O NOVO PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO Breve balanço do plano anterior; Principais problemas do Projeto de Lei n° 8035 de 2010; Principais batalhas que serão travadas. Quem serão os adversários e os aliados nesta batalha. PLANO NACIONAL ANTERIOR Apresentar uma breve avaliação do plano nacional de educação anterior é também avaliar os dois últimos anos de FHC e os dois mandatos de Lula. Passados dez anos o balanço não é muito positivo. Apenas um terço das metas foram cumpridas. Ele não serviu de base para as políticas governamentais. Conseguimos incluir 97,6% das crianças de seis a quatorze anos e 74,8% das crianças de quatro e cinco anos; Mas apenas 18,1% das crianças de zero a três anos frequenta a escola. Em 2001 tínhamos 9% de cobertura Os pobres são os menos incluídos e na maior parte em escolas comunitárias. Apesar de termos 85,2% dos jovens de quinze a dezessete anos na escola... Apenas 50,9% estão no ensino médio. E somente 29,6% dos jovens pobres conseguem esta façanha. Ainda temos mais de 14 milhões de analfabetos maiores que 15 anos de idade. Apenas 13,6% dos jovens estão numa instituição de ensino superior Além disso, este percentual é de apenas 7,7% entre os negros. A maioria das vagas estão concentradas nas regiões sul e sudeste e nas escolas particulares. Os atuais recursos educacionais não foram suficientes para provocar uma melhoria sensível na qualidade do aprendizado. O investimento público em educação representou em 2009 apenas 5% do Produto Interno Bruto. Em 2001 o país aplicava 3,9%. Vale lembrar que a sociedade civil defendia 10%, o Congresso aprovou 7% e o governo vetou este percentual. PROJETO DE LEI N° 8035 DE 2010 No final do ano o governo federal enviou ao Congresso o Projeto de Lei de novo Plano Nacional de Educação. Ele é composto de 12 artigos, 20 metas e 170 estratégias. Ao contrário do PNE anterior, este não veio acompanhado de um diagnóstico da situação educacional até 2010. O texto do novo PNE não possui, como regra, metas intermediárias. Fala-se muito no texto em regime de colaboração, mas pouco se efetiva as responsabilidades de cada ente federado. O texto governamental conseguiu a proeza de praticamente “sumir” com uma das principais inovações da CONAE, que foi o estabelecimento do Custo Aluno-qualidade como referência para o financiamento. Absorveu de maneira muito parcial as proposições aprovadas na CONAE. A parte mais fraca do texto é justamente a mais importante (financiamento). Meta 20: Ampliar progressivamente o investimento público em educação até atingir, no mínimo, o patamar de 7% do produto interno bruto do país. Essa proposta está aquém do aprovado pela CONAE e apenas reedita o que foi vetado há dez anos atrás. É impossível cumprir as metas previstas com um crescimento tão tímido dos recursos educacionais. Não está dito o quanto cada ente federado terá que contribuir para alcançar o crescimento dos recursos educacionais. Em audiência pública na Câmara dos Deputados (esta semana) o Ministro afirmou que “os 2% a mais de investimento público pagam a conta das metas que estão estabelecidas no plano”. Disse também que os organismos internacionais recomendam 6% a 8% do PIB. E chantageou os deputados dizendo que um percentual maior aumentaria a carga tributária. O ministro pode ter razão em relação a adequação dos 7% com as metas propostas. A lógica do PL 8035 é não estabelecer percentual de crescimento público nas áreas com menor cobertura escolar. Não há percentual de cobertura no ensino superior, por exemplo, onde a participação pública vem caindo e a responsabilidade é federal. Quando o plano discute a expansão do atendimento em creche, que hoje é de apenas 18%, mesmo que proponha expandir em 10 anos para 50%, a sua estratégia é via precarização do serviço. Estratégia 1.4: Estimular a oferta de matrículas gratuitas em creches por meio da concessão de certificado de entidade beneficente de assistência social na educação. Quando o plano discute o ensino profissional, demanda reprimida da juventude, novamente não há percentuais de expansão da rede pública. E há clara intenção de repassar a tarefa do crescimento para a iniciativa privada. Estratégia 11.6: Expandir a oferta de financiamento estudantil à educação profissional técnica de nível médio oferecidas em instituições privadas de educação superior. É verdade que uma inovação importante do atual plano é inserir o debate sobre a valorização dos profissionais da educação. A principal meta neste assunto é a de número 17. Meta 17: Valorizar o magistério público da educação básica a fim de aproximar o rendimento médio do profissional do magistério com mais de onze anos de escolaridade do rendimento médio dos demais profissionais com escolaridade equivalente. Além da meta utilizar o termo “a fim de aproximar “, não está dito qual percentual se quer alcançar em 10 anos. Dados divulgados pelo governo mostram que docentes recebem salários 65,4% do recebido por iguais profissionais. E nada se fala sobre apoio aos estados e municípios para que honrem este compromisso. O ministro falou de custo de 80 bilhões em dez anos (oito bilhões por ano). Isso representa apenas o crescimento vegetativo das receitas estaduais e municipais e da complementação da União no FUNDEB. Ou seja, o ministro acha que o dinheiro atual (e seu crescimento normal) será suficiente para cumprir as metas. Por isso propôs metas tímidas. Percentual do Investimento Público Direto em Relação ao PIB Níveis de Ensino Ensino Fundamental Ano Total Educação Básica Educação Infantil De 1ª a 4ª De 5ª a 8ª Séries ou Anos Séries ou Anos Iniciais Finais Ensino Médio Educação Superior 2000 3,9 3,2 0,3 1,3 1,1 0,5 0,7 2001 4,0 3,3 0,3 1,3 1,1 0,6 0,7 2002 4,1 3,3 0,3 1,5 1,1 0,4 0,8 2003 3,9 3,2 0,3 1,3 1,0 0,5 0,7 2004 3,9 3,2 0,3 1,3 1,1 0,5 0,7 2005 3,9 3,2 0,3 1,4 1,1 0,4 0,7 2006 4,3 3,6 0,3 1,4 1,3 0,6 0,7 2007 4,5 3,8 0,4 1,5 1,4 0,6 0,7 2008 4,7 4,0 0,4 1,5 1,5 0,7 0,7 2009 5,0 4,2 0,4 1,6 1,6 0,7 0,7 Percentual do Investimento Público Direto em Relação ao PIB Esfera de Governo Ano Total União Estados e Distrito Federal Municípios 2000 3,9 0,74 1,66 1,55 2001 4,0 0,76 1,68 1,61 2002 4,1 0,72 1,77 1,60 2003 3,9 0,66 1,62 1,59 2004 3,9 0,62 1,62 1,63 2005 3,9 0,65 1,56 1,68 2006 4,3 0,73 1,84 1,73 2007 4,5 0,80 1,86 1,78 2008 4,7 0,85 2,01 1,87 2009 5,0 0,98 2,05 1,95 Isso explica por que o custo aluno-qualidade sumiu do texto. A Campanha Nacional calcula que seria necessário aplicar 1% do PIB somente para elevar a maioria das escolas do norte e nordeste para um padrão mínimo de qualidade. Tão importante quanto o debate sobre o percentual de recursos públicos em relação ao PIB é o debate sobre de onde sairá o dinheiro. O ministro repetiu o eterno mantra da área econômica de sucessivos governos: para elevar os gastos sociais é preciso aumentar tributos. O que o governo não diz é que 44,9% dos tributos pagos pelos brasileiros são destinados a pagar e amortizar os encargos da dívida pública. Somente com pagamento amortização o Brasil repassou para credores e especuladores 380 bilhões de reais. Certamente 8 bilhões por ano é muito pouco diante deste número. Só é possível pensar em um plano nacional se ele estabelecer qual será a participação de cada ente federado no esforço nacional para melhorar a educação. Não é possível, por exemplo, imaginar que sem apoio federal e estadual os municípios conseguirão incluir 1 milhão e 500 mil crianças de 4 e 5 anos em apenas cinco anos. Pela enésima vez travaremos a batalha pelo ensino público como direito de todos. O embate será contra o modelo de expansão defendido pelo governo e contra as tentativas de liberalização propostas pelo setor privado. Em alguns temas a batalha será dura, como contra a expansão da educação infantil via escolas comunitárias. O tema do financiamento terá maior peso desta vez. Esta será a prin A possibilidade de unir diversos movimentos em defesa de um custo aluno-qualidade pode ser um fator novo interessante. E a valorização do magistério ganhou peso na redação do PL e certamente ocupará espaço no debate. ADVERSÁRIOS E ALIADOS O principal adversário é o governo federal, por que o principal protagonista e por que suas propostas privatistas possuem espaço na mídia e na base parlamentar; Os setores privados, que já anunciam a intenção de menos regulação e mais incentivo; O Movimento Todos pela Educação, que representa, digamos, “a sociedade civil empresarial”, que tenta se credenciar como a voz da sociedade. O fracionamento do movimento sindical e estudantil e a postura de corpo-mole de muitas entidades. A Campanha Nacional pelo Direito à Educação, que reúne 200 entidades (sindicais, populares, mistas e ONGs); O movimento pela rearticulação do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública; As entidades de secretários estaduais e municipais, pelo menos no que diz respeito ao reforço do caráter público do plano e no movimento de pressão sobre a União. No campo parlamentar teremos o principal suporte no PSOL e em alguns parlamentares de esquerda da base governista. Apesar da participação na CONAE ter dividido a esquerda, mas as suas deliberações serão um ponto importante de construção de pontes com outros setores. Garantir que a proposta de PNE seja discutida por todos os setores da sociedade. Garantir que além de metas o novo plano estabeleça fontes de recursos para executálas. Garantir que o Congresso Nacional aprove um conjunto de emendas que tornem o PNE expressão da vontade popular. Garantir formas de monitoramento do PNE, para que daqui a dez anos não estejamos avaliando apenas o seu descumprimento.