UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CONSTRUÇÕES COM SE Evidências da emergência da gramática do Português Brasileiro Elaine Alves Santos Melo Março de 2012 Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-graduação em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa). Orientadora: Silvia Regina de Oliveira Cavalcante UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CONSTRUÇÕES COM SE: EVIDÊNCIAS DA EMERGÊNCIA DA GRAMÁTICA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO Elaine Alves Santos Melo Rio de Janeiro, março de 2012. UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CONSTRUÇÕES COM SE: EVIDÊNCIAS DA EMERGÊNCIA DA GRAMÁTICA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO Elaine Alves Santos Melo Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-graduação em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa). Orientadora: Silvia Regina de Oliveira Cavalcante Rio de Janeiro Março 2012. CONSTRUÇÕES COM SE: EVIDÊNCIAS DA EMERGÊNCIA DA GRAMÁTICA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO Elaine Alves Santos Melo Orientadora: Profa. Dra. Silvia Regina de Oliveira Cavalcante Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa) Avaliada por: _______________________________________________________________ Presidente, Prof. Doutora Silvia Regina de Oliveira Cavalcante (UFRJ) _______________________________________________________________ Prof. Doutora Charlotte Marie Chambelland Galves (UNICAMP) _______________________________________________________________ Prof. Doutora Maria Eugênia Lamoglia Duarte (UFRJ) _______________________________________________________________ Prof. Doutora Célia Regina dos Santos Lopes (UFRJ) _______________________________________________________________ Prof. Doutora Marcia Cristina de Brito Rumeu (UFMG) Rio de Janeiro Março, 2012 Melo, Elaine Alves Santos Construções com SE: evidências da emergência da gramática do português brasileiro/ Elaine Alves Santos Melo. Rio de Janeiro: UFRJ – FL, 2012 Orientador: Silvia Regina de Oliveira Cavalcante Dissertação (mestrado) – UFRJ/ Programa de Pós – Graduação em Letras Vernáculas, 2012 Referências Bibliográficas: 153-160 1. Mudança Linguística; 2. Construções com SE; 3. Português Brasileiro. I. Cavalcante, Silvia Regina de Oliveira. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Pós Graduação em Letras Vernáculas. III. Título. MELO, Elaine Alves Santos. Construções com SE: evidências da emergência da gramática do português brasileiro. Dissertação de Mestrado em Língua Portuguesa. Rio de Janeiro, Faculdade de Letras/ UFRJ, 2012. RESUMO Pesquisas como as de Duarte (2002), Duarte e Lopes (2002), Cyrino (2007) têm analisado o DP-argumento interno de construções com SE e verbo transitivo direto que apresentam concordância verbal como um sujeito, como na sentença “Comprãose escravos para encommendas; na rua da Princeza dos Cajueiros número 100.” Outra linha de análise, Raposo e Uriagereka (1996), Martins (2003), Cavalcante (2006, 2011a, 2011b), advoga que essas mesmas construções não são passivas, mas sim ativas, em que o DP argumento interno, mesmo com concordância verbal, é um objeto nominativo e o clítico SE ocupa a posição de sujeito. Nesse sentido, propomos nessa dissertação observar não apenas a concordância, mas também a posição do DP sujeito em construções passivas analíticas, construções com SE-reflexivo/recíproco/inerente e a posição do DP objeto nas construções ativas a fim de verificar se estas construções consideradas passivas sintéticas, que aqui consideramos construções de SE-indefinido, são passivas ou ativas. A hipótese é de que se o DP das construções de SE-indefinido apresentar um comportamento estatístico semelhante aos DPs sujeitos das construções passivas analíticas e das construções com SE-reflexivo/recíproco/inerente, então se trata de um sujeito; contrariamente, se ele apresenta comportamento estatístico semelhante aos DPs objetos, então se trata de um objeto-nominativo. Essa hipótese baseia-se nos resultados da análise diacrônica de Cavalcante (2006, 2011a, 2011b) e na proposta de Raposo e Uriagereka (1996), Martins (2003). A amostra é constituída de anúncios, cartas de leitores e cartas de redatores publicados em jornais cariocas ao longo do século XIX, que compõe parte dos Corpora do Projeto Para a História do Português Brasileiro, equipe Rio de Janeiro (PHPB-RJ), disponível em www.letras.ufrj.br / phpb-rj. Para a análise estatística dos dados, utilizamos o programa Goldvarb-X (SANKOFF, D; TAGLIAMONTE, S. A, SMITH, E, 2001) que atuou como uma ferramenta para o tratamento estatístico. Os resultados indicam dois padrões estatísticos diferentes: os DPs sujeitos das construções passivas analíticas e das construções com SE reflexivo/ recíproco / inerente apresentam-se preferencialmente antepostos; o DP das construções com SEindefinido se comportam estatisticamente como os DPs objetos diretos. Além disso, pudemos observar o que Kroch (2001) chama de competição de gramáticas, pois corroborando os resultados de Cavalcante (1999), Duarte (2002) e Duarte e Lopes (2002) foram encontradas majoritariamente sentenças com concordância, constituindo as estruturas que Raposo e Uriagereka (1996) nomeiam de construções com SEindefinido que para Cavalcante (2006) pertencem à gramática do Português Europeu. A emergência da gramática do Português Brasileiro pode ser observada nas construções sem concordância, ou seja, nas sentenças com SE-genérico (RAPOSO e URIAGEREKA, 1996). MELO, Elaine Alves Santos. Construções com SE: evidências da emergência da gramática do português brasileiro. Dissertação de Mestrado em Língua Portuguesa. Rio de Janeiro, Faculdade de Letras/ UFRJ, 2012. ABSTRACT In this work, we observe the order of the DP-internal argument of sentences like, in order to verify its grammatical relation. Recent research on SE-constructions in Brazilian Portuguese that present agreement between the internal argument and the verb, such as “Comprão-se escravos para encommendas; na rua da Princeza dos Cajueiros número 100.”, has analized this DP “escravos” as a subject, because of the verbal agreement pattern (see Duarte, 2002; Duarte & Lopes, 2002; Cyrino, 2007). Other studies, like Raposo & Uriagereka (1996), Martins (2003) and Cavalcante (2006, 2011a, 2011b), analyze these constructions as active ones, in which the internal argument DP is an object that with nominative Case and the clitic SE lies in subject position. In this thesis, we compare the statistical behavior of these constructions, named as indefinite-SE constructions, in comparison with reflexive / reciprocal / inherent SE constructions, canonical passives and active sentences, in order to show that this DP can be analyzed as a nominative object. By hipothesis, assuming Kroch (2001), we expect that if the DP in indefinite-SE constructions presents statistical behavior similar to the subject DP of canonical passives, and other SE-constructions, then it is analyzed as a subject; on the other side, if this DP presents similar statistical behavior as the object-DP of transitive sentences, then it is analyzed as an object. These hypotheses are based on the diachronic results of Cavalcante (2006, 2011a, 2011b) and the theoretical analysis proposed by Raposo & Uriagereka (1996) and Martins (2003). The analysis is based on data from advertisements, letters from the newspaper editor and letters from readers that were published in newspapers in Rio de Janeiro during the 19th century. This sample is part of the Projeto Para a História do Português do Brasil (PHPB-RJ), available at www.letras.ufrj.br/phpb-rj. For the statistical analysis, we used the software Goldvarb-X (SANKOFF, D; TAGLIAMONTE, S. A; SMITH, E, 2001). Our hypotheses have been confirmed: the DP of indefinite-SE constructions presented a statistical behavior similar to the object; whereas the subject DPs of canonical passives, other SE-constructions behaved similar. Moreover, we could see grammars in competition (Kroch, 2001), in SE-constructions because of the patterns of verbal agreement: the emergence of Brazilian Portuguese grammar can be seen in sentences without agreement, like the ones with generic SE (RAPOSO e URIAGEREKA, 1996); whereas the sentences with agreement (indefinite-SE) belong to the European Portuguese grammar. Agradecimentos O verbo “agradecer” tem origem no vocábulo latino Gratus, que significa “agradecido” ou “agradável”, talvez por isso sejamos agradecidos a todos que nos propiciaram momentos agradáveis, mas considero que temos de agradecer também a aqueles que estiveram ao nosso lado nos intensos momentos de dificuldade os quais nos fazem crescer. Por isso, quero agradecer. Agradeço primeiramente a Deus, minha fonte de luz, de força, com quem eu me agarrei nos momentos em que nada parecia estar correto, naqueles instantes em que o corpo já exausto não reagia aos estímulos, mas era preciso trabalhar. Aos meus pais, não existem palavras capazes de descrever o quanto agradeço a Eliane Melo e Beniz Melo, os primos que casados constituíram uma família linda. Eles são o exemplo que levo para a vida, pessoas de coragem, perseverança que abriram mão de uma vida mais confortável porque acreditavam que educando adequadamente a mim e ao meu irmão, Beniz Junior, dariam a nós muito mais oportunidades do que as obtidas por eles. A vocês dois, tenho que dizer em caixa alta: OBRIGADA! Ao meu irmão, Beniz Junior, que está unido a mim por laços de sangue e a minha irmã, Tatiane Chuvas que é minha irmanzinha do coração preferida. Aos dois, obrigada por existirem na minha vida. Obrigada por me fazerem dar gargalhadas. Tatiane, obrigada por me ouvir, por estar sempre ao meu lado, por ser a minha amiga para todas as horas, pois afinal nós somos a prova de que não é preciso haver laços de sangue para que duas pessoas sejam irmãs. A minha família: avós, avôs, tios, tias, madrinhas, padrinho, primos, primas, amigos e amigas, afilhados que muito incentivaram essa longa caminhada. Obrigada, por tudo, pois afinal sair de uma família em que os avós são analfabetos e tornar-se Mestra requer muito esforço de todos. Agradeço, especialmente, à professora Silvia Regina de Oliveira Cavalcante, minha orientadora, o cuidado, a atenção, o carinho, a amizade com que me recebeu e conduziu no mundo da pesquisa. Particularmente, agradeço o seu constante estímulo na busca por novos conhecimentos linguísticos, o seu interesse ímpar e motivante na construção de um saber que possa auxiliar a desvendar o que são as gramáticas do português. Seu apoio imensurável na vida acadêmica e a sua sempre atenciosa postura em relação à vida pessoal me deram segurança, força, mas, sobretudo, exemplo de como prosseguir nessa caminhada pelo mundo das Letras. OBRIGADA! Aos meus amigos Caio Castro, Érica Nascimento e Ana Carolina Mrad, agradeço cada sorriso, telefonema, bate-papo sérios e aleatórios, viagens, congressos, lembranças de uma época da minha vida que ficará marcada. Ao Caio Castro, agradeço a pergunta cabal, numa sexta-feira de 2008, proporcionadora do início dessa caminhada que chega agora a Dissertação de Mestrado. A Érica e a Ana por terem descoberto que a nova professora do setor trabalhava com sintaxe histórica. Aos três por me ouvirem, aguentarem e até lutarem para entender as construções com SE. Falta ainda agradecer ao restante da grande família F-316: Janaína Pedreira, Rachel Oliveira, Leonardo Marcotulio, Aline Santos, Mayara Nicolau, Jéssica Melo, Stephanie Vale que sem dúvidas tornaram as tardes de trabalho momentos mais agradáveis. Agradeço também a Priscila Santos que surgiu não sei de onde no dia do resultado final do concurso para o Mestrado e ainda desconhecida comemorou junto comigo a aprovação. Obrigada por me ouvir, por me fazer rir, por estar ao meu lado em todos os momentos dessa caminhada. Agradeço aos meus professores desde a Pré-escola até as disciplinas da Pós-graduação, especialmente a Floraci Tavares, Roosevelt Espírito Santo, Eduardo Póvoa, Célia Lopes, Dinah Callou, Filomena Varejão, Carlos Alexandre Gonçalves, Kristine Stenzel, Mônica Orsini, Maria Eugênia L. Duarte, Afrânio Barbosa, Silvia Cavalcante, entre tantos outros pelo incentivo durante esse longo percurso de aprendizado que começou em 1992. Agradeço às professoras Charlotte Galves, Maria Eugênia Duarte, Célia Lopes e Márcia Rumeu que aceitaram participar da banca dessa dissertação. De modo especial agradeço as considerações, na arguição, das professoras Charlotte Galves e Maria Eugênia que muito acrescentaram na construção deste trabalho, indicando caminhos que produzirão reflexões as quais com certeza não cessaram nessa dissertação. Finalmente, quero agradecer aos meus alunos que de modo geral conviveram e convivem com uma professora estressada, mas que acredita na força da educação como a propulsora das mudanças necessárias nesse país. Agradeço a compreensão dos alunos do Estado que perderam uma professora no meio do ano letivo, mas que perceberam a importância da atitude de pedir exoneração na minha carreira. A eles, o meu obrigada por sempre que me encontram na rua, educadamente me cumprimentar e perguntar se já sou Mestre. Falta ainda agradecer ao CNPq que por meio da concessão de uma bolsa de Mestrado permitiu a mim que mais horas fossem dedicadas a pesquisa que é discutida nessa dissertação. Agradeço ainda ao Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas da UFRJ que subsidiou por meio de um auxilio financeiro algumas das viagens que fiz para apresentar trabalhos no Brasil e no exterior. Agradeço a todos que de alguma forma fizeram parte dessa história, apesar de não estarem por nome citados aqui. Vocês sempre estarão guardados em meu coração. Enfim, quero dizer a todos: OBRIGADA! Este trabalho foi parcialmente financiado por uma bolsa do CNPq. A Francisco Alfredo Ferreira Santos (in memorian), João Melo Neto (in memorian), Antônio Alfredo Santos (in memorian), Eliane Alves Santos Melo e Beniz Santos Melo. Pronominais (Oswald de Andrade) Dê-me um cigarro Diz a gramática Do professor e do aluno E do mulato sabido Mas o bom negro e o bom branco Da Nação Brasileira Dizem todos os dias Deixa disso camarada Me dá um cigarro Índice de Figuras Tabela 1: Distribuição dos PPs agente da passiva por tipo de construção (média por séculos) (%) (Retirado de CAVALCANTE, 2011) ....................................................................................................... 30 Tabela 2: Frequência de uso da ordem verbo-sujeito, VS (Retirado de Berlinck, 1989:90) ... 33 Tabela 3: Fatores que favorecem a inversão do sujeito ao longo do tempo em textos de brasileiros (Retirado de Berlinck, 1989:) .................................................................................................. 34 Tabela 4: Ordens SV e (X)VS na escrita catarinense dos séculos XIX e XX (Retirado de COELHO e MARTINS, 2009) .............................................................................................................................. 35 Tabela 5: Contextos sintáticos de VS na escrita catarinense dos séculos XIX e XX em três tempos (Retirado de COELHO e MARTINS, 2009:78) ............................................................................. 36 Tabela 6: Distribuição dos referentes de VS e SV pelas categorias informacionais principais (Retirado de NARO E VOTRE, 1987:469) .................................................................................................... 39 Tabela 7: Frequência de ordem VS segundo o estatuto informacional do sujeito, no PB e no PE modernos (Retirado de BERLINCK, 1997:65) ..................................................................................... 40 Tabela 8: Ocorrência de não concordância. (Retirado de DUARTE, 2002:163) ........................... 44 Tabela 9: Posição do SN x Não concordância (Retirado de DUARTE, 2002:165) ......................... 44 Tabela 10: Construções com “se” e a não concordância com o argumento interno em sentenças finitas (Retirada de DUARTE e LOPES, 2002) ....................................................................... 45 Tabela 11: Realização do argumento interno com relação ao verbo infinitivo nas construções com SE no Corpus TychoBrahe (Retirado de CAVALCANTE, 2006:94) ............................................ 51 Tabela 12: Presença x ausência de preposição em infinitivas com “se” e sem “se” (Adaptado de DUARTE e LOPES, 2002: 163) .................................................................................................................... 52 Tabela 13: Uso de SE com infinitivo em relação à posição do argumento interno e tipo de texto: Período 4 (Retirado de CAVALCANTE, 1999:95) ......................................................................... 53 Tabela 14: As cartas de redatores ao longo do tempo por periódico ............................................... 80 Tabela 15: As cartas de leitores ao longo do tempo por periódico ................................................... 80 Tabela 16: Os anúncios ao longo do tempo por periódico ................................................................... 81 Tabela 17: Distribuição dos dados por gênero textual .......................................................................... 81 Tabela 18: Realização do argumento (interno ou externo) por construção (sentenças finitas e infinitivas)........................................................................................................................................................... 96 Tabela 19: A nova distribuição geral dos dados em sentenças finitas e não finitas. .................. 98 Tabela 20: A distribuição geral nas sentenças finitas. ........................................................................... 99 Tabela 21: A distribuição geral nas sentenças não finitas ................................................................... 99 Tabela 22: Anteposição x posposição ao longo do tempo por tipo de estruturas nas sentenças finitas .................................................................................................................................................................... 101 Tabela 23: As sentenças não finitas ao longo do tempo por tipo de estrutura .......................... 104 Tabela 24: O argumento nulo nas sentenças finitas ............................................................................ 106 Tabela 25: Anteposição x Posposição nas sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo finitas por tipo de sintagma. ......................................................................................................................... 109 Tabela 26: Anteposição x Posposição nas sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo não finitas por tipo de sintagma. ................................................................................................................ 109 Tabela 27: Anteposição x Posposição nas sentenças finitas com SE-reflexivo por tipo de sintagma. .............................................................................................................................................................. 115 Tabela 28: Anteposição x Posposição nas sentenças não finitas com SE-reflexivo por tipo de sintagma. .............................................................................................................................................................. 115 Tabela 29: Distribuição do estatuto informacional dos referentes dos sujeitos em construções VS finitas e não finitas com SE-reflexivo ......................................................................... 120 Tabela 30: Anteposição x Posposição nas sentenças finitas passivas por tipo de sintagma. 120 Tabela 31: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com SE-reflexivo .......... 123 Tabela 32: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas Passivas .......................... 125 Tabela 33: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com SE-genérico .......... 127 Tabela 34: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com SE-indefinido ....... 127 Tabela 35: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com SE-ambíguo .......... 128 Tabela 36: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com objeto direto ........ 129 Tabela 37: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças não finitas com SE-reflexivo . 129 Tabela 38: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças não finitas com SE-indefinido, genérico ou ambíguo. ...................................................................................................................................... 130 Tabela 39: Traço de animacidade nas sentenças finitas com SE-indefinido, genérico ou ambíguo................................................................................................................................................................ 132 Tabela 40: Concordância em sentenças finitas com SE-indefinido/genérico ............................ 138 Tabela 41: Concordância nas construções com SE-indefinido/genérico ao longo do tempo. ................................................................................................................................................................................. 141 Tabela 42: As sentenças com SE-genérico por gênero textual ......................................................... 145 Figura 1: Tipos de SE na diacronia do português (Retirado de CAVALCANTE, 2011a) .............. 22 Figura 2: Características do SE-genérico no PB. (Retirado de CAVALCANTE, 2006:186) ......... 48 Figura 3: Do que trata a linguística histórica? ( Retirado de MATTOS e SILVA, 2008:10) ........ 57 Figura 4: Proposta para repensar a periodização: revisitando a periodização da Língua Portuguesa (Retirado de GALVES, NAMIUTTI e PAIXÃO DE SOUSA, 2005) .................................... 61 Figura 5: O redobramento do nível histórico da língua segundo Koch (1997:45) ...................... 72 Figura 6: Organização do ordenograma (Retirado de Melo, 2011) ............................................... 144 Gráfico 1: SV-cl versus XVS em sentenças ativas ao longo do tempo no Corpus Tycho Brahe (%) (Retirado de PAIXÃO DE SOUSA, 2004:244) ..................................................................................... 26 Gráfico 2: Distribuição dos argumentos (Anteposto, Posposto e Nulo) por tipo de construção ao longo do tempo (%) (Retirado de CAVALCANTE, 2011) ................................................................. 28 Gráfico 3: Distribuição dos argumentos antepostos por tipo de construção ao longo do tempo em Paixão de Sousa (2004) e Cavalcante (2011). (%) .......................................................................... 29 Gráfico 4: Sujeitos plenos e a hierarquia referencial (Retirado de KATO, CYRINO, DUARTE e BERLINCK, 2006:424) ........................................................................................................................................ 42 Gráfico 5: Verbo auxiliar “do” no Inglês em diferentes contextos (Retirado de KROCH 1989:22).................................................................................................................................................................. 69 Gráfico 6: A anteposição ao longo do tempo por tipo de construção em sentenças finitas. . 102 Gráfico 7: O argumento nulo nas sentenças finitas .............................................................................. 106 Gráfico 8: O argumento nulo nas sentenças não finitas ..................................................................... 107 Gráfico 9: A concordância ao longo do tempo nas sentenças com SE-indefinido/ genérico. 142 Gráfico 10: Ordenograma dos anúncios (Retirado de Melo, 2011) ................................................ 144 Sumário Introdução ................................................................................................................................ 1 Capítulo 1: Construções com SE e posição do sujeito ................................................4 1.1 Apresentação.................................................................................................................4 1.2 As estruturas em análise ........................................................................................... 4 1.3 Análises diacrônicas quantitativas..................................................................... 22 1.4 A ordem do sujeito no PB e as construções com SE ...................................... 32 1.4.1 A ordem do sujeito no PB................................................................................ 33 1.4.2 As construções com SE no PB ........................................................................ 43 1.5 As sentenças não finitas ......................................................................................... 50 1.6 Concluindo o capítulo.............................................................................................. 54 Capítulo 2: Pressupostos Teóricos e Metodológicos ............................................... 56 2.1 A questão da mudança ............................................................................................ 56 2.2 A periodização ........................................................................................................... 59 2.3 O Modelo gerativista. ............................................................................................... 63 2.4 Competição de Gramáticas .................................................................................... 67 2.5 A Teoria de Tradição discursiva .......................................................................... 71 2.4 Metodologia e Hipóteses ........................................................................................ 74 2.4.1 Objetivos e Hipóteses ....................................................................................... 74 2.4.2 A amostra ............................................................................................................. 77 2.5 Concluindo o capítulo.............................................................................................. 82 Capítulo 3: Análise dos dados ......................................................................................... 83 3.1 3.1 Os contextos sintáticos em análise .............................................................. 83 3.1.1 As formas de realização do DP ...................................................................... 83 3.1.2 Os contextos sintáticos e as estruturas observadas em relação a realização dos DPs ....................................................................................................... 84 3.1.2.1 Tipo de construção ........................................................................................ 85 3.1.2.2 Estrutura do núcleo do predicado ........................................................... 87 3.1.2.3 Marca de número no argumento e Marca de número no verbo .... 87 3.1.2.4 Realização do argumento ............................................................................ 88 3.1.2.5 Realização do referente ............................................................................... 89 3.1.2.6 Traço de animacidade................................................................................ 90 3.1.2.7 Realização do sintagma agentivo ............................................................. 91 3.1.2.8 Tipo sintático da oração .............................................................................. 92 3.1.2.9 Tempo e modo verbal com predicadores simples e complexos .... 93 3.1.2.10 Tempo.............................................................................................................. 94 3.1.2.11 Gênero textual .............................................................................................. 95 3.2 Distribuição geral dos dados. ............................................................................... 95 3.3 O DP das sentenças com SE que apresentam verbo transitivo direto: sujeito ou objeto? ......................................................................................................... 99 3.4 O estatuto informacional e a ordem dos constituintes ............................ 108 3.5 O tipo de oração ..................................................................................................... 122 3.5.1 O tipo de oração e as sentenças finitas ................................................... 122 3.5.2 O tipo de oração e as sentenças não finitas ........................................... 129 3.6 Traço de animacidade .......................................................................................... 132 3.7 Competição de gramáticas ................................................................................. 137 3.7.1 A concordância ................................................................................................ 137 3.7.4 Anúncios e cartas: os gêneros textuais e a competição de gramáticas ......................................................................................................................................... 143 Considerações Finais ....................................................................................................... 146 Referências ......................................................................................................................... 150 Introdução O objeto de estudo desse trabalho é a análise da ordem do DPargumento interno nas sentenças com SE, tradicionalmente classificadas como passivas sintéticas por apresentarem concordância entre o verbo transitivo direto e o argumento interno no plural como podemos ver no exemplo (1). Diversos estudos, ((Duarte (2002), Duarte e Lopes (2002), Cyrino (2007), Cinque (1988), Dobrovie-Sorin (1998), Mateus et alli (2003)), já observaram essas construções sempre levando em consideração o fator concordância para afirmar que o argumento interno era sujeito. (1) Vendem-se machinas de costura Singer e outras, a dinheiro e a prestações de 5$ a 10$, e alugão-se por pequenos alugueis; na rua Larga de São Joaquim número 116. (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881) Observaremos essas mesmas construções a fim de provar que o DPargumento interno de sentenças como (1) não é o sujeito da sentença ainda que exiba concordância com o verbo. Para tanto, compararemos a posição desse argumento com o DP-sujeito de sentenças passivas analíticas e com SE recíproco (2a), inerente (2b) ou reflexivo (2c). Além disso, observaremos o comportamento do objeto direto (2d) em sentenças transitivas. (2) a) meu amigo, as minhas licenças eu as dou a um guarda da camara para as tirar, porque só assim fico descançado de multas e outros incommodos, embora pague por cada uma 3 ou 4 $ rs., porque elles lá se entendem uns com os outros; (Carta de Leitor, O Despertador Municipal, 28 de Fevereiro de 1850) b) O salão acha-se aberto todos os dias das 9 horas da manhã às 9 horas da noite. Entrada Franca (Anúncios, Diário de Notícias, 29 de dezembro de 1885) 1 c) Infelizmente, ha bastante tempo que a nossa camara dos deputados se resentia, da falta de um orador eloquente, calmo e que uzasse de uma linguagem floreada e elegante; sem attenção a preconceitos ou ideiais de partido, dissesse a verdade franca e nua.(Carta de Leitor, Correio da Noite, 22 de Janeiro de 1879) d) V.Ex.ª é na verdade um ministro PREVARICADOR e CONCUCIONARIO a vista do seu procedimento para com o Official maior Cunha Mattos, pois a voz publica acuza esse funcionario publico V.Ex.ª não o manda justificar, o que dizermos de V.Ex.ª? (Carta de Redator, O Guerreiro, 04 de Março de 1853) Propomos esta comparação, pois a hipótese principal desse trabalho é que se o DP-argumento interno das construções ditas “passivas sintéticas” for o sujeito os padrões estatísticos de anteposição, posposição e argumento nulo serão iguais aos apresentados pelos sujeitos das construções recíprocas, reflexivas, inerentes e passivas analíticas. Entretanto, se for o objeto seu comportamento será simétrico ao encontrado nas sentenças transitivas diretas em que observo apenas o constituinte com a relação gramatical de objeto direto. Essa hipótese fundamenta-se na proposta de Raposo e Uriagereka (1996) e nos resultados quantitativos das análises diacrônicas de Cavalcante (2006), Cavalcante e Paixão de Sousa (2009) e Cavalcante (2011a, b) que indicam ser o DP-argumento interno das construções com SE, preferencialmente, posposto. A análise está pautada na Teoria de Principios e Parâmetros (Chomsky, 1986). O objeto de estudo de um gerativista é a Língua–I, que é uma propriedade biológica capaz de gerar sentenças, sendo sinônimo de gramática internalizada. Para se chegar à Língua-I, temos disponível a Língua-E, que pode ser entendida como o desempenho do falante, ou seja, o produto da Lingua-I. Numa pesquisa que utiliza os pressupostos da Teoria de Princípios e 2 Parâmetros é necessário trabalhar com os dados da Língua-E para checar as pistas que indiquem a Língua-I. A amostra é constituída por cartas de leitores, cartas de redatores e anúncios publicados em jornais cariocas durante o século XIX. Esses textos integram o Corpus do projeto Para uma História do Português Brasileiro – RJ (PHPB-RJ), disponível em www.letras.ufrj.br/phpb-rj. A amostra está dividida em três períodos: 1808-1840, 1841-1870 e 1871-1900. Faremos uso do pacote de Programas Goldvarb-X (SANKOF, D; SMITH, E; TAGLIAMONTE, 2001) como uma ferramenta para o tratamento estatístico dos dados que foram codificados de acordo com contextos sintáticos e ainda em relação ao tempo e ao gênero textual. Esta dissertação está organizada da seguinte forma: no primeiro capítulo, traremos uma discussão acerca dos trabalhos empíricos que tratam do nosso objeto de estudo. No segundo capítulo, apresentaremos o quadro teórico metodológico, as hipóteses, os objetivos, a metodologia no qual apoiamos a análise. No terceiro capítulo, apresentaremos os contextos sintáticos que serão analisados nas seções seguintes deste capítulo. Finalmente, encerraremos a dissertação com as considerações finais que os resultados da pesquisa nos permitem apontar. 3 Capítulo 1: Construções com SE e posição do sujeito 1.1 Apresentação Neste capítulo, procuraremos abordar diferentes visões sobre as construções com SE e a ordem do sujeito no PB, PE e Português Clássico. Posteriormente, trago alguns resultados empíricos acerca dessas sentenças, a partir de diferentes aportes teóricos. Em geral, os trabalhos que serão discutidos tratam do tema a partir de um viés diacrônico num percurso histórico que tem início no Português Arcaico e chega ao Português Brasileiro (doravante PB), passando pelo Português Clássico e Português Europeu (doravante PE). 1.2 As estruturas em análise A amostra desse trabalho consta de objetos diretos, sentenças passivas analíticas, com SE reflexivo, recíproco, inerente, “passivo”, ambíguo e indeterminador1, conforme apresentado na introdução. Inicio esse capítulo discutindo as características dessas oito estruturas, sendo a ordem de apresentação a seguinte: passivas analíticas, SE-reflexivo, SE-recíproco, SE- 1 Os autores que serão apresentados ao longo do capítulo tratam com diferentes nomes o SEindeterminador. Assim, por vezes, durante a apresentação da revisão bibliográfica farei uso da terminologia de cada autor. Vejamos a nomenclatura adotada por cada autor: Duarte, Brito e Matos (2003): SE-indeterminador; Naro (1976): SE-impessoal; Raposo e Uriagereka (1996): SE-genérico. No capítulo 3, especificamente, adotarei a nomenclatura proposta por Raposo e Uriagereka (1996). 4 inerente, SE-passivo, SE-indefinido, SE-nominativo, SE-ambíguo e objeto direto. As passivas analíticas2 são, segundo Duarte (2003), sentenças em que o constituinte com a função sintática de sujeito tem na voz ativa correspondente a relação gramatical de objeto direto, enquanto que o sintagma preposicionado, tradicionalmente classificado como agente da passiva, tem na ativa a função de sujeito. Outra característica dessa estrutura é a manutenção dos papeis temáticos entre o sujeito da passiva e o objeto direto da ativa e entre o agente da passiva e o sujeito da ativa correspondente. O predicador da sentença passiva é um verbo na forma de particípio que concorda em gênero e número com o sujeito, além dele há o verbo auxiliar “ser”, como vemos com os exemplos em (1): (1) a) O protesto que fiz sobre a apprehensão da carne não foi indeferido, nas sim acceito, pois que foi mandado juntar ao processo enviado ao Sr. guardamor,que, sabendo que tal protesto não podia ser acceito pela alfandega, devolveu-o á inspectoria, declarando que lhe parecia não ser isso regular. (Carta de Leitor, Actualidade - Jornal da Tarde, 29 de Janeiro de 1869) b) Os pontos mais difficeis do programma, taes como os que se referem á Prehistoria, aos primeiros typossociaes, á sciencia da historia, da qual se deduzem os dados cosmologicos, physicos e psychologicos, foram tratados com toda a proficiencia e orientação didatica pelo Senhor Annibal Mascarenhas que, sem resfolhos, explanou estes variados assuntos de modo a facilitar sua comprehensão a todas as intelligencias. (Anúncios, A Bomba, 10 de Outubro de 1894) 2 Duarte (2003) afirma ainda que existem as passivas adjetivas que também podem ser chamadas de passivas de estado ou resultativas. Elas compartilham com as passivas sintéticas e as analíticas a propriedade de ter a relação gramatical de sujeito exercida pelo argumento interno. Em passivas adjetivas podem ocorrer verbos copulativos como “ficar”, “estar”, “andar”, entre outros e o predicador verbal que fica no particípio, segundo Mendes (2001), funciona como adjetivo formado por um processo de conversão na morfologia, como se pode ver em (i) e (ii): (i) O carro está deteriorado (ii) O carro ficou deteriorado Em virtude de a literatura não apresentar uma classificação específica como passiva para sentenças como (i), optamos por não tratar delas nesse trabalho. 5 Os clíticos SE recíproco (2a) e reflexivo (2b) apresentam conteúdo argumental, pois ocupam a posição de objeto direto dos verbos transitivos, sendo tratados como clíticos de referência anafórica. Eles admitem construções de redobro, ou seja, estruturas em que um clítico pronominal átono tem a mesma referência de um XP que marca a posição argumental a qual o clítico está associado, tal como ocorre em (2a) em que o argumento interno SE e o DP “uns com os outros” têm o mesmo referente, ou seja, o pronome nominativo “elles”. Nas construções com SE-recíproco, o redobro é parafraseado por expressões como “uns com os outros”, “um com o outro” e suas variantes, como (2a). Já nas sentenças com SE-reflexivo a expressão é “a si próprio”. (2) a) meu amigo, as minhas licenças eu as dou a um guarda da camara para as tirar, porque só assim fico descançado de multas e outros incommodos, embora pague por cada uma 3 ou 4 $ rs., porque elles lá se entendem uns com os outros; (Carta de Leitor, O Despertador Municipal, 28 de Fevereiro de 1850) b) Uma pessoa bastante habilitada encarrega-se de tratar questões forenses, policiaes e particulares nesta Capital, e , bem assim, legalisa com brevidade e por diminuta retribuição os papeis necessarios para enlaces matrimoniaes no civil, e no religioso. Cartas nesta redacção a E. M. (Anúncios, O Jacobino, 8 de agosto de 1896) Segundo Brito, Duarte e Matos (2003), o SE-inerente caracteriza-se por não apresentar conteúdo semântico ou morfossintático. Nessas construções o clítico não pode ser retirado do verbo, sendo uma propriedade lexical do predicador. Esse tipo de pronome ocorre em sentenças com verbos reflexos, conforme os exemplos em (3): (3) a) Carvalho teve a fortuna de ganhar a opinião publica, sendo reeleito quatro vezes por unanime acclamação dos Povos, quando o Sr. Barreto se fazia aborrecido pela guerra civil, que promoveo, aliciando Povo, e a Tropa: elle se 6 dirigio a mim, que lhe respondi o que devia, que era esperar pela decisão de S.M.I., a quem, já se achava affecto este negocio. (Carta de leitor, O Propugnador, 13 de Junho de 1824) b) porque os homens honestos se envergonhão de ler tantas sandices, que desacreditão o Brasil !!! (Carta de Redator, O Brasileiro Imparcial, 27 de Abril de 1830) O SE-indeterminador, que recebe diversos nomes na literatura: SEgenérico (RAPOSO e URIAGEREKA, 1996), SE-impessoal (NARO, 1976) ou SE-nominativo (DUARTE, BRITO e MATOS, 2003), é aquele presente em sentenças sem concordância entre o verbo transitivo direto e o argumento interno, como em (4): (4) Fornece-se comidas para fóra, de casa de familia, com proptidão e asseio, tanto á portuguesa como á brazileira, mandando-se conduzir em casa; na rua do Rosario, número 46, sobrado. (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881) Este é um clítico argumental de referência arbitrária. Sendo o sujeito parafraseável por “alguém”. Esse clítico tem como característica o fato de não admitir redobro, pois este só é possível quando se admite a ocorrência do pronome forte. Tem-se então que sentenças como (5) são agramaticais (5) *Alguém aluga-se casas. (BRITO, DUARTE, e MATOS, 2003:837) Outras propriedades deste clítico são que ele não pode ocupar uma posição de expletivo, como mostram os exemplos em (6a) e (6b), e ocorre em construções de extração simultânea de clítico, conforme (7a) . (6) a) *Há-se muitos livros nesta biblioteca. (BRITO, DUARTE e MATOS, 2003:837) 7 b) *Parece-se a toda a gente que os professores compram livros em excesso (BRITO, DUARTE e MATOS, 2003:837) (7) a) Informa-se que se aluga apartamentos e vende moradias (BRITO, DUARTE e MATOS, 2003:837) O SE-passivo ocorre segundo Duarte (2003) nas passivas de –se em sentenças que apresentam concordância entre o verbo transitivo direto e o argumento interno no plural, como em (8): (8) a) Os artigos publicaram-se propositadamente no último número da revista. (DUARTE, 2003:531) b) O canivete usou-se para cortar o pão. (DUARTE, 2003:531) Para Duarte (2003), o argumento interno de sentenças como (8) exerce a função sintática de sujeito e por isso apresenta concordância verbal, tal como exposto nos exemplos em (9), ele tem obrigatoriamente o traço de terceira pessoa e mantém com o objeto direto da ativa correspondente a constância do papel temático de paciente, conforme os exemplos em (10): (9) a) Esse artigo publicou-se no último número da revista. (DUARTE, 2003:531) b) Os três canivetes usaram-se para cortar o pão (DUARTE, 2003:531) (10) a) Os artigos publicaram-se propositadamente no último número da revista (DUARTE, 2003:531) b) O canivete usou-se para cortar o pão (DUARTE, 2003:531) c) Publicaram os artigos no último número da revista. (DUARTE, 2003:532) d) Usaram o canivete para cortar o pão (DUARTE, 2003:532) Nessas sentenças, o argumento externo com o papel temático de agente, segundo a autora, não pode ser expresso por meio de um sintagma 8 preposicionado (11a) e (11b). Mas a presença de um agente está garantida pelo fato de haver construções em que ocorre um advérbio orientado para o agente, como em (10a), ou um adjunto final cujo sujeito é c-comandado pelo argumento externo que está implícito na sentença, como em (10b). Este agente recebe sempre uma interpretação arbitrária (11) a) *Os artigos publicaram-se no último número da revista pelo editor. (DUARTE, 2003:52) b) *O canivete usou-se por alguém para cortar o pão. (DUARTE, 2003:52) Quanto à posição que esse clítico ocupa, Duarte argumenta que ele recebe o papel temático externo, ficando em [SPEC-VP] e recebe caso acusativo, fazendo com que o argumento interno só possa receber caso nominativo, sendo tratado como o sujeito da sentença. A autora ainda argumenta que sentenças com SE que apresentam verbo transitivo direto no singular com argumento interno também no singular há uma interpretação ambígua entre a leitura passiva ou indeterminada conforme exemplificado em (12). É esse o tipo de clítico que denomino de SE-ambíguo. (12) a) Descobriu-se uma fuga no reactor nuclear. (DUARTE, 2003:533) Int 1: Foi descoberta uma fuga no reactor nuclear. (DUARTE, 2003:533) Int 2: Alguém descobriu uma fuga no reactor nuclear. (DUARTE, 2003:533) b) Assaltou-se uma carrinha de transporte de valores. (DUARTE, 2003:533) Int 1: Foi assaltada uma carrinha de transporte de valores. (DUARTE, 2003:533) Int 2: Alguém assaltou uma carrinha de transporte de valores. (DUARTE, 2003:533) 9 Percebemos assim que estamos diante de vários tipos de SE – o reflexivo, o recíproco e o inerente – que estão presentes em sentenças em que o argumento externo é o sujeito. O indeterminador que é um argumento e, por isso, recebe papel temático e ocupa a posição de sujeito, sendo seus traços [+ humano] e [– definido], o que possibilita a leitura arbitrária do clítico. O passivo não é um argumento verbal e funciona como um morfema capaz de mudar a diátese da voz verbal, ou seja, fazer com que uma sentença ativa passe à passiva. Outros trabalhos têm observado que, especificamente, no que concerne a questão do SE-passivo e do SE-nominativo há análises que consideram haver também o SE-indefinido que seria produto de uma gramática em que o SE-passivo perde espaço. Vejamos a discussão acerca das características do SE-indefinido (RAPOSO e URIAGEREKA, 1996 e MARTINS, 2003) e da reanálise proposta por Naro (1976) para o SE-impessoal e posteriormente a figura retirada de Cavalcante (2011a) em que são apresentadas de forma sintética as características dos tipos de SE na diacronia do português. Naro (1976) apresenta a partir do quadro gerativista transformacional uma análise diacrônica das construções com SE no português. Ele afirma que existem tanto no PB quanto no PE construções com verbo transitivo direto + SE sem concordância. O autor dá a essas construções o nome de “impersonalse”. Nelas, a posição de sujeito é ocupada pelo clítico SE e este argumento é interpretado como um ser humano indefinido. Além disso, essas sentenças não permitem, nas duas línguas citadas, a superficialização do sintagma agentivo que na passiva analítica, como mostram os exemplos em (13a) e (13b), pode ser omitido. 10 (13) a) Os jovens foram levados pelo pai para casa. b) Os jovens foram levados para casa As construções do tipo (14) demonstram que no século XVI era possível que um agente da passiva constasse nas sentenças com SE que apresentavam concordância entre o verbo transitivo direto e o argumento interno. Este é um dos argumentos para se afirmar que nesse período ainda havia SE-passivo (14) a) Vendem-se estas casas. (NARO, 1976:780) b) “...o mar remoto navegamos que só dos feos focas se navega...(Lus, I, 52)” (NARO, 1976:781) Sentenças com se impessoal, como (15), seriam uma inovação da gramática do século XVI. Elas além de não poderem ter a superficialização do sintagma agentivo e de terem um sujeito [+humano] e [+ indefinido] apresentam certas restrições quanto ao tipo de verbo. Elas não ocorrem com verbos impessoais e com verbos que não podem ter um sujeito humano. Observemos os exemplos em (16): (15) Vende-se casas (NARO, 1976) (16) a) Estas teorias implicam as teorias de Einstein. (NARO, 1976) b) *Alguém implica as teorias de Einstein. (NARO, 1976) c) *Implica-se as teorias de Einstein. (NARO, 1976) Entretanto, a inserção desse clítico em sentenças em que o pronome indefinido “alguém” não pode aparecer é possível. Ainda assim, (17b) é agramatical porque o pronome “alguém” não poder ocorrer em contextos que exigem sujeito plural. Outra característica é que sentenças em que se faz 11 referência a humanos sem diferenciação dentro de um grupo são consideradas agramaticais, mas naquelas em que a referência é feita sobre um elemento de um grupo são consideradas gramaticais. Observe as sentenças em (18): (17) a) Trocou-se saudações (NARO, 1976:782) b) *Alguém trocou saudações (NARO, 1976:782) (18) a) *Fala-se um após o outro (NARO, 1976:782) b) Eles falam um após o outro (NARO, 1976:782) Com isso podemos dizer que as principais características do SEimpessoal são: [- definido], [+ humano], [3ª pessoa], [+clítico], [+nominativo]. As construções com SE-impessoal surgiram, segundo Naro (1976), a partir da reanálise das construções com SE-passivo. As sentenças com SEpassivo apresentavam concordância e agente da passiva como exemplificado em (14) e (19): (19) a. Como Josep se conheceu pelos irmãaos. (séc. 14, NARO, 1976:789) b. o mar remoto navegamos, que só dos feos focas se navega (séc. 16, NARO, 1976:781) Na passagem do século XIV para o XV há uma mudança tanto no português (NARO, 1976) quanto no espanhol (LAPESA, 1981, 2000) em que começam a ser produzidas sentenças sem concordância. É a existência de construções como (20) que faz Naro afirmar que houve uma reanálise no estatuto das construções com SE. (20) Trocou-se saudações (NARO, 1976:782) A reanálise consiste na interpretação do argumento interno de sentenças como (20) como o objeto da oração, sendo a função de sujeito exercida pelo 12 clítico SE. Para Naro (1976), exemplos ambíguos como (21) são a motivação para o processo de reanálise do se-passivo em se-impessoal. Em sentenças como (21) não há a presença do sintagma agentivo, mas há concordância entre o verbo e o argumento interno, além disso, o sujeito está à direita do verbo numa posição prototípica de objeto. É a convergência desses três fatores que permite ao argumento interno ser interpretado como objeto da oração, dando a ela um estatuto de sentença ativa com sujeito impessoal. (21) e porém se lee este evangelho na festa da trindade (NARO, 1976:802) Como visto a posição defendida por Naro (1976) quanto às sentenças sem concordância já é adotada por Duarte (2003), mas as análises acerca das construções com concordância, até Raposo e Uriagereka (1996), continuavam apontando que o clítico nessas sentenças era um morfema capaz de mudar a diátese da voz verbal. Raposo e Uriagereka (1996) preocupam-se em observar essas construções advogando que também nelas o clítico SE exerce a função de sujeito, cabendo ao argumento interno a relação gramatical de objeto. Nessas sentenças a concordância ocorre porque este complemento verbal recebe nominativo, sendo o clítico classificado como indefinido. Baseando-se na comparação entre as passivas analíticas e as construções com SE que apresentam concordância, os autores mostram que se o DP argumento interno for movido, ele não ocupará a posição de sujeito, mas sim a de tópico: [SPEC, F], ou seja, uma posição que é responsável, no PE, segundo Uriagereka (1995), por codificar o estatuto informacional da sentença: foco, ênfase, contraste, etc: 13 “F codifica ponto de vista. A assunção é que as informações teóricas de toda informação precisam ser mediadas através de um ponto de vista. Isto é, quando a ênfase aparece na sentença, alguém é responsável por essa ênfase. Informação nova ou velha é nova ou velha para alguém. Até mesmo o uso de uma expressão referencial necessita que se assuma a responsabilidade de chamar alguém de o assassino de Smith ou Jones. Desse modo, o constituinte que se move para [SPEC-FP] tem que checar traços relacionados à força ilocucionária da sentença. Essa checagem pode ser aberta (e aí se vê o movimento) ou somente de traços (o elemento permanece in situ)” (URIAGEREKA, 1995 apud CAVALCANTE, 2011a:7) Para Raposo e Uriagereka (1996) existe ainda outra posição à esquerda dos verbos finitos que é ocupada pelos constituintes que têm a relação gramatical de sujeito: [SPEC-TP]. Nela não há codificação de força ilocucionária, mas há checagem de caso nominativo. Vejamos então como se fundamenta a argumentação de Raposo e Uriagerka (1996) acerca do fato de o argumento interno dessas sentenças ser um objeto direto. Um primeiro dado de intuição que evidência o fato desse argumento não ser o sujeito da oração é que, em sentenças infinitivas tanto na voz passiva (22a) quanto na ativa (22b), o sujeito pode ocupar a posição pré-verbal, o que não é possível nas sentenças com SE-Indefinido. Observemos os exemplos em (23): (22) a) Vai ser difícil os tribunais aceitarem os documentos. b) Vai ser difícil os documentos serem aceitos. (23) a) Vai ser difícil aceitarem-se os documentos. b)* Vai ser difícil os documentos aceitarem-se. 14 Outros dados parecem mostrar que o DP da sentença com SE-indefinido não pode aparecer numa posição pré-verbal em sentenças infinitivas, diferentemente do DP sujeito da passiva. Em sentenças finitas encaixadas, é possível o DP das construções de SE-indefinido aparecer numa posição préverbal, assim como, é possível aparecer um elemento topicalizado (24a), mas não é possível haver topicalização do objeto numa sentença infinitiva, como mostra (24b): (24) a) Vai ser difícil que esses documentos o tribunal (os) possa aceitar b) *Vai se difícil esses documentos os tribunais aceitarem(-nos)] Para os autores, nas sentenças infinitivas como em (22), (23) e (24b) só existe uma posição à esquerda do verbo infinitivo disponível que é [SPEC, T], a posição do sujeito. Entretanto, nas sentenças finitas encaixadas são possíveis duas posições à esquerda do verbo finito [SPEC, F] e [SPEC, T], como demonstra o exemplo em (24a). Vejamos agora o contraste com sentenças com auxiliar ter: (25) a) Eu penso terem os soldados fuzilado os presos b) *Eu penso terem-se os presos fuzilado. c) Eu penso terem os presos sido fuzilados. d) Eu penso terem sido fuzilados os presos. e) Eu penso terem-se fuzilado os presos. Em (25a), o DP com a função de sujeito “os soldados” está à direita do verbo auxiliar, o mesmo ocorre em (25c), uma sentença passiva. A gramaticalidade de ambas não é atestada na sentença com SE-indefinido como podemos ver em (25b), ou seja, este DP não pode ocupar a posição de sujeito, visto que o verbo auxiliar “ter” em todas as construções ocupa uma 15 posição acima de TP. Já (25d) e (25e) mostram que não há problema quando o DP está na posição de objeto tanto na passiva analítica (25d) quanto na sentença com SE-indefinido (25e). Temos, portanto, mais uma evidência de que o DP das sentenças com SE-indefinido não é sujeito, mas sim complemento verbal: objeto direto. Outro argumento utilizado pelos autores está relacionado aos “nomes nus”, ou seja, aqueles sintagmas nominais que não possuem determinante. Sabemos que no PE os nomes nus só podem ocorrer numa posição de tópico se o seu referente for o objeto direto da sentença, e não podem estar ligados a uma posição de sujeito. Observemos o contraste em (26): (26) a) O Nestor compra salsichas no Talho Sanzot b) *Salsichas são compradas no Talho Sanzot c) *Salsichas custam caro no Talho Sanzot d) Salsichasi, o Nestor compra] [-]i no Talho Sanzot. e) *Salsichasi, [-]i são compradas no Talho Sanzot. f) *Salsichasi, [-]i custam caro no Talho Sanzot g) Vendem-se salsichas no talho Sanzot. h) Salsichasi, [-]i vendem-se no Talho Sanzot. Os exemplos em (26a), (26b) e (26c) demonstram que os nomes nus só são admitidos na posição de objeto, visto que quando ocupa o lugar do sujeito (26b) e (26c) as sentenças são agramaticais independente da voz verbal. Em sentenças com tópico marcado, se o DP das construções com SE-indefinido fosse o sujeito poderíamos esperar que as sentenças produzidas com o deslocamento do argumento fossem agramaticais, mas (26h) mostra que há gramaticalidade, assim como em (26a) e (26d), onde o argumento interno de 16 uma sentença transitiva direta está topicalizado. Entretanto, (26e) e (26f) são agramaticais porque o nome nu deslocado para a periferia à esquerda da sentença é o sujeito da oração. Para confirmar a hipótese de que o DP dessas construções quando anteposto não ocupa [SPEC, T], mas sim [SPEC, F], os autores propõem a análise de duas sentenças, que serão apresentadas em (27), a primeira (27a) apresenta o DP “os especialistas” à esquerda do verbo finito entretanto, não é possível saber se esta posição é [SPEC, F] ou [SPEC, T], pois apenas este constituinte aparece à esquerda. Em (27b), é possível observar exatamente as posições que cada constituinte ocupa, pois o sintagma preposicionado com a função de adjunto aparece deslocado na margem à esquerda da sentença em [SPEC, F], ao argumento “os especialistas” só resta a posição de sujeito, ou seja, [SPEC, T]. (27) a) Os especialistas consultaram-se durante a operação b) Em que momento da operação os especialistas se consultaram? Assim, a interpretação dada a essas duas sentenças é distinta, pois enquanto em (27b) só é possível a leitura reflexiva/recíproca visto que o argumento está na posição de sujeito, em (27a) há ambiguidade entre a leitura reflexiva que como (27b) teria o argumento na posição de [SPEC, T] ou indefinida com o constituinte em [SPEC, F] no PE. No PB, ela só pode ser reflexiva. Cavalcante (2011a) apresenta a representação em colchetes das duas possibilidades de interpretação para (27a). Observe: (28) a) [TP Os especialistas consultaram-se durante a operação] b) [FP Os especialistas [TP [SE consultaram durante a operação]] 17 Assim aponto abaixo os cinco argumentos de Raposo e Uriagereka (1996) que demonstram que o DP das sentenças com SE-indefinido não é o sujeito da oração. São eles: Nas sentenças infinitivas, o DP-sujeito pode ocupar a posição pré-verbal nas ativas e nas passivas. Entretanto, o mesmo não é possível nas sentenças com SE-indefinido. Em sentenças finitas encaixadas existem duas posições à esquerda do verbo finito. Uma desta é [SPEC, F] para onde se movimenta o argumento interno das sentenças com SE-indefinido. Os exemplos com verbos epistêmicos mostram que um DP-sujeito pode ocorrer à direita do verbo auxiliar, entretanto o DP-objeto não pode ocupar a mesma posição. As sentenças com SE-indefinido são agramaticais. Em PE, apenas os constituintes com a função de objeto direto admitem “nomes nus”, tanto na posição de origem, quanto na posição de tópico. Visto isto, as sentenças com SE-indefinido apresentam “nomes nus”. O último argumento dos autores comprova a existência das duas posições à esquerda do verbo finito e indica que quando só uma posição é preenchida no PE há ambiguidade entre a leitura reflexiva/recíproca e indefinida, pois não se sabe se o argumento está em [SPEC, F] ou [SPEC, T]. Apresentados estes argumentos que comprovam ser este DP um objeto, Raposo e Uriagereka (1996) propõem uma análise para explicar a concordância entre um objeto e o verbo flexionado. Para tanto, os autores fazem uso da Teoria de Checagem proposta por Chomsky (1995). 18 Cavalcante (2011a) retomando Raposo e Uriagereka (1996) mostra que a proposta dos autores está atrelada a duas hipóteses: (1) “SE é um “DP mínimo”, no sentido de possuir traços semânticos reduzidos [humano] e [indefinido], assim como PRO. SE recebe como PRO, Caso nulo”; (2) “no PE existem duas posições disponíveis para checar nominativo, [SPEC, T] e uma outra [SPEC-F]. Essa posição F encontra-se à esquerda de T. É nessa posição que o DP argumento interno vai checar o caso nominativo.”(CAVALCANTE, 2011a) Com essa proposta os autores explicam a concordância das sentenças indefinidas, mas não afirmam que o DP está na posição de sujeito ou ligado a ela por cadeia conforme Cinque (1988), Dobrovie-Sorin (1998), Cyrino (2007), entre outros. O sujeito da sentença é o clítico SE, assim como nas sentenças impessoais/genéricas. Outra autora, que também advoga em favor das construções com concordância entre o verbo transitivo direto + SE e o argumento interno serem ativas com sujeito de referência arbitrária é Ana Maria Martins, especialmente em Martins (2003). Passemos, então, a análise da autora. Martins (2003) nos apresenta uma proposta de análise similar a de Raposo e Uriagereka (1996), apontando que as construções com SE que apresentam concordância entre o verbo transitivo direto e argumento interno plural são ativas, sendo a função de sujeito exercida pelo clítico SE. As sentenças com SE-passivo seriam fósseis linguísticos de outras gramáticas que aparecem em textos produzidos por falantes que têm o PE como língua materna. A autora amplia a análise de Raposo e Uriagereka (1996) para as sentenças com duplo sujeito em dialetos da Ilha da Madeira e de Porto Santo, 19 que constituem parte da amostra do projeto CORDIAL-SIN (Corpus Dialectal com Anotação Sintáctica). Vejamos então quais são os argumentos para tratar as sentenças passivas como fósseis. Martins (2003) seguindo a proposta de Naro (1976) reafirma que o SEpassivo apresenta as seguintes restrições: só ocorre diante de verbos transitivos, o argumento interno sempre concorda com o verbo e a presença do agente da passiva é opcional. No PE, entretanto, há um clítico que pode ocorrer em sentenças que possuam outro tipo de verbo: inergativo, ergativos, cópula, em que não haja obrigatoriamente a concordância e finalmente sem a expressão do agente da passiva. Além disso, construções com SE que exibem duplo sujeito produzidas nos dialetos da Ilha da Madeira e de Porto Santo, segundo Martins (2003), poderiam ser analisadas a partir da proposta de Raposo e Uriagereka (1996), sendo o clítico SE um argumento que recebe caso nulo em TP e o constituinte que o duplica outro argumento, mas que nesse caso recebe nominativo em FP. Observemos abaixo, alguns exemplos de sentenças produzidas na Ilha da Madeira e em Porto Santo. (29) a) E depois, chegando ao tempo da poda, a gente sega-se esses olhos todos e deixa-se este só (Camacha, Porto Santo) (MARTINS, 2003:30) b) Oh, era um pano que a gente se punha na caixa do moinho (Tanqueanque, Porto Santo) (MARTINS, 2003:30) c) A gente não se come, mas os de Lisboa diz que comem daquele peixe. (Câmara de Lobos, Madeira) (MARTINS, 2003:30) Para a autora, independentemente de haver concordância ou não as sentenças são ativas. E a diferença que se apresenta é em relação ao SEindefinido e ao SE-genérico, nas palavras de Raposo e Uriagereka (1996), o 20 primeiro SE recebe caso nulo e o argumento interno nominativo, já o segundo SE recebe caso nominativo e o argumento interno acusativo. Martins (2003) vai reafirmar a sua posição a partir da assunção de que o fato de existirem construções em que não é possível a substituição do argumento interno que recebe acusativo por um clítico de mesmo caso é resultado de uma restrição morfofonológica. Assim o clítico acusativo não pode aparecer em sentenças com SE-genérico e nem em construções com SE-indefinido (30a) e (30b), mas nas construções com SE-indefinido, (30b), o DP-argumento interno pode aparecer sob a forma de um pronome tônico nominativo quando em posição pré-verbal e se houver uma construção de focalização, (30c), o pronome “ele” pode aparece numa posição pós-verbal. (30) a. *Convidaram-se-os para a festa. (RAPOSO e URIAGEREKA, 1996:777) b. *Deu-se-o à Maria. (RAPOSO e URIAGEREKA, 1996:777) c. Eles convidaram-se para a festa. (RAPOSO e URIAGEREKA, 1996:777) d. Convidou-se até mesmo eles. (MARTINS, 2003:36-38) Desse modo as construções com SE-indefinido, encontradas no PE, seriam parecidas com as construções de duplo sujeito observadas nos dialetos da Ilha da Madeira e de Porto Santo. Mediante a análise de Naro (1976), Raposo e Uriagereka (1996) e Martins (2003) é possível construir um quadro que sintetize as características dos três tipos de SE em discussão para esses autores: SE-passivo, SEindefinido e SE-genérico. Vejamos então o quadro proposto por Cavalcante (2011a) com as respectivas características de cada tipo de SE. 21 Passivo Concordância DP na posição de sujeito SE é um clítico a Infl agente expresso como PP Só verbos transitivos Indefinido Concordância sem DP na posição de sujeito SE ocupa a posição de sujeito não possui agente Genérico Não-concordância sem DP na posição de sujeito SE ocupa a posição de sujeito ----------- Verbos transitivos Todos os verbos Figura 1: Tipos de SE na diacronia do português (Retirado de CAVALCANTE, 2011a) Vistas as características dos tipos de SE passemos a tratar, na próxima seção, de alguns trabalhos com análises diacrônicas quantitativas acerca da ordem do sujeito no P. Clássico, no PE ou no PB. 1.3 Análises diacrônicas quantitativas Muitos dos estudos propostos para as sentenças com SE têm considerado a questão da concordância como fator preponderante para definir se uma construção é passiva ou indeterminada. Como vimos nas seções anteriores, os três tipos de SE, elencados na literatura abrangem características que vão muito além do fator concordância ou não concordância. Por isso, proponho que nessa seção tratemos de alguns desses trabalhos e seus resultados a fim de que possam indicar um caminho para a análise do Corpus dessa pesquisa. Alguns trabalhos relacionados ao Projeto Padrões Rítmicos, Fixação de Parâmetros e Mudança Linguística (PAIXÃO DE SOUSA, 2004; GALVES, BRITO e PAIXÃO DE SOUSA, 2005; CARNEIRO, 2005; CAVALCANTE, 2006; FLORIPPI, 2008; GIBRAIL, 2009) têm mostrado que há uma mudança na passagem do século XVII para o XVIII que caracteriza a emergência da gramática do PE. Esses resultados em muitos casos envolvem a posição do 22 sujeito, e mostram que a mudança paramétrica que resulta na emergência do PE tem relação com o fronteamento de constituintes. Isto porque a gramática do Português Clássico, anterior ao PE, é caracterizada como uma língua em que a posição de sujeito é preferencialmente pós-verbal. No PE, ao contrário, os resultados apontam para um sistema em que o sujeito ocupa uma posição pré-verbal. Essa diferença na frequência de uso da anteposição e da posposição nas duas gramáticas, que trataremos mais detalhadamente abaixo, tem relação com uma estrutura sintática distinta. No Português Clássico, segundo Paixão de Sousa (2004), o sistema VS permitia inúmeras combinações: VS, XVS, XVSX, sendo a posição X, anteposta ao verbo, ocupada por um constituinte pragmaticamente proeminente, ou seja, há nessa língua uma posição para onde se deslocam os constituintes de acordo com seu estatuto informacional. No, PE, entretanto, segundo a mesma autora, a posição X não é mais pragmaticamente proeminente, na verdade, esta passa a ser a posição do sujeito havendo ainda construções em que há outro constituinte numa margem mais à esquerda do verbo. Relacionando essa característica às construções com SE, Cavalcante (2011a), propõe que se no século XVI não havia uma posição à esquerda dos verbos prototipicamente ocupada pelo sujeito, uma gramática como a do Português Clássico não diferenciaria se um constituinte anteposto era o sujeito da sentença ou qualquer outro elemento pragmaticamente proeminente, um tópico, o que faz com que as construções com SE-passivo (o DP, quando anteposto, se move para a posição de sujeito) ou SE-indefinido (o DP, quando 23 anteposto, se move para a posição de tópico) sejam ambíguas entre os séculos XVI e XVII. Além da ordem do sujeito o sistema de clítico também tem sido apontado como diferenciador das duas gramáticas. Paixão de Sousa (2004), observando-o do Português Arcaico, ou seja, a gramática do Português Medieval, até o PE em sentenças ativas, nota que a posição do sujeito no Português Arcaico e no Clássico era VS, constituindo um sistema conhecido como V2, ou seja, em que o verbo ocupa preferencialmente a segunda posição na sentença. A autora menciona que “importantes estudos sobre os textos medievais e clássicos3 têm proposto que a perda da interpolação é o ponto de distinção principal entre o português arcaico e o sistema que o segue.” (PAIXÃO DE SOUSA, 2004:39). Como a distinção das duas gramáticas está relacionada à perda da interpolação, o padrão V2 (31a), como dito anteriormente, se mantém como a ordem preferencial, existindo sentenças em que havia V1 (31b) ou V3 (31c) conforme exemplificado abaixo. (31) a) Agora o faco, dando todo o meu poder a estas regras e renunciando nelas todo meu coracao: para que nao so signifique a Vossa Senhoria meu sentimento em seu sentimento, mas para que me saiba tanto aproveitar da causa dele, que traga dessas sombras claridades e dessas lagrimas avisos, com que possa alumiar minhas trevas e advertir meus desconcertos. (Corpus Tycho Brahe, Melo, 1608) b) Julga-vos as obras, julga-vos as palavras, e ate o mais intimo pensamento vos julga e vos condemna. (Corpus Tycho Brahe, Vieira, 1608) c) Vendo tao rara e verdadeira amizade, el-rei Dionisio o mais velho disselhes: Eu perdoo o crime, a troco de que me admitais tambem por vosso amigo. (Corpus Tycho Brahe, Bernardes, 1644) As sentenças VS apresentavam preferencialmente propriedades das chamadas Inversões Germânicas, ou seja, aquelas em que o sujeito aparece 3 Martins (1994), Torres Morais (1995) e Ribeiro (1995). 24 imediatamente posposto ao verbo e é comum a presença de outro elemento em posição inicial, como em (32a). (32) a) Aos 22 de Setembro partiu de Lisboa; acompanhou-o ate a portaria toda a comunidade; ao despedir-se, ou fosse lembrando-se que a viva forca deixava a casa e a companhia com que nela se criara, ou que daquela hora em diante entrava em cuidados tormentosos e cheios de perigo e desgostos, nos quais se lhe trocara a quietação e descuido santo com que tantos anos entre aqueles padres vivera, reconheceu a humanidade sua fraqueza e derramou muitas lagrimas,por mais forca que fazia pólas dissimular. (Corpus Tycho Brahe, Sousa, 1556) b) Vossa Mercê terá ouvido dizer que os Alemães e gente muito romba de juízo e a meu ver não lhe faz injuria quem o diz; eu ao menos achei-a tal, mais do que esperava, porque supunha grande encarecimento nas informações dos italianos, e outras nações que tem para si que fora delas não ha juízo fino, com efeito estes homens são de pouquíssima viveza, de cabeça e de coração no considerar as coisas, e senti-las; dá-lhe poucos passos o espírito; pasmados e insensíveis fora de modo; donde Vossa Mercê pode tirar facilmente que no seu coração há menos bondade, e menos maldade, que não são outra coisa que movimentos do nosso espírito; mas nessa bondade eu não vejo nada da que e digna de estimação considerável; quero dizer daquilo que se chama virtudes finas, como sinceridade, rasgo, modéstia, generosidade a latina, ou nobreza de ações, etc.; quanto a maldade, confesso-lhe que com ela, ao que parece, se estender no coração desta gente menos que no de outras, para mim e neles mais aborrecível e insuportável pelas duas razoes de faltar-lhe a mistura de virtudes bonitas e de ser verdadeiramente de pé de boi; quero dizer: que não arreia, diminue a vista de olhos, como se vê as vezes entre nos. (Corpus Tycho Brahe, Costa, 1714) Há também evidências de outro padrão de inversão, a chamada inversão românica (32b) em que o sujeito não aparece contiguo ao verbo, que é notada nos poucos casos que restam de inversão do sujeito no PE, segundo Paixão de Sousa (2004). Na verdade, mesmo a frequência de uso de inversão germânica cai ao longo do século XVIII e atinge uma inversão tornando a língua emergente, ou seja, o PE preferencialmente com sujeito anteposto. Quando há posposição esta se caracteriza como uma Inversão Românica. Paixão de Sousa (2004) já salienta que em uma construção do tipo XVS, o 25 constituinte X é pragmaticamente proeminente, diferentemente do que ocorre no PE em que este mesmo constituinte ocupa a posição canônica de sujeito. No gráfico 1, verificamos a curva ascendente da ordem SV-cl entre os séculos XVI e XIX. Paixão de Sousa (2008) propõe que estruturalmente o constituinte fronteado no Português Clássico ocupa a posição de [SPEC-F], a mesma que Uriagereka (1995) advoga ser a preenchida quando há um constituinte fronteado. Gráfico 1: SV-cl versus XVS em sentenças ativas ao longo do tempo no Corpus Tycho Brahe (%) (Retirado de PAIXÃO DE SOUSA, 2004:244) Observando as construções com SE-indefinido e as sentenças ativas com clítico. Paixão de Sousa e Cavalcante (2009), também já haviam observado argumentado que, baseando-se nos resultados de Paixão de Sousa (2004), antes do século XVIII não há uma posição específica para o sujeito à esquerda do verbo finito. As autoras afirmam que em XVS, o constituinte fronteado é um elemento pragmaticamente proeminente que pode por vezes ser o sujeito da oração: “we take the combined findings of the aforementioned studies, centrally, as revealing that up to the 18th century 26 there was not a preverbal position specific for subjects in Portuguese. Instead, the preverbal position could be filled by any fronted element, as we can see by the behavior of XVS sentences in 16th-17th century texts. We assume, following Paixão de Sousa (2008), that the immediate preverbal position in Classical Portuguese is a position for pragmatically prominent constituents; crucially, this preverbal position is not a position for subjects, although a pragmatically prominent constituent obviously can (and in many instances naturally will) coincide with the grammatical subject.” (CAVALCANTE e PAIXÃO DE SOUSA, 2009) Os trabalhos de Cavalcante (2011a e 2011b), com um corpus constituido por textos escritos por autores portugueses nascidos entre os séculos XVI e XIX que compõem o Corpus Tycho Brahe4, comparam o comportamento dos DPs sujeitos de sentenças ativas (com SE-reflexivo/recíproco/inerente) e de sentenças passivas com o DP das construções com SE-indefinido considerando a frequência de argumentos nulos em relação à sua posição pré ou pós-verbal. No gráfico 2, adaptado de Cavalcante (2011a), os resultados comprovam que o DP-argumento interno das sentenças com SE-indefinido no século XVI tem praticamente a mesma taxa de anteposição que a verificada nos sujeitos das sentenças com SE-reflexivo e passiva analítica. Na passagem do século XVII para o XVIII, há uma grande diferenciação na frequência de 4 Os autores analisados em Cavalcante (2011) foram: Fernão Mendes Pinto (1510-1583) Peregrinação; Diogo do Couto (1542-1606) Décadas; Luis de Sousa (1556-1632) Vida de Frei Bertolameu dos Mártires; F. Rodrigues Lobo (1579-1621) Côrte na Aldeia e Noites de Inverno; Manuel de Galhegos (1597-1665) Gazeta em que se relatam as novas todas que ouve nesta corte; Manuel da Costa (1601-1667) A arte de furtar; Antonio Vieira (1608-1697) Cartas e Sermões ; J. Cunha Brochado (1651-1735) Cartas; Maria do Céu (1658-1753) Rellaçaõ da Vida e Morte da Serva de Deos a Veneravel Madre Ellena da Crus; Andre de Barros (1675-1754) Obra; Cavaleiro de Oliveira (1702-1783) Cartas; Matias Aires (1705-1763) Reflexão sobre a vaidade dos homens e Carta sobre a Fortuna; Antonio Verney (1713-1792) Verdadeiro Método de Estudar; Antonio da Costa (n.1714) Cartas do Abade António da Costa; Correia Garção (1724-1772) Obras Completas; Marquesa D‟Alorna (1750-1839) Cartas; Almeida Garrett (17991854) Viagens na Minha Terra; Marques de Fronteira e Alorna (1802-1881) Memórias do Marquês de Fronteira e Alorna; Ramalho Ortigão (1836-1915) Cartas a Emilia. Os textos estão disponíveis em <www.tycho.iel.unicamp.br/~tycho/corpus>. 27 anteposição, constituindo-se dois grupos: as sentenças com SE-indefinido e no outro as sentenças com SE-reflexivo e passiva analítica. Gráfico 2: Distribuição dos argumentos (Anteposto, Posposto e Nulo) por tipo de construção ao longo do tempo (%) (Retirado de CAVALCANTE, 2011) Vemos com o gráfico que nas construções com SE-indefinido ao longo do tempo a frequência de uso de DPs antepostos, pospostos ou nulos se mantém estável, sendo a maior frequência encontrada em sintagmas pospostos com índices que chegam a alcançar 68%. Valores tão altos para a posposição não são observados nas sentenças ativas e passivas, mesmo nos séculos XVI e XVII que como vimos tinha uma gramática em que a ordem preferencial era VS. Nesse período, a taxa de posposição de sujeito nas sentenças ativas e passivas analíticas variava entre 24% e 46% nas primeiras e 26% e 34% no segundo grupo. Se observarmos a taxa do sujeito pré-verbal nas sentenças com SEreflexivo e passivas verificaremos que a queda na frequência de uso da 28 posposição na passagem do século XVII para o XVIII representa uma ascensão na curva que indica a anteposição do DP sujeito nessas mesmas construções. Observemos que nos dois primeiros séculos a anteposição não supera a casa dos 50% variando entre 28% e 39% se considerarmos os dois tipos de sentenças, a frequência de uso aumenta na virada do século XVII para o XVIII, chegando a atingir 61% de DPs sujeito antepostos. Esta curva encontrada assemelha-se ao padrão observado por Paixão de Sousa (2004) com relação aos sujeitos pré-verbais em sentenças com ênclise. Vejamos o gráfico5 abaixo em que são apresentados os resultados de Paixão de Sousa (2004) e de Cavalcante (2011a) para as taxas de sujeito pré-verbal (com ênclise, em sentenças ativas e passivas canônicas) em comparação com a anteposição do DP das construções com SE-indefinido. 100% 95% 90% 80% 70% 72% 60% 61% 50% 59% 53% 46% 40% 39% 36% 30% 28% 31% 27% 26% 27% 26% 20% 11% 10% 3% 0% XVI SE-reflexivo (CV) XVII Passiva (CV) XVIII SE-indefinido (CV) XIX SV-cl (PS) Gráfico 3: Distribuição dos argumentos antepostos por tipo de construção ao longo do tempo em Paixão de Sousa (2004) e Cavalcante (2011). (%) 5 As legendas apresentadas no gráfico 1.3 têm respectivamente os seguintes significados: SE-reflexivo (CV) = SE-reflexivo (Cavalcante, 2011); Passiva (CV) = Passiva (Cavalcante, 2011); SE-indefinido (CV) = SE-indefinido (Cavalcante, 2011); e SV-cl (PS) = SV-cl (Paixão de Sousa, 2004) 29 O gráfico 3 deixa nítido o que já vínhamos advogando ao longo da seção, ou seja, ser o padrão de ordenamento das sentenças com SE-indefinido distinto do observado nas sentenças com SE-reflexivo, passivas e ainda em sentenças ativas que apresentem clítico. É interessante observarmos que nesses três tipos de estrutura é no século XVIII que a frequência de uso da anteposição supera os 50% demonstrando que a nova gramática já havia se estabelecido plenamente. Esses resultados, portanto, corroboram a proposta de Raposo e Uriagereka (1996) de que o argumento interno das sentenças com SE-indefinido não pode ser o sujeito da oração apesar de receber caso nominativo. Um dos fortes argumentos para ainda se tratar as sentenças com SE que apresentam concordância entre o verbo transitivo direto e o argumento interno plural como passivas é a presença do sintagma agentivo que como visto é facultativo nas passivas analíticas. Cavalcante (2011a) observa a frequência de PP agente da passiva em sentenças com SE-indefinido e em passivas analíticas, a fim de verificar se nas construções com o clítico este sintagma preposicionado ainda faz parte da Gramática dos textos portugueses entre os séculos XVI e XIX. XVI XVII XVIII XIX Total N-% N-% N-% N-% N-% Ausente 193 – 99% 227- 99% 506 – 99% 67 – 100% 993- 99% SE-indefinido Presente 1 –1% 3 – 1% 5 – 1% 0 – 0% 9 – 1% Total 194 230 511 67 1002 Ausente 53 – 77% 28 – 88% 36 – 67% 38 – 69% 155 – 74% Passivas Presente 16 – 23% 4 – 13% 18 – 33% 17 – 31% 55 – 26% Total 69 32 54 55 210 Tabela 1: Distribuição dos PPs agente da passiva por tipo de construção (média por séculos) (%) (Retirado de CAVALCANTE, 2011) Tipo de Construção/Tempo A diferença na frequência de uso de agente da passiva nas construções acima se mostra bem clara, pois os índices de presença desse sintagma nas 30 sentenças com SE-indefinido não supera a marca de 1%, enquanto que nas passivas analíticas (33a), ainda que de forma facultativa seu preenchimento oscila entre 13% e 33%. Os resultados indicam que o agente da passiva nas sentenças com SE-indefinido (33b) não faz parte da Gramática dos portugueses. (33) a) Os livros de Aristóteles foram levados a França no século treze pelos Franceses, que tinham ido a Constantinopla. (Corpus Tycho Brahe, Aires, 1705) b) Mas os X, e principalmente os Portugueses, governam-se por outros princípios. (Corpus Tycho Brahe, Verney, 1713) Cavalcante (2011b) observando o padrão de concordância das sentenças com SE no Corpus Tycho Brahe mostra que no Português Clássico e no PE a construção preferencial é aquela que apresenta concordância, tendo sido apenas encontrado um caso de não concordância em sentenças encaixadas (34a) e (34b). Nos demais exemplos com falta de concordância em matrizes, ou que poderiam ser tratados, como tal, a concordância é facultativa, pois os DPs no singular constituem-se como sintagmas coordenados, como vemos em (34c) e (34d): (34) a) Enquanto ao mais o mesmo que em Lisboa e em nada se conhece mais as homogeneidades de raça.” – (Corpus Tycho Brahe, Ortigão, 1836). b).Considerar a natureza e segui-la é a regra geral para acertar, porém, havendo licença para ornar as cópias que se fazem dela, ajuntando à escolha favorável que se elege os aparatos próprios que se apresentam, pode-se dar alguma liberdade à imaginação, contanto que se não falte à verdade nem ao natural inteiramente.” – (Corpus Tycho Brahe, Oliveira, 1702). c) Naõ se vio mais pouca vergonha, nem mayor subtileza! (Corpus Tycho Brahe, Costa, 1601). 31 d) Também se acha abutua, e a casca chamada Preciosa. – (Corpus Tycho Brahe, Barros, 1675) Para Cavalcante, esse padrão baixo de não concordância faz com que seja propícia uma reflexão acerca de outros fatores como a ordem a fim de investigar se uma construção apresenta SE-indefinido ou SE-passivo, principalmente, se tomando as palavras de Naro (1976) a reanálise das construções com SE-passivo como SE-impessoal está atrelada ao surgimento de sentenças sem concordância. E nesse sentido a proposta de Raposo e Uriagereka (1996) se torna importante, pois considera outros fatores além da concordância que diferenciam um SE-passivo de um SE-indefinido. Consideradas as análises de Naro (1976), Raposo e Uriagereka (1996), Martins (2003) e as análises diacrônicas de Cavalcante (2011a, b), Paixão de Sousa (2004) e Cavalcante e Paixão de Sousa (2009), é preciso observar como essas construções são tratadas no PB e como os resultados empíricos mostram o padrão de ordenamento do DP argumento interno. 1.4 A ordem do sujeito no PB e as construções com SE Nesta seção discutiremos alguns trabalhos (TARALLO, 1993; COELHO e MARTINS, 2009; BERLINCK, 1997; HAWAD, 2004; KATO, CYRINO, DUARTE e BERLINCK, 2006, entre outros) que tratam da ordem do sujeito e das construções com SE no PB. A seção está organizada da seguinte forma: primeiramente trataremos dos trabalhos sobre a ordem do sujeito no PB e posteriormente dos resultados acerca das construções com SE finitas e não finitas em Corpora representativos do PB. 32 1.4.1 A ordem do sujeito no PB Tarallo (1993), ao combinar diferentes resultados com base num mesmo corpus, propõe que é na passagem do século XIX para o XX que surge uma gramática brasileira, diferente da gramática do PE relacionando quatro mudanças: a reorganização do sistema pronominal com a maior frequência de sujeitos preenchidos e objetos nulos; a reorganização das estratégias de relativização; a fixação de uma ordem SVO rígida que por consequência enrijece o princípio da adjacência na marcação do acusativo; e, finalmente, a distinção nos padrões sentenciais de perguntas diretas e indiretas. Apesar de elencar as quatro mudanças apontadas por Tarallo (1993), interessa nessa dissertação especificamente a terceira, ou seja, aquela em que são observadas as posições ocupadas pelos DPs sujeito e objeto nas sentenças do PB, por isso, a revisão se restringirá a ela. A análise de Tarallo (1993) acerca da ordem baseia-se nos trabalhos de Berlinck (1988 e 1989) que mostram estar o enrijecimento da ordem do sujeito, SV, no PB, atrelado à mudança no sistema pronominal que passou a permitir sujeitos preenchidos e objetos nulos. Berlinck (1989) encontra justamente um padrão de ordenamento em textos de autores brasileiros variável entre o século XVIII e o XX havendo diminuição na frequência de uso da ordem VS conforme mostram os resultados da Tabela 3 abaixo, adaptada de Berlinck (1989:90). Século XVIII XIX XX N/Total 203/486 144/469 263/1262 % 42% 31% 21% Tabela 2: Frequência de uso da ordem verbo-sujeito, VS (Retirado de Berlinck, 1989:90) A tabela 2 revela que enquanto no século XVIII o sujeito era posposto em 42% das sentenças o índice cai para 21% no século XX. Além disso, 33 Berlinck (1989) também argumenta que não apenas diminui a frequência de uso, mas também o tipo de estruturas em que essa ordem pode aparecer e esse fato estaria relacionado a mudança no Parâmetro do Objeto Nulo no PB. Mas antes de tratarmos da relação anterior é preciso fazer menção aos fatores que ao longo do século propiciavam a inversão do sujeito no PB. Vejamos então o quadro de Berlinck (1989): XVIII Estatuto informacional Forma do SN Distinção aspectual Tipo de verbo XIX Tipo de verbo Forma do SN Forma sentencial XX Transitividade Forma do SN Animacidade do SN Distinção aspectual Concordância verbal Tabela 3: Fatores que favorecem a inversão do sujeito ao longo do tempo em textos de brasileiros (Retirado de Berlinck, 1989:) Observe que no século XVIII o tipo do verbo é apenas a quarta propriedade que favorece a ordem VS, no século XIX esta passa a ser a primeira característica. Dessa forma torna possível que haja especificação desse tipo de verbo e no século XX a transitividade verbal bloqueia a inversão do sujeito. Este bloqueio é resultado, segundo Tarallo (1993), da mudança no parâmetro do objeto nulo, pois como o PB o marca positivamente, sendo, portanto, os objetos nulos traços sintáticos da emergente gramática brasileira, a ordem VS é bloqueada para que não haja colisão entre o papel temático interno ou externo que é atribuído ao DP à direita do verbo. “Desde que os objetos nulos se tornaram um traço sintático dessa emergente gramática brasileira, a ordem VS deveria ser bloqueada com verbos transitivos a fim de não colidir com o papel temático a ser atribuído ao sintagma nominal ao redor do verbo” (Tarallo, 1993:92) Coelho e Martins (2009) observando quantitativamente a ordem XV numa amostra diacrônica de peças produzidas por catarinenses do século XIX ao XX que já havia sido analisada por Coelho (2008) notam que em 1466 34 sentenças afirmativas apenas 151 apresentaram a ordem VS e dessas apenas 51 apresentaram verbo na primeira posição. Vejamos a tabela de Coelho e Martins (2009) em que são apresentados os índices de SV, #VS e XVS nas peças catarinenses. Autor/ano de nascimento Alvaro de Carvalho (1829-1865) Antero dos Reis Dutra (1855-1911) Horácio Nunes (1855-1919) Ody Fraga (1927-1987) Ademir Rosa (1949-1997) Antônio Cunha (1961-) Fábio Bruggemman (1962-) Total SV(O) N/Total 206/235 177/212 107/127 29/33 325/363 289/303 182/193 1315/1466 % 88% 83% 84% 88% 90% 95% 94% 90% #VS(O) N/Total % 8/235 3% 14/212 7% 4/127 3% 2/33 6% 17/363 4% 5/303 2% 1/193 1% 51/1466 3% XVS(O) N/Total % 21/235 9% 21/212 10% 16/127 13% 2/33 6% 21/363 6% 9/303 3% 10/193 5% 100/1466 7% Tabela 4: Ordens SV e (X)VS na escrita catarinense dos séculos XIX e XX (Retirado de COELHO e MARTINS, 2009) Observando a ordem na tabela 4 percebemos que a anteposição é majoritária no século XIX quando considerados os sujeitos lexicais, mas voltemos a análise das construções com inversão de sujeito visto que as construções com SE apresentam DP majoritariamente posposto como destaca Cavalcante (2006, 2011a, 2011b). No que concerne a ordem VS percebemos que há mais inversão do tipo V2, portanto, XVS(O) (35a) do que #VS (35b). É possível notar também que independente do tipo de inversão há sempre uma curva descendente na passagem do século XIX para o XX, corroborando os resultados de Berlinck (1989). (34) a) Não. Já jantei. Além d‟isso alli vem a posteridade dos palitos. [Brinquedos de cupido (1898) de Antero Reis Dutra (1855-1911)] b) quando todos fugiam do pobre velho, com medo da peste: morre o velhote, que era pé de boi e nunca se tinha atravancado com rabos de saia, com perdão da Sora Úrsula e do mais mulherio. [Raimundo (1868) de Álvaro Augusto de Carvalho (1829-1865)] 35 A ordem apresentada na tabela 5 não separa as sentenças de acordo com o material interveniente entre o verbo e o sujeito pós-verbal, uma construção possível segundo Coelho e Martins (2009), Berlinck (1989) em textos produzidos por brasileiros do século XIX. Vejamos então quais os resultados encontrados por Coelho e Martins (2009) para esse tipo de construção. Contexto de mudança #VS XVS VXS VS 1808-1899 N/Total % 26/51 51% 59/100 59% 37/48 79% 48/104 46% 1900-1949 N/Total % 19/51 37% 23/100 23% 9/48 19% 33/104 32% 1950-1969 N/ Total % 6/51 12% 18/100 18% 2/48 2% 23/104 22% Tabela 5: Contextos sintáticos de VS na escrita catarinense dos séculos XIX e XX em três tempos (Retirado de COELHO e MARTINS, 2009:78) Novamente verificamos que há diminuição na frequência de uso do sujeito invertido independente do contexto de VS e que os contextos de V2 favorecem a posposição do sujeito. Esses resultados indicam que havia na gramática dos brasileiros do século XIX inversão românica e germânica, sendo a primeiro não encontrado no século XX, segundo Coelho e Martins (2009). Vejamos alguns exemplos de sentenças com inversão românica e germânica nos dados de autores catarinenses. (36) a) Qual seu Bibiano, respondia-me elle, em eleições ninguém me passa a perna, e além d‟ isso elle é da oposição. [Brinquedos de cupido (1898) de Antero Reis Dutra (1855-1911)] b) Pouco importa saber-se. Trata se de eleições; e aqui na roça, e em toda a parte são innumeros os batalhadores magicos Chicos Hypollitos, n‟essas ocasiões. A questão é sabermos de que modo caudinharam o Sr. Bibiano, quando contava elle a victoria certa. [Brinquedos de cupido (1898) de Antero Reis Dutra (1855-1911)] c) Por mais estranhas cousas que nos relate o Sr. Bibiano creio que não nos sorprehenderá. Ao mesmo tempo é fácil sermos interrompidos em meio da história, portanto, acho mais conveniente que aguardemos outra ocasião. Isto 36 querendo o Sr. Bibiano. [Brinquedos de cupido (1898) de Antero Reis Dutra (1855-1911)] A sentença (36b) apresenta um padrão de inversão não observado na tabela 6, ou seja, XVXS que também é tratado como inversão românica visto que verbo e o sujeito não estão adjacentes, tal como em (36a). Nas sentenças com inversão germânica (36c), o sujeito vem contíguo ao verbo. Para Kato, Cyrino, Duarte e Berlinck (2006), em um trabalho sobre o PB na passagem do século XIX para o XX considerando resultados das quatro autoras em trabalhos anteriores acerca do PB, as construções com inversão românica são mais restritas do que as com inversão germânica, sendo a realização de sujeito posposto não contíguos ao verbo resultado do estatuto informacional do SN ou do peso desse mesmo sintagma. Observamos assim que as análises acima apresentadas têm em comum o fato de que demonstram a diminuição na frequência de uso do sujeito posposto ao longo do tempo e também que o fator estatuto informacional está ao menos nos dados do século XIX sempre se fazendo presente no favorecimento da posposição do sujeito. Além disso, o que todos os trabalhos apontam é que a inversão do sujeito no século XX está restrita a sentenças não transitivas. É então importante observarmos o que é dito na literatura acerca da influência de fatores discursivos na ordem do sujeito no PB. Berlinck (1997) observa justamente a associação tradicionalmente feita na literatura de que sujeitos pospostos tendem a ser informação nova enquanto que sujeitos antepostos tendem a ser casos de informação dada em virtude do estatuto informacional no português que tem a posição à direita dos verbos marcada com traços [+apresentativos]. A análise de Berlinck (1997) é pautada 37 inicialmente na proposta de Naro e Votre (1986) acerca do estatuto informacional do sujeito, mas ao final a autora propõe uma nova análise. Vejamos primeiro a proposta de Naro e Votre (1987) que utilizarei na análise dos dados dessa dissertação. Para Naro e Votre (1987) é necessário haver uma distinção que demonstre o grau de novidade de uma informação em qualquer sentença, ou seja, informações completamente novas, parcialmente novas ou mesmo disponíveis, isto é, que pode rapidamente ser acessada pelo ouvinte/leitor, ainda que não tenham sido mencionada no discurso, mas façam parte do conhecimento compartilhado dos interlocutores, ou referentes únicos – presidente da república brasileira, Sol, Lua - e ainda dados de informações evocadas, ou seja, informações velhas. Os referentes parcialmente novos são os que não estão no discurso, mas podem ser acessados por meio de um referente acessível para o ouvinte. Os autores exemplificam os referentes parcialmente novos com a sentença em (37) em que o referente “casa da banha” é acessível para o ouvinte. (37) Aí, enche o estacionamento da "Casa da Banha". Consideremos então a tabela 7, adaptada de Naro e Votre (1987:469), em que os autores mostram a distribuição dos dados de SV x VS considerando se as informações são evocadas, disponíveis, parcialmente novas ou completamente novas. Ordem/Categoria Informacional Completamente novo Parcialmente novo Disponível Evocado SV N 0 19 35 97 151 VS % 0% 13% 23% 64% N 5 54 67 50 176 % 3% 31% 38% 28% 38 Tabela 6: Distribuição dos referentes de VS e SV pelas categorias informacionais principais (Retirado de NARO E VOTRE, 1987:469) É interessante observar o fato de os resultados comprovarem que as informações dadas, neste caso representadas pelas evocadas, tendem a ser antepostas, mas no que concerne aos casos de inversão podemos notar que a maior parte dos dados encontra-se no grupo dos DPs que têm referentes disponíveis no texto, ou no conhecimento compartilhado, contrariando a hipótese dos autores de que a posposição do sujeito estaria majoritariamente relacionada aos DPs que trouxessem informação completamente ou parcialmente nova. É fato também que os referentes completamente novos atingem apenas 3% de posposição indicando que a segregação proposta por Naro e Votre (1987) mostra que o DPs sujeitos pospostos não são tão novos. Assim para Naro e Votre (1987) o estatuto informacional sozinho não pode ser o responsável pela ordem que os DPs vão ocupar numa sentença é preciso considerar outros fatores como o tipo de verbo, etc. Berlinck (1997), analisando o PB e o PE, também propõe uma análise similar a de Naro e Votre (1987) apresentando o grupo “evocado” de modo distinto, ou seja, sendo formado pelos grupos: dados na situação, dado textual, dado inferível. Os demais grupos se mantêm os mesmos. Vejamos a tabela adaptada de Berlinck (1997:65). PB Dado na situação Dado textual Inferível Disponível Parcialmente novo Completamente novo Total N/Total 8/69 59/501 97/568 78/486 73/267 92/149 408/2040 % 12% 12% 17% 16% 27% 62% 20% PE N/Total 6/24 41/348 56/341 176/357 78/260 37/76 394/1406 % 25% 12% 16% 49% 30% 49% 28% 39 Tabela 7: Frequência de ordem VS segundo o estatuto informacional do sujeito, no PB e no PE modernos (Retirado de BERLINCK, 1997:65) Os resultados da tabela 7 confirmam os apresentados por Naro e Votre (1987), mostrando que em contextos com DP mais “dado” a posposição também é possível. Este fato novamente indica que é preciso considerar outros fatores além do estatuto informacional para tratar da ordem do sujeito no PB. No que concerne especificamente ao estatuto informacional das construções com SE, Hawad (2004), em um trabalho com textos publicados em jornais já no século XXI, mostra que a posposição do DP-argumento interno nesses casos pode ocorrer tanto com constituintes que representem uma informação nova como também com informação dada no discurso. Assim podemos dizer que nesses casos a posposição não está atrelada ao estatuto informacional , ou seja, um traço discursivo, mas sim a sintaxe das construções com SE. Os resultados até agora apresentados revelam um sistema em que a ordem VS cai em frequência de uso. Conforme Tarallo (1993), essa mudança está atrelada a marcação do parâmetro do sujeito e do objeto no PB e o resultado é que a queda no uso de VS no PB caminha junto com o aumento da frequência de uso do sujeito lexical conforme mostram os resultados de Kato, Cyrino, Duarte e Berlinck (2006). Para as autoras, durante o século XIX os sujeitos referenciais na primeira, segunda ou terceira pessoa são preferencialmente nulos, sendo o preenchimento desta posição relacionado a critérios discursivos como a ênfase, ou a posição de foco da sentença. Como demonstram os exemplos em (38) retirados de Kato, Cyrino, Duarte e Berlinck (2006:415) 40 (38) a) Quando (cv)i te vi pela primeira vez, (cv)i não sabia que (cv)j eras viúva e rica. (1845) b) Tua filha lamentar-se-á, (cv) chorará desesperada, não importa (...) i i Depois que (cv) estiver no convento e acalmar-se esse primeiro fogo, (cv) i i abençoará o teu nome e, junto ao altar, no êxtase de sua tranquilidade e verdadeira felicidade, (cv) rogará a Deus por ti. (1845) i Para as autoras sentenças como as expostas em (38) demonstram que o PB do século XIX apresenta um sistema compatível com uma língua de sujeito nulo, sendo a segunda metade do século XX um período em que ocorre uma mudança e os sujeitos referenciais passam a ser preferencialmente preenchidos. Como mostram os exemplos abaixo em (39) que foram retirados de Kato, Cyrino, Duarte e Berlinck (2006:416) (39) a. Se eu ficasse aqui eu ia querer ser a madrinha. (1992) b. Você não entende meu coração porque você „tá sempre olhando pro céu e procurando chuva. (1992) c. Agora ele não vai mais poder dizer as coisas que ele queria dizer. (1992) Essa mudança para Kato, Cyrino e Duarte (2000) obedece a uma hierarquia de referencialidade em que argumentos sujeitos [+humano] tendem a ser foneticamente realizados, ficando no outro extremo os sujeitos proposicionais que tendem a absorver a mudança no parâmetro do sujeito nulo de modo mais lento do que nos argumentos [+humanos]. Observemos como se dá a distribuição ao longo do tempo numa amostra de peças teatrais do aumento do sujeito preenchido no PB considerando o traço de animacidade do referente de acordo com a escala de referencialidade de Kato, Cyrino e Duarte (2000) que propõe que quanto mais referencial um argumento maior a probabilidade dele ser foneticamente preenchido. 41 Escala de referencialidade não-argumento proposição [-humano] 3 p. [+humano] 3 p. 2 p. 1 p. -espec. +espec. [-ref] < ---------------------------------------------------------------------------------- > [+ref.]. No gráfico 4 podemos observar a relação entre a escala de referencialidade e o preenchimento do sujeito: a escala de referencialidade é obedecida com os sujeitos [+humanos] e [+arbitrários] aumentando a frequência de uso de sujeito pleno de modo mais acelerado do que nos demais tipos de referente que se apresentam de modo mais resistente à mudança em direção ao sujeito pleno. 100% 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% [+hum] [+arb] [-hum] [+prop] Gráfico 4: Sujeitos plenos e a hierarquia referencial (Retirado de KATO, CYRINO, DUARTE e BERLINCK, 2006:424) Podemos concluir que a mudança que se processou segundo Tarallo (1993) na passagem do século XIX para o XX nos parâmetros do sujeito nulo e do objeto nulo fez com que houvesse uma reorganização do sistema que pode ser compreendida a partir da análise de corpora diacrônicos. Essa 42 reorganização acarretou um maior preenchimento da posição de sujeito e a menor probabilidade de inversão da ordem canônica SVO, estando esta inversão restrita nos dados do século XX a contextos de verbos monoargumentais. Passemos então, na próxima subseção, a tratar das análises acerca das construções com SE no PB. 1.4.2 As construções com SE no PB Duarte (2002) e Duarte e Lopes (2002) são dois trabalhos que investigam o clítico SE em amostras do Projeto Para uma História do Português do Brasil – PHPB. A primeira pesquisa trata apenas de sentenças encontradas em anúncios publicados durante o século XIX nos estados de Pernambuco, Bahia, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Santa Catarina. A segunda tem a amostra composta por cartas de redatores publicadas no Rio de Janeiro e na Bahia e por cartas de leitores que circulavam por Pernambuco, Minas Gerais, São Paulo e Paraná. Duarte (2002) aponta, observando a concordância verbal, que o uso do SE como indeterminador ou apassivador é variável nos anúncios com índices de 50,2% de concordância e 49,8% para não concordância. Esta frequência de uso varia de acordo com o estado por onde o jornal circulava. Santa Catarina é o estado que mais favorece as construções com menor concordância, enquanto que no Rio de Janeiro prevalece a variante com concordância. Parece, portanto, que a relação entre a presença ou a ausência das marcas flexionais está ligada a colonização e a ocupação do território pelos portugueses e outros imigrantes. O Rio de Janeiro do século XIX é o grande 43 pólo cultural nacional, mas a região Sul, onde se encontra Santa Catarina, tem um processo de colonização em que os portugueses não se fizeram tão presentes. O que pode justificar a maior ausência das marcas flexionais. Estado Santa Catarina Paraná São Paulo Minas Gerais Pernambuco Bahia Rio de Janeiro N/Total 12/13 8/12 60/98 6/15 4/ 11/25 12/56 % 92% 67% 61% 40% 50% 44% 21% P.R .92 .67 .64 .43 .41 .40 .20 Tabela 8: Ocorrência de não concordância. (Retirado de DUARTE, 2002:163) Ao considerar o contexto posição do sintagma nominal (posposto ou anteposto), Duarte encontra 58% de posposição do argumento interno e 32% de anteposição, como mostra a tabela 9 abaixo. Fato que nos leva a ressaltar que este não é um comportamento padrão do PB, se este for o sujeito da oração. Como o valor de aplicação da autora é a não concordância, os resultados apresentados nesse parágrafo nos remetem por consequência ao fato de que quando há concordância o sintagma nominal preferencialmente fica anteposto, visto que os pesos relativos .56 (posposição) e .38 (anteposição) para não concordância inversamente significam .44 (posposição) e .62 (anteposição) para concordância. Anteposto Posposto N/Total 90/154 23/72 % 58% 32% P.R .56 .38 Tabela 9: Posição do SN x Não concordância (Retirado de DUARTE, 2002:165) O trabalho de Duarte e Lopes (2002) pode ser considerado a continuação do acima exposto com o acréscimo de novos dados, novo tipos de textos que podem comprovar a hipótese de que no PB existem o SE passivo e 44 o indeterminador. O clítico sujeito para as autoras, em consonância com Cavalcante (1999), estaria em variação com o pronome pessoal reto de 1ª pessoa do plural nós. É interessante notar que a amostra de Duarte e Lopes (2002) das cartas de leitores mostra que o uso do se como uma estratégia de indeterminação supera a forma nós. Ocorre exatamente o inverso nas cartas de redatores e as autoras justificam este fato a partir do tipo de texto. “Enquanto os redatores preferem nós, o que se explicaria pelo fato de geralmente transmitirem a voz do jornal, os leitores, ao comentarem assuntos gerais e não particulares utilizam-se do se como estratégia que veicula o maior grau de indeterminação.” (DUARTE e LOPES, 2002:159) Novamente, os índices de não-concordância atingem os maiores valores na Região Sul, nesta pesquisa no Paraná. Dessa vez, entretanto, o Rio de Janeiro aparece com 40% de não-concordância. Cavalcante (1999) observando editoriais, crônicas e artigos encontra apenas 10% de não concordância. Observemos a tabela 10 em que apresento, a partir de Duarte e Lopes (2002), resultados da não-concordância em sentenças finitas com SE. Estados Paraná São Paulo Rio de Janeiro Minas Gerais Bahia Pernambuco Oco./Total 4/5 02/10 11/27 3/8 5/38 4/12 % 80% 20% 40% 37% 13% 33% Tabela 10: Construções com “se” e a não concordância com o argumento interno em sentenças finitas (Retirada de DUARTE e LOPES, 2002) Em ambos os trabalhos, as autoras concluem que nas sentenças finitas o clítico SE no século XIX ainda é majoritariamente um pronome apassivador. Duarte, Kato e Barbosa (2001) afirmam que no português brasileiro falado há 45 ausência do se-apassivador e elas atribuem essa perda a mudança no parâmetro do sujeito nulo. Os resultados, para as autoras, indicam que, na escrita, entretanto, o SE-passivo continua presente. Cyrino (2007) assume que no PB só há SE-genérico. A autora chega a essa conclusão por meio de uma análise qualitativa de dados diacrônicos coletados em uma amostra constituída por textos dos séculos XVIII, XIX e XX que compõem parte dos Corpora do PHPB e ainda do Projeto temático: Projeto de História do Português Paulista, subprojeto Mudança gramatical no Português de São Paulo. Os textos são dos seguintes gêneros: anúncios, cartas de leitores, cartas pessoais, cartas oficiais e dados de jornais da imprensa negra paulista. Especificamente, os dados do século XVIII foram produzidos por portugueses que moravam no Brasil. Seguindo Cavalcante (2006), para Cyrino (2007), que a presença apenas do SE-genérico no PB é resultado do fato de AGR ter um traço de pessoa defectivo e por isso não ser capaz de licenciar o sujeito, mas apenas identificá-lo. Assim, a análise proposta pela autora segue em consonância com a hipótese de que o PB perde as marcas de flexão verbal em virtude de uma mudança paramétrica. É interessante observarmos o exemplo (41) produzido em uma carta pelo Marquês de Lavradio em que há uma ocorrência de agente da passiva. Esta é a evidência segundo a autora para que as sentenças com concordância, que são tratadas como ativas por Raposo e Uriagereka (1996) e Cavalcante (2006), sejam tratadas como passivas, estendendo assim a ocorrência do SEpassivo no PE até o século XVIII. 46 (41) Ordena que viberes se vendão, pela meza da Inspeção, e se remeta o dinheiro para os Coffres do fisco da Cidade de Lixboa. (CYRINO, 2007:97) Este exemplo é considerado evidência para a existência de construções passivas no PE por ter sido o texto produzido por um português que morava no Rio de Janeiro setecentista, e por isso, não pode ser tomado como indicio da gramática do PB. O grande problema dessa análise de Cyrino (2007) é considerar que o um dado, num texto escrito, é evidência suficiente para que haja um tipo de estrutura que a literatura (RAPOSO e URIAGEREKA, 1996; CAVALCANTE, 2006, 2011a,b) afirma, a partir de propriedades sintáticas e também com base numa análise diacrônica, não fazer parte da gramática do PE, sendo os poucos casos em que há agente da passiva considerados fósseis linguísticos como aponta Martins (2003). Analiso este dado em consonância com a proposta de Martins (2003), ou seja, ele seria um fóssil linguístico. Mas voltemos às propriedades listadas por Cyrino (2007) para as construções com SE-impessoal no PB. Quando considerado o século XIX apenas com autores brasileiros são encontradas construções sem concordância. As características apontadas pela autora são: quando o argumento interno é plural, o verbo fica no singular (42a); O DP argumento interno é posposto ao predicador, exceto quando ocorrem quantificadores (42b); o DP também aparece anteposto quando ocorrem sentenças relativas (42c). (42) a. eu se podese vello lhe esclareceria a verdade porem por carta receio por que escrevo e não sei por quem mando, e porem em liviaria [?] não [se manda] sertas cartas. (CYRINO, 2007:98) 47 b. estiver conforme nada [se perde] devido a uma unanimidade dos candidatos. Se mover o Silviano nova campanha eleitoras. (CYRINO, 2007:99) c. e que o Sr do Bonfim queira dar-lhe [...] 10 muitos anos de vida com todas as felicidades que [se pode ambicionar] na vida (CYRINO, 2007:98) Sendo o PB, uma língua que só admite construções com SE-impessoal, Cyrino (2007) corrobora a análise de Cavalcante (2006) acerca dos tipos de SE na história do português. Vejamos parte do quadro adaptado de Cavalcante (2006:186) com as características das construções com SE na gramática do PB. PB SE-genérico # [SENom Vinf DPAcu] Não concordância entre V e DP argumento interno SE ocupa a posição de sujeito DP argumento interno checa acusativo SE está em variação com os pronomes a gente e você Figura 2: Características do SE-genérico no PB. (Retirado de CAVALCANTE, 2006:186) Apesar de Cyrino (2007) apontar, retomando Cavalcante (2006), que no PB só há SE-genérico, ainda são encontradas sentenças em que há concordância, portanto, construções que não fazem parte da gramática do PB. E por isso a autora apontará para a questão da competição de gramáticas entre a língua que emerge no final do século XIX e o PE. Cavalcante (2006) também observa que há competição de gramáticas nas sentenças produzidas por brasileiros do século XIX. Vejamos o que a autora salienta. Podemos, portanto, considerar que este tipo de variação observada em corpora de autores brasileiros está relacionado ao que Kroch (1989) chama de “competição de gramáticas”: a genuína gramática brasileira produz enunciados de se-impessoal, mas os falantes, na produção, se utilizam de seus “saberes linguísticos” que são espelhados numa outra gramática. Desse modo, podemos concluir que as construções com se que exibem concordância entre o verbo e seu argumento interno no plural, nos textos brasileiros, estão relacionadas a outra 48 gramática, a gramática que os falantes cultos se espelham. (CAVALCANTE, 2006:194) A variação observada por Cavalcante (2006), ou seja, entre construções com e sem concordância pode ser observada nas sentenças de Cyrino (2007) do século XX que apresentamos abaixo em (43) e ainda podemos perceber a competição de gramáticas em construções com SE-médio, ou seja, aquelas em que o clítico é interpretado de forma genérica (DOBROVIE-SORIN, 2006), pois tais sentenças estariam restritas a gramática do PE. (43) a) batalha, ahi, diariamente realisam-se bailes de maxixe que na maioria dançam mulheres brancas, que não se deixam de compartilhar as nossas patrícias a nossa vergonha, e a nossa raça fica completamente desmoralisada. (Projeto Temático – PHPP, século XX, CYRINO, 2007:100) b) Quase sempre cortamos as columnas onde encontra-se taes artigos e guardamos para de quando em vez relel-os. (Projeto Temático – PHPP, século XX, CYRINO, 2007:100) c) Não obstante haver-se perdido alguns de nossos amigos dançarinos, os ensaios têm sido a frequência costumeira, o que nos prova que bastante diminuta foi a perda que tivemos; oxa lá que menos fosse. (Projeto Temático – PHPP, século XX, CYRINO, 2007:100) d) me arrumar quanto antes, por| que de um momento para outro|podem as cousas mudarem-se,| e presentemente a epoca não lhe| póde ser mais favoravel do| que é. (Projeto Para a História do Português Brasileiro – PHPB, século XIX, CYRINO, 2007:99) Vistos alguns trabalhos acerca da ordem do sujeito no PB e das construções com SE em sentenças finitas, é preciso observar como se dá o ordenamento do sujeito e do DP argumento interno das sentenças com SE em construções não finitas. 49 1.5 As sentenças não finitas Para Galves (1987), uma das propriedades da Gramática do PB que a distingue do PE é a possibilidade de inserção do SE em sentenças não-finitas, exercendo, o clítico, a função de sujeito com interpretação arbitrária. Duarte (2002) aponta que a construção prescrita pela gramática normativa, ou seja, aquela que não apresenta o clítico é no século XIX majoritária, esse resultado é corroborado por Cavalcante (2002 e 2006), Duarte e Lopes (2002). Os exemplos em (44) mostram as diferentes sentenças que as duas línguas podem produzir: (44) a) É impossível se achar alguém aqui (PB) b) É impossível achar alguém aqui (PB e PE) Galves trata essas sentenças de forma especial por considerar que elas são muito representativas das diferenças encontradas nas gramáticas do PB e do PE. Enquanto no PE, o sujeito nulo das infinitivas é interpretado como coindexado a um antecedente da sentença e como não é possível ocorrer absorção de caso via co-indexação a leitura do sujeito da sentença só pode ser indeterminada. No PB, algo distinto acontece: o sujeito das infinitivas pode ter uma interpretação indeterminada quando o clítico SE se faz presente. Observe os exemplos em (45) de Duarte e Lopes (2002) (45) a. Não é tempo de peneirar as causas secretas desse procedimento, não é tempo de descobrir essa machina. (Diário de Pernambuco, 10/10/1871) b. Pelo interior é muito comezinho encontrar-se frequentemente esses infortunados a pedir o seu obolo (...) (O Correio Paulistano, 13/07/1854). Cavalcante (2006) observa o percurso diacrônico do SE em sentenças infinitivas no Corpus Tycho Brahe. Os resultados apontam para o fato de que 50 sentenças como (31) já faziam parte da gramática do Português Clássico. A tabela 13 traz os resultados diacrônicos de Cavalcante (2006) com relação à realização do DP argumento interno nas sentenças infinitivas com SE. 15501549 15501559 16001649 16501699 17001749 17501799 18001849 N-% N-% N-% N-% N-% N-% N-% Nulo 2 – 33% 5 – 13% 30– 27% 5 – 14% 17– 28% 2 – 12% 1 – 25% Posposto 4 – 67% 31– 84% 71– 64% 29– 80% 37– 62% 12– 71% 2 – 50% Anteposto - - 1 – 1% 1 – 3% - - - Relativizado - - 5 – 5% 1 – 3% 1 – 2% - 1 – 25% Topicalizado - 1 – 3% 3 – 3% - 5 – 8% 3 – 17% - Total 6 37 110 36 60 17 4 Tabela 11: Realização do argumento interno com relação ao verbo infinitivo nas construções com SE no Corpus TychoBrahe (Retirado de CAVALCANTE, 2006:94) Os resultados indicam que também nas sentenças infinitivas a posição canônica do argumento interno é pós-verbal, e que essas sentenças estão presentes na amostra desde o Português Clássico, como pode ser visto em (46a) e (46b). (46) a) Era chegada neste tempo ordem e mandato de Sua Santidade que no votar dos preladosiguais em dignidade se tomasse a preferência da antiguidade em promoção de cadaum, sem respeito de primacias, por evitar as dúvidas que ali e em Roma se tinhamlevantado por parte dos embaxadores e prelados castelhanos, sintidos do prejuízo quefazia `a Cadeira toledana o favor que Sua Santidade, antes de se abrir o Concílio, fizeraao Bracarense (Corpus Tycho Brahe, Sousa, 1556) b. Christo Senhor nosso deu hoje signaes para se conhecer ao longe o dia do Juiso: bem será que saibamos nós também algum signal por onde possamos conhecer o logar que n‟elle havemos de ter, e que seja hoje, pois o nosso Juiso está mais perto. (Corpus Tycho Brahe, Vieira, 1608) Os resultados de Cavalcante (2006) também mostram que um dos contextos favorecedores da inserção do SE é constituído pelas orações 51 introduzidas por preposições. Essa estrutura também favorece o uso de SE diante de infinitivo no PB, conforme resultados de Duarte (2002), Duarte e Lopes (2002) e Cavalcante (1999). Na tabela 14 apresentamos os resultados estatísticos de Duarte e Lopes (2002). Infinitivas + prep - prep Total Com “se” N-% 52 – 71% 21 – 29% 73 Sem “se” N-% 87 – 44% 112 – 56% 199 Tabela 12: Presença x ausência de preposição em infinitivas com “se” e sem “se” (Adaptado de DUARTE e LOPES, 2002: 163) Na análise de Cavalcante (1999), com editoriais, textos de opinião, crônicas publicados em jornais do século XIX e XX divididos em cinco períodos (1848-1869; 1891-1910; 1935-1942; 1964-1968; 1996-1998) como dito, também são encontradas sentenças com SE diante de verbo no infinitivo. Nessa amostra há evidências que demonstram a variação entre o SE-genérico e o SE-indefinido que Cavalcante (1999) chama de SE-passivo. No primeiro período, a autora só obteve um dado de SE-genérico, (47), retirado de um editorial: (47) “...para se achar sempre difficuldades em cousas comesinhas...” (Editorial, período 1) No terceiro e no quarto período, a autora encontra 2 dados que apresentam concordância, sendo, portanto, exemplos que ela chama de SEapassivador, um deles obtido em uma crônica (48b) e o outro num artigo de opinião (48a). No quinto e último período foram observados 25% de concordância nas sentenças com se o que significa em números absolutos 2 dados, dos quais apresentamos apenas um, (48c). 52 (48) a. “Respondendo a pergunta, começa ele assinalando o atual abuso praticado principalmente em politica, de se empregarem a miude expressões de sentido muito vago que cada partido interpreta segundo a sua fantasia, ou conforme as necessidades da sua propaganda eleitoral.” (Artigo de opinião, período 3) b)“para se porem os primeiros muito, muitissimo acima da segunda.” (Crônica, período 4) c) “...comissões supervisoras criadas com o objetivo de se evitarem erros cometidos no passado.” (Artigo de opinião, período 5) Quanto à posição do argumento interno nessas sentenças, Cavalcante (1999) encontra apenas 1 dado com DP anteposto. Vejamos a tabela abaixo em que é apresentada a frequência de uso da anteposição X posposição em sentenças com SE não finitas, considerando os três tipos de textos que compõem a amostra da autora. Anteposto Editorial Opinião Crônica Total N/Total 1/4 0/0 0/0 1/4 Posposto % 25% 0% 0% N/Total 2/83 8/79 6/49 16/211 % 3% 10% 12% Tabela 13: Uso de SE com infinitivo em relação à posição do argumento interno e tipo de texto: Período 4 (Retirado de CAVALCANTE, 1999:95) Em resumo, podemos dizer que no Português Clássico, no PE e no PB o contexto de sentenças preposicionadas favorece a inserção do SE. Além disso, a diminuição no uso de SE diante de infinitivo no PE pode ser resultado da mudança que caracteriza a emergência dessa gramática no final do século XVII. É interessante notar que duas línguas originadas do Português Clássico tomaram caminhos distintos: o PB frequentemente utiliza o SE, enquanto que o PE o faz menos vezes. Outro fator interessante a ser notado é que também nessas construções o DP-argumento interno permanece posposto ao verbo. 53 1.6 Concluindo o capítulo A discussão apresentada durante este primeiro capítulo evidência que na Literatura já há um consenso de que as sentenças com SE que não apresentam concordância entre o verbo transitivo direto e o argumento interno são ativas com sujeito indeterminado. A discussão é estabelecida, na verdade, acerca das construções em que há concordância, havendo duas visões possíveis: a primeira na qual se advoga que o argumento interno dessas sentenças é o sujeito em virtude da presença das marcas de concordância; e a segunda, em que é defendida a hipótese de que o argumento interno não é o sujeito, mas sim o objeto da oração e que as marcas de concordância são resultado do fato de este objeto receber caso nominativo. Os resultados de pesquisas diacrônicas tanto no âmbito do Português Clássico, Português Europeu e mesmo no PB têm apontado para o fato de que a concordância não é suficiente para definir se o DP das sentenças com SE que a apresentam é o sujeito da oração, pois este é um argumento que preferencialmente se mantem posposto aos verbos finitos e não finitos, numa posição prototípica de objeto direto tanto no PB quanto no PE. Além disso, os resultados de Cavalcante (2011a, b), mostram que há uma mudança na passagem do século XVII para o XVIII que indica a emergência da gramática do PE que não se reflete nos resultados das construções com SE, ou seja, a frequência de anteposição não aumenta. No PB, Cavalcante (1999) também encontra mais argumento posposto do que anteposto, indicando que também nessa gramática a posição do argumento interno nas construções com SE também não segue a mudança pela qual passa o sujeito. 54 São esses resultados que nos fazem apontar para a hipótese de que tais construções são ativas com sujeito indeterminado tal como afirma Raposo e Uriagereka (1996), se diferenciando das sentenças com SE-genérico em virtude de nessas o DP receber acusativo e naquelas, nominativo, sendo ambos o objeto direto da sentença. Essa hipótese inicial precisa ser comprovada pela análise dos dados que será apresentada no terceiro capítulo, mas antes tratemos dos pressupostos teóricos, da metodologia, hipóteses, objetivos e constituição da amostra no segundo capítulo. 55 Capítulo 2: Pressupostos Teóricos e Metodológicos Apresentarei nesse capítulo a discussão acerca dos pressupostos teóricos que usarei no trabalho. O capítulo está organizado da seguinte forma: apresento na introdução o conceito de linguística histórica, a fim de tornar claro para o meu leitor como o tratamento dos dados é feito nas pesquisas diacrônicas. Em seguida, discuto a Teoria de Principios e Parâmetros , a questão da competição de gramáticas e a tradição discursiva. Finalmente, trato da constituição da amostra, e da sua periodização em três fases: 1808-1840, 1841-1870 e 1871-1900. 2.1 A questão da mudança Mattos e Silva (2008) define com as seguintes palavras a linguística histórica, ou seja, a parte da Linguística preocupada com as mudanças: Tradicionalmente, define-se a linguística histórica como o campo da linguística que trata de interpretar mudanças – fônicas, mórficas, sintáticas e semântico-lexicais – ao longo do tempo histórico, em que uma língua ou uma família de línguas é utilizada por seus utentes em determinável espaço geográfico e em determinável território, não necessariamente contínuo. (...) Considero a linguística histórica stricto sensu a que se debruça sobre o que muda e como muda nas línguas ao longo do tempo em que tais línguas são usadas. (MATTOS e SILVA, 2008: 8-9) Para a autora, a linguística histórica tem, basicamente, dois enfoques: o primeiro considera os fatores intra e extralinguísticos, estando inserida nesse grupo a teoria laboviana da variação e mudança. O outro é o que trata apenas 56 dos fatores intralinguísticos e sob este enfoque está inserido o gerativismo diacrônico. Reproduzo abaixo o quadro de Mattos e Silva (2008) que mostra de FILOLOGIA LINGUÍSTICA HISTÓRICA modo sistemático do que trata a linguística histórica: A “ciência do texto”, base dos dados da linguística histórica. Lato Sensu Stricto Sensu Linguística histórica Sócio-histórica Considera fatores extralinguísticos ou sociais Todo tipo de linguística que trabalha com corpora datados e localizados Linguística diacrônica associal Considera, sobretudo, fatores intralinguísticos Figura 3: Do que trata a linguística histórica? ( Retirado de MATTOS e SILVA, 2008:10) Observando o quadro acima, compreendemos que é intrínseca a relação entre a linguística histórica e a filologia à medida que apenas nos textos escritos, em pesquisas diacrônicas, é possível obter amostras que evidenciem as mudanças6. Assim, numa visão mais ampla essa parte da Linguística é a que se preocupa com a visão da mudança ao longo tempo. 6 Com o desenvolvimento das pesquisas e com o avanço da tecnologia, atualmente, é possível, por exemplo, fazer uma análise de amostras com entrevistas gravadas na década de 1970, portanto, que já ultrapassam no limiar do tempo o período de constituição de uma geração e que poderiam ser tratadas como uma pesquisa diacrônica. Nesse sentido, as futuras gerações 57 A linguistica histórica diante da herança deixada pelo estruturalismo se notabilizou por ser o campo de estudo preocupado com a “dinâmica temporalcronológico dos processos linguísticos: ou seja, desenvolveu-se como „linguística diacrônica‟” (PAIXÃO DE SOUSA, 2006:21). E pode ser usada pelos mais diversos arcabouços teóricos, desde que sejam respeitadas as singularidades de cada teoria, tornando possível que as análises diacrônicas concebam os distintos fenômenos linguísticos. Os estudos diacrônicos por tratarem da mudança integram a esfera da fala à medida que é apenas nela que é possível haver a heterogeneidade linguística, ou seja, o mecanismo propulsor da mudança. É essa mesma perspectiva que Chomsky (1986) assume quando afirma que a diacronia para o gerativismo não se encontra na gramática, mas na performance do falante. Um variacionista, ao contrário, afirma que a heterogeneidade se dá naquilo que eles têm como objeto de estudo, ou seja, a língua nos seus planos geográficos, sociais e temporais. Como vimos, no quadro de Mattos e Silva (2008), a análise da linguística histórica está estritamente interligada aos estudos filológicos que permitem guardar as marcas deixadas na escrita pelos sistemas linguísticos e suas mudanças ao longo do tempo. Mas isso, talvez, seja um dos problemas que surjam quando há uma pesquisa diacrônica. A metodologia aplicada nesses trabalhos pressupõe, como dito anteriormente, que seja possível a partir de dados escritos observar a mudança, já que as formas conservadoras de algum modo se farão presentes no sistema, indicando aquilo que os gerativistas de lingüistas poderão ter acesso a dados diacrônicos que não estão extritamente em textos escritos. Isto, se as pesquisas não necessitarem de uma sincronia tão passada. Entretanto, para amostras anteriores a segunda metade do século XX sempre se fará necessário que o pesquisador recorra as pistas da gramática deixadas em textos escritos e nesse sentido a relação entre a Linguística Histórica e a Filologia continuará sendo intriseca. 58 chamam de pistas. Assim, como salienta Paixão de Sousa (2006), trabalhamos com o que o tempo deixou, e não com a mudança que está transcorrendo. “(...) trabalhamos com o que o tempo deixou e não com o que aconteceu; em outros termos, nossa análise opera no plano temporal do conhecimento, não no plano temporal dos acontecimentos (...)” (PAIXÃO DE SOUSA, 2006:29) Se a mudança se implementa, para um gerativista, no momento em que surge a nova gramática, é necessário compreender quais os contextos sintáticos, fonológicos, morfológicos que condicionam a aumento na frequência de uso de uma gramática B em detrimento da forma conservadora expressa pela gramática A. Assim a mudança é abrupta, mas a aplicação dela no sistema é lenta e gradual. 2.2 A periodização Outro problema que se coloca nas pesquisas diacrônicas é a periodização da mudança, ou seja, estabelecer o momento em que uma nova construção passa a fazer parte do sistema. Nesse sentido, podemos pensar na proposta de Tarallo (1993) quando o autor fazendo uso da Teoria de Variação Paramétrica afirma que o PB emerge na passagem do século XIX para o XX, valendo-se de quatro mudanças interligadas no sistema do PB para estabelecer este marco: maior preenchimento da posição de sujeito, maior frequência de categoria vazia na posição de objeto direto anafórico, perda da inversão livre do sujeito e aumento dos tipos de estratégias de relativização. Tarallo (1993) estabelece como periodização o ano em que a obra consultada durante o processo de catalogação dos dados foi escrita. Essa 59 metodologia tem como consequência o fato de que seja relativizada a tendência que o texto escrito tem de manter em uso as formas conservadoras, ou seja, o que pretendemos dizer é que os primeiros dados encontrados que indiquem uma mudança num texto escrito são sem dúvida indícios de que esta já está amplamente implementada na oralidade e, portanto, teve inicio numa fase anterior a data de publicação da obra. É inegável que numa pesquisa diacrônica às vezes é impossível estabelecer uma datação que seja distinta do ano em que a obra foi produzida, mas quando possível, utilizar a data de nascimento do autor pode ser um caminho. Galves, Namiuti e Paixão de Sousa (2005) propõem estabelecer uma nova periodização para a língua portuguesa, incluindo o PB, utilizando esta metodologia. A argumentação das autoras perpassa pelo conceito de gramática da Teoria de Gerativa, bem como pela noção de mudança para o mesmo arcabouço teórico que é assim entendida: “a Mudança Gramatical é uma função da relação entre a capacidade inata e a experiência linguística vivenciada pelas sucessivas gerações de falantes. O estudo da mudança depende, fundamentalmente, de uma teoria de aquisição de linguagem. As perguntas centrais da teoria da mudança serão: “Quais são as condições que levam, na aquisição, a determinada fixação paramétrica?”; e “Como e por que essas condições podem mudar, levando determinada geração a fixar um parâmetro de modo oposto ao que acontecia na geração anterior?”. (GALVES, NAMIUTI e PAIXÃO DE SOUSA, 2005 :3) Vemos por meio de Galves, Namiutti e Paixão de Sousa (2005) que a mudança linguística na Teoria Gerativa está relacionada à fase de aquisição da linguagem e, por isso, há a possibilidade de demarcar novas fases da língua portuguesa, inclusive recalculando o período em que emergiu o PB. A 60 assunção de uma nova periodização está ligada ao fato de que a concepção da língua como uma propriedade biológica implica que as mudanças ocorrem preferencialmente quando a criança está adquirindo a linguagem, ou seja, nos anos iniciais da vida. Figura 4: Proposta para repensar a periodização: revisitando a periodização da Língua Portuguesa (Retirado de GALVES, NAMIUTTI e PAIXÃO DE SOUSA, 2005) Observemos que as autoras propõem uma periodização distinta da tradicional para o português da Europa, e para tanto, se baseiam no fenômeno da interpolação da negação. Aqui pretendo me deter apenas ao PB e nesse sentido, é notável uma primeira diferenciação em relação à proposta de Tarallo (1993): o PB teria emergido no século XVIII e não na passagem do século XIX para o XX. Essa datação é interessante para a dissertação, pois se a 61 considerarmos estaremos tratando de um período em que já havia PB, o século XIX. É verdade que na amostra dessa dissertação, não é possível ter o controle sobre a data de nascimento dos autores por isso optamos por trabalhar com a periodização do projeto Para uma História do Português Brasileiro, conforme será discutido na próxima seção. Entretanto, se os resultados de Tarallo (1993) indicam que a frequência de sujeito pleno supera a de sujeito nulo na passagem do século XIX para o XX, que há um aumento na frequência de uso de objeto direto nulo anafórico, queda no uso de inversão do sujeito, aumento de tipos de estratégias de relativização, isto significa que a mudança se deu num período anterior a este, pois os fenômenos já estão sendo encontrados nos textos escritos. Para Galves, Namiuti e Paixão de Sousa (2006), já há PB no século XVIII e o que ocorre no século XIX é competição de gramáticas, um assunto que será discutido ainda neste capítulo. Como o PE só chegou com grande força no Brasil no inicio do século XIX com a vinda da corte, pode-se dizer que o PB surgiu a partir de uma mudança na gramática do Português Médio e não na gramática do Português Europeu. Assim, a gramática do século XVI deixou duas “filhas” o PB, já no século XVIII e o PE que também emerge nesse período. Vejamos qual o arcabouço teórico que utilizarei para observar a mudança linguística nas construções com SE e como ela se processa considerando que no século XIX já há PB. 62 2.3 O Modelo gerativista. 2.3.1 A Teoria de Princípios e Parâmetros Inserido no quadro da Teoria Gerativa, o modelo de Princípios e Parâmetros traz consigo uma concepção de língua distinta da proposta pelos Funcionalistas, Sociolinguistas, neogramáticos. Refiro-me a um arcabouço teórico que entende a língua como um processo mental. Nesse sentido, esse termo não se refere a uma língua particular, mas é a capacidade humana de gerar estruturas linguísticas. Os falantes têm domínio da fonética, fonologia, morfologia e semântica no que diz respeito à competência e perfomance. Assim, Chomsky (1986) propõe que existem dois tipos de língua: a Língua-I é a competência linguística do falante e a Língua-E é o resultado audível do processamento sintático que ocorre na mente do falante durante a construção de qualquer enunciado linguístico, portanto é a perfomance. Outro conceito muito importante nessa Teoria é “Gramática”. Para um gerativista, gramática e Língua-I são sinônimos e como propriedades mentais biologicamente condicionadas tem que ser adquiridas pelos seres humanos saudáveis. Mas isto só ocorre se no período crítico de aquisição da linguagem a criança for exposta a Língua-E da sua comunidade de fala para que possa a partir das poucas evidências que obtiver desse sistema internalizar a Língua-I. Nesse sentido a proposição do modelo é que uma criança ao nascer é dotada de uma capacidade biológica, a faculdade da linguagem, também chamada de Gramática Universal, que é ativada no momento em que o pequeno ser humano começa a ouvir a Língua-E da sua sociedade. Ele interpreta os dados e codifica-os até que consiga internalizar a sua Gramática. Assim, a Gramática sai de um estágio G0 em que há apenas a faculdade da linguagem dotada da 63 capacidade de internalizar qualquer Língua-I para G1 em que os falantes já conseguem produzir todos os tipos de sentença. Essa teoria linguística passou por vários estágios e foi sendo aprimorada ao longo do tempo. Inicialmente, a proposta de Chomsky (1965) era que existia um sistema de regras capazes de gerar qualquer sentença. Neste modelo, a estrutura passiva, por exemplo, era interpretada como uma construção resultante de transformação na estrutura ativa que apresentava um predicador transitivo direto. Este modelo é o utilizado por Naro (1976) quando a autor trata da reanálise das sentenças com SE que não apresentam concordância entre o verbo transitivo direto e o argumento interno, por isso, em seu texto, Naro trata das regras que seriam ou não obedecidas na construção de uma sentença passiva, conforme discutido no primeiro capítulo. Já Raposo e Uriagereka (1996), autores que tratam das sentenças com SE-indefinido, assumem outro modelo de análise oriundo do desenvolvimento da Teoria Gerativa: o Programa Minimalista. A Teoria de Regência e Ligação ou também conhecida como Teoria de Princípios e Parâmetros é o modelo de análise posterior ao sistema dotado de regras como o utilizado por Naro (1976) e anterior ao Programa Minimalista do qual fazem uso Raposo e Uriagereka (1996). Neste modelo, Chomsky (1986) invalida uma das maiores críticas feitas até então ao Gerativismo que era a noção de que o sistema de regras produzia línguas homogêneas. Na Teoria de Regência e Ligação, é mantida a noção de que existem princípios invariáveis que estão presentes em todas as línguas humanas, mas também há parâmetros, ou seja, princípios variáveis e que são responsáveis por singularizar cada gramática que só está internalizada quando todos os 64 parâmetros estão fixados de forma positiva ou negativa, visto que estes só podem ter esses dois valores. Assim a gramática nuclear, internalizada é: “Um sistema complexo de conexões entre os princípios universais e rígidos e os parâmetros, o qual determina de um modo altamente específico as propriedades de cada língua particular. A aquisição é completamente identificada com o crescimento e a maturação da Gramática Universal, que passa de um estado apenas parcialmente identificado (com parâmetros por fixar) a um estado completamente especificado (com parâmetros fixados).” (RAPOSO, 1992:55) Nos estágios parcialmente identificados, ou seja, quando a língua está sendo parametrizada estão em vigor na faculdade da linguagem todos os princípios linguísticos, como, por exemplo, o Princípio da Projeção Estendida que diz ser obrigatória, em todas as gramáticas, a existência de uma posição para o sujeito que precisa ter suas propriedades definidas pelos parâmetros que são os responsáveis por singularizar cada gramática. Um dos mais discutidos na literatura linguística é o que trata do sujeito nulo. A partir dele pode-se dizer que se todas as línguas têm o Princípio da Projeção Estendida o que as diferencia é o preenchimento ou não dessa posição, ou seja, a marcação positiva ou negativa do Parâmetro do Sujeito Nulo. Assim existirão línguas que licenciam o sujeito nulo: italiano, português europeu, espanhol e outras em que a posição estrutural de sujeito deve estar foneticamente preenchida, como no francês e no inglês. Nesse sentido a heterogeneidade do sistema é verificada quando um único parâmetro apresenta-se de forma variada na gramática internalizada. Para Galves (1998), a possibilidade de duas marcações paramétricas distintas ocorrerem indica que há a emergência de uma nova Gramática internalizada. 65 “...a gramática de uma língua é o estado de saber linguístico dos falantes que têm essa língua como materna. Por sua vez, esse saber corresponde à parametrização da faculdade da linguagem, ou Gramática Universal (GU). É dentro dessa visão da gramática que se coloca na Teoria da Gramática Gerativa a questão da diferença das línguas. Duas Línguas-I serão consideradas diferentes se contêm na sua parametrização pelo menos um parâmetro fixado diferentemente. Quando isso ocorre, não só as duas gramáticas produzem enunciados diferentes, mas também atribuem a enunciados superficialmente idênticos (por exemplo no arranjo dos constituintes) estruturas diferentes.” (GALVES, 1998:80) Quando uma nova gramática emerge, é possível que uma criança dê uma interpretação distinta ao dado de input transmitido pela geração anterior, possibilitando uma mudança abrupta no sistema linguístico que provoca a competição de gramáticas (Kroch, 2001), ou seja, duas gramáticas são internalizadas e atuam no sistema linguístico de um modo que a inovadora vai aumentando gradativamente a sua frequência de uso. Segundo Roberts (1993), numa pesquisa diacrônica é preciso considerar o aumento da frequência de uso de uma forma inovadora, mas também a reinterpretação de enunciados estruturalmente idênticos, conforme advoga Galves (1998). No Minimalismo, o modelo adotado por Raposo e Uriagereka (1996), que pode ser considerado um desenvolvimento da Teoria de Regência e Ligação, existem dois princípios: interpretação plena e economia linguística. Esses princípios garantem que todas as informações necessárias para a interpretação estejam visíveis durante a derivação sintática e da mesma forma as informações não necessárias sejam eliminadas no curso do mesmo processo. Além disso, especificamente o princípio da economia, assegura que 66 as línguas humanas atuam de tal modo que o sistema computacional tem um custo mínimo durante a derivação. Nessa linha teórica, a linguagem é composta pelo léxico e pelo sistema computacional, estando no primeiro os itens sob a forma de traços não redundantes que serão utilizados na computação das estruturas. Os traços, na verdade, são os responsáveis por indicar o tipo de informação relevante para cada língua e, portanto, são eles que garantem a distinção entre as gramáticas, diferenciando-as a partir dos traços de gênero, número, caso, pessoa, entre outros. São eles que podem sofrer variação na realização morfológica. Neste trabalho, faremos uso dos pressupostos da Teoria de Regência e Ligação na sua versão de Príncipios e Parâmetros. 2.4 Competição de Gramáticas Kroch (1989) apresenta conceitos que serão de extrema importância para o estudo da mudança linguística. A proposta do autor é relacionar o aumento gradativo de uso de uma variante linguística com diferentes gramáticas. No modelo de análise proposto por Kroch, a mudança linguística, na sintaxe, por exemplo, se processa por meio da competição de gramáticas que vão se substituindo em índices de uso através das gerações. Assim, o pressuposto é que haja sempre duas gramáticas distintas competindo: a gramática conservadora e a inovadora. O reflexo dessas gramáticas pode ser visto nas análises empíricas a partir das curvas em “S” que se delineiam ao longo do percurso histórico em que a mudança se processa. Ou seja, as formas variantes competem entre si de modo que enquanto a curva de uma é ascendente a da outra é 67 descendente. Segundo Kroch, a mudança que pode ser atestada a partir dos textos é resultado da fixação de um parâmetro. Kroch (2001) observa, então, o efeito da Taxa Constante, ou seja, nos textos, que são a representação da Língua-E, o que aparece é o efeito da mudança. A mudança em si ocorre na Língua-I. Ela é entendida como uma falha no processo de aquisição da linguagem. O grande problema de conceber a mudança como um “erro” na fixação de determinado parâmetro é que ela passa a ser abrupta. De uma gramática G dos pais a criança fixa G 1. Ocorre que se a gramática da criança fixar distintamente apenas um parâmetro, quando comparada a Língua-I dos pais, há competição de gramáticas, visto que conforme já destacava Galves (1998) a mudança de um único Parâmetro constitui a emergência de uma nova Gramática. Nesse sentido, a criança parametrizou estruturas que pertencem a duas gramáticas distintas fazendo uso das mesmas de forma sistemática. Estudando o verbo auxiliar “do” do inglês, Kroch nos mostra como é o efeito da mudança que se processou no encaixamento desse verbo no sistema linguístico do inglês médio e do inglês moderno que compreendem o período de 1400 a 1700. Com base nesses resultados, o autor mostra como se dá o efeito da taxa constante na implementação do auxiliar do em inglês. Vejamos o gráfico. 68 Gráfico 5: Verbo auxiliar “do” no Inglês em diferentes contextos (Retirado de KROCH 1989:22) Como pode ser visto no Gráfico 5 todas as curvas apresentam a forma em “S” tanto nos contextos de interrogação quanto nos de negação. Para Kroch, a mudança linguística que se evidencia neste gráfico está relacionada a uma reanálise dos verbos auxiliares e a possibilidade ou não do núcleo do sintagma verbal se movimentar no inglês ao longo dos séculos. O efeito da taxa constante pode ser visto quando a razão entre a mudança em contextos variados é a mesma. É exatamente isso que, segundo Kroch (2001), encontramos quando estimamos a razão da mudança nas curvas expressas no gráfico 5. Como afirma o autor, a taxa constante além de indicar um processo de mudança linguística impreterivelmente mostra que há competição entre duas gramáticas: a conservadora e a inovadora. No PB, diversos estudos têm apontado para o fato de que o século XIX se apresenta como um período em que há competição de gramáticas. No que 69 concerne especificamente às construções com SE, Cavalcante (2006) aponta para o fato de que no século XIX o fenômeno de competição de gramáticas também se fazia presente em amostras produzidas por brasileiros. A evidência segundo a autora é o fato de haver sentenças com concordância, visto que a gramática do PB produz apenas sentenças com SE-genérico. As sentenças com concordância seriam produto da gramática do PE. Para Cavalcante (2006), a gramática do PE tem o SE-indefinido e o genérico. Portanto, possui AGR forte ao contrário do PB que tem AGR fraco. No PB, há variação entre o SE-genérico e sujeitos nulos de terceira pessoa com referência arbitrária, como vemos nos exemplos em (5) retirados de Cavalcante (1999): (5) a. E como já se presumia tendências à medida insólita, não foi difícil encontrar a porta de salvação ao estender a reeleição, que não podia ser um privilégio exclusivo do atual ocupante do palácio presidencial. (Artigo de opinião, período 5) b. Em situações como estas, pode-se aplicar metodologias de antecipação do cenário eleitoral. (Artigo de opinião, período 5) c. Diz que vão inaugurar um restaurante em frente ao R9 do Ronaldinho. Vai se chamar Amarelo. (Crônica, período 5) d. O que fez a diferença foi harmonia e evolução, os princípios básicos de um desfile de escolas de samba. Não pode deixar buraco, não pode sair correndo para cumprir o tempo, não pode parar para deixar o relógio correr. Tem que evoluir. Todo mundo tem que cantar o samba, uma ala não pode se misturar à outra, não pode atravessar o samba. Tem que ter harmonia. (Coluna do Artur Xexéo, Jornal do Brasil, 19, fev, 1999) Assim a aparente variação entre construções com e sem concordância em textos produzidos por autores brasileiros no século XIX evidencia aquilo que Galves (1993) chama de competência gramatical. Para a autora um falante tem a possibilidade de interpretar enunciados que não fazem parte da sua 70 gramática a partir dos seus saberes linguísticos aliado a sua competência linguística. É esse mesmo saber linguístico que segundo a autora torna estranhas as sentenças em (6), visto que no PB a ordem OV não é natural, sendo a interpretação mais natural para tais sentenças, a reflexiva e não a indefinida. (6) a) Aqui casacos de lã se vendem (CAVALCANTE, 2006:194) b) Nesta escola, lindos filhotes de poodle se doam. (CAVALCANTE, 2006:194). Assim, podemos dizer que a gramática brasileira produz sentenças com SE-genérico, mas os falantes podem fazer uso dos seus saberes linguísticos produzindo sentenças com concordância que pertencem a gramática do PE. Uma das possíveis formas de observar o fenômeno de competição de gramáticas está na verificação de gramáticas distintas num mesmo gênero textual, nesse sentido torna-se interessante observarmos brevemente um pouco da Teoria de Tradição discursiva da qual farei breve uso quando for tratar da influência dos três gêneros que compõem a amostra: cartas de leitores, cartas de redatores e anúncios nos resultados quantitativos e qualitativos. Na próxima seção, discutiremos, portanto, um pouco da Teoria de Tradição discursiva. 2.5 A Teoria de Tradição discursiva A teoria da tradição discursiva possibilita que um dado fenômeno linguístico seja analisado a partir da historicidade da língua e também do texto. Os trabalhos embasados nela consideram a linguagem uma atividade humana universal que é realizada por cada indivíduo o qual segue técnicas historicamente determinadas, conforme já salientava Coseriu (1981). 71 Para o autor no nível universal encontram-se todas as atividades humanas relacionadas à comunicação, ou seja, processos de predicação, de referenciação, ordem de constituintes, entre outros. Já o nível histórico é subdividido nas tradições discursivas e nas línguas históricas. Estas compreendem todas as línguas humanas e suas particularidades lexicais, fonológicas, morfológicas tanto na escrita quanto na oralidade. A tradição discursiva diz respeito ao tipo de texto, ao gênero textual, ao estilo do autor, ou seja, é o reflexo da situação comunicativa do emissor e seu interlocutor. Koch (1997) propõem a partir da noção do universalismo linguístico um esquema que demonstra os três níveis da língua, como se pode ver com o Figura 5, a seguir: Nível Universal Histórico Histórico Individual/atual Dominio Competência Linguística Língua Particular Tradição Discursiva Discurso Tipo de Norma Normas Linguísticas Normas Discursivas Tipo de Regra Regras de Linguagem Regras da Língua Regras Discursivas Figura 5: O redobramento do nível histórico da língua segundo Koch (1997:45) Da forma como Koch propõe, fica evidente que existem duas historicidades: a da língua e a tradição discursiva. O elo entre as duas permite avaliar as mudanças linguísticas a partir das transformações nos textos. Esse fato para uma pesquisa histórica torna-se extremamente relevante na medida em que permite verificar as continuidades e descontinuidades da evolução textual e de uma possível evolução linguística paralela (KABATEK, 2001, p.100), ou seja, mudanças nas tradições discursivas podem ser reflexos de mudanças no sistema linguístico, mas também podem ser os mecanismos propulsores. Para Kabatek (2004), a tradição discursiva se manifesta quando a repetição de um texto, de uma forma textual, de um registro escrito ou oral 72 adquire um status do próprio, ou seja, é dotado de significado. Esse status só é adquirido por meio da influência da sociedade na língua. Por este viés as tradições discursivas são frutos da memória cultural de uma sociedade que é transmitida às gerações mais novas por meio da televisão, do rádio, dos livros, jornais, etc. O mesmo autor salienta ainda que o falante ao enunciar tem uma finalidade comunicativa para a qual ele possui todas as possibilidades de representação da língua nos registros orais e escritos que o sistema permite; é a partir do seu objetivo de comunicação que será procedida a escolha da tradição discursiva que elucidará a sua mensagem. Kabatek entende Tradição Discursiva (TD) como: “a repetição de um texto ou de uma forma textual ou de uma maneira particular de escrever ou falar que adquire valor de signo próprio (portanto é significável). Pode-se formar em relação a qualquer finalidade de expressão ou qualquer elemento de conteúdo, cuja repetição estabelece uma relação de união entre atualização e tradição; qualquer relação que se pode estabelecer semioticamente entre dois elementos de tradição (atos de enunciação ou elementos referenciais) que evocam uma determinada forma textual ou determinados elementos linguísticos empregados” (KABATEK, 2006:512). Fica evidenciado que a TD não está relacionada somente ao gênero textual, pois na proposta de Kabatek encontram-se palavras chaves como repetição, evocação, atualização e tradição que juntas demonstram que nesta nova teoria não há apenas a preocupação em analisar os elementos que compõem o texto, mas também há o interesse por observar em que medida as normas de um língua são afetadas pelas TDs. Isto porque um texto não tem apenas as marcas da tradição, ou seja, em um documento oficial existem 73 características estruturais que constituem marcas desse gênero, mas não obrigam o emissor a deixar de colocar no papel as marcas da sua língua. Se observarmos a diferença entre documentos atuais e dos séculos passados perceberemos que no século XIX a tentativa de rebuscamento da língua era muito maior do que na atualidade; as “fórmulas”, atualmente, são menos rígidas, isto porque apesar dos gêneros discursivos também seguirem uma tradição, eles estão assim como qualquer outro integrante do sistema sujeitos as mudanças intrínsecas às línguas. O que ocorre nos estudos das mudanças linguísticas é que muitas vezes um fenômeno é estudado a partir de diversos textos, apresentando, por vezes, resultados diferentes que não permitem afirmar com convicção que já houve uma mudança. A teoria da Tradição Discursiva permite solucionar esse problema na medida em que se leva em consideração não apenas a história da língua, mas também a história do texto analisado. Inevitavelmente, para um pesquisador da história da língua, essa relação é essencial visto que o único mecanismo para o estudo dos fenômenos na diacronia é a análise exaustiva dos textos escritos. 2.4 Metodologia e Hipóteses 2.4.1 Objetivos e Hipóteses A partir da discussão acerca das sentenças, indefinidas e impessoais proposta no primeiro capítulo é possível verificar que há uma diferença entre o estatuto do SE no PB e no PE e ainda que é preciso apresentar novos argumentos que comprovem a hipótese de que no PB não há se-passivo. 74 Nesse sentido, apresento os objetivos do trabalho, considerando os pressupostos teóricos discutidos nas seções anteriores. Descrever e analisar o comportamento das construções com se (inerente, indefinido, recíproco, reflexivo, genérico e ambíguo) além das passivas analíticas e das transitivas no que se refere à ordem que o argumento ocupa na sentença em relação ao verbo (anteposto / posposto / nulo). Analisar os alguns contextos linguísticos e extralinguísticos a fim de determinar qual o padrão de ordem dos sujeitos e objetos no PB para delimitar qual a relação gramatical do DP argumento interno das sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo. Analisar como essas sentenças se comportam em relação ao tipo de oração em que ocorrem (matriz, encaixada, absoluta ou coordenada), bem como em relação à finitude dos verbos. Tratar da mudança linguística Minha hipótese básica é que se o DP argumento interno das sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo mantiver um padrão de ordenamento preferencialmente posposto, bem como índices de argumento nulo que se aproximem dos encontrados nos objetos, será um objeto direto. Pelo contrário, se o padrão de ordem for similar ao encontrado nas sentenças passivas analíticas, com SE reflexivo, recíproco e inerente o DP será o sujeito das sentenças. Cavalcante (2006) observando sentenças não finitas afirma que na Gramática do PB estão presentes apenas as construções genéricas. Nesse sentido, acredito que se forem encontradas sentenças com concordância, 75 portanto com SE-indefinido, estas serão resultado da Gramática do PE, constituindo assim o fenômeno de Competição de Gramáticas. Fatores linguísticos como o tipo de argumento (pronome, sintagma nominal, sintagma oracional, entre outros) podem favorecer a anteposição do DP das sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo. Nesses casos, ele nunca ocupará a posição de sujeito e majoritariamente concordará com o verbo finito. A emergência da Gramática do PB estaria relacionada à interpretação distinta dada a enunciados estruturalmente idênticos em relação ao PE. Por hipótese, acredito que encontrarei sentenças como (7a) que não são possíveis no PB, em virtude da posição ocupada pelo argumento interno, distinguindo assim as duas gramáticas. (7) a) ESPECTACULOS THETRO LYRICO FLUMINENSE COMPANHIA HESPANHOLA DE RZUELA DIRIGIDA POR Dom THOMAZ GALVAN HOJE TERÇA-FEIRA 16 DE JULHO Recita extraordinariamente em beneficio de HENRIQUETA QUINTANA Depois que a orchestra tiver executadoasumphonia do estylo, subirá á scena a linda zarzuela em 2 actos, original do sr.Serra, musica do maestro rogelintitulada|AS AMAZONAS DO TORMES CORO GERAL Dará principio a linda zarzuela em 1 acto, intitulada. UM PLEITO Tomam parte os senhores Villanova, Barcena, Villareal e as sras.Pelaez e Barredas. Ás 7 ½ horas. Os bilhetes de camarotes e cadeiras vendem-se por especial obséquio em casa dos senhores Castellões, rua do Ouvidor número 116, e Aurelio, largo de São Francisco de Paula. (Anúncios, Diário de Notícias, 16 de julho de 1869) 76 É necessário depois de tratarmos das hipóteses e dos objetivos dessa dissertação passarmos a descrever a amostra a fim de deixar claro como se procedeu a codificação dos dados que compõem esse trabalho. 2.4.2 A amostra Uma das grandes dificuldades para os pesquisadores de linguística histórica é a constituição da amostra considerada. Para esse trabalho faço uso de parte dos corpora do Projeto PHPB-RJ, mais precisamente do material coletado em jornais cariocas do século XIX. Portanto, trabalho contextos impressos. A escolha dessas obras traz consequências para a pesquisa à medida que podem ter sofrido algum tipo de edição textual e não serem o espelho das gramáticas daqueles que escrevem para os jornais. Conforme destacam Barbosa e Lopes (2006), a imprensa só chega ao Brasil em 1808 quando a Família Real portuguesa desembarca no porto do Rio de Janeiro fugida de Portugal que havia sido invadido por Napoleão Bonaparte, o imperador francês. Os primeiros passos desse novo meio de comunicação foram resultado da necessidade portuguesa de se comunicar com a Metrópole. Com o passar do tempo e o crescente número de leitores, os jornais deixam de ser apenas um mecanismo de comunicação da corte e se propõem a expor ainda que minimamente o que é o Brasil. A partir do advento das assinaturas dos principais jornais brasileiros, eles tornam-se um produto de exportação conforme nos indica Barbosa (2011). “Não se pode também esquecer da circulação física e material que tinham estes periódicos, que tanto transitavam pelo Brasil quanto eram exportados para outros países. A circulação dos periódicos no século XIX pode ser comparada, guardadas as devidas proporções, ao que víamos no século passado com os jornais e atualmente se revela em sites, o que amplia em muito a 77 relação do Brasil para além do mundo Ibérico.” (BARBOSA, 2011:268) A possibilidade de exportar os jornais, a diversificação dos temas das reportagens que passaram a versar até sobre atividades domésticas, constitui as características iniciais daquilo que seria a imprensa brasileira. No inicio, a necessidade de atrair o público fez com que em determinados gêneros os processos de edição não fossem tão rígidos, e neste grupo se inserem as cartas de leitores (ANDRADE, 2008). Para Andrade (2008), essas cartas eram tão importantes no século XIX que chegavam a ocupar uma página inteira. As cartas de redatores, por sua vez, eram textos que tinham como função responder às cartas de leitores ou atuar como editoriais. Nesse sentido, os textos escritos pelos redatores tinham maior riqueza no processo de edição, visto serem eles a “voz” dos jornais e por isso tratavam muitas vezes de temas políticos, enquanto que os textos dos leitores eram escritos por médicos, advogados, senhores de escravos, enfim pessoas comuns que traziam para os jornais os problemas da sociedade brasileira que iam além da política pública. O outro gênero textual que constitui essa amostra é o anúncio. Também iniciante no Brasil, esse gênero caracterizava-se por ter textos pequenos, sem ilustração, mas que por vezes tomavam um grande espaço da página do jornal, como se pode observar em (8): (8) PILULAS DO DoutoR RADWAY cobertas com gomma assucarada autorisadas PELA JUNTA DE HYGIENE. Purgam, regularisam, purificam, limpam e fortificam. PRUSSIA PRUSSIAPRUSSIA Estas pilulas são unicas adoptadas pela escola de pharmacia da Prussia, e foram declaradas pelos rhimicos de Sua Majestade prussiana as mais puras e melhores do mundo, não sendo falsas. Deposito geral 78 46 Rua dos Pescadores 46 (Anúncio, Diário de Notícias,12 de julho de 1869) A quantidade de anúncios era muito maior do que de cartas de leitores e redatores, pois eram financeiramente rentáveis para as tipografias. Ao mesmo tempo em que eram apresentados anúncios grandes como (8), também havia anúncios pequenos como (9). Talvez, os padrões sejam semelhantes, guardadas as devidas proporções, ao que encontramos hoje em anúncios de grandes empresas de eletrodomésticos que tomam páginas inteiras das revistas e dos jornais e anúncios de pequenas imóveis que são muito pequenos. (9) Ama de leite Aluga-se uma, de côr branca, na ladeira do Seminario número 8. (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881) A amostra está dividida em três fases (1808-1840, 1841-1870 e 18711900), estando esta organização relacionada ao período de formação de uma nova geração, por isso intervalos de aproximadamente 30 anos, e ainda a importantes fatos históricos da sociedade brasileira, conforme afirmou Barbosa (c.p) durante uma aula na Faculdade de Letras da UFRJ, como a chegada da Família Real portuguesa em 1808, a coroação de Dom Pedro II como Imperador do Brasil em 1841 e o fim da Guerra do Paraguai em 1871. Como dito foram consultados 52 periódicos, os quais atingiam os mais diversos públicos. E tratavam de assuntos como medicina, informes a população, reivindicações políticas, notícias da sociedade, etc. Alguns desses jornais encontram-se ainda hoje em circulação, por exemplo, o Jornal do Brasil, de onde foram catalogados alguns anúncios. Observemos os títulos destes nas tabelas 14 (carta de redator), 15 (carta de leitor) e 16 (anúncios). 79 Jornais 1808-1840 1841-1870 O Brasileiro Imparcial x O Carioca x O Carijó - jornal Político e Litterário x O Cathólico x Compilador Constitucional e Litterário Brasiliense x Gazeta do Rio de Janeiro x Luz Brasileira x O Sentinella da liberdade no Rio de Janeiro x O Espelho x O Guerreiro x Diário de Notícias x Arquivo de Medicina, Cirurgia e Pharmacia do Brazil Correio Comercial Diário do Brazil Echo social O Extravagante Gazeta Suburbana 7 O Trabalho: revista histórica, literária Tabela 14: As cartas de redatores ao longo do tempo por periódico Jornais 1808-1840 1841-1870 O Carioca x O Cidadão x O Grito da Razão na Corte do Rio de Janeiro x O Macaco Brasileiro x O Papagaio x O Propugnador x A actualidade - Jornal da Tarde Constitucional x O Despertador Municipal x Diário do Rio de Janeiro x Filho da Joanna x Gazeta Médica do Rio de Janeiro x O Guarany - Jornal, Político, Litterário e Industrial x O Guerreiro x Novo Tempo x O Parayba x Correio da Noite Diário Fluminense O Jornal - Folha Diária Jornal de Notícias O Lazarista Relâmpago: periódico de crítica e censura República Brasileira Salva Vidas Tabela 15: As cartas de leitores ao longo do tempo por periódico 1871-1900 x x x x x x x x 1871-1900 x x x x x x x x 7 O nome completo do jornal é: O Trabalho: revista histórica, litterária e scientífica de artes e officios, exclusivamente consagrada aos interesses das classes operárias 80 Jornais 1808-1840 Jornal do Commercio x Gazeta do Rio de Janeiro x Diário de Notícias Atirador Franco A Bomba O Cacete - folha crítica, satyrica, humorística e literária O Jacobino O Caixeiro Jornal do Brazil O Liberalista A Nação Vespa Tabela 16: Os anúncios ao longo do tempo por periódico 1841-1870 1871-1900 x x x x x x x x x x x x Observando as tabelas 16, 17 e 18, percebe-se que nenhum jornal ou revista teve periodicidade nas três fases estudadas. Entretanto, não considero que este fato seja um problema em virtude da Teoria que me baseio, ou seja, Teoria de Princípios e Parâmetros, visto que é possível perceber as características das gramáticas dos autores por meio da análise dos dados de distintos jornais. A Tabela 17 a seguir traz o número de dados extraídos dos textos nos períodos considerados: 1808-1840 1841-1870 1871-1900 Gênero textual/Tempo Texto Dados Textos Dados Textos Dados Carta de Redator 9 73 9 99 8 112 Carta de Leitor 11 130 14 261 9 77 Anúncio 63 57 16 28 87 173 Total 83 260 39 388 104 362 Tabela 17: Distribuição dos dados por gênero textual 81 Nesses periódicos ou revistas havia alguns dados que apresentavam variação de grafias, comum ao sistema ortográfico vigente no século XIX como podemos observar em (10): (10) Annuncia-se a sahida do 2º. Tomo das Memorias Historicasdo Rio de Janeiro por Monsenhor Pizarro para que possão os Senhores subscritores procurá-lo nos lugares , sem que fizerão as suas Assignaturas. Ficão no prelo os Tomos 3º , 4º , 5º , que sahirão com a brevidade possível; e no 6º, e 7º se publicarão a lista de todos os Senhores; que cooperarão para a impressão da Obra com a sua subscripção, a qual ainda continua nos lugares 8 de costumes. (Anúncios, Gazeta do Rio de Janeiro , 1821 ) Nesses casos, optei por manter a grafia conforme as normas de edição estabelecidadas pela equipe do PHPB-RJ (LOPES e BARBOSA, 2006). 2.5 Concluindo o capítulo Neste capítulo tratei dos pressupostos teóricos que nortearão esse trabalho, bem como da constituição da amostra, periodização utilizada na pesquisa, objetivos e hipóteses. Passemos a análise dos dados. Deixaremos para a primeira seção do próximo capítulo a apresentação de todos os contextos sintáticos que controlei a fim de alcançar os resultados dessa pesquisa. 8 Não foram encontradas referências sobre do dia e do mês da publicação dos anúncios na. Gazeta do Rio de Janeiro 82 Capítulo 3: Análise dos dados 3.1 3.1 Os contextos sintáticos em análise Nesta seção apresento os contextos sintáticos e suas possíveis formas de realização que foram codificados e submetidos ao pacote de programas Goldvarb-X (SANKOFF, D; TAGLIAMONTE, S. A; e SMITH, E, 2001) a fim de que fosse feita uma análise quantitativa da amostra. Todos os dados foram rodados em função da forma de realização do argumento, ou seja, anteposto, posposto ou nulo. 3.1.1 As formas de realização do DP Considero três possíveis formas de realização dos DPs: anteposição (1a) e (1b); posposição (2a) e (2b); argumento nulo (3a) e (3b). A hipótese é que nas sentenças indefinidas, genéricas ou ambíguas, assim como nos dados de objeto direto a ordem preferencial é a posposição do DP, enquanto que em sentenças passivas analíticas, reflexivas, recíprocas, inerentes a preferência do DP é pela anteposição. Com relação ao argumento nulo a hipótese é de que eles estão mais presentes nas sentenças indefinidas, genéricas, ambíguas e transitivas diretas, visto que os DPs considerados, por hipótese, são objetos. (1) a. Os viajantes devem sempre munir-se de um vidro de Prompto Allivio Radway, pois poucas gottas em agua impedem doenças ou dôr causadas pela mudança d‟água; é melho que cognac francez ou bitter, como estimulante. (Anúncios, Diário de Notícias, 02 de janeiro de 1889) b) e ninguem ainda se lembrou de censurar a concessão de taes beneficios, como prejudiciais ás empresas; mas agora como foi vendido á sociedade de beneficencia portuguesa, eis que já apparece um correspondente no “Diario 83 do Rio” censurando esse triste beneficio, e ridicularizando os portugueses! (Carta de Leitor, Filho da Joana, 8 de Março de 1844) (2) a) Annibal Mascarenhas que, sem resfolhos, explanou estes variados assuntos de modo a facilitar sua comprehensão a todas as intelligencias. (Anúncios, A Bomba, 10 de Outubro de 1894) b) Alugão-se, em casa de familia, quartos independentes, mobiliados; na travessa de São Francisco de Paula, número 6. (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881) (3) 800$000 10 RUA DA LAMPADOSA 10 AOS FENIANO 2592 Os individuos do kioske rio de Janeiro, quando [-] estabeleceram-se com a tarraxa, propalaram que iam guerrear a casa dos fenianos, no entanto que apresentam-se como victimas, para assim obterem a benevolencia do publico. (Anúncios, A Nação, 15 de março de 1873) b) do Papagaio não terão que dizer, porque he animal de boa memoria, e dá bem a ver que estudou com proveito, pois [-] se explica como gente, e a natureza o dotou de lingua propria para isso: porém o Macaco só tem aprendido a fazer mogigangas. Leve-me o Diabo, se elle a fallar, e eu a zurrar não espantamos todo mundo!! (Carta de leitor, O Papagaio, 22 de Junho de 1822) 3.1.2 Os contextos sintáticos e as estruturas observadas em relação a realização dos DPs Apresentada as possíveis formas apresentadas pelos DPs considerados na análise, passo a tratar dos contextos sintáticos e das estruturas que foram selecionadas a partir dos resultados apresentados na revisão bibliográfica e serão analisadas ao longo da dissertação. O controle desses contextos 84 permitirá além de um tratamento estatístico, a análise qualitativa a medida que teremos como quantificar até que ponto um tipo de estrutura favorece a anteposição, a posposição ou a realização nula de um DP. Vejamos quais as hipóteses para cada contexto sintático controlado. 3.1.2.1 Tipo de construção Brito, Duarte e Matos (2003) afirmam que o clítico SE pode ser classificado como: reflexivo (5a), recíproco (5b) e inerente (5c). Os dois primeiros são tratados como clíticos de referência anafórica argumentais. Eles admitem construções de redobro que marcam a posição argumental a que o clítico está associado. Nas recíprocas o redobro é parafraseado por expressões como “uns com os outros”, “um com o outro” e suas variantes, já nas reflexivas a expressão é “ a si próprio”. Quanto ao clítico inerente as autoras afirmam que ele caracteriza-se por não apresentar conteúdo semântico ou morfo-sintático. Vejamos os exemplos: (5) a) uma pessoa bastante habilitada encarrega-se de tratar questões forenses, policiaes e particulares nesta Capital, e , bem assim, legalisa com brevidade e por diminuta retribuição os papeis necessarios para enlaces matrimoniaes no civil, e no religioso. Cartas nesta redacção a E. M. (Anúncios, O Jacobino, 8 de agosto de 1896) b) meu amigo, as minhas licenças eu as dou a um guarda da camara para as tirar, porque só assim fico descançado de multas e outros incommodos, embora pague por cada uma 3 ou 4 $ rs., porque elles lá se entendem uns com os outros; (Carta de Leitor, O Despertador Municipal, 28 de Fevereiro de 1850) c) porque os homens honestos se envergonhão de ler tantas sandices, que desacreditão o Brasil !!! (Carta de Redator, O Brasileiro Imparcial, 27 de Abril de 1830) A hipótese é que nesses três tipos de sentenças assim como nas passivas analíticas (6), o DP ficará preferencialmente anteposto ao predicador, 85 pois se trata do sujeito das sentenças. Outra hipótese é que os resultados não mostrarão diferença sintática entre as três construções exemplificadas em (5), estando a distinção entre ambas restrita ao campo semântico. Nesse sentido, por hipótese, será possível transformar os três tipos de construções em apenas uma. (6) Todos comprehendem que as ataduras e tiras adhesivas podem ser collocadas circularmente sem apertarem nem estrangularemos membros. (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1 de Janeiro de 1864) Considero ainda o SE-indefinido, o SE-genérico e o SE-ambíguo que estão respectivamente representados em (7). Em sentenças que apresentam esses clíticos, a partir do que dizem Raposo e Uriagereka (1996), Naro (1976), Martins (2003), a hipótese é de que o DP permanecerá posposto ao predicador visto ser este um argumento com a relação gramatical de objeto. Da mesma forma se comportarão os DPs que recebem acusativo em sentenças transitivas como (8a). (7) a) Vendem-se machinas de costura Singer e outras, a dinheiro e a prestações de 5$ a 10$, e alugão-se por pequenos alugueis; na rua Larga de São Joaquim número 116. (Anúncios, Jornal do Commercio , 01 de outubro de 1881) b) Ourivesaria Halphen Para evitar falsificações e usurpações de nome, deve-se exigir os dous carimbos juntos Talheres Alfénide metal branco prateado Propriedade exclusiva da Societé des Couverts Alfenide (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881) c) Ao agradecimento dos duos guardas pela imprensa seguiu-se um artigo do Diário, attribuindo ao Sr. Conselheiro Ferraz a recusa, que só provinha de V. Ex.; foi preciso declarar eu ao publico que nisso estva innocente o Sr. Frraz. Publicado o caso, a guarda nacional tomou a peito desapprovar o procedimento de V. Ex. cuja opposição e a de mais alguns de seus collegas 86 deram-me a presidencia da Illma. camara. municipal; o partido liberal, que se tinha aproveitado do ensejo, unido-se á guarda nacional, venceu nas seguintes. E é possível que V. Ex. esquecesse em tão pouco tempo tudo isso devido em grande parte a um capricho de V. Ex.?(Carta de Leitor, Actualidade - Jornal da Tarde, 29 de Janeiro de 1869) (8) Hoje porem, que o Governo a nosso ver tomou a melhor medida que podia tomar em similhante crise, attendendo ao nosso estado, sobrecarregados de huma divida enorme, em vesporas de outra, julgamos, que os Negociantes, e os taberneiros querem só o bem para si, e o mal para todos os que dependem d‟elles. (Carta de Leitor, O Carioca, 22 de Outubro de 1833) 3.1.2.2 Estrutura do núcleo do predicado Nesta contexto observo se há uma perífrase verbal ou uma forma simples. A hipótese a partir de Cavalcante (1999), Vieira (2007) é que as sentenças com predicadores complexos favorecerão as construções com SEgenérico, ou seja, que não apresentam concordância entre o predicador e o verbo transitivo. Tal como no exemplo em (9a). A sentença em (9b) exemplifica os predicadores simples. (9) a) Mas, Sr. Redactor, eu disse que não dou credito a esta noticia; e eis aqui a rasão. Tem sido governadores das armas da corte alguns Brasileiros natos, e muitos adoptivos; e se estes, a quem se poderia revelar algumas recordações do lugar do seo nascimento, nunca tiverão semelhante lembrança , como hei de crêr que a tivesse o Sr.Chagas, Brasileiro nato. (Carta de leitor, O Cidadão, 29 de Março de 1838) b) Desejamos a v.Ex. immensas felicidades para augmento do Brasil, e que de uma vez se estrangule essa oligarchia quanto antes, por ser isso o mesmo que deseja. (Carta de Redator, O Guerreiro, 2 de Abril de 1853) 3.1.2.3 Marca de número no argumento e Marca de número no verbo O cruzamento desses dois contextos foi importante para que eu pudesse observar o fator concordância, especialmente nas sentenças com SEindefinido, genérico e ambíguo. A hipótese, a partir de Duarte (2002) e Duarte e 87 Lopes (2002), é que haja mais construções com SE-indefinido (10a) do que com SE-genérico (10b) em virtude de a amostra ser constituída por textos jornalísticos cariocas, pois nos trabalhos citados acima o Rio de Janeiro foi o estado que apresentou mais concordância quando analisado em relação aos demais estados que compõem o corpus do Projeto Para uma História do Português do Brasil. (10) a) A esses homens humanos, só nas formas, deram-se espadas, deram-se fardas, para com o titulo de agentes da segurança publica fiscalisarem e velarem pela segurança e bem estar do povo. (Carta de Leitor,O Lazarista, 28 de outubro de 1875) b) Mas, Sr. Redactor, eu disse que não dou credito a esta noticia; e eis aqui a rasão. Tem sido governadores das armas da corte alguns Brasileiros natos, e muitos adoptivos; e se estes, a quem se poderia revelar algumas recordações do lugar do seo nascimento, nunca tiverão semelhante lembrança , como hei de crêr que a tivesse o Sr.Chagas, Brasileiro nato. (Carta de leitor, O Cidadão, 29 de Março de 1838) 3.1.2.4 Realização do argumento Nesse contexto verifico sob quais formas o DP pode ser realizado: argumento nulo (11a), sintagma nominal simples (11b), sintagma nominal composto (11c), sintagma oracional (11d), pronome pessoal do caso reto (11e), pronome indefinido ou demonstrativo (11f). (11) a) Portanto, V. Ex. tem abusado completamente da sua jurisdição, está sacrificando o MONARCHA, o qual por não ter ao seu lado quem lhe faça ver os desvaneios de V. Ex. e de seus collegas ministros, por isso [-] são conservados em despeito a opinião publica; (Carta de Redator, O Guerreiro, 15 de Janeiro de 1853) b) Sr. presidente, só quem não tem pratica, só quem não tem lido as obras de cirurgia, pode afirmar tão cathegoricamente que as feridas contusas não se reunem por 1a. intensão. (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1 de Janeiro de 1864) c) Alugão-se uma negrinha de 14 annos, duas pretas perfeitas cozinheiras, lavadeiras e engommadeiras de roupa de senhora; informa-se por favor, á rua 88 Luiz de Camões número 14, antiga da Lampadosa, venda. (Anúncios, Jornal do Commercio , 01 de outubro de 1881) d) V. Ex. deve ter uma lembrança, que estamos ao facto de um soldado invalido que estragou a sua saude no serviço da Nação, e tendo este isero pedido a sua reforma, nenhuma decisão teve, e o desgraçado procurando o abrigo do THRONO, o MONARCHA BRASILEIRO ordenou a V. Ex. que o reformasse, e que lhe desse uma pensão, e este infeliz procurando a V. Ex., V. Ex. menoscabando o MONARCHA declarou na secretaria em altas e intellegiveis vozes – S.M. ordenou-me que eu o reformasse, e que lhe desse uma pensão, porém eu digo-lhe que não quero, e se você tornar a S.M. hei de remettel-o para bordo de um navio de guerra preso. (Carta de Redator, O Guerreiro, 15 de Janeiro de 1853) e) Declaram-se eles victimas, quando esta patente que eles são os aggressores, dominados pela inveja, por verem como eles mesmos dizem a casa dos fenianos com 300$ a vender premios de continuo. (Anúncios, A Nação, 15 de março de 1873) f) Este liquido, sem competidor pela sua efficacia e barateza, tem feito uma verdadeira revolução na lavoura; a sua procura augmenta de dia em dia, e o lavrador que o experimentar jamais quererá outro. (Anúncios, Jornal do Commercio , 04 de outubro de 1881) A hipótese para esse fator é de que os pronomes indefinidos e demonstrativos favorecerão a anteposição do argumento interno das sentenças com SE-indefinido, genérico e ambíguo. 3.1.2.5 Realização do referente Nesse grupo controlei a relação gramatical do referente quando o argumento era nulo, pronome indefinido/ demonstrativo ou pronome pessoal do caso reto. A hipótese era de que os objetos nulos seriam majoritariamente retomados por tópico conforme destaca Vasco (2005). Foram encontrados referentes exercendo as funções sintáticas de sujeito (12a), objeto direto (12b), tópico (12c) e (12d), predicativo do sujeito (12e). 89 (12) a) Carvalho teve a fortuna de ganhar a opinião publica, sendo reeleito quatro vezes por unanime acclamação dos Povos, quando o Sr. Barreto se fazia aborrecido pela guerra civil, que promoveo, aliciando Povo, e a Tropa: elle se dirigio a mim, que lhe respondi o que devia, que era esperar pela decisão de S.M.I., a quem, já se achava affecto este negocio. (Carta de leitor, O Propugnador, 13 de Junho de 1824) b) meu amigo, as minhas licenças eu as dou a um guarda da camarai para as tirar, porque só assim fico descançado de multas e outros incommodos, embora pague por cada uma 3 ou 4 $ rs., porque ellesi lá se entendem uns com os outros; (Carta de Leitor, O Despertador Municipal, 28 de Fevereiro de 1850) c) Chapelaria do Globo Figueiredo & Irmão Completo sortimento de chapeos para homens, meninos e meninas, tudo por preços resumidosi. Recebem tudoi directamente de Paris. 82 Rua Uruguayana 82 Proximo á Rua do Ouvidor (Anúncios, O Cacete, 16 de janeiro de 1881) d) Ama de leite Aluga-se uma, de côr branca, na ladeira do Seminario número 8. (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881) e) He alli mesmo que pequenos e exhaustos Negociantes fazem ofertas, que em poucos dias, já passavão de cem mil cruzados para se apromptar a Tropa; a qual precizando de hum fardamento, foi em poucos dias apomptado pelas Senhoras Paulistas de todas as classes, que espontaneamente se oferecerão! (Carta de Redator, O Compilador Constitucional Político e Litterário Brasiliense, 12 de Março de 1822) f) Para que pessoa alguma se persuada que nós calumniamos a honra de V. Ex., desde já envidamos a V. Ex. para que nos chame a responsabilidade, e em quanto não o fizer será sempre a nossa mofina o art. 133 da constituição para V. Ex. e seus collegas é letra morta, e que de há muito ella se acha calcada aos pés. (Carta de Redator, O Guerreiro, 15 de Janeiro de 1853) 3.1.2.6 Traço de animacidade A hipótese para este fator é que em sentenças com SE indefinido ou genérico no Português Brasileiro a anteposição do argumento interno só será possível quando o traço de animacidade for [-animado].(14a). As sentenças que apresentam esse argumento com traço [+animado] (14b) ou [+humano] 90 (14c) seriam resultado do processo de competição de gramáticas entre o PB e o PE. (14) a) Olhe do Papagaio não terão que dizer, porque he animal de boa memoria, e dá bem a ver que estudou com proveito, pois se explica [-] como gente, e a natureza o dotou de lingua propria para isso: porém o Macaco só tem aprendido a fazer mogigangas. Leve-me o Diabo, se elle a fallar, e eu a zurrar não espantamos todo mundo!! (Carta de leitor, O Papagaio, 22 de Junho de 1822) b) As mizeras crianças não se podendo conter, coagidas pelas necessidades do estamago, aproveitando algum momento de distracção das pobres mãis, metião os dedinhos nas panellas ferventes, a ver se conseguião colher alguma migalha, sacrificando-se á dôr que sentirião pelas queimaduras! (Carta de Redator, Correio Commercial, 18 de Junho de 1879) c) As mesmas inconveniencias, o mesmo furor em me attacar notão-se nos dois escriptos, construídos de maneira que sobresahem as insinuações, que eu não sei tratar as feridas, que ignoro e modo porque obrão os corpos contundentes, que sou ilogico etc, etc. Parece, Sr. presidente, que a cortezia vai fugindo desta casa (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1 de Janeiro de 1864) d) Festividade Consta-nos que a devoção de Sant‟Anna de Icharay festejará seu orago nos dias 27 e 28 do corrente, com alguma pompa, dando principio no dia 21, com uma ladainha na sua capella havendo nessa tarde levantamento do mastro com painel. (Anúncios, Diário de Notícias , 12 de julho de 1869) 3.1.2.7 Realização do sintagma agentivo Esse contexto sintático foi proposto a fim de observar se ainda há agente da passiva nas sentenças com SE-indefinido, e aí termos um caso de SE-passivo que Martins (2003) chama de “fóssil”. A hipótese, a partir de Cavalcante (2006 e 2011), é de que os sintagmas agentivos (15a) serão encontrados apenas nas passivas analíticas. Sendo a sua realização em sentenças com SE (15b) e (15c) agramatical. (15) a) PILULAS DO DoutoR RADWAY cobertas com gomma assucarada autorisadas PELA JUNTA DE HYGIENE. 91 Purgam, regularisam, purificam, limpam e fortificam. PRUSSIA PRUSSIA PRUSSIA Estas pilulas são unicas adoptadas pela escola de pharmacia da Prussia, e foram declaradas pelos rhimicos de Sua Majestade prussiana as mais puras e melhores do mundo, não sendo alsas. Deposito geral 46 Rua dos Pescadores 46 (Anúncios, Diário de Notícias , 12 de julho de 1869) b) Comprão-se escravos para encommendas; na rua da Princeza dos Cajueiros número 100. (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881) c) Ourivesaria Halphen Para evitar falsificações e usurpações de nome, deve-se exigir os dous carimbos juntos. Talheres Alfénide metal branco prateado Propriedade exclusiva da Societé des Couverts Alfenid (Anúncios, Jornal do Commercio , 01 de outubro de 1881) 3.1.2.8 Tipo sintático da oração Considero as seguintes possibilidades de realização: primeira coordenada (16a), matriz (16b), absoluta (16c), encaixadas (16d) e segunda coordenada (16e). As três primeiras formaram um único grupo durante as rodadas: primeira oração. A hipótese é que em sentenças encaixadas nãofinitas não haverá anteposição do DP-argumento interno das sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo, pois segundo Raposo e Uriagereka (1996), nessas construções só há uma posição à esquerda do verbo. Assim as construções com anteposição poderão ocorrer no grupo das matrizes, absolutas e coordenadas ou nas coordenadas e encaixadas finitas. (16) a) Pianosi Afinão-se [-]i e concertão-se; para chamados, na rua da Uruguayana número 10 e Sete de Setembro número 112 A. (Anúncios, Jornal do Commercio , 01 de outubro de 1881) b) Em torno delles via-se alguns colxões, dos quaes a maior parte em pessimo estado, extendidos no chão talvez para seccarem-se das humildades 92 da noite precedente. (Carta de Redator,Correio Commercial, 18 de Junho de 1879) c) E‟ o orgão perturbador do equilibrio das liberdades collectivas; arrasta a alavanca que mina o edificio social. Pune-se. (Carta de Redator,Diário de Notícias, 15 de Março de 1872) d) Este macaco antes de ser gente já escrevinhava suas obras a fora as de seu officio isto se sabe pela nota do 3 o N.º em que se menciona algumas que deu á luz. (Carta de leitor, O Papagaio, 22 de Junho de 1822) e) Pianosi Afinão-se e concertão-se [-]i; para chamados, na rua da Uruguayana número 10 e Sete de Setembro número 112 A. (Anúncios, Jornal do Commercio , 01 de outubro de 1881) 3.1.2.9 Tempo e modo verbal com predicadores simples e complexos A hipótese para esse contexto é que haverá diferença na interpretação de gramaticalidade quando houver anteposição do DP argumento interno das sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo em virtude do predicado ser episódico ou genérico. Neste contexto, controlamos as seguintes possibilidades: (17a) presente, (17b) pretérito perfeito, (17c) pretérito mais que perfeito, (17d) pretérito imperfeito, (17e) futuro, (17f) infinitivo, (17g) gerúndio. (17) a) Modas, Chapeosi A irmã de Madame Valle tem sempre chapéos modernos e elegantes, para senhoras, de 10$ a 18 $; para crianças, de 4$ a 8$; e chapéos de luto, 12 $. Lava, enforma e enfeita á moda, desde 6$000. 25 Rua De Gonçalves Dias 25 Leques Concertão-se [-]i com perfeição e vende a preços baratissimos. (Anúncios, Jornal do Commercio , 04 de outubro de 1881) b) TINTA VIOLETA Esta tinta veio operar uma completa revolução no artigo tintas para escrever. O consumo extraordinário a que attingiu, é prova sufficiente de que o publico reconheceu a sua superiridade entre a immensa multidão de tintas que por ahi se vendem com titulos os mais ou menos pomposos, cuja durabilidade o tempo não se encarregou de demonstrar, nem seus autores offerecem garantia alguma por falta de conhecimentos proprios: previne-se, pois, aos Senhores consumidores que quando tiverem de fazer as suas encommendas, queiram pedir a LEGITIMA tinta extra-fina Monteiro. 93 Vende-se em todas as livrarias da corte e nas principaes localidades do Imperio. (Anúncios, Diário de Notícias , 12 de julho de 1869) c) V. Ex. deve lembrar-se que estamos ao facto de que um pretendente que outr‟ora derramara seu sangue em defesa do THRONO pedira ao MONARCHA o lugar de official archivista da secretaria da Guerra, cujo requerimento fôra entregue pessoalmente ao MONARCHA (Carta de Redator, O Guerreiro, 15 de Janeiro de 1853) d) Ao publico Domingos Fernando Claro de Almeida, que outr‟ora se assignava Domingos Claro Fernando de Almeida, faz publica esta declaração pra que não se lhe continue a dar o nome que já não usa. Restinga da Gávea, 5 de Outubro de 1881 – domingos Fernando Claro de Almeida. (Anúncios, Jornal do Commercio , 06 de outubro de 1881) e) e deixar aos meus sucessores uma recordação gloriosa, quero que mas tarde leia-se o meu nome gravado em letras de ouro nos livros da litteratura, e siencia, estou bem certo de que a briosa população desta capital não deixará sem auxilio nos amigos das artes e defensores da patria digo porque todos os dias se falla em termos uma guerra com os argentinos, pois bem se realizar essa guerra não ezitarei em pegar na arma e correr ao encalce do inimigo ainda mesmo que o meu sangue, tenha de servir-lhe de alimento. (Carta de Redator, O Extravagante, 09 de Outubro de 1881) f) Diz mais V. S. que não está de accordo com a nossa linguagem virulenta, com o nosso modo de pensar e de dizer (Carta de Redator, Diário do Brazil, 08 de Dezembro de 1881) g) Illm. o e Exm. o Sr.- Tendo o Exm. o Sr. presidente da provincia feito sentir em seu relatorio do 1. o do corrente á assembléa provincial do Rio de Janeiro a nessecidade de se elevar á cathegoria de villa o arraial do porto da Estrella, comprehendendo-se no seu termo as freguezias de Inhomerim, Suruhy, Guia e Pilar, e uma outra, que muito convêm crear-se hoje em Petropolis com a invocação de S. Pedro d‟Alcantara, para a matriz da qual consta que S.M. o Imperador e muitos particulares concorrem com donativos e subscripções (Carta de Leitor, Diário do Rio de Janeiro, 26 de Março de 1846) 3.1.2.10 Tempo A hipótese com relação a este fator é de que os resultados não revelarão uma curva de mudança, mas competição de gramáticas entre o PB, o PE. 94 3.1.2.11 Gênero textual A hipótese é de que nos anúncios ocorrerão sentenças com tópico discursivo que favorecerão os argumentos nulos em sentenças com SEindefinido/genérico (18a). Considero três gêneros textuais: anúncios (18a), carta de leitor (18b) e carta de redator (18c). (18) a) Pianosi M.N. Moreira Paranhos mudou seu estabelecimento da rua Sete de Setembro número 68 para a mesma rua número 155 proximo á travessa de São Francisco, onde aguarda seus amigos e freguezes; vendem-se [-]i, alugão-se [-]i, trocão-se [-]i, concertão-se [-]i e afinão-se [-]i com toda a perfeição. (Anúncios, Jornal do Brazil, 4 de setembro de 1891) b) Asseverão-me que o muito illustre Sr. general Chagas Santos entre outras reformas importantes que introdusio no quartel general da côrte, mandou que ão fossem mais empregadas, como ali se usava, obreias verdes e amarellas, porque S.exa. sympathisa mais om a côr encarnada. Ora, Sr. Redactor, a ser isto verdade o que eu por ora não creio é preciso submetter á consideração do digno generalissimo algumas reflexões. (Carta de leitor, O Cidadão, 29 de Março de 1838) c) Isto nada importa, mas será mais uma recommendação para o Sr. d. Pedro II, quando tiver de viajar a custa do erario publico. (Carta de Redator, Diário do Brasil, 08 de Dezembro de 1881) 3.2 Distribuição geral dos dados. Foram encontradas 884 sentenças distribuídas conforme mostra a tabela 20. No total, temos 524 objetos diretos, 66 sentenças com SE-reflexivo, 4 com SE-recíproco, 49 com SE-inerente, 60 passivas analíticas, 24 com SEgenérico, 55 com SE-indefinido e 137 sentenças ambíguas. Os números obtidos nessa dissertação foram alcançados a partir de rodadas separadas para cada tipo de construção em que foi observada a posição que o argumento interno, nos objetos diretos, nas sentenças com SE-indefinido, SE-genérico, SE-ambíguo e nas passivas analíticas, ou o argumento externo, nas sentenças 95 com SE-reflexivo, SE-recíproco ou SE-inerente, ocupa em relação aos verbos finitos e não finitos. Vejamos como fica a distribuição geral das sentenças. SEreflexivo N-% SErecíproco N-% SEinerente N-% Passiva Analítica N-% SEgenérico N-% SEindefinido N-% SEambíguo N-% Objeto direto N-% Antepos to Pospost o Nulo 31 - 47% 2 - 50% 25 - 51% 40 - 66% 0 - 0% 3 - 5% 12 - 8% 12 - 2% 8 - 12% 0 - 0% 6 - 12% 5 -8% 16 – 75% 31 - 56% 95 – 69% 437 - 83% 27 - 41% 2 - 50% 18 - 36% 15 - 26% 6 – 25% 21 - 38% 30 – 23% 75 - 15% Total 66 4 49 60 22 55 137 524 Tabela 18: Realização do argumento (interno ou externo) por construção (sentenças finitas e infinitivas) Na primeira observação, podemos notar que há um leque maior de construções com SE do que aquele mencionado pela tradição gramatical. Esse maior de número de sentenças com SE, em parte defendido por Duarte (2003), está relacionado a uma distinção das ditas construções com SE-reflexivo. Como visto no primeiro capítulo, a separação em SE-reflexivo (19a), SErecíproco (19b) e SE-inerente (19c) tem relação com o tipo de referente do clítico e com o redobro possível para este, mas não há nenhum critério estritamente sintático, capaz de justificar essa distribuição. (19) a) Uma pessoa bastante habilitada encarrega-se de tratar questões forenses, policiaes e particulares nesta Capital, e , bem assim, legalisa com brevidade e por diminuta retribuição os papeis necessarios para enlaces matrimoniaes no civil, e no religioso. Cartas nesta redacção a E. M. (Anúncios, O Jacobino, 8 de agosto de 1896) b) meu amigo, as minhas licenças eu as dou a um guarda da camara para as tirar, porque só assim fico descançado de multas e outros incommodos, embora pague por cada uma 3 ou 4 $ rs., porque elles lá se entendem uns com os outros; (Carta de Leitor, O Despertador Municipal, 28 de Fevereiro de 1850) c) porque os homens honestos se envergonhão de ler tantas sandices, que desacreditão o Brasil !!! (Carta de Redator, O Brasileiro Imparcial, 27 de Abril de 1830) 96 A análise da ordem do argumento externo dessas sentenças, o sujeito, mostra que sintaticamente em relação a este fator não há diferença na ordem dos constituintes, ou seja, o que importa é que o sujeito majoritariamente, independente da construção, fica a direita do verbo finito ou não finito. Cavalcante (2011a) também faz menção a separação das construções com SE-reflexivo, recíproco e inerente, acrescentando o SE-ergativo, que também encontrei em um único dado, (20), entretanto a autora observando que os resultados em relação a ordem do sujeito nessas sentenças se mostram simétricos ao longo dos séculos no Português Clássico e Português Europeu, opta por tratá-las como sentenças ativas com SE. (20) Tenho a honra de comprimentar os nossos colegas da imprensa os Illms. Snrs. redactores da muito conseituada folha o Espectador e a grande satisfação de declarar ao publico que abrirão-se hoje as portas do abysmo para receber com glorias e cainhos mas um vulto do genero jornalistico intitulado o Estravagante, vulto pouco visivel é certo porem digno de attenção e merecimento visto ser o seu único fim horar a infancia e cultivar as artes. Sinto deveras que a minha mesquinha e acanhada intelligencia, (Carta de Redator,O Extravagante, 09 de Outubro de 1881) Os resultados apresentados na tabela 20 mostram que, no PB, também não há diferença e a preferência pela anteposição é categórica nessas construções com índices respectivos de: 47% para as sentenças com SEreflexivo, 50% nas sentenças com SE-recíproco e 51% naquelas que apresentam SE-inerente. Em virtude dessa disposição, opto por unir essas três construções e tratá-las unicamente como sentenças com SE-reflexivo. Há também na tabela 20 outros três grupos de sentenças com SE: SEindefinido (21a) e SE-genérico (21b) e SE-ambíguo (21c). Nessas construções, ao contrário do grupo mencionado acima, há uma diferença sintática na medida em que, para Raposo e Uriagereka (1996), o DP-argumento interno das 97 sentenças com SE-indefinido é o objeto da oração e recebe caso nominativo, por isso concorda com o verbo. Nas construções com SE-genérico, o DPargumento interno também é o objeto da oração, mas neste caso recebe acusativo e por isso não há o estabelecimento de uma relação de concordância. Nas sentenças com SE-ambíguo, a discussão é se o DP recebe caso nominativo ou acusativo. (21) a) Alugão-se, em casa de familia, quartos independentes, mobiliados; na travessa de São Francisco de Paula, número 6. (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881) b) Ourivesaria Halphen Para evitar falsificações e usurpações de nome, deve-se exigir os dous carimbos juntos. Talheres Alfénide metal branco prateado Propriedade exclusiva da Societé des Couverts Alfenide (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881) c) Tijuca|Aluga-se ou vende-se, por modico preço, o chalet do Alto da Boa Vista número 16; as chaves estão no mesmo, e trata-se na rua do Ouvidor número 79.(Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881) Apesar de na análise de Raposo e Uriagereka (1996), nos três tipos de sentenças apontar que o DP-argumento interno deve ser tratado como objeto direto o que me permitiria juntá-los num único grupo, opto por deixar esses três tipos de SE separados para poder tratar estatisticamente melhor os dados referentes a cada um deles. A tabela 19 traz a distribuição geral das construções analisadas: SE-reflexivo SEgenérico N-% SEindefinido N-% SE-ambíguo Objeto direto N-% Passiva Analítica N-% N-% N-% Anteposto 58 – 49% 40 - 66% 0 - 0% 3 - 5% 12 - 8% 12 - 2% Posposto 14 – 9% 5 -8% 16 – 75% 31 - 57% 95 – 69% 437 - 83% Nulo 47 – 42% 15 - 26% 6 – 25% 21 - 38% 30 – 23% 75 - 15% Total 119 60 22 55 137 524 Tabela 19: A nova distribuição geral dos dados em sentenças finitas e não finitas. 98 A distribuição geral apresentada acima retrata todas as construções sem separar as sentenças finitas e não finitas, entretanto nessa dissertação a análise seguirá sempre de modo a compará-las. Portanto, inicio, na próxima seção, a análise quantitativa dos dados considerando os contextos sintáticos controlados, sempre expondo primeiramente os resultados referentes às sentenças finitas e em seguidas os das não-finitas. 3.3 O DP das sentenças com SE que apresentam verbo transitivo direto: sujeito ou objeto? Esta seção está dividida em três partes: (1) apresentação geral dos resultados; (2) a ordem dos constituintes ao longo do século XIX; e (3) a distribuição, ao longo do tempo, do argumento nulo. Vejamos como ficou a distribuição nas sentenças finitas e não finitas à luz das hipóteses levantadas, a partir, inicialmente, da argumentação referente às tabelas 22 e 23. Anteposto Posposto Nulo Total SEreflexivo N-% 52 - 57% 10 - 11% 29 - 32% 91 Passiva SE-genérico SE-indefinido N-% 40 - 67% 5 - 8% 15 - 25% 60 N-% 0 - 0% 16 – 73% 6 - 27% 22 N-% 3 – 5% 32 – 58% 20 – 36% 55 SEambíguo N-% 12 -11% 75 -68% 23 – 21% 110 Objeto direto N-% 11 - 2% 388 - 85% 57 - 13% 456 828 Tabela 20: A distribuição geral nas sentenças finitas. N-% SEgenérico N -% SEindefinido N-% 6 - 21% 0 - 0% 0 – 0% Posposto 4 - 14% 0 - 0% Nulo 18 - 64% Total 28 SE-reflexivo Passiva SE-ambíguo Objeto direto N-% N-% N-% Anteposto 0 – 0% 0 - 0% 1 - 1% 0 – 0% 0 – 0% 20 - 74% 49 - 72% 0 - 0% 0 – 0% 0 – 0% 7 - 26% 18 - 27% 0 0 0 27 68 123 Tabela 21: A distribuição geral nas sentenças não finitas 99 À primeira vista podemos perceber que se formam dois grupos distintos nos dados analisados, independente do verbo estar na forma finita ou não finita. O primeiro deles, em que predomina a anteposição, é composto pelas sentenças com SE-reflexivo e passivas. O segundo é formado pelos objetos diretos e pelas sentenças com SE-genérico, indefinido ou ambíguo, nesses, prototipicamente, o argumento interno fica posposto ao verbo finito e não finito. Esse comportamento corrobora a hipótese inicial dessa dissertação de que as construções com SE-indefinido, genérico ou ambíguo apresentariam um padrão de ordem simétrico ao observado nos objetos diretos. Enquanto que as sentenças com SE-reflexivo e passivas analíticas teriam um padrão de ordem semelhante entre si. Isto porque por hipótese o DP-argumento interno das sentenças com SE-indefinido, genérico e ambíguo é o objeto da oração. Este resultado também foi encontrado por Cavalcante e Paixão de Sousa (2010), Cavalcante (2011a; 2011b): trabalhos que observaram a ordem do DP das construções com SE em textos de autores portugueses nascidos entre os séculos XVI e XIX. Este comportamento nos leva a questionar a função sintática do argumento interno das construções com SE. Para as autoras, a sintaxe dessas construções não permite que o argumento interno seja o sujeito da oração, especialmente a partir do século XVIII quando emerge a gramática do PE. Antes, porém, no Português Clássico, construções em que esse DPargumento interno exercia a função de sujeito eram possíveis ainda que fossem fósseis de outra gramática: o Português Arcaico. Nesse sentido, os resultados das tabelas 22 e 23 são mais um indício do que os trabalhos supracitados já indicavam, visto que se as análises das autoras acima compreendiam textos do Português Clássico e do Português 100 Europeu, os dados dessa dissertação compreendem textos do PB, já que seguindo a periodização de Galves, Namiutti e Paixão de Sousa (2005) que adoto, a emergência do PB teria ocorrido no século XVIII. Cavalcante (2011a) menciona o fato de que os resultados não indicam uma mudança no estatuto das sentenças com SE, mas revelam um padrão de ordem que evidência a mudança na posição do sujeito que caracteriza a emergência do PE, frente ao Português Clássico. Observemos como se dá a distribuição da anteposição e da posposição nos seis tipos de estrutura analisados ao longo do século XIX: 1808-1840 1841-1870 1871-1900 N-% N-% N-% Anteposto 15 - 78% 22 - 96% 15 - 75% Posposto 4 - 22% 1 - 4% 5 - 25% 19 23 20 N-% N-% N-% Anteposto 4 - 80% 29 - 91% 7 - 88% Posposto 1 - 20% 3 - 9% 1 - 12% 5 32 8 N-% N-% N-% Anteposto 0 – 0% 0 – 0% 0 – 0% Posposto 5 – 100% 3 – 100% 8 – 100% 5 3 8 N-% N-% N-% Anteposto 0 – 0% 2 – 50% 1 – 4% Posposto 3 – 100% 2 -50% 27 – 96% 3 4 28 SE-ambíguo N-% N-% N-% Anteposto 2 - 9% 6 - 16% 4 - 16% Posposto 21 - 91% 32 - 84% 21 - 84% 23 38 25 Objeto direto N-% N-% N-% Anteposto 1 - 1% 5 - 3% 5 - 4% Posposto 115 - 99% 159 - 97% 114 - 96% 116 164 119 SE-reflexivo Total Passiva Total SE-genérico Total SE-indefinido Total Total Total 62 45 16 35 86 399 Tabela 22: Anteposição x posposição ao longo do tempo por tipo de estruturas nas sentenças finitas 101 A tabela 22 comprova que ao longo do século XIX considerando apenas a anteposição e a posposição dos DPs argumentos externos ou internos, há uma nítida distinção, novamente, entre as construções passivas analíticas e com SE-reflexivo se comparada aos objetos diretos e as construções com SE. Abaixo apresento o gráfico 6, em que o valor de aplicação é anteposição, com os mesmos resultados da tabela acima, a fim de tornar mais claros os resultados. 100% 96% 91% 90% 80% 80% 78% 88% 75% 70% 60% 50% 50% 40% 30% 20% 16% 10% 9% 0% 1% 0% 1808-1840 SE-reflexivo SE-indefinido 3% 0% 1841-1870 Passiva SE-ambíguo 16% 4% 0% 1871-1900 SE-genérico Objeto direto Gráfico 6: A anteposição ao longo do tempo por tipo de construção em sentenças finitas. O gráfico 6 representa os resultados encontrados na tabela 24 indicando que a variação na frequência de uso da anteposição nas construções com SE em relação às sentenças com SE-reflexivos e passivas analíticas é muito alta. No primeiro grupo, o maior índice alcançado pela anteposição é 50%. No segundo grupo, apesar de ambos apresentarem uma queda na frequência de 102 uso dos DPs antepostos na passagem da segunda para a terceira fase, isto não implica na maior frequência da posposição. Em especial, quero observar o índice de 50% de anteposição na segunda fase das construções com SE-indefinido, assim como o índice de 16% de anteposição nas sentenças com SE-ambíguo. O que podemos pensar em conjunto observando a tabela 24 e o gráfico 6 é que frente as análises que consideram serem as construções com SE, que apresentam concordância entre o verbo transitivo direto e o argumento interno plural, passivas, a análise de Raposo e Uriagereka (1996) parece se sustentar tanto no PB quanto no PE à medida que os resultados indicam ser o DP dessas construções um argumento interno que tende a aparecer posposto ao verbo finito, tal como um objeto direto. Além disso, outro fator que parece influenciar a anteposição do DP nas construções com SE-ambíguo ou indefinido é o seu estatuto informacional: observando o exemplo em (22), percebemos que se trata de um tópico contrastivo, o que favorece a sua posição pré-verbal:. (22) a) Marjolin só estabelece uma excepção á esta regra para as feridas da cabeça e dos dedos; mas Follin na sua pathologia, recentemente publicada, diz que nada se deve temer da reunião immedita das feridas contusas, uma vez que se vigie com attenção a parte lesada e se renove todos os dias o curativo. (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1 de Janeiro de 1864) Se tal escandalo se observa na rua mais frequentada da Corte do Brasil, por onde passeão a nossa aristocracia, as nossas bellesas, os nossos fidalgos de chelpa!!! o que não irá pelos outros arrabaldes? Eu lho digo. (Carta de Leitor, O Despertador Municipal, 28 de Fevereiro de 1850) 103 Sobre o estatuto informacional, tratarei especificamente na seção 3.4 quando mostrarei que corroborando os resultados de Berlinck (1997) nem tudo o que é posposto é novo. Com relação às sentenças não-finitas, encontramos o mesmo tipo de padrão de ordem observado nas sentenças finitas, ou seja, quando há SEreflexivo prevalece a anteposição, sendo a posposição majoritária nos objetos diretos e nas sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo. 1808-1840 1841-1870 1871-1900 N-% N-% N-% Anteposto 1 - 33% 2 - 100% 3 - 60% Posposto 2 - 67% 0 - 0% 2 - 40% Total 3 2 5 N-% N-% N-% Anteposto 0 - 0% 0 - 0% 0 - 0% Posposto 1 - 100% 11 - 100% 8 - 100% Total 1 11 8 N-% N-% N-% Anteposto 1 - 4% 0 - 0% 0 - 0% Posposto 20 - 96% 21 - 100% 8 - 100% Total 21 21 8 SE-reflexivo SE-ambíguo Objeto direto 10 20 50 Tabela 23: As sentenças não finitas ao longo do tempo por tipo de estrutura Ao contrário das finitas em que foram encontrados dados de DP anteposto nas sentenças com SE-indefinido e ambíguo, não houve nas nãofinitas evidências da presença de construções com DP anteposto, talvez em virtude da baixa quantidade de dados. Nessas sentenças, não houve dados de passiva analítica nem de construções com SE-indefinido ou genérico. Chama a atenção na verdade, que nos DPs argumento interno considerados haja apenas 1 caso de anteposição. É interessante observarmos em que tipo de oração essa construção ocorre visto que para Raposo e Uriagereka, conforme 104 exposto no primeiro capítulo, não há duas posições à esquerda dos verbos não finitos em sentenças encaixadas. Para Kroch (1989), construções independentes sintaticamente apresentam padrões estatísticos independentes, é exatamente este o comportamento que encontramos na amostra dessa dissertação e também já apresentado por Cavalcante (2006, 2011a, 2011b), Cavalcante e Paixão de Sousa (2010), pois “as construções com SE-indefinido/genérico não apresentam um comportamento estatístico semelhante às construções que envolvem sujeito” (Cavalcante, 2011b). Visto como se dá o padrão de anteposição e da posposição nos seis tipos de sentenças em análise, é preciso ainda tecer considerações acerca das sentenças com argumento nulo, mantendo a hipótese inicial de que os objetos diretos e as sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo apresentarão comportamento semelhante enquanto que sentenças com SE-reflexivo e passivas analíticas constituirão novamente um grupo destacado. Vejamos então os resultados, iniciando a argumentação pela tabela 23 em que apresento os resultados acerca dos argumentos nulos ao longo do tempo. No gráfico 7, a oposição é feita em relação a argumentos plenos e nulos, sendo o valor de aplicação o argumento nulo: SE-reflexivo Nulo Pleno Total Passivas Nulo Pleno Total SE-genérico Nulo Pleno Total 1808-1840 N-% 10 - 33% 20 - 67% 30 N-% 0 - 0% 5 - 100% 5 N-% 2 - 29% 5 - 71% 7 1841-1870 N-% 6 - 19% 23 - 81% 29 N-% 13 - 29% 32 – 71% 45 N-% 0 - 0% 3 - 100% 3 1871-1900 N-% 13 - 36% 26 - 64% 39 N-% 2 - 20% 8 - 80% 10 N-% 4 - 33% 8 - 67% 12 88 60 22 105 SE-indefinido Nulo Pleno Total SE-ambíguo Nulo Pleno Total Objeto direto Nulo Pleno Total N-% 1 - 8% 11 - 92% 12 N-% 3 - 12% 23 - 88% 26 N-% 13 - 10% 116 - 90% 129 N-% 3 - 18% 14 - 82% 17 N-% 10 - 29% 25 - 71% 35 N-% 23 - 12% 164 - 88% 187 N-% 16 - 29% 40 - 71% 56 N-% 10 - 21% 39 - 79% 49 N-% 21 - 15% 119 - 85% 140 85 110 456 Tabela 24: O argumento nulo nas sentenças finitas A tabela 24 mostra que nos objetos diretos e nas sentenças com SEindefinido, genérico ou ambíguo há aumento da frequência de uso do argumento nulo, como podemos observar também no gráfico 7 em que o valor de aplicação é também o argumento nulo. 100% 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 33% 29% 20% 10% 0% 12% 10% 8% 0% 1808-1840 36% 33% 29% 21% 20% 15% 29% 19% 18% 12% 0% 1841-1870 1871-1900 SE-reflexivo Passiva SE-genérico SE-indefinido SE-ambíguo Objeto direto Gráfico 7: O argumento nulo nas sentenças finitas Passemos a tratar do argumento nulo nas sentenças não finitas. Observemos o gráfico abaixo: 106 Gráfico 8: O argumento nulo nas sentenças não finitas Nas sentenças não finitas, os resultados do gráfico acima indicam que a mudança parece ter se processado um pouco antes do que ocorre nas sentenças finitas, visto que na última fase do século XIX, os índices de objeto nulo já se aproximam dos 50%. De modo inverso, a curva das sentenças com SE-reflexivo assume um percurso descendente e encontra-se com a de objeto direto. A linha que representa as sentenças com SE-ambíguo também assume uma curva ascendente se comportando tal qual o objeto direto. Observando os resultados referentes à anteposição x posposição e ao argumento nulo nos seis tipos de construções em sentenças finitas e nãofinitas analisadas se evidencia um comportamento que indica duas mudanças que caracterizam, segundo Tarallo (1993), a emergência do PB: no parâmetro do sujeito nulo e no parâmetro do objeto nulo. A mudança na marcação do valor do parâmetro do sujeito nulo tem relação com a queda na frequência de uso de sujeito nulo no PB, a que se realiza no parâmetro do objeto nulo é a operação inversa, ou seja, o aumento 107 na frequência de uso do objeto nulo. Os resultados, portanto, até a presente seção indicam ser o DP-argumento interno das sentenças com SE que têm verbo transitivo direto e concordância, bem como o daquelas que não apresentam concordância, e também os das classificadas como ambíguas, um objeto direto e não o sujeito da oração. Vejamos como o estatuto informacional atua nos poucos dados em que há anteposição do DP-argumento interno das sentenças com SE-indefinido ou ambíguo e ainda nas sentenças com SE-reflexivo e passiva analíticas quando o DP está posposto aos verbos finitos e não finitos. 3.4 O estatuto informacional e a ordem dos constituintes Conforme apresentado no primeiro capítulo, pesquisas como as de Paixão de Sousa (2004), Berlinck (1989), Haward (2004) têm apontado para o fato de que por vezes, o estatuto informacional pode ser um fator capaz de antepor ou pospor determinado constituinte. A hipótese dos trabalhos acima é que as informações novas tendem a ser codificadas no final da sentença, assim como os sintagmas pesados, enquanto que as informações dadas tendem a ser expostas no inicio de cada oração. Vejamos o que ocorre nas sentenças com SE-indefinido/ambíguo em que há anteposição a partir das tabelas 25 e 26, bem como nas sentenças com SE-genérico em que há apenas DPs pospostos. 108 Anteposto Posposto N-% N-% Sintagma nominal simples 7 - 8% 84 - 92% Sintagma nominal composto 2 - 12% 14 - 88% Pronome indefinido 6 - 37% 10 - 63% Oração 0 - 0% 13 - 100% Total 15 121 136 Tabela 25: Anteposição x Posposição nas sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo finitas por tipo de sintagma. Anteposto Posposto N-% N-% Sintagma nominal simples 0 - 0% 16 - 100% Sintagma nominal composto 0 - 0% 0 - 0% Pronome indefinido 0 - 0% 0 - 0% Oração 0 - 0% 3 - 100% Total 0 19 19 Tabela 26: Anteposição x Posposição nas sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo não finitas por tipo de sintagma. Os resultados evidenciam que nesses três tipos de sentenças independente de haver um sintagma pesado a ordem preferencial é a posposição. Foram encontradas 13 sentenças com sintagma oracional em finitas e 3 em não finitas que se caracteriza como um sintagma pesado. Vejamos alguns exemplos: (23) a) Portanto, V. Ex. tem abusado completamente da sua jurisdição, está sacrificando o MONARCHA, o qual por não ter ao seu lado quem lhe faça ver os desvaneios de V. Ex. e de seus collegas ministros, por isso são conservados em despeito a opinião publica; porém recorde-se que temos o bastante coragem de chaegarmos ante os degraos do THRONO e dizermos ao MONARCHA – “SENHOR os ministros de V.M.I. arrede de S.I. esses TRAIDORES: (Carta de Redator, O Guerreiro, 15 de Janeiro de 1853) b) Sabe-se perfeitamente que esse trabalho é uma mentira, porquanto os fornecedores que quasi sempre moram para os lados de Nitheroy não acham dificuldade em obter cousa ue pareça servir. (Carta de Redator, Echo Social, 08 de Março de 1879) c) A voz publica geralmente accusa á Palhares por ter desfraudado a fasenda publica na venda de pistolas, sapatos, correames para o arcenal de guerra sendo estes generos de pessima qualidade, bem como tendo mandado baetilha por casemira & quando na administração de um de seus antecessores prohibiu-se que o arsenal comparsse genero algum na casa de Lourenço & Comp.ª, e além disto foi o mesmo mandado processar,entretanto V.Ex.ª consente que o Palhares continue a defraudar a fazenda publica com 109 um escandalo innaudito. (Carta de Redator, O Guerreiro, 04 de Março de 1853) Ao mesmo tempo, nos sintagmas nominais, em 84 sentenças finitas, que equivalem a 92% dos SNs, há posposição do DP argumento interno. Observemos se estes DPs correspondem, em geral, a informações novas ou dadas. Vejamos alguns exemplos em (24) (24) a) Quando se prohibe a existencia das casas de tavolagem como nocivas ás fortunas, também se deve prohibir a existencia d‟esse genero de agenciar o dinheiro alheio sem fazer correr subscripção. (Carta de Redator, Echo Social, 08 de Março de 1879) b) Macaco humanisado tem de Camões. Diz elle, que El-Rey veio ao Brasil Por mares nunca d‟antes navegados! Que tal Sr. Redactor! não lhe parece rasgo de mestre? nem a martello alli se encaixava melhor aquelle verso! (Carta de leitor, O Papagaio, 22 de Junho de 1822) c) A esses homens humanos, só nas formas, deram-se espadas, deram-se fardas, para com o titulo de agentes da segurança publica fiscalisarem e velarem pela segurança e bem estar do povo. (Carta de Leitor,O Lazarista, 28 de outubro de 1875) d) Comprão-se carroças, animaes e arreios; na rua do Rosario número 142, escriptorio (Anúncios, Jornal do Commercio, 05 de outubro de 1881) e) Comprão-se moveis e cautelas de penhor, na rua Sete de Setembro, número 89. (Anúncios, Jornal do Commercio, 05 de outubro de 1881) Nas sentenças (24a) e (24b), os DPs argumentos internos pospostos aos respectivos verbos finitos são informações dadas. Em (24a), a presença do pronome indefinido “esse” indica que há um caráter anafórico no DP “a existência desse gênero de agenciar o dinheiro alheio” correferente a „existência das casas de tavolagem”. Do mesmo modo, em (24b), “aquele verso” é uma referência anafórica a “por mares nunca d‟antes navegados!”. Para Haward (2004), sintagmas longos como o exposto em (24a) podem fazer com que a posposição seja preferencial ainda que a informação seja dada. 110 Já nas sentenças (24c), (24d) e (24e), todas as informações são novas. Segundo Haward (2004), em sentenças com SE que apresentam verbo transitivo direto concordando com o predicador, em geral, na análise de uma amostra de jornais do século XXI, o argumento interno é uma informação nova, mas mesmo quando há informação dada, esta tende a ser posposta. É importante mencionar que não foi feito um controle estatístico para saber o estatuto informacional dos DP sintagmas nominais nessa dissertação, o que podemos observar é que, em geral, principalmente, nos anúncios as informações contidas nos argumentos internos são novas, vejamos mais alguns exemplos em (25): (25) a) Vendem-se machinas de costura Singer e outras, a dinheiro e a prestações de 5$ a 10$, e alugão-se por pequenos alugueis; na rua Larga de São Joaquim número 116. (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881) b) Comprão-se moveis, pianos, etc., paga-se bem; na rua da Alfandega número 157, sobrado (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881) Quanto as informações dadas, na tabela 27, há 15 dados de DP anteposto. Vejamos todos eles a fim de evidenciarmos o estatuto informacional. Para facilitar a análise, tratarei primeiro dos exemplos em que há pronome indefinido/ demonstrativo e posteriormente dois dados em que a anteposição ocorre com um sintagma nominal. Observemos os exemplos em (26): (26) a Marjolin só estabelece uma excepção á esta regra para as feridas da cabeça e dos dedos; mas Follin na sua pathologia, recentemente publicada, diz que nada [se deve temer] da reunião immedita das feridas contusas, uma vez que se vigie com attenção a parte lesada e se renove todos os dias o curativo. (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1 de Janeiro de 1864) 111 b) Nada [se tem feito] nesse sentido e nem ao menos preparar as cousas de modo a evitar um cataclismo na principal fonte de riqueza do paiz.(Carta de Leitor,Jornal de Notícias, 26 de Novembro de 1875) a) Este macaco antes de ser gente já escrevinhava suas obras a fora as de seu officio isto se sabe pela nota do 3 o N.º em que se menciona algumas que deu á luz. (Carta de leitor, O Papagaio, 22 de Junho de 1822) b) Succedem-se um a outros, cada qual com as melhores promessas cada qual offerecendo a melhor vontade e esperança, mas ao realisar essas promessas, alias necessidades urgentissimas do paiz, tudo se esvae em sonhos, em discursos ephemeros que de nada valem, em mentira social enfim, que leva o desanimo ao coração do operario e indignação á sua alma ao ver-se mais uma vez enganado.(Carta de Leitor,Jornal de Notícias, 26 de Novembro de 1875) c) Tudo se adia, tudo deixa-se para depois, e passa-se o tempo, e as grandes questões do estado ficam cada vez em peiores condições, até que venha a morte fazer impossível todo e qualquer remédio (Carta de Leitor,Jornal de Notícias, 26 de Novembro de 1875) d) Tudo se adia, tudo deixa-se para depois, e passa-se o tempo, e as grandes questões do estado ficam cada vez em peiores condições, até que venha a morte fazer impossível todo e qualquer remédio (Carta de Leitor, Jornal de Notícias, 26 de Novembro de 1875) As sentenças em (26) apresentam sempre um DP anteposto a verbos finitos de modo que são sempre informações velhas caracterizadas pelo uso de um pronome indefinido, nessas sentenças não está em evidência a ordem não marcada para a posição do sujeito, mas sim o sentido potencial. E isto pode ser comprovado pela possibilidade de se parafraseá-las da seguinte forma: tudo é deixado para depois/ tudo é deixável, tudo é adiado/ tudo é adiável. No que concerne aos sintagmas nominais antepostos, podemos verificar que, em geral, há um foco contrastivo que favorece a anteposição dos SNs. Em (27a) e (27b) há um determinante indefinido que favorece a anteposição por se tratar de um pronome que marca que estas são informações já dadas no discurso. Nas sentenças em (27c) e (27d), há um sintagma nominal após o 112 pronome relativo. Por fim, em (27e), (27f) e (27g), (27h) e (27i) há um foco contrastivo que permite a anteposição dos SNs argumentos internos. (28) a) Se tal escandalo se observa na rua mais frequentada da Corte do Brasil, por onde passeão a nossa aristocracia, as nossas bellesas, os nossos fidalgos de chelpa!!! o que não irá pelos outros arrabaldes? Eu lho digo. (Carta de Leitor, O Despertador Municipal, 28 de Fevereiro de 1850) b) O Brigadeiro Cunha homem de muita reconhecida probidade, e com quem servimos, morreu pobre, deixando apenas um nome a prosperidade, e a seus filhos por herdeiros desse mesmo nome, de uns pergaminhos de nobreza adquiridos uns por si, e outros de seus maiores, e o Cunha Mattos seu filho tem na verdade manchado as cinzas desse Illuste General, e completamente desmentido o antigo proverbio de um tal pai, um tal filho se esperava. (Carta de Redator, O Guerreiro, 04 de Março de 1853) c) Decretaram a emancipação do elementeo servil, mas onde estão as medidas reparadoras desses braços arrancadas á lavoura, e cuja falta já se começa a sentir? (Carta de Leitor, Jornal de Notícias, 26 de Novembro de 1875) d) Compareceu um dos redactores do Jornal, o qual depois de contar a seu geito a historia da polemica concluiu: o Jornal foi provocado; nas palavras cuja explicação se pede, nem ha calumnia nem injuria; não damos outra explicação.Instei por intervenção do meu advogado, que não estando saptisfeito o quesito para que fôra feita a intimação, pois que não estava declarado si se afirmava, que dobrando me eu á vontade de alguem tinha estabelecido o preço do café em mais do que devia, necessario era uma resposta terminante n‟este sentido; e mandando o juiz que me fosse respondido, a resposta tornou a ser a mesma:o Jornal foi procurado, e como nem ha calumnia nem injuria, não damos outra alguma explicação.E por mais que fosse instado i redactor do Jornal, declarou, que nada mais respondia, e com effeito mudo ficou. (Carta de Leitor, O Diário do Rio de Janeiro, 26 de Março de 1846) e) As mesmas inconveniencias, o mesmo furor em me attacar notão-se nos dois escriptos, construídos de maneira que sobresahem as insinuações, que eu não sei tratar as feridas, que ignoro e modo porque obrão os corpos contundentes, que sou ilogico etc, etc. Parece, Sr. presidente, que a cortezia vai fugindo desta casa. (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1 de Janeiro de 1864) f) ESPECTACULOS THETRO LYRICO FLUMINENSE COMPANHIA HESPANHOLA DE RZUELA DIRIGIDA POR Dom THOMAZ GALVAN 113 HOJE TERÇA-FEIRA 16 DE JULHO Recita extraordinariamente em beneficio de HENRIQUETA QUINTANA Depois que a orchestra tiver executadoa sumphonia do estylo, subirá á scena a linda zarzuela em 2 actos, original do sr.Serra, musica do maestro rogel intitulada AS AMAZONAS DO TORMES CORO GERAL Dará principio a linda zarzuela em 1 acto, intitulada. UM PLEITO Tomam parte os senhores Villanova, Barcena, Villareal e as sras. Pelaez e Barredas. Ás 7 ½ horas. Os bilhetes de camarotes e cadeiras vendem-se por especial obséquio em casa dos senhores Castellões, rua do Ouvidor número 116, e Aurelio, largo de São Francisco de Paula. (Anúncios, Diário de Notícias, 16 de julho de 1869) g) Feridas Antigas ou recentes, cancros venereos, frieiras e suores fetidos dos pés curam-se com os Pós americanos Pacheco & Abreu. Deposito, Rua da Lapa número 24 (Anúncios, A Bomba, 15 de setembro de 1894) h) A obra já annunciada das Observações sobre o Commercio Franco no Brazil. Parte I. e II. vende-se a 640 reis em brochura, e 800 sendo em papel de Olanda, nas Cazas de Manoel Jorge da Silva, Livreiro, na rua do Rozario, e de Paulo Martim, Filho, Mercador de Livros, na rua da Quitanda. (Anúncios, Gazeta do Rio de Janeiro, 15 de outubro de 1808) i) Lisboa Hotel Esta casa recommenda-se ao respeitavel publico pelo asseio, promptidão e preçps, tanto do serviço de mesa como em todas as bebidas que déllas se sirvam os seus freguezes. (Anúncios, O Caixeiro, 23 de abril de 1899) Mas a anteposição do DP argumento interno das sentenças com SEindefinido ou ambíguo não é prototípica nem mesmo quando a informação é dada. Abaixo estão transcritos dados como (28a) e (28b) em que podemos encontrar casos de DP-posposto com informação dada. Assim, verificamos que as informações dadas favorecem a anteposição, mas não a tornam categórica. (28) a) Quando se prohibe a existencia das casas de tavolagem como nocivas ás fortunas, também se deve prohibir a existencia d‟esse genero de agenciar o dinheiro alheio sem fazer correr subscripção. (Carta de Redator, Echo Social, 08 de Março de 1879) 114 b) Macaco humanisado tem de Camões. Diz elle, que El-Rey veio ao Brasil Por mares nunca d‟antes navegados! Que tal Sr. Redactor! não lhe parece rasgo de mestre? nem a martello alli se encaixava melhor aquelle verso! (Carta de leitor, O Papagaio, 22 de Junho de 1822) Nas sentenças com SE-reflexivo o comportamento é exatamente o contrário do observado nas sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo. Como visto nas seções anteriores, a anteposição é preferencial e ao estatuto informacional cabe a função de por vezes pospor as informações novas e ainda os sintagmas longos. Observemos as tabelas 27 e 28 em que apresento a anteposição x posposição nas sentenças com SE-reflexivo em relação ao tipo de sintagma: Sintagma nominal simples Sintagma nominal composto Pronome indefinido Pronome pessoal do caso reto Total Anteposto N % 42 76% 0 0% 5 83% Posposto N % 13 24% 0 0% 1 17% 7 1 54 88% 12% 15 69 Tabela 27: Anteposição x Posposição nas sentenças finitas com SE-reflexivo por tipo de sintagma. Sintagma nominal simples Sintagma nominal composto Pronome indefinido Pronome pessoal do caso reto Total Anteposto N % 6 60% 0 0% 0 0% 0 0% 6 Posposto N % 4 40% 0 0% 0 0% 0 0% 4 10 Tabela 28: Anteposição x Posposição nas sentenças não finitas com SE-reflexivo por tipo de sintagma. Percebemos com as tabelas 27 e 28 que a posposição nas sentenças com SE-reflexivos ocorre majoritariamente com os sintagmas nominais. Não há casos de sintagmas oracionais e existem dois dados em que a informação dada na forma de um pronome foi codificada à direito do verbo finito. Nas 115 sentenças com verbo não finito, não há outro tipo de DP posposto que não seja um sintagma nominal simples. Vejamos primeiro, a partir de (29), (30) e (31), em que contextos os SNs podem ser pospostos. (29) a) Ha factos n‟esta sociedade, a que o homem não póde assistir, sem que o coração se lhe confranja encarando o estado de miseravel degradação, a que se vê reduzido um certo número de creaturas, dotadas, como nós, é verdade de uma alma capaz de raciocinar, de um coração capaz de sentir, mas cuja alma não raciocina, embrutecida pela ignorancia; cujo coração não sente,pelo menos moralmente, por se achar endurecido, embotado aos soffrimentos da vida, pelo trabalho rude pelas dôres continuas, pela mizeria atroz que os vai corroendo! (Carta de Redator, Correio Commercial, 18 de Junho de 1879) b) No entanto, emquanto estas pobres victimas da sua má sorte, soffrem as mais atrozes necessidades, repotreia-se, em macios coxins, S. Ex.o Sr.Ministro da Agricultura sem se quer em um momento de ocio lançar os olhos sobre tanta desgraça! (Carta de Redator,Correio Commercial, 18 de Junho de 1879) c) Melhor informará V. S. dizendo aos seus leitores que acham-se arbitrariamente presos todos os meus empregados, entre elles os compositores. (Carta de Redator, Diário do Brasil, 18 de Junho de 1879) d) Diz V. S. que acham-se presos diversos vendedores da nossa folha. (Carta de Redator, Diário do Brasil, 18 de Junho de 1879) e) Além disso todos quanto imparciaes existem mui bem conhecem que a causa de se tornar o partido moderado odiado, como vemos, foi o ser composto de cegos adoradores de quantos actos maos, e arbitrarios partião d‟esse homem, a quem nosso correspondente appelida republicano – continua, e diz asseguro-lhe com amisade, que nada mais doe me, que ver attacar a algum individuo por crimes que não commeteu nesta parte muito concordamos com o pensar do nosso correspondente, (Carta de Redator, O Sentinella da Liberdade no Rio de Janeiro, 06 de Dezembro de 1832) f) e encarou fixamente esse sol tão apregoado e decantada, a quem elle estava acostumado, a adorar inmente, e viu desvanecer-se pouco a pouco, à proporção que o ouvia, essa aureola de magnitude que apparentemente circumda o exm. sr. conselheiro Gaspar. (Carta de Leitor, Correio da Noite, 22 de Janeiro de 1879) Todas as sentenças em (29) apresentam sintagmas pesados, longos que como já dito favorecem a posposição. As sentenças em (30), pelo 116 contrário, têm SNs pequenos que tenderiam a ficar antepostos, mas o estatuto de informação nova em (30a), (30b) e (30c) faz com que o DP preferencialmente fique posposto. Vemos então que já foram mencionados dois fatores que favorecem a posposição de sujeitos: informação nova e sintagmas pesados. Esses resultados corroboram os obtidos por Berlinck (1989), apresentados no capítulo 1, em que a autora afirma que a posposição do sujeito no século XIX estava significativamente relacionada ao estatuto informacional dos argumentos. (30) a) Quem entrar nos miseros cubiculos, em que se acouta o operario, ahi pode avaliar ate que ponto tem chegado a incuria dos governos do paiz. Muitos dirão que os governos não são culpados de que o operario vivia bem ou mal;porem ninguem, absolutamente ninguem, é mais responsavel. (Carta de Leitor, Jornal de Notícias, 26 de Novembro de 1875) b) Quando lemos o dito notavel artigo, logo resolvemos condemnal-lo ao despreso, que elle merece; e logo nos ocorreu á lembrança, hum facto acontecido com o respeitavel Padre Oudino: apresentou-se-lhe hum filosofante com aquella audacia, que a ignorancia costuma gerar, e se propoz argumentar com elle sobre a existencia de Deos, declamando logo que hera atheu. (Carta de Redator, O Cathólico, 24 de Fevereiro de 1838) c) Mas tambem, é tão commodo: poder estabelecer-se negocio sem capital; conseguir ganhar muito e gastar pouco, e finalmente proceder illegalmente e nada soffrer?! (Carta de Redator, Echo Social, 08 de Março de 1879) As sentenças em (31), pelo contrário, apresentam DP-posposto com informação dada. Votre e Naro (1986), conforme discutido no capítulo 1, afirmam que há diferente níveis de “dadicidade”, sendo o sujeito posposto passível de ser caracterizado como evocado, disponível, parcialmente novo e completamente novo. Vejamos alguns exemplos em (31) (31) a) Lisboa Hotel Esta casa recommenda-se ao respeitavel publico pelo asseio, promptidão e preços,tanto do serviço de mesa como em todas as bebidas que déllas se 117 sirvam os seus freguezes. O proprietario encarrega-se de apromptar com urgencia e asseio jantares extraordinarios, banquetes, etc. no salão ou fora para o que dispões de um pessoal habilitadissimo. (Anúncios, O Caixeiro, 23 de abril de 1899) b) Os corpos contundentes obrão sobre os tecidos vivos de duas maneiras, ou por pressão ou por percussão. O que actirou sobre o anti-braço de Manoel José Fernandes foi por pressão. Neste caso, quando a acção do corpo contundente é dirigida perpendicularmente á uma região, se a pelle é pouco resistente e mais elastica que os tecidos subjacentes cede, e estes são mais ou menos contusos segundo a quantidade da massa multiplicada pela velocidade. Se, porém, a pelle é mais espessa e mais resistente do que a da face anterior, e tem um apoio mais immediato nos ossos; por isso devia ser mais contusa neste caso; mas segundo a theoria do collega foi o contrario que succedeu. Se o corpo contundente atua obliquamente, é outro o mechanismo porque se alterão os tecidos. Os tegumentos são descolorados, e tem se visto os da parte anterior do anti-braço serem dirigidos para a parte posterior, e viceversa. Neste caso, se os tecidos subcutaneos flexiveis alongão-se, e se são poucos e elasticos, se rompem. Mas a pelle em geral não resiste, se rompe, e fica ou não contusa. (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1 de Janeiro de 1864) c) A base mais forte sobre que se funda o escriptor livre he sem duvida a imparcialidade, e baseado en tão incontestavel principio não hesitamos hum momento em dar publicidade aos sentimentos de nosso correspondente; sentimentos que alias são diametralmente oppostos de que estamos possuidos, e por isso principiaremos a analysa los. (Carta de Redator, O Sentinella da Liberdade no Rio de Janeiro, 06 de Dezembro de 1832) d) Com bastante rasão se queixa o nosso Correspondente (Carta de Redator, O Carioca, 22 de Outubro de 1833) e) Quando o Sr. redactor do Guerreiro, quizer alguma informação a respeito d‟alfandega, pode-se dirigir ao abaixo assignado, que o informara com toda lealdade. Por esse maio estão simples, se livrara o Sr. Redactor de dar noticias ao publico inteiramente falsas, como a de que se trata. (Carta de Leitor, O Guerreiro, 15 de Janeiro de 1853) f) Esperamos que o Governo tomando em consideração o que acabamos de espor faça girar a moeda de 40 rs. que ninguem quer aceitar, e como talvez não esteja sciente destes males que todos nós soffremos, pela primeira vez se queixa, em nome de todos, hum Fluminense que sem ser culpado dos Srs. Negociantes, e Taberneiros que querem tudo para si, e sem que estejão authorisados regeitão a moeda emitida na circulação pelo governo. Rogo-lhe, Sr. Redactor, haja de dar lugar na sua imparcial folha a linhas, pelo que lhe será eternamente grato. (Carta de leitor, O Carioca, 22 de Outubro de 1833) 118 g) He alli mesmo que pequenos e exhaustos Negociantes fazem ofertas, que em poucos dias, já passavão de cem mil cruzados para se apromptar a Tropa; a qual precizando de hum fardamento, foi em poucos dias apomptado pelas Senhoras Paulistas de todas as classes, que spontaneamente se oferecerão! (Carta de Redator, O Compilador Constitucional Político e Litterário Brasiliense, 12 de Março de 1822) Em sentenças como (31c) e (31d), o referente apesar de não aparecer na oração está disponível seguindo a proposta de Naro e Votre (1986), pois os referentes são compartilhados pelos interlocutores. Em (31f), o referente também pode ser considerado disponível, pois trata-se do que os autores nomeiam de um referente irrelevante para o prosseguimento do discurso que caracteriza-se por aparecer na forma de um pronome indefinido. Em (31a) e (31b), o referente é evocado, ou seja, dado, mas não necessariamente idêntico. Em (31a), por exemplo, o referente do argumento externo é o sintagma “ao respeitável público”, em (31b), o referente está, no parágrafo anterior, no sintagma os “tecidos subjacentes” e, em (31e) e (31g), o referente é idêntico ao argumento externo, sendo também considerado evocado. Se estabelecermos o mesmo quadro comparativo com os dados em (30) verificaremos que o quadro proposto por Naro e Votre (1986) se aplica na amostra dessa dissertação. Apenas em (30b) o referente é novo, em (30a) o referente pode ser tratado como parcialmente novo, pois a sua remissão só é feita a partir de um SN que está vários parágrafos antes. E em (30c), o referente está disponível, pois durante a carta são mencionados negociantes, de modo implícito, onde há homens que negociam há negócios.Temos então o seguinte quadro, descartando os casos em que a posposição é preferencial em virtude do peso do sintagma conforme exposto em (29): 119 N % Novo 1 10% Parcialmente Novo 1 10% Disponível 4 40% Evocado 4 40% Total 10 100% Tabela 29: Distribuição do estatuto informacional dos referentes dos sujeitos em construções VS finitas e não finitas com SE-reflexivo Os resultados convergem com os de Naro e Votre (1986) à medida que sujeitos pospostos com informação nova constituíram aproximadamente 3% da amostra, sendo a estratégia com menor frequência de uso. Na amostra da dissertação, há apenas um caso de argumento externo posposto com informação nova, o mesmo número obtido nas informações parcialmente novas. Chama a atenção o fato de termos encontrado uma frequência de uso de SN posposto com referente disponível muito próxima a estabelecida por Naro e Votre (1986), tendo, eles, encontrado 38% e na amostra dessa dissertação 40%. Os resultados apontam para o que Naro e Votre (1987) e Berlinck (1997) defendem, ou seja, nem tudo o que é posposto é novo. Berlinck (1997) estabelecerá ainda outro viés de análise tratando especificamente da posição de cada sintagma nas sentenças, mas este assunto será tratado em outra seção. Proponho que observemos o estatuto informacional das passivas, a partir da tabela 32 em que contraponho os índices de anteposição x posposição ao tipo de sintagma nas sentenças finitas. Anteposto Posposto N % N % Sintagma nominal simples 30 91% 3 9% Sintagma nominal composto 3 60% 2 40% Pronome indefinido 6 100% 0 0% Pronome pessoal do caso reto 1 100% 0 0% Total 40 5 Tabela 30: Anteposição x Posposição nas sentenças finitas passivas por tipo de sintagma. 45 120 Com a tabela 32 percebemos que só há posposição com sintagma nominal composto, como em (32a) e (32b), e com sintagma nominal simples (32c) e (32d). Nas duas primeiras sentenças o peso do SN favorece a ordem VS. Vejamos então como se aplica a proposta de Naro (1976) nas demais sentenças. Observemos os dados. (33) a) Elixir Estomacal de W. Werneck Este elixir reune em si poderosas propriedades tonicas e estomacaes do que resultarão duas vantagens: preparar o estômago para o trabalho das digestões e fornecer-lhe conjuntamente meios para fortalecer o organismo. D‟ahi seu emprego em todos os casos de: digestões difficeis vômitos dispepsias azias gastralgias embaraço gástrico perdas de apetite indigestões em que forem aconselhadas as preparações tonicas e estomacaes, pois os resultados beneficos deste elixir garantem sua efficacia. Dose: Um calice pequeno ao almoço e outro ao jantar. 75 Rua do Ourives 75 Rio de Janeiro (Anúncios, Jornal do Brazil , 01 de junho de 1881) b) Asseverão-me que o muito illustre Sr. general Chagas Santos entre outras reformas importantes que introdusio no quartel general da côrte, mandou que não fossem mais empregadas, como ali se usava, obreias verdes e amarellas, porque S.exa. sympathisa mais com a côr encarnada. (Carta de Leitor, O Cidadão, 29 de Março de 1838) c) Compareceu um dos redactores do Jornal, o qual depois de contar a seu geito a historia da polemica concluiu:- o Jornal foi provocado; nas palavras cuja explicação se pede, nem ha calumnia nem injuria; não damos outra explicação.- Instei por intervenção do meu advogado, que não estando saptisfeito o quesito para que fôra feita a intimação, pois que não estava declarado si se afirmava, que dobrando me eu á vontade de alguem tinha estabelecido o preço do café em mais do que devia, necessario era uma resposta terminante n‟este sentido; e mandando o juiz que me fosse respondido, a resposta tornou a ser a mesma:- o Jornal foi procurado, e como nem ha calumnia nem injuria, não damos outra alguma explicação.- E por mais que fosse instado o redactor do Jornal, declarou, que nada mais respondia, e com effeito mudo ficou. (Carta de Leitor, Diário do Rio de Janeiro, 26 de Março de 1846) 121 d) Compareceu um dos redactores do Jornal, o qual depois de contar a seu geito a historia da polemica concluiu:- o Jornal foi provocado; nas palavras cuja explicação se pede, nem ha calumnia nem injuria; não damos outra explicação.- Instei por intervenção do meu advogado, que não estando saptisfeito o quesito para que fôra feita a intimação, pois que não estava declarado si se afirmava, que dobrando me eu á vontade de alguem tinha estabelecido o preço do café em mais do que devia, necessario era uma resposta terminante n‟este sentido; e mandando o juiz que me fosse respondido, a resposta tornou a ser a mesma:- o Jornal foi procurado, e como nem ha calumnia nem injuria, não damos outra alguma explicação.- E por mais que fosse instado o redactor do Jornal, declarou, que nada mais respondia, e com effeito mudo ficou. (Carta de Leitor, Diário do Rio de Janeiro, 26 de Março de 1846) Nas sentenças (32c) há um sintagma parcialmente novo à medida que o referente pode ser recuperado se pensarmos que está sendo pedida uma explicação acerca do assunto da intimação. Em (32d), o referente é evocado, ou dado. Observe que em todas as sentenças em (32) a posposição do argumento interno sujeito implica na não realização do sintagma agentivo. Essa constatação é interessante para pensarmos a proposta de Haward (2004). Para a autora nas passivas analíticas quando há posposição do sujeito e do agente da passiva, construção que não ocorre nessa amostra, pode-se afirmar que se trata de um fenômeno de desfocalização, ou seja, a idéia é tirar o foco do agente e passá-lo para o sujeito da ação. Nas sentenças em (32), o foco fica sobre o SN posposto visto que estes não competem com o sintagma agentivo. 3.5 O tipo de oração 3.5.1 O tipo de oração e as sentenças finitas Raposo e Uriagereka (1996) afirmam que em sentenças finitas subordinadas existem duas posições à esquerda do verbo: [SPEC-FP] e 122 [SPEC-TP]. A primeira dessas posições é para onde vão os constituintes deslocados em virtude do foco ou da ênfase, nesse sentido um objeto direto quando anteposto ao verbo finito só pode ir para [SPEC-FP]. A posição de [SPEC-TP] é ocupada pelo argumento que tem função de sujeito. Assim por hipótese é esperado que nas sentenças finitas sejam encontrados dados de DP-argumento interno anteposto nos objetos diretos e nas construções com SE-indefinido/genérico. A primeira tabela que apresento traz os resultados referentes ao tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças com SE-reflexivo. Nessas construções, apenas nas sentenças matrizes o sujeito manteve-se preferencialmente anteposto durante todo o século XIX, alternando frequência de 50% a 75%. Vejamos a tabela 31: 1808-1840 1841-1870 1871-1900 N-% N-% N-% Anteposto 11 - 48% 15 - 88% 6 - 27% Posposto 3 - 13% 0 - 0% 6 - 27% Nulo 9 - 39% 2 - 12% 10 - 45% Total 23 17 22 N-% N-% N-% Anteposto 2 - 67% 6 - 55% 1 - 33% Posposto 0 - 0% 1 - 9% 0 - 0% Nulo 1 - 33% 4 - 36% 2 - 67% Total 3 11 3 N-% N-% N-% Anteposto 2 - 50% 3 - 75% 8 - 73% Posposto 2 - 50% 1 - 25% 2 - 18% Nulo 0 - 0% 0 - 0% 1 - 9% Total 4 4 11 Subordinada Coordenadas Matriz 62 17 20 Tabela 31: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com SE-reflexivo Por hipótese, no século XIX, seriam encontrados indícios que apontassem para o preenchimento da posição tal como observado nas 123 sentenças matrizes. Nas coordenadas, entretanto, os resultados apontam para o aumento da frequência de sujeito nulo. Sem dúvida, a sentença coordenada é um ambiente sintático favorecedor das categorias vazias, conforme destacam Kato, Cyrino, Duarte e Berlinck (2006), Duarte (2003). O mesmo contexto foi encontrado nas sentenças subordinadas, pois na terceira fase também há preferência pelo argumento nulo. As sentenças abaixo exemplificam contextos de sujeito nulo (33a), posposto (33b) e anteposto (33c) em sentenças subordinadas. (33) a) Os individuos do kioske rio de Janeiroi, quando [-]i estabeleceram-se com a tarraxa, propalaram que iam guerrear a casa dos fenianos, no entanto que apresentam-se como victimas, para assim obterem a benevolencia do publico.|Declaram-se eles victimas, quando esta ptente que eles são os aggressores, dominados pela inveja, por verem como eles mesmos dizem a casa dos fenianos com 300$ a vender premios de continuo.|A prova mais exhuberante das malevolas intenções desses homens da tarraxa, está em asseverar que os fenianos vendem apenas 300$, quando os Fenianos, só de encomenda têm 390$ e a provincia 800$000.| Nada mais direi a esses individuos porque o meu dinheiro não se gasta com tal plebe. - Salles. (Anúncios, A Nação , 15 de março de 1873) b) Lisboa Hotel Esta casa recommenda-se ao respeitavel publico pelo asseio, promptidão e preçps,tanto do serviço de mesa como em todas as bebidas que déllas se sirvam os seus freguezes. O proprietario encarrega-se de apromptar com urgencia e asseio jantares extraordinarios, banquetes, etc. no salão ou fora para o que dispões de um pessoal habilitadissimo. (Anúncios, O Caixeiro, 23 de abril de 1899) c) TINTA VIOLETA Esta tinta veio operar uma completa revolução no artigo tintas para escrever. O consumo extraordinário a que attingiu, é prova sufficiente de que o publico reconheceu a sua superiridade entre a immensa multidão de tintas que por ahi se vendem com titulos os mais ou menos pomposos, cuja durabilidade o tempo não se encarregou de demonstrar, nem seus autores offerecem garantia alguma por falta de conhecimentos proprios: previne-se, pois, aos Senhores consumidores que quando tiverem de fazer as suas encommendas, queiram pedir a LEGITIMA tinta extra-fina Monteiro. Vende-se em todas as livrarias da corte e nas principaes localidades do Imperio. (Anúncios, Diário de Notícias , 12 de julho de 1869) 124 Nas passivas, as sentenças matrizes também se apresentaram preferencialmente com o DP-sujeito anteposto. Nas coordenadas, foram encontrados 11 dados de sujeito nulo, não havendo anteposição nem posposição na terceira fase (1871-1900). Os resultados indicam que a estrutura coordenada favorece a categoria vazia na posição de sujeito nas passivas. Vejamos a tabela 34 em que apresento a distribuição ao longo do tempo por tipo de sentença nas passivas e em seguida exemplos de sentenças passivas com argumento nulo e sujeito anteposto. 1808-1840 1841-1870 1871-1900 Subordinadas N-% N-% N-% Anteposto 9 - 60% 25 - 69% 4 - 21% Posposto 2 - 13% 2 - 6% 5 - 26% Nulo 4 - 27% 9 - 25% 10 - 53% Total 15 36 19 Coordenadas N-% N-% N-% Anteposto 0 - 0% 9 - 47% 0 - 0% Posposto 0 - 0% 2 - 11% 0 - 0% Nulo 1 - 100% 8 - 42% 2 - 100% Total 1 19 2 Matriz N-% N-% N-% Anteposto 2 - 67% 10 - 91% 11 - 85% Posposto 1 - 33% 1 - 9% 2 - 15% Nulo 0 - 0% 0 - 0% 0 - 0% Total 3 11 13 70 22 27 Tabela 32: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas Passivas (34) a) Lições de Historia Geral Organisadas de accordo com o actual programma approvado pela Inspectoria Geral da Instrução Publica para os exames geraes por Annibal Mascarenhas 1 Bello Vollume Encadernado 3$000. Este trabalhoi, que ainda em manuscrito recebeu a approvação de numerosos e habilitadissimos professores aos quaes [-]i foi apresentado, é o único que pode servir aos examinados de historia, pois nele encontrarão claras dissertações sobre todos os pontos do programma para os exames, dissertações estas escriptas de accordo com o espirito que dictou aquelle programma, e que tende a dar nova orientação aos estudos historicos. (Anúncios, A Bomba, 10 de Outubro de 1894) 125 b) Ora se o Brigadeiro cunha Mattos não tendo ligado a seus filhos bens da fortuna como é que seu filhoi Official maior da Secretaria da guerra não tendo tido heranças, não constando que [-]i tenha sido favorecido das loterias não se tendo casado rico se apresenta com uma fortuna colloçal? Teria o mesmo descoberto a california dentro do arsenal? (Carta de Redator, O Guerreiro, 04 de Março de 1853) c) PILULAS DO DoutoR RADWAY cobertas com gomma assucarada autorisadas PELA JUNTA DE HYGIENE. Purgam, regularisam, purificam, limpam e fortificam. PRUSSIA PRUSSIA PRUSSIA Estas pilulasi são unicas adoptadas pela escola de pharmacia da Prussia, e []i foram declaradas pelos rhimicos de Sua Majestade prussiana as mais puras e melhores do mundo, não sendo alsas. Deposito geral 46 Rua dos Pescadores 46 (Anúncios, Diário de Notícias, 12 de julho de 1869) (35) a) Pastilhas de Clorato de Potassio e Cocaina de W.Werneck Aprovadas pela Inspectoria de Hygienei. [-]i São empregadas pelos mais distinctos medicos, com excelentes resultados contra as dôres de garganta, rouquidão, extincção de voz, pharingite, laringite, ulcerações tuberculosas, etc.Á venda na 75 Rua do Ourives 75 (Anúncios, Jornal do Brazil , 01 de junho de 1881) b) Os pontos mais difficeis do programma, taes como os que se referem á Prehistoria, aos primeiros typos sociaes, á sciencia da historia, da qual se deduzem os dados cosmologicos, physicos e psychologicos, foram tratados com toda a proficiencia e orientação didatica pelo Senhor. Annibal Mascarenhas que, sem resfolhos, explanou estes variados assuntos de modo a facilitar sua comprehensão a todas as intelligencias. (Anúncios, A Bomba, 10 de Outubro de 1894) c) Attenção A redacção da Vespa, desejando tomar parte activa no actual movimento litterario, vae sacrificar também á moda, perguntando ao contrario da Semana e do Diario Portuguez: Qual é o peior dos poetas brasileiro que actualmente existem? As respostas serão recebidas em cartas fechadas neste escritorio, rua do Carmo número 40, 2 andar, e publicadas no proximo e susequentes numeros de Vespa. (Anúncios, Vespa , 09 de maio de 1885) Segundo Raposo e Uriagereka (1996) é possível a topicalização do DP objeto, em sentenças subordinadas, se estas forem finitas. Há alguns exemplos nesse contexto, conforme mostra a tabela 37 em que é apresentada a a forma 126 de realização de argumento interno das sentenças com SE-ambíguo por tipo de oração. Nas tabelas 33 e 34, apresento os resultados referentes ao SEgenérico e ao SE-indefinido respectivamente. SE-genérico 1808-1840 1841-1870 1871-1900 N-% N-% N-% Anteposto 0 - 0% 0 - 0% 0 - 0% Posposto 4 - 67% 2 - 100% 0 - 0% Nulo 2 - 33% 0 - 0% 2 - 100% Total 6 2 2 N-% N-% N-% Anteposto 0 - 0% 0 - 0% 0 - 0% Posposto 1 - 100% 0 - 0% 1 - 100% Nulo 0 - 0% 0 - 0% 0 - 0% Total 1 0 1 N-% N-% N-% Anteposto 0 - 0% 0 - 0% 0 – 0% Posposto 0 - 0% 1 - 0% 7 - 78% Nulo 0 - 0% 0 - 0% 2 - 22% Total 0 1 9 Subordinada Coordenada Matriz 10 2 10 Tabela 33: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com SE-genérico SE-indefinido 1808-1840 1841-1870 1871-1900 N-% N-% N-% Anteposto 0 - 0% 0 - 0% 0 - 0% Posposto 2 - 100% 2 - 50% 5 - 45% Nulo 0 - 0% 2 - 50% 6 - 55% Total 2 4 11 N-% N-% N-% Anteposto 0 - 0% 0 - 0% 0 - 0% Posposto 0 - 0% 0 - 0% 2 - 22% Nulo 1 - 100% 0 - 0% 7 - 78% Total 1 0 9 N-% N-% N-% Anteposto 0 - 0% 2 - 67% 1 - 4% Posposto 1 - 100% 0 - 0% 20 - 83% Nulo 0 - 0% 1 - 33% 3 - 12% Total 1 3 24 Subordinada Coordenada Matriz 17 10 28 Tabela 34: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com SE-indefinido 127 SE-ambíguo 1808-1840 1841-1870 1871-1900 N-% N-% N-% Anteposto 0 - 0% 4 - 19% 1 - 7% Posposto 7 - 88% 12 - 57% 11 - 79% Nulo 1 - 12% 5 - 24% 2 - 14% Total 8 21 14 N-% N-% N-% Anteposto 1 - 33% 0 - 0% 2 - 20% Posposto 1 - 33% 7 - 75% 6 - 60% Nulo 1 - 34% 2 - 25% 2 - 20% Total 3 9 10 N-% N-% N-% Anteposto 1 - 7% 0 - 0% 3 - 12% Posposto 13 - 87% 3 - 50% 15 - 62% Nulo 1 - 7% 3 - 50% 6 - 25% Total 15 6 24 Subordinada Coordenada Matriz 43 22 45 Tabela 35: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com SE-ambíguo Os exemplos abaixo mostram as sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo que têm o DP-objeto anteposto ao verbo finito. Em (36a), a subordinada, em (36b), a coordenada e em (36c), a matriz. (36) a) O Brigadeiro Cunha homem de muita reconhecida probidade, e com quem servimos, morreu pobre, deixando apenas um nome a prosperidade, e a seus filhos por herdeiros desse mesmo nome, de uns pergaminhos de nobreza adquiridos uns por si, e outros de seus maiores, e o Cunha Mattos seu filho tem na verdade manchado as cinzas desse Illuste General, e completamente desmentido o antigo proverbio de um tal pai, um tal filho se esperava. (Carta de Redator, O Guerreiro, 04 de Março de 1853) b) Tudo se adia, tudo deixa-se para depois, e passa-se o tempo, e as grandes questões do estado ficam cada vez em peiores condições, até que venha a morte fazer impossível todo e qualquer remédio (Carta de Leitor,Jornal de Notícias, 26 de Novembro de 1875) c) As mesmas inconveniencias, o mesmo furor em me attacar notão-se nos dois escriptos, construídos de maneira que sobresahem as insinuações, que eu não sei tratar as feridas, que ignoro e modo porque obrão os corpos contundentes, que sou ilogico etc, etc. Parece, Sr. presidente, que a cortezia vai fugindo desta casa (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1 de Janeiro de 1864) 128 O padrão de ordenamento dos objetos diretos, expostos na tabela 36, indica que o comportamento desses é simétrico ao observado nas sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo. Há predominância de posposição e aumento dos argumentos nulos em sentenças coordenadas. 1808-1840 1841-1870 1871-1900 Subordinadas N % N % N % Anteposto 1 1% 3 3% 4 5% Posposto 61 85% 88 85% 60 81% Nulo 10 14% 13 12% 10 14% Total 72 104 74 250 Coordenadas N % N % N % Anteposto 0 0% 2 6% 1 5% Posposto 23 92% 30 86% 12 57% Nulo 2 8% 3 9% 8 38% Total 25 35 21 81 Matriz N % N % N % Anteposto 0 0% 0 0% 0 0% Posposto 31 97% 41 85% 42 93% Nulo 1 3% 7 15% 3 7% Total 32 48 45 125 Tabela 36: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças finitas com objeto direto 3.5.2 O tipo de oração e as sentenças não finitas Raposo e Uriagreka (1996) afirmam que sentenças não finitas encaixadas não admitem a anteposição do DP argumento interno das sentenças com SE-indefinido/genérico, visto que há apenas uma posição à esquerda do verbo não finito que é a de sujeito. Os nossos resultados corroboram a análise dos autores visto que em 21 sentenças subordinadas não finitas não foram encontrados DPs antepostos, como mostra a Tabela 37: 1808-1840 1841-1870 1871-1900 N-% N-% N-% Anteposto 1 - 17% 0% 1 - 10% Posposto 2 - 33% 0% 3 - 30% Nulo 4 - 66% 8 – 100% 6 - 60% Total 6 8 10 24 Tabela 37: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças não finitas com SE-reflexivo 129 (37) a) Goyana estava em armas contra o Pro-Presidente Interino da Junta do Governo passado o Sr. Francisco Paes Barreto, e no Grande Conselho de 13 de Dezembro do anno proximo passado por ordem delle convocado, eu mesmo fui testemunha do Sr. Paes Barreto dimitir-se por ter perdido a força e consideração moral, quando então eu em nada tinha concorrido para isto, e nessa occasião fui elleito Commandante das Armas, depois de já estar elleito Presidente da Provincia o actual, a quem prestei obediencia, segundo a clausula do juramento, que deo o ex-Governador das Armas Almeida, ao qual me referi na minha posse. (Carta de leitor, O Propugnador, 13 de Junho de 1824) c) Quasi sempre os annuncios são phantasticos, de modo que o freguez, que precisa de uma criada ou criado, nas condições annunciadas, ao obter a resposta já está alugado, faz a encommenda, deixando como agencia 5$000, para poder o agente dar-se ao trabalho de procurar o criado pedido. (Carta de Redator, Echo Social, 08 de Março de 1879) Nas sentenças com SE-indefinido/genérico, corroborando a análise de Raposo e Uriagereka não foram encontradas sentenças encaixadas com anteposição do argumento interno. Vejamos a tabela 38 em que apresento a distribuição por tipo de oração das sentenças com SE-indefinido,genérico ou ambíguo. 1808-1840 1841-1870 1871-1900 N-% N-% N-% Anteposto 0 - 0% 0 - 0% 0 - 0% Posposto 1 - 100% 11 - 79% 7 - 64% Nulo 0 - 0% 3 - 21% 4 - 36% Total 1 14 11 26 Tabela 38: Tipo de oração ao longo do tempo nas sentenças não finitas com SEindefinido, genérico ou ambíguo. Vejamos abaixo alguns exemplos de sentenças subordinadas. (38) a) O Prompto Allivio de Radway é inestimavel. Pode empregar-se com certeza de obter-se feliz resultado em todos os casos que se sente dor ou qualquer encommodo. Rheumatismo. Esta dolorosa enfermidade tem zombado dos esforços dos mais habeis medicos e dos melhores remedios. É a molestia mais dificil de se tratar, comtudo com o Prompto Allivio de Radway sempre se consegue um rapido allivio para o paciente, e em todos os casos de rheumatismo agudo, inflammatorio ou nervoso obtem-se uma completa 130 cura. No rheumatismo chronico ou gottoso deve tomar-se o resolutivo e pilulas reguladoras como auxiliares do Prompto Allivio. Os tres medicamentos do Dr. Radway formam por si sós uma botica, com a qual todos ficam prevenidos para acudir a maior parte das molestias. DEPOSITO GERAL 46 RUA DOS PESCADORES 46 CASA COM A FRENTE PINTADA DE ENCARNA (Anúncios, A Nação, 15 de março de 1873) b) É preciso pois ser-se muito injusto para diser-se o que acabo de ler. (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1 de Janeiro de 1864) c) S. ex. não contava, de certo, com o rapido andamento, nem com o desfecho que teve esse negocio, que aqui para nós, que ninguem nos ouça, foi para s. ex. o caso de dizer-se – que cahiu-lhe a sôpa no mel! (Carta de Leitor, Diário Fluminense, 5 de Setembro de 1884) d) Illm. o e Exm. o Sr.- Tendo o Exm. o Sr. presidente da provincia feito sentir em seu relatorio do 1. o do corrente á assembléa provincial do Rio de Janeiro a nessecidade de se elevar á cathegoria de villa o arraial do porto da Estrella,comprehendendo-se no seu termo as freguezias de Inhomerim, Suruhy, Guia e Pilar, e uma outra, que muito convêm crear-se hoje em Petropolis com a invocação de S. Pedro d‟Alcantara, para a matriz da qual consta que S.M. o Imperador e muitos particulares concorrem com donativos e subscripções. (Carta de Leitor, Diário do Rio de Janeiro, 26 de Março de 1846) Fica evidente, portanto, que especialmente nas subordinadas não pode haver anteposição do DP-argumento interno ao verbo não finito em sentenças com SE-indefinido, genérico ou ambíguo, sendo a construção possível em sentenças com SE-reflexivo. Nesse sentido, se a única posição disponível à esquerda dos verbos não finitos é a de sujeito [SPEC-TP] e o DP das sentenças com SE-indefinido/genérico não pode ocupá-la evidencia-se que este não é o sujeito da oração, mas o objeto direto. 131 3.6 Traço de animacidade A hipótese para esse contexto sintático é de que não serão encontrados casos de DP anteposto a verbos finitos e não finitos que tenham traço [+humano] no PB. Visto que esta língua apresentaria, segundo Raposo e Uriagereka (1996), uma restrição a DPs com este tipo de traço de animacidade anteposto. Vejamos então como fica a distribuição da anteposição x posposição nas sentenças com SE-genérico, indefinido e ambíguo em relação ao traço de animacidade. Inanimado Animado Humano N-% N-% N-% 0 – 0% 0 – 0% 0 – 0% 14 – 10% 1 – 100% 1 – 100% 14 1 1 16 Inanimado Animado Humano SE-indefinido N-% N-% N -% Anteposto 3 -10% 0 – 0% 0 – 0% Posposto 28 - 90% 0 – 0% 4 – 100% Total 31 0 4 35 Inanimado Animado Humano SE-ambíguo N-% N-% N-% Anteposto 11 – 14% 0 – 0% 1 – 14% Posposto 68 – 86% 0 – 0% 6 – 86% Total 79 0 7 86 Tabela 39: Traço de animacidade nas sentenças finitas com SE-indefinido, genérico ou ambíguo. SE-genérico Anteposto Posposto Total Ao contrário do que esperavamos foi encontrado um dado numa sentença com SE-ambíguo que apresenta um DP [+humano] anteposto ao verbo finito (39). Nessa sentença, pode se perceber que há um foco contrastivo - “um tal pai” vs. “um tal filho” o que justifica a anteposição deste DP: (39) O Brigadeiro Cunha homem de muita reconhecida probidade, e com quem servimos, morreu pobre, deixando apenas um nome a prosperidade, e a seus filhos por herdeiros desse mesmo nome, de uns pergaminhos de nobreza adquiridos uns por si, e outros de seus maiores, e o Cunha Mattos seu filho tem na verdade manchado as cinzas desse Illuste General, e completamente desmentido o antigo proverbio de um tal pai, um tal filho [se esperava]. (Carta de Redator, O Guerreiro, 04 de Março de 1853) 132 Nas demais sentenças o traço de animacidade do DP quando anteposto é sempre [+inanimado] como vemos nos exemplos em (40) (40) a . lisboa Hoteli Esta casai recommenda-se ao respeitavel publico pelo asseio, promptidão e preçps, tanto do serviço de mesa como em todas as bebidas que déllas se sirvam os seus freguezes. (Anúncios, O Caixeiro, 23 de abril de 1899) b) ESPECTACULOS THETRO LYRICO FLUMINENSE COMPANHIA HESPANHOLA DE RZUELA DIRIGIDA POR Dom THOMAZ GALVAN HOJE TERÇA-FEIRA 16 DE JULHO Recita extraordinariamente em beneficio de HENRIQUETA QUINTANA Depois que a orchestra tiver executadoa sumphonia do estylo, subirá á scena a linda zarzuela em 2 actos, original do sr.Serra, musica do maestro rogel intitulada AS AMAZONAS DO TORMES CORO GERAL Dará principio a linda zarzuela em 1 acto, intitulada. UM PLEITO Tomam parte os senhoresVillanova, Barcena, Villareal e as sras. Pelaez e Barredas. Ás 7 ½ horas. Os bilhetes de camarotes e cadeiras vendem-se por especial obséquio em casa dos senhores Castellões, rua do Ouvidor número 116, e Aurelio, largo de São Francisco de Paula. (Anúncios, Diário de Notícias , 16 de julho de 1869) c) Feridas Antigas ou recentes, cancros venereos, frieiras e suores fetidos dos pés curam-se com os Pós americanos Pacheco & Abreu. Deposito, Rua da Lapa número 24 (Anúncios, A Bomba, 15 de setembro de 1894) d) A obra já annunciada das Observações sobre o Commercio Franco no Brazil. Parte I. e II. vende-se a 640 reis em brochura, e 800 sendo em papel de Olanda, nas Cazas de Manoel Jorge da Silva, Livreiro, na rua do Rozario, e de Paulo (Anúncios, Gazeta do Rio de Janeiro, 15 de outubro de 1808) e) As mesmas inconveniencias, o mesmo furor em me attacar notão-se nos dois escriptos, construídos de maneira que sobresahem as insinuações, que eu não sei tratar as feridas, que ignoro e modo porque obrão os corpos contundentes, que sou ilogico etc, etc. Parece, Sr. presidente, que a cortezia vai fugindo desta casa (Carta de Leitor, Gazeta Médica do Rio de Janeiro, 1 de Janeiro de 1864) 133 f) Se tal escandalo se observa na rua mais frequentada da Corte do Brasil, por onde passeão a nossa aristocracia, as nossas bellesas, os nossos fidalgos de chelpa!!! o que não irá pelos outros arrabaldes? Eu lho digo. (Carta de Leitor, O Despertador Municipal, 28 de Fevereiro de 1850) Assim o que se observa nessa amostra é uma restrição que o Português Brasileiro impõe as construções com SE-indefinido, genérico e ambíguo, que possuem um DP anteposto. Esse DP, em geral, não pode ter traço [+humano] visto que se isto ocorrer a interpretação da sentença é reflexiva, pois o DP não subiria para [SPEC-FP] em virtude de precisar primeiro preencher a grade temática de [SPEC-TP] para depois haver a subida de um nível e o DP atingir [SPEC-FP]. Em sentenças com DP [+inanimado], a necessidade de preencher [SPEC-TP] para depois alçar um DP para [SPEC-FP] faz com que no PB sentenças como as expostas em (40) sejam interpretadas como agramaticais. Essa pode ser uma diferença entre o PB e o PE. No PE, há a possibilidade de que [SPEC-FP] seja preenchido sem que a grade temática de [SPEC-TP] esteja ocupada e isso faz com que sentenças como (40) sejam gramaticais9. Nesse sentido temos uma diferença nas construções com SE que marca as gramáticas do PB e do PE. A produção de sentenças como (40) seria uma evidência para o fenômeno de competição de gramáticas, visto que a presença destas em jornais indica que os falantes do século XIX podiam interpretá-las ainda que estas fossem produzidas por uma gramática do PE. 9 Seguindo a proposta de Uriagereka (1995), não haveria a posição de F(orce)P disponível no PB, pois essa posição está intimamente relacionada, não só à força ilocucionária da sentença, mas também à colocação pronominal. Assim, como os clíticos no PB não se movem para o núcleo funcional mais alto, não haveria essa posição. A questão, como se pode perceber, ainda está em aberto e pode ser objeto de estudo de futuros trabalhos com base na análise desses mesmos dados. 134 Desse modo, sentenças como (41) abaixo podem ser representadas como (42), pois estamos diante de uma sentença produzida por uma gramática do PE, em que a posição de [Spec, FP] está disponível. O baixo índice dessas construções pode ser mais uma evidência de que estamos diante de estruturas distintas das produzidas pela gramática do PB: (41) Os bilhetes de camarotes e cadeiras [vendem-se] por especial obséquio em casa dos senhores Castellões, rua do Ouvidor número 116, e Aurelio, largo de São Francisco de Paula. (Anúncios, Diário de Notícias, 16 de julho de 1869) (42) FP 3 Os bilhetes e os camarotesk, F‟ 3 vendem TP 3 T‟ SEj 3 VP i 3 tj V‟ 3 ti Assim, a categoria vazia das construções tk com SE-indefinido apresentadas é gerada por movimento do objeto. A leitura arbitrária da sentença se dá pelos traços inerentes do clítico SE [+humano], [-definido], que ocupa a posição de sujeito e satisfaz o EPP, segundo Raposo e Uriagereka, 1996. 135 As construções com o DP em posição de tópico também podem ser consideradas uma evidência da presença de pistas que revelam gramáticas em competição na amostra. O exemplo em (43) revela a variação na concordância entre o verbo e o tópico no plural, o que evidencia uma construção do PE (com concordância) e uma construção do PB (sem concordância). (43) Ballanças, pesos, medidas, vasilhas de tabernas, de boticas, ferros velhos, metaes, ditos novos e usadosi, comprão-se [-]i e vende-se [-]i na rua do Conde D‟Eu número 146, em frente ao portão do chafariz do Lagarto. (Anúncios, Diário de Notícias, 12 de julho de 1869) Vemos nessa sentença um exemplo de duas gramática competindo: primeiro SE-indefinido e depois SE-genérico. Vale observar também que esta sentença ocorre em um anúncio, ou seja, no gênero textual em que encontramos o maior número de sentenças com SE-genérico (sem concordância) e também aquele em que majoritariamente foram encontrados dados de construções com o DP em posição de tópico (pela própria estrutura do anúncio). Talvez, uma análise de sentenças como as expostas em (41) e (42) à luz da proposta de Rizzi (1988) para a configuração de [SPEC-FP], nível que Rizzi (1988) chama de CP, possa trazer uma visão um pouco mais ampla da distinção entre as gramáticas do PB e do PE, visto que no nível [SPEC-FP] haveria várias categorias cindidas que processam informações distintas, como por exemplo, foco informacional, flexão,etc. Mas este é um trabalho que fica pro futuro à medida que iria requerer outra dissertação. O que posso deixar neste momento é a evidência de que sentenças como (41) diferenciam as gramáticas do PB e do PE. 136 3.7 Competição de gramáticas 3.7.1 A concordância O fator concordância é tratado na literatura como o diferenciador das sentenças indeterminadas e passivas de SE. É esta, por exemplo, a posição defendida por uma série de trabalhos que tomam os pressupostos da Teoria de Regência e Ligação e que foram brevemente apresentados no capitulo de revisão bibliográfica (MANZINI, 1986; CINQUE, 1988; DOBROVIE-SORIN, 1998; MATEUS et al., 2003; CYRINO, 2007), assim como os trabalhos de Duarte (2002) e Duarte e Lopes (2002) que seguem a linha da Teoria de Variação Paramétrica. Nesses trabalhos as construções com SE, que apresentam concordância, são tratadas como passivas sendo semelhantes as construções inacusativas em que o argumento interno recebe caso nominativo e exerce a função de sujeito, podendo ocupar a posição estrutural de sujeito [SPEC-TP] ou estar ligado a ela por meio de uma cadeia. Mas nessa dissertação, conforme foi mostrado na seção 3.2 os resultados comprovam a argumentação de Raposo e Uriagereka (1996), que se valem dos pressupostos da Teoria de Regência e Ligação em sua versão Minimalista (CHOMSKY, 1995), de que o argumento interno das sentenças com SE que exibem concordância não é o sujeito da oração, mas sim um objeto direto que checa caso nominativo e por isso pode concordar com o verbo finito ou não finito, sendo este clítico um SEindefinido. Por isso, o que proponho fazer ao observar a concordância é verificar se encontro pistas que evidenciem um quadro de competição de gramáticas, pois segundo Cavalcante (2006, 2011a, 2011b), as construções com SE-indefinido 137 pertencem a gramática do PE, enquanto que no século XVI e XVII, ou seja, o Português Clássico, ainda haveria SE-passivo. No PB, especificamente em Cavalcante (2006), para a autora, há SE-genérico. Passemos, então, para a análise dos resultados nas sentenças finitas. Ressalto antes, que no fator concordância não observarei as sentenças não finitas visto que não foram encontrados dados de verbo no plural. Observemos a tabela 40 em que apresento o fator concordância, considerando apenas os verbos finitos no plural. Concorda Não concorda Total N 3 0 3 Anteposto % 100% 0% N 31 16 47 Posposto % 70% 30% 50 Tabela 40: Concordância em sentenças finitas com SE-indefinido/genérico A primeira observação que podemos fazer é que quando o DP está anteposto não há falta de concordância, quando há o DP está sempre posposto ao verbo finito e estes casos se resumem a 30% dos dados, ou seja, a frequência de sentenças com SE-indefinido é maior do que a de sentenças com SE-genérico. Vejamos os exemplos em (44). (44) a) Alugão-se uma negrinha de 14 annos, duas pretas perfeitas cozinheiras, lavadeiras e engommadeiras de roupa de senhora; informa-se por favor, á rua Luiz de Camões número 14, antiga da Lampadosa, venda. (Anúncios, Jornal do Commercio , 01 de outubro de 1881) b) OS LEGITIMOS REMEDIOS DO Doutor AYER Vendem-se á 15 Rua Sete de Setembro 15 Extracto de salsaparrilha Remedio para sezões Peitoral de cereja Pilulas Catharticas Vigor do cabelo e Agua florida de Murray Tonico oriental Perfumarias inglezas e das mais afamadas fabricas francezas (Anúncios, Diário de Notícias , 12 de julho de 1869). 138 c) Compra-se ouro, prata e brilhantes; na rua Sete de Setembro número 229, loja de Ourives. (Anúncios, Jornal do Commercio , 04 de outubro de 1881) d) Annuncia-se a sahida do 2º. Tomo das Memorias Historicas do Rio de Janeiro por Monsenhor Pizarro para que possão os Senhores subscritores procurá-lo nos lugares , sem que fizerão as suas Assignaturas. Ficão no prelo os Tomos 3º , 4º , 5º , que sahirão com a brevidade possível; e no 6º, e 7º se publicarão a lista de todos os Senhores;que cooperarão para a impressão da Obra com a sua subscripção, a qual ainda continua nos lugares de costumes. (Anúncios, Gazeta do Rio de Janeiro, 1821) As sentenças (44a-c) constituem dados em que a concordância é facultativa visto que apesar de haver vários sintagmas coordenados o verbo finito pode ou não ir para o plural, pois os núcleos dos DPs coordenados estão no singular. Já em (44d), a falta de concordância pode ser interpretada como um caso de hipercorreção, pois o emissor fez a concordância com o sintagma “todos os senhores”. Conforme exposto na tabela 42, são somente 16 as sentenças sem concordância, vejamos treze destas em (45). Em geral, os contextos que favorecem a falta de concordância são os predicadores complexos (45a) e (45b), a distância entre o SN e o verbo finito (45c) e mesmo a posposição do argumento interno (45d-l). (45) a) Mas, Sr. Redactor, eu disse que não dou credito a esta noticia; e eis aqui a rasão. Tem sido governadores das armas da corte alguns Brasileiros natos, e muitos adoptivos; e se estes, a quem [se poderia revelar] algumas recordações do lugar do seo nascimento, nunca tiverão semelhante lembrança , como hei de crêr que a tivesse o Sr.Chagas, Brasileiro nato. Carioca, do que estacidade toda é testemunha, pois o vêrão criança na companhia de seo pai, que vivia muito modicamente ali na rua do Ouvidor!.Parece-me impossivel, até porque não quero suppôr que o Sr. Chagas seja dos maniacos que gostão de passar por adoptivos. (Carta de leitor, O Cidadão, 29 de Março de 1838) b) Ourivesaria Halphen Para evitar falsificações e usurpações de nome, deve-se exigir os dous carimbos juntos. Talheres Alfénide metal branco prateado 139 Propriedade exclusiva da Societé des Couverts Alfenide. (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881) c) Companhia Sorocabana Paga-se no New London and Brasilian Bank Limited os juros vencidos hoje dos debentures 50 e os debentures sorteados. Rio de Janeiro, 30 de Setembro de 1881 – F.P. Mayrink, presidente. (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881) d) Fornece-se comidas para fóra, de casa de familia, com proptidão e asseio, tanto á portuguesa como á brazileira, mandando-se conduzir em casa; na rua do Rosario, número 46, sobrado. (Anúncios, Jornal do Commercio, 01 de outubro de 1881) e) Gruta Bahiana de I. F. dos Santos Neste antigo estabelecimento, encontra-se sempre grande sortimento de artigos especiaes da Bahia, como sejam: Louça de barro, Azeite de dendê cheiro, camarões secos, doces, charutos, etc. Aceita-se também encommendas de Vatapá, Caruru, Moqueca de Peixe, Firgideira e outros partos especiaes da cosinha bahiana 37 Travessa do Ouvidor 37 (Anúncios, O Caixeiro, 23 de abril de 1899) f) Compra-se moveis, louças e crystaes de casa de familia; na rua Visconde do Rio-Branco número 52, loja (Anúncios, Jornal do Commercio, 04 de outubro de 1881) g) Asseverão-me que o muito illustre Sr. general Chagas Santos entre outras reformas importantes que introdusio no quartel general da côrte, mandou que não fossem mais empregadas, como ali se usava, obreias verdes e amarellas, porque S.exa. sympathisa mais om a côr encarnada. Ora, Sr. Redactor, a ser isto verdade o que eu por ora não creio é preciso submetter á consideração do digno generalissimo algumas reflexões. (Carta de leitor, O Cidadão, 29 de Março de 1838) h) Este macaco antes de ser gente já escrevinhava suas obras a fora as de seu officio isto se sabe pela nota do 3 o N.º em que se menciona algumas que deu á luz. (Carta de leitor, O Papagaio, 22 de Junho de 1822) i) Sim a engratidão, a destruição, o atrazo, a mizeria foi com que se premiou os grandes serviços, que fizestes como descobridores, conquistadores, e Povoadores de tantas Provincias, que cedestes ao Rei:o Machiavelismo temeo a Póvos tão emprehendedores, tão livres, tão constantes, patriotas e valentes; (Carta de Redator, O Compilador Constitucional Político e Litterário Brasiliense, 12 de Março de 1822) j) já o devia ter feito, e muito mais quando o clamor publico, e a voz geral accusão V. Ex. e seu official maior Cunha Mattos como os maiores criminosos nesses escandalosos roubos, e mui principalmente quando se vê a honra de um official general aballada, e sua reputação manchada no fim de trinta e 140 tantos annos de serviço, e sendo este demittido de chefe de uma repartição, da qual se manifestou esses escandalosos roubos. (Carta de Redator, O Guerreiro, 15 de Janeiro de 1853) l) Em torno delles via-se alguns colxões, dos quaes a maior parte em pessimo estado, extendidos no chão talvez para seccarem-se das humildades da noite precedente. (Carta de Redator, Correio Commercial, 18 de Junho de 1879) As construções com SE-genérico revelam um sistema em que a não concordância é justificada pela posição que o DP ocupa: posição de acusativo. Observe que em nenhum dos casos o DP está anteposto ao verbo finito, numa posição em que ele, em geral, receberia nominativo. Portanto, no PB, o DP argumento interno de construções com SE que apresentam verbo transitivo direto recebe caso acusativo. Vejamos como se comporta a concordância nas sentenças com DP argumento interno no plural ao longo do tempo a fim de que possamos enxergar se esses dados revelam uma curva de ascensão das construções com SE-genérico que indicaria o aumento da frequência de uso da gramática do PB em detrimento da gramática do PE que seria caracterizada pelas sentenças com SE-indefinido. 1808-1840 N-% 5 – 62% 3 – 38% 8 SE-genérico SE-indefinido Total 1841-1870 N-% 5 – 66% 4 – 44% 9 1871-1900 N-% 6 – 19% 27 – 81% 33 Tabela 41: Concordância nas construções com SE-indefinido/genérico ao longo do tempo. A tabela 41 mostra que da primeira para a segunda fase a um aumento na frequência de uso das construções com SE-genérico, conforme esperávamos a partir dos resultados de Cavalcante (2006), entretanto na passagem da segunda para a terceira fase as construções com SE-indefinido 141 se tornam majoritárias. Observemos o gráfico de linha abaixo em que apresento as curvas referentes aos dois tipos de sentenças. 100% 90% 81% 80% 70% 60% 66% 62% 50% 40% 44% 38% 30% 20% 19% 10% 0% 1808-1840 1841-1870 SE-genérico 1871-1900 SE-indefinido Gráfico 9: A concordância ao longo do tempo nas sentenças com SE-indefinido/ genérico. No gráfico acima, os valores apresentados na tabela 43 ficam mais claramente expressos, revelando um contexto em que se tomada a hipótese de que as sentenças com SE-indefinido são resultado da gramática do PE, esta, no processo de competição de gramáticas, estaria com uma freqüência maior de uso ao longo do tempo. Na verdade, esse pode ser um contexto em que a pressão normativa, que Pagotto (1993) já havia detectado em relação à colocação pronominal, pode estar agindo. A amostra dessa dissertação é constituída por textos impressos que podem ter sofrido um processo de edição à luz das normas prescritas pela gramática lusitana do século XIX. A observação dessas sentenças ao longo do século XX pode revelar qual a gramática que venceu esse processo de competição, acredito por intuição e por meio dos resultados de Cavalcante (2006) que tenha sido a do 142 PB e que, portanto, haja muito mais sentenças sem concordância do que com presença das marcas flexionais. 3.7.4 Anúncios e cartas: os gêneros textuais e a competição de gramáticas Em um trabalho sobre as construções com SE-indefinido/genérico, (MELO, 2011), utilizando parte da amostra dessa dissertação -- uma carta de leitor publicada na Gazeta Médica do Rio de Janeiro e todos os anúncios da segunda fase, ou seja, publicados entre (1840-1870) -- observei que a maior parte das construções em que há uma categoria vazia nas sentenças com SEindefinido/genérico10, estando o referente numa posição de tópico, foi encontrada nos anúncios. Argumento, desse modo, que o aumento das taxas de DPs em posição de tópico, e por conseguinte, argumentos nulos, nos anúncios pode estar relacionado ao fato de haver a necessidade de colocar o produto em evidência. Como nas sentenças com SE-indefinido/genérico o único DP é o argumento interno, ele tenderia a ser topicalizado nos anúncios. Para explicar essa diferença, utilizei a Teoria de Tradição discursiva e por meio de um gráfico (ordenograma), procuro mostrar a ordem do argumento interno nos anúncios. A leitura desse ordenograma deve ser feita considerando a coluna vertical que se encontra numerada da seguinte forma (-1, -2, -3, 0, 1, 2, 3). Os números positivos representam o tipo de sintagma em que a construção ocorreu – sintagma nominal, sintagma oracional ou pronome – os números negativos retratam a ordem que o DP ocupa na sentença, o índice -1 10 Em Melo (2011), não diferenciei as construções ambíguas que foram tratadas como sentenças com SE-indefinido 143 representa a anteposição, o -2 a posposição e o -3 a topicalização. Para ficar mais claro, a Figura 6 traz uma leitura do ordenograma. Numeração Estrutura 1 2 3 Oração Pronome Sintagma nominal -1 -2 -3 Anteposição Posposição Topicalização Figura 6: Organização do ordenograma (Retirado de Melo, 2011) Vejamos então como fica o ordenograma dos anúncios, observando apenas o eixo dos números negativos (em que observamos a anteposição, posposição e topicalização dos argumentos), como mostra o Gráfico 11 a seguir: Gráfico 10: Ordenograma dos anúncios (Retirado de Melo, 2011) Observe neste ordenograma que nos anúncios não há dúvida sobre a posição do argumento interno, ou ele está topicalizado ou posposto aos verbos finitos e não finitos. É interessante observar que, como vimos na seção anterior, as construções com topicalização são uma forte evidência da presença da gramática do PE nos textos do século XIX. Na seção 3.4, quando 144 tratei da concordância vimos que as construções com SE-genérico são evidências da presença da gramática do PB. Observemos como se da a distribuição nos anúncios de sentenças com SE-genérico. Anúncios Carta de redator Carta de leitor Total Posposição N -% 9 – 55% 4 – 25% 3 – 20% 16 Tabela 42: As sentenças com SE-genérico por gênero textual Os resultados da tabela 42 comprovam que há sentenças com SEgenérico em todos os gêneros, entretanto é nos anúncios que encontramos o maior número de dados, comprovando portanto que além de ser ele o gênero que mais apresenta topicalização também há a gramática do PB com as construções sem concordância. 145 Considerações Finais O propósito desse trabalho foi examinar à luz dos pressupostos da Teoria gerativista no modelo de Principios e Parâmetros a ordem do DP-argumento interno nas construções com SE-indefinido, genérico e ambíguo em dados produzidos durante o século XIX no Rio de Janeiro. Para tanto fizemos uso de uma amostra constituída por anúncios, cartas de leitores e cartas de redatores publicados em jornais cariocas que compõem parte do Corpus do projeto Para a História do Português do Brasil (PHPB-RJ) de onde foram coletados dados de objetos diretos, sentenças com SE-reflexivo, SE-indefinido, SE-genérico, SE-ambíguo e passivas analíticas a fim de que fosse possível uma comparação entre a ordem do sujeito e do objeto direto no PB. Partimos dos resultados de diversas pesquisas que têm apontado para o fato de que ao contrário do que diz a tradição gramatical, ou seja, ser o DP das construções com SE que apresentam concordância entre o verbo transitivo direto e o argumento interno plural, o sujeito da oração, o argumento interno dessas sentenças é um objeto direto independente das marcas de concordância. E assim fizemos o levantamento estatístico dos dados que foram codificados a partir dos contextos sintáticos que se mostraram relevantes durante a construção da revisão bibliográfica. Os resultados dessa dissertação apontam para o fato de que o DP dessas construções preferencialmente é posposto ao verbo finito ou não finito ao contrário do que ocorre com o DP das sentenças com SE-reflexivo e com o argumento interno das sentenças passivas analíticas. Esse resultado, portanto, 146 comprova a hipótese inicial de que o DP argumento interno das sentenças com SE-indefinido, genérico e ambiguo manteria um padrão estatístico de ordem preferencialmente posposta, bem como índices de argumento nulo que se aproximassem dos encontrados nos objetos. Desse modo, os resultados estatísticos indicam que nessas construções temos um objeto e não sujeito. Ainda que não sejam majoritários, foram encontrados dados de DP anteposto ao verbo finito. Em geral, os argumentos internos antepostos nas sentenças com SE estavam sob a forma de pronomes indefinidos e demonstrativos. Quando ocorreram como sintagma nominal havia sempre um estatuto informacional de foco ou de ênfase que favorecia a anteposição do DP. Nesses casos, a construção tinha em geral um sinal de pontuação ou uma marca da edição que indicavam estar o DP numa posição mais à esquerda da sentença que para Raposo e Uriagereka (1996) corresponde a [SPEC-FP]. Além disso, não foram encontrados dados em que esse DP estivesse anteposto numa construção não-finita. Esse resultado é especialmente importante, pois conforme afirmam Raposo e Uriagereka, nas sentenças não finitas só há uma posição à esquerda do verbo: [SPEC-TP], a posição de sujeito que não pode ser ocupada pelo DP das sentenças com SEindefinido/genérico. Os resultados referentes aos DPs-sujeitos indicam que no PB a ordem preferencial é SVO. O estatuto informacional favoreceu a posposição do sujeito corroborando os resultados de Berlinck (1989) que indicavam ser este um fator extremamente relevante para a posposição do sujeito durante o século XIX. Também controlamos o estatuto das construções com SE e nesses casos a posposição não está relacionada a esse fator. 147 O conjunto desses resultados evidenciou um comportamento de que o DP das construções com SE indefinido, genérico e ambíguo não é o sujeito da oração, mas sim o objeto direto. Entretanto, isso não significa que encontramos uma mudança no estatuto das construções com SE, ou seja, a passagem de um sistema em que há SE-passivo para outro em que há SE-indefinido. Na verdade, os resultados indicam o aumento do uso do sujeito pleno e aumento do objeto nulo, evidenciando as mudanças que, segundo Tarallo (1993), caracterizam a emergência da gramática do PB. Tratamos também da questão de competição de gramáticas, mostrando que ao longo do século XIX havia ao menos duas gramáticas em competição: PE e PB. A primeira pôde ser observada na maior frequência de uso das sentenças com SE-indefinido e em algumas construções com topicalização. Ainda em relação à concordância, a gramática do PB emerge como um sistema que apresenta apenas o SE-genérico. Finalmente podemos concluir que no século XIX com relação às construções com SE o quadro de competição de gramáticas fazia com que fossem possíveis sentenças com SE-indefinido e SE-genérico. Como vimos a análise neste trabalho transcorreu mais diretamente a partir da comparação entre o sujeito das sentenças com SE-reflexivo e passivas analíticas com o DPargumento interno das sentenças com SE-indefinido, genérico e ambiguo e dessa forma estabelecemos um panorama que evidencia a distinção na função sintática desses DPs. Esses resultados nos permitem apontar que as construções com SE que chamei de sentenças com SE-ambíguo, são na verdade ativas tal qual as construções com SE-genérico e SE-indefinido. 148 Assim, mais uma contribuição dessa dissertação é a possibilidade de passarmos a inclui-la no grupo das sentenças com SE-genérico. Brevemente, observamos também o objeto direto de sentenças transitivas ativas, mas fica ainda a necessidade de comparar especificamente os contextos sintáticos dos objetos diretos das transitivas com os DPs das sentenças com SE-indefinido, genérico e ambíguo no PB. Observar por exemplo, como se processa o aumento na frequência de uso de objetos nulos nas sentenças com SE com relação à escala de referencialidade de Kato, Cyrino, Duarte e Berlinck (2006). Por hipótese, acreditamos que o quadro de mudança nos objetos nulos das construções com SE também respeitará a escala de referencialidade. Essas são idéias que mostram não estar esta pesquisa encerrada, mas esperamos ter contribuído com mais um trabalho que evidencia a emergência da gramática do PB e tenta desvendar ainda que minimamente as suas características. 149 Referências ANDRADE, Maria Lucia Cunha Victório de Oliveira. (2008). Cartas do leitor: interatividade na correspondência publicada em jornais. Revista da ANPOLL, v. 25, p. 137-165. BARBOSA, Socorro de Fátima Pacífico. (2011). A escrita epistolar, a literatura e os jornais do século XIX: uma história. Revista da ANPOLL (Impresso), v. 1, p. 261-291. BERLINCK, Rosane de Andrade. (1988). A ordem VSN no português do Brasil: Sincronia e diacronia. Unicamp, dissertação de mestrado. BERLINCK, Rosane de Andrade. (1989). A construção VSN no português do Brasil: uma visão diacrônica do fenômeno da ordem”, in F. Tarallo (org) Fotografias sociolinguísticas, Campinas, Pontes Editores, pp. 95-112. BERLINCK, Rosane de Andrade. (1997). Nem tudo que é posposto é novo: estatuto informacional do SN e posição do sujeito em português. In: Revista Alfa, São Paulo, 41(n.esp.), 57-78. CARNEIRO, Zenaide Novaes. (2005). Cartas da Bahia (1809-1907): um estudo filológico-linguístico,Tese de doutorado inédita, Unicamp. CAVALCANTE, Silvia Regina de Oliveira. (1999). A indeterminação do sujeito na escrita padrão: a imprensa carioca nos séculos XIX e XX. Dissertação de Mestrado, Faculdade de Letras / UFRJ, Rio de Janeiro. CAVALCANTE, Silvia Regina de Oliveira. (2002). Formas de indeterminação na imprensa carioca. In: Tania Alkmin. (Org.). Para a história do Português Brasileiro: novos estudos. 1 ed. São Paulo: Humanitas, v. 3, p. 197-219. CAVALCANTE, Silvia Regina de Oliveira. (2006). O se com infinitivo na história do português, do português clássico ao português europeu e brasileiro modernos. Tese de doutorado inédita, Unicamp. CAVALCANTE, Silvia Regina de Oliveira. (2010). O uso de se com infinitivo do português clássico ao português europeu e brasileiro modernos. Estudos da Língua(gem) (Impresso), v. 8, p. 1-20. CAVALCANTE, Silvia Regina de Oliveira. (2011a). As construções com "SE" na história do português: o "SE" passivo é passivo?. In: XVI Congresso 150 Internacional da ALFAL, 2011, Alcalá de Henares. Documentos para el XVI Congreso Internacional de la ALFAL. Alcalá de Henares: Universidad de Alcalá, Servicio de Publicaciones, v. 1. p. 1-10. CAVALCANTE, Silvia Regina de Oliveira. (2011b). Padrões estatísticos do encaixamento da mudança de SE-passivo a SE-indefinido na história do português. Alfa: Revista de Linguística (UNESP. São José do Rio Preto. Impresso), v. 2, p. 523-544. CAVALCANTE, Silvia Regina de Oliveira; PAIXÃO DE SOUSA, Maria Clara. (2009). Subject position and SE constructions in the history of Portuguese,. In: Going Romance. Apresentação de trabalho/ Comunicação. CHOMSKY, Noam. (1965). Aspects of the theory of syntax, The MIT Press, Cambridge, Ma, 1965. CHOMSKY, Noam. (1986). Knowledge of language: Its nature, origin and use. New York: Praeger. CHOMSKY, Noam. (1995). The Minimalist Program. Cambridge, Mass. MIT Press. CINQUE, Guglielmo. (1988). On si constructions and the theory of arb. In: Linguistic Inquiry 19:521–581. COELHO, Izete. (2008). Variação e mudança na sintaxe do PB de Santa Catarina: a inversão sujeito verbo. In: MATZENAUER, Carmen Lúcia et all. (Org.). Estudos da Linguagem: VII Círculo de Estudos Linguísticos do Sul. v. 1, Pelotas: EDUCAT, p. 369-392. COELHO, Izete; MARTINS, Marco. Antônio. (2009). A diacronia em construções XV na escrita catarinense. In: Fórum Linguístico, Florianópolis, v.6, n.1 p.73-90. COSERIU, Eugenio. (1981). Creatividad e tecnica lingística. Los ter niveles del lenguaje. In: COSERIU, Eugênio: Lecciones de linguística general. Madrid: Gredos, 269-290. CYRINO, Sônia. (2007). Construções com SE e promoção de argumentos no português brasileiro: uma investigação diacrônica. Revista da ABRALIN, v. 6, p. 85-116. DOBROVIE-SORIN, Carmen. (1998). Impersonal si Constructions in Romance and the Passivization of Unergatives. Linguistic Inquiry 29:399–437. 151 DUARTE, Inês. (2003). “Relações gramaticais, esquemas relacionais e ordem de palavras”. In.: Mateus, Maria Helena Mira et alli,Gramática da Língua Portuguesa.Lisboa, Caminho, p 275- 320. DUARTE, Inês.; BRITO, Ana. Maria. & MATOS, Gabriela. (2003). “Tipologia e distribuição das expressões nominais”. In: MATEUS, M. H. M. et alii. Gramática da Língua Portuguesa. 7ª ed. Lisboa: Editorial Caminho. DUARTE, Maria Eugênia Lamoglia. (2002). Construções com se apassivador e indeterminador. In: Para a História do Português Brasileiro: Novos Estudos, ed. Tânia Alkmim, volume III, 155–176. São Paulo, SP: Humanitas. DUARTE, Maria Eugênia Lamoglia; KATO, Mary; BARBOSA, P. (2001). Sujeitos Indeterminados em PE e PB. In: Colóquio apresentado no II Congresso Internecional da ABRALIN. 13 a 16 de março. Fortaleza, 2001. DUARTE, Maria. Eugênia. Lamoglia; e LOPES, Celia Regina dos Santos. (2002) Realizaram, realizou-se ou realizamos? As formas de indeterminação do sujeito em cartas de jornais do século XIX. In: Notícias de corpora e outros estudos, volume IV de Para a história do Português Brasileiro, 155–165. Rio de Janeiro: UFRJ/LETRAS, FAPERJ. FLORIPI, Simone. (2008). Estudo da variação do determinante em sintagmas nominais possessivos na história do português. Tese de doutorado, Unicamp. GALVES, Charlotte. (1987) A sintaxe do português brasileiro. Cadernos de Linguística e Teoria da Literatura - Ensaios de Linguística 7. GALVES, Charlotte. (1993) O enfraquecimento da concordância no português brasileiro In: Roberts, I. & Kato, Mary A. (orgs.) Português brasileiro: uma viagem diacrônica. Campinas, Pontes. p. 387-408. GALVES, Charlotte. (1998). A Gramática do Português Brasileiro. In. Línguas e Instrumentos Linguísticos, nº. 1, 79-98. São Paulo, Pontes. GALVES, Charlotte; BRITTO, Helena; PAIXÃO DE SOUSA, Maria Clara. (2005) The Change in clitic placement from Classical to Modern European Portuguese: Results from the Tycho Brahe Corpus. Journal of Portuguese Linguistics, v. 4, p. 39-67. GALVES, Charlotte; NAMIUTI, Cristiane; PAIXÃO de SOUSA, Maria Clara. (2005). Novas perspectivas para antigas questões: revisitando a periodização da língua portuguesa. In: Annette Endruschat; Rolf Kemmler; 152 Barbara Schafer-Prie t. (Org.). Grammatische Strukturen des Europaischen Portugiesich. Tubingen: Calepinus Verlag, p. 45-75. GIBRAIL, Alba. (2009). O requerimento de efeitos V2 no licenciamento de estruturas de tópico no Português Clássico. Anais do Seta, v. 3. HAWAD, Helena. (2004) A voz verbal e o fluxo informacional do texto. In: Revista Delta 20:1 pp 97-121. JACOB, David; KABATEK Johannes. (2001) Lengua medieval y tradiciones discursivas en La Península Ibérica: Descripción gramatical - pragmática histórica – metodología. Frankfurt am Main/Madrid: Vervuert Iberoamericana. KABATEK, Johannes. (2004) Algunas reflexiones sobre tradiciones discursivas. Lexis (Lima); número especial en homenaje a José Luis Rivarola. Dísponível em: http://www.kabatek.de/discurso, Acesso em 08/12/21010. KABATEK, Johannes. (2006). “Tradiciones discursivas y cambio linguístico”, in Lexis 29/2, 151-177; versão portuguesa “Tradições discursivas e mudança linguística”, in: LOBO, T; RIBEIRO, Ilza; CARNEIRO, Zenaide; ALMEIDA, N (org.): Para a História do Português Brasileiro, Vol. VI: Novos dados, novas análises, Tomo II, Salvador, Bahia: EDUFBA p. 505-527. KATO, Mary. A. (2005). A contribuição chomskiana para a compreensão da aprendizagem de L2. Trabalhos em Linguistica aplicada. Campinas, v. 44, n2. P. 185-199. KATO, Mary; CYRINO, Sônia; DUARTE, Maria Eugênia Lamoglia. (2000). “Visible subject and invisible clitic in Brasilian Portuguese”. In: Kato, M & Negrão, E. (eds) Brasilian Portuguese and null subject parameter, Frankfurt. KATO, Mary; DUARTE, Maria Eugênia L; CYRINO, Sônia; ANDRADE, Rosane Berlinck. (2008) Português brasileiro no fim do século XIX e na virada do milênio. In: Cardoso, Suzana (orgs.) 500 anos de história linguística no Brasil. Salvador. KOCH, Peter. (1997) Diskurstraditionen: zu ihrem sprachtheoretischen Status und ihrer Dynamic In: Barbara Frank/ Thomas Haye/ Doris Tophinke (orgs.) Gattungen mittelalterlicher Schriftlichkeit, Tubingen: Narr. KROCH, Anthony. (1989). Reflexes of grammar in patterns of language change. In: Language Variation and Change.Cambridge University Press. 153 KROCH, Anthony. (2001). “Syntactic Change”. In: M. Baltin e C. Collins (eds): The handbook of contemporary syntactictheory. Blackwell. LAPESA, Rafael. (1981). Historia de La Lengua Española. Madrid: Gredos. LAPESA, Rafael. (2000). Estudios de Morfosintaxis Histórica del Español. Madrid: Gredos. SANKOF, David; SMITH, Eric; TAGLIAMONTE, Sali. (2001) GoldVarb: A multivariate analysis application for Windows. University of York: Department of Language and Linguistic Science and Computer Services. LOPES, Célia Regina Santos. (Org.); BARBOSA, Afrânio. (Org.). (2006). Críticas, queixumes e bajulações na imprensa brasileira do século XIX: cartas de leitores e cartas de redatores. 1. ed. Rio de Janeiro/São Paulo: www.letras.ufrj.br/phpb-rj e Humanitas,. v. 1. 393 p. MANZINI, Maria Rita. (1986). Syntax and semantics: the syntax of pronominal clitics, capítulo On italian si. Florida, Academic Press. MATEUS, Maria Helena Mira. et al. (2003). Gramática da Língua Portuguesa (5ª edição, revista e aumentada), Lisboa (Editorial Caminho – Colecção Universitária / Série LINGUÍSTICA). MARTINS, Ana Maria. (1994). Clíticos na história do português. Lisboa: Universidade de Lisboa. MARTINS, Ana Maria. (2003). Construções com se: mudança e variação no português europeu. In: Razões e Emoções: Miscelânea de Estudos em Homenagem a Maria Helena Mateus,ed. Ivo Castro e Inês Duarte, volume 2, 163–178. Lisboa: Imprensa Nacional - Casa da Moeda. MARTINS, Marco Antonio. (2009). Variação e mudança na sintaxe como competição de gramáticas. Investigacoes (UFPE), v. 22, p. 65-87. MATTOS e SILVA, Rosa Virgínia. (2008). Caminhos da linguística histórica. São Paulo: Parábola, p.206. MELO, Elaine Alves Santos. (2011). “Balanças, casas, sofás, vendem-se, compram-se na loja do seu Manuel”: tradições discursivas e a gramática de anúncios e cartas de leitores cariocas do século XIX. In: XVI Congresso Internacional da ALFAL, 2011, Alcalá de Henares. Documentos para el XVI Congreso Internacional de la ALFAL. Alcalá de Henares : Universidad de Alcalá, Servicio de Publicaciones, v. 1. p. 11-20. 154 NARO, Anthony Julius. (1976). The genesis of the reflexive impersonal in Brazilian portuguese: a study in syntactic change as a surface phenomenon. In: Language, 52:4, 779-810. PAGOTTO, Emílio. (1993). Clíticos, mudança e seleção natural. In: Ian Roberts; Mary A. Kato. (Org.). Português brasileiro: Uma viagem diacrônica. 1 ed. Campinas: Editora da UNICAMP, v. 1, p. 185-206. PAIXÃO DE SOUSA, Maria Clara. (2004). Língua Barroca: Sintaxe e História do Português nos 1600. Tese de Doutorado, Instituto de Estudos da Linguagem, UNICAMP, Campinas, SP. PAIXÃO DE SOUSA, Maria Clara. (2006). Linguística Histórica. In: Claudia Pfeiffer; José Horta Nunes. (Org.). Introdução às Ciências da Linguagem: Língua, Sociedade e Conhecimento. 1 ed. Campinas: Pontes, v. 3, p. 1148. PAIXÃO DE SOUSA, Maria Clara. (2008). Padrões de ordem sujeito-verbo do Português Médio ao Português Europeu Moderno. In: Denilda Moura. (Org.). Os Desafios da língua: Pesquisas em língua falada e escrita. Maceió: Editora da Universidade Fedaral de Alagoas (EDUFAL). RAPOSO, Eduardo P. (1992). Teoria da Gramática. A faculdade da linguagem. Lisboa, Caminho. RAPOSO, Eduardo; URIAGEREKA, Juan. (1996). Indefinite SE. In: Natural Language and Linguistic Theory 14:749–810. RIBEIRO, ILZA. (1995). A sintaxe da ordem no português arcaico: o efeito V2. Campinas:UNICAMP, IEL – Campinas. RIZZI, Luigi. (1988). The new comparative syntax: principles and parameters of universal Grammar. ROBERTS, Ian. (1993) O português brasileiro no contexto das línguas românicas. In: Roberts, I. & Kato, Mary A. (orgs.) Português brasileiro: uma viagem diacrônica. Campinas, Pontes. p. 409-425. TARALLO, Fernando. (1993) Diagnosticando uma gramática brasileira: o português d‟aquém e d‟além mar ao final do século XIX. In: Roberts, I. & Kato, Mary A. (orgs.) Português brasileiro: uma viagem diacrônica. Campinas, Pontes. p. 69-105. 155 TORRES MORAIS, Maria Aparecida. (1995). Do português clássico ao português europeu moderno: um estudo diacrônico da cliticização e do movimento do verbo. Campinas: UNICAMP, IEL. URIAGEREKA, Juan. (1986). Aspects of the syntax of clitic placement in Western Romance. In: Linguistic Inquirty. V. 26:1, p. 79-123, 1995. VOTRE, Sebastião; NARO, Anthony. Emergência da sintaxe como um efeito discursivo. Rio de Janeiro, p.454-81. (Relatório final do Projeto Subsídios Sociolinguísticos do Projeto Censo à Educação) VASCO, Sergio Leitão. (2005). As construções de Tópico na Fala Popular Brasileira. In: XII Congresso do CIFEFIL, Rio de Janeiro. (Apresentação de Trabalho/Comunicação) VIEIRA, Silvia Rodrigues. (Org.); BRANDÃO, Silvia Figueireido. (Org.). (2007). Ensino de gramática: descrição e uso. 1. ed. São Paulo: Editora Contexto. 156