INDENIZAÇÃO PELA TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE: A JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Felipe Cunha De Almeida INTRODUÇÃO O estudo da responsabilidade civil é tema que há muito nos toca, bem como é objeto de estudo. Os rumos acerca da responsabilidade, as teorias e a sua aplicação nos corredores forenses, entendemos assim, merecem estudos aprofundados, haja vista a importância que o tema merece, bem como pela relevância de suas consequências na sociedade. E a teoria da perda de uma chance, aqui abordada, é de suma importância, e não só para os operadores do Direito, sejam quaisquer os níveis e esferas que atuem, mas igualmente, também, para as partes envolvidas em um processo judicial, os advogados, profissionais que eventualmente venham a sofrer determinada condenação, os representantes do Ministério Público e os Magistrados, estes que irão ter de decidir a demanda. Como veremos, a indenização concedida, nos casos de responsabilidade civil com base na teoria da perda de uma chance, revela-se diversa das demais. Observamos que, por já ter sido objeto de nosso estudo quanto aos casos de indenização por erro médico, não abordaremos essa questão específica1. O assunto pode ser resumido a partir dos acórdãos em comento, inicialmente, com o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, passando pelo entendimento de Cortes estaduais a respeito da matéria, sempre em relação com o entendimento da doutrina. 1 Para tanto, remetemos o leitor para o seguinte artigo: ALMEIDA, Felipe Cunha de. A teoria da perda se uma chance e a responsabilidade civil do profissional da saúde sob a ótica do Superior Tribunal de Justiça: que tipo de indenização? Revista Jurídica, Porto Alegre, 1953, v. 427, 2013, p. 73-88. 1 O objeto desde artigo é analisar a teoria da perda de uma chance frente a diversos casos, como nas atuações de advogados, licitação, concursos públicos, instituição de ensino, entre os demais que também serão abordados, para fins de responsabilidade civil e consequente indenização. O esclarecimento da natureza da indenização frente a tal teoria também terá lugar. 1 A TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE Como um dos objetivos deste artigo é a demonstração do entendimento do Superior Tribunal de Justiça acerca da teoria da perda de uma chance, iniciamos os estudos noticiando matéria veiculada no site do Superior Tribunal de Justiça. Tal instituto, como podemos observar pelo o que foi tratado pela Corte em notícia aqui retratada, tem origem na França, sendo comum também em países como Estados Unidos e Itália. Esta teoria da perda da chance (perte d'une chance), adotada em matéria de responsabilidade civil, vem despertando interesse no Direito brasileiro embora não seja aplicada com frequência nos tribunais do País. A teoria enuncia que o autor do dano é responsabilizado quando priva alguém de obter uma vantagem ou impede a pessoa de evitar prejuízo. Nesse caso, há uma peculiaridade em relação às outras hipóteses de perdas e danos, pois não se trata de prejuízo direto à vítima, mas de uma probabilidade. Não é rara a dificuldade de se distinguir o dano meramente hipotético da chance real de dano. Quanto a esse ponto, a Ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), avalia que "a adoção da teoria da perda da chance exige que o Poder Judiciário bem saiba diferenciar o 'improvável' do 'quase certo', bem como a 'probabilidade de perda' da 'chance de lucro', para atribuir a tais fatos as consequências adequadas". O Juiz aposentado do Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo Sílvio de Salvo Venosa, autor de vários livros sobre direito civil, aponta que "há forte corrente doutrinária que coloca a perda da chance como um terceiro gênero de indenização, ao lado dos lucros cessantes e dos danos emergentes, pois o fenômeno não se amolda nem a um nem a outro segmento"(Disponível em: <http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=99 879>. Acesso em: 15 jan. 2013). Sérgio Cavalieri Filho, abordando o instituto em questão, ensina que a teoria da perda de uma chance guarda certa relação com os lucros cessantes, uma vez 2 que a doutrina francesa utiliza-a nos casos em que o ato ilícito tira da vítima a oportunidade dela de obter uma situação futura melhor. Ressalta, ainda, que não se deve entender para a chance como a perda de resultado certo, porque não há a certeza da realização do evento. Portanto, a chance deve ser analisada como a perda da possibilidade de se alcançar resultado ou de se evitar um dano. Importante, desta forma, é valorar as possibilidades que o sujeito tinha de conseguir determinado resultado, para aferir a sua importância, ou não, para o ordenamento jurídico. Continuando as lições do mestre, este segue dizendo que tal tarefa cabe ao juiz, que deverá fazer, em cada caso, um prognóstico sobre as possibilidades concretas que a pessoa tinha de conseguir resultado favorável, de tal sorte que a perda de uma chance só será indenizável quando houver a probabilidade de sucesso superior a cinquenta por cento, de onde se conclui que nem todos os casos de perda de uma chance serão indenizáveis. Finaliza, com maestria ímpar, dizendo que a indenização deve se dar pela perda de uma oportunidade de se obter uma vantagem, e não pela própria perda da vantagem2. O autor suprarreferido, dissertando sobre a questão em conjunto com Carlos Alberto Menezes Direito, também ensina que a teoria da perda de uma chance guarda relação com os lucros cessantes. O fundamento é o de que determinado ato ilícito praticado retira da vítima de obter uma situação futura melhor3. 2 INDENIZAÇÃO PELA PERDA DE UMA CHANCE: A QUE TÍTULO? Sérgio Cavalieri Filho levanta a seguinte e relevante problemática: a que título deve se dar a indenização em razão da perda de uma chance? Dano moral, material ou, neste último caso, a título de dano emergente ou lucro cessante? Pondera o autor referido que tal discussão mostra-se controvertida, seja na jurisprudência, seja na doutrina, e segue dizendo que, em muitas oportunidades, os tribunais que 2 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 7475. 3 DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Comentários ao novo Código Civil: da responsabilidade civil, das preferências e privilégios creditórios. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (Coord). 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, v, XIII, 2011. p. 96. 3 indenizam a perda de uma chance ainda não se refiram à expressão, ou seja, se a título de lucros cessantes, se a título de dano moral4. Prosseguindo a lição, o professor aponta que existe uma forte corrente doutrinária que insere a perda de uma chance como um terceiro gênero de indenização, ou seja, coloca-a meio caminho entre o dano emergente e o lucro cessante, de modo que, entre um extremo e outro, caberia uma graduação, e que deve ser feita em cada caso, com critério equitativo e distinguindo a mera possibilidade da probabilidade. Como já referido, a indenização deve corresponder à própria chance, que o juiz apreciará considerando o caso concreto, e não ao lucro ou à perda que dela era objeto, haja vista que a falha foi em relação à chance5. Finalizando a questão sobre a qual título se daria a indenização em decorrência da perda de uma chance, Sérgio Cavalieri cita a monografia de Sérgio Savi, cujo trabalho, neste tópico e com base nos pensamentos de Adriano DeCupis, forma a conclusão de que a perda de uma chance deve ser considerada no ordenamento jurídico pátrio como uma subespécie de dano emergente. A base, para tanto, é que deve ser considerada uma espécie de propriedade anterior do lesado e, inserindo-se a teoria da perda de uma chance no conceito de lucro emergente, está eliminada a problemática da certeza do dano, tendo em vista que, ao contrário da pretensão de indenização sobre o prejuízo decorrente da perda do resultado útil esperado (como exemplo uma vitória em ação judicial), a indenização é concedida em razão da perda da chance de obtenção do resultado útil que se esperava. Por último, alerta Sérgio Cavalieri que a jurisprudência ainda não firmou entendimento sobre essa questão. Aduz que ora as indenizações em decorrência da perda de uma chance são concedidas a título de danos morais, ora a título de lucros cessantes, destacando, também, um ponto negativo: ora a indenização dá-se pela perda própria vantagem, e não pela perda da oportunidade de obtenção da vantagem, transformando, assim, a chance na própria realidade6. 4 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 77. CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 77. 6 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 7778. 5 4 3 O PAPEL DA JURISPRUDÊNCIA Estamos tratando da aplicação, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, da teoria da perda de uma chance, bem como do conceito que a doutrina dá ao instituto. Portanto, consideramos importante uma breve análise do conceito de jurisprudência, bem como dos seus reflexos e consequências, que incidem na teoria aqui estudada. Arnoldo Wald, ao discorrer sobre o papel da jurisprudência, conceitua-a como o conjunto de decisões uniformes dos tribunais, ou seja, afirma que é a autoridade de casos julgados de forma sucessiva, e do mesmo modo. Continua o mestre ensinando que, em havendo alguma lacuna na lei, ou seja, alguma matéria não regulamentada devidamente pela lei escrita, faz-se necessário recorrer-se à jurisprudência para supri-la. Pondera o autor, todavia, que, em princípio, no sistema jurídico organizado, não existem lacunas no Direito. A explicação dá-se no sentido de que toda a situação, quando não puder ser resolvida de forma direta através das normas existentes, poderá sê-lo deduzindo-se do sistema uma solução para o caso concreto. Refere, ainda, que o julgado nunca é uma norma jurídica, senão para o caso concreto para qual fora proferida determinada decisão. Por outro lado, a norma jurídica é comando prévio e geral, universal e obrigatório. De tal forma que o julgado só pode ser aplicado ao caso em discussão e, embora constitua precedente, não se torna obrigatório para o futuro, vinculando, desta forma, somente às partes no processo7. Importante referir também que tem a função de estabelecer uma interpretação construtiva da lei, podendo, até, revogá-la, quando nela existirem princípios contraditórios. Em relação a esse aspecto, Arnoldo Wald exemplifica problema de conflito e interpretação existente no antigo Código Civil, mais especificamente quanto aos arts. 1.521 e 1.523. Esclarece o autor que o primeiro dispositivo tratava da responsabilidade do preponente por ato do preposto, que é presumida; já o segundo, para a responsabilidade do preponente, a prova da culpa do preposto e do empregador. A jurisprudência tratou de resolver o problema, conciliando aqueles dois dispositivos, chegando a considerar revogado o art. 1.523, com o entendimento 7 WALD, Arnoldo. Direito civil: introdução e parte geral. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.p. 73-74. 5 de que a prova da simples culpa do preposto acarreta, de forma automática, a responsabilidade do empregador8. Portanto, entende e reconhece o mestre supracitado a função da jurisprudência como verdadeira fonte do direito. Ressalta, porém, que, em tese, a vinculação restringe-se às partes no processo, não tendo o caráter de generalidade da norma jurídica9. 4 O POSICIONAMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Observamos, no tópico acima, o relevante papel, a importantíssima função da jurisprudência. O fato é que ela é determinante na interpretação e aplicação da lei. Portanto, nos termos da Constituição Federal, iniciamos a verificação da aplicação da teoria da perda de uma chance, em nosso ordenamento jurídico, por meio da Corte que tem a função, entre outras, de interpretar a legislação federal em nosso país. Portanto, o próximo tópico passa a analisar julgamentos envolvendo questões como a desapropriação; curso superior e o Ministério da Educação; programa de televisão envolvendo perguntas e respostas; inacumulabilidade de cargos públicos; responsabilidade civil do advogado; recusa de atendimento hospitalar; por último, caso envolvendo licitação. 4.1 Desapropriação Iniciamos a verificação da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, acerca da teoria da perda de uma chance, em discussão sobre desapropriação, caso em que a Corte rechaçou a aplicação da teoria. Pelas razões de decidir, constata-se que o demandante contratou a elaboração de um projeto denominado River Side Hotel Ecoturismo, havendo a 8 9 WALD, Arnoldo. Op. cit., p. 74. WALD, Arnoldo. Op. cit., p. 74. 6 desapropriação. O acórdão consignou que, no tocante à teoria da perda de uma chance, é exigido, para fins de reparação, que se comprove uma chance ou uma oportunidade de se alcançar um determinado beneficio, um determinado resultado, além de revelar a qualidade séria e real. Requer-se, também, que, a partir de um juízo de probabilidade, a chance de se obter resultados favoráveis se mostre concreta, e não meramente hipotética ou imaginária. Ou seja, a probabilidade da chance de se alcançar o benefício deve se mostrar significativa. Resumindo, houve entendimento de que a desapropriação não inviabilizou a execução de qualquer projeto pretendido, não havendo, deste modo, em se falar na perda de oportunidade, como a frustração de objetivos, como a instalação de energia elétrica rural e construção de escola rural. Portanto, e de acordo com o voto, a desapropriação em nada atrapalhou qualquer intenção ou objetivo do autor, frisando, ainda, que os objetivos podem ser alcançados, dependendo apenas do empenho da parte autora10. 4.2 Curso superior não reconhecido pelo Ministério da Educação e Cultura 10 "Processual civil. Recurso especial. Honorários advocatícios. Revisão. Premissas fáticas não delineadas na instância de origem. Impossibilidade. Súmula nº 7/STJ. 1. Em princípio, descabe ao STJ revisar valores de sucumbência fixados nas instâncias ordinárias, pois eles são arbitrados em consideração àquilo que se desenvolveu no processo e por intermédio de juízos de equidade, circunstâncias que não podem ser reavaliadas nesta Corte, nos termos da Súmula nº 7/STJ. 2. Em situações excepcionalíssimas, o STJ afasta o rigor da Súmula nº 7 para exercer juízo de valor sobre o quantum fixado a título de honorários advocatícios, com vistas a decidir se são eles irrisórios ou exorbitantes. 3. Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça não pode, em recurso especial, refazer o juízo de equidade de que trata o art. 20, § 4º, do CPC, levando em conta as alíneas a, b e c do § 3º do mesmo dispositivo legal, sem que o acórdão recorrido deixe delineada a especificidade de cada caso, porque isso, necessariamente, demanda o reexame do contexto fático-probatório, o que é vedado a esta Corte, nos termos da Súmula nº 7/STJ. 4. Recurso especial não conhecido." "Processual civil e administrativo. Agravo em recurso especial. Ação de indenização. Prejuízos decorrentes de desapropriação. Teoria da perda de uma chance. Revisão do contexto fáticoprobatório dos autos. Impossibilidade. Súmula nº 7/STJ. 1. A jurisprudência desta Corte admite a responsabilidade civil e o consequente dever de reparação de possíveis prejuízos com fundamento na denominada teoria da perda de uma chance, 'desde que séria e real a possibilidade de êxito, o que afasta qualquer reparação no caso de uma simples esperança subjetiva ou mera expectativa aleatória' (REsp 614.266/MG, DJe 02.08.2013). 2. Impossível rever a premissa fática fixada pelas instâncias ordinárias por demandar o reexame do acervo fático-probatório dos autos, a atrair o óbice da Súmula nº 7/STJ. 3. Agravo em recurso especial não provido." (STJ, REsp 1354100/TO, 2ª T., Relª Eliana Calmon, J. 17.10.2013) (Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=201202432776&dt_publicacao=24/10/2013>. Acesso em: 12 dez. 2013) 7 A discussão travada nos autos resume-se à ação objetivando indenização por perdas e danos materiais e morais em face de Universidade, referindo o autor a conclusão do curso de Ciências Jurídicas, além de seguida aprovação no exame da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB. Todavia, a sua inscrição no quadro de advogados da Ordem foi negada, haja vista o não reconhecimento do curso pelo Ministério de Educação e Cultura. Em razão de tal fato, o demandante estimou que, por restar impedido de exercer seu ofício, deixou de auferir o equivalente a trinta salários-mínimos mensais. A sentença julgou parcialmente procedente o pedido, condenando a ré ao pagamento, a título de danos extrapatrimoniais, no valor de trinta vezes sobre o que foi pago pelo autor nos cinco anos de curso, bem como danos materiais correspondentes ao que poderia conseguir no mercado de trabalho, desde a aprovação na OAB até 27.01.2000, data em que houve o reconhecimento do curso pelo MEC (fls. 429-437). A apelação da Instituição foi parcialmente provida apenas para ver reduzido o valor por danos imateriais. A indenização, a título de danos materiais, foi afastada, pela razão de que não se concede indenização em decorrência de dano hipotético, haja vista que, segundo o relator, não houve demonstração de dano efetivo. E, quanto à teoria da perda de uma chance, restou consignado no voto que [...] a teoria da perda de uma chance visa à responsabilização do agente causador não de um dano emergente, tampouco de lucros cessantes, mas de algo intermediário, precisamente a perda da possibilidade de se buscar posição mais vantajosa que muito provavelmente se alcançaria, não fosse o ato ilícito praticado. De todo modo, verifico não ser possível o reconhecimento da teoria da perda de uma chance no caso, tendo em vista que o autor deduziu indenização por danos materiais, com fundamento em lucros cessantes. Não poderia esta Corte reconhecer a teoria da perda de uma chance, sob pena de julgamento extra petita [...].11 11 "Legislação de ensino. Recurso especial. Curso superior não reconhecido pelo MEC. Impossibilidade de exercer a profissão. Responsabilidade objetiva da instituição de ensino. Dano material não reconhecido. Dano moral. Valor. Revisão pelo STJ. Montante exorbitante ou irrisório. Cabimento. 1. O art. 535 do Código de Processo Civil permanece incólume quando o Tribunal de origem manifesta-se suficientemente sobre a questão controvertida, apenas adotando fundamento diverso daquele perquirido pela parte. 2. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB (Lei nº 9.394/1996) exige sejam os cursos reconhecidos por prazo limitado de validade, sendo renovado o reconhecimento, periodicamente, após processo regular de avaliação (art. 46). Regulamentando tal disposição, foi emitida a Portaria nº 877, de 1997, então vigente, que dispunha que o reconhecimento 8 4.3 Programa de televisão - Perguntas e respostas O debate, neste caso, trata de desclassificação da parte autora, em programa de televisão, com base em perguntas e respostas que davam vantagens econômicas a cada fase vencida. A ação foi julgada improcedente. Em sede de recurso de apelação, foi dado provimento, por maioria, ao recurso, para reformar a sentença e condenar a ré ao pagamento de indenização no valor de R$ 59.000,00 (cinquenta e nove mil reais), a título de danos emergentes. Foi negado seguimento ao recurso especial interposto pela ré, sendo mantida a condenação do Tribunal Estadual, sob o fundamento de que, [...] se não bastasse, para infirmar a conclusão a que chegou o Tribunal de origem acerca da existência de responsabilidade da recorrente pela perda da chance para que o Recorrido pudesse conseguir o prêmio de R$ 120.000,00, oferecido pelo programa, e seria, necessário, como já dito, o reexame do conjunto probatório e a interpretação das cláusulas do contrato, soberanamente examinadas pelas instâncias ordinárias, o que é defeso nesta fase recursal a teor das Súmulas nºs 5 e 7 do STJ. É o que se extrai das conclusões do voto-condutor lançado nestes termos (e-STJ fls. 450 e 453): "O que está implícito na cláusula contratual, a ser interpretada segundo o princípio da boa-fé objetiva e a causa do negócio jurídico, é que os dados reais, contidos na parte preta do livro, é que seriam levados em conta para aferição de cursos superiores deveriam ser requeridos a partir do terceiro ano, quando se tratar de curso com duração superior a cinco. 3. A instituição de ensino que oferece curso de bacharelado em Direito sem providenciar o reconhecimento deste no Ministério da Educação e Cultura (MEC), antes de sua conclusão - resultando na impossibilidade de aluno, aprovado no exame da OAB, obter inscrição definitiva de advogado -, responde objetivamente pelo serviço defeituoso. 4. O requerente à inscrição no quadro de advogados da OAB, na falta de diploma regularmente registrado, apresenta certidão de graduação em Direito, acompanhada de cópia autenticada do respectivo histórico escolar, por licença do art. 23 do Regulamento da Advocacia. De todo modo, o diploma ou certidão devem ser emitidos por instituição de ensino que esteja reconhecida pelo Ministério da Educação. A ausência do reconhecimento do curso impede a inscrição. Precedentes. 5. No caso concreto, não foi demonstrado dano material efetivo. Depreende-se de sua exordial que o autor somente pretendeu indenização por danos materiais com fundamento em lucros cessantes, tendo sido o pleito acatado pelas instâncias ordinárias, motivo pelo qual esta Corte não pode reconhecer a teoria da perda de uma chance, sob pena de julgamento extra petita. 6. O montante arbitrado a título de danos morais comporta revisão pelo Superior Tribunal de Justiça nas hipóteses em que for claramente irrisório ou exorbitante. Precedentes. 7. Recurso especial parcialmente provido." (STJ, REsp 1244685/SP, 4ª T., Rel. Luis Felipe Salomão, J. 03.10.2013) (Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=201001625090&dt_publicacao=17/10/2013>. Acesso em: 25 dez. 2013) 9 da correção das respostas [...]. Absolutamente sensato que, pela própria causa do contrato celebrado entre as partes, qual seja, participação em programa televisivo de perguntas e respostas sobre o Corinthians, que a bibliografia base fosse a parte dos dados reais (parte preta), e não a parte ficcional (parte branca) do livro, esta última descolada da própria razão de ser da gincana e sem interesse do público [...]". 12 4.4 Não acumulabilidade de cargos públicos O debate gira em torno da possibilidade de acumulação de cargos públicos e que, segundo o entendimento da autora, seria plenamente possível. O acórdão local recorrida aplicou a teoria da perda de uma chance. Todavia, as razões da recorrente fundam-se na responsabilidade objetiva do Estado, e não na referida teoria. 12 "Recurso especial. Ação indenizatória. Programa televisivo de perguntas e respostas. Boa--fé objetiva do participante. Contrato que estabelecia obra-base composta de duas partes, uma real e outra fictícia. Contrato que não obrigava a responder errado de acordo com parte fictícia da obrabase. Perda de uma chance. Peculiaridades do caso. Prequestionamento inexistente. Aplicação das Súmulas nºs 5, 7, 282 e 356 do STF. 1. Programa 'Vinte e Um', de que participante candidato cujo contrato de participação com a emissora televisiva, como firmado pelo acórdão, 'continha cláusula expressa no sentido de que a bibliografia básica para a formulação da perguntas seria uma determinada obra - Corinthians é preto no branco, a qual continha uma parte verdadeira, de cor preta, e uma parte fictícia, de cor branca, tendo o candidato sido desclassificado por responder o resultado correto de uma partida, que não se encontrava na parte correta, de cor preta, mas que constava, com resultado errado diverso, na parte fictícia de cor branca. 2. Acórdão que reconhece direito a indenização por perda de uma chance de passagem a etapa seguinte, sob o fundamento de que 'o que está implícito na cláusula contratual, a ser interpretada segundo o princípio da boa-fé objetiva e a causa do negócio jurídico, é que os dados reais, contidos na parte preta do livro, é que seriam levados em conta para a aferição da correção das respostas', de modo que, não constando, a resposta correta, da parte verdadeira, 'eventual dubiedade, imprecisão ou contradição da cláusula deve ser interpretada contra quem a redigiu, no caso o réu STB', sendo que o julgamento 'somente admitiria a improcedência da ação caso constasse da cláusula contratual o seguinte: I - a bibliografia que serviria como base das perguntas e respostas abrangerá a parte branca e a parte preta do livro; II - o programa de televisão versasse sobre o livro, e não sobre a história real do Corinthians'. 3. Acórdão que, por fim, funda-se também em 'direito difuso à informação exata, desinteressada e transparente', ao passo que, 'no caso concreto, o que foi vendido ao público telespectador é que um candidato responderia questões variadas sobre o Corintians, e não sobre uma obra de ficção sobre o Corinthians', de modo que, não constando regência contratual do caso pela parte ficcional do livrobase, 'é evidente que se na parte ficcional do livro (parte branca) constasse que o Corinthias venceu por dez vezes a Taça Libertadores da América, e por dez vezes foi campeão do mundo' e se se 'formulasse questão a respeito, a resposta do autor não poderia ser irreal, sob pena de comprometer o formato do programa e frustrar o próprio interesse do público'. 4. Inocorrência de violação do disposto no art. 859 e parágrafos do CC/2002 pela procedência da ação. 5. Interpretação do contrato dada pelo Tribunal de origem, após julgamento em embargos infringentes, a qual não pode ser alterada por esta Corte, sob pena de infringência da Súmula nº 5/STJ; fatos ocorridos, que igualmente não podem ser reexaminados, por vedado pela Súmula nº 7/STJ; ausência, ademais, de prequestionamento, sem interposição de embargos de declaração, o que leva à incidência das Súmulas nºs 282 e 356/STF. 6. Recurso especial improvido." (STJ, REsp 1383437/SP, 3ª T., Rel. Sidnei Beneti, J. 27.08.2013) (Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=201200793917&dt_publicacao=06/09/2013>. Acesso em: 25 dez. 2013) 10 Em sede de recurso especial, este foi parcialmente conhecido e, no ponto, provido. A Turma entendeu que [...] o dano sofrido pela parte ora recorrente de ordem material não advém da perda de uma chance. Isso porque, no caso dos autos, os recorrentes já exerciam ambos os cargos de profissionais de saúde de forma regular, sendo este um evento certo sobre o qual não restam dúvidas. Não se trata de perda de uma chance de exercício de ambos os cargos públicos porque isso já ocorria, sendo que o ato ilícito imputado ao ente estatal implicou efetivamente prejuízo de ordem certa e determinada. A questão assim deve continuar sendo analisada sob a perspectiva da responsabilidade objetiva do Estado, devendo, portanto, ser redimensionado o dano causado, e, por conseguinte, a extensão da sua reparação. 6. Assim, afastado o fundamento adotado pelo Tribunal a quo para servir de base à conclusão alcançada, e, considerando que a mensuração da extensão do dano é matéria que demanda eminentemente a análise do conjunto fático e probatório constante, devem os autos retornarem ao Tribunal de Justiça a quo a fim de que possa ser arbitrado o valor da indenização nos termos do art. 944 do Código Civil.13 13 "Administrativo. Processual civil. Recurso especial. Responsabilidade civil do Estado. Ato da Administração Pública que equivocadamente concluiu pela inacumulabilidade dos cargos já exercidos. Não aplicação da teoria da perda de uma chance. Hipótese em que os cargos públicos já estavam ocupados pelos recorrentes. Evento certo sobre o qual não resta dúvidas. Nova mensuração do dano. Necessidade de revolvimento do conjunto fático e probatório. Retorno dos autos ao Tribunal a quo. 1. A teoria da perda de uma chance tem sido admitida no ordenamento jurídico brasileiro como sendo uma das modalidades possíveis de mensuração do dano em sede de responsabilidade civil. Esta modalidade de reparação do dano tem como fundamento a probabilidade e uma certeza, que a chance seria realizada e que a vantagem perdida resultaria em prejuízo. Precedente do STJ. 2. Essencialmente, esta construção teórica implica um novo critério de mensuração do dano causado. Isso porque o objeto da reparação é a perda da possibilidade de obter um ganho como provável, sendo que 'há que se fazer a distinção entre o resultado perdido e a possibilidade de consegui-lo. A chance de vitória terá sempre valor menor que a vitória futura, o que refletirá no montante da indenização'. 3. Essa teoria tem sido admitida não só no âmbito das relações privadas stricto sensu, mas também em sede de responsabilidade civil do Estado. Isso porque, embora haja delineamentos específicos no que tange à interpretação do art. 37,§ 6º, da Constituição Federal, é certo que o ente público também está obrigado à reparação quando, por sua conduta ou omissão, provoca a perda de uma chance do cidadão de gozar de determinado benefício. 4. No caso em tela, conforme excerto retirado do acórdão, o Tribunal a quo entendeu pela aplicação deste fundamento sob o argumento de que a parte ora recorrente perdeu a chance de continuarem exercendo um cargo público tendo em vista a interpretação equivocada por parte da Administração Pública quanto à impossibilidade de acumulação de ambos. 5. Ocorre que o dano sofrido pela parte ora recorrente de ordem material não advém da perda de uma chance. Isso porque, no caso dos autos, os recorrentes já exerciam ambos os cargos de profissionais de saúde de forma regular, sendo este um evento certo sobre o qual não resta dúvidas. Não se trata de perda de uma chance de exercício de ambos os cargos públicos porque isso já ocorria, sendo que o ato ilícito imputado ao ente estatal implicou efetivamente prejuízo de ordem certa e determinada. A questão assim deve continuar sendo analisada sob a perspectiva da responsabilidade objetiva do Estado, devendo, portanto, ser redimensionado o dano causado, e, por 11 4.5 Responsabilidade civil do advogado O demandante ajuizou ação buscando reparação em decorrência de eventual desídia do seu advogado. O acórdão, a seu turno, embora tenha invocado a Súmula nº 7 do Superior Tribunal de Justiça, fez menção à obrigação de meio do procurador da parte autora, bem como registrou que não houve a demonstração inequívoca de qualquer dano em face do demandante, bem como do nexo de causalidade, circunstância esta que acarretou o desprovimento do recurso14. Neste outro julgamento, a Corte entendeu pela responsabilização do advogado, aplicando a teoria da perda de uma chance, haja vista que, como se percebe do voto, diante da conduta omissiva e culposa verificada, em decorrência da impetração de mandado de segurança fora do prazo e sem a devida instrução com os documentos necessários, restou frustrada a possibilidade da cliente, que foi aprovada em concurso público, de ser nomeada ao cargo pretendido15. Já neste outro julgamento, a aplicação da teoria foi mantida, mas sob o fundamento da conseguinte, a extensão da sua reparação. 6. Assim, afastado o fundamento adotado pelo Tribunal a quo para servir de base à conclusão alcançada, e, considerando que a mensuração da extensão do dano é matéria que demanda eminentemente a análise do conjunto fático e probatório constante, devem os autos retornarem ao Tribunal de Justiça a quo a fim de que possa ser arbitrado o valor da indenização nos termos do art. 944 do Código Civil. 7. Recurso especial parcialmente conhecido, e, nesta extensão, provido." (REsp 1308719/MG, 2ª T., Rel. Mauro Campbell Marques, J. 25.06.2013) (Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=201102405322&dt_publicacao=01/07/2013>. Acesso em: 25 dez. 2013) 14 "Agravo regimental em agravo de instrumento. Responsabilidade civil do advogado. Perda de uma chance. Revisão do acervo probatório. Impossibilidade. Súmula nº 7/STJ. 1. Rever as conclusões do tribunal de origem, que entendeu pela ausência de responsabilidade civil do advogado, encontra óbice insuperável na Súmula nº 7/STJ. 2. Agravo regimental não provido." (AgRg-Ag 1106066/RS, 3ª T., Rel. Ricardo Villas Bôas Cueva,J. 07.05.2013) (Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200802279755&dt_publicacao=13/05/2013>. Acesso em: 25 dez. 2013) 15 "Civil e processual civil. Embargos de declaração no recurso especial. Recebimento com agravo regimental. Responsabilidade civil. Danos morais. Conduta omissiva e culposa do advogado. Teoria da perda de uma chance. Razoabilidade do valor arbitrado. Decisão mantida. 1. Responsabilidade civil do advogado, diante de conduta omissiva e culposa, pela impetração de mandado de segurança fora do prazo e sem instruí-lo com os documentos necessários, frustrando a possibilidade da cliente, aprovada em concurso público, de ser nomeada ao cargo pretendido. Aplicação da teoria da 'perda de uma chance'. 2. Valor da indenização por danos morais decorrentes da perda de uma chance que atende aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, tendo em vista os objetivos da reparação civil. Inviável o reexame em recurso especial. 3. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental, a que se nega provimento." (EDcl-REsp 1321606/MS, 4ª T., Rel. Antonio Carlos Ferreira, J. 23.04.2013) (Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=201102373280&dt_publicacao=08/05/2013>. Acesso em: 25 dez. 2013) 12 impossibilidade do reexame de provas, nos termos da Súmula nº 7 do Superior Tribunal de Justiça. O caso tratou de condenação por danos morais, também em desfavor de advogado, que, segundo o relato nos autos, não teria ajuizado ação principal, no prazo legal, circunstância essa que ensejou a perda do imóvel da recorrida, alienado em leilão judicial16. 4.6 Hospital particular e recusa de atendimento Neste caso, a reparação civil deu-se, segundo a fundamentação verificada no voto, ante a recusa de atendimento médico, que privilegiou trâmites burocráticos em detrimento da saúde da menor e que, segundo o entendimento do Tribunal, não tem qualquer respaldo legal ou moral. Portanto, a omissão adquire relevância jurídica e torna o omitente responsável quando este tem o dever jurídico de agir, de praticar um ato para impedir o resultado, como na hipótese, criando, assim, sua omissão, risco da ocorrência do resultado. 4.7 Participação em processo licitatório É este último o caso que trazemos julgado pelo Superior Tribunal de Justiça. O caso em discussão trata de ação de danos morais e materiais em decorrência da impossibilidade, pelo atraso injustificável dos correios, na entrega de correspondência, cujo objetivo era a participação em processo de licitação. Aplicada no caso a teoria da perda de uma chance, ficou registrado no voto o prejuízo da demandante, eis que fora considerada a "potencialidade concreta de êxito na licitação relativa a alguns dos produtos objeto do certame17". 16 "Processual civil. Agravo regimental no recurso especial. Responsabilidade civil. Teoria da perda de uma chance. Advogado. Ausência de propositura da ação principal. Dano moral. Configurado. Precedente. 1. O recurso especial não comporta o exame de questões que impliquem revolvimento do contexto fático-probatório dos autos, a teor do que dispõe a Súmula nº 7/STJ. 2. No caso concreto, o Tribunal de origem, analisando a prova dos autos, concluiu que o dano moral experimentado pelo autor decorreu de conduta culposa do advogado. Alterar esse entendimento é inviável na via especial a teor do que dispõe a referida súmula. 3. Agravo regimental desprovido." (AgRg-REsp 1149718/MT, 4ª T., Rel. Antonio Carlos Ferreira, J. 21.02.2013) (Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200901384198&dt_publicacao=04/03/2013>. Acesso em: 25 dez. 2013) 17 "Recurso especial. Processual civil. Civil. Teoria da perda de uma chance. Participação em processo licitatório. Impossibilidade. Envio da proposta pelo correio a estado diverso da federação. 13 5 O POSICIONAMENTO DOS TRIBUNAIS ESTADUAIS Pois bem. Muito importante para a continuidade da elucidação da questão aqui trabalhada é também trazermos o entendimento dos tribunais estaduais a respeito da teoria da perda de uma chance, assim como já procedemos apontando a posição do Superior Tribunal de Justiça. De início, valemo-nos de um julgado da Corte gaúcha, envolvendo promessa de compra e venda de bem imóvel, caso cuja teoria em estudo foi aplicada18. Por Possibilidade concreta de êxito. Prejuízo real. Art. 159 do Código Civil de 1916. Súmula nº 7/STJ. Custas processuais. Isenção. 1. A teoria da perda de uma chance incide em situações de responsabilidade contratual e extracontratual, desde que séria e real a possibilidade de êxito, o que afasta qualquer reparação no caso de uma simples esperança subjetiva ou mera expectativa aleatória. 2. O êxito em licitação, possibilidade frustrada em virtude da conduta ilícita da empresa responsável pela entrega, em tempo hábil, da documentação devidamente enviada, enseja dano concreto, aferível à luz do art. 159 do Código Civil de 1916. 3. O exame relativo à mensuração do valor econômico da efetiva possibilidade da recorrida em obter o resultado útil esperado, caso a correspondência houvesse sido adequadamente enviada ao destino correto, resta insindicável, nesta instância processual, pelo óbice formal da Súmula nº 7/STJ. 4. A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos é isenta do recolhimento das custas processuais em decorrência do art. 12 do Decreto-Lei nº 509/1969. 5. Recurso especial parcialmente provido." (STJ, REsp 614266/MG, 3ª T., Rel. Ricardo Villas Bôas Cueva, J. 18.12.2012) (Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200302223827&dt_publicacao=02/08/2013>. Acesso em: 25 dez. 2013) 18 "Apelações cíveis e agravo retido. Promessa de compra e venda do imóvel. Questão preliminar de deficiência da representação. Exceção de prescrição. Mérito. Perdimento do valor pago de entrada pela construtora promitente-compradora que não pagou nem realizou o empreendimento, dando causa ao inadimplemento. Compensação pela posse indevida por dez anos e perda da chance durante o período, até a transmissão da posse a outro adquirente. A representação processual da parte demandante é feita pelo diretor da empresa demandante, conforme o Estatuo Social. Diante dos documentos juntados pela parte demandante, deveria a parte demandada e agravante fazer prova da existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo, de modo a demonstrar as suas alegações, prova esta que não produziu. O prazo prescricional aplicável à presente demanda é vintenário, conforme a lei civil vigente à época da celebração do contrato e ajuizamento. Interrompendo-se a fluência do prazo pela citação de um dos demandados no litisconsórcio passivo, interrompem-se para os demais devedores solidários demandados. A promessa de compra e venda de terreno celebrada entre as partes previa o pagamento de valor de entrada em dinheiro, correspondente a menos de um por cento do preço, mais dação de apartamentos aos proprietários, correspondendo à maioria absoluta do preço. A venda não se perfectibilizou porque a construtora promitente-compradora não entregou os apartamentos no prazo do contrato, alienando-os a terceiros e, com isso, impedindo a conclusão do negócio, porém ficando na posse do imóvel por mais de dez anos, opondo-se à resolução do negócio jurídico. Nesse contexto, a postura da construtora, em postular desfazimento do contrato, com devolução da entrada, caracteriza venire contra factum proprium, vedado pelo direito. Se a construtora demandante deixou de pagar a maioria absoluta do preço e inviabilizou a conclusão do contrato, alienando os apartamentos prometidos a terceiros, por descumprir o que se obrigara, no prazo assinado em contrato, incidiu em mora e deu causa à não conclusão do negócio, devendo responder pelos prejuízos acarretados e pela impossibilidade da prestação. O valor de entrada pago na promessa de compra e venda do imóvel deve ser pedido a título de perdas e danos, durante dez anos que se ficou na posse do imóvel, utilizando-o indevidamente durante a posse. A empresa usufruiu o imóvel por 10 anos, porém jamais complementou o pagamento do preço. O mesmo ocorre com o decréscimo patrimonial, quando da alienação da posse à outra construtora, depois do tempo que a demandante detinha o imóvel de forma indevida, diante da instabilidade decorrente da titulação, decorrente da permanência da 14 sua vez, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo decidiu na mesma linha de raciocínio, mas em caso que houve condenação de advogado que não recorreu de sentença parcialmente procedente19. Essa mesma Corte aplicou a teoria em discussão em caso de negativação indevida, em cadastros restritivos de crédito20. O Tribunal do Estado do Rio de Janeiro, como podemos observar das razões de decidir, também aplica a teoria, quando possível, em caso que também tratou da promessa de compra que não foi resolvida, indenizado pelo perdimento do valor pago a título de entrada em favor dos promitentes vendedores." (TJRS, AC 70053352258, 20ª C.Cív., Rel. Carlos Cini Marchionatti, J. 10.04.2013) (Disponível em: <http://google8.tjrs.jus.br/search?q=cache:www1.tjrs.jus.br/site_php/consulta/consulta_processo.php %3Fnome_comarca%3DTribunal%2Bde%2BJusti%25E7a%26versao%3D%26versao_fonetica%3D1 %26tipo%3D1%26id_comarca%3D700%26num_processo_mask%3D70053352258%26num_process o%3D70053352258%26codEmenta%3D5268427+empresa+e+perda+de+uma+chance&site=ementar io&client=buscaTJ&access=p&ie=UTF-8&proxystylesheet=buscaTJ&output=xml_no_dtd&oe=UTF8&numProc=70053352258&comarca=Comarca+de+Porto+Alegre&dtJulg=10-042013&relator=Carlos+Cini+Marchionatti>. Acesso em: 27 dez. 2013) 19 "Mandato. Ação de indenização por danos materiais e morais. Ação julgada parcialmente procedente. Ausência de interposição de apelação por parte dos autores para majoração da condenação. Impossibilidade de piora na condenação imposta. Princípio reformatio in pejus. Danos configurados. Sentença reformada. Ação julgada parcialmente procedente. Advogado que deixa de recorrer de sentença parcialmente favorável aos patrocinados, sem consultá-los, comete desídia no patrocínio da causa, gerando indenização por danos morais. A simples perda de uma chance de obtenção de um provimento judicial mais favorável caracteriza danos morais. Sem suporte se mostra a alegação do profissional que deixa de recorrer de sentença parcialmente favorável aos clientes com receio de piorar a situação, tendo em vista a vedação imposta pelo princípio reformatio in pejus. Recurso parcialmente provido." (AC 0006081-65.2009.8.26.0481, 27ª CDPriv., Rel. Des. Gilberto Leme, J. 10.12.2013) (Disponível em: <http://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=7254528>. Acesso em: 27 dez. 2013) 20 "Declaratória e indenizatória. Dano moral. Negativação indevida. Responsabilidade civil configurada Manutenção do quantum indenizatório. Sentença mantida. Recurso desprovido." (TJSP, Apelação nº 0058240-20.2011.8.26.0576, 6ª CDPriv., Des. Fortes Barbosa, J. 17.01.2013) (Disponível em: <http://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/resultadoCompleta.do?dados.buscaInteiroTeor=perdadeumachance&tipoD ecisaoSelecionados=A&tipoDecisaoSelecionados=R&tipoDecisaoSelecionados=H&tipoDecisaoSeleci onados=D>. Acesso em: 21 jan. 2013) 15 responsabilidade de advogado21. No mesmo sentido, aquele Tribunal aplicou a teoria em demanda envolvendo concessionária de automóveis22. 6 BREVE ANÁLISE DAS DECISÕES E SEUS DESDOBRAMENTOS Percebemos, pelas decisões aqui trazidas, que espelham a aplicação da teoria da perda de uma chance, que as indenizações devem buscar, quando arbitradas, uma reparação que busque compensar a perda da chance, e não o bem em si, como já colocamos, pensamento esse baseado no entendimento do Superior Tribunal de Justiça, bem como da doutrina. Assim, o advogado que estiver fazendo a defesa ou ajuizando ação de indenização desta natureza deve ter profunda atenção quanto aos pedidos da demanda, eis que a perda de uma chance, como refere a teoria, não deve servir para indenizações, como, por exemplo, a título de danos emergentes. 21 "Embargos de declaração. Apelação cível. Responsabilidade civil subjetiva. Profissional liberal. Obrigação de meio. Dano material proporcional. Aplicação da teoria da perda de uma chance. Juros de mora. Correção monetária. Termo de incidência. Contradição. Obscuridade. Efeitos infringentes. 1. Assiste razão ao embargante, devendo o julgado ser aclarado no tocante ao termo de incidência da correção monetária e dos juros moratórios, vez que configurada hipótese do art. 535 do CPC. 2. Tem natureza material a indenização decorrente do direito à reparação em virtude de dano, que se traduz na perda da oportunidade séria e real de alcançar determinado resultado ou evitar determinado prejuízo, e que, portanto, deve observar a correção monetária desde o efetivo prejuízo, nos termos da Súmula nº 43 do STJ. 3 Fixação dos juros moratórios atinentes ao dano material que deverá ter termo inicial diverso daquele pleiteado pela embargante, pois, em se tratando de relação contratual aquela firmada entre as partes, deverão os juros correr a partir da citação, nos moldes da Súmula nº 54 do STJ, a contrário senso. 4. Não configura violação ao princípio da reformatio in pejus a revisão ex officio do termo de incidência dos juros moratórios, haja vista tratar-se de matéria de ordem pública, conforme ampla jurisprudência da Corte Superior. Acolhimento dos embargos." (TJRJ, AC 000037233.2006.8.19.0066, 6ª C.Cív., Relª Desª Teresa Castro Neves, J. 04.12.2013) (Disponível em: <http://www1.tjrj.jus.br/gedcacheweb/default.aspx?UZIP=1&GEDID=0004F607F845C96F3405E93D5 6E96BDFA61BC5021C493503>. Acesso em: 27 dez. 2013) 22 "Apelação cível. Consumidor. Concessionária de veículos. Oferta de venda com isenção de ICMS, baseada em Lei Estadual de Incentivo Fiscal (Lei nº 4.819/2006). Publicidade lacunosa. Ausência de informação clara e precisa quanto ao tempo do incentivo. Aceitação da proposta. Revogação do benefício pela montadora. Não concretização do negócio. Frustração das justas expectativas. Boa-fé objetiva. Violação ao dever de informação. Vinculação à publicidade. Teoria da perda da chance. Súmulas nºs 94 e 75, a contrario sensu, TJRJ. Se a prova dos autos (fls. 70/71) é segura no sentido de que o negócio jurídico ofertado ao consumidor/recorrente não se concretizara pela falha da proponente com seu dever de prestar informações claras e precisas quanto aos termos da isenção fiscal que o motivara a contratar, então, inviabilizado o negócio, deve o aceitante ser indenizado pela frustração de suas justas expectativas causadas pela perda da chance. Inteligência conjunta dos arts. 31, 34, 35, III, e 37, §§ 3º e 4º, do CDC. Dano moral configurado. Procedência parcial do pedido. Reforma da sentença. Provimento parcial ao recurso. (TJRJ, AC 0018599-75.2007.8.19.0021, 8ª C.Cív., Des. Orlando Secco, J. 28.04.2009) (Disponível em: <http://www.tjrj.jus.br/documents/10136/31308/teoria-perda-chance.pdf>. Acesso em: 21 jan. 2013) 16 Transcrevemos parte dos ensinamentos de Sérgio Cavalieri, já colocados, que põem uma pá de cal na questão: "Importante, desta forma, é valorar as possibilidades que o sujeito tinha de conseguir determinado resultado, para aferir a sua importância, ou não, para o ordenamento jurídico". Por tais razões, entendemos como didático o voto do Superior Tribunal de Justiça já trazido e, no ponto específico, transcrevemos parte das razões de decidir, que demonstram a aplicação prática a que pretendemos demonstrar: "[...] Nessas situações, há certeza quanto ao causador do dano e incerteza quanto à respectiva extensão, o que torna aplicável o critério de ponderação característico da referida teoria para a fixação do montante da indenização a ser fixada. Precedentes [...]". A própria Corte já manifestou em voto que a teoria da perda de uma chance responsabiliza o causador não por um dano emergente ou a título de lucros cessantes, mas sim em uma instância intermediária. Em que pese termos demonstrado o entendimento de Arnoldo Wald acerca do estudo e da importância da jurisprudência, bem como tenha afirmado o mestre que a obrigatoriedade de determinada decisão vincula apenas as partes do processo, entendemos que, havendo a real demonstração de que a perda de uma vantagem venha a ocorrer, independentemente do caso, parece que a jurisprudência é pacífica ao aplicar a teoria da perda de uma chance. Todavia, alertamos para os casos de incidência da Súmula nº 7 do Superior Tribunal de Justiça, que, como vimos, deixou de analisar o cabimento, ou não, da teoria da perda de uma chance, em razão da impossibilidade do reexame de provas. Esta é outra circunstância que, ao nosso modesto entendimento, pode vir a causar injustiça no caso concreto, pois este pode não ser devidamente analisado e, como consequência, deixa a vítima lesada sem a devida indenização. 17 CONSIDERAÇÕES FINAIS Como pudemos observar, a teoria da perda de uma chance, utilizada tanto pelo Superior Tribunal de Justiça23 como pelos demais Tribunais estaduais, bem como admitida pela doutrina, autoriza a aplicação em diversas relações jurídicas (hospitais, profissionais liberais, licitação, concurso público, por exemplo). Ainda, pode ser utilizada tanto nos casos de responsabilidade contratual, como extracontratual, para danos materiais e imateriais. Após este estudo, observamos que doutrina e jurisprudência são unânimes em afirmar que, para o sucesso da aplicação dessa teoria, deve ser feita uma análise sobre as reais chances de êxito, caso determinada conduta fosse executada. No caso de mesmo assim procedida a ação e o resultado restasse inexitoso, a teoria não tem aplicação. Flávio Tartuce, ao comentar o tema em questão, vê com ressalvas o enquadramento da teoria da perda de uma chance como nova categoria de dano. A justificativa do autor, para tanto, é no sentido de que esses danos são, em sua maioria, hipotéticos ou eventuais. Assevera, ainda, que os arts. 18624 e 40325 do 23 "Processual civil e direito civil. Responsabilidade de advogado pela perda do prazo de apelação. Teoria da perda da chance. Aplicação. Recurso especial. Admissibilidade. Deficiência na fundamentação. Necessidade de revisão do contexto fático-probatório. Súmula nº 7 do STJ. Aplicação. A responsabilidade do advogado na condução da defesa processual de seu cliente é de ordem contratual. Embora não responda pelo resultado, o advogado é obrigado a aplicar toda a sua diligência habitual no exercício do mandato. Ao perder, de forma negligente, o prazo para a interposição de apelação, recurso cabível na hipótese e desejado pelo mandante, o advogado frustra as chances de êxito de seu cliente. Responde, portanto, pela perda da probabilidade de sucesso no recurso, desde que tal chance seja séria e real. Não se trata, portanto, de reparar a perda de 'uma simples esperança subjetiva', nem tampouco de conferir ao lesado a integralidade do que esperava ter caso obtivesse êxito ao usufruir plenamente de sua chance. A perda da chance se aplica tanto aos danos materiais quanto aos danos morais. A hipótese revela, no entanto, que os danos materiais ora pleiteados já tinham sido objeto de ações autônomas e que o dano moral não pode ser majorado por deficiência na fundamentação do recurso especial. A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial. Aplicação da Súmula nº 7 do STJ. Não se conhece do especial quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles. Súmula nº 283 do STF. Recurso especial não conhecido." (STJ, REsp 1.079.185/MG, (2008/01684395), 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, J. 11.11.2008) (Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revistaeletronica/inteiroteor?num_registro=200801684395&data=4/8/2 009>. Acesso em: 21 jan. 2013) 24 "Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito." 25 "Art. 403. Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual." 18 Código Civil exigem que o dano seja presente, efetivo. Pondera, também, que essa teoria, na verdade, vem a trabalhar com suposições, com a expressão se. Portanto, muitas das situações colocadas pelos adeptos da teoria podem ser, segundo o autor, resolvidas em sede de danos morais ou materiais, sem a necessidade de a vítima ter de provar a séria e real chance. Pondera o mestre, todavia, que vem acompanhando a evolução jurisprudencial e doutrinária acerca do tema e, futuramente, pode vir a alterar o seu posicionamento 26. O assunto, como se observa dos entendimentos aqui detalhados, é instigante. Nossa intenção jamais é a de esgotá-lo. Um dos objetivos foi o de aprofundar mais o debate, no sentido do seu esclarecimento e também como contribuição aos estudiosos, para que possam utilizar este trabalho em seu cotidiano e dar continuidade aos estudos. REFERÊNCIAS ALMEIDA, Felipe Cunha de. A teoria da perda se uma chance e a responsabilidade civil do profissional da saúde sob a ótica do Superior Tribunal de Justiça: que tipo de indenização? Revista Jurídica, Porto Alegre, 1953, v. 427, 2013. BRASIL. Código Civil. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília/DF, 10 jan. 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm>. Acesso em: 24 dez. 2013. CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2009. DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Comentários ao novo Código Civil: da responsabilidade civil, das preferências e privilégios creditórios. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (Coord). 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. XIII, 2011. 26 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 3. ed. São Paulo: Método, 2013. p. 482. 19 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 3. ed. São Paulo: Método, 2013. WALD, Arnoldo. Direito civil: introdução e parte geral. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. 20