ISSN 2179-6998 Rev. Ibirapuera, São Paulo, n. 2, p. 15-17,Jul./Dez. 2011 A IMPORTÂNCIA DA MATEMÁTICA CRÍTICA NO CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS (EJA) Edgar Alves da Silva UNIVERSIDADE IBIRAPUERA Av. Interlagos, 1329 – São Paulo – SP [email protected] Resumo Trata-se de um relato de uma proposta didática apresentada aos alunos das últimas séries do Ensino Fundamental II (7ª e 8ª) da Educação Básica (modalidade de Ensino de Jovens e Adultos). Abordamos os conteúdos matemáticos relacionados à álgebra na perspectiva da Etnomatemática e tendo como referencial teórico a Matemática Crítica estudada por Skovsmose. Esta abordagem mostrou que os conteúdos matemáticos podem e devem ser utilizados como agentes de mudança política e social. Desta forma, a matemática deve se apresentar de forma consistente, inserida como elemento importante em um modelo de Projeto Pedagógico moderno e eficaz. Palavras-chaves: Álgebra; Ensino de Jovens e Adultos; Etnomatemática; Matemática Crítica; Projeto Pedagógico. Abstract This is a report of a didactic proposal presented to students the latest series of Basic Education (Method of teaching young people and Adults). We discuss the mathematical content related to algebra in Ethnomathematics perspective and with the theoretical mathematics Critical studied by Skovsmose. This approach showed that the contents Mathematicians can and should be used as agents of political change and social. Mathematics should be presented consistently inserted as an important element in a model of Teaching Project modern and efficient. Keywords: Algebra; Youth and Adult Education; Ethnomathematics; Critical Mathematics. Revista da Universidade Ibirapuera Jul/Dez 2011 n.2: 15-17 16 1. Introdução Este artigo tem por objetivo indicar novos cami- Buscamos trabalhar em um processo de “ressignificação” nhos para o desenvolvimento do pensamento matemáti- do papel da escola em conjunto com professores, pais, co crítico. O público deste estudo é formado por Jovens e comunidades interessadas, abrindo a possibilidade de ter- Adultos que freqüentam as últimas séries (7ª e 8ª séries) do mos formas mais justas e solidárias de convivência. Ensino fundamental II, em uma Escola Pública Municipal da Cidade de São Paulo. Trata-se de trabalhadores onde a respeite suas capacidades e talentos, e, nós, como edu- Matemática surge constantemente no seu cotidiano, mas cadores, podemos propor um ensino solidário, participa- que têm grandes dificuldades em reconhecer e associar tivo e acolhedor, quebrando o estigma do professor como os conteúdos estudados na escola com a sua “matemática transmissor de conhecimentos fragmentados, em tempos cotidiana”. e disciplinas escolares, amarrados em matrizes curricula- res rígidas. Pressupõe-se que o processo cognitivo dessa po- O aluno almeja ter uma formação integral que pulação de estudantes (EJA) se apresenta de forma dife- renciada do conhecimento elaborado por uma criança em professores, obtemos muita resistência, pois todos os mo- idade regular de ensino. O adulto cria caminhos e cone- delos acomodados em suas rotinas deverão ser quebrados xões mentais diferenciadas, associadas à sua realidade e ou revistos e os pilares de sustentação irão sofrer uma de- às suas experiências de vida, que podem ser uma chave sestabilização. na elaboração de um novo currículo algébrico matemático mais atraente e significativo. de incerteza e de insegurança, porém pode proporcionar aos integrantes e agentes do processo educacional uma Assume-se a hipótese que é possível abordar os Quando propomos mudanças de paradigmas aos Notamos, também, que toda mudança é cercada conteúdos algébricos de forma diferenciada e atraente sensação de liberdade, jamais sentida antes. usando o Modelo Matemático , tendo como suporte a Et- nomatemática , além das premissas presentes na teoria identidade fixada em modelos ideais, permanentes e in- sobre a Educação Matemática Crítica de Ole Skovsmo- substituíveis. se , que salienta que devemos preparar os alunos para o exercício consciente da cidadania, utilizando a Matemática te das relações interpessoais, do esvaziamento de idéias, como instrumento de análise crítica da sociedade. que geram crises contínuas em nossos velhos paradigmas. Entendemos que antes de qualquer conteúdo ela- Surge o momento de propor a mudança de mentalidade borado e ministrado pelos professores, devemos pensar e entre os participantes do processo educacional, criando repensar os processos de inclusão propostos a esses estu- novas inter-relações entre as disciplinas e a matemática dantes. O aprendizado pode ser concreto e significativo, se escolar abandonando seu isolamento. O aluno do curso de jovens e adultos não tem uma Nosso modelo educacional luta contra o desgas- valorizarmos a autoestima e propiciarmos condições para o desenvolvimento cognitivo destes alunos. ¹ Um conjunto de símbolos e relações matemáticas que traduz, de alguma forma, um fenômeno em questão ou um problema de situação real, é denominado de Modelo Matemático. ² Etnomatemática – [...] um programa que visa explicar os processos de geração, organização e transmissão de conhecimento em diversos sistemas culturais e as forças interativas que agem nos e entre os três processos D’Ambrósio (1990, p.7). ³ Ole Skovsmose é um dos principais responsáveis por divulgar o movimento da “educação matemática crítica” ao redor do mundo. Com mestrado em Filosofia e Matemática pela Universidade de Copenhague e doutorado em Educação Matemática pela Royal Danish School of Education Studies, Skovsmose defende em seus trabalhos o direito à democracia e o ensino de matemática a partir de trabalho com projetos. Revista da Universidade Ibirapuera Jul/Dez 2011 n.2: 15-17 17 A Matemática está inserida neste processo de ressignificação do universo escolar assumindo um papel A escola pode expressar a visão de mundo das mais variadas formas a partir de nossas origens, de nossos importante na busca de novas formas e procedimentos de ensino e aprendizagem. valores e de nossos sentimentos. A construção do conhecimento evoluiu para a contextualização e a integração dos saberes em rede, possibilitando a busca das soluções dos problemas de uma forma solidária. Quando buscamos uma escola e, por que não dizer uma sociedade inclusiva, temos que ter coragem de repensar nossos conceitos e valores para que a educação e, conseqüentemente, a Matemática escolar se volte à construção de uma cidadania global, livre de preconceitos e que reconheça e valorize as diferenças pessoais. Enquanto professores, questionamos as diferen- ças sutis entre integração e inclusão, pois entendemos que integrar sugere apenas inserir o aluno em um determinado grupo. Já a inclusão está focada em não deixar ninguém fora do ensino regular e, conseqüentemente, da escola pública ou privada. Percebemos que as escolas que não conseguem ver “a luz no fim do túnel” estando focadas apenas na crença de que o fracasso escolar, e o ensino da Matemática se enquadram neste insucesso, é oriundo do aluno, que não se comporta dentro dos padrões pré-estabelecidos, portanto, a escola ainda reluta em admitir suas falhas e 2. Referências Bibliográficas BARBOSA, J.C. Modelagem Matemática: Concepções e experiências de futuros professores. Rio Claro, SP: UNESP – 2001 (Tese de Doutorado). CAMPOS, Elza da Silva “O discurso de professores de prática de ensino e a perspectiva da Etnomatemática” PUC/SP, 2006 (Dissertação de Mestrado). D’AMBROSIO, Ubiratan. Etnomatemática. São Paulo: Ática, 1990. FERREIRA, S. Etnomatemática - uma proposta metodológica. Série reflexão em Educação Matemática. Rio de Janeiro. MEM/USU, 1997. MONTEIRO, Alexandrina, POMPEU JR, Geraldo. A Matemática e os Temas Transversais. São Paulo: Moderna, 2001 – (Educação em Pauta: temas transversais). SKOVSMOSE, O. Educação Matemática Critica, A questão da democracia. Papirus – SBEN, São Paulo, 2000. SILVA, Edgar Alves da “Introdução do Pensamento Algébrico para os Alunos do EJA: Uma Proposta de Ensino” PUC/SP, 2007 (Dissertação de Mestrado). assumir sua responsabilidade. Podemos apenas avaliar o que o aluno não apren- deu - o que ele não sabe, mas também, analisar o que a nossa escola “não ensina” a esse aluno. Esta análise, em muitos casos, explica e nos ajuda a corrigir falhas que evitam as conseqüências geradas pela grande evasão, discriminação e exclusão que ronda o ensino brasileiro. Desta forma, buscamos construir uma nova ética esco- lar que resgate a consciência individual, social e global de nossos alunos. Nossa busca se pauta nos novos saberes, em novos alunos, e em outras maneiras de se resolver problemas e de avaliar a aprendizagem. Buscamos, em suma, novas formas de fazer, pois constatamos que para a maioria dos alunos, a escola é o único espaço de acesso ao conhecimento. É o lugar onde eles se tornam cidadãos, pessoas com uma identidade sócio-cultural conferindo-lhes o direito de viver dignamente. Revista da Universidade Ibirapuera Jul/Dez 2011 n.2: 15-17