KANT: A CRÍTICA DA RAZÃO
PURA
Kant (1724-1804) foi talvez o maior dos filósofos modernos.
Teve formação em matemáticas e física.
Sua maior obra foi a CRÍTICA DA RAZÃO PURA, um trabalho de
teoria do conhecimento no sentido amplo da palavra.
Com essa obra ele intentou uma grande síntese do empirismo
(Locke, Berkeley, Hume) com o racionalismo (Descartes, Leibniz),
embora tenha aprendido também com os medievais e os filósofos
antigos.
Sua filosofia contém muitas idéias extraordinariamente
sugestivas, mas também grande obscuridade ou, como dele
escreveu Strawson:
“we read and re-read his work with a commingled sense of
great insight and great mistification”.
Lógica transcendental:
Estética transcendental:
DIALÉTICA
ESTÉTICA
ANALÍTICA
RAZÃO
JUÍZOS
ESPAÇO/ fe-
X ou EU
IDÉIAS:
CATEGORIAS:
TEMPO
TRANS-
alma,
substância,
CEN-
mundo,
causalidade etc.
DEN.
.
.
deus
(conceitos puros
do entendimento)
(ilusões
da razão)
no-
COISA
(formas puras me-
EM
da intuição) nos
SI
CONHECIMENTO A PRIORI
(MUNDO
NOUMÊNICO)
Kant discordava tanto do racionalismo quanto do empirismo,
pretendendo fazer uma grande síntese crítica. Vejamos o que Kant
via de errado em cada posição:
1. Consideremos primeiro o racionalismo
(Descartes, Spinoza, Leibniz). Ele via na RAZÃO
a única fonte verdadeira de conhecimento, pois a
via dotada de IDÉIAS INATAS, devendo a
filosofia alcançá-las pelo poder do raciocínio.
(Hoje diríamos que as disposições inatas são resultados
evolucionários resultantes de uma espécie de
aprendizado empírico indutivo da própria espécie via
seleção natural.)
Para o racionalista os juízos que contam são o que
Leibniz chamava de as VERDADES DA RAZÃO.
São em Kant:
JUÍZO ANALÍTICO (Df) = AQUELE EM QUE O
PREDICADO ESTÁ CONTIDO NO SUJEITO.
O JUÍZO ANALÍTICO É NATURALMENTE A
PRIORI, ou seja INDEPENDENTE DA
EXPERIÊNCIA. (Embora possamos precisar da
experiência para chegar até ele, não é através dela
que chegamos a ele.)
Exemplo de Kant é:
“Todos os corpos são extensos”.
Se considerarmos o juízo: “Todos os corpos são
extensos”, o predicado é um aspecto do múltiplo de
intuições que penso ao pensar o conceito de corpo.
Outros exemplos são:
“Todos os homens são homens” (tautologia),
“Todos os gregos são homens”,
“Todos os triângulos tem três lados”,
“Todos os solteiros são não casados”.
Nos últimos três casos o predicado está apenas
implicitamente contido no conceito do sujeito.
Características do juízo analítico:
1) A negação é CONTRADITÓRIA (negá-los
contradiz o princípio da não-contradição, ou ~(P &
~P)).
2) São PURAMENTE EXPLICATIVOS, NÃO
AMPLIANDO O CONHECIMENTO.
Na opinião de Kant a característica 2 é desastrosa
para o racionalista porque para ele a ciência é feita
de juízos ampliadores do conhecimento e se tudo o
que a razão nos oferece são juízos analíticos e eles
não ampliam o conhecimento, então eles não são
capazes de fundamentar a ciência.
Afinal, as LEIS da física newtoniana são
AMPLIADORAS DO CONHECIMENTO, o
mesmo acontecendo, na opinião de Kant, com o
conhecimento matemático!
2) Vejamos agora o empirismo de Locke, Berkeley e Hume.
Ele dizia que não temos idéias inatas e que a única fonte
de conhecimento é a experiência...
Os juízos que contam eram EMPÍRICOS (o que Leibniz
chamava de VERDADES DE FATO) ou, no dizer de
Kant,
JUÍZOS SINTÉTICOS (A POSTERIORI) (Df) =
SÃO SINTÉTICOS PORQUE NELES O
PREDICADO NÃO ESTÁ CONTIDO NO
CONCEITO DO SUJEITO
e são A POSTERIORI PORQUE DEPENDEM
DA EXPERIÊNCIA.
Exemplo de Kant: “Todos os corpos tem peso”.
Consideremos os exemplos:
“Todos os corpos tem peso”,
“A terra gira em torno do sol”,
“Meu carro é amarelo”...
Se examinarmos o conceito dos sujeitos: corpo,
carro e terra, não encontraremos o predicado
contido.
Sem dúvida esses juízos dependem da experiência
para serem conhecidos.
As características dos juízos sintéticos são:
1) Podem ser NEGADOS SEM CONTRADIÇÃO.
2) São AMPLIADORES DO CONTEÚDO DO
CONHECIMENTO.
3) NÃO TEM VALOR UNIVERSAL E
NECESSÁRIO.
Para Kant a característica 3) é uma deficiência
grave, pois para ele os juízos verdadeiramente
científicos das matemáticas e da física newtoniana
PRECISAVAM SER NECESSÁRIOS E
UNIVERSAIS!
Na época de Kant era tido como certo que a
geometria euclidiana era inatacável e que as leis da
mecânica newtoniana eram VERDADES
ÚLTIMAS descobertas pela física. (Hoje,
contrariamente, impera a idéia peirceana do
FALIBILISMO da ciência.)
Mas juízos empíricos, ou seja, juízos sintéticos não
podem ter a sua universalidade garantida!
Por conseguinte, o filósofo empirista não é capaz de
fundamentar nem as matemáticas nem a física,
como um cético como Hume teria sabido admitir.
COMO RESULTADO DISSO, NEM O
EMPIRISMO, QUE VALORIZA AS
VERDADES DE FATO, NEM O
RACIONALISMO, QUE VALORIZA AS
VERDADES DA RAZÃO, É CAPAZ DE
FUNDAMENTAR O CONHECIMENTO
CIENTÍFICO!
O sujeito só pode oferecer universalidade e o
objeto só pode oferecer novidade. Donde o
racionalismo reduz o conhecimento a
universalidade sem novidade e o empirismo o
reduz à novidade sem universalidade...
A SOLUÇÃO KANTIANA
Ela consiste em propor que a ciência (matemáticas e física) não se
fundamenta nem nos juízos SINTÉTICOS nem nos juízos
ANALÍTICOS, mas que
ela se funda em algo novo que ele chamou de JUÍZOS SINTÉTICOS
A PRIORI.
JUÍZO SINTÉTICO A PRIORI (Df) = AQUELE
EM QUE O CONCEITO DO PREDICADO NÃO
ESTÁ CONTIDO NO CONCEITO DO SUJEITO
(é SINTÉTICO)
e também é A PRIORI, POIS INDEPENDE DA
EXPERIÊNCIA.
Exemplos de Kant:
“7 + 5 = 12”,
“A reta é a distância mais curta entre dois pontos”,
“Todo evento tem uma causa”.
Nesses exemplos o predicado não está contido no
conceito do sujeito e ao mesmo tempo eles são para
Kant ampliadores do conhecimento.
E é informativo saber que todos os eventos tem
uma causa...
Daí as características do juízo sintético a priori. Ele
é:
1) é AMPLIADOR DO CONHECIMENTO,
2) é NECESSÁRIO E UNIVERSAL
SENDO POR ISSO CAPAZ DE FUNDAMENTAR A
CIÊNCIA.
Ao propor fundamentar o conhecimento por meio de juízos
sintéticos a priori Kant opera o que chamou de sua
REVOLUÇÃO COPERNICANA
A REVOLUÇÃO COPERNICANA:
O conhecimento não resulta nem do
SUJEITO nem do OBJETO, mas da AÇÃO
COMBINADA DE AMBOS: o sujeito dá a
FORMA, o objeto dá a MATÉRIA, e o
CONHECIMENTO empírico resulta de um
elemento A PRIORI (vindo do sujeito) e outro
A POSTERIORI (vindo do objeto).
O conhecimento não é mais reprodução passiva do objeto,
mas
CONSTRUÇÃO ATIVA DO OBJETO PELO SUJEITO.
Ou, na metáfora kantiana:
A metáfora da revolução copernicana:
“Copérnico, não podendo mais admitir que todo o exército
dos astros se move em torno do espectador, julgou admitir
que o observador gira e que os astros estão parados.
Assim também na metafísica...
Julgamos dever admitir que é o espectador, o sujeito, que
se move...
Pois se a intuição deve se conformar à natureza dos
objetos, não vejo como se possa saber algo deles a priori.
Mas se o objeto deve se conformar à natureza de nossa
faculdade intuitiva, posso muito bem mostrar essa
possibilidade.”
Com a admissão dos juízos sintéticos a priori a aritmética,
a geometria e a física tornam-se capazes de serem
demonstradas universalmente válidas, pois sua verdade se
constata a priori.
A finalidade da Crítica da razão pura é mostrar como isso
acontece.
Para tal é preciso fazer a razão voltar-se para si mesma e se
considerar criticamente, justificando assim a existência de
juízos sintéticos a priori, e com isso os limites do que pode
ser legitimamente pensado.
Para isso ele precisa começar investigando as operações da
mente, que são:
APREENSÃO, JUÍZO E RACIOCÍNIO.
Daí a divisão da Crítica três partes principais:
1) A ESTÉTICA TRANSCENDENTAL, que
estuda a APREENSÃO.
2)LÓGICA TRANSCENDENTAL:
2a) A ANALÍTICA TRANSCENDENTAL, que
estuda o JUÍZO
2b) A DIALÉTICA TRANSCENDENTAL, que
estuda a RAZÃO
A seguir veremos resumidamente cada uma delas...
ESTÉTICA TRANSCENDENTAL
O pano de fundo da discussão é a disputa sobre a natureza
do espaço entre NEWTON (defendido por Clarke) e
LEIBNIZ
Newton: concepção absoluta: ESPAÇO E TEMPO SÃO
ÚNICOS, ABSOLUTOS E IMUTÁVEIS, dentro deles se
encontrando os corpos físicos. Como um grande caixote!
Leibniz: concepção relacional. ESPAÇO E TEMPO SÃO
CONSTITUÍDOS através das RELAÇÕES ENTRE OS
CORPOS FÍSICOS,
Exs:
em cima, embaixo, ao lado de de...
antes, depois, no mesmo momento...
Kant discorda de ambos:
Ambos pressupõem a REALIDADE OBJETIVA
DO ESPAÇO e TEMPO.
Mas se o ESPAÇO E TEMPO SÃO OBJETIVOS, A
MATEMÁTICA E A GEOMETRIA, que
dependem do espaço e tempo para se constituírem,
NÃO PODEM TER A SUA UNIVERSALIDADE
E NECESSIDADE GARANTIDA, pois devem ser
sintéticas a posteriori, ou seja, dependentes da
experiência, posto que para Kant elas não são
analíticas!
Por isso espaço e tempo NÃO PODEM SER OBJETIVOS.
Antes de começar a expor o pensamento de Kant é preciso
distinguir entre TRANSCENTE (-) e
TRANSCENDENTAL (+):
1) TRANSCENDENTE = AQUILO QUE
ULTRAPASSA TODA A EXPERIÊNCIA
( metafísica pré-kantiana).
2) TRANSCENDENTAL = AS CONDIÇÕES
SUPREMAS PARA QUALQUER TIPO DE
CONHECIMENTO
(espaço e tempo, categorias, as idéias da razão)
============================================
A ESTÉTICA TRANSCENDENTAL (do grego ‘aesthesis’
= sensação) visa mostrar como são possíveis a
matemática e a geometria.
Para Kant a matemática e a geometria são conhecimento universal de
caráter intuitivo, a geometria requer espaço (e tempo) e a matemática
requer o tempo.
Elas são universais porque ESPAÇO e TEMPO não
pertencem ao mundo externo em si mesmo, mas à própria
mente.
Eles são FORMAS A PRIORI DA INTUIÇÃO
SENSÍVEL, dotadas de universalidade e intuitividade,
residindo na mente!
Por se encontrarem na mente, as matemáticas são a priori,
independentes da experiência, pois AS FORMAS A PRIORI DA
INTUIÇÃO SE LHES SOBREPÕEM...
Mas por que espaço e tempo são condições a priori de toda a
experiência e não são resultados da experiência? Argumentos:
1) Qualquer sensação de coisas externas PRESSUPÕE a intuição do
ESPAÇO, e o TEMPO está presente em todas as intuições. (Não
podem vir juntas?)
2) Se você pensa em RELAÇÕES, como acima, ao lado de, você já
as situa no espaço. Se X está ao lado de Y, você JÁ ASSUME A
IDÉIA de espaço. O mesmo com o antes e o depois no tempo.
(Mas não vem juntos?)
3) Você não pode imaginar objetos sem espaço, mas pode imaginar o
espaço sem objetos... (eu não posso).
2) Além disso ESPAÇO E TEMPO SÃO ÚNICOS E ILIMITADOS,
não podendo ser abrangidos por CONCEITOS. Sob um conceito
(ex: casa) caem objetos, o que não acontece aqui. (Mas há
conceitos sob os quais cai uma só entidade.)
Para Kant esses argumentos mostram que
ESPAÇO E TEMPO não são
NEM PRODUTOS DA EXPERIÊNCIA
NEM CONCEITOS.
Logo:
eles só podem ser FORMAS A PRIORI DE
NOSSA MENTE,
ESQUEMAS VAZIOS que se tornam
perceptíveis no ato de formação de conteúdos
empíricos.
A conclusão é a oposição:
FORA: OBJETO x DENTRO, onde encontramos:
1) O sentido externo recebe os estímulos sob a forma
ESPACIAL, de modo que toda sensação nos parece
EXTENSA.
2) O sentido interno (condição imediata das aparências
internas e mediata das aparências externas) recebe os
estímulos sob a forma de TEMPO, pois toda sensação
ocupa um lugar no tempo.
PARA KANT O ESPAÇO É A FORMA DE TUDO O QUE
É PERCEBIDO PELO SENTIDO EXTERNO
e O TEMPO É A FORMA DE TUDO O QUE É
PERCEBIDO PELO SENTIDO INTERNO e também
externo.
Da SÍNTESE da MATÉRIA
constituída pelos DADOS
SENSORIAIS sob a FORMA do
ESPAÇO E TEMPO resulta o
FENÔMENO.
(A intuição humana é só sensível, só
Deus tem intuição intelectual)
***
Estabelecidos esses princípios Kant conclui que a
matemática e a geometria são CIÊNCIAS porque
são formadas de proposições UNIVERSAIS E
EXTENSIVAS DE NOSSO CONHECIMENTO:
E essa UNIVERSALIDADE só é possível porque
ESPAÇO E TEMPO, que acompanham todas as
proposições geométricas e matemáticas, são
FORMAS A PRIORI E PORTANTO
UNIVERSAIS.
Isso não quer dizer que espaço e tempo não sejam de
modo algum reais (como nos sonhos): ELES SÃO
IDEALIDADES TRANSCENDENTAIS E
REALIDADES EMPÍRICAS.
Com efeito, nada se prova em matemática e geometria
apenas pela análise conceitual, mas por síntese. É
sempre preciso o uso dos sentidos... EXEMPLOS:
1) “A reta é a distância mais curta entre dois pontos”.
R: é a própria definição de reta que está aqui explicitada.
2) Como sabemos que “só uma única reta pode cortar
outra em um ponto formando um ângulo reto com a
primeira”?
R: primeiro desenhamos, apelamos à nossa intuição
espacial, depois sabemos que isso vale universalmente
(na geometria euclideana).
a
Considere agora o teorema de Euclides:
“A soma dos ângulos internos de um triângulo é 180º”.
Kant nota que não é uma proposição analítica, pois o
predicado não está contido no sujeito. Poderia ser outro
número qualquer! Precisamos de uma PROVA que se dá
por meio de SÍNTESES:
B
E
1
2
A
3
2
C
1
D
Também aritmética é sintética a priori. Considere o juízo:
“2 + 2 = 4”
Para Kant ele é sintético, o que se mostra quando
consideramos uma prova como a proposta por Leibniz:
2 + 2 = (1 + 1) + (1 + 1)
(1 + 1) + (1 + 1) = 1 + 1 + 1 + 1
= (1 + 1) + 1 + 1
=2+1+1
= (2 + 1) + 1
=3+1
=4
(tirando os parêntesis)
(df. 2 = 1 + 1)
(df. 3 = 2 + 1)
(df. 4 = 3 + 1)
Mas Kant não acha que essa prova seja analítica, pois ela se
dá no TEMPO! Mat. requer tempo... Como a geometria.
Começa a se delinear que o CONHECIMENTO
humano se encontra para Kant entre dois termos
opostos, os quais são incognoscíveis:
1) o OBJETO ou COISA EM SI ou NOUMENON do lado
objetivo, e
2) o SUJEITO entendido como X ou EU
TRANSCENDENTAL do lado subjetivo.
Pois SÓ CONHECEMOS O QUE SE DÁ SOB AS
CONDIÇÕES TRANSCENDENTAIS DO
CONHECIMENTO, QUE SÃO OS FENÔMENOS,
que quando são objetivos formam a NATUREZA
e quando subjetivos formam o EU EMPÍRICO.
ANALÍTICA TRANSCENDENTAL
Com a sua analítica transcendental Kant quer
estudar a FACULDADE DO ENTENDIMENTO
como uma maneira de investigar os conceitos a
priori.
Para Kant
A SENSAÇÃO produz INTUIÇÕES,
enquanto
O ENTENDIMENTO produz os CONCEITOS.
Mas não há conhecimento sem o intercêmbio entre ambas:
“CONCEITOS SEM INTUIÇÕES SÃO VAZIOS E
INTUIÇÕES SEM CONCEITOS SÃO CEGAS.”
Além disso, assim como na estética ele pretende ter
provado que as matemáticas são possíveis, na
analítica ele quer provar como a ciência empírica (a
física newtoniana) é possível.
Como podemos saber que o campo da experiência
está submetido à LEI UNIVERSAL E
NECESSÁRIA?
Como são possíveis leis da física como:
G = M1 x M2
D²
Ora, para Kant elas só são possíveis se o
INTELECTO IMPÕE ESSAS LEIS À
NATUREZA.
O sujeito que as dita ÀS IMPÕE - não à natureza
em si mesma - mas à NATUREZA COMO ELA
NOS APARECE, À NATUREZA FENOMÊNICA.
Só por serem provenientes do SUJEITO que as
LEIS DA NATUREZA TEM CARÁTER
UNIVERSAL E NECESSÁRIO.
Para entender como Kant torna esse ponto plausível
precisamos percorrer seu longo caminho argumentativo.
Para Kant o ENTENDIMENTO funciona
aplicando CONCEITOS MÁXIMOS, as
CATEGORIAS, aos DADOS DA INTUIÇÃO.
Para entendermos o que é uma categoria é bom voltar
por um momento a Aristóteles...
Aristóteles entendia como categorias os “os gêneros
supremos do ser”, produzindo uma tábua de conceitos
que se aplicavam a tudo o que é dado. Ele tinha uma
lista de oito, por vezes dez categorias.
Eis as categorias de Aristóteles:
1) Substância ou essência,
2) Qualidade,
3) Quantidade,
4) Relação,
5) Agir,
6) Sofrer a ação,
7) Lugar (espaço),
8) Quando (tempo).
Assim, uma substância, essa ROSA, tem qualidade, é
vermelha, tem quantidade, certo peso, está relacionada
às outras flores do feixe, age ao exalar um perfume e
ocupa certo lugar e dura um certo tempo.
Como vêem, elas parecem ser conceitos fundamentais!
Kant não estava satisfeito com a tábua das categorias de
Aristóteles, pois as considerava obtidas aleatoriamente.
Ele considera que conceitos são sempre predicados
de JUÍZOS e que o entendimento também consiste
na FACULDADE DE JULGAR, DE FORMAR
JUÍZOS.
Com base nisso ele teve a idéia de construir a sua
própria lista de categorias, usando como fio
condutor A CLASSIFICAÇÃO LÓGICA DOS
JUÍZOS, de modo que de cada espécie de juízo ele
possa abstrair um conceito máximo, uma categoria,
produzindo assim a sua própria tábua de
categorias!
Kant produz uma tábua com 12 tipos de juízo segundo qualidade,
quantidade, relação e modalidade, retirando daí 12 categorias:
ESQUEMA:
JUÍZO:
CATEGORIA:
QUANTIDADE
.
.
singulares
particulares
universais
totalidade
multiplicidade
unidade
QUALIDADE
.
.
RELAÇÃO
.
.
afirmativos
negativos
indefinidos
categóricos
hipotéticos
disjuntivos
ser
não-ser
limitação
substância-inerência
causalidade-dependência
comunhão-reciprocidade
MODALIDADE
.
.
problemáticos
Assertóricos
Apodíticos
possibilidade-impossibilidade
realidade-irrealidade
necessidade e contingência
Quanto à QUANTIDADE os juízos se dividem em:
1)UNIVERSAL: Ex: todos os homens são mortais.
2) PARTICULAR: Ex: alguns homens são calvos.
3) SINGULAR: Ex: Sócrates é mortal.
Desses três momentos ou subclasses de juízos se
deduzem respectivamente três categorias:
1)UNIDADE
2)PLURALIDADE
3)TOTALIDADE
Quanto à QUALIDADE os juízos podem ser:
1) AFIRMATIVO (ex: A alma é mortal)
2) NEGATIVO (ex: A alma não é mortal)
3) INFINITO (ex: A alma é não-mortal)
(É infinito porque o sujeito é asserido como pertencendo
a uma classe infinita de coisas que não incluem o
conceito de ser mortal.)
Dessas momentos se deduzem respectivamente as
categorias de:
1) REALIDADE
2) NEGAÇÃO
3) LIMITAÇÃO
Quanto à RELAÇÃO:
1) CATEGÓRICO: Afirma relação S-P entre 2 conceitos,
ex: “Os maus serão punidos”.
2) HIPOTÉTICO: Afirma relação de consequência entre
dois juízos, ex: “Se há justiça, os maus serão punidos.”
3) DISJUNTIVO: Afirma disjunção entre dois ou mais
juízos, ex: “O mundo existe ou por acaso ou por
necessidade ou por uma causa externa”.
Daí se deduzindo respectivamente as categorias de:
1) INERÊNCIA E SUBSISTÊNCIA
2) CAUSALIDADE E DEPENDÊNCIA
3) COMUNIDADE (reciprocidade entre agente e paciente)
Quanto à MODALIDADE:
1) PROBLEMÁTICO (ex: “O gato pode estar no tapete”)
2) ASSERTÓRICO (ex: “O gato está no tapete”)
3) APODÍTICO (ex: “O gato deve estar em algum lugar”)
Desses momentos se deduzindo respectivamente as
categorias de:
1) POSSIBILIDADE-IMPOSSIBILIDADE
2) EXISTÊNCIA-INEXISTÊNCIA
3) NECESSIDADE-CONTINGÊNCIA
Essas classificações são um tanto artificiais e mesmo em desacordo
com a lógica contemporânea, com o agravante de que elas se
impõem ao restante da Crítica.
Essa dedução da origem a priori das categorias a partir dos juízos é
chamada de DEDUÇÃO METAFÍSICA para se distinguir da
subsequente DEDUÇÃO TRANSCENDENTAL
Segundo Kant o juízo dá-se quando superpomos
categorias à associação do predicado ao sujeito,
por exemplo:
Ex.1:
“Essa rosa é vermelha”, categorias aplicadas:
totalidade, ser, substância e inerência, realidade.
O intelecto pode agora realizar juízos universais
ao impor categorias à experiência!
Ex.2:
“Se um metal é aquecido ele se expande”: unidade,
ser, causalidade, realidade.
Entendemos aqui como as categorias se aplicam aos
objetos da experiência e vemos que há três fatores, um
passivo e dois ativos, envolvidos no conhecimento a
priori:
(i)O múltiplo da intuição pura (a moldura espaciotemporal)
(ii) A síntese desse múltiplo por meio da imaginação.
(iii) Os conceitos que dão unidade a essa síntese.
A imaginação, com a ajuda dos conceitos
puros do entendimento, produz a atividade
combinatória que dá sentido ao material
apresentado pela sensibilidade.
Chegamos aqui à famosa DEDUÇÃO
TRANSCENDENTAL.
A questão é: o que justifica a aplicação dos conceitos puros
do entendimento?
Resumidamente a resposta é:
Como as categorias se aplicam às aparências
e não à coisa em si, deve ser natural que essa
aplicação dependa em parte da própria
estrutura de nossas mentes, só através delas
podendo ser os objetos pensados.
Mais detalhadamente:
1) O múltiplo dado à intuição espacio-temporal é uma
variedade de cores, odores, gostos, que não somos
capazes de nomear nem conhecer. Para que isso
aconteça nós precisamos ORGANIZÁ-LO
ATIVAMENTE através da ATIVIDADE
EXPONTÂNEA DO ENTENDIMENTO. Ele junta o
múltiplo fazendo-nos reconhecer uma cadeira ou um
cão.
2) Conceitos empíricos são formados por ABSTRAÇÃO. O
problema é como são formados conceitos a priori, como
as CATEGORIAS. Ele quer mostrar que assim como
todo o material sensível é espacio-temporalmente
ordenado, todo entendimento é ordenado segundo as
CATEGORIAS, que são REGRAS, CONDIÇÕES
FUNDAMENTAIS DE NOSSO PENSAMENTO.
3) A atividade do entendimento consiste essencialmente de
um ATO DE COMBINAÇÃO OU SÍNTESE. Se penso
“João é mais alto que Maria” (juízo empírico) ou “Todo
evento tem uma causa” (juízo a priori), estou combinando
em pensamento duas coisas e dizendo que elas se
combinam na realidade.
4) Essa atividade combinatória pressupõe uma UNIDADE
na mente que combina. Toda representação (Vorstellung)
precisa poder ser relacionada a representações passadas ou
futuras numa única mente. Só essa unidade da consciência
garante a síntese. Essa unidade é chamada de UNIDADE
TRANSCENDENTAL DA APERCEPÇÃO. A mente
forma uma unidade e esse princípio da unidade da unidade
sintética da apercepção é o supremo princípio de todo o
juízo.
Como ele diz numa famosa passagem:
“o eu penso deve poder acompanhar todas as minhas
representações pois elas não seriam minhas se não
pertencessem todas a minha autoconsciência.”
(Assim, a solução de Kant para o problema do Eu é
intermediária entre Descartes e Hume:
Descartes achava que o Eu fosse cognoscível
imediatamente em si mesmo.
Hume achava que o Eu fosse uma ilusão fictícia.
Kant acha que ele existe, mas é incognoscível.)
Obs: a apercepção transcendental precisa ser distinguida da
apercepção empírica ou sentido interno, pela qual me torno
consciente da sucessão de meus estados mentais internos.
5) Questão: como essa unidade determina o
funcionamento das regras do entendimento? Para tal
precisamos investigar mais a natureza do juízo. Como o
entendimento difere juízos com referência objetiva de
asserções puramente subjetivas? Se digo que “sinto peso”
isso é diferente do juízo objetivo “Todos os corpos são
pesados” em que as idéias de corpo e peso são
objetivamente combinadas.
Ora, porque no juízo, diversamente da mera asserção, eu
submeto as cognições dadas à UNIDADE OBJETIVA DA
APERCEPÇÃO (B141). Se ajuizo “Corpos são pesados”,
faço referência ao “EU PENSO”, que envolve a
6) Mas como o entendimento realiza essa atividade de
unificação por meio dos JUÍZOS da lógica, que são
funções das CATEGORIAS (como mostrou a dedução
metafísica), segue-se que o múltiplo da intuição deve se
submeter às CATEGORIAS.
7. Adicionalmente, Kant distingue a SÍNTESE DA
APREENSÃO da SÍNTESE DA APERCEPÇÃO: a síntese
da apreensão concerne à combinação do múltiplo em uma
intuição empírica. Ex: posso olhar para uma casa sem
reconhecê-la como tal, eu combino as impressões visuais
antes de reconhecer a casa ou mesmo um objeto. Aqui
espaço e tempo provêem a unidade, mas quem dá essa
unidade ao múltiplo JÁ É O ENTENDIMENTO, que nos
faz reconhecê-lo como em UM espaço e em UM tempo.
Daí se segue que Kant pensa que a síntese empírica da
apreensão deve se conformar com a síntese puramente
intelectual da apreensão, e daí que toda a síntese,
empírica ou a priori, deve se conformar com as
categorias.
Ele dá dois exemplos dessa conformidade:
a) Eu percebo uma casa. Penso que ela é necessariamente
estendida no espaço. Essa unidade sintética espacial tem
sua origem no entendimento, no caso, na categoria de
quantidade, que se aplica à extensão da casa.
b)Eu percebo que a água se congela. Eu relaciono
temporalmente os estados de fluidez e solidez. A
unidade sintética é aqui também dada pelo
entendimento, pela categoria de causalidade.
O resultado disso tudo é que a NATUREZA deve se
sujeitar às categorias do entendimento, pois ela é composta
de aparências, e o MODO como ela aparece é
determinado, em suas características gerais, pela aplicação
das categorias, além da recepção do múltiplo pela moldura
espacio-temporal.
Claro que o conhecimento empírico demanda experiência
para ser adquirido. Mas a sua estrutura geral não é algo
descoberto pela investigação empírica, mas pelo poder
combinatório da mente humana.
***
A explicação das categorias dá lugar a princípios chamados por Kant
de ANALOGIAS DA EXPERIÊNCIA, que são LEIS fundamentais
da experiência.
1ª ANALOGIA é o princípio da permanência da
substância:
“Em toda mudança dos fenômenos a substância
permanece, e a quantidade desta na natureza não aumenta
nem diminui.”
Esse princípio é condição necessária para se perceber a mudança. Se
uma cadeira desaparece e uma mesa aparece em seu lugar não
podemos falar de mudança. Mas se um pedaço de cera aquecido se
torna líquido, isso é mudança. Essa mudança, contudo, pressupõe
que a substância permaneceu inalterada. Essa substância, aliás, não
é para Kant nem a ousia aristotélica, nem a mônada leibniziana, mas
simplesmente a QUANTIDADE DE MATÉRIA, a MASSA
newtoniana! É a quantidade de matéria que permanece idêntica.
A segunda analogia institui o princípio da causalidade:
2ª ANALOGIA DA EXPERIÊNCIA:
“Todas as mudanças acontecem segundo as leis do
nexo de causa e efeito”.
Note que a causa NECESSITA o efeito.
Para Hume essa necessidade era subjetiva, fruto do mero hábito.
Para Kant o princípio da causalidade é ao contrário condição A
PRIORI de toda a experiência, pois essa necessidade é imposta pelo
sujeito, pela categoria do intelecto que lhe dá objetividade,
i.e. validade universal, embora só no campo da experiência possível.
A demonstração disso tem vários argumentos intercalados, a idéia
principal é a seguinte:
1) Mudança implica em sucessão. Ora, em certos casos a
sucessão parece ser IRREVERSÍVEL para nós, razão pela
qual a atribuimos ao OBJETO, ELA É OBJETIVA.
2) Quando a ordem da sucessão é IRREVERSÍVEL, nós a
atribuimos ao nosso MODO DE PERCEBER,
considerando-a como existente só em nossa
REPRESENTAÇÃO e não no objeto.
3) Mas OBJETIVO equivale a NECESSÁRIO.
4) Assim, quando atribuimos a sucessão ao OBJETO, o
antes e o depois parecem-nos IRREVERSIVELMENTE
ligados, de modo que tal NECESSIDADE só pode ser
proveniente do entendimento, da aplicação da
CATEGORIA DE CAUSALIDADE.
Kant tenta ilustrar isso com um exemplo.
Imagine um barco que desce o rio em nossa direção. Não
podemos por nossa vontade reverter a ordem de suas
sucessivas posições.
Mas imagine as sucessivas representações que tenho de
uma casa: olho para o térreo, depois para o teto. São
reversíveis: posso olhar para o teto e depois para o térreo.
Isso é critério para dizermos que não há sucessão objetiva,
na casa, mas subjetiva.
Em ambos os casos, diz Kant, estamos lidando apenas com
representações, mas uma ordem é objetiva, outra subjetiva.
A segunda analogia corresponde à lei da inércia, dizendo que “toda a
mudança da matéria tem uma causa externa”, que ele quer fazer
equivaler ao princípio da razão suficiente.
3ª ANALOGIA DA EXPERIÊNCIA:
“Todas as substâncias, enquanto podem ser
percebidas no espaço como contemporâneas, estão
em contínua ação recíproca”.
Corresponde à terceira lei da mecânica newtoniana.
***
O ESQUEMATISMO: Para se por em contato, intuições e juízos precisam de um
INTERMEDIÁRIO, que é a IMAGINAÇÃO ou FANTASIA, a qual inicia a associação
entre as duas coisas segundo esquemas fundamentais...
O TEMPO tem a função de fazer uma INTERMEDIAÇÃO entre
CONCEITOS PUROS e DADOS DA SENSIBILIDADE, estando
sempre presente nas analogias da experiência.
Como as CATEGORIAS são COMPLETAMENTE
HETEROGÊNEAS em relação às INTUIÇÕES,
é necessário um MEIO INTERMEDIADOR entre as
CATEGORIAS e as INTUIÇÕES, que Kant chama de
ESQUEMA e que é produto da IMAGINAÇÃO.
O esquema forma uma IMAGEM que não é a imagem
sensível particular, mas a imagem VISTA COMO
EXEMPLO DE UM CONCEITO.
Ex: se exemplifico o número 3 com a imagem <***> isso é um
ESQUEMA, mas isso é NUMERÁVEL e o NUMERAR exige
Com base em tudo isso Kant pode concluir que a física
newtoniana é válida quando aplicada ao mundo
fenomênico, sendo necessária e universal!
Falta, porém, uma coisa: é que o conhecimento não
é constituído de elementos separados uns dos
outros, mas forma um TODO UNITÁRIO.
Para explicar isso Kant recorre à suprema condição
unificadora de toda a experiência, que é o EU
TRANSCENDENTAL.
Afinal, o que liga todas as minhas representações é o fato
delas todas poderem ser reconhecidas como ligadas a um
EU, senão ele seria variegado.
Como ele diz numa famosa passagem:
“o eu penso deve poder acompanhar todas as minhas
representações pois elas não seriam minhas se não
pertencessem todas a minha autoconsciência.”
Essa consciência da continuidade do eu é chamada por
Kant de APERCEPÇÃO TRANSCENDENTAL.
A solução de Kant para o problema do Eu é intermediária
entre Descartes e Hume:
Descartes achava que o Eu fosse cognoscível
imediatamente em si mesmo.
Hume achava que o Eu fosse uma ilusão fictícia.
Kant acha que ele existe, mas é incognoscível.
Finalmente, há um problema com o conceito de
NOUMENON (da coisa em si, do X, do sujeito
transcendental):
Se dizemos que ele EXISTE, ou CAUSA os
FENÔMENOS, então aplicamos as categorias de
realidade e causalidade a ele. Mas isso é contraditório com
os princípios da Crítica.
Talvez por isso é que na segunda edição da Crítica ele
passou a considerá-lo um CONCEITO LIMITE
(Grenzbegriff), podendo ser entendido simplesmente como
O QUE NÃO PODE SER OBJETO DA NOSSA
INTUIÇÃO SENSÍVEL.
Mas o é isso do qual nada pode ser dito? Como Strawson
notou, essa parece ser uma tese ININTELIGÍVEL!
DIALÉTICA TRANSCENDENTAL
DIALÉTICA TRANSCENDENTAL =
Estudo da atividade da RAZÃO, com o fito de
avaliar a POSSIBILIDADE DA
METAFÍSICA.
Para Kant a ATIVIDADE DA RAZÃO consiste em
RACIOCINAR COM O FITO DE UNIFICAR TODA A
EXPERIÊNCIA SOB AS 3 IDÉIAS FUNDAMENTAIS
DA RAZÃO, QUE SÃO:
1) IDÉIA DA ALMA
2) IDÉIA DO MUNDO
3) IDÉIA DE DEUS
Isso é feito através do raciocínio CATEGÓRICO, que
corresponde à idéia da ALMA, através do raciocínio
HIPOTÉTICO, que corresponde à idéia do MUNDO, e o
raciocínio DISJUNTIVO, que corresponde à idéia de
DEUS.
O que são essas idéias unificadoras?
IDÉIA DE ALMA = representa a TOTALIDADE DA
EXPERIÊNCIA EM RELAÇÃO AO SUJEITO.
IDÉIA DO MUNDO = representa a TOTALIDADE DA
EXPERIÊNCIA EM RELAÇÃO AOS OBJETOS
FENOMÊNICOS.
IDÉIA DE DEUS = representa a TOTALIDADE DA
EXPERIÊNCIA EM RELAÇÃO A TODO OBJETO
POSSÍVEL, INTERNO E EXTERNO.
É importante entender o específico status epistêmico das
idéias de ALMA, MUNDO E DEUS.
Elas são para Kant CONDIÇÕES A PRIORI
UNIFICADORAS DA EXPERIÊNCIA.
Elas nem são derivadas da experiência, como
pensavam os empiristas, nem são representações
das coisas em si, como pensavam os racionalistas
como Descartes.
Elas tem como única função UNIR JUIZOS, não
podendo se referir efetivamente a nada.
Elas não são conceitos, mas são FORMAS SEM
CONTEÚDO, não possuindo VALOR
CONSTITUTIVO!
Elas não são como os conceitos do entendimento,
capazes de CONSTITUIR OBJETOS.
Elas são meros IDEAIS REGULATIVOS,
DIRETIVOS .
Sua função é INDICAR UMA DIREÇÃO, UM
PONTO DE CONVERGÊNCIA HIPOTÉTICO,
PROBLEMÁTICO, PARA O QUAL TENDEM
TODOS OS RACIOCÍNIOS.
Por não atentar para isso a mente humana foi
levada a produzir inúmeros argumentos no
sentido de provar que as idéias da razão se
referem a COISAS EM SI ou a FENÔMENOS,
tratando-as como conceitos ordinários,
Isso constitui aquilo que que se entendia por
metafísica na época de Kant:
Ou seja, investigações sobre a
Existência da ALMA,
Existência e natureza de DEUS,
ou sobre as origens do MUNDO.
Tais argumentos, quando se referem a ALMA e a
DEUS, são ERRÔNEOS e chamados por Kant de
PARALOGISMOS.
Já quando se referem ao MUNDO eles são
INCONCLUDENTES e chamados por Kant de
ANTINOMIAS.
A dialética possui, pois, uma parte positiva,
que é a investigação da razão em si mesma, e
negativa,
que é
uma CRÍTICA ÀS ILUSÕES DA RAZÃO, À
METAFÍSICA de seu tempo.
ALMA:
Eis um exemplo de paralogismo:
1. O que pode ser pensado somente como sujeito é uma
substância.
2. O eu pensante só pode ser pensado como sujeito.
3. Logo: o eu pensante é uma substância.
Problema:
na premissa maior o termo ‘sujeito’ significa EU
NOUMÊNICO (TRANSCENDENTE), mas na segunda o
termo ‘sujeito’ significa EU FENOMÊNICO
(TRANSCENDENTAL).
Logo o silogismo é EQUÍVOCO, FALAZ.
MUNDO:
As antinomias, com as quais a RAZÃO intenta provar a
ORIGEM DO MUNDO, são INCONCLUDENTES.
As antinomias são quatro, segundo a QUANTIDADE,
QUALIDADE, RELAÇÃO E MODALIDADE:
1) Antinomia de QUANTIDADE:
TESE: o mundo teve início no tempo e é limitado no
espaço.
ANTÍTESE: o mundo não tem princípio no tempo nem
limites no espaço.
Para Kant não há como decidir, pois diz respeito ao
mundo em si mesmo.
2. Antinomia de QUALIDADE:
tese: existe substância simples,
antítese: não existe nada simples no mundo.
.............................................................................
3. Antinomia da RELAÇÃO:
tese: além da causalidade necessária das leis naturais, existe uma
causalidade livre.
Antítese: não existe liberdade, tudo ocorre sob as leis da natureza.
........................................................................................................................
4. Antinomia da MODALIDADE:
Tese: no mundo existe um ser absolutamente necessário, como parte
ou como causa.
Antítese: nem no mundo nem fora dele existe um ser absolutamente
necessária.
Todos esses argumentos são
INCONCLUDENTES e mesmo ERRÔNEOS,
posto que pressupõe que se possa dizer algo sobre o
MUNDO EM SI MESMO!
Eles são INDECIDÍVEIS porque vão além da experiência
possível.
a) Os argumentos das TESES são dos RACIONALISTAS.
b) Os argumentos das ANTÍTESES são dos
EMPIRISTAS,
ainda mais danosos que os racionalistas, por afetarem os
interesses práticos da razão.
DEUS:
Para Kant a razão não é capaz de demonstrar a existência
de Deus, pois isso está além dos seus limites! A prova
fundamental é para ele a PROVA ONTOLÓGICA (sob a
qual se fundam as provas cosmológica e teleológica).
PROVA ONTOLÓGICA: DO CONCEITO DE SER
PERFEITÍSSIMO DEDUZ-SE A SUA EXISTÊNCIA.
Kant responde que A EXISTÊNCIA NÃO É NENHUM
PREDICADO CONTIDO NA ESSÊNCIA DE
NENHUM SUJEITO.
Ela precisa lhe ser SINTETICAMENTE
ACRESCENTADA. Mas no caso do SER ABSOLUTO,
que está ALÉM DE TODA A EXPERIÊNCIA, esse
acréscimo é IMPOSSÍVEL.
Em suma:
As idéias da razão são NORMAS QUE IMPELEM
NOSSAS MENTES A PROCURAR UMA UNIDADE
SEMPRE MAIS COMPLETA, UMA SÍNTESE SEMPRE
MAIS VASTA DA EXPERIÊNCIA. Elas são IDEAIS
INATINGÍVEIS, mas ORIENTADORES.
Embora a razão humana seja dotada de IDÉIAS A PRIORI
da ALMA-MUNDO-DEUS, ela não pode dar-lhes
CONTEÚDO, pois sendo essas coisas COISAS EM SI,
elas são INCOGNOSCÍVEIS.
Além disso a METAFÍSICA como conhecimento das
COISAS EM SI é IMPOSSÍVEL.
A METAFÍSICA só é possível como ESTUDO DAS FORMAS A
PRIORI DA RAZÃO (o que a dialética faz).
BIBLIOGRAFIA SUPLEMENTAR PARA A CRÍTICA DA
RAZÃO PURA:
Quebra galhos:
- Giovanni Reale e D. Antiseri: História da filosofia, vol. 2,
(ed. Paulinas).*
- Sofia Vanni Rovigui: História da Filosofia Moderna, vol. 1
(ed. Loyola).
Introduções gerais a Kant:
- John Kemp: The Philosophy of Kant (OUP 1968)*
- W. Wood: Kant (trad. Artmed 2008(2005))
- Frederick Copleston: A History of Philosophy, vol. 6, parte II Kant
(New York: Image Books 1959).
Introduções dedicadas à Crítica da Razão Pura:
- T.E. Wilkerson: Kant’s Critique of Pure Reason: A Comentary for
Students (OUP 1976).*
- S. Gardner: Kant and the Critique of Pure Reason (Routledge 1999)
Comentários:
- N. Kemp Smith: A Comentary to Kant’s Critique of Pure Reason
(London 1930). Clássico
- H.J. Paton: Kant’s Metaphysics of Experience (London 1936).
Clássico.
- P.F. Strawson: The Bounds of Sense (Methuen 1966)*
FIM
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Kant - CCHLA/UFRN