Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009 ISBN- 978-972-8746-71-1 A EDUCAÇÃO SUPERIOR NO PROJECTO CAMOESAS José Carlos de Oliveira Casulo Universidade do Minho (CIEd) Resumo Projecto Camoesas é uma das designações atribuídas à Proposta de lei sobre a reorganização da educação nacional, da autoria de João José da Conceição Camoesas, na altura Ministro da Instrução Pública, apresentada à Câmara dos Deputados portuguesa em 1923. Devido à queda do governo que a apadrinhava, tal proposta de lei acabou por não singrar, mas, não obstante, ficou na História, devido, entre outros, ao facto de ter sido a primeira tentativa de sistematização de uma lei de bases da educação portuguesa. O ensino superior, no âmbito do qual merece ser destacada a vontade de se criarem faculdades de Ciências da Educação nas três universidades portuguesas então existentes (Coimbra, Lisboa e Porto), teve, neste projecto de lei, atenção própria, mormente quanto à sua estrutura, aos seus professores, à sua distribuição territorial e ao seu financiamento, entre outros aspectos. Assim, nesta comunicação, começando por ter em conta a parte do preâmbulo que fundamenta as medidas propostas para este nível de ensino, continua-se com a análise daquelas que, de entre as vinte e quatro bases fixadas, parcial ou totalmente, directa ou indirectamente, se referem ao ensino superior. 1. Introdução O objectivo desta comunicação é investigar aquela que foi a atenção dada ao ensino superior na Proposta de lei sobre a reorganização da educação nacional, apresentada à Câmara de Deputados em 1923, da responsabilidade de João Camoesas 1. Começamos, assim, por, sumarissimamente, referir a circunstância histórica imediata em que surgiu o documento, passando, depois, à análise dos dados relevantes para a consecução do nosso objectivo. Neste sentido, pesquisa-se a causa justificadora da elaboração da Proposta de lei, passando-se, depois, a apresentar os resultados concernentes ao que nela se expõe quanto ao ensino superior, mormente quanto aos seguintes aspectos: conceito e objectivos da educação superior; número e administração das universidades; criação das faculdades de Ciências da Educação; medidas relativas ao corpo docente; residências universitárias; universidades populares. Seguem-se uma nota conclusiva e a referência do texto analisado e de alguns estudos que podem ajudar a compreender o Projecto Camoesas. 2. Circunstância histórica Paradoxalmente, foi na social e politicamente instável e agitada Primeira República Portuguesa (1910-1926) 2que se verificou a primeira tentativa de dotar a educação nacional com a estabilidade decorrente de um quadro jurídico próprio de uma lei de bases. O responsável por esta tentativa foi o político, também médico e jornalista, João José da Conceição Camoesas ( El va s ,18 87–Ne w Be df o r d ,E. U. A,1 95 1) ,q ueal e vo uac a b oa qu a n dod as u apr i me i r a 4973 Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009 ISBN- 978-972-8746-71-1 passagem3 pelo Ministério da Instrução Pública, que teve lugar entre 9 de Janeiro e 22 de Junho de 1923, numa governação do Partido Democrático chefiada por António Maria da Silva. Com efeito, em 21 de Junho de 1923, penúltimo dia do consulado ministerial de Camoesas, e com publicação no Diário do Governo de 2 do mês seguinte, foi apresentada à Câmara dos Deputados uma proposta de lei sobre a reorganização da educação nacional (o Projecto Camoesas) densamente fundamentada no seu preâmbulo e estruturada em vinte e quatro bases, nas quais, naturalmente e tal como no relatório preambular, não deixou de ser considerada a questão da educação superior. O governo, porém, caiu, e, com ele, o Projecto de João Camoesas. Mesmo que tal não tivesse acontecido, não podemos esquecer que, nem três anos volvidos sobre a data, seria o próprio regime primo-republicano a cair, abrindo-se caminho a uma Segunda República, e que, portanto, o mais certo seria que, a ter singrado como lei, não teria havido tempo suficiente para executar as medidas previstas no documento de João Camoesas para a educação superior portuguesa. 3. Causa da necessidade da reforma e problemas a resolver Como causa da necessidade da reforma educacional pretendida, estipulava Camoesas as condições resultantes da Grande Guerra 1914-1918, às quais Portugal, nação beligerante que fora, não se podia furtar, condições essas que imp un ha m“ ai mp e r i o s ane c e s s i d a dedeuman ov a definição das exigências da vida [e] de um no vo a j u s t a me n t o do sor ga n i s moss o c i a i s ” (Camoesas, João, 1923: p. 2258). Deste modo, no tocante à educação, uma nova ordem de coisas tinha que ser criada, para que o país n ã oc o nt i nu a s s ep r e s oaumas i t ua ç ã o“ q uen ã o logra[va], em matéria de ensino, resultados correspondentes aos seus esforços em dinheiro e h ome n s ”( i bi de m) . Camoesas, em consequência, propunha uma reforma que considerasse e resolvesse os grandes problemas da educação nacional, os quais, na sua óptica, giravam em torno do seguinte: cultura física, intelectual, moral e social; relação das escolas entre si e com a sociedade; jardins-deinfância e escolas de deficientes 4, primárias, secundárias, agrícolas, comerciais, coloniais, domésticas, industriais e profissionais; escolas superiores e universidades (incluindo as universidades populares); actividades extra-escolares e investigação científica; organização do ensino em função da qualidade e número do pessoal qualificado para prover às necessidades do país; pessoal docente; órgãos de fiscalização e administração da educação; edifícios escolares, internatos e residências estudantis; recursos financeiros da educação. Na parte destes problemas directamente respeitante ao ensino superior, o preâmbulo do Projecto Camoesas apontava, no tocante a inf r a e s t r ut u r a s ,os“ d e f e i t u os í s s i mos ”( i b . ,p.2 26 1 )e d i f í c i o s 4974 Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009 ISBN- 978-972-8746-71-1 escolares e a inexistência de residências para estudantes dotadas de condições que potenciassem a“ c u l t ur aeh i gi e nef í s i c a ”( i b . ,p.2 26 2)d oss e u sut e nt e seq u ec on t r i b uí s s e m“ pa r ao desenvolvimento do seu espírito associativo, do seu senso social, da sua formação pessoal e p a r aame l h o r i ad os e ua mb i e n t ed et r a b a l h o”( i bi de m) .Ma s ,p o rs ob r ee s t e s ,a p on t a v a ms es e t e grandes pecados ao ensino superior português de então, a saber: 1) distanciamento das instituições deste nível educativo relativamente à realidade social e profissional do país; 2) inexistência de democraticidade electiva como método de escolha das autoridades académicas; 3) ausência de comunicação entre as diferentes instituições existentes; 4) inexistência de uma divisão entre cursos profissionalizantes e cursos de doutoramento; 5) multiplicação de organismos desnecessários e inexistência de outros necessários; 6) rendimento insuficiente dos processos de ensino e avaliação dos alunos e de recrutamento e promoção de professores; 7) financiamento exíguo; 8) escassez de investigação científica. Concomitantemente, não deixava o legislador de também ter em conta que a reduzida abrangência da educação superior das c l a s s e spo p ul a r e s ,de vi d aa o“ nú me r ol i mi t a dodeor ganismos educativos [e à] insignificância irrisória das verbas que são consignada sp a r ae s t ee f e i t o”( i b . , p. 22 6 0) . De tudo isto, o relatório preambular extraía conclusão sobre a necessidade de encarar, como medidas a serem tomadas urgentemente, a institui ç ã ode“ c ur s osp op u l a r e ss u pe r i o r e s( …)[ ea] concessão de um importante subsídio para a ed uc a ç ã os up e r i ord a sc l a s s e sp op ul a r e s ”( i b . ,p . 2263), bem assim como a criação de residências estudantis. Sem que estes dois aspectos fossem menosprezados no âmbito das vinte e quatro bases da proposta de lei de João Camoesas, a amplitude das medidas previstas para a educação superior foi maior, tendo-se espargido pelas bases 1ª, 13ª, 14ª, 17ª, 19ª, 20ª e 23ª do documento em causa, como passamos a demonstrar. 4. A educação superior 4.1 Conceito e objectivos da educação superior Desde logo, João Camoesas entendia a educação superior como sendo, de entre as três categorias de educação pública 5, aquela que se ministrava em universidades e em Escolas Su pe r i o r e sEs p e c i a i s ,t e nd opo rob j e c t i v os“ ap r omoção da cultura superior do espírito, a formação do pessoal superior das profissões, a realização de investigação científica em institutos, a organização de uma élite social directiva, o estudo científico e a sua aplicação à u t i l i d a d ena c i on a l ”( i b . , p. 22 66 ) . 4.2. Número e administração das universidades Quanto ao ensino universitário, estipulava-se a divisão de Portugal em três zonas territoriais, cada uma delas sob a alçada das universidades então existentes 6. 4975 Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009 ISBN- 978-972-8746-71-1 À frente de cada universidade e para prover à sua governação quotidiana estaria um reitor, havendo, ainda, directores de faculdades e d ei n s t i t ut os ,t o do se l e s pe r c e b e n do “ uma gratificação mensal, além dos respectivos venci me nt osp e l os e r vi ç od oc e n t e ”( i b. ,p.22 69 ) , c a be n doa osr e i t o r e s , a d e ma i s ,“ umave r b ap a r ade s p e s a sder e pr e s e n t a ç ã o ”( i bi de m) . Ao nível administrativo central, e segundo a vigésima terceira e penúltima base, haveria uma Direcção Geral de Educação Superior, cujo Director Geral teria assento no Conselho dos Directores Gerais do Ministério da Instrução Pública. Constituir-se-ia, também, um Conselho dos Reitores das Universidades. Estes dois últimos órgãos funcionariam sob a supervisão da Secretaria do Gabinete do Ministro, à frente da qual estaria o respectivo chefe de gabinete. 4.3. Faculdades de Ciências da Educação De acordo com a décima quarta base deste Estatuto da Educação Pública, as universidades portuguesas passariam a contar com faculdades de Ciências da Educação, a criar a partir da fusão das Escolas Normais Primárias com as Escolas Normais Superiores. Es t a sn ov a sf a c u l da d e smi ni s t r a r i a mc u r s o s“ d ec a r á c t e re s s e nc i a l me n t epr of i s s i o na l ”( i b . ,p. 2267), nos quais obrigatoriamente constariam as disciplinas de Psicologia, Princípios de Pedagogia, Didácticas especiais, Higiene, Administração, organização e legislação e Prática escolar nas escolas de aplicação. Os cursos em causa seriam sete, a cargo, cada um deles, de uma correspondente secção da Faculdade, e formariam os seguintes profissionais da educação: 1) educadoras de infância; 2) professores de crianças portadoras de deficiência; 3) professores do ensino primário; 4) professores do ensino técnico (elementar e complementar); 5) professores l i c e a i s ;6 )“ pr of e s s or e sded e s e n hoet r a ba l ho sma n ua i s ”( i b. ) ;7 )“ mé d i c o se s c ol a r e s ,( …) p r of e s s or e sd ee d u c a ç ã of í s i c ae( …)i n s t r ut or e smi l i t a r e sdeg i ná s t i c aej og o s ”( i b. ) . Aos cursos de educação de infância, educação de deficientes e ensino primário poderiam candidatar-se os titulares do curso especial dos liceus, o mesmo valendo para quem pretendesse f r e qu e n t a ro sc ur s osdef or ma ç ã odep r o f e s s o r e sd oe n s i n ot é c n i c oc om de s t i n o“ a oe n s i n oda s d i s c i pl i na sd ec a r á c t e rg e r a l ”( i b . ) ,j áq ue ,noc a s od e“ op r o f e s s o rs ed e s t i n a ra oe n s i n oda s d i s c i pl i na sd ec a r á c t e rt é c n i c o” ( i b . )b a s t a r l h e i a po s s ui r“ q ua l qu e rc u r s ot é c n i c o ou p r of i s s i o na l ”( i b . ) .No sc ur s osdef or ma ç ã odep r o f e s s o r e sl i c e a i ss ós ea dmi t i r i aq ue mf os s e portador de um grau académico obtido nas Faculdades de Letras ou nas de Ciências. Candidatos habilitados com o curso das Escolas de Belas Artes teriam acesso à formação de docentes de Desenho e de Trabalhos Manuais,e mc o nd i ç õ e si gu a i sc om “ osp r ofissionais da indústria que possuam conhecimentos gerais e técnicos suficientes, bem como dotes pedagógicos avaliados p orme i od eumapr ov ae s pe c i a l ”( i b. ) .Porf i m,s óosmé di c osp od e r i a mc a nd i da t a r s ea oc ur s o de medicina escolar e só os militares com patente de oficial seriam poderiam vir a ser 4976 Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009 ISBN- 978-972-8746-71-1 seleccionados para a frequência dos cursos de preparação de professores na área da Educação Física. Tanto o Projecto Camoesas esperava destas faculdades que não deixava de prever que, a elas anexos, funcionassem as Escolas de Aplicação, um Consultório Médico-pedagógico, um Con s ul t ór i odeOr i e n t a ç ã op r o f i s s i o n a le“ u m Instituto de Psico-pedagogia Nacional e de Di d á c t i c aExp e r i me n t a l ”( i b . ) . 4.4 Corpo docente Para o ensino superior, pretendia João Camoesas dois géneros de professores: os do quadro e os de além do quadro. Os professores do quadro subdividir-se-iam em duas categorias: professores ordinários e professores assistentes. Os professores livres e os professores extraordinários constituiriam o grupo de docentes além do quadro. Se é certo que tão só isto era explanado quanto aos professores deste grau de ensino, menos certo não é que a proposta de lei, a partir do décimo segundo parágrafo da sua vigésima base, apresentava um conjunto de medidas aplicáveis à generalidade do professorado nacional, logo, também ao do ensino superior. Assim era que se estipulava que a cada categoria profissional correspondesse um vencimento único, sem prejuízo, todavia, de um acréscimo de remuneração, n oc a s od e ,d ur a n t e um t r i é n i o,“ op r o f e s s o r( …)[ t i ve s s e ]r e ve l a do d ot e se s p e c i a i sde c ompe t ê n c i ae d e d i c a ç ã oa oe ns i no ”( i b . ,p. 2269), dotes especiais estes devidamente c ompr o v a d osp or“ um Tr i b un a lSup e r i ord eCl a s s i f i c a ç ã od eSe r v i ç o sDo c e n t e sc o mp os t ode um delegado da Junta Superior de Educação, do inspector técnico ou do seu delegado e de um d e l e ga d odop r o f e s s o r a d opo rc a d ar a moe d u c a t i v o ”(ibidem). Pelo contrário, se a avaliação trienal concluísse pela incompetência e negligência, os professores em causa veriam, à primeira vez, o seu salário ser diminuído em vinte por cento e, à segunda vez, seriam colocados na situação de suspensão de funções sem direito a auferir vencimento. A competência e dedicação seriam, aliás, os únicos critérios a ter em conta para a promoção e a concessão de nomeação definitiva aos docentes, excluindo-se liminarmente o critério da antiguidade. Os professores teriam que se apresentar, ciclicamente, a uma inspecção médico-escolar e, se padecessem de alguma doença profissional, o seu tratamento decorreria por conta do Estado. Anualmente, teriam direito a candidatar-se a bolseiros a fim de desenvolverem missões de estudo no estrangeiro. Teriam um regime disciplinar próprio e eram obrigados a exercer a docência em regime de dedicação exclusiva, salvo excepções dependentes de autorização ministerial. Poderiam reformar-se uma vez completados vinte e cinco anos de serviço, recebendo uma pensão equivalente à totalidade do seu salário. Os seus filhos beneficiariam de “ umas i t u a ç ã oe s pe c i a ln osi n t e r na t osof i c i a i s ”( i b i d e m) . 4977 Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009 ISBN- 978-972-8746-71-1 4.5. Residências universitárias O Estatuto de João Camoesas pretendia que, em Lisboa, Porto e Coimbra -as cidades universitárias- se implantassem residências para estudantes, geridas por estes e financiadas pela “ qu a r t ap a r t edop r o du t oda sma t r í c u l a se mc a daFa c u l da deouEs c o l aSu pe r i or( …)a l é md o subsídio que o Governo fica autorizado a estipular-lhes pelas receitas do Fundo de Educação Na c i on a l ”( i b . ) . Uma quota-parte dos lugares disponíveis nestas residências estudantis seria afectada a estudantes bolseiros, os quais, contudo, depois de terminados os seus cursos e ao longo de uma década, estariam obrigados a devolver ao Estado o dinheiro dispendido com o seu alojamento naquelas residências. 4.6. Universidades populares Uma última referência se faça ao modo como o Projecto Camoesas tratou o caso particular das universidades populares. Assim, como objectivo, era-lhes fixada a promoção e o a pe r f e i ç o a me nt oda“ e du c a ç ã of í s i c a ,i nt e l e c t ua l ,mor a l ,s o c i a lea r t í s t i c ad a sc l a s s e sp op ul a r e s ” (ib., p. 2268). Para cumprimento deste desiderato, incumbiria a estes estabelecimentos de ensino a leccionação d e“ c u r s o ss i s t e má t i c ospa r ao p e r á r i o s ”( i bi d e m) ,c om adu r a ç ã od eq ua t r oa no seai n t e n ç ã od e aumentar a cultura geral dos alunos que os dema n da s s e m.Es t e sc ur s os– de n omi n a d o sCu r s o s Populares Superiores- versariam sobre matérias do âmb i t oda“ hi s t ó r i a ,g e og r a f i a ,f i l o s of i a , s o c i o l o gi a ,mor a lea r t e ”( i b . ) . As universidades populares financiar-se-iam através do orçamento do Estado, com uma verba anual de quinhentos mil escudos7. Aos professores do Estado que nelas exercessem o seu múnus aplicar-se-ia o regime de avaliação trienal atrás referido. 5. Nota conclusiva Gorou-se, claro, a possibilidade de concretização do Projecto Camoesas, devido à queda do governo que o assumira. Vale o documento, não obstante, por ter configurado, ao nível de uma proposta de lei, a primeira manifestação histórica da intenção de legislar, em texto único, sobre a globalidade da educação portuguesa, assentando as directrizes de um seu desenvolvimento sem incidentes, só possível num quadro de estabilidade assegurado por uma lei de bases. Mas vale, também, por uma certa antevisão do que deveria ser o ensino superior em Portugal. Com efeito, o Projecto Camoesas encerrava quatro ideias que o futuro veio a consagrar: a constituição de um Conselho de Reitores, a fundação de Faculdades de Ciências da Educação, a avaliação dos professores do ensino superior com base, unicamente, no mérito (competência e 4978 Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009 ISBN- 978-972-8746-71-1 dedicação) e a necessidade de criação de residências estudantis parcialmente financiadas por verbas advindas das propinas pagas pelos estudantes. Será caso para dizer que, no tocante ao ensino superior, o Projecto Camoesas, em alguns dos seus aspectos, não foi apenas um projecto, mas obteve, com o tempo e através da acção de terceiros, uma concretização prática. Notas 1 Daqui a designação deste documento por Projecto Camoesas, sendo também conhecido, no entanto, como Estatuto da Educação Pública. 2 Só governos, a Primeira República, nos seus incompletos dezasseis anos de vida, teve cerca de meia centena. 3 João Camoesas regressaria à pasta da Instrução Pública entre 1 de Agosto e 16 de Dezembro de 1925, num ministério encabeçado por Domingos Pereira. 4 Es c o l a s“ p a r aa no r ma i s ” , nal e t r adot e xt o. 5 As outras duas eram a educação geral e a educação especial. 6 A multissecular Universidade de Coimbra e as então recentemente criadas universidade de Lisboa e Porto. 7 Sensivelmente dois mil e quinhentos euros, valor este cujo significado terá que ser reportado à época (1923) e não à actualidade (2009). Bibliografia Bandeira, Filomena (2003). Camoesas, João José da Conceição. In: Nóvoa, António (dir. de. Dicionário de educadores portugueses. Porto: Asa, pp. 237-241. Casulo, José Carlos (1988). As leis de bases da educação nacional: percurso histórico e condições de aplicabilidade. Revista Portuguesa de Educação, vol. 1, nº 3, pp. 21-28. Carvalho, Rómulo de (1986). História do Ensino em Portugal. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. Cortesão, Jaime (1923). A Reforma da Educação. Seara Nova, nº 25. Nóvoa, António (1986). O projecto da Reforma Camoesas (1923): uma referência histórica no pensamento do Prof. João Evangelista Loureiro. Re v i s t ad aUn i v e r s i da d edeAve i r o– série Ciências da Educação, vol. 7, nº 1-2, pp. 113-121. Portugal. Proposta de lei sobre a reorganização da educação nacional. Diário do Governo, II série, nº 151, 2 der Julho de 1923, pp. 2258-2273. Sérgio, António (1923).Virtudes fundamentais da reforma da educação. Lisboa: s/ed. Serrão, Joaquim Veríssimo (1990). História de Portugal (vol. XII): a Primeira República (1910-1926). Lisboa: Editorial Verbo. 4979