POR QUE
0 PERIGO
Pelo menos 2 milh6es de clientes
da operadora de saude Unimed estao
em cooperativas problematicas. A de
Sao Paulo ja quebrou. Vem mais por ai?
TATIANA BAUTZER
PRESIDENTEDA OPERADORA DE PLANOS de
0
saude Unimed no Rio de
Janeiro, Celso Barros, e
figurinha facil no noticiario esportivo da cidade. Durante 16
anos, entre 1998 e 2014, a cooperativa
foi a maior patrocinadora do Flurninense, pagando at6 25 milhdes de reais por
ano ao clube. Tricolor confesso, Barros
aparecia nas comemora~desde titulos
e interferia nas contrataqdes. Era tanto
dinheiro investido pel0 executivo, e tanto tempo dedicado a causa, que a impresslo era que as coisas iam as mil
maravilhas para a Unimed Rio. Nada
disso. Mesmo sendo a maior das cooperativas que formam o sistema Unimed
no Brad, com 4,6 bilhdes de reais de
faturamento, a unidade do Rio teve prejuizo de 200 milhdes de reais em 2014.
As dividas chegarn a 1bilhb de reais e
fornecedores tiveram pagamentos atrasados no ano passado. Em dezembro, a
Unimed Rio cancelou o contrato com o
Fluminense. E, em maryo, sofreu intervenyiio da Ag6ncia Nacional de Saude
(ANS) - na pratica, funcionririos da
aghcia supervisionam o dia a dia para
conter eventuais danos. 0 atendimento
aos pacientes continua normal.
Com 20 milhdes de clientes em mais
de 300 cidades, e 112 000 medicos associados, a Unimed e a maior operadora de planos de saude do pais. Niio chega a s e n ~ ide
r consolo aos clientes cariocas, mas as dificuldades se repetem
em outras sete unidades da Unimed
B r a d afora. 0 maior exemplo, claro, e
a Unimed Paulistana, que quebrou no
fim de agosto, depois de quatro intervenqdes da ANS. Ate o fim de setembro,
a cooperativa tera de transferir seus
clientes para outra operadora. 0 mais
provavel e que a Unimed Fesp (Federac5o de S2o Paulo) ou a Central Nacional
Unimed assumam a carteira de 750 000
clientes. A Justiqa ordenou que, ate la,
os clientes sejam atendidos pela Central Nacional Unimed, que tem como
uma de suas funqdes justamente resgatar unidades em apuros. As cooperativas de Jequie e Paulo Afonso, na Bahia,
tambem estlo com ordens para transferir seus clientes, e as de Manaus e
Belem estCo sob intervenqlo. Em Manaus, cada medico cooperado contribuiu em 2014 com 2 4 0 0 0 reais para
cobrir deficits. As oito cooperativas sob
intervenqlo da ANS t@m2,s milhdes de
clientes, 12% do total da Unimed. Nem
sempre as intervenqbes resultam em
fechamento das cooperativas e, na
maior pane dos casos, como no Rio, o
atendimento nlo chega a ser afetado.
Mas, como o exemplo da Unimed Paulistana atesta, nada garante que a situaq50 se mantenha desse jeito.
E verdade que os resultados estlo .
ruins para a maior pane das operadoras
de planos de saude do pais. 0 s custos
com saude tem crescido 15% ao ano no
Brad, o que derrubou os resultados. A
maior delas, a Amil, teve prejuizo de
259 milhdes de reais no ano passado.Mas a complexa estrutura da Unimed
contribui para agravar a situapio. 0 s
presidentes slo eleitos pelos medicos
cooperados e brigas politicas entre os
g u p o s que disputam o poder slo comuns, como ocorreu em Slo Paulo. Um
conflito de interesses entre o medico e
a cooperativa tambem contribui para
que as margens sejam menores do que
na concorr0ncia. A Bradesco Saude e a
Sul America lucraram no ano passado
cerca de 6% da receita, ante 4% da Central Nacional Unimed. Para o medico,
quanto mais complexos os atendimentos, melhor. Para a cooperativa, quanto
maior a simplicidade, maior o lucro.
Em Slo Paulo, essa combinaqgo fez
com que a Unimed implodisse em setembro. Custos altos demais levaram a
operadora a lona. Naturalmente, comeqou ali a busca por culpados. EXAME
apurou que o antigo presidente, Paulo
Leme, que ocupava o cargo ate o ano
passado, e o atual, Marcelo Nunes,
acusam-se de malversaqlo de recursos.
Leme havia contratado como executivo
Augusto Cruz, ex-presidente da varejista Plo de Aqucar. Executivos proximos a Leme dizem que, na gestio dele,
as despesas cairam de mais de 100%
para algo proximo a 85% do total arrecadado em 2013. "Antes dele, tinha clinica ortopedica que apresentava conta
de 80 infiltraqdes em 40 pacientes",
conta um ex-diretor. "0s controles foram abandonados pela gestiio seguinte." Em nota, a administraqio atual
afirma que os indices de eficihcia
apresentados pela gestio anterior nio
eram reais. E devolve afirmando que
enviou ao Ministerio Publico provas,
obtidas em auditorias, de que a gestio
mterior pagava caro demais a fornecedores. 0 s executivos da atual gestio e
da anterior n b deram entrevista.
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Transformar uma empresa com essa
estrutura num negocio vihvel exige consenso entre os milhares de cooperados.
Eudes Aquino, presidente da Unimed
Brasil - entidade que funciona como
uma federaqiio nacional das Unimeds
-, comeqou em 2009 um projeto para
racionalizar a estrutura admini-strativa.
Ate agora, os avanqos s b pontuais e em
cooperativas que ja sio lucrativas. Nas
problematicas, a coisa so muda quando
a situaqio esta insustentavel. No Rio,
Barros mudou a equipe de gestio em
novembro de 2014, trazendo um vice-presidente da Amil, Alfredo Cardoso,
para controlar os gastos. A equipe cortou oito das 12 superintendSncias e demitiu 2 000 funcionarios. A maior fiscaliza@o reduziu o total de despesas
medicas de mais de 100% da receita,
no ano passado, para 83%, neste ano.
A medida mais importante, entretanto,
foi recorrer a Justiqa para liberar parte dos 350 milhdes de reais em reservas
tecnicas que ficam depositadas em
bancos (e sio usadas para pagar dividas em caso de quebra da operadora).
Foi com esse dinheiro que a Unimed
Rio pagou fornecedores, como os hospitais da Rede D'Or e o laboratorio
Dasa A aqio foi malvista pela ANS, que
decretou uma intervenqio para acompanhar de perto a recomposiq50 do
caixa da empresa. Executivos proximos a companhia dizem que os numeros devem melhorar ate o fim do ano,
com as receitas de um novo hospital
proprio na Barra da Tijuca, que custou
400 milhdes de reais e foi financiado
por divida bancaria (a Unimed Rio niio
p6de recorrer ao BNDES porque tem
impostos em atraso). 0 investimento
no hospital e o atraso em sua constru$50 pioraram a situaq5o. Executivos
proximos a Barros defendem a construg5o do hospital e os contratos com
o Fhminense. "Quando o patrocinio
comesou, tinhamos 200 000 clientes e
hoje temos 1,1 milh5o", diz um diretor.
Barros e Aquino n5o deram entrevista.
Ha bons exemplos em que se inspirar.
As Unimeds que tsm bons resultados
absorveram cooperativas regionais,
simplificarrun suas estruturas e ganham
com a escala - elas tCm no minimo
700000 clientes. Constroem consensos
politicos entre os grupos de medicos e,
principdmente, controlam custos por
ter redes proprias de hospitais. A mais
avangada nesse modelo 4 a Unimed de
Belo Horizonte, que tem 80% do mercad0 na regi5o metropolitana, com 1,2
milh5o de clientes. A cooperativa tem
trCs hospitais e uma maternidade, alem
de 11 unidades de pronto-atendimento,
e esta construindo um hospital de 200
leitos em Betim. "Mais da metade dos
atendimentos de emergencia e um
quarto das internagdes s5o feitos na rede propria, o que diminui os custos", diz
o presidente da Unimed BH, Samuel
Flarn. Para reduzir fraudes e cobranqas
excessivas, a Unimed BH faz treinamentos para que os medicos se vejam
mais como donos do negocio do que
como prestadores de serviqo. No ano
passado, a cooperativa lucrou 166 milhdes de reais e distribuiu 11 000 reais a
cada um dos 5000 cooperados. E pouco, mas mostra uma saude financeira
rara no mundo Unimed.
A Unimed BH tem exportado alguns
de seus sistemas de gestlo para outras
unidades, como as d e Vitoria, Porto
Alegre e Curitiba, que tambem s i o lucrativas. As Unimeds de Campinas e
Vitoria t6m centros proprios de tratamento para cCncer e laboratorios. No
Parana e no Rio Grande do Sul, algumas cooperativas uniram-se numa
central de compras unica Uma medida
que a Unimed BH e que outras grandes
operadoras estio tentando adotar e
estabelecer um preqo fechado por tratamento - o que, em tese, incentiva os
hospitais a encurtar o tempo das internaqdes e, tambem, reduz os riscos. S5o
medidas esperadas ha algum tempo.
Mas, se o ocaso da Unimed Paulistana
provou alguma coisa, foi justamente
que nlo ha tempo a perder. H
NOS HOSPrCNS
APOS UMA AVALIACAO RECORDE DA EMPRESA
CARIOCA, INVESTIDORES CACAM HOSPlTAlS PEL0
PAIS. MAS CRlAR UMA REDE NAO SERA FACIL
nquanto as operadoras de
planos de saude sofrem para
pagar as contas, o mercado
de hospitais privados \w' e seu melhor momento no Brasil. 0 motivo
C uma transaqb fechada em abril,
I
na qual o fundo de private equity
Carlyle pagou 1,75 bilhfio de reais
por 9% da Rede D'Or, maior rede de
hospitais privada do pais, corn 24
unidades. Em seguida, o fundo de
Singapura GIC pagou 3,2 bilhdes de
reais por 15% do capital. Ou seja, a
rede foi avaliada em cerca de 2 0 bilhdes de reais. Desde entilo, respaldadas por uma mudanga na legisla$90 que passou a permitir capital
estrangeiro em hospitais, dezenas
de hospitais entre os 2 600 com fins
lucrativos sonham em receber urn
cheque bilionbio. Interesse niio falta: Fundos de private equity estrangeiros, como KKR e Advent, procuram alternativasde investimento.
E um grupo de empresas busca
compradores ou s6cios. Segundo
EXAME apurou, esi5o procurando
investidores o Santa Joana, de Recife; o grupo Vita, com trGs hospitais
(dois em Curitiba e um em Volta
Redonda, no Rio); o Sancta Maggiore, que pertence ao grupo de planos
de saude Prevent Senior e tem oito
hospitais na capital paulista; e tambem o hospital Siio Francisco, em
Ribeirb Preto. 0 s dois primeiros
contrataram os bancos Credit Suisse e Santander. 0 Sancta Maggiore
e o Siio Francisco negarn o interesse.
0 SantaJoana confirmou a informa@o. 0 grupo Vita niio comentou.
0 s hospitais atraem investidores
porque podem ter margem operacional de ate 30%,superior a media
das operadoras, de 15%. Mas o mercad0 e fragmentado e hospitais que
atendem muitos pacientes do Sistema ljnico de Saude podem ter
rentabilidade menor. Ganhar com
escala tambem 6 dificil porque ha
poucos grupos de grande porte no
pais. "Existem grupos com dois ou
tr& hospitais que aceitariam socios, mas os fundos teriam de fazer
o trabalho de criar redes maiores",
diz um executivodo setor. Integrar
hospitais 6 dificil, especialmente
para executivos que n5o siio do ramo medico. Querer repetir o sucesso da rede D'Or 6 bem mais fhcil do
que conseguir chegar la.
OS DOIS LADOS DA UNIMED
Quais srio, entre as 300 ~midadesda Unimed no Brasil, as que esttio em forma,
E as que sofrem com custos em aka e dividas difceis depagar
i EM DlFKUUlADE
SEH PROBLEMAS
BELO
HORIZONTE
.
1 mlihao
de cllentes
RiODE
lANEIRO
.l,2 m~lhao
de cllentes
Tern 80%do mercado local. Lucrou 166 rnilhdes
Tern 1bllhao de reaisde dividas e estd sob
de reais. cerca de 7% da receita, em 2014
j intervencao da Agencia Nacionai de Saude
CAMPINAS
- 795cllentes
000
E lucrativa e tem uma rede corn urn hospital de
orande uorte e laboratorios de analises clinicas
PAULISTANA
a
.750000
cllentes
Pediu 24000 realsaos medicos para pagar
i dividas e devesalr do nreluizo neste ano
APERTO GERAL
0 mercado deplanos de s d d e cresceu20%em2014,
mas as margens continuam apertadas
RECEITADASDUMAIORESOPERADORAS
(ern bilhhdes dereais)
:i LUCRODAS
DEZ MAIORESOPERADORAS
[em miih&s de reaisi
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Pelo menos 2 milh6es de clientes da operadora de saude Unimed