“Não há almoços grátis” ou ... o Estado é financiado por nós todos António Nogueira Leite Professor Catedrático da Univ. Nova Administrador da Companhia União Fabril, SGPS Setembro 2003 Aproximação à Europa • Convergência real: o rendimento per capita aproximou-se da média comunitária (de cerca de 60% em 1985 subiu para cerca de 75% em 2002); • Convergência nominal: esforços em matéria de política orçamental, cambial e monetária possibilitaram baixa de juros e inflação para níveis exigidos para entrada na UEM. Problemas subsequentes atenuaram o sucesso inicial Mas, no entanto... • Aproximação real a ritmo relativamente lento (…aos ritmos médios dos últimos anos convergência decorrerá muito mais do que 1 geração); • Participação na UEM implica (e bem) regras em matéria de finanças públicas que serão muito difíceis de cumprir; • Nos últimos anos verificou-se uma degradação importante da BTC (de equilíbrio a défice de mais de 10% do PIB, entretanto reduzido); • Situação de elevado endividamento dos agentes privados e do Estado, comprometendo a disponibilidade de recursos para o investimento (alavanca do desenvolvimento futuro); Convergência fraca e em desaceleração 6 5 4 3 2 crescimento diferencial UE15 1 0 -1 -2 -3 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 Evolução nominal em linha com a da UE 25 20 15 Inflação i Depósitos I crédito benchmark Div Pub Government Bond Yield (IMF/IFS 61) 10 5 0 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 Baixo crescimento potencial • Inacção nas reformas estruturais não permitiu a expansão da capacidade produtiva/oferta agregada (produto nominal); • resultado: economia com inflação relevante de par com modestas taxas de crescimento real (2000, 2001e 2002) e recessão (2003); • Redução da taxa de poupança e capacidade reduzida de atracção de IDE relevante questionam perspectivas de desenvolvimento e convergência a prazo; Principais preocupações • Degradação da competitividade (evolução dos salários não justificada pela evolução da produtividade); • Finanças Públicas em “derrapagem” em função de alguma “ilusão financeira” inicial (1996-99) e posterior descontrolo (2001) implicaram: – Medidas correctivas severas a contraciclo; – Necesidade de restaurar credibilidade externa do País; A questão da produtividade Indicadores Salários e produtividade • Remunerações têm crescido acima da produtividade desde 1996; • CUTs com maior crescimento dentro do grupo da coesão desde 1998; • taxa de crescimento da produtividade em desaceleração desde 1995; • produtividade por trabalhador muito baixa; Salários têm crescido acima da produtividade 4 3.5 3 2.5 tcr remun por trab 2 Prod. por pessoa 1.5 1 0.5 0 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 Produtividade com evolução modesta... Tv Produtividade 7 6 5 4 3 Portugal Irlanda 2 Espanha Grécia 1 0 1990 -1 -2 -3 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 CUTs a aumentar... 7 6 5 4 1998 1999 2000 3 2001 2 1 0 Portugal Irlanda Espanha Grécia Produtividade muito baixa Produtividade por trabalhador (1999) PIB/empregado/hora (USD) 35 30 25 20 15 10 5 0 Portugal Irlanda Espanha Grécia Necessidade de novas políticas • Mercado de trabalho necessita de reformas (revisão do código de trabalho já iniciada) tendo em conta a necessidade de: – Reduzir actual rigidez micro (mobilidade, tempo de desemprego, entradas e saídas, mobilidade geográfica); – Reduzir actual dualismo (lei rígida, situações iníquas em virtude da prática muito disseminada de subterfúgios); – Permitir incentivar cumprimento e desincentivar absentismo e incumprimentos; • Melhoria da qualidade da gestão Necessidade de novas políticas • Redução do peso que a máquina administrativa e burocrática coloca à actividade empresarial (redução dos custos de contexto); • Melhoria da formação e educação (impactos faseados); • As questões relacionadas com a Oferta de Trabalho e o enquadramento da actividade empresarial são particularmente importantes quando Portugal enfrenta (a menos de 1 ano) um alargamento a Leste da UE: Oferta de trabalho Facilidade com que obtém trabalho qualificado 8 6.79 7 6.75 6.46 5.81 6 5.74 5.2 5.09 5 4 3 2 1 0 República Checa Grécia Hungria Irlanda Polónia Portugal Espanha Oferta de trabalho “O sistema educativo satisfaz as necessidades de uma economia competitiva?” 8 7.42 7 5.81 6 5 5.15 4.94 4.21 3.8 4 3.44 3 2 1 0 República Checa Grécia Hungria Irlanda Polónia Portugal Espanha Oferta de trabalho Existência de engenheiros qualificados em número suficiente 7.81 8 7.02 7.11 6.87 7 6 5.87 5.85 Polónia Portugal 5.05 5 4 3 2 1 0 República Checa Grécia Hungria Irlanda Espanha Oferta de trabalho Sentido de iniciativa e inovação dos gestores 7 6.53 6.41 6.14 6.04 6 5.7 5.14 4.86 5 4 3 2 1 0 República Checa Grécia Hungria Irlanda Polónia Portugal Espanha Oferta de trabalho Flexibilidade da legislação laboral 8 7.2 7 6 5.93 5.45 5.16 5 4.11 3.97 4 3.47 3 2 1 0 República Checa Grécia Hungria Irlanda Polónia Portugal Espanha Oferta de Trabalho Índice sintético das condições da oferta de trabalho 7 6.6 6.3 6 5.5 5.3 5.2 5 4.9 5 4 3 2 1 0 República Checa Grécia Hungria Irlanda Polónia Portugal Espanha A questão das finanças públicas indicadores A questão financeira do Estado • Despesa Pública tem crescido muito acima do verificado no resto da UEM: taxas médias entre ; • Ilusão financeira toldou a percepção do fenómeno até 1998; • “folga” resultante da baixa Dívida Pública (assumida) deixou de ser relevante; • Assunção de compromissos futuros reduz margem de manobra porque alguém paga (não há free lunches): SCUTS, SS, EPs de transportes; Saldo primário e global 3 2 1 0 -1 -2 -3 -4 -5 -6 -7 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 Grande crescimento da Despesa Despesa /PIB 60 50 40 Despesa/PIB (Eurostat) Port Despesa/PIB (Eurostat) Irl 30 Despesa/PIB (Eurostat) Esp Despesa/PIB (Eurostat) Gr 20 10 0 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000E Longe da “norma” da UEM Saldo Primário ajustado do ciclo 5 4,5 4 3,5 3 1998 2,5 1999 2000 2 1,5 1 0,5 0 Portugal Irlanda Espanha Restante zona euro Que fazer? Implica, sobretudo, uma actuação muito determinada no sentido de: • Restabelecer a credibilidade internacional; • Resolver os problemas estruturais da administração pública, o que implica medidas e reformas a médio prazo; Melhoria da situação das Finanças Públicas. Tal implica 5 medidas essenciais 1. Reforma da administração pública, ao serviço dos contribuintes, segundo 3 princípios: – cultura de responsabilidade; – promoção do mérito; – emagrecimento, aproveitando a “janela de oportunidade” resultante da aposentação de mais de 200.000 funcionários públicos até 2008; Finanças Públicas (cont.) 2. Eliminação das sobreposições de competências e actuação, combatendo o desperdício. Ex: entre novos institutos e os serviços que lhes deram origem, o caso das lojas do cidadão,... 3. Reforma do modelo económico de funcionamento de dados sectores e/ou sistemas: – privatização ou gestão privada de alguns serviços (e.g. hospitais, universidades); – reforma do modelo económico das empresas públicas em sectores chave como os transportes; Finanças Públicas (cont.) 4. Rever rapidamente a “reforma do financiamento da Segurança Social”, no mínimo obrigando os fundos de capitalização a deter dívida privada no sentido da proposta apresentada já em 2002; 5. Necessidade de controlo mais eficaz da assunção de compromissos futuros (ex. Concessões scut, leasings, etc.) por via da adopção de orçamentos plurianuais com limites a este tipo de despesas futuras. O longo prazo A Segurança Social: Angústia para o Jantar A nova Segurança Social • Os modelos actuais de financiamento da segurança social (assentes num sistema de transferências inter-geracionais correntes) não são sustentáveis a longo prazo, por um conjunto de factores de natureza demogáfica: – Quebra da fertilidade; – Aumento da esperança de vida; – Mudanças nas estruturas familiares; A Segurança Social • Actuais níveis de solidariedade são incomportáveis sem reforma, pois a sua ausência implicaria: – Aumento da carga fiscal sobre empresas e trabalhadores, ou – Redução das pensões. • Reforma exigida pela insustentabilidade financeira do actual regime, também possibilita: – Reforço de uma cultura de responsabilidade; – Canaliza poupança estável para o mercado. Vidas mais longas Esperança de vida Homens Mulheres Esperança de vida aos 65 Homens Mulheres Fertlidade Gastos Sociais/PIB Fonte: Eurostat 1960 1998 67,2 72,9 74,6 80,9 12,7 15,1 2,6 19 15,6 19,4 1,4 29 Projecções 2000-2030 Gastos/PIB variação 2000-2030 Saúde Pensões Alemanha Espanha França Irlanda Itália Portugal Reino Unido USA 1,5 1,3 2 0,7 2 1 0,9 1,6 Fonte: OCDE 5 4,6 3,7 -0,1 7,7 6,1 1 2,4 Efeitos das alterações demográficas no saldo primário (em % do PIB) 2000-2030 -6,5 -7,1 -5,7 -0,6 -9,7 -8,8 -1,9 -4 Que concluir? • Os governos têm 3 funções básicas: na afectação de recursos, na estabilização e na redistribuição; • De uma forma geral, os Governos da UE têm tido sucesso nesta última função dando origem a um “tecido social” mais coeso que o dos EUA numa base que durante largos anos não colidiu com o desenvolvimento económico; • No entanto, há um conjunto de problemas que nos levam a questionar a sustentabilidade do modelo construído: Que concluir? • As elevadas taxas marginais de impostos distorcem os incentivos e dificultam a posição competitiva das economias europeias; • A “almofada” do Estado-previdência tem afectado os mercados de trabalho criando rigidez e incentivos desadequados; • A demografia afecta a sustentabilidade ao requerer, se nada for feito, ainda maiores taxas marginais de tributação ou menor equidade intergeracional; • Dívida acumulada (factura do modelo social) dificulta a função de estabilização da política económica dos Estados. Linhas de acção 1. Necessidade de garantir a sustentabilidade das finanças públicas ajustando o nível de compromissos à capacidade de obtenção de receitas: implica reformas; 2. Construção de incentivos adequados: quer no mercado de trabalho quer na contribuição de cada um (via poupança e investimento) para o seu futuro enquanto pensionista; Linhas de acção 3. Melhoria da dotação de capital humano (educação e formação); 4. Resolver eventuais trade-offs entre eficiência e solidariedade (equidade) por via da manutenção de elementos de redistribuição no sistema de pensões; 5. Adiar as reformas implica maiores custos e menor eficácia. Conclusão Algumas lições para Portugal Acção • Portugal necessita de uma estratégia política clara que se traduza numa política económica consistente, disciplina orçamental a médio e longo prazo e ideias claras sobre o modelo de funcionamento e propriedade dos sectores estruturantes • A estratégia política deve romper com o constrangimento dos ciclos eleitorais • Qualquer Governo deve prometer pouco e concretizar muito Promover desenvolvimento de competências estruturantes • Reter e desenvolver autonomamente num ambiente de sã concorrência toda a “fileira do conhecimento” de um dado negócio e manter as “competências de topo” asseguram: – a valorização das qualificações do País e – reforçam os centros de inteligência do País (universidades, centros de investigação, gabinetes de consultoria, etc.) – Eliminar “brain drain” como já se verifica • Acumulação e desenvolvimento de competências estruturantes são essenciais para a afirmação de Portugal numa Europa alargada Desafios • Estratégia clara por parte dos decisores (públicos e privados) • Aproveitar ao máximo a pressão competitiva da globalização: racionalizando processos e estruturas, melhorando competências • Abertura a parcerias e alianças • Reaproximação dos investidores institucionais (afastados após o início de 1999) • Deixar de pensar pequeno • Conseguir captar IDE Desafios • Evitar a captura pelas corporações instaladas; • Há sempre alguém que paga a refeição: se não forem as gerações que actualmente decidem serão as próximas: é necessário promover uma maior solidariedade inter-geracional por via de uma cultura de responsabilidade . Não há almoços grátis… António Nogueira Leite