. As sociedades seguradoras autorizadas a operar exclusivamente no ramo vida poderão ser autorizadas a operar os planos de benefícios a que se refere o caput , a elas se aplicando as disposições desta Lei Complementar. Art. 37. Compete ao órgão regulador entre outras atribuições que lhe forem conferidas por lei, estabelecer: I - os critérios para a investidura e posse em cargos e funções de órgãos estatutários de entidades abertas, observado que o pretendente não poderá ter sofrido condenação criminal transitada em julgado, penalidade administrativa por infração da legislação da seguridade social ou como servidor público; II - as normas gerais de contabilidade, auditoria, atuária e estatística a serem observadas pelas entidades abertas, inclusive quanto à padronização dos planos de contas, balanços gerais, balancetes e outras demonstrações financeiras, critérios sobre sua periodicidade, sobre a publicação desses documentos e sua remessa ao órgão fiscalizador; III - os índices de solvência e liquidez, bem como as relações patrimoniais a serem atendidas pelas entidades abertas, observado que seu patrimônio líquido não poderá ser inferior ao respectivo passivo não operacional; e IV - as condições que assegurem acesso a informações e fornecimento de dados relativos a quaisquer aspectos das atividades das entidades abertas. Art. 38. Dependerão de prévia e expressa aprovação do órgão fiscalizador: 276 I - a constituição e o funcionamento das entidades abertas, bem como as disposições de seus estatutos e as respectivas alterações; II - a comercialização dos planos de benefícios; III - os atos relativos à eleição e conseqüente posse de administradores e membros de conselhos estatutários; e IV - as operações relativas à transferência do controle acionário, fusão, cisão, incorporação ou qualquer outra forma de reorganização societária. Parágrafo único. O órgão regulador disciplinará o tratamento administrativo a ser emprestado ao exame dos assuntos constantes deste artigo. Art. 39. As entidades abertas deverão comunicar ao órgão fiscalizador, no prazo e na forma estabelecidos: I - os atos relativos às alterações estatutárias e à eleição de administradores e membros de conselhos estatutários; e II - o responsável pela aplicação dos recursos das reservas técnicas, provisões e fundos, escolhido dentre os membros da diretoria-executiva. Parágrafo único. Os demais membros da diretoria-executiva responderão solidariamente com o dirigente indicado na forma do inciso II deste artigo pelos danos e prejuízos causados à entidade para os quais tenham concorrido. Art. 40. As entidades abertas deverão levantar no último dia útil de cada mês e semestre, respectivamente, balancetes mensais e balanços gerais, com observância das regras e dos critérios estabelecidos pelo órgão regulador. Parágrafo único. As sociedades seguradoras autorizadas a operar planos de benefícios deverão apresentar nas demonstrações financeiras, de forma discriminada, as atividades previdenciárias e as de seguros, de acordo com critérios fixados pelo órgão regulador. CAPÍTULO V DA FISCALIZAÇÃO Art. 41. No desempenho das atividades de fiscalização das entidades de previdência complementar, os servidores do órgão regulador e fiscalizador terão livre acesso às respectivas entidades, delas podendo requisitar e apreender livros, notas técnicas e quaisquer documentos, caracterizando-se embaraço à fiscalização, sujeito às penalidades previstas em lei, qualquer dificuldade oposta à consecução desse objetivo. 277 § 1º O órgão regulador e fiscalizador das entidades fechadas poderá solicitar dos patrocinadores e instituidores informações relativas aos aspectos específicos que digam respeito aos compromissos assumidos frente aos respectivos planos de benefícios. § 2º A fiscalização a cargo do Estado não exime os patrocinadores e os instituidores da responsabilidade pela supervisão sistemática das atividades das suas respectivas entidades fechadas. § 3º As pessoas físicas ou jurídicas submetidas ao regime desta Lei Complementar ficam obrigadas a prestar quaisquer informações ou esclarecimentos solicitados pelo órgão regulador e fiscalizador. § 4º O disposto neste artigo aplica-se, sem prejuízo da competência das autoridades fiscais, relativamente ao pleno exercício das atividades de fiscalização tributária. Art. 42. O órgão regulador e fiscalizador poderá, em relação às entidades fechadas, nomear administrador especial, a expensas da entidade, com poderes próprios de intervenção e de liquidação extrajudicial, com o objetivo de sanear plano de benefícios específico, caso seja constatada na sua administração e execução alguma das hipóteses previstas nos arts. 44 e 48 desta Lei Complementar. Parágrafo único. O ato de nomeação de que trata o caput estabelecerá as condições, os limites e as atribuições do administrador especial. Art. 43. O órgão fiscalizador poderá, em relação às entidades abertas, desde que se verifique uma das condições previstas no art. 44 desta Lei Complementar, nomear, por prazo determinado, prorrogável a seu critério, e a expensas da respectiva entidade, um diretor-fiscal. § 1º O diretor-fiscal, sem poderes de gestão, terá suas atribuições estabelecidas pelo órgão regulador, cabendo ao órgão fiscalizador fixar sua remuneração. § 2º Se reconhecer a inviabilidade de recuperação da entidade aberta ou a ausência de qualquer condição para o seu funcionamento, o diretor-fiscal proporá ao órgão fiscalizador a decretação da intervenção ou da liquidação extrajudicial. § 3º O diretor-fiscal não está sujeito à indisponibilidade de bens, nem aos demais efeitos decorrentes da decretação da intervenção ou da liquidação extrajudicial da entidade aberta. CAPÍTULO VI 278 DA INTERVENÇÃO E DA LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL Seção I Da Intervenção Art. 44. Para resguardar os direitos dos participantes e assistidos poderá ser decretada a intervenção na entidade de previdência complementar, desde que se verifique, isolada ou cumulativamente: I - irregularidade ou insuficiência na constituição das reservas técnicas, provisões e fundos, ou na sua cobertura por ativos garantidores; II - aplicação dos recursos das reservas técnicas, provisões e fundos de forma inadequada ou em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos competentes; III - descumprimento de disposições estatutárias ou de obrigações previstas nos regulamentos dos planos de benefícios, convênios de adesão ou contratos dos planos coletivos de que trata o inciso II do art. 26 desta Lei Complementar; IV - situação econômico-financeira insuficiente à preservação da liquidez e solvência de cada um dos planos de benefícios e da entidade no conjunto de suas atividades; V - situação atuarial desequilibrada; VI - outras anormalidades definidas em regulamento. Art. 45. A intervenção será decretada pelo prazo necessário ao exame da situação da entidade e encaminhamento de plano destinado à sua recuperação. Parágrafo único. Dependerão de prévia e expressa autorização do órgão competente os atos do interventor que impliquem oneração ou disposição do patrimônio. Art. 46. A intervenção cessará quando aprovado o plano de recuperação da entidade pelo órgão competente ou se decretada a sua liquidação extrajudicial. SEÇÃO II Da Liquidação Extrajudicial 279 Art. 47. As entidades fechadas não poderão solicitar concordata e não estão sujeitas a falência, mas somente a liquidação extrajudicial. Art. 48. A liquidação extrajudicial será decretada quando reconhecida a inviabilidade de recuperação da entidade de previdência complementar ou pela ausência de condição para seu funcionamento. Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei Complementar, entende-se por ausência de condição para funcionamento de entidade de previdência complementar: I - (VETADO) II - (VETADO) III - o não atendimento às condições mínimas estabelecidas pelo órgão regulador e fiscalizador. Art. 49. A decretação da liquidação extrajudicial produzirá, de imediato, os seguintes efeitos: I - suspensão das ações e execuções iniciadas sobre direitos e interesses relativos ao acervo da entidade liquidanda; II - vencimento antecipado das obrigações da liquidanda; III - não incidência de penalidades contratuais contra entidade por obrigações vencidas em decorrência da decretação da liquidação extrajudicial; IV - não fluência de juros contra a liquidanda enquanto não integralmente pago o passivo; V - interrupção da prescrição em relação às obrigações da entidade em liquidação; VI - suspensão de multa e juros em relação às dívidas da entidade; VII - inexigibilidade de penas pecuniárias por infrações de natureza administrativa; VIII - interrupção do pagamento à liquidanda das contribuições dos participantes e dos patrocinadores, relativas aos planos de benefícios. § 1º As faculdades previstas nos incisos deste artigo aplicam-se, no caso das entidades abertas de previdência complementar, exclusivamente, em relação às suas atividades de natureza previdenciária. 280 § 2º O disposto neste artigo não se aplica às ações e aos débitos de natureza tributária. Art. 50. O liquidante organizará o quadro geral de credores, realizará o ativo e liquidará o passivo. § 1º Os participantes, inclusive os assistidos, dos planos de benefícios ficam dispensados de se habilitarem a seus respectivos créditos, estejam estes sendo recebidos ou não. § 2º Os participantes, inclusive os assistidos, dos planos de benefícios terão privilégio especial sobre os ativos garantidores das reservas técnicas e, caso estes não sejam suficientes para a cobertura dos direitos respectivos, privilégio geral sobre as demais partes não vinculadas ao ativo. § 3º Os participantes que já estiverem recebendo benefícios, ou que já tiverem adquirido este direito antes de decretada a liquidação extrajudicial, terão preferência sobre os demais participantes. § 4º Os créditos referidos nos parágrafos anteriores deste artigo não têm preferência sobre os créditos de natureza trabalhista ou tributária. Art. 51. Serão obrigatoriamente levantados, na data da decretação da liquidação extrajudicial de entidade de previdência complementar, o balanço geral de liquidação e as demonstrações contábeis e atuariais necessárias à determinação do valor das reservas individuais. Art. 52. A liquidação extrajudicial poderá, a qualquer tempo, ser levantada, desde que constatados fatos supervenientes que viabilizem a recuperação da entidade de previdência complementar. Art. 53. A liquidação extrajudicial das entidades fechadas encerrar-se-á com a aprovação, pelo órgão regulador e fiscalizador, das contas finais do liquidante e com a baixa nos devidos registros. Parágrafo único. Comprovada pelo liquidante a inexistência de ativos para satisfazer a possíveis créditos reclamados contra a entidade, deverá tal situação ser comunicada ao juízo competente efetivados os devidos registros, para o encerramento do processo de liquidação. Seção III Disposições Especiais Art. 54. O interventor terá amplos poderes de administração e representação e o liquidante plenos poderes de administração, representação e liquidação. 281 Art. 55. Compete ao órgão fiscalizador decretar, aprovar e rever os atos de que tratam os arts. 45, 46 e 48 desta Lei Complementar, bem como nomear, por intermédio do seu dirigente máximo, o interventor ou o liquidante. Art. 56. A intervenção e a liquidação extrajudicial determinam a perda do mandato dos administradores e membros dos conselhos estatutários das entidades, sejam titulares ou suplentes. Art. 57. Os créditos das entidades de previdência complementar, em caso de liquidação ou falência de patrocinadores, terão privilégio especial sobre a massa, respeitado o privilégio dos créditos trabalhistas e tributários. Parágrafo único. Os administradores dos respectivos patrocinadores serão responsabilizados pelos danos ou prejuízos causados às entidades de previdência complementar, especialmente pela falta de aporte das contribuições a que estavam obrigados, observado o disposto no parágrafo único do art. 63 desta Lei Complementar. Art. 58. No caso de liquidação extrajudicial de entidade fechada motivada pela falta de aporte de contribuições de patrocinadores ou pelo não recolhimento de contribuições de participantes, os administradores daqueles também serão responsabilizados pelos danos ou prejuízos causados. Art. 59. Os administradores, controladores e membros de conselhos estatutários das entidades de previdência complementar sob intervenção ou em liquidação extrajudicial ficarão com todos os seus bens indisponíveis, não podendo, por qualquer forma, direta ou indireta, aliená-los ou onerá-los, até a apuração e liquidação final de suas responsabilidades. § 1º A indisponibilidade prevista neste artigo decorre do ato que decretar a intervenção ou liquidação extrajudicial e atinge todos aqueles que tenham estado no exercício das funções nos doze meses anteriores. § 2º A indisponibilidade poderá ser estendida aos bens de pessoas que, nos últimos doze meses, os tenham adquirido, a qualquer título, das pessoas referidas no caput e no parágrafo anterior, desde que haja seguros elementos de convicção de que se trata de simulada transferência com o fim de evitar os efeitos desta Lei Complementar. § 3º Não se incluem nas disposições deste artigo os bens considerados inalienáveis ou impenhoráveis pela legislação em vigor. § 4º Não são também atingidos pela indisponibilidade os bens objeto de contrato de alienação, de promessas de compra e venda e de cessão de direitos, desde que os respectivos instrumentos tenham sido levados ao competente registro público 282 até doze meses antes da data de decretação da intervenção ou liquidação extrajudicial. § 5º Não se aplica a indisponibilidade de bens das pessoas referidas no caput deste artigo no caso de liquidação extrajudicial de entidades fechadas que deixarem de ter condições para funcionar por motivos totalmente desvinculados do exercício das suas atribuições, situação esta que poderá ser revista a qualquer momento, pelo órgão regulador e fiscalizador, desde que constatada a existência de irregularidades ou indícios de crimes por elas praticados. Art. 60. O interventor ou o liquidante comunicará a indisponibilidade de bens aos órgãos competentes para os devidos registros e publicará edital para conhecimento de terceiros. Parágrafo único. A autoridade que receber a comunicação ficará, relativamente a esses bens, impedida de: I - fazer transcrições, inscrições ou averbações de documentos públicos ou particulares; II - arquivar atos ou contratos que importem em transferência de cotas sociais, ações ou partes beneficiárias; III - realizar ou registrar operações e títulos de qualquer natureza; e IV - processar a transferência de propriedade de veículos automotores, aeronaves e embarcações. Art. 61. A apuração de responsabilidades específicas referida no caput do art. 59 desta Lei Complementar será feita mediante inquérito a ser instaurado pelo órgão regulador e fiscalizador, sem prejuízo do disposto nos arts. 63 a 65 desta Lei Complementar. § 1º Se o inquérito concluir pela inexistência de prejuízo, será arquivado no órgão fiscalizador. § 2º Concluindo o inquérito pela existência de prejuízo, será ele, com o respectivo relatório, remetido pelo órgão regulador e fiscalizador ao Ministério Público, observados os seguintes procedimentos: I - o interventor ou o liquidante, de ofício ou a requerimento de qualquer interessado que não tenha sido indiciado no inquérito, após aprovação do respectivo relatório pelo órgão fiscalizador, determinará o levantamento da indisponibilidade de que trata o art. 59 desta Lei Complementar; 283 II - será mantida a indisponibilidade com relação às pessoas indiciadas no inquérito, após aprovação do respectivo relatório pelo órgão fiscalizador. Art. 62. Aplicam-se à intervenção e à liquidação das entidades de previdência complementar, no que couber, os dispositivos da legislação sobre a intervenção e liquidação extrajudicial das instituições financeiras, cabendo ao órgão regulador e fiscalizador as funções atribuídas ao Banco Central do Brasil. CAPÍTULO VII DO REGIME DISCIPLINAR Art. 63. Os administradores de entidade, os procuradores com poderes de gestão, os membros de conselhos estatutários, o interventor e o liquidante responderão civilmente pelos danos ou prejuízos que causarem, por ação ou omissão, às entidades de previdência complementar. Parágrafo único. São também responsáveis, na forma do caput , os administradores dos patrocinadores ou instituidores, os atuários, os auditores independentes, os avaliadores de gestão e outros profissionais que prestem serviços técnicos à entidade, diretamente ou por intermédio de pessoa jurídica contratada. Art. 64. O órgão fiscalizador competente, o Banco Central do Brasil, a Comissão de Valores Mobiliários ou a Secretaria da Receita Federal, constatando a existência de práticas irregulares ou indícios de crimes em entidades de previdência complementar, noticiará ao Ministério Público, enviando-lhe os documentos comprobatórios. Parágrafo único. O sigilo de operações não poderá ser invocado como óbice à troca de informações entre os órgãos mencionados no caput , nem ao fornecimento de informações requisitadas pelo Ministério Público. Art. 65. A infração de qualquer disposição desta Lei Complementar ou de seu regulamento, para a qual não haja penalidade expressamente cominada, sujeita a pessoa física ou jurídica responsável, conforme o caso e a gravidade da infração, às seguintes penalidades administrativas, observado o disposto em regulamento: I - advertência; II -suspensão do exercício de atividades em entidades de previdência complementar pelo prazo de até cento e oitenta dias; III - inabilitação, pelo prazo de dois a dez anos, para o exercício de cargo ou função em entidades de previdência complementar, sociedades seguradoras, instituições financeiras e no serviço público; e 284 IV - multa de dois mil reais a um milhão de reais, devendo esses valores, a partir da publicação desta Lei Complementar, ser reajustados de forma a preservar, em caráter permanente, seus valores reais. § 1º A penalidade prevista no inciso IV será imputada ao agente responsável, respondendo solidariamente a entidade de previdência complementar, assegurado o direito de regresso, e poderá ser aplicada cumulativamente com as constantes dos incisos I, II ou III deste artigo. § 2º Das decisões do órgão fiscalizador caberá recurso, no prazo de quinze dias, com efeito suspensivo, ao órgão competente. § 3º O recurso a que se refere o parágrafo anterior, na hipótese do inciso IV deste artigo , somente será conhecido se for comprovado pelo requerente o pagamento antecipado, em favor do órgão fiscalizador, de trinta por cento do valor da multa aplicada. § 4º Em caso de reincidência, a multa será aplicada em dobro. Art. 66. As infrações serão apuradas mediante processo administrativo, na forma do regulamento, aplicando-se, no que couber, o disposto na Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999. Art. 67. O exercício de atividade de previdência complementar por qualquer pessoa, física ou jurídica, sem a autorização devida do órgão competente, inclusive a comercialização de planos de benefícios, bem como a captação ou a administração de recursos de terceiros com o objetivo de, direta ou indiretamente, adquirir ou conceder benefícios previdenciários sob qualquer forma, submete o responsável à penalidade de inabilitação pelo prazo de dois a dez anos para o exercício de cargo ou função em entidade de previdência complementar, sociedades seguradoras, instituições financeiras e no serviço público, além de multa aplicável de acordo com o disposto no inciso IV do art. 65 desta Lei Complementar, bem como noticiar ao Ministério Público. CAPÍTULO VIII DISPOSIÇÕES GERAIS Art. 68. As contribuições do empregador, os benefícios e as condições contratuais previstos nos estatutos, regulamentos e planos de benefícios das entidades de previdência complementar não integram o contrato de trabalho dos participantes, assim como, à exceção dos benefícios concedidos, não integram a remuneração dos participantes. 285 § 1º Os benefícios serão considerados direito adquirido do participante quando implementadas todas as condições estabelecidas para elegibilidade consignadas no regulamento do respectivo plano. § 2º A concessão de benefício pela previdência complementar não depende da concessão de benefício pelo regime geral de previdência social. Art. 69. As contribuições vertidas para as entidades de previdência complementar, destinadas ao custeio dos planos de benefícios de natureza previdenciária, são dedutíveis para fins de incidência de imposto sobre a renda, nos limites e nas condições fixadas em lei. § 1º Sobre as contribuições de que trata o caput não incidem tributação e contribuições de qualquer natureza. § 2º Sobre a portabilidade de recursos de reservas técnicas, fundos e provisões entre planos de benefícios de entidades de previdência complementar, titulados pelo mesmo participante, não incidem tributação e contribuições de qualquer natureza. Art. 70. (VETADO) Art. 71. É vedado às entidades de previdência complementar realizar quaisquer operações comerciais e financeiras: I - com seus administradores, membros dos conselhos estatutários e respectivos cônjuges ou companheiros, e com seus parentes até o segundo grau; II - com empresa de que participem as pessoas a que se refere o inciso anterior, exceto no caso de participação de até cinco por cento como acionista de empresa de capital aberto; e III - tendo como contraparte, mesmo que indiretamente, pessoas físicas e jurídicas a elas ligadas, na forma definida pelo órgão regulador. Parágrafo único. A vedação deste artigo não se aplica ao patrocinador, aos participantes e aos assistidos, que, nessa condição, realizarem operações com a entidade de previdência complementar. Art. 72. Compete privativamente ao órgão regulador e fiscalizador das entidades fechadas zelar pelas sociedades civis e fundações, como definido no art. 31 desta Lei Complementar, não se aplicando a estas o disposto nos arts. 26 e 30 do Código Civil e 1.200 a 1.204 do Código de Processo Civil e demais disposições em contrário. 286 Art. 73. As entidades abertas serão reguladas também, no que couber, pela legislação aplicável às sociedades seguradoras. Art. 74. Até que seja publicada a lei de que trata o art. 5º desta Lei Complementar, as funções do órgão regulador e do órgão fiscalizador serão exercidas pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, por intermédio, respectivamente, do Conselho de Gestão da Previdência Complementar (CGPC) e da Secretaria de Previdência Complementar (SPC), relativamente às entidades fechadas, e pelo Ministério da Fazenda, por intermédio do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) e da Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), em relação, respectivamente, à regulação e fiscalização das entidades abertas. Art. 75. Sem prejuízo do benefício, prescreve em cinco anos o direito às prestações não pagas nem reclamadas na época própria, resguardados os direitos dos menores dependentes, dos incapazes ou dos ausentes, na forma do Código Civil. Art. 76. As entidades fechadas que, na data da publicação desta Lei Complementar, prestarem a seus participantes e assistidos serviços assistenciais à saúde poderão continuar a fazê-lo, desde que seja estabelecido um custeio específico para os planos assistenciais e que a sua contabilização e o seu patrimônio sejam mantidos em separado em relação ao plano previdenciário. § 1º Os programas assistenciais de natureza financeira deverão ser extintos a partir da data de publicação desta Lei Complementar, permanecendo em vigência, até o seu termo, apenas os compromissos já firmados. § 2º Consideram-se programas assistenciais de natureza financeira, para os efeitos desta Lei Complementar, aqueles em que o rendimento situa-se abaixo da taxa mínima atuarial do respectivo plano de benefícios. Art. 77. As entidades abertas sem fins lucrativos e as sociedades seguradoras autorizadas a funcionar em conformidade com a Lei nº 6.435, de 15 de julho de 1977, terão o prazo de dois anos para se adaptar ao disposto nesta Lei Complementar. § 1º No caso das entidades abertas sem fins lucrativos já autorizadas a funcionar, é permitida a manutenção de sua organização jurídica como sociedade civil, sendo-lhes vedado participar, direta ou indiretamente, de pessoas jurídicas, exceto quando tiverem participação acionária: I - minoritária, em sociedades anônimas de capital aberto, na forma regulamentada pelo Conselho Monetário Nacional, para aplicação de recursos de reservas técnicas, fundos e provisões; 287 II - em sociedade seguradora e/ou de capitalização. § 2º É vedado à sociedade seguradora e/ou de capitalização referida no inciso II do parágrafo anterior participar majoritariamente de pessoas jurídicas, ressalvadas as empresas de suporte ao seu funcionamento e as sociedades anônimas de capital aberto, nas condições previstas no inciso I do parágrafo anterior. § 3º A entidade aberta sem fins lucrativos e a sociedade seguradora e/ou de capitalização por ela controlada devem adaptar-se às condições estabelecidas nos §§ 1º e 2º, no mesmo prazo previsto no caput deste artigo. § 4º As reservas técnicas de planos já operados por entidades abertas de previdência privada sem fins lucrativos, anteriormente à data de publicação da Lei nº 6.435, de 15 de julho de 1977, poderão permanecer garantidas por ativos de propriedade da entidade, existentes à época, dentro de programa gradual de ajuste às normas estabelecidas pelo órgão regulador sobre a matéria, a ser submetido pela entidade ao órgão fiscalizador no prazo máximo de doze meses a contar da data de publicação desta Lei Complementar. § 5º O prazo máximo para o término para o programa gradual de ajuste a que se refere o parágrafo anterior não poderá superar cento e vinte meses, contados da data de aprovação do respectivo programa pelo órgão fiscalizador. § 6º As entidades abertas sem fins lucrativos que, na data de publicação desta Lei Complementar, já vinham mantendo programas de assistência filantrópica, prévia e expressamente autorizados, poderão, para efeito de cobrança, adicionar às contribuições de seus planos de benefícios valor destinado àqueles programas, observadas as normas estabelecidas pelo órgão regulador. § 7º A aplicabilidade do disposto no parágrafo anterior fica sujeita, sob pena de cancelamento da autorização previamente concedida, à prestação anual de contas dos programas filantrópicos e à aprovação pelo órgão competente. § 8º O descumprimento de qualquer das obrigações contidas neste artigo sujeita os administradores das entidades abertas sem fins lucrativos e das sociedades seguradora e/ou de capitalização por elas controladas ao Regime Disciplinar previsto nesta Lei Complementar, sem prejuízo da responsabilidade civil por danos ou prejuízos causados, por ação ou omissão, a entidade. Art. 78. Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação. Art. 79. Revogam-se as Leis nº 6.435, de 15 de julho de 1977, e nº 6.462, de 9 de novembro de 1977. 288 Brasília, 29 de maio de 2001; 180º da Independência e 113º da República. FERNANDO HENRIQUE CARDOSO José Gregori Pedro Malan Roberto Brant 289 LEI Nº 10.190, DE 14 DE FEVEREIRO DE 2001. Altera dispositivos do decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, da Lei n º 6.435, de 15 de julho de 1977, da Lei nº 5.627, de 1º de dezembro de 1970, e dá outras providências. Faço saber que o Presidente da República adotou a Medida Provisória nº 2.06931, de 2001, que o Congresso Nacional aprovou, e eu, Antonio Carlos Magalhães, Presidente, para os efeitos do disposto no parágrafo único do art. 62 da Constituição Federal, promulgo a seguinte Lei: Art. 1º Os arts. 20, 26, 84 e 90 do decreto-lei n º 73, de 21 de novembro de 1966, passam a vigorar com as seguintes alterações: "Art. 20............................................................................... .................................... ................................................................................ ................................................ Parágrafo único. Não se aplica à União a obrigatoriedade estatuída na alínea "h" deste artigo." (NR) "Art. 26. As sociedades seguradoras não poderão requerer concordata e não estão sujeitas à falência, salvo, neste último caso, se decretada a liquidação extrajudicial, o ativo não for suficiente para o pagamento de pelo menos a metade dos credores quirografários, ou quando houver fundados indícios da ocorrência de crime falimentar." (NR) "Art. 84............................................................................. ...................................... § 1º 0 patrimônio liquido das sociedades seguradoras não poderá ser inferior ao valor do passivo não operacional, nem ao valor mínimo decorrente do cálculo da margem de solvência, efetuado com base na regulamentação baixada pelo CNSP. § 2º 0 passivo não operacional será constituído pelo valor total das obrigações não cobertas por bens garantidores. § 3º As sociedades seguradoras deverão adequar-se ao disposto neste artigo no prazo de um ano, prorrogável por igual período e caso a caso, por decisão do CNSP." (NR) 290 "Art. 90. ............................................................................. .................................... Parágrafo único. Aplica-se à intervenção a que se refere este artigo o disposto nos arts. 55 a 62 da Lei nº 6.435, de 15 de julho de 1977." (NR) Art 2º Fica restabelecido o art. 33 do decreto-lei nº 73, de 1966, com a seguinte redação: "Art. 33. 0 CNSP será integrado pelos seguintes membros: I - Ministro de Estado da Fazenda, ou seu representante; II - representante do Ministério da Justiça; III - representante do Ministério da Previdência e Assistência Social; IV - Superintendente da Superintendência de Seguros Privados -SUSEP; V - representante do Banco Central do Brasil; VI - representante da Comissão de Valores Mobiliários - CVM. § 1º 0 CNSP será presidido pelo Ministro de Estado da Fazenda e, na sua ausência, pelo Superintendente da SUSEP. § 2º 0 CNSP terá seu funcionamento regulado em regimento interno" (NR) Art. 3º Às sociedades seguradoras de capitalização e às entidades de previdência privada aberta aplica-se o disposto nos arts. 2º e 15 do decreto-lei nº 2.321, de 25 de fevereiro de 1987, 1º a 8º da Lei nº 9.447, de 14 de março de 1997 e, no que couber, nos arts. 3º a 49 da Lei nº 6.024, de 13 de março de 1974. Parágrafo único. As funções atribuídas ao Banco Central do Brasil pelas Leis referidas neste artigo serão exercidas pela Superintendência de Seguros Privados - SUSEP, quando se tratar de sociedades seguradoras, de capitalização ou de entidades de previdência privada aberta. Art. 4º Aplica-se às entidades de previdência privada aberta o disposto no art. 84 do decreto-lei nº 73, de 1966. Art. 5º O art. 56 da Lei nº 6.435, de 15 de julho de 1977, passa a vigorar com a seguinte redação: "Art. 56. ................................................................................ ................................. ................................................................................ ................................................ 291 § 3º A decretação da intervenção não afetará o funcionamento da entidade nem o curso regular de seus negócios. § 4º Na hipótese de indicação de pessoa jurídica para gerir a sociedade em regime de intervenção, esta poderá, em igualdade de condições com outros interessados, participar de processo de aquisição do controle acionário da sociedade interventiva." (NR) Art. 6º O art. 9º da Lei nº 5.627, de 1º de dezembro de 1970, passa a vigorar com a seguinte redação: "Art. 9º ................................................................................ ................................... Parágrafo único. Excepcionalmente, e em prazo não superior a um ano, prorrogável por uma única vez e por igual prazo, e a critério da SUSEP, poderá ser autorizada a transferência de controle acionário de sociedades de seguros às pessoas jurídicas indicadas neste artigo." (NR) Art. 7º Ficam convalidados os atos praticados com base na Medida provisória nº 2.069-30, de 27 de dezembro de 2000. Art. 8º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação. Art 9º Fica revogado o art. 3º da Lei nº 7.682, de 2 de dezembro de 1988. Congresso Nacional, em 14 de fevereiro de 2001; 180º da Independência e 113º da República. SENADOR ANTONIO CARLOS MAGALHÃES Presidente