Boletim da ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA PROPRIEDADE INTELECTUAL Fevereiro de 2004 - nº 50 A pirataria de livros causa prejuízo de R$ 400 milhões/ano Um dos 14 fundadores da Associação Brasileira para a Proteção dos Direitos Editoriais e Autorais - ABPDEA, e hoje diretor da entidade, Jackson Alves de Oliveira, trouxe sua experiência de 21 anos como editor especializado em livros didáticos, para falar da pirataria de livros, copiados sem autorização. E a maior incidência dessa atividade criminosa ocorre nos campi das universidades brasileiras, ou no entorno das escolas, gerando prejuízos de R$ 400 milhões por ano. Página 4. Livro esgotado e pirataria das editoras Foram alguns dos temas levantados que aqueceram os debates após a palestra do almoço da ABPI, realizado no Rio de Janeiro. Página 5. Nº 50 • Fevereiro de 2004 Software Sessão de Comercial: Inovação Conhecimentos Alessandra Del Debbio, diretora Tradicionais jurídica da Microsoft Informática Ltda., é a convidada para proferir palestra no próximo almoço da ABPI que será realizado no dia 18 de março de 2004, no America Business Park, em São Paulo. O tema que ela vai desenvolver será “Software Comercial: Inovação”. Página 8. Boletim da ABPI De 15 a 19 de março, na cidade de Genebra, será realizada a 6ª Sessão do Comitê Intergovernamental sobre Propriedade Intelectual e Recursos Genéticos, Conhecimentos Tradicionais e Folclore, no âmbito da OMPI. Página 8. 1 Notas Editorial Os editores e a cópia privada de obra esgotada Novos associados Gabriel F. Leonardos Membro do Conselho Editorial da ABPI Na reunião-almoço da ABPI realizada em 22.01.2004, no Rio de Janeiro, proferiu palestra o dr. Jackson Alves de Oliveira, editor e diretor da APDEA - Associação Brasileira para a Proteção dos Direitos Editoriais e Autorais. A palestra foi especialmente oportuna, uma vez que um dos dispositivos mais discutidos na Comissão de Direito Autoral da ABPI tem sido o art. 46, II da LDA, que limita a possibilidade da cópia privada a “pequenos trechos” da obra, o que aparentemente está em descompasso com a recente lei 10.695/2003, que modificou o art. 184 do Código Penal, a fim de passar expressamente a excluir a ilicitude, sem a obrigação de ser limitada a pequenos trechos, da “cópia de obra intelectual ou fonograma, em um só exemplar, para uso privado do copista, sem intuito de lucro direto ou indireto”. No final de 2003, a Comissão, levando em consideração tal modificação no Código Penal bem como os direitos de autores e editores, de um lado, e o interesse público existente na disseminação da cultura e na liberdade de expressão e informação, de outro, sugeriu para discussão interna na ABPI que as seguintes modalidades de reprodução passassem a ser excluídas de ilicitude em futura modificação do art. 46 da LDA: “(i) a reprodução em um só exemplar de qualquer obra para uso privado do copista, desde que feita por este ou a seu pedido, sem intuito de lucro, sendo vedados o oferecimento e a disponibilização ao público de exemplar original ou de exemplar assim reproduzido; (ii) a reprodução integral, por biblioteca de acesso ao público, para fins de consulta, de obra esgotada pertencente a seu acervo. No caso de nova edição desta obra, a biblioteca deverá, no prazo de um ano, substituir a reprodução informal por exemplar original, inutilizando aquela reprodução; e (iii) a reprodução integral, inclusive por meios eletrônicos, de artigos isolados, exclusivamente publicados em periódicos há mais de 12 (doze meses), desde que esta reprodução seja para fins didáticos e sem finalidade de venda”. Note-se que jamais se desejou permitir novas “edições” não autorizadas, com vendas para o público, inclusive porque, neste caso, não apenas seriam prejudicados os editores, mas também estariam sendo feridos direitos do autor. A ABPI continua discutindo a questão e, por isso, percebe-se a importância da qual se revestiram a excelente palestra do dr. Jackson e os animados debates que a sucederam, os quais estão relatados em detalhes nas páginas centrais deste Boletim. Indagado sobre a liberdade de realização de fotocópias de livros já esgotados, o dr. Jackson esclareceu que muitas vezes os editores de livros didáticos têm conhecimento de que um livro está esgotado no meio do ano letivo, mas, nessa época, freqüentemente, o livro já está sendo atualizado pelo autor e, por isso, os editores preferem aguardar o início do ano letivo seguinte para poder relançar a obra já atualizada. Diante dessa prática do mercado, os editores não poderiam jamais concordar com a realização de cópia privada, tanto de livro que seja encontrado à venda, quanto de livro esgotado há pouco tempo, devendo ser mantida a ilicitude desse ato ao menos na esfera cível (uma vez que, na esfera penal, a realização de cópia privada de qualquer obra, esgotada ou não, já foi descriminalizada pela lei 10.695/2003). Não obstante, respondeu o dr. Jackson, no caso de obras esgotadas há longo tempo, os editores não teriam qualquer objeção a que fosse livre a realização de cópia privada. Parece, assim, que nossa Comissão de Direito Autoral poderá retomar os trabalhos sobre o tema gozando agora de valiosos subsídios a respeito do mercado editorial. 2 Boletim da ABPI O Comitê Executivo e o Conselho Diretor da ABPI aprovaram em 22 de janeiro as propostas de filiação de: Abreu, Merkl e Advogados Associados (Maria Inez Araujo de Abreu); Ana Cristina Almeida Müller (Castro, Barros, Sobral, Gomes Advogados); Britânia Marcas e Patentes S/C Ltda. (Luiz Esteves Ortega); Claudia Christina Schulz (Castro, Barros, Sobral, Gomes Advogados); Fábio Carraro (Carraro, Costa e Farias Advogados Associados S/C); Geovana de Oliveira Rosales (Vieira de Mello Advogados); Luiz Fernando Pinheiro G. de Carvalho (Escritório de Advocacia Sergio Bermudes). Licença de software A Computer Law Association CLA realizará, com o apoio da ABPI, mais um CLA Videoconference Roundtable, a ser transmitido dos Estados Unidos, no dia 3 de março, no auditório de Pinheiro Neto Advogados, à rua Boa Vista, 254, 11º andar, São Paulo. O conferencista convidado será Chris Nadan, do Conselho Geral Associado para a Sun Microsystems, Inc. and Legal Director of World Wide Software & OEM Sales. As inscrições deverão ser feitas na CLA: www.cla.org/cla_roundtables.htm. Dúvidas com Heloísa, telefone (11) 3247-8598, ou e-mail [email protected]. Estatuto da ABPI O estatuto consolidado da ABPI, com as alterações aprovadas na Assembléia Geral Extraordinária de 18 de dezembro de 2003, e registrado no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, do Rio de Janeiro, encontra-se disponível no sítio da associação. Cartas para a redação do Boletim da ABPI Envie suas mensagens para a redação do Boletim da ABPI pelo e-mail [email protected] Informações, críticas e sugestões serão avaliadas e respondidas, podendo ser publicadas ou não no Boletim após estudo de cada caso. Fevereiro de 2004 • Nº 50 Notas Propriedade Intelectual tem cursos na FGV A Escola de Direito de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas (FVGEDESP), está organizando, em módulos independentes, novos cursos de extensão e de especialização lato sensu em propriedade intelectual, com início em 15 de abril de 2004, sendo os coordenadores drs. Manoel Joaquim Pereira dos Santos, Wilson Pinheiro Jabur e Pedro Paranaguá Moniz. As inscrições estão abertas até o dia 5 de março. O curso está estruturado em quatro módulos semestrais e independentes: Módulo A - Introdução à propriedade intelectual e direito autoral - Introdução à teoria da propriedade intelectual e da concorrência desleal, O Direito internacional da propriedade intelectual, Direito autoral; Módulo B - Propriedade Industrial - Criações industriais, Sinais distintivos, Segredos de negócio e concorrência desleal; Módulo C - Contratos e procedimentos em propriedade intelectual - Contratos e tributação, Sanções e procedimentos; Módulo D - Novas tecnologias e direito de entretenimento - Abordando nomes de domínio, proteção do software, das bases de dados, de métodos de fazer negócio na Internet e das expressões culturais tradicionais, cultivares e biotecnologia, direito do entretenimento e leis de incentivo à cultura, entre outros temas. Informações em: www.edesp.edu.br, link Cursos, sessão Especialização. Associações divergem sobre defesa dos direitos autorais Os novos coordenadores das Comissões de Estudos O Jornal do Commercio, do Rio de Janeiro, publicou matéria (dia 4/2/04, na seção de Direito & Justiça), abordando a defesa de direito autoral na questão que envolve livros com edição esgotada. Divergências estão surgindo nos debates sobre a proposta de alteração do artigo 46 da lei 9.610/98, que dispõe sobre os direitos autorais. Enquanto a ABPI se posiciona a favor da permissáo da reprodução de livros cujos contratos de edição não estejam em vigor, segundo o presidente Gustavo S. Leonardos, a ABPDEA argumenta que livros esgotados são aqueles que estão momentaneamente fora de circulação, portanto, não podem ser copiados, mesmo que seus contratos de edição não estejam mais em vigor. Esse debate deriva da apresentação do diretor da ABPDEA, Jackson Alves de Oliveira, sobre a questão da pirataria de livros didáticos, durante almoço da ABPI. As duas associações são unânimes na aprovação da proibição da reprodução, quando se trata de livros esgotados e cujos contratos de edição ainda estão em vigor. Já estão definidos os novos coordenadores e vices-coordenadores das dez Comissões de Estudo da ABPI: Nº 50 • Fevereiro de 2004 Patentes Coordenador: Gustavo José Ferreira Barbosa Vice-coordenadora: Maria Lavinia L. Maurell Transferência de Tecnologia e Franquias Coordenadora: Juliana L.B. Viegas Software e Informática Coordenador: José Henrique B. Moreira Lima Neto Vice-coordenador: Marcello do Nascimento Direito Autoral Coordenador: Guilherme C. Carboni Vice-coordenadora: Tatiana Campello Lopes Direito da Concorrência Coordenador: José Carlos Vaz e Dias Vice-coordenador: João Marcelo de Lima Assafim Indicações Geográficas Coordenador: Pietro Ariboni Vice-coordenadora: Laetitia Maria Alice Pablo d’Hanens Integração Regional Coordenador: Rodrigo Affonso de Ouro Preto Santos Rodrigo S. Bonan de Aguiar eleito delegado titular da ASIPI Em segundo turno, o dr. Rodrigo S. Bonan de Aguiar foi eleito, com 53,7% dos votos, delegado titular do Grupo Brasileiro da ASIPI. A delegada suplente foi a dra. Marta Pequeño Manfredini. Marcas Coordenador: Ricardo P. Vieira de Mello Vice-coordenadora: Vivian de Melo Silveira Biotecnologia Coordenador: Gabriel Di Blasi Jr. Vice-coordenadora: Leonor Magalhães Peres Galvão de Botton Rodrigo S. Bonan de Aguiar Boletim da ABPI Repressão às Infrações Coordenador: Ricardo Fonseca de Pinho Vice-coordenador: Fabiano de Bem da Rocha 3 Matéria de capa A pirataria de livros didáticos Jackson Alves de Oliveira é editor e diretor há 21 anos da MEDSI Editora Médica e Científica Ltda., uma das catorze grandes editoras especializadas em livros técnico/científico/didáticos, que fundaram a Associação Brasileira para a Proteção dos Direitos Editoriais e Autorais - ABPDEA, atualmente com 53 participantes. O dr. Jackson proferiu breve palestra sobre a situação do mercado, a atuação educativa da ABPDEA e suas ações para conscientizar e tentar reduzir a pirataria de livros. Ele foi o convidado da ABPI para apresentação durante a reunião-almoço, no dia 22 de janeiro, no Rio de Janeiro. Essa atividade criminosa que, segundo Jackson, “começa nos campi de universidades brasileiras e grassa pelo seu entorno e deteriora o mercado livreiro” vem dando prejuízos estimados em R$ 400 milhões por ano, mais de 35% de todo o faturamento global da indústria brasileira de livros didáticos. Numa rápida apresentação, o palestrante afirmou que a ABPDEA foi criada na esteira da lei 9.610/98, do direito autoral, com o objetivo de esclarecer, orientar e responder a dúvidas quanto à lei e fiscalizar e punir seus infratores. Fundada em 1999, a ABPDEA já realizou as primeiras apreensões e centrou suas atividades na produção de cartilhas de esclarecimento e dirigiu milhares de cartas a reitores, diretores de faculdades, professores, bibliotecários, autores, livreiros e diretórios acadêmicos. “Durante esses quatro anos, a ABPDEA tem trabalhado bastante, conversando com reitores”, porque, segundo Jackson, “o grande foco da pirataria do livro é dentro das universidades. Procuramos orientar, fizemos uma cartilha, distribuímos essa cartilha, conversamos com os professores, e depois passamos às ações na esfera judicial”. “A lei é clara no que tange à pirataria de livros”, afirma o editor. “Ela define o que é legítimo e o que é crime e quais as sanções a serem 4 aplicadas em caso de infração. Só é permitida uma única cópia, de pe-quenos trechos, para uso privado do copista e desde que seja feita sem intuito de lucro. Hoje, a pirataria campeia no Brasil todo em vários setores e nos livros também é granJackson Alves de Oliveira de a pirataria. Mesmo assim, poucas pessoas se dão conta da grande perda que as sos são movidos contra copiadoras editoras têm com a pirataria hoje no no país: em todas elas foi dado flaBrasil”, reclamou Jackson. “Quando grante e houve apreensões (numa estivemos na CPI da Pirataria, em das mais recentes, em Recife, foram Brasília, a primeira pergunta dos apreendidas mais de mil cópias de deputados foi exatamente esta: exis- livros). Com uma sentença lavrada pelo juiz Mantovani Cavalcanti Colate pirataria do livro?” O problema é no Brasil inteiro, res em ação movida contra a Unifor, mas quem mais sofre são os livros que alegava não ter responsabilidade didáticos, principalmente na área téc- com as atividades da copiadora nica, livros de medicina, livros de atuante em seu campus (segundo o direito, segundo o palestrante. O dire- palestrante, “a Universidade é co-ré e tor da ABPDEA ressalva que não estão responsável pelo que acontece em preocupados com aquele aluno que suas dependências, em especial neste tira uma cópia de um ou alguns capí- caso de crime contra a Constituição”), tulos do livro, pequenos trechos. “Nos- a ABPDEA ganhou força para increso foco é o livro totalmente copiado, mentar sua luta contra copiadoras que funcionam dentro do campus de isso dentro das universidades.” Ele uma universidade, onde estudantes conta o caso da Universidade de Fortareproduzem impunemente livros leza, onde o DCE distribuía a todos os inteiros, em prática que lesa autores e alunos a lista dos livros adotados e os editores, e freqüentemente estimulapreços da cópia. “Uma verdadeira da pelos próprios orientadores. “Eslivraria pirata dentro da universida- tamos tentando partir agora para de”, desabafa Jackson. ação cível e criar uma jurisprudência. O editor pondera que, “como Antes da lei do direito autoral parceiros, poderiam fazer cópias dos (9.610/98), a punição era de 50 centalivros encalhados, mas não, eles só vos para quem fosse pego copiando o querem aqueles livros que vendem, livro inteiro. Não havia nenhuma que são sucesso. A ABPDEA vem, proteção aos editores. Não havia prodesde a sua criação, batalhando para teção ao autor”, argumenta. conscientizar os professores das uniSegundo seu raciocínio, a editoversidades. Quando não se conse- ra, como todo comerciante que se gue, quando não é possível, estamos estabelece, visa lucro. “Mas existe o partindo para a área policial, tentan- autor”, destaca o palestrante, “aquele que escreve, se dedica, sacrifica suas do coibir esse crime”. horas de lazer, sacrifica as horas com Mais de cem ações em andamento a família para escrever um texto, que Ele contou que a associação tem é publicado e colocado no mercado hoje 102 ações em curso no Brasil. pela editora. Se é sucesso, vai para a Alguns dos acusados são reinciden- cópia, vai para a pirataria, como tes uma, duas, três vezes. Os proces- acontece com CDs e outros artigos.” Boletim da ABPI Fevereiro de 2004 • Nº 50 Matéria de capa Debates Gustavo S. Leonardos - Gostaria de lembrar aquela situação nos Estados Unidos sobre um proprietário de copiadora que já recolheu os direitos. Gustavo S. Leonardos Jackson Alves de Oliveira Nos Estados Unidos, pode-se tirar cópias de partes do livro. Só que, ao tirar cópias de parte dos livros, imediatamente é creditado à editora o valor referente àquela cópia. Tudo é controlado. A editora recebe por aquelas cópias e faz a divisão com seus autores. Então, o autor é remunerado e a editora é remunerada. Aqui no Brasil, estamos combatendo a pirataria, onde o livro indicado no início do ano letivo é copiado no próprio campus. Se visitarem uma faculdade de medicina, em volta da faculdade, os senhores vão encontrar umas vinte casas copiadoras que deveriam fazer cópias de trechos, papéis etc. Mas em cada uma delas os senhores poderão encontrar cópias de livros já prontas para venda, à disposição do aluno. O aluno chega e pede o livro, o funcionário pega o livro, a cópia malfeita do livro que é sucesso já está pronta na prateleira. Encontram-se todos os livros adotados em quantidade. Estamos agora com um pirata, também em Fortaleza, que, além de abastecer o mercado, já exporta para João Pessoa e Natal. Ele é um policial da Rodoviária Federal. Ele vai se valer disso para exportar livros piratas. Esse cidadão já foi autuado duas vezes e agora será pela terceira vez. Nº 50 • Fevereiro de 2004 Pesquisa que uma aluna realizou para integrar sua tese colocou o preço do livro em terceiro lugar entre as causas da pirataria. Em primeiro lugar ela colocou o fato de dar muito trabalho comprar o livro, pela dificuldade de ir à livraria. A segunda causa é que o aluno muitas vezes não necessita de todo o livro, pois deseja estudar apenas dois ou três capítulos. Terceiro, o preço do livro. O preço do livro, todos nós sabemos, é relativo ao livro e relativo à tiragem. Na área de medicina, por exemplo, as tiragens são pequenas, porque na medicina freqüentemente os livros estão mudando. Para um livro de terapêutica, por exemplo, a cada dois anos é preciso tirar uma nova edição. As tiragens são pequenas e temos que vender aquele livro em dois ou três anos. Na anatomia, as tiragens são maiores, mas sempre há atualizações. Além disso, temos a concorrência da pirataria que hoje é de 30% a 40%. Como funciona hoje essa questão do preço? A editora estabelece o preço final do livro em função do custo e sua margem. As livrarias têm um desconto ao adquirir o livro e fazem a revenda aos leitores. José Carlos Tinoco Soares O senhor pensou também na pirataria dos editores? Eu já escrevi alguns livros. E, não faz muito, fiquei surpreso porque até então eu não tinha a preocupação de saber quanto eu ganhava. Aí, fiz um levantamento dos pagamentos que me eram feitos, e fiquei realmente assustado. Para o meu tratado de patentes, que é colocado na faixa de R$ 180,00 a 190,00, eu recebo R$ 4,00 por exemplar vendido. Nesse novo tratado que eu lancei, falei: “Não. Eu vou mudar o contrato e vou colocar minha remuneração sobre o preço de capa”. Eu sei lá o que é preço de capa. Eu recebi agora a primeira prestação de contas. O tratado em dois volumes é vendido a R$ 366,00 ou 396,00 e o editor coloca pra mim o preço de capa de R$ 110,00. Boletim da ABPI Então, eu passei a receber R$ 7,00. Ora, eu fico aqui a vida inteira pesquisando, trabalhando, consultando, e no final das contas eu não recebo nada. O que eu devo fazer José Carlos Tinoco Soares no futuro para evitar esse quadro? Eu fiz mais um trabalho agora. Eu resolvi fazer a impressão e venda por minha conta. Pois eu acho que é uma afronta: aquele que escreve simplesmente não ganha nada e as editoras ficam ricas com o nosso trabalho. Jackson Alves de Oliveira Estou há quarenta anos no livro, tenho longa experiência sobre isso. Preço de capa é o preço estabelecido pela editora para ser vendido. Se o livro é vendido por R$ 300,00, a editora coloca na tabela dela os preços. Nós estabelecemos o preço e damos desconto para a livraria, que pode ser de 30%, 40%, dependendo da livraria. No mundo todo, o preço de capa é estabelecido pela editora. O senhor tem um contrato de 10% do preço de capa, o livro é vendido por R$ 370, o senhor terá R$ 37,00 por livro vendido. O preço líquido é preço de capa menos o desconto que for dado à livraria. Existem contratos de preço líquido também. Quando o autor é muito conhecido e a gente tem a certeza de que vai ser um sucesso, a gente passa o preço de capa. Quando o autor vem pedir pelo amor de Deus para fazer o livro, e a gente não acredita muito, a gente passa o preço líquido e às vezes até mesmo menos de 10%. Se o senhor tem um contrato, é isso. Agora, lamentavelmente, é verdade 5 Matéria de capa que existem editoras que não respeitam o autor. É preciso saber escolher a editora. Na área de medicina, eu diria ao senhor, na ponta da língua, quais as que respeitam e quais as que não respeitam. Nas outras, eu não me atreveria. Custódio Afonso Torres de Almeida - O mercado de livros é grande para educação e cultura, e vocês são responsáveis pela disseminação dessa realidade. Eu quero fazer uma sugestão e uma pergunta. A sugestão: se os EUA controlam as cópias, aqui também tem Internet, computador, eu acho que há possibilidade de a associação que o senhor está representando aqui organizar-se e viabilizar esse controle, já que a informática é hoje um instrumento poderoso para transformar isso em realidade. A pergunta: o senhor tem controle sobre as cópias? Como é que Sob controle, com o mesmo critério adotado pelos EUA e Espanha, onde o livro e a parte tirada serão remuneradas. Quanto ao combate, o que a ABPDEA fez? Começamos orientando, distribuindo cartas, cartilhas, orientamos reitores, professores, da ajuda que precisávamos deles para acabar com esse processo dentro das universidades, dentro das faculdades. Recebemos alguma ajuda. A UFMG proibiu terminantemente tirar cópias de livros dentro do campus. Quando abrimos o processo contra a Universidade de Fortaleza, o reitor e o advogado da Universidade alegaram que estavam apenas cedendo espaço para o DCE e que eles não eram responsáveis por aquilo. O juiz que julgou a causa, por sinal, ex-aluno dessa Universidade, deu seu parecer: “O reitor é responsável por tudo o que se passa dentro da Universidade”. E condenou a Universidade. Se houver erros, primeiro nós orientamos. Mandamos cartas para os responsáveis. Senão, informamos a delegacia, que vai fazer a visita. Em todas as visitas foi encontrada uma grande quantidade de livros, produzidos e prontinhos para serem vendidos. Aí é a polícia que entra. chamar de eletrônico. Tecnologicamente, você tem condição, daqui do Rio de Janeiro, de controlar uma cópia eletrônica de um livro que está sendo impresso em Manaus. Você tem condição de saber a hora, para quem foi, tudo. Contudo, a questão da fotocópia do livro já impresso, propriamente dita, passa por uma mudança de todo o sistema, porque, mal comparando, poderia ser aproveitado o sistema do ECAD, que utilizamos para o recolhimento de direito autoral de música; você pode ter um ECAD do livro. Não há nada que impeça de ser criado. Isso implicaria a mudança do sistema de cultura dos editores, das copiadoras, um monte de gente. Passaria sobretudo pela cultura das universidades, que deveriam fornecer dentro da pasta do professor esclarecimentos sobre a cópia, sobre a cópia legal e ilegal. Custódio Afonso Torres de Almeida - As delegacias podeCustódio Afonso Torres de Almeida pretende controlar? Na minha faculdade, onde eu estudei, não era no entorno que tinha empresas. Eles construíram um shopping, dentro da universidade, uma hipercopiadora. Tiraram cópias em série, dentro da universidade, uma coisa impressionante. Como é que se vai controlar se fotocopiou-se toda ou apenas parte da obra, como o senhor vê esse tipo de controle para sanar a pirataria? Jackson Alves de Oliveira Com relação à sugestão, já existem firmas sérias, criando esse tipo de controle e softwares e que devem colocar ainda este ano em funcionamento onde ela vai permitir o uso, tirar cópias, partes do livro. 6 riam autuar não só as editoras como as copiadoras que integram essa rede informatizada, e exigir que, à medida que se fotopia parte das obras, fossem remuneradas as editoras. Jackson Alves de Oliveira Ao visitar essas casas, muitas são empresas informais que não têm CNPJ; é muito difícil fazer qualquer coisa contra esse pessoal. Quando tivermos condição de controlar, aí a gente pode fazer alguma coisa. Por enquanto, não há condição de controle. Flávio Leonardos - Como advogado da ABPDEA, gostaria de esclarecer duas coisas ao Custódio: é extremamente fácil hoje montar um esquema de controle com tudo aquilo que podemos Boletim da ABPI Flávio Leonardos Há movimento, sim, dentro da Câmara Brasileira do Livro, para se começar a estudar um sistema de controle de cópias de livros, esse livro papel e não o livro eletrônico. O livro eletrônico, você tem lá nos EUA o Amazon Book e na França, a Achete, que também tem um sistema de controle. Nunca ouvi falar que outra editora tivesse um sistema parecido. Valdir Rocha - Os exemplos que o senhor deu foram de reprografia tradicional. O Flávio mencionou agora o livro eletrônico. Gostaria de perguntar sobre a cópia digital do livro papel, viável através de um scanner manual. O scanner popularizou-se a tal ponto que, por Fevereiro de 2004 • Nº 50 Matéria de capa exemplo, no recente caso judicial relativo às dificuldades da empresa Parmalat, vários escritórios de advocacia estão acompanhando o processo e todos querem tirar cópia dos autos. Então, o estagiário vai consultar, escaneia os autos, e vai para uma loja, baixa aquele arquivo digital no computador da loja e a loja imprime as peças em papel. Isso pode ser feito em livros também. Um aluno da universidade escaneia o livro, leva a memória digital para fora da universidade, baixa no computador, envia por e-mail e pode imprimir até em casa. A sua entidade já se deparou com esse problema e tem tomado alguma providência nesse sentido? Jackson Alves de Oliveira Não, ainda não tivemos esse tipo de problema. Tivemos alguma coisa parecida, dentro de uma universidade brasileira, os funcionários Valdir Rocha públicos pegavam os livros e copiavam dentro da Universidade de Brasília, com papel do governo. Fizemos a denúncia, a polícia apreendeu uma grande quantidade de exemplares. Roberto Vieira de Mello - Entramos agora em pirataria eletrônica. A Internet, sabemos que é um campo fértil para proliferação das violações das obras intelectuais, notadamente das obras literárias, várias obras são usadas indevidamente e divulgadas através da rede. Quanto aos livros didáticos, têm sido também pirateados através da Internet? Jackson Alves de Oliveira Não. Ainda não. Nº 50 • Fevereiro de 2004 Luiz Edgard Montaury Pimenta - A pessoa que usa o scanner, leva para casa e depois reproduz pode estar fazendo apenas uma cópia para uso privado. O art. 46, inciso II, permite a cópia de pequenos trechos. A lei que modificou os artigos 134 do Código Penal, § 4, do 184, permite sim a cópia para uso privado. O que ele não permite é a cópia visando o lucro. Vivian de Melo Silveira Na Comissão de Estudos de Direitos Autorais, a gente discutiu muito a alteração do artigo 46 da lei em que se falou sobre a cópia de livros esgotados. Quem estudou Direito sabe que muitos livros indicados pelos professores eram livros esgotados. Você tinha acesso a dois volumes dentro da biblioteca da faculdade, e poderia pesquisar na biblioteca, mas, havendo uma turma de 180 alunos, dois volumes não eram suficientes, e, ao mesmo tempo, era proibido fazer cópias, nem mesmo de uns poucos capítulos. Sempre causou muito problema a proibição de cópia de um livro esgotado. Qual a sua opinião e como proceder em relação ao livro esgotado? Jackson Alves de Oliveira A posição do setor, mesmo quanto ao livro esgotado, é que alguém detém o direito desse livro. Quem detém esse direito é a única pessoa que poderia autorizar copiar esse livro. Ele não reproduziu com a editora, por isso está esgotado. Ou ele não quer, que é um direito dele, ou porque o livro está desatualizado. A posição dos editores é que no livro esgotado deve ser consultado o autor, detentor dos direitos do livro. Só ele ou a editora, se a editora ainda tiver o direito de produzir o livro, só os dois é que podem autorizar a cópia desse livro. Gabriel Leonardos - Gostaria de explorar mais detalhes sobre o livro esgotado. Aqui na ABPI discutimos uma possível modificação da lei autoral. Muitos entendem que a lei atual não atende ao interesse público de disseminação da leitura, Boletim da ABPI das idéias, e o senhor deixou claro em sua exposição que a ABPDEA combate “a cópia integral dos livros didáticos adotados no início do ano letivo”, ou seja, livros que estão disponíveis para a venda aos alunos. Em que medida uma eventual modificação do artigo 46 da lei de direito autoral, no sentido de retirar a ilicitude da cópia do livro esgotado, ou pelo menos de permitir a cópia do livro esgotado em determinadas circunstâncias para não tornar ilícita a reprodução, estaria afetando o interesse econômico direto das editoras? Salvo melhor juízo, parece-me que, uma vez que o livro está esgotado, não haveria nenhuma ofensa aos interesses das editoras. O que ocorre hoje em dia é uma situação de fato muito interessante, para não dizer trágica: como a lei não permite essa exceção, na prática vemos que em todos os cursos de pós-graduação do Brasil a lei trans- Roberto Vieira de Mello forma os estudantes em criminosos. Porque é comum todo estudante ser obrigado a tirar fotocópias dos livros esgotados, para os quais não há previsão de serem novamente editados, sob pena de não se poder consultar, citar aquele livro. Então, a lei de direito autoral está impedindo a circulação de idéias. Esse foi um debate muito grande na ABPI, que ainda não tem uma opinião formada, pois não foi adotada uma deliberação da associação, mas muitos de nós entendem que a lei falha nesse ponto, que deveria ser mais liberal em relação à possibilidade de cópia de livro esgotado. Gustavo S. Leonardos - Esclareça-se, dr. Jackson, que estamos sem- 7 Matéria de capa pre cogitando a cópia para fins privados, sem qualquer finalidade de lucro. Jackson Alves de Oliveira Muitas vezes os editores de livros didáticos têm conhecimento que um livro está esgotado no meio do ano letivo, mas, nessa época, freqüentemente, o livro já está sendo atualizado pelo autor e, por isso, os editores preferem aguardar o início do ano letivo seguinte para poder relançar a obra já atualizada. Diante dessa prática do mercado, os editores não poderiam jamais concordar com a realização de cópia privada, tanto de livro que seja encontrado à venda, quanto de livro esgotado. Gabriel Leonardos - Mas e quando a obra já estiver esgotada há muito tempo? Jackson Alves de Oliveira No caso de obras esgotadas há longo tempo, os editores não teriam qualquer objeção a que fosse livre a realização de cópia privada. Notas Sessão de conhecimentos tradicionais XII Reunião do Comitê Mercosul x União Européia O Comitê Intergovernamental sobre Propriedade Intelectual e Recursos Genéticos, Conhecimentos Tradicionais e Folclore, no âmbito da Organização Mundial da Propriedade Intelectual, OMPI, realizará a sua sexta sessão, na cidade de Genebra, no período de 15 a 19 de março de 2004. Os trabalhos exploratórios da OMPI em 19981999 demonstraram que os conhecimentos tradicionais constituem uma fonte abundante de criatividade e inovação. Para o biênio 2004-2005, os trabalhos devem entrar numa fase de abordagem de problemas básicos no âmbito teórico e a identificação de ativos que possam ser objeto de proteção. Deverá, igualmente, ser buscada qual a forma legal de proteção desses objetos e sua relação com o sistema de propriedade intelectual. A informação é da Gerência de Direito Autoral (GDA), subordinada à Secretaria de Formulação e Avaliação de Políticas Culturais, do Ministério da Cultura. E-mail: [email protected] A XII Reunião do Comitê de Negociações Bi-Regionais Mercosul x União Européia será realizada nos dias 8 a 12 de março de 2004, em Buenos Aires. A proposta de uma Associação Inter-regional de Comércio entre os dois blocos foi lançada em dezembro de 1995, com um “Acordo-quadro de cooperação” (Inter-regional Framework Cooperation Agreement), tendo como base a implementação de uma progressiva liberalização comercial entre si. Sem excluir qualquer tema, a priori, criou-se uma estrutura institucional básica que promoveu encontros técnicos de estudo e avaliação, buscando estabelecer o alcance do mandato negociador. Algumas áreas técnicas responsáveis pela propriedade intelectual no governo vêm explicitando ser dispensável e pouco recomendável assumir novas obrigações em relação a disposições substantivas de propriedade intelectual no plano multilateral, além do que já está disposto no Acordo TRIPs. Boletim da ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA PROPRIEDADE INTELECTUAL Informativo mensal dirigido aos associados da ABPI. Visite a versão on-line deste Boletim no sítio da Associação. Software Comercial: Inovação O próximo almoço da ABPI será no dia 18 de março de 2004, em São Paulo. A convidada para a palestra será Alessandra Del Debbio, diretora jurídica da Microsoft Informática Ltda., que vai desenvolver sua apresentação sobre o tema “Software Comercial: Inovação”. O encontro será nas salas John Wesley e George Whitefield, no Condomínio América Business Park, na avenida Marginal do Rio Pinheiros, 5.200, Morumbi, São Paulo. Confirmações com Adriana Rosa ou Carmen Lima, (21) 2532-5655, ou pelo e-mail [email protected] ABPI - Associação Brasileira da Propriedade Intelectual - Av. Rio Branco, 277 - 5º andar Conj. 506 - Centro - Cep 20047-900 - Rio de Janeiro - RJ - Brasil - Tel.: 21 2532-5655 Fax: 21 2532-5866 - Web Site: http://www.abpi.org.br - E-mail: [email protected] Comitê Executivo: Gustavo Starling Leonardos - Presidente; Sueli Burger - 1º VicePresidente; Rodrigo Sérgio Bonan de Aguiar - 2° Vice-Presidente; Helio Fabbri Junior - 3° Vice-Presidente; Manoel J. Pereira dos Santos - 4º Vice-Presidente; Cláudio Roberto Barbosa - Diretor Relator; Lilian de Melo Silveira - Diretora Editora; Paulo Parente Marques Mendes - Diretor Secretário; Herlon Monteiro Fontes - Diretor Tesoureiro. Conselho Editorial: Gabriel F. Leonardos, Ivan B. Ahlert, José Roberto d’Affonseca Gusmão, Juliana L. B. Viegas e Manoel J. Pereira dos Santos. Boletim da ABPI: Editora - Lilian de Melo Silveira; Jornalista Responsável - João Yuasa (MTb: 8.492); Produção Gráfica - PW Gráficos e Editores Associados Ltda; Fotos - Wladimir Wong; Revisão - Mauro Feliciano; Impressão e Acabamento - Bureau Bandeirante. © ABPI 2004 - Todos os direitos reservados. 8 Boletim da ABPI Fevereiro de 2004 • Nº 50