A direção da cura A dialética do desejo do analista e as resistências à cura Joselita Rodrigues Rodovalho Director de Tesis: Prof. Dra. Amelia Haydée Imbriano Informe de avanço 2 I - Apresentação A Investigação sobre a direção da cura, pela perspectiva da relação dialética do desejo do analista e suas relações com as resistências à cura, pretende: Demonstrar aspectos clínicos concernentes à dialética da função do desejo do analista; Investigar as causas e a natureza das resistências ao trabalho de simbolização; Considerar a eficácia simbólica como o fim almejado de uma análise. Proposições O procedimento analítico é um método investigativo no qual se processa a construção de uma verdade desconhecida, constitutiva da subjetividade O processo de construção da verdade investigada, expõe as destinações de uma vida pulsional de exclusiva meta de satisfação, determinante das índoles subjetivas. O tratamento analítico como “clínica da fala” dá primazia à palavra e estabelece um compromisso de responsabilidade com o sujeito implicado em sua fala própria. Proposições A “clínica da fala” faz emergir através das palavras articuladas, a questão do objeto do desejo que elas propriamente representam. O objeto articulado nos dizeres do paciente, ao ceder às representações simbólicas, modela as transformações dialéticas do desejo no decorrer de todo procedimento analítico. Linguística Antropologia Psicanálise II – A Eficácia Simbólica e as Resistências ao Simbólico A “clínica da fala” ao operar com a noção de real inefável (R), demonstra um mundo sistematizado por representantes simbólicos (S), cujas representações imaginárias (I) constroem uma lógica fantasmática típica. Há que se considerar acerca da eficácia simbólica, uma equivalência na determinação lógica dos mitos e dos fantasmas engendrada nos discursos coletivos e parentais, que dão respectivamente significância à constituição dos laços sociais e da subjetividade individual. II – A Eficácia Simbólica e as Resistências ao Simbólico As resistências típicas à eficácia simbólica ocorrem devido a impregnação das imagens intensamente investidas que intensificam a primazia de sua tendência a realizar a imagem (rI), marcada pelas satisfações das experiências precoces. As funções essenciais das relações imaginárias que se apresentam sob a forma de resistências estão diretamente relacionadas à captação do real como aquilo que dá realidade a imagem(rI). As relações do imaginário (I) com o real (R) e com o simbólico (S) só podem ser assimiladas através de dois tipos de repetição: o automatismo de repetição a compulsão de repetição Automatismo de repetição Demonstra uma questão temporal. Freud (1920) demonstra através do jogo infantil “For-da!” o “ato simbólico” de fazer aparecer/desaparecer o objeto. Após o 1º mov. “For” (Tichê), surge a necessidade de repetir o 2º “For” (Automatôn), mas não sem antes a antítese “da!” no intervalo entre o 1º e o 2º “For”. Condição sine qua non para passar do automatismo à compulsão de repetição Automatismo de repetição A repetição do jogo assim instaurada “a mais primitiva repetição” é um ato de escansão temporal. A escansão temporal possibilita uma inscrição a priori do objeto e a posteriori a conservação de sua identidade tanto em presença quanto em ausência. Demonstra o valor, quantitativo e qualitativo, da significação do símbolo com respeito à existência do objeto: ou seja, poder ideá-lo sob a forma de conceito. Segundo Lacan, “um conceito responde por um objeto encarnado em sua duração no tempo”. Trata-se da permanência dos símbolos pela “simbolização da imagem” (sI). O automatismo de repetição (Tichê) é a forma de reconduzir a imagem a um real, realizar a imagem (rI), fossilização da imagem. É o encontro faltoso com o real (R). O automatismo resulta da relação do imaginário com o real. É o núcleo oco da pulsão de morte, devido ao esgotamento da compulsão até o ponto da esterilidade reprodutiva. O automatismo de repetição é o que vai persistir no mais além do princípio do prazer. O automatismo de repetição tem como núcleo estéril o que pertence às origens do estádio do espelho no tempo da formação do narcisismo primário, e que não desgarra, formando o “nó cego” sempre deslocado na trama das representações psíquicas do objeto. O deslocamento é oriundo da transação simbólica do real (sR) e os restos perdurantes não se vinculam às questões temporais de escansão e projeção essenciais à perduração dos símbolos. O deslocamento expõe as relações do imaginário com o simbólico , ou seja, imaginar o símbolo (sI) para que se dê o ato de simbolização. Uns dos efeitos deste ato são as resistências típicas do Eu, Isso e Supereu. Compulsão de repetição A compulsão de repetição (Atômaton) resulta das relações do simbólico com o imaginário (sI). A compulsão de repetição regida pelo “princípio do prazer” é um movimento que faz persistir o retorno dos signos. É uma compulsão produzida pelo simbólico. A compulsão de repetição (Autômaton) é o movimento próprio da contingência simbólica. Tichê Tichê é o “encontro do Real”. Tichê opera para além do Autômaton. Tichê é a emergência de um real alojado por detrás do Autômaton, que o sujeito só encontra através dos tropeços, atos falhos, lapsos, sonhos etc. O Real é o que insiste em retornar, repetindo-se como se fosse algo que se produz como um acaso Autômaton Autômaton resulta das simbólico com o imaginário. relações do Autômaton faz parte da contingência dos significantes, repetição dos signos. Autômaton tem ligação com o imaginário que consiste no investimento libidinal comandado pelo princípio do prazer. Lacan vislumbrou pela primeira vez a inusitada aparição do nó borromeano durante um jantar, no brasão de uma dinastia milanesa: a família Borromée. Três anéis em forma de trevo simbolizam uma tríplice aliança, tendo como sua especificidade o fato de que, se cada um dos anéis for retirado, os outros três ficarão livres, sem que se forme um par. Conforme ilustra a figura abaixo Anel borromeano 1 – Os anéis não se encontram entrelaçados nesta figura. Simbólico Real Imaginário Anel borromeano 2 – nesta figura os anéis já demonstram um movimento de entrelaçamento, desenhando a parte central do nó. Simbólico a Real Imaginário Anel borromeano 3 – nesta figura os anéis já estão ficando mais apertadinhos, a parte central dando maior visibilidade ao nó que é onde estará cravado o objeto pequeno a Simbólico Real Imaginário As relações do simbólico, imaginário e o real. O Real (R), como insistência, no automatismo de repetição, é o que não cessa de não se inscrever. O Simbólico (S), como contingência, na compulsão de repetição, é o que cessa de não se inscrever. A primeira produção de algo que se configura O Imaginário (I), como consistência, tanto no automatismo quanto na compulsão, é o que não cessa de se inscrever. “uma análise, mais do que nenhuma outra práxis, está orientada para o que, na experiência, é o osso do real” (Lacan, 1964; XI). Na análise, o real inefável concerne a verdade, a mais obscura verdade tamponada pela trampa do imaginário. “o núcleo real do sintoma” Freud HIPOTESES Uma análise ordenada pela relação do sujeito com o real visa, na medida do possível, transpor ao simbólico (S) os restos imaginários (I) arremetidos pelo real (R). Então: ◦ O tema da experiência analítica é a primazia da palavra no ato da fala do analisando. ◦ A eficácia da palavra (eficácia simbólica) vai desvendar profundas marcas que efetuam, consequentemente, substanciais mudanças subjetivas. Logo: ◦ Poderá o sujeito simbolizar esse real? ◦ Isto permite ao sujeito retificar, sucessivamente, sua posição em suas `”determinações” imaginárias? ◦ O que impulsiona essa retificação? ◦ Qual o benefício dessa retificação sucessiva do sujeito? Lugar e função do analista no tratamento analítico Considerar os conceitos fundamentais da metapsicologia freudiana. Considerar e destacar os principais princípios norteadores da práxis, por exemplo: Freudiano: ◦ “A cada circuito pulsional se produz um novo sujeito”; ◦ “Lá onde era o Isso, o Eu deve advir” (Wo Es war, soll Ich werden). Lacaniano: ◦ “O inconsciente é estruturado como uma linguagem”; ◦ “Crise real ou imaginária só se resolve pela intervenção de uma nova ordem simbólica. Compreender a escritura da lógica do fantasma de cada paciente. O fantasma, mito individual ou novela familiar, é recurso do simbólico. O que é passível de análise é estritamente simbólico. O imaginário não é analisável, está fora da “eficácia simbólica”: não é transmissível em palavras como recordação. O imaginário se produz em ato: automatismo e/ou compulsão que realiza o fantasma (rI); O ato do analista deve proporcionar meios de condições para a representação simbólica, a simbolização da imagem (sI), da tenacidade primitiva do objeto imaginário e torná-lo analisável, pois o que há de mais inanalisável é toda e qualquer realização da imagem (rI). A Lógica do Fantasma O fantasma, assim como os mitos, como elemento imaginário só tem valor simbólico. Só pode ser apreciado e compreendido em função do momento da análise no qual vai se inscrever Permite isolar certo padrão reproduzido na compulsão de repetição e que permanece sempre no mesmo lugar, é o que há de mais automático na repetição. O fantasma, como uma tela, permite a simbolização de algo, “atual sempre”, mas que vem com sentidos completamente diferentes em cada momento do diálogo analítico. Alógica do sintoma Somente os sintomas são passíveis de análises. É competência do analista transpor todos os impossíveis possíveis à condição de analisabilidade. Os sintomas são os representantes das representações do sujeito fixado em certos pontos dos estádios da organização sexual primitiva: autoerótica, homoerótica e heteroerótica, que afirma uma constituição subjetiva, inversamente a uma constituição objetivada. Alógica do sintoma Para abordar o simbólico é preciso considerar as repetições que marcam o dado de real, aquilo que traz em seu bojo o que está “fossilizado” no mesmo lugar, o que não cessa de não se escrever, inalterável. A parte da função imaginária a ser considerada na análise é justamente o que se revela como o mais automático e imutável na compulsão de repetição. Enfim O que Freud soube ler nos sintomas é que todos eles, com ou sem palavras, expressam algo estruturado e organizado como uma linguagem. E cabe ao analista investigar as bases que deram origem a uma dada organização com a finalidade de aumentar as condições de resilência para a permanência mais resistente de uma dada estrutura subjetiva. É a descoberta de Freud que dá vigor a uma aposta cada vez mais renovada para reiniciar novas aventuras psicanalíticas, ampliando cada vez mais o número de casos que testemunham a evidência de um tratamento possível, pela eficácia simbólica