UFSM – Semana Acadêmica do
Curso de Química
As contribuições da História da
Ciência para a Educação
Científica
Profa. Dra. Neusa Maria John Scheid
Programa de Pós Graduação em Ensino Científico e
Tecnológico – PPGEnCT/URI
Santo Ângelo-RS
“Tarde, muito tarde, descobri a verdadeira natureza da
ciência, de seu processo, dos homens que a produzem.
Compreendi que (...) a marcha da ciência não consiste de uma
sequência de conquistas inelutáveis; que ela não percorre a
régia estrada da razão humana; que ela não é o resultado
necessário, o produto inevitável de observações sem apelo
impostas pela experimentação e pelo raciocínio. Encontrei
nela um mundo de jogo e de imaginação, de manias e de ideias
fixas. (...) aqueles que atingiam o inesperado e inventavam o
possível, não eram simplesmente homens de saber e de
método. Eram sobretudo espíritos insólitos, amantes da
dificuldade, seres com visões absurdas (...),
estranhas
misturas de indiferença e de paixão, de rigor e de bizarria, de
vontade de poder e de ingenuidade. É o triunfo da
singularidade” (JACOB, François, 1987, p. 12-13).
(Encontrado em sua autobiografia: La Statue Intérieure, ed.
Odile Jacob, Seuil, 1987).
Uso da HFC no ensino de
ciências
Início na Universidade de Harvard,
destacando-se a publicação do “The
Project
Physics
Course
(1970)”,
destinado a alunos de Ciências na faixa
etária de 16-18 anos e que contempla essa
abordagem (Solbes e Traver , 1996).
Por que usar a História da
Ciência no ensino?
ALGUMAS RAZÕES
Para Matthews (1994, p. 72)
Humanizar as ciências e aproximá-las mais
dos interesses pessoais, éticos, culturais e
políticos;
Tornar as aulas mais estimulantes e
reflexivas, incrementando a capacidade
do pensamento crítico;
Contribuir para uma compreensão maior
dos conteúdos científicos;
Melhorar a formação dos professores
contribuindo para o desenvolvimento de
uma epistemologia da ciência mais rica e
mais autêntica, isto é, a um melhor
conhecimento da estrutura da ciência e
seu lugar no marco intelectual das coisas.
Para Obregón (1996, p. 543)
A HC deve constituir-se numa
[...] valiosa ferramenta tanto para o
ensino como para o próprio trabalho
científico. O conhecimento da história de
uma ciência permite desenvolver a
capacidade crítica, o espírito de análise e
de precisão e a atitude atenta e curiosa
indispensável para o pensamento
científico.
Para Martins (1998, p. 18)
a) Mostrar através de episódios históricos o
processo gradativo e lento de construção
do conhecimento, permitindo que se
tenha uma visão mais concreta da
natureza real da ciência, seus métodos,
suas limitações. Isso, possibilitará a
formação de um espírito crítico fazendo
com que o conhecimento científico seja
desmistificado sem, entretanto, ser
destituído de valor.
b) A HC mostra , através de episódios
históricos, que ocorreu um processo
lento de desenvolvimento de conceitos
até chegar às concepções aceitas
atualmente. Isso pode facilitar o
aprendizado do próprio conteúdo
científico que estiver sendo trabalhado. O
educando perceberá que suas dúvidas são
perfeitamente cabíveis em relação a
conceitos que levaram tanto tempo para
serem estabelecidos e que foram tão
difíceis de atingir.
c) Através da HC o estudante irá perceber
que a aceitação ou ataque a alguma
proposta não dependem apenas do seu
valor intrínseco, de sua fundamentação,
mas que também nesse processo estão
envolvidas outras forças tais como as
sociais, políticas, filosóficas ou religiosas.
Para Chassot (2000, p. 266)
A HC é uma facilitadora ou, ainda mais
enfaticamente, uma produtora da
alfabetização científica do cidadão e da
cidadã.
O que é AC
Capacidade de ler, elaborar e
emitir opiniões sobre determinados
assuntos relacionados a processos
de
investigação
científica,
compreendendo sua terminologia e
tendo consciência do impacto da
Ciência e da Tecnologia na
Sociedade (FOUREZ, CHASSOT et alli).
Cidadão Alfabetizado Cientificamente
Pessoa que:
Aprecia as ciências e o esforço científico;
Usa as ciências diariamente;
Sente-se impelida a aprender ciências
sempre que isso se fizer necessário;
Possui uma visão da ciência como
atividade realizada por seres humanos,
com aparelhos e instrumentos nem
sempre perfeitos, e inseridos num
contexto sócio-histórico-cultural.
HC para contrapor-se à imagem de
um conhecimento científico de:




algorítmico;
exato;
a-histórico;
exclusivamente
analítico;
 cumulativo;
 neutralidade
empírica;
linear;
elitista;
 indivilualista;
 descontextualizado;
 socialmente neutro.
Como utilizar a HC no ensino?
Bastos (1998)
- Como conteúdo de ensino em si mesmo;
- Como fonte de inspiração para a
definição de conteúdos e para a
proposição de estratégias de ensino.
Matthews (1994)
Inclusão da história com abordagem
ilustrativa (add-on approach)
(cita os cientistas, seus experimentos,
conclusões e alguns fatos para explicar o
assunto, constituindo-se numa abordagem
cronológica que comumente aparece no
início dos capítulos dos manuais didáticos
para chamar a atenção do assunto que
será abordado).
História com abordagem
(integrated approach)
integrada
(compreendida e interpretada a partir de
pressupostos filosóficos, para permitir a
aproximação de conteúdos geralmente
dispersos).
Assim, o ensino de uma teoria é
conduzido de modo a incluir não apenas
as suas leis, mas da mesma forma a
história do desenvolvimento de suas leis e
as dificuldades de sua implementação.
Essa contextualização torna o ensino mais
significativo para o estudante e contribui
para uma concepção adequada da
natureza da Ciência.
Sobre esses dois modos, Santos e Silva
(2005, p. 790), embora não considerem a
primeira como incorreta, posicionam-se
favoráveis à segunda por acreditarem que
ela “contribui (e muito) para uma
reaproximação de conteúdos que se
encontram espalhados. De certa forma,
consolida
e
fornece
argumentos
necessários para a apreensão de um
determinado conhecimento”.
 CUIDADOS AO UTILIZAR A HC
NO ENSINO
Não usar biografias longas, repletas de
datas, sem nenhuma referência à filosofia
e às ideias científicas, ao contexto
temporal, social e cultural daquilo que se
está ensinando (Martins, 1993; Silva et
al., 2008);
Evitar mostrar apenas aquilo que “deu
certo”,
omitindo
as
dificuldades
encontradas e as propostas alternativas;
Evitar não considerar ou mesmo
desvalorizar a experiência do próprio
aluno. Ver possível “semelhanças de
etapas construção do conhecimento do
aluno e dos primórdios da ciência”
(Martins, 1998).
Problemas que o uso incorreto (superficial e
falho) da HC pode causar:
É possível se identificar quem fez e
quando foi feita cada descoberta
científica importante;
Na HC, há os “heróis” (os que chegam a
verdade) e os “vilões” (que só fazem
confusões e cometem erros);
Os grandes cientistas do passado não se
enganavam e já tinham chegado
exatamente às ideias que nos aceitamos
hoje em dia.
Aquilo que atualmente aceitamos é
correto e foi provado de forma definitiva
por alguém, no passado;
Bastos (1998) alerta que o exame crítico
da História da Ciência que tem sido
veiculada
no
Ensino
Superior,
Fundamental e Médio demonstra que
existem muitos problemas, tais como:
ignorar as relações entre o processo de
produção de conhecimento na Ciência e o
contexto social, político, econômico e
cultural;
dar a entender que os conhecimentos
científicos acontecem de forma linear,
pelas descobertas fabulosas realizadas por
cientistas geniais;
dar ênfase aos conhecimentos científicos
atuais como sendo verdades imutáveis;
glorificar o presente e seus paradigmas,
menosprezando a importância das
correntes científicas divergentes das
atuais, a riqueza dos debates ocorridos no
passado e as descontinuidades entre
passado e presente.
NÃO HÁ CONSENSO SOBRE O USO
DA HC NO ENSINO
Solbes e Traver (2001) não creem que a
ausência da História da Ciência na
formação
inicial
seja
a
razão
preponderante
de
distorção
na
compreensão da Ciência.
Razões
 As finalidades do ensino universitário,
seus conteúdos, os métodos de ensino e
avaliação,
como
sendo
muito
significativas.
Assim, quando o licenciando se torna
professor, deixa de abordar muitas
questões, mesmo que sejam urgentes para
o futuro da humanidade, dando prioridade
aos conteúdos conceituais aprendidos
durante sua formação.
Atribuem também a isso o fato de terem
pouco êxito, entre os professores, os
livros e projetos que usam a História da
Ciência.
Brush, Stephen G. (1974)
(Science, pp.1164-1172)
Should the History of Science Be
Rated X?
The way scientists behave (according to
historians) might not be a good model for
students.
Referências
 BRUSH, S. G. Should the History of Science Be Rated X? Science, v. 183,
p. 1164-1172, mar 1974.
 GONZALES, J.P.C.; GATICA,M. Q. Resolución de problemas científicos
desde la história de la ciencia: retos y desafíos para promover
competencias cognitivo lingüsticas en la Química escolar. Ciência e
Educação. Bauru, v. 14, n. 2, p. 197-212, 2008.
 MATTHEWS, M. R. Science Teaching: The Role of History and
Philosophy of Science. London: British Library Cataloguing, 1994.
 _____. História, Filosofia e Ensino de Ciências: a tendência atual de
reaproximação. Caderno Catarinense do Ensino de Física,
Florianópolis, v.12, n.3, p. 164-214, dez 1995.
 SILVA, C. P.;FIGUEIRÔA, S.F.M.; NEWERLA, V.B.;MENDES, M.I.P.
Subsídios para o uso da História das Ciências no ensino: exemplos
extraídos das geociências. Ciência e Educação. Bauru, v. 14, n. 3, p. 497517, 2008.
Muito obrigada pela atenção.
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