T Vida e obra Robert Nozick nasceu em Nova York, em 1938, originado de uma família de russos emigrados, e faleceu em 23 de janeiro de 2002, aos 64 anos em Harvard. Graduou-se em Filosofia na Universidade de Columbia, onde participou como ativo militante de um pequeno partido político socialista. Na sua pós-graduação em Princeton, teve contato com as ideias neoliberais, inflectindo sua posição política: de militante socialista passou a defensor ardoroso do neoliberalismo. Vida e obra Foi em Harvard, como professor, que se tornou um ícone deste pensamento no mundo político, com a obra “Anarquia, Estado e Utopia” [1974]- objeto de pesquisa neste ensaio. Filiação ideológica: Nozick segue a matriz da escola conhecida como neoliberal, mais precisamente da libertariana, uma das suas correntes centrais. A defesa do Estado mínimo de Nozick segue uma tendência que começou em meados da década de 1940, com os escritos de Hayek. “Um Estado mínimo, limitado as funções restritas de proteção contra a força, roubo, a fraude, de fiscalização do cumprimento de contratos e assim por diante justifica-se; que o Estado mínimo é tanto inspirador quanto certo. Duas implicações dignas de nota são que o Estado não pode usar sua máquina coercitiva para obrigar certos cidadãos a ajudarem a outros e que não pode proibir atividades a pessoas que desejam realizá-las para seu próprio bem ou proteção.” (Nozick, 1991 [1974], p. 9) Contexto da publicação da obra Ano da publicação: 1974 objetivo: criticar dois modelos de Estado: o intervencionista; e o socialista de Estado A formação do Estado capitalista (séc. XVII, XVIII, XIX). O estado se apresenta como defensor do interesse geral da nação. Todos os indivíduos são iguais perante a lei. Fim dos limites ao livre comércio. 1ª fase do Estado capitalista: liberal o Estado de tipo capitalista, formado após as revoluções burguesas dos séculos XVII, XVIII e XIX, caracteriza-se pela defesa do livre comércio, da universalidade de suas instituições, franqueadas a todos os cidadãos, e como suposto representante do interesse geral. O grande diferencial deste modelo de Estado para os de tipo pré-capitalistas é a igualdade jurídica entre os cidadãos - todos são iguais perante a lei - mesmo em meio a grandes desigualdades econômicas e sociais; isto é, juridicamente, os desiguais econômica e socialmente são considerados como se fossem iguais. o liberalismo, como ideologia sustentadora e impulsionadora do capitalismo Defende e é bastante eficaz ao impor ao mundo uma nova característica ao Estado, uma nova organização do Direito, uma nova divisão social do trabalho e novas relações de produção, ao solapar as restrições feudais sobre a circulação de mercadorias, trabalho e capital, desempenhando, assim, um papel revolucionário, porque contra o sistema estabelecido. liberalismo Ao mesmo tempo, o liberalismo estimulou o crescimento das cidades e dos complexos urbanosindustriais. Enfim, ele impõe ao mundo uma mudança que busca apresentar-se como irreversível e nesse sentido tem-se mostrado bastante eficaz. A crise do modelo liberal: Acontecimentos mundiais do século XX que mudaram o papel do Estado: Duas grandes guerras mundiais; Crescimento do grau de politização da classe operária; Revolução Russa de 1917; Crise de superprodução de 1929. Além de criar direitos para os que vivem do trabalho, também é posta em prática uma política de inclusão de camadas subordinadas da população na institucionalidade por meio da participação eleitoral: o voto passa a ser universal e são retiradas algumas barreiras para a chegada ao poder por meio deste. Todavia, paralelamente, o Estado mantém a coerção sobre os segmentos sociais que não se subordinam ao poder do Estado capitalista. Estas políticas podem ser reduzidas em duas palavras: coerção e convencimento Quanto mais forte os sindicatos, mais direitos conseguem arrancar do Estado. Proporcionou a convivência pacífica ente Capital e Trabalho (somado a criação de partidos operários), o que fez a classe trabalhadora abandonar o objetivo da superação do capitalismo. Década de 1970 início da crise do capitalismo, sem o perigo da revolução social entra em processo o retorno do liberalismo (com seu papel original). Destruindo tudo que fez para impedir a revolução social, por exemplo, a flexibilização das leis trabalhistas no mundo. A obra de Nozick, portanto, é contra toda e qualquer idéia de justiça distributiva, de igualdade econômica e social, de coletivismo e de intervenção do Estado na economia ( contra as características do Estado camaleônico, socialismo, anarquismo e contra as idéias de John Rawls.) A obra de Nozick em questão está dividida em três partes. A primeira justifica a existência do Estado mínimo; A segunda alega que nenhum Estado mais amplo que o mínimo pode ser justificado; A última parte busca igualmente justificar o Estado mínimo. Toda a obra do autor tem o objetivo de legitimar o Estado mínimo e desqualificar qualquer outra forma de organização estatal. Objetivo do Autor Nozick através de análises dedutivas da história, explica a criação de agências de proteção e como estas evoluíram para o Estado. Toda sua obra tem por objetivo legitimar o Estado mínimo (por meio de argumentos ditos utópicos), justificando sua existência e alegando que qualquer existência de um Estado mais amplo é moralmente injusta e atenta contra a liberdade do indivíduo. Quatro postulados centrais: 1. a teoria da mão invisível; 2. a teoria do estado de natureza para justificar a existência do Estado; 3. a teoria do individualismo metodológico; 4. a desigualdade econômica e social como um valor positivo. Estas opções metodológicas dizem muito, pois trata-se de tendência majoritária da matriz explicativa liberal que, abstraindo os fatos concretos, busca reescrever a história estatal e social por meio de deduções racionais. Seu principal principio condutor é o da “mão invisível” como modo explicativo da história do papel do Estado, uma vez que assevera que os fatos são constituídos desprovidos de intencionalidade de indivíduos, grupos, frações de classe ou classes sociais. “As explicações da mão invisível minimizam o emprego de idéias que constituem os fenômenos a serem explicados. Em contraste com explicações diretas, não explicam modelos complicados, incluindo as idéias do modelo plenamente desenvolvidas como objetos dos desejos ou crença das pessoas. (...) Uma explicação da mão invisível mostra que o que parece ser produto do trabalho intencional de alguém não foi produzido pela intenção de ninguém” ( Nozick, 1974, p. 23). No resgate do estado de natureza lockeano, Nozick afirma que os limites da lei de natureza estabelecem que ninguém deve prejudicar a outrem em sua vida, liberdade e propriedade. Ele defende esses três direitos naturais para justificar a existência da propriedade privada. Cabe lembrar que, para Locke, a propriedade privada fora fundada pelo trabalho, pelo mérito, sendo portanto absolutamente legítima. Outro fator importante que o singulariza em sua época é asseverar que no estado de natureza já existia a propriedade privada que, por conseqüência, é elevada ao status de direito natural. “Individualmente todos resolvemos as vezes suportar alguma dor ou sacrifício por um beneficio maior ou para evitar maior dano. (...) Em todos os casos algum custo é incorrido em troca do bem maior. Por que não, analogamente, sustentar que algumas pessoas tem que arcar com alguns custos, a fim de beneficiar mais outras pessoas, tendo em vista o bem social geral? Mas não há entidade social com um bem que suporte algum sacrifício para seu próprio bem. Há apenas pessoas individuais,pessoas diferentes com suas vidas individuais próprias. Usar uma dessas pessoas em benefício das outras implica usá-la em proveito da demais. Nada mais. O que acontece é que alguma coisa é feita com ela em benefício dos outros. (...) Usar uma pessoa dessa maneira, além de indicar desrespeito, não leva em conta o fato de que ela é uma pessoa separada, que é sua a vida de que dispõe. Ela não obtém algum bem que contrabalance seu sacrifício, e ninguém tem o direito de obrigá-la a isso – e ainda menos o Estado ou o governo, que alegam que lhe exige a lealdade (o que os outros indivíduos não fazem) e que, por conseguinte, deve ser escrupulosamente neutro entre seus cidadãos.” (Idem, [1974] 1991, p. 48) A desigualdade é um fator positivo que não deve ser atacado. Ao contrário é a desigualdade que impulsiona o desenvolvimento, gerando por fim um bem-estar para todos. A propriedade privada é o tema central do pensamento de Nozick Importância da propriedade privada para a sociedade: Determinante nas relações de poder , de liberdade , de sobrevivência e de Estado. Para Nozick , a propriedade privada têm de ser protegida pelo Estado. É a sua existência que determina o progresso , o desenvolvimento da humanidade. Justificativas para a propriedade privada , segundo Nozick : Aquisição inicial das propriedades Transferência de propriedades de uma pessoa a outra Reparação da injustiça na propriedade Legitimidade da propriedade , segundo Nozick : A pessoa tem direito aos seus dotes naturais quando: 1-se pessoas têm direito a alguma coisa , elas têm direito a tudo que decorre dela 2-as propriedades das pessoas decorrem de seus dotes naturais Logo, 3-as pessoas tem direito as suas propriedades 4-se pessoas tem direito a alguma coisa , então devem tê-la “No Estado de natureza, a propriedade é adquirida de acordo com o principio de justiça na aquisição e desse ponto em diante , segundo o princípio de justiça na transferência por troca de propriedade possuída por outra , por serviços ,compromissos ou presentes” (Nozick,1974) Como justificar a desigualdade atual ,se as distribuições de propriedade feitas foram tão justas? Nozick se questiona a respeito das injustiças cometidas em relação a distribuição da propriedade ,mas não aponta soluções para o problema e comenta : “Não conheço um tratamento teoricamente sofisticado ou exaustivo dessas questões .(Nozick [1974] 1991, pág:173) A aparente isenção de Nozick : Toda sua obra foi marcada pela neutralidade,favorecendo a exploração. O objetivo de Nozick é encontrar a melhor forma de defender a propriedade privada . A punição e a compensação são cabíveis ao Estado: Pune-se aqueles que atentarem contra a propriedade e compensa-se quem de alguma forma sofre no pleno uso de sua propriedade. Formação segundo a concepção de Nozick; Anarquismo – Estado ultra mínimo – Estado mínimo; A legitimação do Estado mínimo; A naturalização do sistema capitalista. Concepções sobre o Estado “A fim de demonstrar que o Estado mínimo é moralmente legítimo, e que não é imoral em si, temos que provar que [as] transições [anteriores] (...) são moralmente legítimas. (...) argumentaremos que a transição do estado ultramínimo para o mínimo tem moralmente que ocorrer. Seria moralmente intolerável que as pessoas mantivessem o monopólio do Estado ultramínimo sem fornecer serviços de proteção a todos, mesmo que isso requeresse uma “redistribuição” específica.” (Nozick, [1974] 1991, p. 67-68) Contra o estado maior que o mínimo Total crítica contra o estado social democrata; Apologia ao individualismo; Idealização de que um estado mínimo diminui a desigualdade política. “Argumentamos na parte I que o Estado mínimo é moralmente legítimo; na parte II ,dissemos que nenhum Estado mais extenso poderia ser moralmente justificado, que qualquer um deles violaria (violará) os direitos do indivíduo. Vemos agora que esse Estado moralmente aprovado, o único moralmente tolerável, é o que melhor realiza as aspirações utópicas de incontáveis sonhadores e visionários. Ele preserva tudo o que podemos conservar da tradição utopista e abre o resto dela às nossas aspirações individuais”. (Nozick, [1974] 1991,p.357 ) O autor por meio de sua argumentação dedutiva, não leva em conta os acontecimentos históricos. Os pobres foram prejudicados com a criação das associações de proteção , logo elas não são moralmente justas. Quem não aderisse às tais associações (os independentes ) eram a maioria . “Se a criação das agências viola direitos de liberdade de outros que não encamparam o Estado , logo ela é injusta, imoral e não se justifica.” (p.474) É mais lógico que poucos tenham criado o Estado e imposto aos demais através da força. A obra de Robert Nozick se tornou um clássico do pensamento liberal contemporâneo. Ele nos leva a refletir sobre a função do Estado em nossa sociedade, a partir de suas deduções racionais e inteligentes, mesmo que não concordemos com as mesmas. Sua defesa intolerante do Estado mínimo, que significa um Estado sem compromisso com os pobres, com a forma de provimento do Estado, saúde, educação, e moradias gratuitas estão na ordem do dia, sem contar com as privatizações das estatais, a maneira de não interferência do Estado no mercado. O livro em questão, de 1974, ganhou mais destaque, associado a vários outros trabalhos intelectuais e a uma conjuntura especifica para enfraquecer os movimentos autônomos dos trabalhadores. Nas ultimas décadas podemos perceber que os meios de comunicação em massa, em todo o mundo, inclusive no Brasil, parece terem adotado suas teses. Podemos concluir então, que a sociedade em que vivemos hoje é um relato fiel do que Nozick descreveu uma sociedade com desigualdades extremas, com um Estado que não garante nem as necessidades básicas de sua população. Entretanto se pararmos para analisar, Nozick tem razão ao afirmar que o papel histórico do Estado (capitalista) não é de prover direitos aos trabalhadores, mas apenas de controlá-los.