EDMUND HUSSERL Edmund Husserl nasceu em Prossnitz, na Morávia, no antigo Império Austríaco (hoje Prostejov, na República Checa), em 8 de abril de 1859, e morreu em Freiburg, em 27 de abril de 1938. A fim de completar seus estudos de matemática, iniciados nas universidades alemãs, foi, em 1884, para Viena, onde, sob a influência de Franz Brentano, descobriu sua vocação filosófica. Em 1887, Husserl, que fora judeu, converteuse à Igreja Luterana. Ensinou filosofia, como livre docente, em Halle, de 1887 a 1901; em Göttingen, de 1901 a 1918; e, em Freiburg, de 1918 a 1928, quando se aposentou. Na raiz do pensamento de Husserl encontram-se as seguintes influências principais: Franz Brentano e, por seu intermédio, a tradição grega e escolástica; Bolzano, Descartes, Leibniz, o empirismo inglês e o kantismo. De acordo com Edmund Husserl, em sua obra Idéias para uma fenomenologia pura e para uma filosofia fenomenológica: introdução geral à fenomenologia pura, tem de se tomar os vividos puramente em sua essência própria. Depois de superadas as dificuldades iniciais, o campo de conhecimentos eidéticos se apresenta como um campo por toda parte infinito As diversidades, com suas composições eidéticas reais e intencionais é inesgotável e também os nexos eidéticos possuem diversidade, bem como as verdades apoditicamente são necessárias Esse campo infinito do a priori da consciência é importante para que se possa colher frutos valiosos. A dificuldade é o começo, e a situação incomum. O novo campo não se espraia ao nosso olhar com uma profusão de dados já destacados, que nos bastaria pegar nas mãos para estarmos seguros da possibilidade de torná-los objetos de uma ciência, não menos que do método pelo qual se deveria proceder. É diferente do que ocorre quando, em investigação independente, tentamos levar ainda mais adiante o conhecimento dos dados da orientação natural. Neles, tudo que é desconhecido é horizonte de algo conhecido. Todo empenho metológico se prende ao já dado, todo aprimoramento do método, a um método já existente; trata-se que se adaptam ao estilo já prefixado e estável de uma metodologia científica verificada e seguem esse estilo em suas descobertas. Quão diferente é na fenomenologia. Não apenas porque ela precisa de um método antes de todo método de determinação das coisas, isto é, de um método para trazer à apreensão do olhar o campo de coisas da consciência transcendental pura; não apenas porque nela é preciso desviar laboriosamente o olhar dos dados naturais de que não se cessa de ter consciência. A fenomenologia não tem apenas de desenvolver o método de obter novas espécies de coisas para novas espécies de conhecimentos; ela tem de proporcionar a mais perfeita clareza sobre o sentido e a validez desse método, que a capacite a rechaçar todas as objeções sérias A fenomenologia tem por essência de reivindicar o direito de ser filosofia “primeira” e de oferecer os meios para toda crítica da razão que se possa almejar; ela requer a mais completa ausência de pressupostos e absoluta evidência reflexiva sobre si mesma . Sobre aquilo que é metodologicamente determinante para a nova ciência, têm para a fenomenologia uma significação totalmente diferente daquela que esforços análogos poderiam ter para outras ciências . O autor coloca todo o mundo natural fora de circuito, pensando, com isso, obter uma consciência “pura”. A norma de redução fenomenológica, que vale para nossa existência empírica e que nos proíbe de registrar qualquer proposição que contenha, explícita ou implicitamente, tais teses naturais. O fenomenólogo, não procede diferentemente de qualquer investigador eidético, por exemplo, o geômetra. Em seus tratados, os geômetras não raro falam de si e de suas pesquisas; o sujeito que faz matemática, entretanto, não entra como parte no teor eidético das próprias proposições matemáticas. Exatamente o mesmo se dá na psicologia. Em todas as disciplinas que remetem a si mesmas há, sem dúvida, certa dificuldade, já que para a primeira introdução, assim como para a primeira incursão investigativa nelas, é preciso operar com meios metódicos auxiliares, aos quais só posteriormente elas terão de dar forma científica definitiva. Uma ciência eidética puramente descritiva têm de por diante dos olhos, exemplarmente, puros eventos da consciência, tem de trazêlos à clareza mais completa, para, dentro dessa clareza, analisá-los e apreender intuitivamente a sua essência, tem de perseguir os nexos eidéticos evidentes, formular o intuído em expressões conceituais fiéis, cujo sentido só pode ser prescrito puramente por aquilo que foi intuído ou foi visto com evidência em sua generalidade . Todas as análises reflexivas são análises fenomenológicas de essência. Nas novas é reflexões é preciso, portanto, poder sempre se convencer de que os estados de coisas expressos em enunciados metodológicos estão dados na mais completa clareza, de que conceitos utilizados se ajustam real e fielmente ao dado. O que foi dito vale manifestamente para todas as investigações metodológicas referentes à fenomenologia. As palavras empregadas podem provir da linguagem comum, podem ser equívocas e vagas devido a seu sentido variável . Nem tudo está feito com a mera aplicação da palavra fielmente ajustada à essência apreendida em intuição. Só é possível ciência onde os resultados do pensamento possam ser conservados na forma de saber e aplicados pelo pensamento posterior na forma de um sistema de enunciados, que são claros pelo seu sentido lógico, mas podem ser entendidos sem evidência. Ciência ao mesmo tempo requer providências subjetivas e objetivas para que possam ser estabelecidas suas funções adequadas e suas evidências atuais. As mesmas palavras e proposições sejam univocamente ordenadas e certas essências intuitivamente apreensíveis, as quais constituem o preenchimento do sentido delas. Nas línguas de validez geral há boas razões para evitar ao máximo os termos técnicos estrangeiros, diante das equivocidades do uso comum das palavras é preciso cautela e exame reiterado para saber se aquilo que foi fixado num contexto anterior é empregado no novo contexto efetivamente com o mesmo sentido. A cada vez se vislumbra numa obscuridade fugidia, em maior ou menor distância intuitiva, deve, pois, ser trazido à proximidade normal, à perfeita clareza, a fim de que a ele se apliquem valiosas intuições eidéticas. Há para cada essência, assim como para o momento individual que lhe é correspondente, uma proximidade, por assim dizer, absoluta . No caso da obscuridade total, pólo oposto da total clareza, absolutamente nada alcança a condição de dado, a consciência é uma consciência obscura, não mais intuitiva e, estritamente, não mais “doadora” no sentido próprio da palavra. A consciência doadora, no sentido forte, coincide com a consciência intuitiva, clara, por contraposição à consciência não – intuitiva obscura. O limite mínimo é a obscuridade; o limite máximo é a clareza, a intuitividade, o dado em sua plenitude. Se falamos de níveis de doação ou de clareza, temos de distinguir os níveis autênticos de clareza, à série dos quais se pode fazer seguir os níveis de obscuridade, dos níveis inautênticos de clareza, a saber, as ampliações extensivas do âmbito da clareza, com eventual aumento simultâneo da intensidade dela. Temos de lidar com gradações que se movem no âmbito em que o intuído é efetivamente intuível. A clarificação consiste, pois, aqui em dois processos que se vinculam um ao outro: nos processos de tornar intuitivo e nos processos de intensificação da clareza do já intuído. Com isso, está descrita a essência da clarificação normal. Pois a regra é que não há de antemão nenhum intuição pura, nem puras representações vazias se convertem em intuições puras; ao contrário, o papel capital dos níveis intermediários será desempenhado pelas intuições impuras. A apreensão perfeitamente clara tem a vantagem de permitir, por essência, uma identificação e diferenciação, uma explicação, referência, absolutamente indubitáveis e, portanto, a efetuação evidente de atos lógicos. Destes também fazem parte os atos de apreensão eidética. Os traços individuais que se intenta confusa e obscuramente buscar possam ser ressaltados e então trazidos à condição de dado o mais claro. Uma aproximação pode se efetuar em geral também na esfera de obscuridade. Aquilo que é dado a cada momento é as mais vezes rodeado por um halo de determinabilidade indeterminada, cujo modo de aproximação se faz por etapas, pela repetição em séries de representação: mais uma vez, primeiro na obscuridade e então de novo na esfera do dado, até que o intencionado entre no círculo de nítida luminosidade do dado perfeito. Seria exagero dizer que toda evidência da apreensão eidética requeira que as individualidades subjacentes estejam plenamente clarificadas em sua concreção. Para apreender distinções eidéticas mais gerais, como, por exemplo, a distinção entre cor e som, entre percepção e vontade, é suficiente que os exemplos tenham sido dados em nível mais baixo de clareza. A percepção externa possui clareza perfeita para todos os momentos objetivos, que nela entram efetivamente como dados no modo da originariedade. Ela, no entanto, oferece também com a eventual cooperação da reflexão a ela referida, individualizações claras e estáveis para análises eidéticas gerais de tipo fenomenológico ou até, mais especificamente, para análises de atos. A percepção externa além de muito mais acessível, não se esvai pela reflexão, nós podemos estudar, no âmbito da originariedade, a sua essência geral e a essência de seus componentes e de seus correlatos eidéticos em geral, sem despender esforços especiais para o estabelecimento da clareza. As livres imaginações conseguem uma posição privilegiada em relação às percepções, e isso mesmo na própria fenomenologia das percepções, com exceção, naturalmente, da fenomenologia dos dados de sensação. Na imaginação ele tem a liberdade inigualável de reconfigurar como quiser as figuras fictícias, de percorrer as formas possíveis em contínuas modificações e, portanto, de gerar um sem – número de novas construções .