Artigo Original
Epidemiologia do trauma maxilofacial num hospital
universitário terciário da cidade de São Paulo
Epidemiology of maxillofacial trauma in a tertiary university
hospital of São Paulo city
Resumo
Abstract
Introdução: Nas últimas décadas, houve elevação dos acidentes
e da violência urbana nas grandes metrópoles. Dessa forma,
o trauma maxilofacial representa um importante problema de
saúde pública. Objetivo: Um estudo retrospectivo das fraturas
maxilofaciais tratadas de 2004 a 2007, num hospital universitário
terciário. Método: As informações obtidas dos prontuários foram
transcritas para um protocolo. Resultados: 591 pacientes foram
incluídos no estudo. A idade média da população estudada foi
de 31 anos, sendo que a grande maioria eram homens numa
proporção de 5:1. O fator etiológico mais comum foi a agressão
física (38,2%) e a grande maioria dos pacientes referiram algum
hábito ou vício. Entre todos os tipos de fraturas, a fratura de
mandíbula foi a mais prevalente (37,3%). O tempo médio decorrido
do trauma até o tratamento definitivo foi de 10 dias, com tempo
de internação médio de 6 dias. O traumatismo cranioencefálico
moderado e grave ocorreu em 4,9% de todos os traumas
maxilofaciais, com significativo número de fraturas panfaciais
neste grupo. A traqueostomia foi necessária em 12 pacientes,
correspondendo a 2% dos casos analisados. Ocorreram 52
complicações (8,8%). Destas, 06 foram complicações gerais (1%)
e 46 foram complicações locais (7,8%). Conclusão: Diferente
de outros estudos, o fator etiológico prevalente nesta casuística
foi a agressão física. E a indicação de traqueostomia foi para
pacientes com trauma maxilofaciais associados ao traumatismo
cranioencefálico.
Descritores: Epidemiologia;
Fraturas Maxilomandibulares.
Marcio Tadashi Tino 1
Flávio Alves de Andrade 1
Antonio José Gonçalves 2
Ronaldo Rodrigues de Freitas 3
Traumatismos
Maxilofaciais;
Introdução
O trauma maxilofacial representa um dos problemas
de saúde pública mais importante na sociedade contemporânea. Isto se deve pela elevada incidência e diversidade das lesões faciais1.
A crescente incidência, nas últimas quatro décadas,
tem ocorrido devido ao aumento dos acidentes de trânsi-
Introduction: In the recent decades, accidents and urban violence
had been increased in large metropolis. Therefore, maxillofacial
trauma is an important public health problem. Objective: A
retrospective study of maxillofacial fractures treated from 2004
to 2007, in a tertiary university hospital. Method: Data obtained
from medical records was transcribed to a protocol. Results:
591 patients were included in this study. The study population
average age was 31 years and the vast majority was men in a
proportional relationship of 5:1. Physical aggression (38.2%)
was the most common etiological factor, and the most of the
patients reported some inurement. Among all types of fractures,
fracture of the mandible was the most prevalent (37.3%). The
median time from trauma to definitive treatment was 10 days, with
hospital stay average of 6 days. The moderate to severe traumatic
brain injury occurred in 4.9% of all maxillafacial trauma, with a
significant panfacial fractures number in this group. Tracheostomy
was necessary in 12 patients, corresponding to 2% of the cases.
There were 52 complications (8.8%). Of these, 06 were general
complications (1%) and 46 were local complications (7.8%).
Conclusion: Different of others reporters, physical aggression
was the most prevalent in this study. Thacheostomy was indicated
in maxillofacial trauma patients with traumatic brain injury trauma
associated.
Key words: Epidemiology; Maxillofacial Injuries; Maxillary
Fractures.
to e da violência urbana, que continuam sendo as principais causas desses traumatismos em indivíduos jovens2.
Estudos em diferentes regiões geográficas têm
destacado as principais etiologias: acidente motociclístico3, 4, acidente automobilístico5,6,7,8 e as agressões físicas9,10,11.
O grande avanço no transporte da vítima de trauma
e a regionalização do atendimento nos centros de trau-
1) Especialista em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial. Ex-Residente do Setor de Cirurgia Buco-Maxilo-Facial da Irmandade da Santa Casa de São Paulo.
2)Doutor em Medicina. Área de concentração: Cirurgia Geral. Chefe da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
3)Doutor em Medicina. Área de concentração: Cirurgia Geral. Chefe do Setor de Cirurgia Buco-Maxilo-Facial da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
Instituição: Setor de Cirurgia Buco-Maxilo-Facial, Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço, Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
São Paulo / SP – Brasil.
Correspondência: Ronaldo Rodrigues de Freitas – Rua Dr. Cesário Motta Junior, 112 – Vila Buarque – São Paulo / SP – Brasil – CEP: 01221-900 – E-mail: [email protected]
Recebido em 10/05/2010; aceito para publicação em 09/07/2010; publicado online em 20/07/2010.
Confilto de interesse: não há. Fonte de fomento: não há.
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Epidemiologia do trauma maxilofacial num hospital universitário terciário da cidade de São Paulo. ma têm aumentado o número de tratamento de pacientes com fraturas complexas12.
Nos traumas com alta energia, as fraturas faciais
podem ocorrer isoladamente ou concomitante às outras
lesões do corpo7,13. Assim, a abordagem destes pacientes torna-se desafiadora, necessitando de uma equipe
multidisciplinar4,10,11,14.
Em consequência desta somatória de fatores, o trauma maxilofacial está frequentemente associado com alta
morbidade, com perda da função, desfigurações e significativo custo financeiro1.
Este trabalho tem como objetivo, realizar um estudo
retrospectivo dos casos de fraturas maxilofaciais, tratados por uma equipe de Cirurgia Buco-Maxilo-Facial de
um prontossocorro de hospital terciário.
Método
Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em
Pesquisa da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de
São Paulo, São Paulo-SP, Brasil (projeto número: 206/08).
O estudo baseou-se numa avaliação retrospectiva de
prontuários dos pacientes com fraturas de face tratados
no setor de Cirurgia Buco-Maxilo-Facial do Departamento
de Cirurgia da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia
de São Paulo, entre janeiro de 2004 e dezembro de 2007.
Neste período, foram atendidos no prontossocorro
adulto e infantil, 3.106 pacientes com trauma em região
maxilofacial. Sendo que destes, 675 tiveram necessidade de tratamento. Porém, 84 foram excluídos do estudo
por falta de dados nos prontuários.
As informações obtidas dos prontuários foram transcritas para um protocolo contendo os seguintes dados:
gênero, idade, raça, etiologia, topografia das fraturas,
forma de tratamento, tipo de anestesia, tempo médio de
internação, presença de traumatismo cranioencefálico
(TCE), necessidade de traqueostomia, consumo de drogas e complicações relacionadas ao tratamento.
Resultados
Dos 591 pacientes incluídos no estudo, obtivemos os
seguintes resultados:
Idade. A idade dos pacientes variou de 03 a 73 anos,
dessa forma, a idade média da população estudada foi
de 31 anos.
Gênero. A grande maioria, 496 pacientes, eram do
gênero masculino (84%) e 95 do gênero feminino (16%),
obtendo-se uma relação próxima de 5:1. Ambos os grupos tiveram maior prevalência na faixa etária entre 21 e
30 anos (226 pacientes) (Gráfico 1).
Raça. Nos diferentes grupos étnicos, a raça mais
prevalente foi a branca (73,5%), seguida da negra (25%)
e amarela (1,5%).
Etiologia. A agressão física foi o fator etiológico
mais comum tanto no gênero masculino quanto no feminino, correspondendo a 38,2%. Seguido dos acidentes
de trânsito (30,3%), queda (20,8%), acidente esporti140 R�������������������������������������������������������������
Tino et al.
Gráfico 1. Distribuição do trauma em face de acordo com a faixa etária
e gênero.
Tabela 1. Pacientes segundo o mecanismo de trauma e
gênero de 2004 a 2007.
Etilogia
Masculino
N
%
Agressão física
193
Acidente de trânsito 152
Queda
93
Acidente esportivo
37
Acidente de trabalho 16
Outros
5
38,9
30,6
18,8
7,5
3,2
1
Feminino
N
%
33
27
30
4
0
1
Total
N
%
34,7 226 38,2
28,4 179 30,4
31,7 123 20,8
4,2
41 6,9
0
16 2,7
1
6
1
* abreviação: N (número).
vo (6,9%), acidente de trabalho (2,7%) e outros (1,1%)
(Tabela 1). A agressão física foi observada na faixa etária
de 14 a 71 anos, com pico de incidência na faixa de 21 a
30 anos de idade (Gráfico 2). Nos acidentes de trânsito
(a segunda maior incidência), observou-se que 85% dos
pacientes eram homens, com pico de incidência na faixa etária de 21 a 30 anos (Gráfico 3). A queda, terceira
maior incidência, foi observada na faixa etária de 03 a 73
anos, com pico de incidência na faixa de 31 a 40 anos
de idade (Gráfico 4).
Hábitos e vícios. O grupo de pacientes com vícios
como tabagismo, etilismo e/ou uso de drogas ilícitas, correspondeu a 54,7% dos pacientes, superando o número de pacientes que negaram qualquer hábito ou vício
(45,3%) (Gráfico 5). Do primeiro grupo, 26,6% referiram
somente tabagismo, 20,7% o tabagismo e abuso do álcool, 12% declararam somente o uso de drogas ilícitas,
11,2% o uso de drogas ilícitas e tabagismo, 9% afirmaram
somente o etilismo, 1,6% o etilismo e uso de drogas ilícitas, e 18,9% dos pacientes referiram o abuso do álcool,
tabagismo e também o uso de drogas ilícitas. Dos 43,7%
dos pacientes que usam drogas ilícitas isoladas ou associadas ao etilismo e tabagismo, 87% são usuários de
crack e/ou cocaína e 13% de maconha (Gráfico 6).
Neste grupo, a idade dos pacientes com vícios variou de 15 a 68 anos (idade média de 34 anos), com
maior prevalência entre 21 a 30 anos (79 pacientes), no
gênero masculino (290 pacientes) (Gráfico 7).
Correlacionando os pacientes, de modo geral, na faixa etária entre 21 e 30 anos (226), com os pacientes na
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Epidemiologia do trauma maxilofacial num hospital universitário terciário da cidade de São Paulo. Tino et al.
Gráfico 2. Distribuição da faixa etária na agressão física.
Gráfico 3. Acidentes de trânsito acordo com a faixa etária e gênero.
Gráfico 4. Distribuição da faixa etária na queda.
Gráfico 5. Pacientes que referem hábitos ou vícios.
Gráfico 6. Pacientes que referem tabagismo, etilismo e uso de drogas
ilícitas.
Gráfico 7. Hábitos de vícios de acordo com a faixa etária e gênero.
mesma faixa etária, que referiram hábitos e vícios (79),
temos que 35% dos pacientes jovens afirmaram algum
hábito ou vício. E neste grupo, 51 pacientes referiram
etilismo (22,5%).
Topografia das fraturas. Dentre as fraturas de face,
a mais frequente foi a fratura de mandíbula (255 casos;
37,3%), seguido das fraturas de zigoma (153 casos;
22,4%), fraturas nasais (146 casos; 21,4%), as fraturas
tipo Le Fort (47 casos; 7%), fraturas de arco zigomático
(27 casos; 3,5%), fraturas fronto-naso-órbito-etmoidais
(22 casos; 3,2%), fraturas de órbita (19 casos; 2,8%), ferimentos extensos de tecido mole (8 casos; 1,2%), maxila
(7 casos; 1%) e frontal (1 caso; 0,2%) (Gráfico 8). Com
relação às fraturas de mandíbula, a região anatômica
mais acometida foi o ângulo mandibular (32,4%), seguido
da região de sínfise/parassínfise (28%), côndilo mandibular (20%), corpo mandibular (18,6%), ramo mandibular
(0,7%) e coronoide (0,3%) (Figura 1). As fraturas de mandíbula ocorreram isoladamente em 49,6% dos casos e
associadas a outros terços da face em 50,4% dos casos.
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Epidemiologia do trauma maxilofacial num hospital universitário terciário da cidade de São Paulo. Gráfico 8. Distribuição de acordo com a topografia das fraturas de
face.
Gráfico 9. Modalidades de tratamento.
Gráfico 10. Comparação entre cirurgias eletivas e de urgência.
Gráfico 11. Distribuição do TCE nas fraturas de face.
Modalidades de Tratamento dos 591 pacientes,
427 foram submetidos ao tratamento cruento (72,2%) e
164 ao tratamento incruento (27,8%). A maior parte dos
tratamentos (538 casos - 91%) foram realizados eletivamente e 53 casos (9%) na urgência.Além disso, 76,8%
das cirurgias ocorreram sob anestesia geral e 23,2% sob
anestesia local, como mostram os Gráficos 9 e 10. O
tempo médio decorrido do trauma até o tratamento cirúrgico definitivo foi de 10 dias, com tempo de internação
médio de 6 dias.
Traumatismo Cranioencefálico (TCE). O escore
da escala de coma de Glasgow foi utilizado como indicador de gravidade do TCE. Sendo que 94,4% dos pacientes sofreram TCE leve (Glasgow 14-15); 2,2% TCE
moderado (Glasgow 9-13); 2,7% TCE grave (Glasgow
3-8) e 0,7% não sofreram TCE (Gráfico 11).
Os TCE moderado e grave (4,9%) ocorreram principalmente no gênero masculino (96,6%), o principal fator
etiológico foi o acidente de trânsito (15 casos, 51,7%),
seguido de queda (8 casos, 27,7%), agressão física (5
casos, 17,2%) e acidente de trabalho (1 caso, 3,4%).
Com relação às fraturas de face, neste mesmo grupo
(TCE moderado e grave), ocorreram 15 fraturas panfaciais (51,8%), além de 6 fraturas de mandíbula isoladas
(20,7%), 2 ferimentos extensos de tecidos moles (6,9%),
2 fraturas de zigoma (6,9%), 2 fraturas FNOE (6,9%), 1
fratura de arco isolada (3,4%), 1 fratura Le Fort III isolada
142 R�������������������������������������������������������������
Tino et al.
Figura 1. Distribuição de acordo com as regiões anatômicas da mandíbula.
(3,4%). A incidência de fraturas de mandíbula associado
a outros terços da face foi de 41,4% (12 pacientes).
Com relação ao tratamento, o tempo decorrido da
data do trauma até a data da cirurgia variou de 0 a 64
dias, com tempo médio de 16,3 dias. O tempo de internação variou de 3 a 95 dias, com tempo médio de 22,4 dias.
Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v.39, nº 2, p. 139-145, abril / maio / junho 2010
Epidemiologia do trauma maxilofacial num hospital universitário terciário da cidade de São Paulo. Traqueostomia. A traqueostomia foi necessária em
12 pacientes, correspondendo a 2% dos casos analisados. A idade dos pacientes variou de 23 a 58 anos,
com idade média de 32 anos e a maioria dos pacientes
eram homens (11 casos, 91,7%). O principal mecanismo
de trauma foi o acidente de trânsito (7 casos, 58,4%),
seguido das agressões físicas (3 casos, 25%), queda
(1 caso, 8,3%) e mecanismo de trauma desconhecido
(1 caso, 8,3%). O tempo decorrido da data do trauma
até a data da intervenção cirúrgica variou de 0 a 64 dias,
com tempo médio de 17,5 dias. Um terço das traqueostomias foram realizadas na urgência e os dois terços
restantes foram eletivas.
Todos os pacientes traqueostomizados sofreram
TCE. Sendo 7 pacientes com TCE grave (58,3%), 2 com
TCE moderado (16,7%) e 3 com TCE leve (25%). Com
relação à topografia das fraturas, a grande maioria dos
pacientes sofreram fraturas complexas, sendo 8 fraturas panfaciais (66,7%); além de 2 fraturas de mandíbula
isoladas (16,7%), 1 fratura FNOE (8,3%) e 1 ferimento
extenso de tecidos moles (8,3%).
O tempo de internação variou de 5 a 60 dias, com
tempo médio de 30 dias.
Complicações. Ocorreram 52 complicações (8,8%).
Destas, 06 foram complicações gerais (1%) e 46 foram
complicações locais (7,8%). Das complicações locais, a
maior prevalência foi de infecção (18 casos; 3,1%), seguida de falha do sistema de fixação (11 casos; 1,9%),
sinéquias (4 casos; 0,7%), hematoma (3 casos; 0,5%),
deiscência de suturas (3 casos; 0,5%), epífora (2 casos;
0,3%); ectrópio (2 casos; 0,3%), outros (3 casos; 0,5%).
(Tabelas 2 e 3).
Discussão
Vários autores encontraram os acidentes de trânsito
como fator etiológico principal4,6,7,8,13,15,16. Em relação aos
acidentes de trânsito, nossos resultados estão de acordo
com os de Martini et al. em 20063, os quais encontraram
o acidente motociclístico como principal fator. No entanto, em nosso estudo, o fator etiológico mais comum foi
agressão física. A respeito deste fato, podemos especular que, apesar do prontossocorro do nosso hospital ser
referência para atendimento ao trauma para a Grande
São Paulo, um número expressivo dos pacientes que
atendemos são provenientes da área central da cidade.
Nesta região, encontram-se várias casas noturnas em
que há elevado consumo de drogas lícitas e ilícitas, que
geralmente resultam em brigas interpessoais. Dessa
forma, assim como Al-Khateeb & Abdullah, 20078 acreditamos que a etiologia do trauma depende de fatores
sócio-econômicos, culturais, geográficos, uso de drogas/
álcool e do período do ano.
Ao mesmo tempo, concordamos com estudos em
diversos países, os quais demonstraram uma tendência
de decréscimo dos traumas maxilofaciais por acidentes
automobilísticos. Isso tem ocorrido devido a implementação do uso obrigatório do cinto de segurança, diminuiRev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v.39, nº 2, p. 139-145, abril / maio / junho 2010
Tino et al.
Tabela 2. Complicações gerais.
Complicações Gerais (N = 6 / 1%)
N
%
Broncopnemonia
Óbito
Meningite
3
2
1
0,05
0,03
0,02
TOTAL
6
0,1
Tabela 3. Complicações locais.
Complicações Locais (N = 46 / 7,8%)
N
%
Infecção
Falha da Técnica
Sinéquia endonasal
Hematoma
Deiscência de sutura
Epífora
Ectrópio
Outros
18
11
4
3
3
2
2
3
3,1
1,9
0,7
0,5
0,5
0,3
0,3
0,5
TOTAL
46
7,8
ção dos limites de velocidade, aumento na frequência
da inspeção por itens de segurança, veículos modernos
mais seguros, e legislações contra abuso de bebida alcoólica 17,18,19,20.
Embora os traumas maxilofaciais tenham ocorrido
na faixa de 03 a 73 anos de idade, observamos que,
em ambos os principais fatores etiológicos já descritos,
o pico de prevalência das fraturas de face ocorreu nos
pacientes jovens, do gênero masculino, entre 21 e 30
anos de idade, o que está de acordo com a maioria dos
estudos3,4,8,10,16,20. Já as quedas foram mais frequentes
nos pacientes entre 31 e 40 anos de idade. Os acidentes
esportivos foram pouco frequentes, assim como os acidentes de trabalho.
O consumo de álcool parece ter uma associação importante na incidência das fraturas faciais10,20,21. Segundo
Lee et al. em 200720, houve envolvimento de consumo
de álcool em 87% das fraturas causadas por agressões
físicas e 58% nos acidentes de trânsito. Na nossa casuística, mais da metade dos pacientes (54,7%) declararam
algum hábito ou vício, dado que é compatível com o de
Mattos et al. em 201016. Apesar de existir diversos trabalhos correlacionando os fatores de risco sociais com as
complicações no tratamento das fraturas faciais22, 23, encontramos poucos trabalhos epidemiológicos que pudessem estabelecer uma correlação entre a incidência das
fraturas faciais com os fatores de risco social e etiologia
do trauma. Este achado nos estimulou a iniciar um estudo
prospectivo correlacionando o uso de drogas ilícitas com
as agressões físicas na incidência das fraturas faciais.
Estudos em diferentes países têm relatado redução
da proporção entre o gênero masculino e feminino. Esta
–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– 143
Epidemiologia do trauma maxilofacial num hospital universitário terciário da cidade de São Paulo. tendência foi atribuída ao fato que de que as mulheres
agora trabalham fora de casa, dessa forma, tornando-se
mais expostas aos riscos como os acidentes de trânsito
e outras causas das fraturas faciais24,25. Apesar da maior
independência conquistada pelas mulheres, a proporção
homem:mulher encontrada neste trabalho, de 5:1, mostra
que as mulheres em nosso meio, ainda se envolvem muito
menos em acidentes de trânsito e violência interpessoal.
A localização das fraturas depende do mecanismo
e intensidade do trauma20. Em nosso estudo, as fraturas mandibulares foram as mais comuns dentre todos
os tipos de fratura de face, dado que corresponde com
alguns estudos anteriores8,10,15,24,26. Em contrapartida,
outras casuísticas mostram maior frequência de fraturas
nasais4 e de zigoma9. Ao mesmo tempo, o ângulo mandibular foi a região anatômica mais acometida, no entanto,
foi menos frequente em outros trabalhos, em que o côndilo mandibular16, a sínfise4, 6 e corpo3 foram as regiões
mais prevalentes.
Para Patrocínio et al. em 20056, as fraturas de mandíbula ocorreram isoladamente na maioria dos casos.
Contudo, nosso estudo contraria este achado, já que
mais da metade das fraturas de mandíbula ocorreram
associadas a outros terços da face. Isso aconteceu por
provável impacto de maior intensidade no mecanismo de
trauma dos casos estudados.
As agressões físicas frequentemente resultam em
fraturas faciais isoladas, enquanto que acidentes de
trânsito resultam em fraturas faciais complexas e associadas a outras regiões, devido ao impacto em alta velocidade11, 20.
A frequência de lesões associadas às fraturas de
face podem variar entre 10,3%10 e 45%8. No entanto,
apesar de alguns trabalhos demonstrarem baixos índices, o tratamento destes politraumatizados continua a
ser significante e são fundamentais os cuidados multidisciplinares10.
No presente estudo a incidência do TCE moderado
a grave foi discretamente inferior ao relatado em outros
trabalhos, onde a mesma variou de 5,4%27 a 14%7. Segundo Haug et al. em 19925, as fraturas mandibulares
estão frequentemente associadas aos traumatismos cranianos, e além disso, fraturas do terço médio têm duas
vezes mais chance de causar fraturas cranianas e traumas neurológicos. O resultado deste estudo mostra que,
nos pacientes com TCE moderado a grave, uma minoria
teve fratura de mandíbula isolada. A maioria das fraturas de mandíbula estavam associadas aos terços médio e superior da face. Além disso, as fraturas panfaciais
ocorreram em quase dois terços dos casos. No entanto,
Pappachan et al. em 20067, correlacionando fraturas de
face e traumatismos cranianos, não encontrou este tipo
de associação. Isso porque a energia pode ser dissipada
nas múltiplas fraturas da face e assim, causando lesões
neurológicas de menor gravidade. Porém, os pacientes
que não sobrevivem do traumatismo craniano, frequentemente apresentam ou fratura isoladas do terço médio
ou combinações com outros terços da face28.
144 R�������������������������������������������������������������
Tino et al.
Com relação ao tratamento das fraturas de face, em
nosso estudo, a grande maioria dos casos, foram tratados de modo cruento, com utilização de placas e parafusos, e o restante de modo incruento, com utilização
do bloqueio intermaxilar, redução incruenta de fraturas
nasais e fisioterapia para recuperação dos movimentos
mandibulares nas fraturas condilares. A grande maioria das cirurgias foram realizadas de forma eletiva, sob
anestesia geral.
Concordamos com Follmar et al. em 200713, que a
presença de TCE associado pode atrasar o tratamento
das fraturas de face. Em nosso estudo, de modo geral,
o tempo médio decorrido do trauma ao tratamento cirúrgico definitivo foi de 10 dias, com tempo de internação
médio de 06 dias. Já nos pacientes com TCE moderado
a grave, houve um aumento tanto no tempo decorrido do
trauma até a cirurgia para 16,3 dias, quanto no tempo
médio de internação que subiu para 22,4 dias.
Segundo Holmgren et al. em 200729, as fraturas faciais são as principais causas do comprometimento da
via aérea, devido, em sua grande parte, ao sangramento
intenso. Em estudo retrospectivo, observaram alta incidência de fraturas de mandíbula e fraturas Le Fort III
nos pacientes que tiveram necessidade de traqueostomia. Porém, no presente estudo, todos os pacientes que
necessitaram de traqueostomia tiveram TCE associado,
sendo maior a incidência nos TCEs moderado a grave.
Neste trabalho o índice de complicações foi relativamente baixo quando comparado a outros estudos3,4,8.
Entretanto, devido a falta de padronização na conceituação das complicações nos estudos, é difícil estabelecer
comparações adequadas para as mesmas.
Conclusão
Este estudo possibilitou concluir que, diferentemente de outros trabalhos, o fator etiológico mais prevalente foi a agressão física. A indicação de traqueostomia
foi para pacientes com trauma maxilofaciais associados
ao TCE.
Referências
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Artigo 11 - Sociedade Brasileira de Cirurgia de Cabeça e Pescoço