Calabar, O Elogio da Traição “No ano de 1973, o compositor Chico Buarque, junto a Ruy Guerra, fez uma peça teatral com o nome de: “Calabar: O Elogio da Traição” onde pela primeira vez a condição de traidor de Calabar era observada. Quando Chico e Ruy escrevem Calabar, em período ditatorial o fazem como pontuação e posicionamento reclamando do regime em que o país está envolvido. Calabar trata da personificação do traidor, da história do Brasil, seus colonizadores, do sofrimento, de um amor, do envolvimento religioso e a compensação de estar de um lado mudando rapidamente para o outro. Todos vivem de conveniência, bastam interesses pessoais que os planos e os ideais se transformam. Calabar é a fala de um homem que pelo menos tem coragem de escolher o lado que vai andar a quem dizer sim e quando disser não. Calabar é fazer uma opção. Entre 1632 e 1635, com reforços vindos da Europa e a ajuda de moradores da terra, os holandeses conquistaram pontos decisivos como a Ilha de Itamaracá, a Paraíba, o Rio Grande do Norte e, por fim, o Arraial do Bom Jesus, consolidando a ocupação de Pernambuco. Dentre os colaboradores dos Holandeses destacou-se a figura de Domingos Fernandes Calabar – Mulato (mameluco, nascido em Alagoas), perito conhecedor das terras onde se desenvolvia a guerra brasílica – as guerrilhas contra os holandeses. Calabar aparece como vilão na historiografia luso-brasileira. Integrante inicialmente das forças que tentaram impedir a conquista do território pernambucano, acabou tornando-se um eficaz colaborador dos holandeses, até ser preso, executado e esquartejado pelos luso-brasileiros. “[...] Traição era uma atitude cotidiana, aliás, implícita na própria colocação do problema: defender Portugal ou defender a Holanda significava uma traição ao Brasil. Trocar de lado era um hábito constante. De toda esta confusão, restou um bode expiatório: Calabar. Desde os bancos de escolas ensinaram que Calabar foi um traidor. Nada mais lógico, já que nossa história oficial defende o ponto de vista do colonizador português. Calabar é um herói para os holandeses. Na verdade, ao contrário de muitos delatores ou mercenários, Calabar fez uma opção. [...]”. . Biografia Pouco se sabe desse personagem controverso da História do Brasil: nasce em Porto Calvo, Alagoas, então parte integrante da Capitania de Pernambuco, por volta de 1600. Foi batizado na fé católica no dia 15 de março de 1610. Mulato, estudara com os jesuítas e, fazendo dinheiro com o contrabando, chega a tornar-se senhor de engenhos e terras. Contra a Holanda Comerciante e contrabandista, Calabar vivia a percorrer aqueles caminhos, e com seu auxilio viram-se os holandeses forçados a abandonar Olinda, que incendeiam, concentrando-se no Recife. Domingos Fernandes, muito contribuiu com Portugal, exímio conhecedor do território onde andavam, suas emboscadas eram perfeitas armadilhas contra os Holandeses. Do outro lado Por razões que nunca serão desvendadas inteiramente, Calabar muda de lado, em 1632. Por ambição, desejo de alguma recompensa entre os invasores, convicção de que estes seriam vitoriosos ao final, ou ainda mesmo por supor que aqueles colonizadores trariam maiores benefícios que os portugueses. O fato é que Calabar se tornara um homem cheio de reputação. Seu auxilio foi tão precioso que a vantagem mudara de lado e os holandeses passaram a ganhar mais território, tanto que o domínio holandês se estendeu do Rio Grande do Norte até o Recife. A Captura Durando as lutas que duravam já cinco anos, levava Albuquerque (português) oito mil homens retirando-se para Alagoas encontram um grupo de 380 holandeses, entre eles, Calabar. Um destes moradores Sebastião Souto prepara uma emboscada para os holandeses. Souto vai ao comandante holandês Picard, dizendo haver mudado de lado, convencendo-o a atacar as forças portuguesas, que informou não terem mais que 200 homens. Armada a cilada, nela caem Picard e os seus, dentre os está Calabar que juntos se rendem, e Domingos Fernandes é feito prisioneiro. Execução Tratado como traidor pelos portugueses – Calabar é punido com a morte. Esquartejado e as suas partes expostas na paliçada da fortaleza, demonstrando assim a quem mudasse de lado o destino que lhe estava reservado. Recebeu honras fúnebres, prestadas pelos holandeses que lhes deviam grande parte de seus sucessos. Calabar durante séculos foi sinônimo de traição. Porém vejamos uma suposição do que nunca seria Calabar: Sebastião Souto: _ Não sei. Só sei que eu também sempre fiz o que era para ser feito. E passei de um lado para o outro sem nunca me perguntar por quê. Porque aprendi que na guerra vale tudo. Sempre achei tudo normal. Achei normal que todo um batalhão de flamengos lutasse do lado dos portugueses. Quando um ano depois, eles desertaram de volta, achei normal. Achei que era normal executar 200 índios porque eram tapuias e hereges. Depois executamos outros cento e vinte batizados. Achei que era normal. Combati normalmente sob as ordens de chefes espanhóis, lusos, franceses, italianos, poloneses, alemães que também achavam normal lutar por dinheiro, por qualquer bandeira. Falaram em religião, acreditei. Disseram que a luta era entre Deus e os diabos, entre a terra e o mar, lutei. Depois vi que a luta era entre o açúcar e o sal, por ouro e prata, pela pimenta e a noz moscada, pela cochonilha e pelo pau-brasil, e aceitei. Achei tudo normal porque não sou louco. Só um louco é que faz perguntas que não se pode responder. Se tiver um louco nesta história é ele (Calabar). E Quando for Calabar? Seremos Calabar ao fazermos perguntas que não se pode ou não querem responder. Quando respondermos coisas que ninguém quer perguntar. Deixarmos duvida na consciência de quem quase não a tem. Nem sempre fazer o que é para ser feito. E sempre se arrepender do que não fez, só às vezes do que fez. E por ser assim: TU NÃO MORRES EM VÃO!!! “Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal. Ainda vai se tornar-se um império colonial”.