PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
PROGRAMA DE MESTRADO EM HISTÓRIA
DOUGLAS BALTAZAR GONÇALVES
NOS “LARES DA FAMÍLIA SIDERÚRGICA”:
A RÁDIO SIDERÚRGICA NACIONAL
DE VOLTA REDONDA (1955-1980)
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM HISTÓRIA SOCIAL
VASSOURAS/RJ
JANEIRO/2012
1
DOUGLAS BALTAZAR GONÇALVES
NOS “LARES DA FAMÍLIA SIDERÚRGICA”:
A RÁDIO SIDERÚRGICA NACIONAL
DE VOLTA REDONDA (1955-1980)
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-graduação em História Social, da
Severino Sombra, como requisito para
obtenção do título de Mestre.
Orientadora: Profª. Drª. Tatyana de Amaral Maia (USS)
VASSOURAS/RIO DE JANEIRO
JANEIRO/2012
2
UNIVERSIDADE SEVERINO SOMBRA
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
PROGRAMA DE MESTRADO EM HISTÓRIA
Douglas Baltazar Gonçalves
Nos “lares da família siderúrgica”:
a Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda (1955-1980)
Banca examinadora:
_____________________________________________________
Profª. Drª. Tatyana de Amaral Maia (USS)
(ORIENTADORA)
_____________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Surama Conde Sá
(UFRRJ)
______________________________________________________
Prof. Dr. Fernando da Silva Rodrigues
(USS)
3
Gonçalves, Douglas Baltazar
G5868l Nos “lares da família siderúrgica”: a rádio Siderúrgica Nacional de
Volta Redonda (1955-1980) / Douglas Baltazar Gonçalves. – Vassouras,
2012.
xi, 108 f. : il. ; 29,7 cm.
Orientador: Tatyana de Amaral Maia.
Dissertação (mestrado) - História, Universidade Severino Sombra, 2012.
Inclui bibliografias.
1. História social. 2. Rádio. 3. Companhia Siderúrgica Nacional. 4. Volta Redonda
(RJ). I. Maia, Tatyana de Amaral. II. Universidade Severino Sombra. III. Título.
CDD 306.09
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Central da Universidade Severino Sombra / Vassouras - RJ
4
Pequena caixinha que carreguei quando em fuga
Para que suas válvulas não pifassem
Que levei de casa para o navio e trem
Para que os meus inimigos continuassem a falar-me
Perto de minha cama, e para minha angústia,
As últimas palavras da noite e as primeiras da manhã
Sobre suas vitórias e sobre meus problemas
- Prometa-me não ficar muda de repente
(O dramaturgo alemão Bertolt Brecht fez um poema sobre o rádio, 1933.) 1
1
McLUHAN, Marshall, Os meios de comunicação como extensões do homem, São Paulo, Cultrix, 1979. p.
335
5
Aos meus pais pelo amor, vida e
educação, a minha esposa Bruna e a
minha filha Beatriz pelo incentivo e
exemplo e todos os familiares que
entenderam a falta de tempo durante
a realização da pesquisa.
6
AGRADECIMENTOS
A minha orientadora professora Doutora, Tatyana de Amaral Maia (USS), por assumir
como orientadora e acreditar na pesquisa e ter contribuído com sua competência para a
conclusão do mesmo.
A professora Doutora, Rosangela de Oliveira Dias, por ter orientado o trabalho durante
um período e sempre com críticas construtivas que colaboraram para a realização do trabalho.
Ao coordenador do Mestrado professor Eduardo Scheidt pela excelente condução do
curso, sempre preocupado com a realização de eventos e a participação dos alunos em eventos
internacionais, nacionais e regionais.
À secretária do mestrado Sandra Feijó pela sua generosidade e competência.
Aos companheiros do Centro Universitário de Volta Redonda (UniFOA) pelo
incentivo na minha capacitação no mestrado.
Aos amigos da minha turma do mestrado que contribuíram com suas experiências
durante o curso.
Aos amigos do Programa Dário de Paula pelo apoio durante as ausências no serviço
devido os estudos.
Agradecimento póstumo ao amigo Ronald Jarbas que foi funcionário da Rádio
Siderúrgica e que durante uma entrevista para a realização do mestrado me deu um cd com
diversos depoimentos gravados um dia depois de desativação da Rádio Siderúrgica Nacional
foi um material excelente que explorei durante a pesquisa.
Agradeço a todos os meus amigos e familiares pela força e paciência durante todo este
período.
7
RESUMO
Essa dissertação apresenta a história da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda.
A emissora que pertenceu a Companhia Siderúrgica nacional (CSN) e funcionou de 1955 a
1980 quando a empresa encerrou suas as atividades. A CSN utilizou a rádio como canal direto
de comunicação, com os metalúrgicos, através das produções de programas musicais,
reportagens, festivais, festas, radionovelas, transmissão de atividades esportivas e
inaugurações da siderúrgica. O objetivo central do trabalho é buscar entender o papel da
Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda nos “Lares da família siderúrgica”.
Palavras chave: rádio, CSN, rádio-empresa, Volta Redonda.
8
GONÇALVES, Douglas Baltazar. The history of Radio National of Volta Redonda steel (1955-1980). Msc
Dissertation, Master´s degree in Cultural History at the Universty Severino Sombra, Vassouras, Rio de Janeiro,
2012. 101p.
SUMMARY
This dissertation shows the history of the Radio Siderurgica Nacional of Volta
Redonda . This radio station belonged to Companhia Siderurgica Nacional (C.S.N.) and was
broadcast from 1955 to 1980 . C.S.N. used this radio station as a direct means of
communication with their employees through their productions of musical programming ,
news casting , festivals , party promotions , radio soap operas , the broadcast of sports events
and inaugurations events of the company. The main objective of this work is to search for a
better understanding the impact of this radio station in the homes of the company’s
employees.
Keywords: radio, CSN, radio company, Volta Redonda.
9
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 12
CAPÍTULO I – A EVOLUÇÃO DO RÁDIO NO BRASIL 1922-1955 ............................ 14
1.0 – O Rádio no Brasil ............................................................................................................ 14
1.1 – A Companhia Siderúrgica Nacional de Volta Redonda .................................................. 20
1.2 – A inauguração da Rádio Siderúrgica Nacional................................................................ 24
1.3 – A estrutura da Rádio Siderúrgica..................................................................................... 26
1.4 – O Trabalhismo e a Rádio CSN ........................................................................................ 30
CAPÍTULO
II
–
INDÚSTRIA
CULTURAL
E
SUAS
IMPLICAÇÕES
NA
PROGRAMAÇÃO DA RÁDIO SIDERÚRGICA ............................................................... 30
2.0 – A discoteca da Rádio Siderúrgica .................................................................................... 46
2.1 – Bossa na Rádio Siderúrgica ............................................................................................. 48
2.2 – Trilha Sonora de Novelas na Rádio Siderúrgica ............................................................. 51
2.3 – Trilha Sonora de Filmes na Rádio Siderúrgica ................................................................ 51
2.4 – Os sambas enredo ............................................................................................................ 52
2.5 – Jovem Guarda .................................................................................................................. 52
CAPÍTULO III – Os TRÊS períodos da trajetória da Rádio Siderúrgica (1955-1965),
(1965-1979) E (1979-1980)...................................................................................................... 55
3.0 – O apogeu da Rádio Siderúrgica 1965 a 1979 ................................................................. 59
3.1 – .. Rádio Siderúrgica: a relação que a rádio pretendia estabelecer com os trabalhadores da
CSN ......................................................................................................................................... 64
3.2 – A divulgação do Governo civil-Militar na Rádio da CSN .............................................. 68
3.3 – Divisão dos departamentos da Rádio Siderúrgica ........................................................... 73
3.4 – A Rádio Siderúrgica e o esporte ...................................................................................... 74
3.5 – Os principais radialistas da emissora ............................................................................... 78
3.6 – O esvaziamento e o fim da Rádio Siderúrgica Nacional ................................................. 83
3.7 – A situação econômica do município de Volta Redonda .................................................. 85
3.8 – A trajetória da rádio e os impactos que podem ter contribuído para o fim da RS ........... 86
3.9 – O fim da Rádio Siderúrgica Nacional ............................................................................. 90
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 100
FONTES ................................................................................................................................ 102
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................... 103
10
RELAÇÃO DAS IMAGENS
Figura 1 –
Empresas Radiofônicas segundo ano de instalação ............................................ 19
Figura 2 –
Plano Geral da Usina e da Vila Operária de Volta Redonda, 1941 .................... 22
Figura 3 –
Sede da Rádio Siderúrgica Nacional no bairro Laranjal ..................................... 28
Figura 4 –
Discoteca da Rádio Siderúrgica Nacional ........................................................... 47
Figura 5 –
Imagem da portaria da Rádio Siderúrgica (março de 2011) ............................... 59
Figura 6 –
Militares fazendo discurso na Rádio Siderúrgica Nacional ................................ 69
Figura 7 –
Um funcionário da emissora mostrado uma porta cenográfica que era utilizada
para emitir o som durante as radionovelas .......................................................... 74
Figura 8 –
José Madureira na Rádio Siderúrgica Nacional .................................................. 78
Figura 9 –
Nélio de Andrade narrando uma transmissão esportiva direto do Recreio do
Trabalhador ......................................................................................................... 79
Figura 10 – Edward Gagana ................................................................................................... 80
Figura 11 – Ricardo André, locutor que fez carreira internacional ........................................ 81
Figura 12 – Uiara Araújo, ex-funcionário da Rádio Siderúrgica............................................ 82
Figura 10 – Sede da Rádio Siderúrgica Nacional ................................................................. 100
11
RELAÇÃO DAS TABELAS
Tabela 1 – Programação da Rádio Siderúrgica na Década de 1970 ........................................ 60
Tabela 2 – Programação da Rádio Siderúrgica até o ano de 1980 .......................................... 62
12
INTRODUÇÃO
Esse trabalho pretende construir uma história da Rádio Siderúrgica Nacional
entrelaçando a questão da rádio em si, como objeto de estudo, aos interesses da CSN e a sua
relação com os trabalhadores. A dissertação surge com o propósito de realizar uma análise
sobre fatos da Rádio Siderúrgica Nacional.
A história da Rádio CSN sempre esteve presente na minha trajetória pessoal e
profissional. Peço licença, as tradicionais normas acadêmicas, para pontuar minha própria
historicidade e com isso justificar a escolha do meu objeto. Conheci a história da emissora
ainda na adolescência. Meu pai, Dirceu Gonçalves trabalhou na emissora na década de 1960,
e sempre se lembra de episódios interessantes do convívio com os colegas de trabalho e com
os ouvintes. A partir do momento que comecei a conhecer os outros profissionais que também
trabalharam na emissora, esses discursos se tornavam complementares e às vezes repetitivos,
e isso foi muito interessante principalmente para a minha formação profissional. Fui
direcionado para seguir a mesma profissão do meu pai, Dirceu Gonçalves e do meu irmão,
Acrisio Gonçalves que são radialistas. Isso influenciou ainda mais a minha busca em conhecer
melhor a história dessa emissora. Em 2001, comecei a trabalhar em um programa de rádio, de
um ex-funcionário da Rádio Siderúrgica. Ele também sempre trazia fatos da Rádio
Siderúrgica e assim citava o nome da extinta emissora, várias vezes durante os 20 anos que
seu programa está no ar, fazendo um trabalho junto à memória sonora dos ouvintes da extinta
Rádio Siderúrgica. Em 2003, entrei para a faculdade de jornalismo, em seguida fiz pósgraduação em Comunicação Empresarial. Através do mestrado em História, o melhor tema
para a pesquisa tinha que seguir a trajetória dessa rádio.
Em alguns momentos, tenho curiosidade e vou visitar o antigo prédio da Rádio
Siderúrgica Nacional. Um local abandonado, onde vários serviços foram prestados a uma
comunidade durante 25 anos, e assim, sinto que de alguma maneira o campo da História pode
contribuir para divulgar a importância social dessa emissora para os ouvintes e exfuncionários naqueles turbulentos anos da História do Brasil.
O problema que me entusiasmou a realizar este trabalho foi essencialmente um
questionamento em relação aos discursos formados por ouvintes e radialistas da Rádio
Siderúrgica Nacional, que formam de alguma maneira o registro do período de funcionamento
da emissora, desde o ano 1955, quando foi fundada até o fim de suas transmissões, em 31 de
dezembro de 1980.
13
O principal objetivo desta pesquisa é analisar as especificidades da prática radiofônica
da emissora da CSN, emissora pública, vinculada a empresa Companhia Siderúrgica
Nacional, entre o período de 9 de abril de 1955 a 31 de dezembro de 1980. Este período é
marcado por várias transformações no modelo político e econômico brasileiro que
influenciaram a rádio durante sua existência. A política brasileira neste período pode ser
compreendida por dois grandes modelos teóricos: o trabalhismo presente nas décadas de 1950
e 1960; e o autoritarismo modernizador, marca da ditadura civil-militar (1964-1985). No
campo econômico, verifica-se a preponderância do nacional-estatismo durante todo o período.
Em nossa análise a emissora buscou exercer algum controle social, sobretudo, sobre os
operários da empresa, ao mesmo tempo, exposto e implícito, e constantemente veiculava os
valores éticos e morais, além do modelo de sociedade considerado ideal pela elite política e
econômica da região do Vale do Paraíba.
A emissora fez parte do cotidiano de vários volta-redondenses por ser um objeto
midiático com grande audiência na cidade. Quais as interações sociais que a emissora
estabeleceu com os trabalhadores? Qual a relação entre a rádio e a CSN? Como a rádio estava
estruturada? Quais eram os departamentos? Quais os principais radialistas, os principais
programas? A relevância da emissora para a sociedade? Quais os motivos para o fim das
transmissões da rádio? Os ouvintes ainda se recordam dessa emissora? A busca por essas
respostas estimularam a pesquisa. Essas indagações irão percorrer o trabalho para contribuir
como guia pela busca desses questionamentos.
A dissertação está dividida em três capítulos.
No primeiro capítulo faremos uma abordagem sobre a CSN e a questão do trabalhismo
no Brasil e as características da cidade de Volta Redonda. Em seguida apresentamos a história
da Rádio Siderúrgica Nacional.
No segundo capítulo, nos dedicaremos a compreensão da Indústria Cultural e a sua
influência na emissora da CSN, além de apresentar os principais estilos musicais foram
veiculados pelas emissoras, como Bossa Nova e Jovem Guarda.
No terceiro e último capítulo há um análise sobre o período de atividades da emissora
que foi dividida em dois momentos: de 1955 a 1965 sendo este de processos iniciais; e de
1965 a 1979 considerados os anos de consolidação e sucesso da emissora. Veremos qual a
relação que a CSN pretendia ter com os metalúrgicos através da emissora e de como o
Governo Federal divulgou seus interesses durante a programação da Rádio Siderúrgica. Por
fim, temos a questão do esvaziamento e fim da emissora com a apresentação dos possíveis
motivos que ocasionaram essa situação.
14
CAPÍTULO I – A EVOLUÇÃO DO RÁDIO NO BRASIL 1922-1955
1.0 – O Rádio no Brasil
A criação do rádio no Brasil ocorreu graças aos serviços da empresa americana
Westinghouse Eletric and Manufacturing Company que realizou a primeira demonstração
pública de radiodifusão sonora em nosso país, a pedido da Repartição Geral dos Telégrafos.
Isto aconteceu na Exposição Internacional do Rio de Janeiro, em comemoração ao centenário
da independência, no dia 7 de setembro de 1922. Como havia uma concorrência entre
empresas americanas para a venda de equipamentos ao Brasil, a Wester Eletric também
colocou em seu estande no evento, com dois transmissores de 500 watts cada. Quem ganhou
esse processo foi a Westinghouse, empresa responsável pela primeira transmissão no país,
com 80 receptores. O som foi captado no Palácio do Catete e em outros pontos da então
capital. Alguns trechos de “O Guarani”, de Carlos Gomes foram transmitidos direto do Teatro
Municipal, além do discurso do Presidente Epitácio Pessoa. (FERRARETTO, 2000, p. 93). A
estratégia da empresa Westinghouse era inicialmente gerar o interesse nos brasileiros sobre o
rádio, para que a partir de então, fossem adquiridos os equipamentos necessários para a
implantação de estações de rádio no país, e esse objetivo foi alcançado.
O professor Edgar Roquette Pinto, em 1922, foi um dos cientistas que participou da
primeira transmissão de rádio no Brasil. Ele havia feito expedições em algumas regiões e
conhecia o grande espaço territorial do país. O professor logo viu que o rádio seria um meio
ideal de divulgação para as grandes dimensões da nossa terra. Roquette Pinto acreditava que o
rádio seria um excelente projeto de integração nacional. (PIMENTEL, 1999, p. 26).
Em 20 de abril de 1923, a Associação Brasileira de Ciências fundou a primeira estação
brasileira: Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, com fins científicos e sociais. Como ainda não
havia autorização no país para a transmissão de rádio, Roquette Pinto nomeou o Ministro da
Viação da época, Francisco Sá, para ser presidente de honra da Rádio Sociedade. Dessa
forma, rapidamente a liberação para aquisição de equipamentos foi aprovada, possibilitando à
emissora seu funcionamento de forma oficial. (PIMENTEL, 1999, p. 26).
Diversas emissoras do país se inspiraram na Rádio Sociedade2 para criar suas
programações, como destaca o autor Pimentel (1999):
2
Rádio Sociedade - Foi aí que surgiu o conceito de “rádio sociedade” ou “rádio clube”, no qual os ouvintes eram
associados e contribuíram com mensalidades para a manutenção da emissora. Com o intuito de criar uma
15
A Rádio Sociedade serviu de modelo para quase todas as emissoras de sua época, a
partir da criação do formato de rádios clubes. Sua programação não tinha,
principalmente nos primeiros anos, uma grande preocupação com a linguagem
radiofônica, o que podia ser explicado pelo caráter pioneiro do rádio nos anos 20. Os
programas jornalísticos, por exemplo, resumiam-se à leitura das principais notícias
dos jornais do dia, sendo que os textos não recebiam nenhum tratamento para a
transmissão radiofônica, e todas as pessoas envolvidas com a Rádio atuavam em
qualquer fase da produção. Nos primeiros anos da emissora, o próprio RoquettePinto, além de dirigir a Rádio, apresentava o “Jornal da Manhã” – programa onde lia
as principais notícias dos jornais matutinos – e palestras educativas. (PIMENTEL,
1999, p. 26).
A emissora foi gerenciada pela Academia Brasileira de Ciências, seus integrantes
pretendiam usá-la como instrumento para educar a população. Nesse centro renovado da
capital da República podemos acompanhar a implantação das primeiras estações fundadas no
Distrito Federal, lideradas pela Rádio Sociedade e sua proposta educativa. O modelo da Rádio
Sociedade seria adotado pelas estações instaladas tanto na capital quanto em outros pontos do
país, no ciclo pioneiro do rádio brasileiro, compreendido entre 1922 e 1932. Não por acaso,
essas emissoras incorporam ao nome a classificação de “clubes” ou “educadoras” sendo
mantidas pela contribuição mensal de seus sócios/ouvintes. (SAROLDI e MOREIRA, 1985,
p. 19).
Em outros países o rádio ganhava força e crescia. Em 1925, já existiam transmissões
regulares em 19 países europeus, na Austrália, no Japão e na Argentina. Podemos inserir
nesse contexto o Brasil, onde as primeiras transmissões regulares aconteceram em 1923.
Durante a década de 1920, no Brasil, 19 emissoras foram fundadas, o que pode ser
considerado um período de experimentação do novo veículo, que se estruturou em 1935, em
termos comerciais. Renato Ortiz (1993) enfatiza que o rádio passou período crescente no país,
devido o surgimento dos receptores em tamanho reduzido e mais em conta, o que favorecida o
fortalecimento. “A introdução dos rádios a válvula na década de 30, o que vem baratear os
custos de produção dos aparelhos e possibilitar sua difusão junto ao público ouvinte mais
amplo”. (ORTIZ, 1993, p. 39).
Maria Luisa Costa cita que “Em 1933, Roquette Pinto convenceu Anísio Teixeira,
Secretário da Educação, a fundar uma rádio-escola a ser mantida pela Prefeitura do Rio de
Janeiro, para servir de exemplo a outras no futuro” (COSTA, 2004, p. 4). Anísio aprovou a
idéia. Roquette emprestou-lhe equipamentos e funcionários da Rádio Sociedade e, devido esse
empenho, mais tarde a emissora passou a se chamar Rádio Roquette-Pinto. Em 1936, a rádio
emissora com fins educativos, Roquete Pinto define o seguinte slogan para primeira emissora do país:
“Trabalhar pela cultura dos que vivem em nossa terra e pelo progresso do Brasil” (HAUSSEN, 2003, p.125).
16
foi doada ao governo brasileiro, que a destinou ao Ministério da Educação e Cultura.
(DUARTE, 2008, p. 27).
O professor Roquette Pinto definiu que o veículo era um meio dinâmico e
imprescindível para a sociedade. Para ele:
O rádio é o jornal de quem não sabe ler; é o mestre de quem não pode ir à escola; é o
divertimento gratuito do pobre; é o animador de novas esperanças; o consolador do
enfermo; o guia dos sãos; desde que o realizem com espírito altruísta e elevado.
(ROQUETTE-PINTO citado por FERRARETTO, 2000, p. 97).
A previsão de difusão de conhecimentos pretendida por Roquette Pinto não foi
realizada de imediato, já que o rádio naquele instante era consumido somente pela elite
brasileira. Para manter a programação, as emissoras recebiam ajuda dos próprios ouvintes,
que entravam como sócios, eram divididos como agremiações, e com a mensalidade
contribuíam para manter as emissoras em funcionamento. Com programação de música
clássica e transmissões lítero-musicais, as emissoras além da contribuição de seus associados,
que pagavam uma taxa mensal, recebiam também doações de entidades privadas. O valor
pago para entrar como sócio da rádio sociedade era de cem mil-réis. (FERRARETTO, 2000.p
99). A programação das emissoras não era contínua, e os horários do dia não eram
preenchidos, havendo várias interrupções durante o período da transmissão. Os aparelhos
receptores eram poucos e o ouvinte tinha que pagar uma taxa de contribuição ao Estado pelo
uso das ondas (HAUSSEN, 2001, p. 23). O sonho roquetteano era atingir o espectador, não o
consumidor, com o ideal de promover a formação complementar do homem brasileiro, para o
exercício da cidadania. (DUARTE, 2008, p. 195).
A galáxia de Gutemberg foi vencida pela galáxia de Marconi, o inventor do rádio. Era
a vez do meio de comunicação onipresente ser utilizado por diversos políticos para manter,
divulgar e criar idéias de poder nos ouvintes através das programações.
Marshall McLuhan em seu clássico Os meios de comunicações como extensões do
homem diz que “o rádio provoca uma aceleração da informação que também se estende a
outros meios. Reduz o mundo a uma aldeia e cria o gosto insaciável da aldeia pelas fofocas,
pelos rumores e pelas picuinhas pessoais” (MCLUHAN, 1964, p. 344). O ouvinte, receptor
das informações, atua como agente nesse processo de comunicação; afinal, na operação de
retransmitir o que ouviu, ele reinterpreta o conteúdo a partir da sua compreensão sobre os
fatos narrados. Foi seguindo essas características que o modelo americano de rádio guiou
diversos países que precisavam criar também um processo próprio de radiodifusão. Os
americanos tinham como base as agências de publicidade que exploravam todos os recursos
possíveis para transmitir seus anúncios. Sevcenko (1998) afirma que:
17
Foi nessa escola que se educou Franklin Delano Roosevelt. Breve ele aprendeu que
o que é dito no rádio vale mais pelas qualidades sensíveis da elocução da voz do que
pelo conteúdo do que é comunicado. (SEVCENKO, 1998, p.587).
Ainda sobre a forma de utilização do rádio pelo presidente americano o autor diz que:
Sua grande especialidade eram os discursos em estádios desportivos, com radiação
direta, em que à sua voz se agregavam os alaridos de adesão das multidões e as
ovações estrepitosas e unânimes. O Rio de Janeiro e o Brasil conheceriam o
fenômeno mais tarde, quando Getúlio Vargas viesse a tornar institucional a prática
da irradiação de sua voz dramatizada pela Rádio Nacional, nos discursos oficiais do
Estádio São Januário: “Tra-ba-lha-do-res do Bras-sil!...”. (SEVCENKO, 1998,
p.587)
O primeiro país a utilizar o rádio para fins políticos foram os Estados Unidos. O
período do governo de Franklin Delano Roosevelt, de 1933 até 1945 foi praticamente todo
repercutido pelo rádio, já que o presidente projetou seu carisma utilizando as técnicas de
comunicação para desenvolver seus processos políticos. O rádio já tinha sido utilizado nos
EUA para transmitir conteúdos políticos com o presidente Warren G. Harding (1921-1923)
eram mais de quatrocentos mil aparelhos. Quando Roosevelt se tornou presidente em 1932 o
número já chegava há oitocentos mil. Durante o período que foi governador de Nova Iorque o
presidente já utilizava o rádio a seu favor. (SCHWARTZENBERG, 1977, p.174 citado por
NUNES, p. 40). O presidente sabia que o rádio era um veículo forte que passava por cima das
leis estabelecidas pelos republicanos, pela imprensa escrita, e seria fundamental para
conquistar a opinião pública.
Durante os anos 1930 e 1940 no Brasil não era apenas o Estado o artífice das
tradições. As emissoras de rádio tinham um produto para oferecer a todo instante aos
ouvintes: os seus programas. Foi necessário adotar características específicas do meio e do
público para atender as exigências e ser aceito. Foi fundamental nesse momento fazer uma
programação para um público específico, e o processo de produção se adequou para
conquistar a audiência. O rádio abandonava a ideia de que a função dos meios de
comunicação era educar, estipulado por Roquete Pinto. O momento era de agradar, divertir,
distrair o ouvinte. César Ladeira3 destaca que o rádio “estava vencendo na sua finalidade de
agradar” e que “querer educar pelo rádio era bobagem”. (CALABRE, 1996, p. 89).
Em 1933, Ademar Casé lança o Programa Casé, que entrava no ar trazendo uma
inovação ao país. Sem intervalos comerciais o programa apresentava as atrações intercalando
3
Cesar Ladeira – César Ladeira ganhou fama nacional como locutor oficial da Revolução Constitucionalista de
1932, em São Paulo, através da Rádio Record. (ORTRIWANO, G. S. . A Informação No Radio - Os Grupos de
Poder e A Determinação dos Conteúdos. SAO PAULO: SUMMUS, 1985. 120 p.)
18
os anúncios durante as pausas das apresentações, isso conseguia manter a atenção do público
que não saia de perto do rádio. (CALABRE, 1996, p. 91).
A publicidade chega ao rádio através do decreto-lei, instituído por Getúlio Vargas, em
março de 1932. Com o crescimento da indústria brasileira e a inserção do anúncio
publicitário, a programação das emissoras sofreu alteração constante, já que esse processo
definiu uma ligação direta com a transformação do amadorismo para o profissionalismo, que
agora estaria subordinado há uma lógica do capitalismo. O entretenimento seria patrocinado
pelas organizações, que queriam investir nos programas de auditório, radioteatro, radionovela,
humor e radiojornalismo. (LAIGNIER E FORTES org. p, 82, 2009). Em algumas emissoras
como a Rádio Nacional, a produção de programas estava diretamente ligada aos
patrocinadores. Um dos exemplos é o noticiário Repórter Esso, patrocinado pela Esso
Distribuidora de Petróleo. Mas a credibilidade das produções era tão forte que mesmo os
programas patrocinados ganhavam respeito junto ao público. (CALABRE, 1996, p. 96-97).
Algumas novas modalidades de propaganda eram utilizadas para tentar conquistar o
público. Foi então que Ademar Casé criou o primeiro jingle da publicidade brasileira, que
anunciava o pão Bragança. O interessante é que para seguir a tradição, a melodia foi feita em
tom de fado para agradar o dono da pararia:
Oh, padeiro desta rua, tenha sempre na lembrança. Não me traga outro pão que não
seja o pão Bragança. Pão inimigo da fome. Fome inimiga do pão. Enquanto os dois
não se matam, a gente fica na mão. De noite, quando me deito e faço a minha
oração, peço com todo o respeito que nunca me falte o pão. (CASÉ 1955, p. 50
APUD LAIGNIER E FORTES ORG. p, 82, ano 2009).
O ano de 1936 marca o início da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, ela fazia parte do
grupo “A Noite” 4. Em um curto espaço de tempo a emissora alcançou bons índices de
audiência criando uma programação com atrações predominantemente populares. Sobre a
popularidade do rádio, o Cyro Cesar (2005) afirma que:
Entre os anos de 1930 e de 1950, o rádio possuía glamour, era considerado uma
espécie de Hollywood brasileira. Ser cantor ou ator de uma grande emissora carioca
ou paulista era o suficiente para que o artista conseguisse sucesso em todo o país,
obtivesse destaque na imprensa escrita e até mesmo freqüentasse os meios políticos.
(CESAR, 2005 p.187).
A separação de Herivelto Martins e Dalva de Oliveira era retratada pelas músicas do
casal, e o público acompanhava a história real acontecendo em cada instante da programação
das grandes emissoras da época (AGUIAR, 2007, p. 67).
4
O Grupo “A Noite” – reunia um grupo formado por jornais e rádio e ficava no prédio de mesmo nome na Praça
Mauá, no Rio de Janeiro. (HAUSSEN, 2001, p. 54, Porto Alegre, Edipucrs, 2ª Ed. 2001).
19
Na década de 1940, a discussão sobre como as emissoras de rádio deveriam guiar sua
programação é o questionamento que toma conta dos artigos de jornais e revistas da época.
Para isso, foi criado um processo participativo, onde a sociedade iria colaborar e ser mais
ouvida no processo de produção de conteúdo das rádios foi assim que a opinião pública
ganhou espaço nesse meio de comunicação. Mesmo com todas as normas e regulamentações
estabelecidas pelo Estado na década de 1940, o rádio conseguiu crescer e se consolidar como
importante meio de comunicação de massa no país. (CALABRE, 1996, p. 118).
No Brasil, a “Era do Rádio” se concentra entre os anos de 1945 e o final de década de
1950. Era a fase do surgimento dos aparelhos de rádio portáteis, o que facilitou o crescimento
da audiência das emissoras. A Rádio Nacional do Rio de Janeiro conseguiu criar um glamour
em sua programação. Os artistas que faziam sucesso na emissora conseguiam ser
reconhecidos em todo o país e constantemente recebiam propostas para ocupar até cargos
políticos. De 1945 até 1950 houve um crescimento acelerado do setor de radiodifusão
brasileira. As emissoras investiram em equipamentos que ampliaram o seu raio de alcance,
incorporando uma audiência maior a partir de transmissões em nível nacional. (CALABRE,
1996, p. 80- 81). Em 1955, foram inauguradas no Brasil 33 emissoras de rádio, entre elas, a
Rádio Siderúrgica Nacional, objeto de análise dessa dissertação (figura 1).
Fonte: Anuário Estatístico do IBGE
*Resultados obtidos por estimativa
Figura 1 - Empresas Radiofônicas segundo ano de instalação
20
1.1 – A Companhia Siderúrgica Nacional de Volta Redonda
Antes de iniciar a análise especifica sobre a história da Rádio Siderúrgica é
fundamental apresentar um panorama do processo de construção da Companhia Siderúrgica
Nacional, responsável pela criação e extinção da emissora. A Rádio era um braço da
Companhia e proporcionou uma aproximação entre a empresa e a população de Volta
Redonda e arredores.
A história de Volta Redonda surge com a negociação de Vargas com o governo
americano, como afirma Levine (2001):
Vargas apreciou a oportunidade de usar a neutralidade do Brasil para jogar um lado
contra o outro. Em maio de 1941, mandou telegrama a Hitler com “os melhores
votos de felicidade pessoal e de prosperidade para a nação alemã”. Durante os
acontecimentos que se seguiram a Pearl Harbor, ele manteve a pressão sobre os
Estados Unidos e obteve, em março de 1942, recursos do Export-Import Bank, em
Washington, para a criação da Companhia Vale do Rio Doce, a exploração de
minério de ferro e, em última instância, a geração de energia hidroelétrica. Também
foram concedidos 20 milhões de dólares para uma siderúrgica brasileira em Volta
Redonda, cidade industrial inteiramente planejada, símbolo da meta de
independência econômica almejada por Vargas. (LEVINE, 2001, p.113).
As obras da Companhia Siderúrgica Nacional, em 1941, previam também a construção
de uma infra-estrutura ao redor que fazia surgir uma nova cidade. As melhorias aconteciam de
forma planejada. A CSN nesse mesmo ano criou o corpo de bombeiros, um hospital
provisório e uma banda de música. (MOREIRA, 2000, citado por CORRÊA, 2006, P. 42). A
chamada cidade nova surgia e era conduzida pela siderúrgica, enquanto a parte velha, sem
nenhum tipo de planejamento, ficava por conta da administração da prefeitura de Barra Mansa
e enfrentava problemas de infra-estrutura. Volta Redonda recebeu mais de 11 mil operários
que trabalharam na construção da usina e se acomodaram na região conhecida como cidade
velha. Após a conclusão da obra da usina, uma parte dos operários foi aproveitada nas funções
criadas dentro da empresa, mas muitos trabalhadores foram demitidos com o fim da obra
gerando uma desordem em Volta Redonda. (MOREIRA, 2000, citado por CORRÊA, 2006,
p. 42).
Havia uma referência para diferenciar a cidade organizada e a outra parte que crescia
de forma irregular, a cidade velha era conhecida como Niterói, em uma menção a disputa das
cidades de Niterói e Rio de Janeiro, que faziam parte do estado da Guanabara. (CORRÊA,
2006, p.43). Enquanto a outra parte seguia os modelos de uma Vila Operária.
A CSN representou o avanço da produção industrial da região Sul Fluminense:
A Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), criada em 1941, na ditadura varguista do
Estado Novo, representou um estímulo à produção industrial fluminense, então em
21
declínio, convertendo o Vale do Paraíba num importante pólo industrial.
(PESSANHA; MOREL, 2001, p.278).
A cidade de Volta Redonda passou por uma intensa modificação em seu núcleo
urbano, entre os anos de 1942 e 1947. Corrêa (2008) comenta sobre o crescimento que ajudou
o desenvolvimento do distrito:
Foram instalados a primeira agência bancária da cidade, os clubes dos Funcionários,
o Hotel Bela Vista (de propriedade da CSN), o Aeroclube de Volta Redonda; e
foram criados a Cooperativa dos Empregados da CSN, a Associação Beneficente
Operária e o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e
de Material Elétrico de Barra Mansa, Volta Redonda, Resende e Barra do Piraí
(1945). (CORRÊA, 2006, p. 43)
No Brasil durante a década de 40, e principalmente nos anos 50 há “uma marca muito
especial, a da crença na transformação do presente com o objetivo de construção de um futuro
alternativo ao próprio presente” NEVES (2001, p.171) 5. Em Volta Redonda esse processo é
ainda mais forte com a presença constante da CSN, empresa que além de estimular a
economia local desenvolvia ações sociais para os seus operários. Por ser estatal, a CSN
auxiliava o governo que queria “implementar um projeto de nação comprometido
principalmente com o desenvolvimento social”. (NEVES, 2001, p.171). Neste processo, o
“trabalhismo” tornava-se uma estratégia política essencial, ao garantir ao Estado à
responsabilidade das iniciativas legislativas, sempre buscando preservar uma harmonia
política entre capital e trabalho.
Em 1950, a população de Volta Redonda passava de 30 mil habitantes. Ainda no início
dessa década, outras indústrias se instalaram na cidade: White Martins, Companhia de
Cimento Vale do Paraíba e Manufatura de Cimento Armado. Para que esse crescimento
populacional não acontecesse de forma desordenada, a CSN elaborou em 1954, um plano
urbanístico para a cidade (figura 2), prevendo que a população poderia chegar a no máximo
100 mil habitantes.
5
“Trabalhismo Nacionalismo e desenvolvimento: um projeto para o Brasil”. In Ferreira, Jorge (org). O
populismo e sua historio. Debate e crítica. Rio Janeiro, Civilização Brasileira, 2001.
22
Figura 2 – Plano Geral da Usina e da Vila Operária de Volta Redonda, 1941.6
A geração que surgiu na década de 1950 viveu sentimentos envolvendo uma série de
representações, Ferreira (2005) afirma que:
“o nacionalismo, a defesa da soberania nacional, nas reformas das estruturas
socioeconômicas do país, na ampliação dos direitos sociais dos trabalhadores do
campo e da cidade, entre outras demandas materiais e simbólicas encontrariam os
meios necessários para alcançar o real desenvolvimento do país e o efetivo bemestar da sociedade”. (FERREIRA, 2005, p. 119).
Sabemos que de alguma maneira não era a totalidade da população que seguia esses
padrões estabelecidos, mas a grande maioria tinha que conviver com a apresentação dessas
questões, desde o nacionalismo, até as propostas de reforma econômica e social. Para essa
população, João Goulart assumiria o posto de Getúlio Vargas como liderança do movimento
reformista. (FERREIRA, 2005, p. 120).
Os metalúrgicos de Volta Redonda foram os primeiros que lutaram pela redução ou
inserção de intervalo na carga horário de trabalho. Eles entraram com ações na justiça e
conseguiram, assim, criar uma linguagem para defender seus direitos contra aquilo que
consideravam os abusos da empresa. PESSANHA e MOREL (2001) relatam que:
O Sindicato dos Metalúrgicos de Volta Redonda foi o que pela primeira vez no
Brasil levantou a questão da incompatibilidade entre o sistema de jornada contínua
de 8 horas, em turnos de revezamento, e os princípios estabelecidos na CLT, com
referência a descansos para refeição e repouso. Em 1952, cerca de 3.000 operários
entraram com ação na Justiça do Trabalho, acusando a companhia de não cumprir o
Artigo 71 da CLT. Pleitearam como indenização pelos intervalos de repouso não
concedidos pela empresa o pagamento correspondente à importância do salário de
uma hora, referente a cada turno efetivamente trabalhado, por cada reclamante, nos
últimos dois anos. A questão foi ganha em segunda instância; a empresa, no entanto,
6
LOPES, Alberto Costa. A aventura da cidade industrial de Tony Garnier em Volta Redonda. Dissertação
(Mestrado em Geografia) – Instituto de Geociências, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ/PPGG), Rio
de Janeiro, 1993.
23
conseguiu que o sindicato retirasse a reclamação, mas, a partir daquele ano, a
cláusula passaria a vigorar em todos os acordos. O recurso à Justiça e a
reivindicação pela aplicação das leis teve no caso analisado uma importância que
não deve ser negligenciada: era através dessa linguagem de “direitos”, que
pressupõe um modelo de moralidade e de justiça, que os trabalhadores da CSN
procurariam romper o modelo autárquico de dominação, as regras arbitrárias da
direção da companhia e reivindicariam reconhecimento de cidadania. (PESSANHA;
MOREL, 2001, p.304-305).
Durante a realização de pesquisa achei no catálogo de áudios da Rádio Siderúrgica o
seguinte título “Curso e Interpretação da Legislação Trabalhista Brasileira, 15 de outubro de
1956” 7. Provavelmente esse foi o tipo de gravação que não deve ter sido divulgada para todos
os trabalhadores. Acredito que a empresa tinha algumas aulas gravadas para treinar outros
funcionários de temas de interesse da siderúrgica. Eles eram os líderes e formadores de
opinião que serviriam de propagadores dos interesses da empresa.
O avanço em todas as áreas em volta da siderúrgica era tão grande que o oitavo distrito
da cidade de Barra Mansa ficou cada vez mais independente. Foi a partir de então surgiu a
Sociedade Amigos de Volta Redonda que fez a primeira referência sobre a emancipação8, o
movimento ganhou força e mais tarde a Sociedade Amigos de Volta Redonda se transformou
em Centro Cívico Pró-Emancipação. Uma parte dos funcionários da siderúrgica apoiava a
emancipação, assim a direção da CSN queria deixar de ser a gestora da cidade, passando a
responsabilidade para a prefeitura posteriormente implantada com esse movimento.
(CORRÊA, 2006, p.43) Regina da Luz Moreira destaca a estratégia da CSN no processo:
Uma vez conseguida a emancipação de Volta Redonda, a empresa veria suas
responsabilidades para a cidade reduzirem. Conseqüentemente, poderia transferir os
recursos tradicionalmente empregados na manutenção de infra-estrutura e
equipamentos urbanos para sua própria atividade produtiva, ou seja, transformá-los
em investimentos. (MOREIRA, 2000, citado por CORRÊA, 2006, p. 43).
Volta Redonda, por não ser ainda uma cidade emancipada até 1954, não recebia todos
os impostos da CSN. A prefeitura de Barra Mansa arrecadava os recursos cobrados da usina e
convertia os investimentos para o município-sede. Com isso, a localidade de Volta Redonda
enfrentava diversos problemas de infra-estrutura. O processo de emancipação se concretizou
em um plebiscito feito no dia 20 de junho daquele ano. Oficialmente, o município de Volta
Redonda foi criado no dia 17 de julho de 1954. No mesmo ano, em 3 de outubro foram
realizadas as eleições para prefeito e para a câmara de vereadores. O prefeito Sávio Gama
tomou posse no dia 6 de fevereiro de 1955, no Recreio do Trabalhador, e começava assim um
7
Essa gravação consta no catálogo da Fonoteca da Fundação CSN.
Emancipação – processo em que determinado(s) distrito(s) passam por um processo de municipalização,
deixando de ser Distritos e passam a ser um novo Município.
8
24
processo para a transferência das ações da CSN enquanto gestora do município. A partir de
então, a prefeitura deveria assumir toda a responsabilidade administrativa. (CORRÊA, 2006,
p.43).
Para o tabelião aposentado Dauro Aragão9 (2011) o período estatal foi quando a CSN
mais cuidou das questões culturais da cidade.
Naquele tempo a siderúrgica apesar de ser estatal, a siderúrgica cuidava muito bem
desse patrimônio artístico e cultural de Volta Redonda mesmo, não é como hoje.
Isso tudo me recorda um tempo áureo da siderúrgica, em que de fato, a comunidade
de Volta Redonda se resumia na presença da siderúrgica, na atuação da siderúrgica.
(ARAGÃO, Dauro. depoimento [12 de dezembro de 2011]. Volta Redonda, Rio de
Janeiro. Entrevista concedida pelo empresário tabelião aposentado nomeado em
1953 pelo governador Amaral Peixoto).
1.2 – A inauguração da Rádio Siderúrgica Nacional
O processo de instalação da Rádio Siderúrgica Nacional teve início com o interesse da
Companhia Siderúrgica Nacional a partir da concessão pública para a prestação de serviço de
radiodifusão, em Volta Redonda10, no Sul do estado do Rio de Janeiro, no ano de 1953.
Provavelmente, este processo foi facilitado porque a Companhia Siderúrgica Nacional era
uma empresa estatal, e tinha ligação direta com os setores do governo responsáveis pela
liberação de outorgas, para o funcionamento de emissoras de rádio. Esse interesse foi
registrado no Diário Oficial
11
de 17 de março de 1953, com o pedido autorizando o
funcionamento de duas emissoras, com os seguintes nomes: Rádio Clube de Volta Redonda e
Rádio Industrial de Volta Redonda LTDA, pertencentes à Companhia Siderúrgica Nacional,
na cidade de Barra Mansa. Nesse período Volta Redonda ainda era o 8º distrito do município.
9
Dauro Aragão - nasceu em Barra Mansa, Estado do Rio de Janeiro, em 1931, é empresário tabelião aposentado,
tendo sido nomeado oficial de registro civil em Volta Redonda aos 21 anos em 1953, pelo então governador
Amaral Peixoto, tendo em 1961 sido nomeado titular do Cartório do 1o, oficio de Volta Redonda, tendo exercido
outras atividades relacionadas a Justiça Estadual.Foi presidente da subseção da Associação dos Notários e
Registradores do Estado do Rio de Janeiro, presidente do Sindicato dos Notários e Registradores do Estado do
Rio de Janeiro, e Vice Presidente da entidade. Foi designado Secretário da Junta Apuradora do plebiscito para a
emancipação de Volta Redonda á época distrito de Barra Mansa. Foi secretário do MDB de Volta Redonda e
fundador do partido em Volta Redonda; secretário do extinto PSD de Barra Mansa em 1955; fundador e
presidente do diretório do PSB de Quissamã. Proprietário dos jornais "Jornal da Cidade" e "Ação" em Volta
Redonda e " O Sul Fluminense" em Barra Mansa. Recebeu inúmeras homenagens e honrarias entre elas Medalha
da Emancipação de Volta Redonda, Cidadão Quissamarense é sócio benemérito de diversas entidades. É
instituidor da Fundação Oswaldo Aranha, sendo membro Curador da entidade, sendo seu presidente de 1998 a
2001, de 2001 a 2006, e de reeleito para o mandato 2006 a 2010, tendo criado o Centro Universitário de Volta
Redonda - UNIFOA.
10
Volta Redonda – “ nome oriundo do acidente geográfico no Rio Paraíba do Sul que levaram os primeiros
habitantes a designarem a margem esquerda do rio. A outra parte, que é vista à direita, a partir da base do morro,
era designada por Volta Grande”. ATHAYDE, J . B. de. Volta Redonda através de 220 anos de História.. Rio de
Janeiro: Gráfica Lammert, Ltda, 1965. p. 11 .
11
Diário Oficial da União – número 4.616, terça-feira, dia 17 de março de 1953.
25
Apesar de ter conseguido a liberação com o governo para o funcionamento de duas
emissoras, a empresa decidiu utilizar apenas uma de suas concessões. A Companhia
Siderúrgica Nacional não utilizou os nomes das outorgas das duas emissoras e alterou o nome
para Rádio Siderúrgica Nacional12.
Oficialmente o município de Volta Redonda foi criado no dia 17 de julho de 1954,
após o plebiscito feito no dia 20 de junho de 1954. O prefeito Sávio Gama tomou posse no dia
6 de fevereiro de 1955, no ginásio do Recreio do Trabalhador13. Começava assim, um
processo para a transferência das obrigações da CSN, enquanto administradora do município,
a partir de então, a prefeitura deveria assumir toda a responsabilidade administrativa.
(CORRÊA, 2006, p.43).
Entre o período de liberação para o funcionamento da Rádio Siderúrgica Nacional e a
sua construção, ocorreu à emancipação do distrito de Volta Redonda. Ela seria um veículo
importante para estimular a formação de uma identidade da classe operária dentro do projeto
trabalhista e baseada no nacional-estatismo, se estendendo para os moradores da nova cidade.
O radialista Dário de Paula14 explicou sobre como a CSN foi convencida a montar
uma emissora de rádio própria para se comunicar com os trabalhadores de forma mais
eficiente:
A Companhia Siderúrgica Nacional foi convencida por um funcionário que era
auxiliar administrativo, Nazer Feres Themis, a colocar um meio de comunicação
para se comunicar com os trabalhadores de Volta Redonda. A Companhia
Siderúrgica Nacional era o centro das atenções em Volta Redonda e a cidade cresceu
em função da siderúrgica. Era o grande emprego, era o grande empregador da
cidade. A ação social da CSN era muito forte. E havia uma necessidade de
comunicação mais rápida com os trabalhadores. O Nazer convenceu a diretoria da
CSN a montar uma emissora de rádio. Conseguiu-se uma outorga, uma autorização
do Governo Federal, e a Companhia Siderúrgica que era uma estatal construiu um
prédio para fazer uma rádio para se comunicar com seus trabalhadores. (PAULA,
Dário. Dário de Paula. Depoimento [14 de julho de 2011] Volta Redonda, Rio de
Janeiro. Entrevista concedida pelo ex-funcionário de Rádio Siderúrgica Nacional de
Volta Redonda)
O chefe da Rádio Siderúrgica Nazer Feres Temes foi um dos funcionários mais
antigos da siderúrgica. Ele trabalhou na área de contabilidade da empresa. Depois no Rio de
Janeiro, em 1952, atuou no gabinete da vice-presidência da CSN. Nessa ocasião fez um curso
na Rádio do Ministério da Educação, antiga Rádio Sociedade, fundada por Roquette Pinto15.
12
A ZYP 26 – Rádio Siderúrgica Nacional fazia parte do Departamento de Comunicação da Companhia
Siderúrgica Nacional.
13
Recreio do Trabalhador – Complexo esportivo e de lazer criado pela CSN em 1951.
14
Dário de Paula – ex-funcionário da Rádio Siderúrgica, começou a trabalhar na emissora com 9 anos de idade.
15
Roquette Pinto - O professor Edgar Roquette Pinto, em 1922, foi um dos cientistas que participou da primeira
transmissão de rádio no Brasil. Ele havia feito expedições em algumas regiões e conhecia o grande espaço
26
Outro veículo de comunicação importante da empresa era o seu jornal oficial, “O
Lingote”, que fez uma reportagem especial sobre os dos 10 anos da Rádio Siderúrgica
Nacional.16
Houve uma tentativa de realizar uma emissora de rádio própria da CSN. Para isso, ela
capacitou um gerente que iria ser o coordenador da emissora. Durante as atividades da
emissora ela transferiu trabalhadores de outros setores sem nenhum tipo de critério de seleção
para executar funções que não eram compatíveis com as mesmas realizadas dentro da
siderúrgica. Buscaremos entender agora como foi pensada a estrutura da rádio empresa da
Companhia Siderúrgica Nacional de Volta Redonda.
1.3 – A estrutura da Rádio Siderúrgica
Iremos apresentar agora os setores administrativos da Rádio Siderúrgica Nacional. A
emissora fazia parte do Departamento de Radiodifusão da CSN. Cada área da usina de Volta
Redonda era dividida em departamentos. Isso funcionou também como modelo para o setor
onde foi organizada a estrutura da emissora.
Buscaremos explorar através da história oral em sua modalidade de trajetória de vida,
como contribuição no processo de investigação e produção de conhecimento sobre a Rádio
Siderúrgica Nacional. Para isso exploraremos a história oral conforme a definição de Janaína
Amado e Marieta Ferreira (2002):
A história oral poderia distinguir-se como um procedimento destinado à constituição
de novas fontes para a pesquisa histórica, com base nos depoimentos orais colhidos
sistematicamente em pesquisas específicas, sob métodos, problemas e pressupostos
teóricos explícitos. Fazer história oral significa, portanto, produzir conhecimentos
históricos, científicos, e não simplesmente fazer um relato ordenado da vida e da
experiência dos “outros”. (AMADO, Janaína & FERREIRA, Marieta de Moraes
(orgs), 2002, p. 17).
Sobre o papel do historiador oral buscaremos também da definição de Amado e
Ferreira (2002):
O historiador oral é algo mais que um gravador que registra os indivíduos “sem
voz”, pois procura fazer com que o depoimento não desloque nem substitua a
pesquisa e a conseqüente análise histórica; que seu papel como pesquisador não se
limite ao de um entrevistador eficiente, e que seu esforço e sua capacidade de síntese
e análise não sejam arquivados e substituídos pelas fitas de gravação (sonoras e
visuais). (AMADO, & FERREIRA, Marieta de Moraes (orgs), 2002, p. 17).
territorial do país. O professor logo viu que o rádio seria um meio ideal de divulgação para as grandes dimensões
da nossa terra. Para Roquette Pinto o rádio seria um excelente projeto de integração nacional (PIMENTEL, 1999,
p. 26)
16
O Lingote – meio de comunicação oficial da Companhia Siderúrgica Nacional
27
Alberti (1990, apud SILVA, 1998, p.118) define história oral como:
[...] um método de pesquisa (histórica, antropológica, sociológica, etc.) que
privilegia a realização de entrevistas com pessoas que participam de, ou
testemunharam acontecimentos, conjunturas, visões de mundo como forma de se
aproximar do objeto de estudo [...] Trata-se de estudar acontecimentos históricos,
instituições, grupos sociais, categorias profissionais, movimentos, etc., à luz de
depoimentos de pessoas que deles participaram ou os testemunharam.
Um ponto em comum no discurso tanto dos funcionários e ouvintes da emissora é
sobre as instalações da rádio. Ela impressionava pela estrutura física do prédio onde era a sua
sede. Os equipamentos utilizados para as suas transmissões também chamavam a atenção de
todos, sobretudo, pelos recursos proporcionados com o funcionamento de cada um nos
programas que eram apresentados. Dauro Aragão que foi ouvinte da emissora fala sobre o
prédio onde era a sede da emissora “Ela era um prédio muito bonito. Tinha uma clave de sol
do lado de fora desenhada pela siderúrgica” 17.
Dário de Paula18 enfatiza:
Detalhe interessante é que o prédio construído e inaugurado em 1955 para a Rádio
Siderúrgica Nacional foi modelo para todo o Brasil. Não havia no país um prédio
construído como foi o da extinta Rádio Siderúrgica no Laranjal. Todo planejado,
com estúdio de gravação maravilhoso, uma acústica fantástica. O arquiteto Glauco
que era funcionário da CSN e que projetou o prédio, não sei, acho que ele se baseou
na BBC de Londres, e fez um prédio que é moderno até hoje. Foi inaugurado em
1955, está todo acabado no Laranjal, foi comprado por uma igreja evangélica, mas o
prédio se reformado é moderno até hoje. (PAULA, Dário. Dário de Paula.
Depoimento [14 de julho de 2011] Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista
19
concedida pelo ex-funcionário de Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda)
Ambos os depoimentos registram a imponência do prédio construído para abrigar a
emissora, considerado um dos mais modernos do Brasil e utilizado como referência em outras
construções. A CSN fazia um alto investimento em suas instalações, proporcionando uma
estrutura adequada para a realização dos trabalhos. Esse investimento revela a importância da
rádio para a Companhia. O prédio receberia ouvintes para os programas de auditório, tietes se
alojariam na sua suntuosa entrada para aguardar a passagem dos artistas. O prédio funcionava
também como um cenário, cuja função cênica era demonstrar os padrões de modernidade
trazidos pela Rádio CSN à cidade.
Os empreendimentos da empresa seguiam um mesmo padrão. Isso se confirmou
também com a construção da Rádio Siderúrgica: a emissora recebeu todo o investimento
17
Dauro Agarão - (ARAGÃO, Dauro. depoimento [12 de dezembro de 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro.
Entrevista concedida pelo empresário tabelião aposentado nomeado em 1953 pelo governador A maral Peixoto).
18
Dário de Paula – ex-funcionário da emissora. Ele começou a trabalhar na rádio com 9 anos de idade.
19
DE PAULA, Dário. Dário de Paula: depoimento [14 de julho, 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro.
Entrevista concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda.
28
inicial necessário para a sua constituição e estruturação, através da compra do mobiliário e
equipamentos adequados para as atividades que seriam ali desenvolvidas.
O prédio da emissora (figura 3) foi planejado para atender toda a demanda do serviço
radiofônico executado pelos profissionais da rádio. As divisões dos setores e a acústica do
local eram algumas das preocupações para a construção do edifício.
Figura 3 – Sede da Rádio Siderúrgica Nacional no bairro Laranjal
Além de toda a estrutura da sede da rádio, a empresa explorava também outras áreas
de sua propriedade para realizar transmissões ao vivo. Um desses locais foi o ginásio do
Recreio do Trabalhador, onde aconteciam shows e atividades esportivas para os funcionários
da usina. Esse espaço se transformou em um auditório externo da rádio. Ainda sobre a
estrutura da emissora Alkindar Costa (2004) destaca:
A “Rádio Siderúrgica” funcionou na Rua 100 nº 01 - Bairro Laranjal, com uma
potência inicial de 100 watts na antena, aumentada mais tarde - 1977 - para 1.000
watts. Tinha uma área de 500 m2 e registrava 3 estúdios, 3 sono-técnicas, 1 sala de
rádiojornalismo, 1 oficina de rádio-técnica, 2 salas de redação, 1 sala de discoteca, 2
auditórios (sendo um na própria emissora e outro no Recreio do Trabalhador),
refrigeração central e grupo gerador de reserva. (COSTA, 2004, p. 433)
Mesmo em um período inicial, a emissora tinha dois geradores de energia,
equipamentos fundamentais para uma rádio, visto que se houvesse falta de luz, os geradores
eram acionados, permitindo a continuação da transmissão para os ouvintes que tinham
aparelhos receptores a pilha. É bem provável que emissoras particulares não tivessem esse
equipamento na época e a Rádio Siderúrgica possuía essa tecnologia por ser uma emissora de
uma empresa estatal com vultosos recursos financeiros.
29
Os comunicadores- radialistas20 da Rádio Siderúrgica afirmam que a emissora é uma
réplica da rádio BBC de Londres. Essa informação é confirmada também pelo catálogo 21 da
fonoteca22 da Fundação CSN. Nele há a informação, de que prédio da BBC de Londres serviu
de exemplo para a construção da sede da emissora de Volta Redonda. O Presidente da
Fundação CSN em 2009, Marcos Barreto registra “O prédio da emissora, alias, era um charme
à parte: inspirado na BBC de Londres, instalada no Alto Laranjal, com uma vista privilegiada
de Volta Redonda”.23
Também na edição de 1965 do jornal “O Lingote”, o educador Fernando Tude de
Souza24, afirmou que a Rádio Siderúrgica era “A maior pequena estação do mundo”.
25
Esse
comentário pode justificar porque os locutores que trabalharam na emissora sempre destacam
em seus depoimentos os diferenciais da estrutura da rádio. Além disso, a rádio manteve
intercâmbios regulares com a Rádio BBC de Londres, com o serviço Holandês de
Informações e com a organização das Nações Unidas. (O Lingote. Volta Redonda, 1965).
Dário de Paula, ex-comunicador da Rádio Siderúrgica, na década de 1960, fala sobre a
comparação dos estúdios da Rádio Globo do Rio de Janeiro e da emissora de Volta Redonda:
Eu me lembro que na década de 60 quando eu conheci a Rádio Globo, era na Rua
Irineu Marinho, no prédio do Globo, eu fiquei decepcionado, porque a Rádio Globo
era uma emissora fantástica, com uma audiência maravilhosa, líder de audiência no
Rio de Janeiro, no Brasil e tal, e não tinha as instalações da nossa rádio Siderúrgica
em Volta Redonda. (PAULA, Dário. Dário de Paula. Depoimento [14 de julho de
2011] Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pelo ex-funcionário de
Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda)
A Rádio Siderúrgica produzia conteúdo especialmente para a cidade, de forma
regionalizada, buscando uma fidelização de sua audiência, criando uma identidade específica
nos trabalhadores e estimulando hábitos culturais, através, por exemplo, da execução de
músicas clássicas e em outros estilos.
20
Comunicador Radialista - Constitui-se na figura central da programação de emissoras de radio em que
predomina a transmissão ao vivo. E o responsável pelo dialogo imaginário – e com dose significativa de
coloquialidade – estabelecido pela estação de radio com o ouvinte. Ate meados da década de 1960,
predominaram, no Brasil, conteúdos lidos ou interpretados, tendo como base a palavra escrita e, como
suporte físico, o papel na forma do roteiro. (Enciclopédia INTERCOM de comunicação. – São Paulo: Sociedade
Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, p. 313, 2010).
21
Catálogo da Fonoteca da Fundação CSN – reúne informações sobre a Rádio Siderúrgica, além de arquivar os
16 mil discos do acervo da emissora.
22
Fonoteca - refere o lugar de conservação de discos fonográficos — tal como discoteca que também nomeia
uma coleção de discos fonográficos — e o museu que conserva coleções de discos que apresentam valor
artístico, histórico. (ESTRELA, Edite, Dúvidas do falar português: consultório da língua portuguesa, volume 4.
Editorial Notícias, 1991, 276 páginas).
23
Catálogo da Fonoteca da Fundação CSN – reúne informações sobre a Rádio Siderúrgica, além de arquivar os
16 mil discos do acervo da emissora.
24
Fernando Tude de Souza – foi diretor da Rádio do Ministério da Educação.
25
Declaração do Jornal o Lingote de 1965, edição comemorativa de 10 anos da Rádio Siderúrgica Nacional.
30
Em Volta Redonda, pela primeira vez um veículo de comunicação ganhava força em
um contexto regional. Os ouvintes começavam a se habituar às músicas executadas e também
com os comunicadores. Eles viviam na mesma cidade e, por isso, falavam de assuntos de
interesse comum entre os funcionários da CSN. Diferente das outras emissoras da capital que
faziam uma programação que tinha o objetivo de alcançar um público mais amplo.
Em Volta Redonda, “os lares da família siderúrgica” tinham espaço cativo para os
aparelhos receptores de rádio. Eles serviam de divertimento nas horas de lazer dos
trabalhadores e seus familiares na cidade do aço.
A popularização dos aparelhos de rádio em Volta Redonda só foi possível pela
implantação do sistema de participação nos lucros e resultados, além do reembolso criado
pelo Clube dos Funcionários26, que parcelavam as compras de eletrodomésticos em várias
parcelas, facilitando assim a aquisição dos aparelhos de rádio. Isso ajudou a impulsionar a
compra de rádios e outros utensílios para a casa do operário. Além disso, muitas lojas
ofereciam desconto em folha para funcionários da CSN. Em 1954, ainda na administração de
Sylvio Raulino de Oliveira, então Presidente da CSN, foi implantado a contribuição extra no
mês de aniversário da empresa em abril. Era a participação nos lucros e resultados. A
chamada “girafa”
27
era quase um décimo quarto salário para o operário. O comércio
aproveitava a “girafa” e realizava promoções no aniversário da CSN.
1.4 – O Trabalhismo e a Rádio CSN
A Rádio Siderúrgica Nacional foi fundada em Volta Redonda, em 9 de abril de 1955.
Essa data marcava também as festividades dos 14 anos de atividades da Companhia
Siderúrgica Nacional. Durante a inauguração da emissora, o texto de abertura da programação
foi lido pelo primeiro locutor da Rádio Siderúrgica, o radialista José Madureira:
Entardece tranquilamente. Hoje pela primeira vez, foi ao ar a ZYP-26. Graças à
Deus e ao desejo de vencer foram corados de pleno êxito os nossos trabalhos. Nessa
hora de amor e confraternização humana. Dirigimos a virgem Maria nosso
pensamento. Pedindo a mãe do céu, que a Companhia Siderúrgica Nacional, e a
26
Clube dos Funcionários - O Clube dos Funcionários da CSN, foi o primeiro Clube Social Esportivo a ser
criado em Volta Redonda (19.02.1942).
27
Girafa - é como os moradores da região costumam chamar a Participação nos Lucros e Resultados (PLR) paga
anualmente pela Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) a seus funcionários. “No décimo aniversário de
privatização da empresa, a bolada surpreendeu: cada funcionário recebeu três salários a mais, totalizando 16 no
ano. (Termo disponível na reportagem “O Efeito CSN”, da Revista IstoÉ Dinheiro edição 296.) O termo “girafa”
também é apresentado por FERREIRA, A, Jorge. Org- (O Populismo e sua História - debate e crítica”. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.)
31
todos os nossos ouvintes que vibram nesta máquina gigantesca que é Volta
28
Redonda, de paz e espírito tão necessária, ao trabalho honesto e dignificante.
O texto inicial de inauguração da Rádio Siderúrgica valorizava o trabalho,
qualificando-o como honesto e dignificante. A partir do Estado Novo (1937-1945), houve
uma reorientação na forma de lidar com a questão trabalhista. Ao invés de ser um “caso” de
polícia, o operário-brasileiro se torna o centro das atenções do governo. As relações entre
Vargas e o trabalhador brasileiro seriam marcadas pelo trabalhismo, ou seja, pela negociação
constante entre Vargas e os trabalhadores urbanos. Como propõe Ângela de Castro Gomes,
“A importância e o papel do cidadão-trabalhador tinham assim uma dimensão
material comprovável nas numerosas e variadas iniciativas desencadeadas pelo
Estado, tendo como finalidade precípua a criação e proteção deste novo homem
brasileiro” (GOMES, 2005, p. 237).
Nota-se, ainda, nessa mensagem de abertura da Rádio Siderúrgica como havia a
preocupação de destacar a dimensão do trabalho da siderúrgica construída em Volta Redonda.
Esse discurso evidencia como diretoria da CSN realçava em suas cerimônias a importância da
empresa para Volta Redonda, que impressionava a todos. A CSN era o símbolo da
industrialização nacional. Temos também a figura do trabalhador-cidadão, que participa das
atividades sociais da empresa, através das atividades de lazer, da participação nos aniversários
da empresa, inaugurações e outras efemérides. Construir uma imagem da cidadania através do
trabalho foi uma preocupação constante da empresa.
A questão do trabalho como um patrimônio do país sempre era destacada na emissora.
Lucília de Almeida Neves afirma:
A conjuntura delimitada pelos anos 40 e início dos anos 60 foi caracterizada pela
crença de expressivos segmentos da sociedade civil brasileira de que a modernidade
só seria possível se apoiada em um programa governamental sustentado pela
industrialização, por políticas sociais distributivistas e por efetiva defesa do
patrimônio econômico e cultural do país. (NEVES, 2001, p.172)
A organização sindical funcionava nesse período como um recurso de métodos que
iriam disciplinar a classe trabalhadora. (Ibidem, p. 237) Em Volta Redonda, logo após a
instalação da CSN, foi instalado o Sindicato dos Metalúrgicos, sobre esse fato Bezerra (2006)
comenta:
A cidade de Volta Redonda foi palco de atuação de movimentos políticos e sociais,
por se tratar de uma cidade tipicamente operária onde foi implantada a maior usina
siderúrgica da América Latina na década de 1940, a Companhia Siderúrgica
Nacional (CSN). A inauguração da siderúrgica na cidade marcou o surgimento do
28
Trecho da nota de abertura da Rádio Siderúrgica lida pelo radialista José Madureira. O áudio foi extraído do
cd com depoimentos dos ex-funcionários da rádio Siderúrgica gravado em 31 de outubro de 1985, pelo radialista
Ronald Jarbas.
32
Sindicato dos Metalúrgicos, entidade sob a qual os trabalhadores se organizaram em
sua luta por melhores condições de trabalho e de vida. No período inicial, o
sindicato teve uma relevante participação política com disputas na direção entre
partidários varguistas (PSD) e os comunistas (PCB). Esta dinâmica de embates
perdurou até 1957, quando finalmente os comunistas conseguem vencer a eleição
para a diretoria do sindicato, o qual teve como marca a atuação combativa até o
29
golpe civil militar de 1964. (BEZERRA, 2006, p. 1)
Essa disputa pela diretoria do sindicato, com a posterior vitória das lideranças do PCB,
demonstra as limitações do ideário trabalhista predominante na Rádio CSN. O discurso
trabalhista divulgado pelas ondas da Rádio não eliminou as divergências políticas no seio do
operariado, cujo maior exemplo são as eleições para diretoria do sindicato. Com o retorno a
democracia e o pluripartidarismo, a presença dos partidos disputando os votos operários
demonstra a importância do operariado no jogo político.
No plano da gestão de trabalho, Volta Redonda também deve ser pensada no contexto
maior da legislação social estabelecida nos anos 1940. Pensamos o Estado Novo (1937-1945)
como um processo de incorporação de elementos constitutivos tanto da lógica do
empresariado quanto das lutas dos trabalhadores em um novo plano político, numa agenda
centralizada pelo Estado. (GOMES, 2005, p. 238).
Assim o Estado passou a instituiu uma ideologia de que:
Só o trabalho podia constituir-se em medida de avaliação do valor social dos
indivíduos e, por conseguinte, em critério de justiça social. Só o trabalho podia ser o
princípio orientador das ações de um verdadeiro Estado democrático, de um Estado
“administrador do bem comum”. (GOMES, 2005, p. 238)
Vemos fortemente a questão de valor que o trabalho30 tinha que ser transmitido. O
Estado criou formas de controlar a população através do conceito de todos fazerem parte de
uma grande família, e na CSN esse discurso era difundido por todos os seus veículos de
comunicação, seja o jornal ou em sua emissora.
Esta era uma nova forma de exercício do poder que, sem abdicar da soberania do
Estado – controle sobre o território -, suplementava-a com um controle sobre a
sociedade. Ou seja, com um controle que era fundamentalmente uma técnica de
construção do povo/nação como uma grande família, em que o Estado/presidente era
o pai/guia. (GOMES, 2005, p. 238)
29
BEZERRA, Aroldo et al. Operários Metalúrgicos de Volta Redonda: Sindicato, Igreja e Movimento
Comunitário Disponível em
m:http://www.rj.anpuh.org/Anais/2006/ic/Aroldo%20Bezerra,%20Fernando%20Pozzobon%20e%20Luria
n%20Endo.pdf. Acesso em 01 de Agosto de 2009.
30
Trabalho - No programa do apresentador Fernando Lucas todos os dias era reproduzida uma música que fazia
menção ao trabalho. “Amanheceu vou sair para a minha luta, mais um dia de labuta, pra ganhar dinheiro meu”.
(O áudio foi extraído do cd com depoimentos dos ex-funcionários da rádio Siderúrgica gravado em 31 de
outubro de 1985, pelo radialista Ronald Jarbas).
33
A “grande família” segundo o governo trabalhava para o progresso do Brasil. A ideia
de família substitui a ideia da luta de classes, tão propagada pelos representantes do Partido
Comunista, pela perspectiva da harmonia entre os operários e a empresa, todos empenhados
num único objetivo: trabalhar pelo desenvolvimento da nação. Em um dos anúncios sobre o
aniversário da CSN, projeta-se a perspectiva de que as atividades desenvolvidas pela empresa
geram o desenvolvimento para a cidade e para o país:
Dezesseis anos de luta pelo progresso do Brasil. Festejos da CSN. Dia 8 segundafeira, na quadra do Recreio do Trabalhador, às 20 horas, voleibol masculino, Volta
Redonda e Academia Militar Agulhas Negras. Vinte e uma horas, basquetebol
masculino, Botafogo do Rio e Toshiba de Porto Alegre. (FONOTECA Fundação
CSN. Gravação extraída dos arquivos da emissora da CSN).
Durante as décadas de 1950 e 1960 havia a necessidade de realizar o plano de
expansão da CSN. Para isso, seria necessário abrir novas vagas e ampliar a mão-de-obra
disponível, principalmente após a emancipação de Volta Redonda. Em um plano simbólico
divulgado pela empresa, Volta Redonda era o “Eldorado” que prosperava em emprego e bons
salários para os operários. A cidade de Volta Redonda era responsável pela geração de
empregos, mas o que geralmente não era destacado é que o trabalho era pesado e desgastante,
já que se tratava da produção de aço. Nessa época, o valor social do trabalho era questão
central. Era este o grande esforço do novo Estado Nacional. Ele enfrentava a questão social
não como uma questão operária, mas como um problema de todos os homens e todas as
classes, já que eram trabalhadores eram todos aqueles que produziam e que colaboravam com
seu trabalho. (GOMES, 2005, p. 238). A Rádio Siderúrgica Nacional pode ser definida como
um instrumento da CSN e do governo para divulgação de políticas sociais e difusão da cultura
do país.
34
CAPÍTULO
II
–
INDÚSTRIA
CULTURAL
E
SUAS
IMPLICAÇÕES
NA
PROGRAMAÇÃO DA RÁDIO SIDERÚRGICA
Para apresentar a discussão teórica sobre os meios de comunicação de massa31, iremos
buscar inicialmente a reflexão sobre o conceito de Indústria Cultural32 proposto por Theodor
W. Adorno e Max Horkheimer que em seus estudos abordaram as consequências do
crescimento do capitalismo tardio, e a formação de dominação social, dos meios “de
comunicação de massa”, por meio de uma estrutura para este processo, a Indústria Cultural:
Pois a cultura contemporânea confere a tudo um ar de semelhança. O cinema, o
rádio e as revistas constituem um sistema. Cada setor é coerente em si mesmo e
todos são em conjunto. Até mesmo as manifestações estéticas de tendências políticas
opostas entoam o mesmo louvor do ritmo de aço (ADORNO e HORKHEIMER,
1995, p. 113)
“Os meios de comunicação incluem todas as formas de comunicação mediada
através de canais mecânicos ou eletrônicos” (STRAUBHAAR E LAROSE, 2004, p.4). O
rádio conseguiu se transformar em meio de massa e unidirecional, por meio os avanços
tecnológicos (FERRARETTO, 2000, p.88). Straubhaar e Larose definem o termo
“Comunicação de Massa” como um processo de:
[...] um para muitos ou ponto a multiponto. Nesse caso, uma mensagem é
comunicada de uma única fonte para centenas ou milhares de receptores, com
relativamente poucas oportunidades para a audiência comunicar-se de volta com a
fonte (STRAUBHAAR E LAROSE, 2004, p.9).
Cyro Cesar (2005, p. 163) ressalta:
O rádio é um veículo de comunicação de massa que por meio de ondas
eletromagnéticas atinge um público numeroso, anônimo e heterogêneo. Sua
audiência é formada por um número considerável de ouvintes por ter a possibilidade
de atingir uma extensa área de cobertura. (CESAR, 2005, p.163)
Philippe Breton (2002) irá contribuir com o debate sobre a comunicação de massa,
quando apresenta as tendências sobre a transformação da sociedade tradicional para a
31
Meios de Comunicação de Massa - Marshall McLuhan definiu os “meios” como centrais no processo
comunicacional. Por isso afirma que “O meio é a mensagem. Isto apenas significa que as conseqüências sociais e
pessoais de qualquer meio, ou seja, de qualquer uma das extensões de nós mesmos, constituem o resultado do
novo estalão introduzido em nossas vidas por uma nova tecnologia” (MCLUHAN, 1964, p. 21). MCLUHAN,
Marshall. Os meios de comunicação como extensões do homem. São Paulo: Cultrix, 1969.
32
Indústria Cultural - Conceito apresentado por Theodor Adorno e Max Horkheimer (1947) para caracterizar as
indústrias da diversão e difusão de bens simbólico-culturais, veiculados por radio, televisão, jornais, revistas,
cinema etc. (Enciclopédia INTERCOM de comunicação. – São Paulo: Sociedade Brasileira de Estudos
Interdisciplinares da Comunicação, p. 683, 2010).
35
sociedade de massa33. A outra questão tenta colocar se realmente havia a totalidade do poder
dos meios de comunicação:
A partir dos anos 40, e durante quase vinte anos, os conhecimentos sociológicos
referentes ao fenômeno da mídia vão, assim, cristalizar-se em torno de duas grandes
correntes. A primeira, essencialmente crítica e articulada em torno de reflexões
sobre a “cultura de massa”, é mais filosófica e especulativa; ela se vale das grandes
tendências da sociologia européia do final do século XIX que descrevem a passagem
da sociedade tradicional para a modernidade e da “sociedade de massa”. A segunda
corrente centra-se no estudo empírico das “comunicações de massa” e tende por
meio do recurso aos cânones da pesquisa positiva e da análise dos resultados de
enquetes sistemáticas, a desmistificar a crença na idéia de uma “onipotência” da
mídia. (BRETON, 2002, p. 129 e 130)
Mesmo tendo uma emissora de rádio, a empresa não conseguia controlar a totalidade
dos operários pela programação da emissora. Thompson (1998, p.32) classifica o termo
“comunicação de massa” como “à produção institucionalizada e difusão generalizada de bens
simbólicos através da fixação de informação ou conteúdo simbólico”, por isso, não podemos
entender “massa” como sinônimo de quantidade. Na comunicação de massa, os produtos
estão disponíveis para um público aberto. Mas não justifica afirmar que comunicação de
massa é para todos, ou se todos serão atingidos de uma só vez, pelos ideais divulgados pelos
meios. Segundo Renato Ortiz (1994) o processo do desenvolvimento da Indústria Cultural no
Brasil buscava a integração cultural, e necessitava da ação de um Estado nacional, a união
desses fatores definia o surgimento de uma “sociedade de massa”.
A cultura de massa é um campo de transmissão de informações e entretenimento
através de símbolos, imagens e contextos do cotidiano e da vida imaginária, dessa forma,
serve de referência para a população que se identifica nas produções realizadas pelos meios de
comunicação. Teixeira Coelho (1998) afirma que a Indústria Cultural bloqueava a
subjetividade dos indivíduos, com graves consequências, como o entorpecimento dos
sentidos, a alienação e a reificação, isto é, a transformação dos seres humanos em objetos
(COELHO, 1998, p. 11).
Canclini (2003) define o termo cultura de massa:
Em meados do século falava-se em cultura de massa, ainda que logo tenha
percebido (sic) e que os novos meios de comunicação, como o rádio e a televisão,
não eram propriedade das massas. Parecia mais justo chamá-la cultura para a
massa, mas essa designação durou enquanto pôde ser sustentada a visão
unidirecional da comunicação que acreditava na manipulação absoluta dos meios e
supunha que suas mensagens eram destinadas às massas, receptoras submissas. A
noção de indústrias culturais, útil aos frankfurtianos para produzir estudos tão
renovadores quanto apocalípticos, continua servindo quando queremos nos referir ao
33
Sociedade de Massa - tem origens na história do pensamento político, além de componentes e correntes
bastante diversas: “trata-se, em suma, de um “termo guarda-chuva” de que, a cada passo, seria necessário
precisar a utilização e a acepção”. (WOLF, 2009, p. 23).
36
fato de que cada vez mais bens culturais não são gerados artesanal ou
individualmente, mas através de procedimentos técnicos, máquinas e relações de
trabalho equivalentes aos que outros produtos na indústria geram; entretanto, esse
enfoque costuma dizer pouco sobre o que é produzido e o que acontece com os
receptores. (CANCLINI, 2003, p. 257).
A Rádio Siderúrgica fazia sua programação voltada para a massa de operários da CSN,
e não para o público em geral. Essa segmentação pode ser uma das explicações para que a
emissora tivesse fidelização em sua audiência34. Não podemos pensar que essa audiência, se
transforma em controle ou manipulação, mas sim que a emissora tinha um nível de
popularidade considerável já que ficou no ar em 25 anos. É fundamental discutir o papel do
público nesse processo de comunicação. “A necessidade de se inserir na discussão do produto
cultural a categoria PÚBLICO CONSUMIDOR, sem a qual se torna incompleta a avaliação
do papel desempenhado por qualquer tipo de manifestação simbólica” (GOLDFEDER, 1980,
p.17). Para Gramsci, o público tem sim capacidade de decisão e escolha podendo assim,
estabelecer mudanças no processo de elaboração do produto cultural. (GOLDFEDER, 1980,
p.17). A produção radiofônica da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda
desempenhou funções junto aos processos sociais durante o período em que a mesma esteve
em funcionamento. Principalmente, no período inicial da implantação da emissora, na década
de 1950, houve a procura por parte da direção da emissora em estabelecer vínculos sociais
com o público-alvo, os trabalhadores da siderúrgica. “A instância cultural, propriamente dita,
ocuparia, desta forma, um espaço específico na reprodução das relações vigentes,
reelaborando, a nível das significações, um determinado sistema de dominação política”
(GOLDFEDER, 1980, p.13). Nesse sentido tentaremos explorar os campos de quem
dominaria a chamada Cultura Popular, que prevaleceu na programação da rádio. “A noção de
Popular encontra-se em Gramsci diretamente ligada à questão da ideologia das camadas
dominadas.” (GOLDFEDER, 1980, p.16).
Kischinhesvsky (2007) cita como o rádio e o cinema funcionou como bens simbólicos:
O rádio, assim como o cinema, mediou entre tradição e modernização, entre o
campo e a cidade, conservando o registro lingüístico de camadas sociais que neles se
reconheciam, se identificavam social e culturalmente e, assim, pela primeira vez
tinham acesso a um sofisticado mercado de bens simbólicos. (KISCHINHESVSKY,
2007, p. 22)
Theodor Adorno e Max Horkeimer definem o rádio como um veículo capaz de nivelar
as pessoas. No sistema de programação formulado pelos profissionais da rádio, os programas
34
Audiência - O conceito de audiência este intimamente relacionado ao modelo publicitário de financiamento
das indústrias culturais, típico da radiodifusão. (Enciclopédia INTERCOM de comunicação. – São Paulo:
Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, p. 108, 2010).
37
das emissoras teriam o mesmo objetivo, reproduzir canções, apresentar atrações, para
conquistar a audiência:
Democraticamente o rádio transforma-os a todos igualmente em ouvintes, para
entregá-los autoritariamente aos programas, iguais uns aos outros das diferentes
estações [...]. Não somente os tipos de canções de sucesso, os astros, as novelas
ressurgem ciclicamente como invariantes fixos, mas o conteúdo do espetáculo é ele
próprio derivado deles e só varia na aparência, sendo arbitrariamente aqui e ali
completamente definidos pela finalidade que lhes cabe no esquema (ADORNO e
HORKHEIMER, 1988 citado por SANTOS, 2004, p. 28).
Umberto Eco faz uma crítica aos teóricos da Escola de Frankfurt 35 Adorno e
Horkheimer já que acredita que os ouvintes não são iguais e que podem sim escolher o que
querem ouvir:
Pode-se simplesmente afirmar que o rádio, introduzindo novas modalidades de
audição musical e oferecendo, assim novos estímulos à sensibilidade, deu início a
novas possibilidades de uma arte com caracteres próprios, assim como a audição em
uma sala de concertos se opõe à audição toda, interior e imaginativa, mas nem por
isso menos válida, do musicista que lê uma partitura. Negada, pois, toda e qualquer
hierarquia de valores entre os vários tipos de audição, caberá, todavia, observar que
essas novas possibilidades estéticas podem ser fruídas diversamente pelos diversos
tipos de ouvintes. (ECO, 2006, p. 321).
Falando sobre as tipologias de ouvintes temos outro fator fundamental nas emissoras
de rádio que são as músicas. Nicolau Sevcenko36 afirma:
O acesso instantâneo à música, com todo o seu poder de alterar os estados
psicológicos e as disposições emocionais dos ouvintes, tornou-se logo o aspecto
mais contagiante e irresistível da audição radiofônica e a principal fonte de seu
poder de transformação cultural.” (SEVCENKO, 1998, p. 588).
Adorno e Horkheimer (1995, p. 114) conceituam que: “O cinema e o rádio não
precisam mais se passar como arte”. Eles estariam atuando como reprodutores de uma ordem
estabelecida, pela racionalização técnica da cultura. “A indústria cultural acaba por colocar a
imitação como algo absoluto” (ADORNO e HORKHEIMER, 1995, p. 123). Ou seja, a Rádio
Siderúrgica se encaixa nesse padrão porque sua programação era repetitiva, imitava outros
padrões, reproduzia diversas músicas, deixando assim de ser arte, aqui compreendida como
produção cultural marcada pela singularidade, e tornando-se um produto de massa dedicado
apenas ao entretenimento.
A crítica de Adorno e Horkheimer discorre sobre o nivelamento que a Indústria
Cultural faz da “arte diversão”, aquela mais massificada em reação à “arte genuína”,
35
Escola de Frankfurt - tomou como referência a estrutura da sociedade na qual surgem os produtos culturais na
sociedade de massa. Enciclopédia (INTERCOM de comunicação. – São Paulo: Sociedade Brasileira de Estudos
Interdisciplinares da Comunicação, 2010. v. 1; 18 x 25 cm, p.1127)
36
Nicolau SEVCENKO, História da vida privada no Brasil – República: da Belle Époque à Era do Rádio, vol.
3, p. 588.
38
desconectada dos interesses mercadológicos mais imediatos. Essa indústria fomentaria a arte
da massa, em forma de entretenimento. Dessa maneira:
A relação de predomínio do emissor sobre receptor é a idéia que primeiro desponta,
sugerindo uma relação básica de poder, em que a associação entre passividade e
receptor é evidente. Como se houvesse uma relação sempre direta, linear, unívoca e
necessária de um pólo, o emissor, sobre outro, o receptor; uma relação que
subentende um emissor genérico, macro, sistema, rede de veículos de comunicação,
e um receptor especifico indivíduo despojado, fraco, micro, decodificador,
consumidor de supérfluos; como se existissem dois pólos que necessariamente se
opõem, e não eixos de um processo mais amplo e complexo, por isso mesmo,
também permeado por contradições (BARBERO, 1995, citado por CURY, 2005, p
40)
Na Indústria Cultural, o método de produção é parecido com o modelo industrial
fordista (procedimento adotado nas fábricas de Henry Ford). A linha de instalação segue
normas de separação dos procedimentos da produção em massa. (ADORNO e
HORKHEIMER, 1995, p. 114) O mesmo método de repetição funcionava na emissora da
Companhia Siderúrgica Nacional. A programação tinha um perfil local destinado à massa de
trabalhadores da empresa, sendo assim, havia a repetição de temas do cotidiano dos ouvintes.
Umberto Eco (2006) fez o levantamento de questões para saber se o rádio, enquanto
veículo de reprodução musical teve efeitos positivos ou não junto ao público, para isso ele
questiona:
Terá o rádio, como instrumento de informação musical, tido efeitos positivos ou
negativos? – eis uma pergunta, que se integra num exame mais amplo de fatores que
se integra num exame mais amplo de fatores culturais, sociológicos, econômicos.
“Democratização da audição”, “difusão de repertório”, “encorajamento da audição
direta de concertos” são contrabalançados por um bloqueio de atenção e por uma
política de conservação cultural (especialmente no campo da música ligeira, que visa
não renovar, mas a encorajar o gosto existente). Essa situação é conexa com as
particulares condições econômicas em que operam habitualmente os organismos
radiofônicos, submetidos a exigências comerciais ou – em regimes de monopólio – a
não louváveis concessões demagógicas (ECO, 2006, p. 319)
A Rádio Siderúrgica enfrentou alguns problemas iniciais, para se firmar como meio de
comunicação, na cidade de Volta Redonda. O seu primeiro diretor, Nazer Feres fez seu
treinamento, para administrar à emissora, na Rádio do Ministério da Educação no Rio de
Janeiro e trouxe para Volta Redonda um sistema de gestão e programação, possivelmente
ultrapassadas. Sobre esse momento Dário de Paula enfatiza:
A rádio Siderúrgica montada para se comunicar com os trabalhadores teve um
problema. Porque o Nazer em vez de fazer o seu estágio para a instalação da rádio
na Rádio Nacional que era a grande emissora daquela década de 40 e 50, ele foi
fazer estágio na Rádio Ministério Educação. A Rádio Ministério da Educação, não
vai aqui nenhuma crítica, mas era uma emissora elitizada, uma emissora que não era
para divertir, era só para instruir. (PAULA, Dário. Dário de Paula. Depoimento [14
39
de julho de 2011] Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pelo ex37
funcionário de Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda)
O padrão educacional de rádio perdia força no Brasil, e o estilo de programação
popular e massificante ganhava espaço em vários lugares do país. César Ladeira38 destaca “o
rádio estava vencendo na sua finalidade de agradar” e “querer educar pelo rádio era bobagem”
(CALABRE, 1996, p. 89) 39.
A programação da rádio, inicialmente, era feita nos padrões da Rádio do Ministério
da Educação. Era necessário se adaptar e evoluir. Dário de Paula diz:
A rádio tinha uma programação hermética, não se comunicava bem com o público.
A programação musical era também uma programação muito fechada e mesmo nos
primórdios da Rádio Siderúrgica a sua programação já era antiquada. (PAULA,
Dário. Dário de Paula. Depoimento [14 de julho de 2011] Volta Redonda, Rio de
Janeiro. Entrevista concedida pelo ex-funcionário de Rádio Siderúrgica Nacional de
40
Volta Redonda)
Em uma análise mais profunda sobre a Indústria Cultural, Morin (2007, p. 88-89)
classifica que há uma forma de intercâmbio entre o cotidiano, o real e o imaginário. Esse
modelo abre espaço para uma troca em que o imaginário recebe apoio de atributos da vida
prática e a vida prática se preenche com doses do mundo imaginário. Esse conceito se
aplicava nas emissões das radionovelas da Rádio Siderúrgica Nacional que apresentava temas
do cotidiano e imaginário dos “operários-ouvintes”. Foi necessário criar a cultura do ouvir.41
Um dos mecanismos criados para estimular essa cultura foram as radionovelas. Sabemos que
37
DE PAULA, Dário. Dário de Paula: depoimento [4 de julho, 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista
concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda.
39
As emissoras se empenhavam em produzir programas cada vez mais populares, criando uma “via de mão
dupla” na relação rádio/sociedade, em que a opinião pública (o gosto popular) adquiriu um peso fundamental. Os
modelos de programação eram lançados e as emissoras avaliavam sua audiência. A forma mais comum para isso
era a promoção de concursos com distribuição de brindes, seguida pela análise da correspondência recebida.
Caso a reação do público fosse negativa, o programa era reformulado ou retirado do ar. CALABRE, op.cit. 2002,
p. 25-6
40
DE PAULA, Dário. Dário de Paula: depoimento [4 de julho, 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista
concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda.
41
Cultura do ouvir - Dessa forma, a perspectiva da cultura do ouvir concentra-se no tempo lento do ouvir
nos ambientes e/ou processos de vinculação humana. No âmbito mediático, essas pesquisas em geral têm como
objeto os meios sonoros, sejam os tradicionais, como o radio, ou novos, como os ambientes digitais.
Independente do suporte, elas buscam compreender o áudio numa perspectiva mais ampla, como no contexto das
paisagens sonoras (SCHAFER, 2001) ou da sincronização da vida social pela vinculação sonora proporcionada
pelo radio (MENEZES, 2007). Profundidade possível, porque se busca compreender o conjunto dos sentidos do
corpo antes e depois dos equipamentos analógicos ou digitais de comunicação. Essas investigações não se
limitam a arqueologia dos meios, isto e, ao processo histórico que gerou o atual predomínio do visual. Antes,
visam entender a convergência entre a ‘cultura da imagem’ e a cultura do ouvir, diagnosticar limites e
possibilidades. Esse cenário já pode ser percebido, no campo do jornalismo, em reportagens especiais que fogem
ao padrão da visão que tudo quer explicar, convidando os ouvintes a se tornarem interlocutores dos
acontecimentos por meio do compartilhamento do universo sonoro das narrativas. (Jose Eugenio de Oliveira
Menezes) Enciclopédia INTERCOM de comunicação. – São Paulo: Sociedade Brasileira de Estudos
Interdisciplinares da Comunicação, 2010. v. 1; 18 x 25 cm, p.352
40
o rádio constrói o seu conteúdo de acordo com o imaginário da massa, como afirma, Barbero
(1997):
Entretanto, será mesmo que essa mobilização das maiorias foi mera manipulação por
parte do Estado, com ajuda dos meios massivos? Hoje sabemos que não. O apelo ao
"popular" conteve no populismo elementos da primeira interpelação - reivindicações
salariais, direitos de organização etc. - que, projetados sobre a segunda,
"carregaram" o discurso sobre a constituição do trabalhador em cidadão de uma
sociedade-formação nacional. Daí, com toda a sua ambigüidade, a eficácia do apelo
às tradições populares e à construção de uma cultura nacional. Daí, também, o papel
peculiar de certos meios massivos que, como o cinema e o rádio, constroem seu
discurso com base na continuidade do imaginário da massa com a memória
narrativa, cênica e iconográfica popular, na proposta de uma imaginária e uma
sensibilidade nacionais. (BARBERO, 1997, p. 227).
As histórias das radionovelas, as mensagens lidas pelos locutores indicavam um
universo de “heróis e mitos criados pelos meios de comunicação ainda funcionam no processo
de recepção porque há demanda para isso e a indústria preenche esses espaços deixados como
forma de esperança dos consumidores” (MORIN, 2007, p. 88-89). A afirmação de Morin
pode ser aplicada ao ano de 1955, já não existia uma disputa entre os outros meios de
comunicação como ocorre hoje. “Na cultura de massa não há descontinuidade entre a arte e a
vida” (MORIN, 2007, p. 15). As características do rádio foram fortemente aplicadas em 1938,
quando os americanos conheceram um dos fatos mais marcantes da história do rádio. No dia
30 de outubro, às 20 horas, entrou no ar a radionovela Guerra dos Mundos. Com a utilização
de efeitos sonoros e principalmente a interpretação dos radioatores, o diretor Orson Welles
conseguiu gerar pânico em grande parte dos ouvintes. Eles por sua vez não conseguiam
confirmar se aquilo que estavam ouvindo era informação verídica. Com o episódio “Welles
virou notícia no país todo e, diante das pressões e resultados, declarou que nada havia sido
intencional. Em 1955, contudo, em uma especial da BBC (Orson Welles Sketchbook),
assumiria que o programa não foi tão inocente assim” (BEIGUELMAN, 2005, p. 114). Era a
adaptação para o rádio de um roteiro de teatro, sobre uma possível invasão marciana na terra.
Watson Zucco Weber (2008) descreve como foi essa transmissão:
A história narrava marcianos invadindo a Terra dentro de cilindros metálicos; depois
disso, seguia com a interpretação sonora do extermínio da raça humana pelos
monstros. A transmissão durou uma hora, mas antes que ela encerasse, milhares de
pessoas nos Estados Unidos, por mais extraordinários que pareça, rezavam,
choravam, fugiam apavorados ante o avanço dos habitantes de Marte! Outros se
despediam dos parentes pelo telefone, preveniam os vizinhos do perigo que se
aproximava, procuravam notícias nos jornais ou em outras estações de rádio, pediam
ambulâncias e chamavam a polícia. A estimativa é que seis milhões de pessoas
escutaram a “Guerra dos Mundos – 28% dos ouvintes acreditaram tratar-se de uma
reportagem autêntica e 70% destes, assustaram-se ou ficaram perturbados. Calculase em um milhão, pelo menos, o número de pessoas tomadas pelo pânico, incluindo
ricos e pobres, cultos e incultos, velhos e novos. Acredita-e que esta transmissão
assustou muita gente por vários motivos. Entre eles, o realismo na narração do
programa, a aceitação da rádio como veículo de notícias importantes e o prestígio e
41
credibilidade dos locutores. Além disso, a rotatividade dos ouvintes, como acontece
ainda hoje, contribuiu para esse choque. Quem pegou a transmissão no meio, não
compreendeu com exatidão que se tratava de uma ficção. E mais: como ainda não
existia a TV, ninguém poderia comprovar através de imagens o que estava realmente
acontecendo. Cada pessoa imaginava sua própria cena. Tudo isso ocorreu 22 anos
após o surgimento do primeiro programa de rádio no mundo (WEBER, 2008, p. 16).
A sensorialidade42 apresentada na transmissão de Wells, segundo Ortriwano
“envolve o ouvinte, fazendo-o participar por meio da criação de um diálogo mental com o
emissor. A transmissão da Guerra dos Mundos, em 1938, provou como o rádio explora a
sensorialidade pela busca de audiência. Essa transmissão influenciou o modo de produção de
programas de entretenimento e de jornalismo de emissoras de rádio em todo o mundo.
A cultura de massa possibilita um consumo através de um tempo contínuo e não
diferencia os valores de qualidade das produções executadas. Como exemplo, podemos citar a
programação de uma emissora de rádio que durante o dia veicula estilos de músicas de
diferentes de cantores e compositores que nunca estariam reunidos em um mesmo palco. O
rádio é um componente da indústria cultural. A mercadoria produzida por esse veículo não
pode ser sentida fisicamente, e nesse sentido ela atinge o público, de forma diferente, se
concentra e se infiltra psiquicamente ,envolvendo componentes da vida e sonhos que o
público possui (MORIN, 2007, p. 24).
Mesmo que haja a busca pela padronização das produções sonoras, temos que analisar
que a emissão pode seguir uma linha de pensamento, mas a outra ponta do processo pode não
seguir a forma padronizada na recepção da transmissão, sendo assim, fica difícil aceitar que
todos os produtos da indústria cultural tenham a mesma reação no público “os indivíduos
sejam levados a aderir à ordem social, a identificar-se com as imagens projetadas e aceitar,
acriticamente, a sabedoria proverbial que é veiculada” (THOMPSON, 1995 citado por
CURY, 2005, p. 29).
A Rádio Siderúrgica Nacional fazia uma programação específica principalmente para
os metalúrgicos, mesmo sabendo que na cidade de Volta Redonda existiam outros públicos. A
programação da emissora funcionava como forma de estimular o lazer para os funcionários da
siderúrgica, por isso, a rádio era um meio de comunicação de massa. Contudo, mesmo que a
programação fosse irradiada para outros públicos, a empresa tinha o objetivo específico de
atingir os metalúrgicos.
42
Sensorialidade - Ao mesmo tempo, desperta a imaginação através da emocionalidade das palavras e dos
recursos de sonoplastia” (ORTRIWANO, G. S. . A Informação No Radio - Os Grupos de Poder e A
Determinação dos Conteúdos. SAO PAULO: SUMMUS, 1985. 120 p.)
42
Para entender melhor os processos da Indústria Cultural é preciso analisar a
complexidade dos processos comunicacionais. Para isso as pesquisas de Walter Benjamin,
que era membro do Instituto de Pesquisa Social, são fundamentais. Para ele, a recepção
funcionava a partir da “fruição distraída”, ou seja, o ouvinte pode executar outras ações
enquanto faz uma percepção distraída do som reproduzido pela emissora. Assim, o rádio se
encaixa de forma adequada ao pensamento de Benjamin, uma vez que a programação da
Rádio Siderúrgica Nacional, a partir de 1955 se transformou em algo comum no cotidiano dos
operários da CSN. O ex-diretor da rádio Siderúrgica Nélio de Andrade diz que
“A família siderúrgica chamava a ZYP-26 de nossa rádio. Nossa rádio – “Naquela
época com grande público presente lá nas instalações da rádio, porque o funcionário da
Siderúrgica Nacional tinha a rádio como..., tratava a rádio como nossa rádio, tinha uma
adoração muito grande pela rádio, e graças a Deus nós tivemos êxito, durante todo o
tempo em que nós ali estivemos.” 43
O ponto-chave desse processo é o ouvinte, que passa por um processo de apropriação.
Isso acontece quando o operário-ouvinte44 passa a tomar para si a programação, que é o
conteúdo simbólico transmitido pela emissora, ele se apropria de tudo o que é divulgado pela
rádio, as músicas, as notícias e as rádionovelas. Se o ouvinte incorpora a mensagem divulgada
pela emissora, ele também a utiliza de forma compartilhada em sua vida, por isso, a recepção
dos bens simbólicos vai muito além do que uma simples recepção, já que ele passa a
incorporar a programação da emissora como sendo sua. (THOMPSON, 1998, p.45)
Benjamin fazia um alerta para uma das características dos produtos da Indústria
Cultural: elas são de um contexto capitalista, e por isso, seguem os métodos do capital
“explora secretamente, no interesse de uma minoria de proprietários, a inquebrantável
aspiração por novas condições sociais” (BENJAMIN, 1994, p, 185). Apesar de ser uma
empresa estatal, a CSN visava também o lucro e manutenção de relações estáveis com o
trabalhador, evitando distúrbios que ameaçassem parar a produção, e a Rádio Siderúrgica era
uma das ferramentas que eram utilizadas para isso.
É necessário mostrarmos que a interpenetração da esfera de bens eruditos e a de bens
de massa configuram uma realidade particular que reorienta a relação entre as artes e a cultura
popular de massa. Esse fenômeno pode ser observado com clareza nos anos 40 e 50, momento
em que se constitui uma sociedade moderna incipiente e que atividades vinculadas à cultura
43
ANDRADE, Nélio: depoimento [10 de agosto de 2007]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida
pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda ao programa Memória do Rádio,
produzido pela web rádio da Fundação CSN.
44
Operário-ouvinte – utilizaremos o termo para designar o público que é ao mesmo tempo operário da CSN e
ouvinte da Rádio Siderúrgica.
43
popular de massa são marcadas por uma aura que em princípio deveria pertencer à esfera
erudita da cultura. (ORTIZ, 1993, p. 64)
Walter Benjamin em sua teoria da reprodutibilidade defende como o processo de
reprodução é possível sair do campo tradicional da arte e ganhar a massa. A programação da
Rádio Siderúrgica definia e criava hábitos na população. O programa “Hora do Brasil” era
veiculado pela emissora, de 19h00min até 19h30min. O tema de abertura da “Hora do Brasil”
é o clássico “O Guarani”, de Carlos Gomes, uma obra que milhares de brasileiros conhecem
possivelmente por causa da reprodutibilidade técnica da obra de arte em rede nacional em
todas as emissoras do país. A repetição é uma das técnicas mais utilizadas no rádio. Os
chamados prefixos de identificação dos programas criam uma padronização no público, que
consegue identificar uma característica das trilhas sonoras dos programas. Para Umberto ECO
“A matéria radiofônica, tomada como veículo, cria, assim, fenômenos de modificação de
outras linguagens artísticas; tomada como médium formativo, permite o nascimento de uma
nova linguagem” (ECO, 2006, p. 321).
A massa através da reprodutibilidade técnica do rádio não tem acesso ao modelo tátil e
visual da percepção. Essa contemplação acontece de forma reflexiva e sensitiva já que não há
imagem no veículo e o ouvinte se guia através do som (DUARTE, 2003, p. 27).
Teixeira Coelho (1980) destaca que:
Uma das bases de sustentação das teorias de McLuhan consiste no conceito segundo
o qual "o meio é a mensagem". Colocando-se na posição contrária à ocupada pelos
que se preocupam com o conteúdo das mensagens produzidas pela indústria cultural,
McLuhan observa que essa obsessão com o conteúdo é resquício de uma cultura
letrada incapaz de adaptar-se às novas condições. Durante séculos nós teríamos
acostumado a perguntar qual seria o conteúdo de um certo livro, ou o que um certo
pintor quis dizer com sua tela, ou qual o sentido de uma dada fábula. E esta
tendência nos teria levado a uma preocupação excessiva com os conteúdos
veiculados pelos meios da indústria cultural, quando o alvo dessa nossa atenção
deveria ser os meios considerados em si mesmos, independentemente de qualquer
conteúdo. Assim — e lembrando que para McLuhan os meios de comunicação não
são apenas os tradicionais (rádio, TV, jornal, etc.), mas também o carro, a roupa, a
casa, o dinheiro e uma infinidade de entidades assemelhadas — o autor canadense
considera que a "mensagem" de qualquer meio (por ele também chamado de
tecnologia) é a mudança de escala, de andamento ou de padrão por ele introduzida
nas relações sociais. A "mensagem" do trem, por exemplo, não é a introdução do
movimento, ou do transporte mais rápido, mas sim o fato de que ele acelerou e
ampliou a escala anterior das funções humanas ao criar novos tipos de cidades e
novas concepções de trabalho ou de lazer. (COELHO, 1980, p.40)
44
A emissora era um dos veículos de comunicação oficiais da CSN assim como o jornal
Lingote
45
, um periódico produzido pelo setor de comunicação da empresa que trazia as
principais ações da usina, e reforçava o modelo ideal de trabalhador brasileiro.
Souza (1992) em análise sobre o discurso oficial da CSN, interno ou externo, mostrou
que a cidade prosperava principalmente na fala dos diretores da siderúrgica que reforçavam
essa imagem nos pronunciamentos dos eventos da empresa. Se o jornal fazia a divulgação
desses discursos é bem provável que a Rádio da CSN transmitia os mesmos ao vivo.
O jornal O Lingote46 e a Rádio Siderúrgica possibilitavam a CSN a manutenção de um
diálogo constante com o trabalhador, transmitindo através das páginas de seu jornal e das
ondas de sua Rádio as determinações e diretrizes da empresa. Através desses veículos de
comunicação, o trabalhador da siderúrgica conhecia as expectativas e normas da empresa,
além claro, da intenção da siderúrgica de controlar os horários livres dos trabalhadores com
uma “programação sadia”. Souza (1992) afirma que:
“O discurso oficial da empresa siderúrgica apresentava as “facilidade oferecidas à
vida” na Cidade Operária: habitações confortáveis, aluguéis baratos, infra-estrutura
completa, limpeza e zelo com as áreas urbanas, locais para a recreação e o lazer. A
paisagem urbana era ressaltada pela beleza e amenidade conferidos pelo relevo
suave, pela arborização das ruas e ajardinamento das casas, pela simplicidade e
equilíbrio das construções e do traçado urbano. Tudo isso formava, na linguagem da
CSN, “um cenário agradável presença, como um convite À felicidade” (SOUZA,
1992, p. 33)
Ângela de Castro Gomes (2005), afirma que para trabalhar esse discurso era
necessário utilizar múltiplos instrumentos de comunicação social:
Esta argumentação procurava opor às normas liberais os fatos da realidade empírica,
utilizando todo o instrumental da moderna sociologia e estatística. Exatamente
porque se tinha “consciência” de que o processo de constituição e divulgação de um
apelo político é o mesmo processo de constituição do público deste apelo, o
diagnóstico cientificista foi complementado com um amplo conjunto legislativo e
com múltiplos instrumentos de comunicação social (jornais, filmes, cartazes, discos,
rádio etc.). (GOMES, 2005, p. 31)
O que não era divulgado pela empresa é que somente a área próxima da CSN é que
recebia esse cuidado, já a chamada “Cidade Velha” crescia de forma desordenada, sem
receber o apoio da CSN.
Apesar de ser uma fonte utilizada nessa pesquisa, para contextualizar os fatos, vemos
claramente que o discurso feito pelo jornal “O Lingote” foi predominantemente positivo às
45
O jornal O Lingote – A CSN, através de seu discurso oficial, utilizando-se de meios orais e escritos, como o
informativo, “O Lingote”, apresentava as facilidades que a empresa concedia a seus empregados, como: casas
confortáveis (seguindo o critério pré-estabelecido deles) e aluguéis baixos. MEDEIROS, Simone Alves. “A
cidade que educa” A construção das identidades sociais dos trabalhadores da cidade-empresa de Volta Redonda
(1940-1973). Mestrado em Educação da Universidade Federal Fluminense, 2004.
46
Informativo da CSN distribuído aos trabalhadores entre 1953 e1972.
45
ações empreendias pela CSN, já que o periódico era editado pelo setor de comunicação da
siderúrgica de Volta Redonda. O Jornal também foi uma fonte fundamental para apresentar
como a emissora foi importante para os ouvintes e radialistas. A função desses veículos para a
empresa era o de formar uma imagem do trabalhador-cidadão, como peça importante no
desenvolvimento do país.
A rádio Siderúrgica era um canal importante na relação da empresa com a “família
siderúrgica”
47
, termo utilizado pela CSN para criar um clima harmônico e familiar entre os
funcionários. A repetição48 desse tipo de discurso na Rádio Siderúrgica foi utilizada pela
empresa durante os 25 anos de programação da emissora, já que diariamente a rádio tinha o
papel de divulgar as ações e ideologia da CSN. “Na medida em que um grupo social
estabelece uma identificação mínima com uma determinada produção, e a expressa pelo
consumo, fica demonstrada por princípio a capacidade deste produto de estabelecer um
vínculo atendendo, com isto a algum tipo de necessidade psicossocial” (GOLDFEDER, 1980,
p.17).
O ex-funcionário da emissora, Edward de Carlos definiu que “A Rádio Siderúrgica
Nacional e a sua finalidade precípua era servir de comunicação entre Companhia Siderúrgica
Nacional e a família siderúrgica” 49. (CARLOS, Edward, 1980)
Dauro Aragão, empresário tabelião aposentado, que foi ouvinte da emissora, opina
sobre o fato de a rádio ser uma empresa do governo:
A siderúrgica por ser, apesar de ser excelente, uma programação muito boa, era
sempre uma rádio de uma empresa estatal, e tinha seus limites para poder reagir ali
dentro. Na parte política, por exemplo, não tinha participação nenhuma. Porque era
tudo controlado, porque não podia ferir os interesses do patrão. (ARAGÃO, Dauro.
2011 depoimento [12 de dezembro de 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro.
Entrevista concedida pelo empresário tabelião aposentado nomeado em 1953 pelo
governador Amaral Peixoto)
47
A família operária será fixada; será prescrito para ela um tipo de moralidade, através da determinação de seu
espaço de vida, com uma peça que serve como cozinha e sala de jantar, o quarto dos pais (que é o lugar da
procriação) e o quarto das crianças. Às vezes, nos casos mais favoráveis, há o quarto das meninas e o quarto dos
meninos. (FOUCAULT, 1989, p 123. apud DEBIAGGI, Sylvia Dantas e PAIVA, Geraldo José de, (orgs.)
Psicologia, e/imigração e cultura. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004, p. 64)
48
NUNES, Mônica Rebecca Ferrari. O mito no rádio: a voz e os signos de renovação periódica. 3 a edição. São
Paulo: ANNABLUME, 1993. (Selo Universidade, 16).
49
CARLOS, Edward. Edward de Carlos: depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de Janeiro.
Entrevista concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda para Ronald Jarbas.
O Depoimento de Edward de Carlos reforça a idéia de família siderúrgica. A entrevista foi concedida no dia 30
de dezembro momento em que a emissora foi fechada, em 1980. Fica bem claro que a siderúrgica conseguiu
formar essa família mesmo que isso ficasse no discurso da população, mas foi uma estratégia que funcionou,
apesar dessa família nunca ter existido.
46
A Rádio Siderúrgica existia para enaltecer os trabalhos e comemorações da CSN.
Apesar de a rádio fazer um trabalho constante junto aos ouvintes, o mais importante eram as
atividades especificas da CSN, como ressalta o ex-funcionário Edward de Carlos:
A rádio não tinha, por exemplo, hoje é aniversário da rádio vamos fazer festa, não.
O aniversário era da CSN, 9 de abril. Nesse dia se comemorava tudo da siderúrgica.
Então a rádio participava dos eventos que tinha, os acontecimentos, as
comemorações. Era o almoço da amizade que existia, o almoço da confraternização
que acontecia todos os anos, na época de aniversário da CSN. (CARLOS, Edward.
Edward de Carlos. depoimento [4 de dezembro de 2011]. Volta Redonda, Rio de
Janeiro. Entrevista concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de
Volta Redonda).
Após o diálogo do aparato teórico e historiográfico sobre a Indústria Cultural e as
especificidades da emissora da CSN, seguiremos apresentando as influências das músicas na
programação da Rádio Siderúrgica.
2.0 – A discoteca da Rádio Siderúrgica
Apesar de o aparelho receptor de rádio ficar mais próximo das pessoas, a emissora
enfrentava um problema em relação à atualização de sua discoteca. A Rádio Siderúrgica não
conseguia acompanhar o ritmo acelerado de lançamentos musicais com a mesma velocidade
que as emissoras da capital apresentavam. Por isso, foi necessário achar uma saída para
solucionar esse problema. O ex-funcionário da rádio, Dário de Paula ressalta que a rádio:
Passou muito tempo sem comprar os discos que eram lançados. A rádio recebia os
suplementos das gravadoras, e houve um período que nem sempre a programação
podia ser atualizada com os sucessos do momento. A gente não tinha os sucessos
para tocar. O ouvinte queria ouvir os sucessos que ele ouviu na Rádio Mundial, que
ele ouviu Rádio Globo, e a gente não tinha. Depois esse problema foi sanado, a rádio
fez uma permuta com uma rede de lojas que tinha um departamento de discos e os
discos de sucessos eram emprestados à rádio que gravava a faixa de sucesso em fita
de rolo e reproduzia na programação. (PAULA, Dário. Dário de Paula. Depoimento
[14 de julho de 2011] Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pelo ex50
funcionário de Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda) .
Se por um lado a Rádio Siderúrgica Nacional enfrentava problemas para buscar os
novos sucessos nacionais, em contrapartida ela tinha um diferencial de músicas
internacionais. O radialista Dário de Paula, afirma que “ela recebia também alguns sucessos
internacionais da embaixada dos EUA e esses sucessos internacionais sim, esses eram super
atualizados”. Sobre a influência americana Gerson Moura (1984) destaca que:
[...] a década de 40 é notável pela presença cultural no sentido amplo dos padrões de
comportamento, da substância dos veículos de comunicação social, das expressões
50
DE PAULA, Dário. Dário de Paula: depoimento [4 de julho, 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista
concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda.
47
artísticas e dos modelos de conhecimento técnico e do saber científico. O traço
comum às mudanças que então ocorriam no Brasil na maneira de ver, sentir,
explicar e expressar o mundo era a marcante influência que aquelas mudanças
receiam do “american way of life” (MOURA, 1984, p. 8).
O que pode explicar a facilidade da equipe da Rádio Siderúrgica ter acesso aos
sucessos musicais americanos é a “política da boa vizinhança”. Essa relação ficou mais
estreita a partir de 1940, quando os americanos assinaram um acordo com o governo
brasileiro para implantar a siderúrgica no Brasil que foi financiada pelo Eximbank. Moura
afirma que a assistência técnica necessária seria fornecida por empresas privadas americanas,
em 1941, quando os acordos foram assinados (1984, p. 65). Sobre ela relação dos Estados
Unidos com o Brasil Gerson Moura destaca que:
Essa boa vizinhança significaria um convívio harmônico e respeitoso entre todos os
países do continente. Significaria também uma política de troca generalizada de
mercadorias, valores, bens culturais entre os Estados Unidos e o restante da
América. (MOURA, 1984, p. 8)
Dentre os sucessos internacionais que aparecem em destaque no acervo composto por
16 mil discos estão Cole Porter, Duke Ellington, Frank Sinatra, Doris Day, Elvis Presly,
Rollig Stones, The Who entre outros. A Rádio Siderúrgica tinham um extenso repertório
musical ampliando assim o gosto musical do operário.
Apesar de a reportagem do Jornal do Brasil apontar o número de 12 mil discos, o
catálogo da Fonoteca da Fundação CSN (figura 4) registra que o acervo total da emissora é de
16 mil discos.
Figura 4 – Discoteca da Rádio Siderúrgica Nacional
O ecletismo no campo musical é revelado nos trabalhos que se destinam ao estudo da
música brasileira neste período:
“O rádio no Brasil abriu espaço para que gêneros e estilos regionais urbanos
originários nas camadas mais pobres se difundissem, para um quadro regional mais
amplo, como ocorreu com o samba, canções sertanejas e choros. Esse fato notável
permitiu [...] a diversificação e o alargamento das possibilidades de escolha dos
48
artistas e dos ouvintes, provavelmente ampliando e desenvolvendo seu universo de
51
escuta ao invés de regredi-lo”. (MORAES, 1999, p. 76)
A falta de discos novos nacionais e a programação feita de forma repetida eram
problemas que prejudicavam o processo de popularização da emissora. O radialista Dário de
Paula conta que:
No princípio era uma programação feita fechada para a semana inteira. Então você
tinha os programas com os títulos, e os discos que se repetiam. Era uma
programação, segunda-feira era a mesma programação da próxima segunda-feira, ou
da segunda-feira passada, domingo a mesma coisa. (PAULA, Dário. Dário de
Paula. Depoimento [14 de julho de 2011] Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista
52
concedida pelo ex-funcionário de Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda)
Para manter a programação musical, a emissora contratou dois maestros: Josué Nonato
e Cláudio. A rádio mantinha duas orquestras exclusivas para apresentações, em shows ao
vivo, no Recreio do Trabalhador e nos programas de estúdio da sede da emissora.
Lia Calabre enfatiza que:
Nas grandes emissoras, o núcleo musical era composto por orquestras inteiras,
diversos maestros e conjuntos regionais, que executavam músicas populares. A
música sempre foi um elemento fundamental dentro da programação de uma
emissora de rádio, e eram esses profissionais que criavam arranjos para os
programas dos mais variados estilos. Os músicos também acompanhavam os
cantores exclusivos da rádio e os convidados. Ou seja, a estrutura interna de uma
emissora de rádio era complexa, com todos os setores funcionando de maneira
interligada. (CALABRE, 2004, p. 33)
Os moradores de Volta Redonda ganhavam espaço na emissora com as transmissões
externas desenvolvidas em pontos estratégicos da cidade e começavam, assim, a trazer novos
hábitos culturais, como os concursos de calouros, apresentações das duplas caipiras, de teatros
e outras atividades.
2.1 – Bossa na Rádio Siderúrgica
Mesmo com a influência de músicas internacionais na emissora de Volta Redonda, os
estilos brasileiros também tiveram o seu espaço garantido na programação da Rádio
Siderúrgica, como foi o caso da Bossa Nova. Luiz Tatit (2004) afirma que:
[...] os artistas que assimilaram a dicção norte-americana ou aqueles que aprenderam
a improvisar como os jazzistas não foram os principais responsáveis pelo reencontro
da força estética da canção brasileira. Os artífices da terceira triagem que
51
José Geraldo Vinci de MORAES, Rádio e música popular nos anos 30, p. 76. In: Revista de História do
Departamento de História da Universidade de São Paulo, nº 140.
52
DE PAULA, Dário. Dário de Paula: depoimento [4 de julho, 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista
concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda.
49
combateram frontalmente os excessos musicais e semânticos e selecionaram os
recursos essenciais para a criação de uma espécie de canção absoluta – e que
constituem personagens centrais e recorrentes desta ora -, foram o compositor Tom
Jobim e o intérprete João Gilberto. (TATIT, 2004, p.100)
O acervo da emissora traz várias músicas de Antônio Carlos Jobim como “Esperança
perdida”, “Fotografia”, “Por causa de você” e “Desafinado”, e os vinis “Elis e Tom”, “Miucha
e Tom” e muitos outros. João Gilberto também foi um dos artistas da Bossa Nova que recebeu
destaque na rádio de Volta Redonda, com os discos “Tin tin por tin tin”, “O barquinho”
“Saudade da Bahia”, “Trem de Ferro” e “Bolinha de papel”.
Tatit (2004) afirma que:
Tom Jobim e João Gilberto foram para os EUA por ocasião da famosa apresentação
do movimento brasileiro no Carnegie Hall e lá permaneceram nos anos sessenta
realizando o sonho de exportação da nossa música. Os demais bossanovistas
retornaram à pátria e logo em seguida foram atraídos pelos chamados da nova
realidade que tomara conta do Brasil. Às vésperas do golpe militar de 1964 e em
plena efervescência do movimento estudantil, os jovens músicos não podiam deixar
de se solidarizar com seus recentes colegas de universidades nem deixar de
acompanhar a luta geral dos também colegas da área teatral, das artes plásticas e do
Cinema Novo. Tudo clamava por um engajamento político que só se intensificou até
a promulgação do AI 5, em 1968. (TATIT, 2004, p.101)
A partir do golpe civil-militar de 1964, as músicas da Bossa Nova perderam seu
caráter mais romântico e partiram para a exposição de posicionamento ideológico. Como
afirma Tatit (2004):
A primeira conseqüência da nova ordem se fez sentir nas letras das canções que
foram gradativamente retomando o peso semântico, agora não mais no campo
amoroso e sim na forma de posicionamento ideológico que compreendia a
reabilitação dos valores regionais, a denúncia de injustiças sociais e o anúncio de
uma revolução iminente e inevitável. Logo depois, as melodias também recuperaram
as inflexões grandiloqüentes de tempos passados para dar cobertura compatível à
oratória engajada. (TATIT, 2004, p.102)
Na Rádio Siderúrgica Nacional os seguintes discos que continham canções politizadas
eram veiculados em sua programação: “III Festival Internacional da Canção”, “IV Festival
Internacional da Canção”, “V Festival Internacional da Canção”, “VI Festival Internacional da
Canção”, “Festival Internacional da Canção Popular Rio 1969”, “Festival Internacional
Popular Rio 1969 da Rede Globo”,53 entre outros. A música “Disparada” de Geraldo Vandré
dividiu o primeiro lugar no Festival de Música da Tv Record de 1966, mas a composição que
marcou uma geração foi “Pra não dizer que não falei de flores” que venceu o III Festival da
Canção 1968 e a emissora de Volta Redonda também reproduziu essa canção:
53
Informações do catálogo de músicas da Rádio Siderúrgica Nacional.
50
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Somos todos iguais
Braços dados ou não
Nas escolas, nas ruas
Campos, construções
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
54
Não espera acontecer
A televisão a cada dia passou a ditar moda também para rádio. O programa “O Fino da
Bossa” comandado por Elis Regina, e os festivais da música popular da TV Record de São
Paulo definiram a ascensão e queda da canção brasileira engajada. Os festivais de música
além de serem transmitidos pela televisão tinham o áudio gravado em vinil e com isso eram
distribuídos pelas gravadoras nas emissoras de rádio de todo o Brasil. Tatit (2004) afirma que
nesse período:
Da bossa nova inicial havia restado apenas uma pálida – e quão pálida! –lembrança
da emissão de voz de João Gilberto no canto de um estreante que, depois de tentara
sorte imitando o intérprete baiano, encontrou sua própria dicção como líder do
incipiente – e ingênuo – rock brasileiro, rebatizado de jovem guarda. De fato, como
já destacamos, Roberto Carlos e o iê-iê-iê brasileiro sempre estiveram um pouco
próximos de João Gilberto do que a turma que deixou a bossa nova para criar a sigla
MPB. Pode-se dizer que desde então passou a existir no Brasil uma linha direta entre
o seu canto mais refinado (João Gilberto) e sua voz mais popular (Roberto Carlos).
(TATIT, 2004, p.102)
As músicas de protesto de compositores como Geraldo Vandré ganharam força
gerando até conflito com outros estilos musicais, como o Tropicalismo, essa outra corrente
criticou a forma como a música de protesto de artistas como Vandré se classificavam como
únicos que protestavam contra o regime. Tatit explica (2004) que:
Esse posicionamento de Geraldo Vandré forneceu munição extra aos baianos e
atribuiu ao movimento tropicalista um sentido de urgência. Se a música de protesto
era contra a ditadura militar, o tropicalismo manifestava-se em boa medida contra a
música de protesto seu espírito de exclusão, o que não significava, muito pelo
contrário, que os tropicalistas nutrissem qualquer simpatia pelos usurpadores do
poder político. Essa configuração das tendências que atuavam na tela da TV Record
no final de sessenta parece-nos essencial para se compreender a especificidade da
intervenção tropicalista que promoveu a mais ampla assimilação de gêneros e estilos
da história da música popular brasileira. (TATIT, 2004, p.103)
54
Trecho da música “Pra não dizer que não falei de flores” de Geraldo Vandré.
51
O público ouvinte da Rádio da CSN tinha acesso às músicas da Bossa Nova na
televisão e durante a programação normal da emissora, dando oportunidade assim ao
operário-ouvinte a refinar o seu gosto musical com as composições de Geraldo Vandré,
Antonio Carlos Jobim, João Gilberto entre outros.
2.2 – Trilha Sonora de Novelas na Rádio Siderúrgica
A influência da televisão na Rádio Siderúrgica foi marcante tanto na disputa por
audiência, quanto na reprodução trilhas sonoras que eram transmitidas pelas emissoras de
destaque na final da década de 60 e década de 70, Tupi e Rede Globo. A Rádio Siderúrgica
veiculou em sua programação as trilhas sonoras de novelas: “Nino o italianinho”, de 1969, da
Tupi, “Véu da Noiva”, Rede Globo. Em 1970, “Simplesmente Maria”, “As Bruxas” e “E nós,
aonde vamos?” da TV Tupi. No ano de 1972, foram reproduzidas as músicas das novelas
“Uma rosa com amor” e “Jerônimo”, da Rede Globo. No ano de 1973, “Os ossos do Barão” e
“O Espigão”, produzida pela Rede Globo em 1974, “Sucessora” 55 1978 e “Maria, Maria”.56
2.3 – Trilha Sonora de Filmes na Rádio Siderúrgica
As trilhas sonoras de alguns filmes estão registradas na programação da Rádio
Siderúrgica Nacional, entre eles: “A Ponte do Desejo”, “Ambição e Ódio”, “Assassinato no
Orient Express”, “Com Quale Amore, Com Quanto Amore”, “Godspell, A esperança”, “Joana
Francesa”, “Le Voyou”, “O Barão de Otelo”, “O caso Cláudia”, “Papillon”, “Sweden
Heaven”, “To na tua, ó bicho”. A CSN mantinha também em funcionamento o maior cinema
da cidade, com 1505 lugares o Cine 9 de Abril57, servia de espaço para lazer dos operários. A
escolha do nome do cinema faz referência ao aniversário da empresa.
A Rádio Siderúrgica mantinha em sua programação as atrações “Cinema em casa”,
“Telas Brasileiras” e “Flashes da 7ª arte”. Todos esses áudios estão datados em 13 de julho de
55
Informações do projeto Memória Globo. http://memoriaglobo.globo.com/Memoriaglobo/0,27723,GYN05273-230615,00.html
56
As informações sobre o nome das músicas veiculadas estão n Catálogo da Fonoteca da Fundação CSN.
57
Cine 9 de Abril - foi inaugurado em 27 de fevereiro de 1959, com sessão às 21 horas e o filme “Noites de
Mardigrás”, com Pat Boone e Christine Carrero. Cerca de 5.000 pessoas postaram-se nas proximidades do
cinema para assistir a entrada dos convidados de Volta Redonda, Barra Mansa, Resende, Barra do Pirai, Valença,
Vassouras, e Rio de Janeiro. (Disponível em http://www.clubedosfuncionarios.com.br/cine.php . Acesso 10 de
novembro de 2011).
52
1957. Podemos perceber mesmo após 2 anos de funcionamento, a emissora buscava aumentar
o seu leque de conteúdos criando inclusive, programas voltados para o cinema.
2.4 – Os sambas enredo
O carnaval recebeu sempre destaque especial na programação da Rádio Siderúrgica.
Foram catalogados dos arquivos musicais da emissora os seguintes discos: “Carnaval de 1932
a 1975, História dos Sambas Enredo”, da gravadora Polydor. E praticamente de 1965 a 1980
foram veiculados todos os discos de carnaval 107 discos, com temáticas carnavalescas. Isso
mostra força dessa festa popular e que as gravadoras disputavam as programações das
emissoras de rádio que auxiliavam na divulgação dos sambas enredo.58
A gravadora Continental produziu em áudio, contos infantis que a Rádio Siderúrgica
também reproduzia esse material para os seus ouvintes, entre eles: “Alice no país das
maravilhas”, “Pinocchio”, “Os quatro heróis”, “história dos três porquinhos” todos gravados
pelo elenco de radioatores da Continental. Isso mostra também uma possível atenção ao
público infantil da emissora.
2.5 – Jovem Guarda
O catálogo da Rádio da CSN tem os nomes dos cantores Tony e Celly Campelo, que
interpretaram músicas como “Don´t cry for me Argentina” e “Little Devil”. Eles foram os
primeiros cantores que iniciaram uma série de versões de músicas estrangeiras junto com
Sérgio Murilo (broto legal). Foi nesse contexto que surge a Jovem Guarda. Paulo Sérgio
Carmo (2000) registra que “... o aparecimento da jovem guarda ocorreu antes do movimento
hippie e do grande concerto de Woodstock, de 1969. A época, a Guerra do Vietnã não havia
ainda se intensificado”. (CARMO, 2000, p.42)
A Rádio foi um dos canais ecléticos que possibilitou de alguma forma um crescimento
do ritmo Jovem Guarda59 na cidade de Volta Redonda. Carmo (2000) afirma que:
O rock ingênuo e os conjuntos de iê-iê-iê eram idolatrados pelo mesmo público que
gostava das baladas românticas dos norte-americanos Paul Anka, Pat Boone e as
trilhas musicais dos filmes de Sandra Dee. Dessa forma, o negócio dos rapazes era
tocar nas rádios e conquistar garotas. Nada de mudar o mundo com canções de
apelos políticos. Suas letras, ingênuas, falavam de namoro, amor, roupas, carros e
velocidade. (CARMO, 2000, p.43)
58
Informações do catálogo de músicas da Rádio Siderúrgica Nacional.
Jovem Guarda - As músicas românticas faziam o público festejar os novos tempos. (CARMO, Paulo Sérgio
do. Cultura da rebeldia. A juventude em questão. 2ª edição, editora Senac, 2000, p. 44-45).
59
53
Carmo (2000) define ainda que:
A jovem guarda era a “versão nacional da energia rebelde do rock´n´roll 60, ritmo que
estava invadindo o mundo inteiro. Sua música emblemática, Quero que tudo vá pro
inferno, revela um pouco o seu ideário. Defender a música nacional não importava
para essa tribo. Em meados da década de 60 a TV Record, de São Paulo, despontava
na comunicação. O movimento musical acabou por dar certo e então se criou o
programa – Jovem Guarda61 – transmitido nas tardes de domingo diretamente do
auditório da Record. Enquanto a velha guarda da era do rádio fazia sucesso, mas
terminava pobre, a jovem guarda, da era da tevê, ditava moda inaugurando o
chamado marketing com a venda de chaveiros, cadernos, calças, bolsas com
estampas do calhambeque, símbolo de Roberto Carlos, e outros, dos demais
membros grupos, como Ternurinha (Wanderléia) e Tremendão (Erasmo Carlos). 62
(CARMO, 2000, p.43).
Na Rádio Siderúrgica outros componentes da Jovem Guarda também fizeram sucesso
no programa “Correspondente Musical” produzido com a participação do público. Os
locutores saiam às ruas com um gravador e assim o público poderia pedir músicas e mandar
recados para outros ouvintes, fortalecendo ainda mais a relação da rádio com os moradores, já
que a mesma fazia a repercussão do gosto musical dos volta-redondenses. Um fator
fundamental era que a emissora abria a suas instalações para a visita do público, criando
assim um elo com a comunidade da cidade do aço. Sobre a relação da emissora com a
população, o radialista Nélio de Andrade esclarece:
...Nós tínhamos um programa é musical, em que dois colegas, o Dário de Paula e o
Manuel Alves, eram os responsáveis pelos programas. E naquela época o Wanderley
Cardoso e o Jerry Adriani, eram as grandes estrelas da música e os dois saíram pelos
bairros para fazer uma gravação, em um determinado bairro, que hoje eu não me
lembro qual, se foi Vila Americana, ou se foi Santo Agostinho, o grupo do Jerry
Adriani era muito mais forte do que o do Wanderley Cardoso, e eles foram
impedidos de ouvir os fãs do Wanderley Cardoso, e em conseqüência só colocaram
música do Jerry Adriani no programa, eu observei aquele detalhe e chamei a atenção
dos dois, falei, mas porque vocês fizeram só o Jerry Adriani cantou hoje no
programa, e não pode ser assim, etc e tal. No outro dia, eles não reclamaram não
falaram nada. No outro dia eles me aparecem com um programa só de música
saudosa, com Orlando Silva, com Nelson Gonçalves, são fatos assim que a gente
passa e depois você acha até interessante a brincadeira, mas uma brincadeira que
fizeram de mau gosto, porque nós estávamos perante o público ouvinte da Rádio
Siderúrgica Nacional. (ANDRADE, Nélio. Nélio de Andrade [ 8 de agosto de 2007]
61
Jovem Guarda – Segundo Carmo (2000) “o nome que vingou foi inspirado numa frase de um livro do
comunista Lênin: “O futuro pertence à jovem guarda porque a velha está ultrapassada”. O programa, na TV
Record, teve dois anos de duração. Sinônimo de jovem guarda, a expressão iê-iê-iê originou-se do refrão da
famosa canção dos Beatles: Shes loves you / yeah, yeah, yeah. Como os programas infantis de hoje em dia, a
jovem guarda preencheu um vazio consumista e encantou também o universo da garotada, que passou a utilizar
músicas para animar festinhas de aniversário”. (CARMO, Paulo Sérgio do. Cultura da rebeldia. A juventude em
questão. 2ª edição, editora Senac, 2000, p.43).
62
Também fizeram parte da jovem guarda Wanderley Cardoso, Jerry Adriani, Martinha, Golden Boys, Leno e
Liliam, Prini Lorez, Sérgio Murilo, Os Vips, Trio Esperança, The Fevers, Renato e Seus Blue Caps, Bobby di
Carlo, Deny & Dino, Rosemary, Vanusa, Eduardo Araújo, Silvinha, Sérgio Reis, Ronnie Von, Waldirene, Nilton
César, The Jet Black´s e outros.
54
Volta Redonda. Entrevista concedida ao programa Memória do Rádio, para a Web
Rádio da Fundação CSN, Volta Redonda)
A emissora reproduzia em sua grade o “Clube da Jovem Guarda”, apresentado no
auditório do Colégio Manuel Marinho, na Vila Santa Cecília. A ouvinte Eliane Silva Luz
moradora de Volta Redonda destaca os artistas que fazia sucesso na programação da Rádio
Siderúrgica “Era Jerry Adriani, Roberto Carlos, Walderley Cardoso, era a nossa discoteca né
para a gente ouvir”. Para a ouvinte a emissora fazia parte dos momentos de diversão e lazer.
Eliane Silva63 conta:
Eu lembro que era muito bom, tinha várias pessoas conhecidas, Dário de Paula,
Dirceu Gonçalves, Zé Rodinha, Tadeu. Eu trabalhava nas Lojas Americanas e nas
horas de folga a gente subia né, que era o lazer das meninas era subir para conhecer
a rádio. O bacana e a gente ia lá. Tinha um palco, parece um palco, um auditório
bacana, umas máquinas de escrever antigas, que o Dirceu ficava fazendo os
repórteres.
Umberto Eco (2006) analisa a situação do ouvinte numa particular condição de
“intimidade e isolamento, disposto para a recepção dos sons puros, sem outro complemento
visual ou emotivo”. (ECO, 2006, p. 319) Realmente isso fica claro, porque o ouvinte
possivelmente, por um momento, devia acreditar que a programação de uma emissora
necessita atingir apenas uma única pessoa. Na verdade, isto não ocorre dessa maneira, apesar
do locutor falar sempre para um público individual, na forma de recepção do conteúdo. Com o
modelo de comunicação, nesse caso é de um emissor para vários receptores o efeito se repete
nesse público.
63
SILVA, Eliane. Depoimento [7 de julho, 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pela
ouvinte da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda.
55
CAPÍTULO III – OS TRÊS PERÍODOS DA TRAJETÓRIA DA RÁDIO
SIDERÚRGICA (1955-1965), (1965-1979) E (1979-1980)
Esse terceiro capítulo irá analisar a relação que a rádio pretendia estabelecer com os
trabalhadores. Para isso, buscaremos os depoimentos dos ex-funcionários da emissora e
análise da programação a partir de três períodos: o primeiro (1955 a 1965) em caráter
experimental; o segundo (1965 a 1979) marca o apogeu da emissora; e o terceiro durante o
ano de 1980 quando houve o esvaziamento e o fim da emissora.
Entre 1955 e 1965, a primeira década de existência da emissora definiu uma
programação que funcionava de forma experimental. A rádio buscava se firmar como uma
nova opção no setor de comunicação, no Sul do Estado do Rio de Janeiro. Era necessário que
a sua equipe experimentasse algumas opções de programas e atrações para tentar conquistar
prestígio junto aos ouvintes.
A diversificação de programação atraiu um considerável número de público ouvinte
para a emissora. Os locutores recebiam sugestões dos ouvintes para complementar ou auxiliar
nas produções realizadas pela rádio. Os ouvintes participavam da rádio porque acreditavam
estar contribuindo com as informações e com a comunidade. Queriam ser atores nesse
processo de consolidação da rádio.
Nesse período experimental que vai de 1955 a 1965 a rádio constantemente divulgava
atividades, inaugurações e eventos importantes realizados pela Companhia Siderúrgica
Nacional.
Para saber quais eram os programas de destaque nesse período inicial da emissora
fizemos uma pesquisa na Fonoteca da Fundação CSN, onde ficam arquivados os discos da
extinta Rádio Siderúrgica Nacional. As gravações especiais com conteúdos de programas da
rádio, comerciais, jingles, discursos, inaugurações e conferências envolvendo a CSN estão
disponíveis nesse acervo. Iremos trabalhar com os áudios que foram destaque nesse período
inicial. O arquivo da extinta Rádio Siderúrgica possui discos de vinil com gravações
históricas que marcaram a história da cidade de Volta Redonda, como a do mês de janeiro de
1956, no almoço da amizade, com inauguração da APAE (Associação de Pais e Amigos dos
Excepcionais) e a visita do vice-presidente dos EUA Richard Nixon a Volta Redonda no
mesmo dia. Ele inaugurou junto com o presidente Juscelino Kubitschek o monumento
Presidente Vargas, na Praça Brasil, no bairro Vila Santa Cecília.64 Em janeiro de 1956, o vice-
64
Não foi possível extrair o áudio desse acontecimento porque o vinil não era compatível com o equipamento.
56
presidente dos EUA Richard Nixon e o Presidente Juscelino Kubitschek fizeram discurso em
um almoço no hotel Belo Vista. Esse discurso foi possivelmente transmitido pela Rádio
Siderúrgica e reproduzido em outros momentos já que ele também foi gravado.
A Rádio Siderúrgica Nacional divulgava no final da década de 1950 as apresentações
da Banda e do Coro da CSN, que eram atrações marcantes nas festividades e inaugurações
que a empresa realizava. No acervo da Fonoteca da CSN há registros sonoros também de
apresentações da Banda e Coro da CSN estão no acervo da emissora. No ano de 1957, o
prefixo65 do programa “Momento Feminino” tem data de transmissão, no dia 7 de março de
1957. Ainda no ano de 1957 havia o programa “Seqüência Musical Odeon” e “Rádio Baile”.
O locutor criava um clima realmente de baile para os ouvintes que estavam em casa. Outro
programa que fazia sucesso no dia 9 de fevereiro de 1957 era o “Característica Musical da
RS”, com as músicas mais marcantes da programação da emissora. Dauro Aragão, ouvinte da
emissora enfatiza como era a divulgação cultural feita pela Rádio Siderúrgica:
Era uma coisa maravilhosa porque você tinha todo mundo ali participando e os
valores culturais e artísticos e da cidade tinham oportunidade de se apresentar
também era muito interessante. (ARAGÃO, Dauro. depoimento [12 de dezembro de
2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pelo empresário
tabelião aposentado nomeado em 1953 pelo governador Amaral Peixoto).
Um tipo de divulgação que se tornou comum na emissora em seu período inicial eram
as festividades em comemoração aos aniversários da CSN. Nos dias 7, 8 e 9 de abril de 1957,
era comemorado os 16 anos de funcionamento da siderúrgica. Essa propaganda do aniversário
da CSN anunciava os shows que aconteciam no Recreio do Trabalhador66, espaço reservado
para lazer na cidade. O ano de 1957 marca também a divulgação dos anúncios pela rádio da
expansão da CSN, projeto apresentado como um benefício ao trabalhador pois, aparentemente
traria mais oportunidades de emprego para quem já vivia na cidade.
Em forma de entretenimento para o operariado, a prática desportiva era utilizada como
forma de lazer ou em competições. “Clubes e associações atléticas, desde o início do século,
surgiam como expressão das diversas comunidades- bairros, grupos de imigrantes etc, que
floresciam no ambiente no ambiente urbano...” (PARADA, p.157, 2009). Havia uma
hierarquia na organização dos clubes baseada na hierarquia das relações de trabalho na CSN,
65
Prefixo – em rádio prefixo é uma fala que apresenta o nome da próxima atração da emissora.
Recreio do trabalhador - Em 1951, foi inaugurado o Recreio do Trabalhador, com quadras de esportes,
auditório e piscinas, onde era oferecido ao trabalhador todo tipo de divertimento, desde torneios esportivos até
festas, shows e maratonas estudantis locais, destinadas a prática de esportes para os funcionários e sua família.
Esse espaço foi utilizado para reforçar a idéia de formar uma “família operária”. (MOREIRA, Regina da Luz.
CSN: um sonho feito de aço e ousadia. Rio de Janeiro: Iarte, 2000. p. 55).
66
57
mantendo-se a distinção social. O Clube Umuarama, por exemplo, era destinado aos
engenheiros da CSN, e o Recreio do Trabalhador era destinado a todos os trabalhadores, já
que era uma estrutura bem maior onde as massas eram convidadas a participar das atividades
de entretenimento. (MEDEIROS, 2004, p. 248)
Ainda durante o final da década de 1950 na busca pela identificação da emissora com
o público, os conteúdos divulgados tinham padrões dos anúncios específicos de cada
programa, são os chamados prefixos. Gravados especialmente para cada programa da
emissora. “No acervo da rádio, há a gravação dos prefixos dos programas “O Lingo”,
“Gotinhas”, Palavras que o amor escreveu”, “As atrações do dia”, “O que vai pelo exterior”.
Os áudios são do ano de 1957. Na década de 1960 os programas de maior destaque são:
“Alvorada Sertaneja”, “Atendendo aos ouvintes”, “Coletânea Esportiva”, “Programa Sociais”,
“As mais pedidas pelos ouvintes”, “Galeria dos Grandes Mestres” com músicas clássicas,
“Clube do Estudante”, “Festival – P 26” e “Rádio Baile Maravilha”.
Dário de Paula fala sobre as mudanças na programação da emissora:
No final da década de 60, depois que surgiram os Beatles é que nós conseguimos o
Nazer Feres Themis, de que o rádio feito pela Rádio Siderúrgica tinha que ser um
rádio mais popular. Eu acho que o ano de ouro da Rádio Siderúrgica em termos de
modernização nos tempos foi o ano de 1970. Em 1970, o Manuel Alves era
programador, o Dário de Paula era programador, o Edward de Carlos era
comunicador e mudaram a programação da Rádio Siderúrgica Nacional. (PAULA,
Dário. Dário de Paula. Depoimento [14 de julho de 2011] Volta Redonda, Rio de
Janeiro. Entrevista concedida pelo ex-funcionário de Rádio Siderúrgica Nacional de
Volta Redonda)
O jornal “O Lingote” produziu uma edição comemorativa sobre as atividades da
emissora, e nesse especial realçou como eram os trabalhos da Rádio Siderúrgica:
Com pouco mais de dez anos de trabalhos prestados à CSN e à comunidade voltaredondense, a ZYP-26 desenvolve um programa dos mais diversificados em matéria
de radiodifusão, contando em suas atividades com divulgações de caráter cultural,
literário, esportivo, teatral, de relações públicas, educativo e musical. Além de boa
parte publicitária da própria CSN e para o desenvolvimento do bem organizado
comércio local. (O Lingote. Volta Redonda, 1965) 67
A reportagem traz referências de uma emissora de rádio ainda com princípios culturais
e literários que foram utilizados primeiramente por Roquete Pinto, fundador da Rádio
Sociedade do Rio de Janeiro, em 1923. O slogan da primeira emissora do país era “Trabalhar
pela cultura dos que vivem em nossa terra e pelo progresso do Brasil” dessa forma RoquettePinto definia o rádio:
67
A CSN publicava o Jornal o Lingote para divulgar as suas ações para a família siderúrgica. Em uma edição
comemorativa o periódico fez uma reportagem especial sobre a Rádio Siderúrgica Nacional.
58
O rádio é o jornal de quem não sabe ler; é o mestre de quem não pode ir à escola; é o
divertimento gratuito do pobre; é o animador de novas esperanças; o consolador do
enfermo; o guia dos sãos; desde que o realizem com espírito altruísta e elevado.
(Roquette-Pinto apud Ferraretto, 2000, p. 97).
A forma de comunicação utilizada constantemente pelos ouvintes para trocar
informações com a emissora era feito através de correspondência. Jorge Rodrigues trabalhava
controlando a distribuição de correspondências que chegavam e eram enviadas envolvendo a
rádio. As cartas chegavam enviadas por ouvintes que estavam trabalhando dentro da usina, ou
então vinham endereçadas das residências dos operários. Esse era um setor fundamental para
a relação da emissora com os ouvintes, que participavam da programação com sugestões,
pedidos musicais e reclamações. Assim, o público contribuía de alguma maneira com a
produção dos programas que eram veiculados pela Rádio Siderúrgica.
Como havia um fluxo intenso de anúncios e comunicados que eram divulgados pela
rádio foi necessário criar um setor específico para controlar esses dados. A direção da
emissora disponibilizou em sua portaria uma bancada com o setor de informações. Tudo que
era divulgado pelos radialistas ficava arquivado para que servisse de informação para quem
entrasse em contato por carta, telefone ou fosse pessoalmente à emissora.
Considerando que a emissora seguia esses ideais, a Câmara de Vereadores de Volta
Redonda reconheceu a rádio como serviço de utilidade pública. Além disso, a Rádio
Siderúrgica recebeu vários diplomas de mérito pelos trabalhos desenvolvidos para a
comunidade local. 68
Assim que os visitantes chegavam à rádio eles avistavam na porta de entrada do prédio
(figura 5) uma parte da partitura da obra de Carlos Gomes, O Guarani, considerada a mais
importante composição erudita de um autor brasileiro e até hoje serve de abertura para o
noticiário “A Voz do Brasil”. A música tornou-se um dos símbolos da nacionalidade
brasileira e foi utilizada na primeira transmissão de rádio no Brasil, em 7 de setembro de
1922.
68
Informação retirada do Jornal o Lingote de 1965.
59
Figura 5 – Imagem da portaria da Rádio Siderúrgica (março de 2011)
O prédio da Rádio Siderúrgica Nacional foi tombado pela Lei Estadual nº 3.913 e
12/08/2002. A prefeitura de Volta Redonda disponibilizou uma placa de patrimônio histórico
e cultural da emissora. O mais estranho é que essa placa não foi colocada no prédio da
emissora. Há na homenagem uma indicação de que o prédio da emissora foi inspirado no
prédio de uma emissora nos EUA. A Fundação CSN não confirma esses dados, mas mesmo
assim a prefeitura registrou essa comunicação. Provavelmente muitos moradores de Volta
Redonda ainda se lembram das instalações da Rádio Siderúrgica na década de 1980, mas hoje
com o passar o tempo o prédio está com suas estruturas em condições precárias.
3.0 – O apogeu da Rádio Siderúrgica 1965 a 1979
A partir de 1965, a Rádio Siderúrgica promoveu mais mudanças em sua programação
para se adaptar ao público. O clássico e o erudito perderam espaço para o estilo popular, mas
não foram retirados da grade da emissora. A programação musical funcionava da seguinte
forma: às 7h: 30min iniciava o primeiro programa que se chamava “Alvorada Sertaneja”, com
músicas voltadas para o homem rural. Enquanto isso, a música clássica teve seu horário
específico em um programa que iniciava às 20h30min e terminava às 23h30min, era um
horário nobre e esse programa era divulgado de segunda à sexta. Para agradar o público em
geral, durante o final de semana havia nesse mesmo horário, o Programa “Baile Show” com o
objetivo de entretenimento para os ouvintes terem a possibilidade de aumentar o som do rádio
e dançar ao com as músicas especialmente escolhidas pelos programadores da emissora,
proporcionado um verdadeiro baile para os ouvintes.
60
Dário de Paula afirma que foi também a partir de 1970 que a emissora profissionalizou
o setor de jornalismo “um noticiário que era feito através de radio escuta. As notícias que
predominavam a programação quais eram, eram as notícias do Rio de Janeiro. Porque a gente
tinha um noticiário super atualizado do Rio de Janeiro”. (DE PAULA, Dário , 2011)69
Uma das gravações extraídas do arquivo sonora da emissora dizia: “Notícia,
acontecimento. A comunicação verdade. Destaque. O jornalismo 49470, colocando você ao
lado da notícia”
71
. Apesar de afirmar que a emissora veiculava a verdade, com a censura
estabelecida pela CSN, possivelmente não havia o mesmo destaque para os assuntos que eram
apresentados por outros veículos de comunicação.
No início da década de 1970, a mudança na programação é marcada pela inserção dos
disc jockey.72 Dário de Paula73 afirma que o modelo seguia “no estilo da programação que era
desenvolvida pela Rádio Tupi, pela Rádio Globo, um pouco do que foi a Mayrink Veiga na
década de 1960”. (PAULA, 2011) O programa “Atendendo aos Ouvintes” também foi um dos
destaques da Rádio Siderúrgica. O método utilizado pela produção da rádio era fazer a
programação naquele período de acordo com o gosto específico do ouvinte (tabela 1). O
radialista Dário de Paula ressalta que foi:
Um programa que tinha muita audiência, o Atendendo aos Ouvintes, era o programa
no horário nobre do rádio, que até hoje é o horário nobre no rádio, de nove ao meio
dia. A fórmula extremamente simples. O ouvinte ligava na véspera, pedia a música,
era feita a gravação, a voz do ouvinte ia para o ar, eu quero ouvir a música tal, com o
fulano de tal, e a música era executa, a programação era feita de véspera. Depois
houve uma super modernização, aí o ouvinte podia pedir a música na hora.
(PAULA, Dário. Dário de Paula. Depoimento [14 de julho de 2011] Volta Redonda,
Rio de Janeiro. Entrevista concedida pelo ex-funcionário de Rádio Siderúrgica
Nacional de Volta Redonda)
Horário
69
Programa
Dia da semana
7h:30min às 9h
Programa Alvorada Sertaneja
Segunda a Domingo
9h às 12h
Atendendo aos ouvintes
Segunda a Domingo
12h as 12h05min
Coletânea Esportiva
Segunda a Domingo
12h05min às 15h
Programação Musical
Segunda a Domingo
DE PAULA, Dário. Dário de Paula: depoimento [4 de julho, 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista
concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda.
70
Prefixo 494, a emissora que ante tinha o prefixo ZPY -26 teve que ser alterado para 494.
71
Áudio extraído do cd de vinhetas da Rádio Siderúrgica Nacional. Arquivo pessoal do ex-funcionário da
emissora Ronald Jarbas.
72
Disc jockey – expressão em inglês que passou a ser adotada para qualificar os locutores que falavam e
reproduziam música.
73
DE PAULA, Dário. Dário de Paula: depoimento [4 de julho, 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista
concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda.
61
15 h até as 18h
Programa Social
Segunda a Domingo
18h até as 18h30min
As mais pedidas pelos ouvintes
Segunda a Domingo
19h até as 19h30
À hora do Brasil
Segunda a Domingo
19h30 até as 23h30min
Galeria dos Grandes Mestres
Segunda a Sexta
Aos Domingos
9h
Clube do Estudante
Domingo
10h
Festival P-26
Domingo
19h até as 19h30
Rádio Baile Maravilha
Sábado e Domingo
Tabela 1 – Programação da Rádio Siderúrgica na Década de 197074
Em 1970, a programação da Rádio Siderúrgica ganha estilo popular com a entrada no
ar do programa “Alvorada Sertaneja”, que tinha transmissão diária de 7h30min até 9h. Ela foi
a primeira emissora a manter uma programação das 6 horas à meia-noite totalmente produzida
pela sua equipe. De meio dia e cinco até as 15h, ingressava no ar uma programação musical,
com estilos distintos. Ás 15 horas começava o “Programa Social” que ia ao ar, até as 18 horas,
esse programa também era musical com uma programação diversificada. Enquanto a dona de
casa estava em casa preparando o jantar, ela poderia fica sintonizada no programa.
O ouvinte da Rádio Siderúrgica podia votar nas músicas de sua preferência, onde as
favoritas repetiam na programação de 18h até 18h30min, no programa “As mais pedidas”. E
novamente a editoria esportiva tinha destaque, às 18h30min a emissora apresentava as
principais notícias do esporte, no programa “As últimas do esporte”. Às 19 horas começava o
programa “Hora do Brasil”, o noticiário oficial do governo federal. Apesar da busca pelo
popular, a música clássica ainda era reproduzida em horário nobre na emissora. Finalmente à
noite, a música clássica tinha o seu espaço reservado. De 19h30min até às 23h30min, a Rádio
Siderúrgica dedicava um programa exclusivo para as músicas eruditas. O programa era de
segunda a sexta, e rematava a programação da emissora às 23h: 30min. A emissora adequava
as suas produções de acordo com as atividades da cidade, nos finais de semana havia
variações na programação. Um exemplo disso é o fechamento da programação, que ao invés
de reproduzir música clássica, a rádio fazia uma programação especial de 19h30min até às
23h30min, com o programa “Rádio Baile Maravilha”, um estilo dançante destinado a diversão
da família siderúrgica, já que no fim de semana o operário podia dormir até mais tarde.
74
DE PAULA, Dário. Dário de Paula: depoimento [4 de julho, 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista
concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda.
62
O equilíbrio entre o estilo popular sem perder os horários de destaque para a música
clássica foi uma busca constante que a emissora tinha que fazer. A cada dia a produção da
Rádio Siderúrgica queria se adequar ao gosto dos seus ouvintes (tabela 2). Uma contribuição
para isso foi a contratação do comunicador Benedito Alves Resende, conhecido como o Tio
Bené:
O rádio teve que se adaptar ao seu público. Isso foi uma necessidade. E nesse
período quando houve um momento em que o Nélio de Andrade assumiu a direção
da de programação da rádio, ele contratou o Tio Bené, que era o comunicador de
maior audiência nas madrugadas. De 4h: 30 da manhã até as 8h ele fazia um
programa que ficou famoso, com o vamos tomar café com o titio Bené, quem é que
não quer, o Tio Bené era um comunicador descontraído que dava algumas notícias,
mas o que ele fazia mesmo era tocar música velha e contar algumas piadas no
programa. Mas era a Alvorada do Trabalho, o programa que despertava a cidade
naquele tempo. (PAULA, Dário. Dário de Paula. Depoimento [14 de julho de 2011]
Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pelo ex-funcionário de Rádio
Siderúrgica Nacional de Volta Redonda).
Horário
Programa
Radialista
Dia da semana
04h30min às 8h
Alvorada do Trabalho
Tio Bené
Segunda à Sábado
9 às 11H
Programa Fernando Lucas
Fernando Lucas
Segunda à Sábado
11 h
Programa Mauro Tanury
Mauro Tanury
Segunda a sábado
12h15min
Jogo Aberto
Manuel Alves
Segunda à Sábado
13h
Tele-disco
Eduardo Gonçalves
Segunda à Sábado
15h
Correspondente Musical
Manuel Alves
Segunda à Sábado
15h40min
Campeãs do Dia Tele-disco
Eduardo Gonçalves
Segunda à Sábado
20h40min
Galeria dos Grandes
Manuel Alves
Segunda à Sábado
Mestres
Tabela 2 – Programação da Rádio Siderúrgica até o ano de 1980
A Rádio Siderúrgica produzia o programa “Festival P-26” no ginásio do Recreio do
Trabalhador. O programa de auditório contava com atrações que vinham da capital do estado
para se apresentar em Volta Redonda. Em entrevista, o radialista Nélio de Andrade que era o
apresentador do programa destacou que:
Esse programa era realizado todos os domingos pela manhã, a partir de 10 horas, no
Recreio do Trabalhador, e com o título de Festival P-26, ali nós tínhamos os
cantores locais e também as atrações do Rio de Janeiro, que por diversas vezes se
apresentaram em nosso programa Como o Jerry Adriani, e Wanderley Cardoso , o
Roberto Carlos que estava praticamente no início de sua carreira, já esteve em Volta
Redonda cantando em nosso programa. Chacrinha por várias vezes esteve aqui
fazendo um grande sucesso no Recreio do Trabalhador. E assim, nós tivemos muitos
outros cantores que me fogem agora da memória, mas que aquele programa Festival
P-26, foi realmente um programa que era marcado na cidade do aço, porque era um
63
ponto de encontro, um ponto de referência aos domingos na cidade. (ANDRADE,
Nélio. Nélio de Andrade. Entrevista concedida pelo ex-funcionário da Rádio
Siderúrgica ao programa Memória do Rádio, em 2007, Volta Redonda) 75
Mais de 50 artistas da região foram revelados pela emissora através do programa
“Festival P-26”, apresentado aos domingos, no Recreio do Trabalhador. A Rádio Siderúrgica
Nacional recebeu ainda a visita de artistas como Chacrinha, Ary Barroso, Severino Araújo e
sua Orquestra, além do elenco da Rádio Nacional do Rio de Janeiro dos anos 50. (Catálogo da
Fonoteca Fundação, CSN 2009-3).
O programa de maior destaque da Rádio Siderúrgica foi o “Clube do Estudante”
(tabela 1). Edward de Carlos explica como ele funcionava:
Aos domingos a emissora apresentava às 9h da manhã o “Clube do Estudante” uma
produção que contava com a participação de alunos das escolas de Volta Redonda.
O gerente geral da emissora, Nazer Feres Themis, recebeu do diretor de
Comunicação Social da CSN, Simas Pereira, o apoio para contratar um “casting”
completo para a emissora que, além de uma programação musical, possuía um
núcleo próprio para produção de novelas escrita pelo jornalista Walter Naves. (E.C,
entrevista concedida no dia 29 de maio de 2011).
Dário de Paula destaca como as novelas eram escritas:
Um funcionário da CSN que trabalhava como datilógrafo na Engenharia Industrial,
o Walter Naves escrevia as novelas. No princípio, a Rádio Siderúrgica tinha um
quadro de redatores. O professor Cláudio Mendes, criou o Clube do Estudante. Era
professor criou o Clube do Estudante que era um programa de variedades que ele
escrevia, era um programa semanal. Agora o cara era contratado como redator,
trabalhava a semana inteira para produzir um programa de uma hora por semana, é
pouco, não é, e o salário era bom. (PAULA, Dário. Dário de Paula. Depoimento [14
de julho de 2011] Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pelo ex76
funcionário de Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda)
A Rádio Siderúrgica apesar de pertencer a CSN tinha muitos anúncios publicitários. O
motivo para isso foi que o valor para inserir mensagens comerciais na programação tinha
custo baixo e estimulava assim o aumento de clientes. Dário de Paula conta como funcionava
a propaganda na emissora:
Enquanto nós trabalhamos na rádio Siderúrgica, havia os corretores, a publicidade
era um negócio interessante. Primeiro muito barato. A rádio tinha muito anúncio,
tinha muito anúncio, a programação musical era muito prejudicada. Havia blocos de
comerciais muito longos, e a rádio tocava tanta propaganda que em uma hora tocava
mais ou menos, oito ou nove músicas era o máximo que conseguia tocar. E olha que
era uma programação musical. E a rádio tinha uma equipe de corretores. Os
corretores credenciados. Só quem pedia vender anúncio para a rádio era o grupo
corretores credenciado. Nessa época eu inclusive não mexia com publicidade porque
eu não podia como funcionário da rádio, não podia trabalhar na publicidade.
75
ANDRADE, Nélio: depoimento [10 de agosto de 2007]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida
pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda ao programa Memória do Rádio,
produzido pela web rádio da Fundação CSN.
76
DE PAULA, Dário. Dário de Paula: depoimento [4 de julho, 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista
concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda.
64
(PAULA, Dário. Dário de Paula. Depoimento [14 de julho de 2011] Volta Redonda,
Rio de Janeiro. Entrevista concedida pelo ex-funcionário de Rádio Siderúrgica
77
Nacional de Volta Redonda)
Os principais patrocinadores nacionais da Rádio Siderúrgica foram os seguintes: Lojas
Singer, Lojas Arapuã, Danúbio, Cigarro Continental, Cia Ultragáz, Gripargil, Óticas Brasil,
Gessy Lever, Emplasto Poroso Sabiá, Duck B. Moreira, Antárctica, Portobrás, Colombus,
Banrio, Loja Condor, Peças Originais Volkswagem, Refrigerador Frigidaire, Toddy, , Casas
Mury, Anil Kolman, Lojas Ducal, Americola Refrigerante, Brahma Chopp, Guaraná Brahma,
Rayovac e Coca Cola. Havia também anunciantes locais como a Sapataria Wilson, 207 Auto
Car, Sapataria Mineira e Mercearia Royal. No acervo da Rádio Siderúrgica estão os discos
com as gravações dos comerciais que eram veiculados na emissora. A empresa Magazine
Royal também era anunciante da Rádio Siderúrgica Nacional:
Super venda de natal do Magazine Royal. Estoque ainda maior. Tecidos modernos,
tecidos quase pelo preço de custo. Tecidos e mais tecidos por quase nada. Tudo por
causa de Papai Noel. Não deixe de visitar a sua loja tradicional na super venda de
natal do Magazine Royal.
A ouvinte da Rádio Siderúrgica, Neiva Carvalho em depoimento confirmou que a
emissora fazia veiculação de anúncios também de lojas da cidade, “Logo que a minha irmã
abriu uma loja, foi em 1975, Deusa Modas, fez muita propaganda nessa rádio”.
(CARVALHO, Neiva. depoimento [14 de dezembro de 2011]. Volta Redonda, Rio de
Janeiro. Entrevista concedida pela ouvinte Neiva de 70 anos, da Rádio Siderúrgica Nacional).
3.1 – Rádio Siderúrgica: a relação que a rádio pretendia estabelecer com os trabalhadores da
CSN
Os trabalhadores da CSN contribuíram com o movimento sindical, representando assim
uma base do sindicalismo estatal entre 1945 e 1964. Os alcances do projeto nacionaldesenvolvimentista fizeram com que os acontecimentos seguissem de uma forma específica
na siderúrgica de Volta Redonda. Pessanha e Morel (2001) afirmam que “um peso importante
na determinação das escolhas vividas, no posicionamento das correntes reivindicações e nas
atitudes frequentemente contraditórias assumidas perante a companhia” (PESSANHA E
MOREL, p. 300). A intervenção estatal e a ideologia nacionalista foram fatores que fizeram
da CSN uma marca de progresso. PESSANHA; MOREL citam que:
77
DE PAULA, Dário. Dário de Paula: depoimento [4 de julho, 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista
concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda.
65
Vindo de diferentes regiões do país para participar da construção da primeira
siderúrgica de grande porte do Brasil, numa conjuntura muito particular – a Segunda
Guerra e o Estado Novo – empreendimento que seria a “menina dos olhos” de
Getúlio Vargas, símbolo do “progresso” e do novo impulso que se pretendia dar à
industrialização, tudo isso costurado pela ideologia nacionalista que, naquele
momento, legitimava a intervenção estatal, esse setor da classe operária é, muitas
vezes, identificando como atraso, massa de manobra do getulismo e do sindicalismo
corporativista, presa fácil de demagogos e pelegos. (PESSANHA; MOREL, 2001, P.
301)
Durante os anos de 1962 e 1964 não havia muitas greves na CSN. O operário de Volta
Redonda lutava pelas conquistas sem usar a greve como instrumento de pressão. Sobre isso o
ex-sindicalista Silvestre Pereira Rosa traz uma explicação:
Quer dizer, então a gente tinha um movimento sindicalista, aqui em Volta Redonda,
lutando e defendendo. E não havia greve. Esse era o negócio. Não havia greve.
“Vamos fazer greve” Não, para quê? Não é preciso. Tinha unidade no movimento.
Vamos fazer greve para quê? Contra a Siderúrgica, que é patrimônio nosso? É
preciso saber que aqueles que dirigem a companhia, eles estão lá por mandato.78
A CSN representava praticamente o primeiro e único emprego de milhares de
trabalhadores, por isso, provavelmente conseguiu manter e transmitir uma imagem positiva
sobre os moradores da cidade de Volta Redonda. Houve todo um trabalho para que a primeira
geração de trabalhadores tivessem uma representação positiva da siderúrgica e acreditasse que
a CSN fosse um patrimônio da nação. Como ressaltam Pessanha e Morel (2001):
Nesta análise, não devemos subestimar os efeitos da heterogeneidade, tanto do ponto
de vista profissional quanto cultural. Para muitos, a entrada da CSN representou o
primeiro emprego fabril e o contato com o mundo urbano, numa cidade que numa
década multiplicou sua população por dez. A mística de que se cercou a criação da
companhia certamente teve um peso importante na construção da identidade da
primeira geração de trabalhadores, cuja formação profissional deu-se paralelamente
à trajetória dentro da empresa, contribuindo para reforçar os laços entre a história
pessoal e a companhia. (PESSANHA; MOREL, 2001, P. 301)
Como havia uma legislação corporativa ainda sem muitos apontamentos positivos para
a classe trabalhadora, o sindicato começou a criar um conjunto de ações para conquistar os
seus direitos reais. Pessanha e Morel esclarecem (2001):
Mas a argumentação central desenvolvida por nós é a de que, a despeito das
ambigüidades da gestão paternalista e das limitações da legislação corporativista, os
desafios daquela conjuntura contribuíram para a construção de uma tradição sindical
entre esses trabalhadores, na qual a noção de “direitos” constituía o núcleo principal.
(PESSANHA; MOREL, 2001, P. 301)
Para reforçar os vínculos entre os trabalhadores a CSN desempenhava o papel da
prefeitura da cidade, como destacam Pessanha e Morel (2001, p.301):
78
Entrevista de Silvestre Pereira Rosa, ex-Diretor Sindical, A Gazeta do Aço, 12 a 16 de julho de 1981. (apud
PESSANHA; MOREL, 2001, p.310).
66
Adotando uma política de gestão de força de trabalho com traços “paternalistas, a
companhia controlava também a cidade, administrando uma série de serviços
urbanos (transportes, cooperativa de abastecimento, hospital, escolas), além de
construir moradias para seus empregados – qualitativamente diferenciadas segundo
distintos níveis hierárquicos do coletivo de empregados. Os benefícios sociais –
sempre apresentados como “dádiva” – se estendiam à família operária e foram um
dos pontos sobre os quais a empresa procurou construir sua legitimidade. Tratandose de uma empresa estatal, esses mecanismos tinham uma conotação própria, pois,
além de constituírem uma estratégia de fixação da força de trabalho,
desempenhavam também um papel político importante: reforçavam os laços
coorporativos entre os trabalhadores e a companhia e, por extensão, o Estado.
(PESSANHA; MOREL, 2001, P. 302)
Volta Redonda era considerada uma cidade modelo do trabalhismo79, por isso,
rapidamente ganhou atenção dos partidos políticos PSD e PTB, que se apresentavam como
herdeiros de Vargas:
No período analisado, Volta Redonda, considerada “cidade-símbolo do
trabalhismo”, converteu-se em importante centro regional, tornando-se alvo de
atenção de políticos e presidentes da República em busca de votos e apoio político.
O extraordinário crescimento da cidade, a grande concentração de operários, sua
emancipação de Barra Mansa e a importância econômica que adquiria para o estado
do Rio de Janeiro tornaram-na objeto de disputa acirrada entre partidos, sobretudo o
PSD e o PTB. Todos tentariam se apropriar da imagem de Getúlio Vargas, devido ao
seu apoio popular, proclamando-se seus legítimos herdeiros. (PESSANHA;
MOREL, 2001, P. 302)
A CSN de alguma maneira tentou minimizar os conflitos com a classe trabalhadora
através do uso constante dos meios de comunicação como a Rádio Siderúrgica. Pessanha e
Morel (2001) afirmam que:
Vários autores já apontaram para as ambigüidades práticas políticas consideradas
“populistas”, enquanto significando, simultaneamente, manipulação e expressão da
insatisfação das classes populares; o apelo à colaboração e à mobilização contido na
interpelação política e nos laços com que se preocupava vincular as massas urbanas
aos líderes vinha acenar também como o reconhecimento da sua cidadania e o
direito à participação. (PESSANHA; MOREL, 2001, P. 302)
De alguma maneira os benefícios da CSN aos seus trabalhadores chamavam a atenção
para os padrões da época, mas ao mesmo tempo os trabalhadores não aceitavam passivamente
esse discurso, eles utilizavam os próprios benefícios adquiridos para cobrar melhorias nas
suas condições de trabalho. PESSANHA e MOREL (2001) citam que:
79
O trabalhismo cedia ao Estado a responsabilidade das iniciativas legislativas, sempre buscando preservar uma
harmonia política entre capital e trabalho. A maneira como os três partidos políticos do Brasil sugiram enquanto
a democracia se desenvolvia era peculiar ao estilo de Vargas: dois partidos inteiramente leais a ele e um terceiro,
de intricada ligação com a democracia, na oposição. A base pragmática do arranjo era típica da abordagem
política de Vargas: o PTB recompensaria os trabalhadores por não sucumbirem à propaganda comunista, e o
PSD procuraria chegar aos funcionários públicos e a outros empregados da classe média beneficiários de
programas governamentais (pensões, saúde pública, educação, proteção ao emprego) e que não queriam uma
volta ao velho sistema. (LEVINI, 2001, p. 120)
67
A CSN se vangloriava de oferecer “o mais alto padrão já realizado no Brasil, em
prol dos operários de uma grande indústria, permitindo-lhes uma vida condigna”.
Tal discurso - que remetia, como vimos, à noção de dádiva – não era passivamente
“engolido” pelos operários, mas era por vezes apropriado por eles e convertido em
base de reivindicações por melhores condições de vida e de trabalho, vistos como
direitos. (PESSANHA; MOREL, 2001, P. 303).
A Rádio Siderúrgica produzia conteúdo especialmente para a cidade, de forma
regionalizada, o que buscaria uma fidelização de sua audiência. Uma das expectativas da
emissora para isso era o fenômeno que aparecia na época, o rádio a pilha, que estaria muito
mais próximo das pessoas como destaca a reportagem do Jornal Lingote:
...Trata-se de uma penetração diferente, porém, condicionada por fatores novos de
vivência. Quem já não observou o fenômeno do rádio de pilha? No Maracanã, por
exemplo, dezenas de milhares de espectadores vão assistir a uma pugna de futebol,
mas não dispensam o rádio a pilha, que trazem colocado ao ouvido. O hábito de ouvi
rádio em família, de antigamente, deslocou-se para a praça pública, às vezes para o
local de trabalho ou para atividades transitórias, tais como viajar de automóvel,
repousar em casa de campo, fazer piquenique, etc. A RSN encara este fenômeno
como de suma importância para as suas atividades. (Lingote. Volta Redonda, 1965)
Em Volta Redonda pela primeira vez o rádio ganhava força e formava um grupo fiel
de ouvintes que se habituavam às músicas e aos comunicadores. Os lares da “família
siderúrgica” tinham espaço cativo para os aparelhos receptores que serviam de divertimento
nas horas de lazer dos moradores de Volta Redonda. Enfatizamos que a popularização dos
aparelhos de rádio em Volta Redonda só foi possível pela implantação do sistema participação
nos lucros e resultados, além do reembolso criado pelo Clube dos Funcionários, que
parcelavam as compras de eletrodomésticos em várias parcelas. O historiador Sevcenko
(1998) define as características do rádio que influenciaram todas as emissoras do Brasil e
podem ser adequar a emissora da cidade do Aço da seguinte forma:
Partindo cada um do seu isolamento real, se encontram todos nesse território etéreo,
nessa dimensão eletromagnética, nessa voz sem corpo que sussurra suave, vinda de
um aparato elétrico no recanto mais íntimo do lar, repousando sobre uma toalhinha
de renda caprichosamente bordada e ecoando no fundo da alma dos ouvintes,
milhares, milhões, por toda parte e todos anônimos. O rádio religa o que a
tecnologia havia separado. [...] Cada um põe naquela voz aliciante o rosto e o corpo
de seus sonhos. Como o som se transmite pelo espaço, onde quer que se ande pela
casa, aquela voz penetrante iria atrás. Em breve era possível introduzi-la no carro
também, circulando e se afagando nela em meio à rispidez mecânica no trânsito.
(SEVCENKO, 1998, p.585-586)
A partir dos depoimentos dos ex-funcionários percebemos que mesmo sem ter os
recursos necessários para concorrer com as emissoras da capital, a rádio fazia um bom
trabalho. Edward de Carlos afirma que:
Nós não poderíamos jamais entrar em competição com emissoras do Rio de Janeiro
ou outras emissoras, mas a nossa finalidade estava sendo cumprida. Dentro de
possibilidades nós procuramos fazer tudo o que uma emissora do interior fazia, e
68
chegávamos às vezes até a competir com emissoras do grande centro. (CARLOS,
Edward. Edward de Carlos: depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de
Janeiro. Entrevista concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta
Redonda para Ronald Jarbas.).
A finalidade da emissora da CSN era servir de meio de comunicação social entre a
empresa e os seus funcionários. Era um veículo mais rápido para transmitir informações.
Edward de Carlos afirma que “A Rádio Siderúrgica Nacional a sua finalidade precípua era de
servir de comunicação entre Companhia Siderúrgica Nacional e a família siderúrgica”.
(CARLOS, Edward. Edward de Carlos: depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta
Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica
Nacional de Volta Redonda para Ronald Jarbas.)
Eram assim divulgados recordes de produção, ampliação da usina, aumento salarial. Ela ainda
fazia a apresentação de outros temas, que não eram relacionados especificamente a área
siderúrgica, mas em menor escala.
3.2 – A divulgação do Governo civil-Militar na Rádio da CSN
Durante o período da ditadura civil-militar (1964-1985) o rádio é um instrumento
utilizado para discursos de apoio ou de resistência ao regime. No Rio Grande do Sul, por
exemplo, Leonel Brizola utilizou o veículo para defender a democracia. Nunes (2000) afirma
que:
Quase quarenta após o surgimento do rádio no Brasil, ele desempenharia um
importante papel, retornando à cena política durante os acontecimentos que
marcariam tragicamente o cenário nacional: o golpe militar de 1964 e a destituição
de João Goulart da presidência da república. A “cadeia da legalidade”, coordenada
por Leonel Brizola a partir do Rio Grande do Sul, difundiu através do rádio, por um
curto espaço de tempo, um discurso de resistência do movimento popular e
convocava a população a defender a democracia e o presidente eleito. (NUNES,
2000, p. 5)
O ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Edward de Carlos afirma que apesar do
período da ditadura civil-militar, a emissora não sofreu muito com censura, já que a emissora
tinha como único interesse a própria CSN.
A programação da rádio vamos dizer ela não mudou em nada. Porque o que a gente
fazia era uma rádio praticamente empresa, era uma rádio-empresa. Não era uma
rádio política, não era uma rádio com fins comerciais. Ela era simplesmente
empresa. É claro que a gente tinha que fazer uma rádio empresa. Que é diferente do
rádio hoje. O disk jokey vai pra lá, bel prazer dele ele fala o que ele achar bem. A
rádio empresa não. A finalidade ela... A rádio ela divulga isso, divulga aquilo.
(CARLOS, Edward. Edward de Carlos: depoimento [31 de dezembro de 1980].
Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pelo ex-funcionário da Rádio
Siderúrgica Nacional de Volta Redonda para Ronald Jarbas)
69
Contudo, a Rádio Siderúrgica recebia comunicados do Batalhão do Exército (figura 6)
para informar notícias de interesse do governo. Apesar de afirmar que a emissora não alterou
a sua rotina, Edward de Carlos relata que recebia alguns informes que deveriam ser lidos na
Rádio: “Então não afetou quase nada. É claro que chegava lá às vezes uma nota do comando
para divulgar, como chegava da prefeitura, mas para chegar lá e dizer vocês não podem fazer
isso, eu nunca, nunca aconteceu isso” CARLOS, Edward. Edward de Carlos: depoimento [31
de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pelo exfuncionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda para Ronald Jarbas
Figura 6 – (Esquerda) Comunicador Tio Bené com Dario Azevedo, ao centro falando provavelmente um
oficial do exército e (Direita) o comunicador Nélio de Andrade. (Autor da foto desconhecido, não há a data
que a fotografia foi feita, ela faz parte do arquivo da Fonoteca da Fundação CSN).
Como não poderia ser diferente, os eventos do Estado e da CSN recebiam atenção
especial da emissora. Edward de Carlos enfatiza que:
Todos os eventos da CSN eram transmitidos pela rádio siderúrgica. Era o
aniversário da companhia, era o dia da bandeira, era hasteamento da bandeira, 15 de
novembro, a rádio estava presente, ia lá na Vila, ou às vezes, no Ginásio do Recreio,
ou lá na usina, aqui no Escritório Central, muitas solenidades eram realizadas.
O governo federal utilizou a emissora da CSN para veicular as propagandas sobre a
“Revolução de Março”. Abaixo fizemos a transcrição de três comerciais divulgados durante a
década de 1970. Em todos os anúncios há a comparação de ações que foram realizadas pela
chamada revolução, que de alguma maneira poderia ter melhorado a vida do brasileiro. Nas
três propagandas existe menção a paz instaurada, além de temas como controle da inflação e
progresso.
Antes de 64 quase todos os dias as greves fomentadas de cima paravam os navios do
porto, o caminhão e o trem na estrada, o estudo na escola e o trabalho na oficina.
Enquanto a dona de casa corria em pânico para o armazém já vazio, a inflação de
100% devorava a poupança do povo. Você que se lembra de isso tudo não se
70
esqueça, a Revolução de Março, sepultou esse tempo e assegura a paz para que
possa trabalhar. 80
Se analisarmos algumas das principais campanhas da Aerp/ARP (Assessoria Especial
de Relações Públicas), verificaremos a recorrência de certas temáticas, de certas idéias-força,
especialmente as noções de “construção” e “transformação” do Brasil (FICO, Carlos. 1997
P.125). O progresso também é um dos destaques das gravações veiculadas pela Rádio
Siderúrgica Nacional:
Em cada estrada que começa a levar a nossa colheita, em cada ponte que aproxima
as margens, em cada usina que nos dá mais força, em cada escola que se abre ao
amanhã, em cada novo teto que a nossa cria, na defesa da nossa forma de vida, a
vigília da paz que o progresso assegura, a Revolução cumpre o compromisso, honra
o seu compromisso com o povo brasileiro que há 6 anos a pediu nas ruas. 81
Os anúncios enalteciam as possíveis mudanças que o governo civil-militar teria
realizado. Mais uma vez o governo realça a importância do trabalho para o progresso do país:
Se você esqueceu tudo aquilo de mau que a Revolução de Março já baniu desse país,
veja na recuperação do Nordeste, no ICM despertando o município, no porto
funcionando como nunca, veja na inflação reduzida a menos que um terço, no
equacionamento do problema da habitação popular, veja no orçamento honesto e
realista, na garantia da paz, no respeito à família, veja na multiplicação das escolas,
na vida ressurgindo lá nos campos, na confiança do povo que no trabalho se
empenha para o progresso fazer. Veja um pouco do muito que já se fez de bom
depois de março de 64. 82
O “amor” foi um dos temas explorados pela campanha da Assessoria Especial de
Relações Públicas no Governo Médici. Como afirma Fico (1997):
O tema “amor” inspiraria uma grande campanha da Aerp: O Brasil Merece o Nosso
Amor. Ela, de algum modo, buscou vincular-se a uma frase de Médici
(possivelmente escrita por Octávio Costa) que dizia: “O amor à pátria é o silencioso
ofício de todo homem de bem” Iniciou-se em agosto de 1973 e contou com os
suportes que a Aerp/ARP comumente utilizava: filmes para a TV, jingles, adesivos
(com slogan e a Bandeira do Brasil) e um cartaz que mostrava muitas pessoas de
mãos dadas tendo ao fundo o mapa do país. (FICO, 1997, p. 125)
Além de anúncios narrados, o governo também veiculava músicas temáticas para
tentar fortalecer sua imagem:
O amigo merece um abraço, a planta merece o calor. A ave merece o espaço, o
Brasil merece o nosso amor. O Brasil é o esforço comum, com a união no trabalho e
valor. Vamos dar a mão agora, o Brasil merece o nosso amor. O trabalho semeia o
80
Anúncio de Rádio da Revolução – durante a pesquisa fiz a transcrição dos áudios dos discos de vinil que eram
enviados pelo governo para a Rádio da CSN. Arquivo da Fonoteca da Fundação CSN.
81
Anúncio de Rádio da Revolução – durante a pesquisa fiz a transcrição dos áudios dos discos de vinil que eram
enviados pelo governo para a Rádio da CSN. Arquivo da Fonoteca da Fundação CSN.
82
Anúncio de Rádio da Revolução – durante a pesquisa fiz a transcrição dos áudios dos discos de vinil que eram
enviados pelo governo para a Rádio da CSN. Arquivo da Fonoteca da Fundação CSN.
71
progresso. O progresso com ordem e amor. A paz o nosso povo merece. O Brasil
merece o nosso amor, o Brasil merece o nosso amor!
Algumas frases foram marcantes nos anúncios apresentados durante o Governo Médici
(1969-1974) na programação da rádio Siderúrgica “O amor ao Brasil é o silencioso oficio de
todo homem de bem. O amor ao Brasil é a união de todos nós na comunhão da paz e do
trabalho. O Brasil merece o nosso amor!” Com esses anúncios podemos notar que por ser uma
emissora estatal, era comum a divulgação do ufanismo nacionalista presente nos discursos
oficiais na programação da rádio da CSN.
O acervo da Rádio Siderúrgica Nacional é composto de programas, comerciais,
jingles, discursos, inaugurações e conferências e separamos alguns títulos para mostrar como
a emissora foi utilizada pelo governo. “Senado Federal – Abertura e encerramento” essa
gravação possivelmente foi a da Voz do Brasil que era apresentada também pela emissora.
Além dessa participação estão catalogados os seguintes discursos de políticos: os senadores
Domingos Velasco, Ferreira de Souza e Carlos Lindenberg. E ainda os discursos dos
deputados: Clemente Medrado, Ministro Paulo Martins (1966), Presidente Juscelino
Kubitschek na Cosipa, em março de 1966.
Listaremos agora algumas gravações institucionais que foram divulgadas pelo
Governo Federal na programação da Rádio Siderúrgica Nacional:

Institucional Aliança para o Progresso – 17 de março de 1967

Institucional Mobral – Movimento Brasileiro de Alfabetização – 1970

Institucional Aniversário da Revolução – Março de 1970

Institucional Aniversário da Revolução – Março de 1971

Campanha de Saúde Pública – Sucam 1971

Institucional Presidência da República – O Brasil é feito por nós – 1977

Institucional Gabinete Civil – Toda essa gente

Institucional Ministério de Guerra – Alistamento / Reservista / Convocação

Institucional Aniversário da Independência do Brasil

Institucional da Inauguração do Cemitério Parque Recanto da Saudade em Barra
Mansa

Institucional Semana da Pátria

Institucional do Primeiro Concurso de Oratória Estudantil

Institucional do Hospital Juscelino Kubitschek

Campanha da Agricultura – 90 milhões / Como o Governo / Aumente o volume /
às 5 horas da manhã / Quando você acordar / Você arou a terra?
72

Campanha de Serviço Público – Mórmons

Campanha Nacional Pro - Presidencialismo
Sobre o período da ditadura civil-militar o ex-funcionário Dário de Paula83 lembra
que:
Não dava principalmente informação regional, principalmente informação política.
Não tinha essa liberdade. Foi uma programação que era censurada, mas o que havia
era uma autocensura, a própria direção da rádio determinava as notícias que íamos
divulgar. Então naquela época o Jornal do Brasil que era um jornal que tinha mais
liberdade, entre aspas, o jornal, notícias do jornal nem sempre a rádio não podia
divulgar. O povo daqui não ficava sabendo de todas as informações possíveis e
imagináveis, embora a gente tivesse as informações, a gente não podia divulgar,
havia um processo de autocensura na rádio. (PAULA, Dário. Dário de Paula.
Depoimento [14 de julho de 2011] Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista
concedida pelo ex-funcionário de Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda)
Para o funcionamento do Estado de Segurança Nacional no governo do presidente
Ernesto Geisel (1974 -1978) era fundamental o controle da imprensa, rádio e televisão. O
Estado repressivo tinha que limitar a divulgação de informação ao público. “ocultar abusos de
poder e impor um silêncio que não só limite a oposição, como aumente o sentimento de
isolamento e medo necessário ao impacto de um estratégico de governo pelo terror”.
(ALVES, 2005, p. 256). Alves (2005) afirma que:
Desse modo, a censura foi amplamente utilizada para manter vastos setores da
população desinformados e, portanto, incapazes de participar politicamente de
maneiras efetivas. A censura feita de duas formas no Brasil: censura a priori, pela
qual a rede policial do Aparato Repressivo transmite ordens diretamente aos órgãos
de informação, proibindo a publicação ou transmissão de certos assuntos, fatos ou
opiniões, e a censura a posteriori, que envolve a proibição de venda de jornais e
revisas ou a transmissão de programas gravados na televisão ou no rádio. (ALVES,
2005, p. 256).
A Rádio da CSN explorou também a características dos radialistas na busca pela
divulgação dos seus interesses. O programa do apresentador Mauro Tanury, era possivelmente
um dos líderes de audiência da emissora e criava diariamente mensagens motivacionais para
os ouvintes, incorporando situações do cotidiano do operário. Em uma delas o locutor
destacava a felicidade de trabalhar:
Observa cada manhã é um novo dia. Renascer-te, sais-te mais uma vez da nebulosa.
Deus te renovou o pensamento do cérebro acesso. Retomaste a presença da luz. O
tempo te pertence. Pode se criar, analisar, despertar-te junto dos outros, tens o dom
de servir. Aceita a benção de pender, e a felicidade de trabalhar. Reinicia a tarefa
estampando um sorriso em suas páginas de bondade. Coloca otimismo e paz,
esperança e alegria em tua lista de doações para hoje. Age agora para o bem. Se
mágoas de ontem ainda te pesam na alma, procure esquecê-las. Se ofenderes alguém
83
DE PAULA, Dário. Dário de Paula: depoimento [4 de julho, 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista
concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda.
73
dispõe de sanar a falta cometida. Se alguém te feriu, perdoa sem condições. Olha os
quadros em torno, a vida de busca, a oficina da oportunidade te abre às portas.
Escolhe fazer o melhor que puderes, sai de ti mesmo e segue a diante para amar,
auxiliar, construir, e compreender porque Deus espera por ti. (TANURY, Mauro.
Mauro Tanury: depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de
Janeiro. Áudios extraídos de um cd do arquivo da emissora.)
Para integrar os funcionários a CSN realizava festas tradicionais e os espaços
poderiam ser reservados e o pagamento era facilitado. Um anúncio veiculado durante a
programação da emissora informa:
O Clube dos Funcionários para maior facilidade de seu quadro social colocará a
venda para o réveillon e carnaval a partir do dia 30 de novembro às 8 horas, no
Clube dos Funcionários. Esse ano parcelado. Música a cargo da orquestra de
Epaminondas. 84
Os clubes de Volta Redonda sempre realizavam diversas atividades para o
metalúrgico, mais uma vez vemos uma festividade para comemorar o aniversário da CSN:
Primeiro Festival de Cerveja interclube! Promoção do Umuarama oferecida aos
associados dos clubes regionais em homenagem ao jubileu de prata da CSN. Dia 3
de dezembro, a partir de 20 horas, no Umuarama. Na maior festa interclube já
realizada no Vale do Paraíba. Adquira o seu ingresso convite por Cr$5.000,00.
Primeiro festival de cerveja interclube, dia 3 de dezembro, no Umuarama.
Nos arquivos em áudio da Rádio Siderúrgica existem gravações que divulgam as
festas da CSN. A direção da empresa realizava o “Almoço da Amizade” para reunir
autoridades durante as festividades do dia 9 de abril.
3.3 – Divisão dos departamentos da Rádio Siderúrgica
O núcleo de rádio-teatro da emissora era composto de 30 atores e atrizes, alguns com
experiência em teatro, como Salim Jabour, Jane Martins e muitos outros. O Clube dos
Estudantes, apresentado pelo comunicador Darío Azevedo, foi importante para a introdução
da classe estudantil no mundo jornalístico. Cabia aos estudantes da rede pública e particular
produzir matérias, escrever histórias e participar de gincanas culturais transmitidos ao vivo
pelo programa.
A rádio passou a adotar métodos exploratórios para conquistar o ouvinte, segundo
Ortiz e Marchamalo:
A linguagem falada, ou seja, a palavra. A linguagem da música, também chamada de
linguagem das sensações. A linguagem dos sons e dos ruídos propriamente ditos.
Para alguns autores, a descrição desse tipo de comunicação coincide com a
84
Anúncio de Rádio sobre Réveillon e Carnaval da CSN – os empregados podiam parcelar o valor das mesas.
74
linguagem das coisas, e finalmente, a linguagem do silêncio (ORTIZ E
MARCHAMALO, 1994, p. 20).
De acordo com a programação da Rádio Siderúrgica as apresentações ao vivo, a
participação dos ouvintes por cartas, telefones e no auditório da emissora, unidos às técnicas
de criação dos efeitos sonoros davam a emissora (figura 7), subsídios para produzir conteúdos
parecidos com os das emissoras da capital.
Figura 7 – Um funcionário da emissora mostrado uma porta
cenográfica que era utilizada para emitir o som durante as radionovelas (Arquivo da Fonoteca da
Fundação CSN. Não há referência do autor da imagem, ano que foi tirada e de quem é o funcionário)
Os estímulos sonoros fazem efeito nos ouvintes de acordo com o tempo de exposição
ao rádio. Uma narração mais lenta pode causar angústia; o silêncio prolongado provocará
inquietação ao receptor. É nesse sentido que o rádio consegue se adaptar ao público, de
acordo com as sensações que ele transmite e o que realmente o público percebe. O rádio é um
veículo cego, dessa maneira a audiência é um fator muito subjetivo: cada ouvinte percebe seu
próprio cenário dos fatos ou da informação emitida (ORTIZ e MARCHAMALO, 1994, p.
21).
3.4 – A Rádio Siderúrgica e o esporte
Passaremos agora a sistematizar o radiojornalismo esportivo da Radio Siderúrgica
Nacional, importante no quadro de programação da emissora desde a sua inauguração até o
seu ultimo dia de transmissão. O setor esportivo da Rádio Siderúrgica Nacional trabalhou
75
constantemente em transmissões de eventos esportivos no Recreio do Trabalhador e também
em externas realizadas nos estádios de futebol de todo estado do Rio de Janeiro. O esporte foi
assunto constantemente apresentado na programação da emissora, desde a sua inauguração até
o seu último dia de transmissão. Sobre isso, o ex-funcionário da emissora Ronald Jarbas
registra:
Volta Redonda foi realmente uma praça, que proporcionou muito através da CSN,
investimentos sobre o esporte: basquete, voleibol. Volta Redonda teve a seleção
brasileira de voleibol, o basquete foi decacampeão do estado do Rio de Janeiro. Nas
datas de aniversário da fundação da CSN, a CSN promovia no Recreio do
Trabalhador jogos interestaduais, trazia times, por exemplo, Atlético Mineiro, Tupi
de Juiz de Fora, o Flamengo, Fluminense. Então aquilo que havia a possibilidade e
era tudo com portão aberto. Acho que é isso que levou o pessoal ainda estar hoje,
ainda estar acostumado aquela, o beneplácito de você poder ir aos acontecimentos
sem pagar nada. (R.J, entrevista ao programa Memória do Rádio, em 3 de agosto de
2007, Volta Redonda)
Em 1951, pensando em criar áreas de lazer para a população, a CSN inaugurou o
Recreio do Trabalhador com quadras de esportes, auditório e piscinas, onde era oferecido ao
trabalhador todo tipo de divertimento, desde torneios esportivos até festas, shows e maratonas
estudantis locais, destinadas a prática de esportes para os funcionários e sua família. O
Recreio do Trabalhador serviria para práticas esportivas dos funcionários que em seu tempo
de lazer estariam cuidando do corpo, e sabendo que o trabalho dentro da usina era pesado o
funcionário estaria em horário de descanso se preparando fisicamente para o trabalho.
Seguindo as mudanças que aconteceram durante a década de 30 em relação ao corpo e as
atividades físicas ligadas ao civismo. A família siderúrgica85 enquanto estava fora da empresa
descansava dentro de um projeto de lazer desenvolvido pela própria CSN, reforçando mais
uma vez o controle que ela fazia com os trabalhadores. (PARADA, p. 157, 2009)
Eram inúmeras e minuciosas as determinações que se faziam sobre aspectos da vida
social dos trabalhadores, envolvendo sua saúde, alimentação, habitação, lazer e vida
familiar, além, obviamente, da sua vida profissional. Só o trabalho podia constituirse em medida de avaliação do valor social dos indivíduos e, por conseguinte, em
critério de justiça social. Só o trabalho podia ser o princípio orientador das ações de
um verdadeiro Estado democrático, de um Estado “administrador do bem comum.
(PARADA, p. 157, 2009)
Como entretenimento para a massa, a prática desportiva era utilizada sob a forma de
lazer e competições. “Clubes e associações atléticas, desde o início do século, surgiam como
85
Família Siderúrgica – Planejada segundo as modernas cidades industriais americanas, Volta Redonda
pretendia ser o símbolo por excelência da integração da “família siderúrgica”, expressão pela qual os
documentos da diretoria da CSN designavam os laços que deveria ligar os trabalhadores à empresa. Adotando
uma política de festão da força de trabalho com traços “paternalistas”, a companhia controlava também a cidade,
administrando uma série de serviços urbanos. (FERREIRA, Jorge. O populismo e sua história: debate e crítica /
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. p. 301)
76
expressão das diversas comunidades-bairros, grupos de imigrantes etc., que floresciam no
ambiente urbano...” (PARADA, p.157, 2009).
Na cidade de Volta Redonda surgiram várias associações esportivas que tinham
aproximadamente 4.853 associados. Alkindar Costa ressalta que o desenvolvimento dessas
associações na cidade representava um movimento criado dentro da CSN:
Com a participação, entre outros, dos esquadrões do Gasômetro, Alto Forno, Central
de Ferro, Vila Operária e DAU-Transportes. O Clube dos Funcionários da CSN, foi
o primeiro Clube Social Esportivo a ser criado em Volta Redonda (19.02.1942)
seguindo-se a criação do Umuarama em 24.06.1942 e Aero Clube de Volta Redonda
em 01.04.1943. O Clube dos Funcionários da CSN se inscreveu na Liga de
Desportos de Barra Mansa, comprou uniforme e fazia uma seleção entre as equipes
da localidade, tendo como técnico Dorival Knippel, o conhecido Yustrich. Os
dirigentes de Clubes de Departamentos começaram a se insurgir contra a ASEA,
destacando-se entre os principais opositores, o Engº Rondon (presidente de um dos
Clubes da Usina), Hipólito Moreira e Hélio Maurey. Em razão do movimento, um
fato inédito foi registrado, visto que a Cidade de Barra Mansa passou a contar com
duas ligas desportivas, uma na sede e outra no 8º distrito (Volta Redonda). Em 03 de
maio de 1945, no Escritório DOM, reuniu-se o Conselho Deliberativo da ASEA,
com o fim específico de discutir o aprovar os Estatutos da LDVR que substituiria a
Associação. (COSTA, 2004, p. 451)
Mais uma vez a família siderúrgica demonstra sua hierarquização através do
mecanismo de controle da empresa. O Recreio do Trabalhador possuía campo de futebol e
pista de atletismo. A figura 4 mostra a equipe da Rádio Siderúrgica no local realizando a
transmissão dos eventos esportivos desenvolvidos pela CSN.
O comunicador Manuel Alves, de segunda à sexta, ao 12h 30 trazia as principais
informações do esporte da região Sul Fluminense, no Programa “Jogo Aberto”. Além desse
programa, havia também o programa “Bola Show” com duas edições diárias, comandado pelo
apresentador Edward de Carlos, conhecido como Edward Gangana. A área esportiva da
emissora tinha como lema a seguinte frase “Esporte uma velha mania. Um abraço fraternal. O
esporte une e cria novos amigos. Esporte é vida. Estamos vivendo um novo tempo. Vibrante,
cheio de emoção. O Show começa pela RS, a preferida de todas as torcidas”. 86
A aproximação da emissora acontecia nas instalações da própria emissora. Sobre a
estrutura Alkindar Costa enfatiza:
A “Rádio Siderúrgica” funcionou na Rua 100 nº 01 - Bairro Laranjal, com uma
potência inicial de 100 watts na antena, aumentada mais tarde - 1977 - para 1.000
watts. Tinha uma área de 500 m2 e registrava 3 estúdios, 3 sono-técnicas, 1 sala de
rádiojornalismo, 1 oficina de rádio-técnica, 2 salas de redação, 1 sala de discoteca, 2
auditórios (sendo um na própria emissora e outro no Recreio do Trabalhador),
refrigeração central e grupo gerador de reserva. Funcionava de 04:45 às 02:00 horas,
86
O áudio foi extraído do cd com depoimentos dos ex-funcionários da rádio Siderúrgica gravado em 31 de
outubro de 1985, pelo radialista Ronald Jarbas. Nesse cd há vinhetas e jingles da emissora.
77
ininterruptamente, atingindo uma área de 100 km, aproximadamente. Sua sintonia
era de 1.500 Kilohertz. (COSTA, 2004, p. 433)
Um dos primeiros locutores da Rádio Siderúrgica, Nélio de Andrade trabalhou na
emissora no ano de 1955 e destacou principalmente a cobertura esportiva da emissora:
Durante todo o tempo em que nós ali estivemos, embora com bastante dificuldade
para a realização de transmissões em especial, as externas, porque naquela época nós
não tínhamos, como hoje tem essa facilidade da tecnologia, naquele tempo para se
fazer uma transmissão esportiva, por exemplo, a gente teria que puxar cabo pelas
ruas de uma cidade, por exemplo, é me lembro ainda que nós estivemos lá em
Campos, no domingo para transmitir o futebol, nós iríamos necessitar de 150 metros
de cabo, passamos a trabalhar para puxar o cabo, arrumar um telefone emprestado
com alguma pessoa, e durante duas horas aquela pessoa ficava sem o telefone, e a
gente fazia a transmissão do futebol, sem saber que tinha transmitido, porque não
havia retorno, você falava muitas vezes você irradiava, mas esse jogo não chegava a
ser transmitido, porque você não tinha retorno não sabia se a rádio tinha entrado no
ar, era tudo na base do sinal. (N.A, entrevista ao programa Memória do Rádio, em 3
87
de agosto de 2007, Volta Redonda)
Ainda na área esportiva, a Rádio Siderúrgica tinha uma equipe especializada que fazia
as transmissões de diversos eventos. O radialista Dário de Paula começou na emissora com 10
anos de idade no programa de radionovelas Clube do Estudante. Sobre a atuação do radialista
o Jornal “O Lingote” destacou em reportagem:
Com 14 anos, Dário de Paula foi convidado para participar de uma transmissão
esportiva da Rádio, colaborando como locutor de pista. Saiu se tão bem que passou a
ser mais um membro da equipe esportiva. Aos 15 anos irradiou, pela primeira vez,
parte de um jogo de futebol. Dário trabalha na RSN há 8 anos, mas somente a partir
de 1963 passou a levar vida funcional exclusivamente na Rádio. Atua como
programador da RSN, quando necessário, gosta de música, principalmente a
moderna música brasileira. Não tem esporte preferido. Gosta de todas as
modalidades. No Rio de Janeiro é inveterado torcedor do Flamengo, e em São Paulo
é santista, por causa de Pelé. (O Lingote. Volta Redonda, 1965).
O esporte também não ficava de lado. Ao meio dia iniciava a “Coletânea Esportiva”
com cinco minutos de duração. O noticiário trazia as principais informações do esporte.
Havia, além disso, as notícias das competições esportivas desempenhadas pela CSN, na área
de lazer, conhecida como “Clube dos Funcionários”. O programa era no horário de almoço
dos operários e a maioria dos homens poderia assim acompanhar as notícias e informações.
87
ANDRADE, Nélio: depoimento [10 de agosto de 2007]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida
pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda ao programa Memória do Rádio,
produzido pela web rádio da Fundação CSN.
78
3.5 – Os principais radialistas da emissora
Faremos agora uma apresentação dos principais radialistas da Rádio Siderúrgica.
Vamos começar com o primeiro locutor da emissora, José Argemiro Madureira Neves, mais
conhecido como José Madureira (figura 8). Sua voz era considerada uma das mais bonitas do
rádio regional. Ele era o locutor de notícias da emissora e durante a carreira recebeu diversos
prêmios em reconhecimento ao seu trabalho. O radialista morreu no dia 8 de agosto de 2010.
Foi o responsável em fazer a abertura e encerramento oficial da emissora.
Figura 8 – José Madureira na Rádio Siderúrgica Nacional
A equipe de trabalho da emissora era composta de elementos ligados diretamente à
sociedade volta-redondense e que conseguiam através dos programas apresentados ganharem
prestígio junto à comunidade. O jornal “O Lingote” destaca essa relação da seguinte forma:
Desde o jardineiro e o mensageiro até a sua chefia. São todos homens que lutam
para vencer no seu “metier”, vale dizer se esmeram na confecção e apresentação dos
seus programas, para levar alegria e satisfação aos ouvintes”. (Jornal O Lingote de
1965).
O Jorge Negri conhecido como “Júlio Cezar” era o apresentador do programa
“Atendendo aos Ouvintes”. Ele também foi secretário da ZYP 26. Formado em contabilidade,
começou a trabalhar na CSN em janeiro de 1950. Foi arquivista, auxiliar de escritório na
Escola Técnica Padiacalógeras mantida pela CSN, onde foi professor de matemática. Ele foi
também auxiliar de administração no Departamento Hospitalar. Na emissora, Jorge Negri
participou também do programa “Coquetel Elegante”.88
Outro componente da equipe da rádio Siderúrgica foi Jair Tavares. Ele entrou para a
CSN em agosto de 1954. Depois foi transferido para rádio, trabalhou como atendente e atuou
também como operador de mesa de controle de som. Como na época não havia
88
Informações do Jornal O Lingote de 1965.
79
profissionalização do radialista um funcionário sem formação específica poderia assim ocupar
a função de um radialista. De alguma maneira, para trabalhar em rádio, o profissional
precisava ser versátil. Uma característica comum entre os ex-funcionários da Rádio
Siderúrgica é que eles passavam pelas diversas funções existentes no rádio para depois
conseguir apresentar um programa.
Nélio de Andrade (figura 9) foi narrador de futebol apresentando o programa Festival
P-26. Sua maior contribuição para a emissora foi quando assumiu a coordenação da rádio e
fez sua transição para um estilo mais popular em 1970. Nélio de Andrade comenta como foi
o período inicial na emissora:
Eu fui um dos primeiros, eu o Madureira, Ubirajara, inclusive a abertura da rádio,
abertura da inauguração da rádio foi feita pelo colega José Madureira, também hoje
afastado, mas ainda vivo, graças a Deus. Naquela época com grande público
presente lá nas instalações da rádio, porque o funcionário da Siderúrgica Nacional
tinha a rádio como..., tratava a rádio como nossa rádio, tinha uma adoração muito
grande pela rádio, e graças a Deus nós tivemos êxito, durante todo o tempo em que
nós ali estivemos.
Figura 9 – Nélio de Andrade narrando uma transmissão esportiva direto do Recreio do Trabalhador
Edward Gagana (figura 10) era conhecido na Rádio Siderúrgica como Edward de
Carlos. “Os colegas de trabalho acharam que o meu sobrenome não era bom para o rádio, e
como nessa época o Roberto Carlos já fazia muito sucesso, eles me batizaram de Edward de
Carlos”.89 Ele iniciou a carreira na emissora em 1964. Fez locução comercial e apresentou o
programa “Estúdio e Novidades”. Foi também discotecário, auxiliando na programação
musical da rádio. Além disso, também fez a apresentação dos programas “Rádio Boate”,
“Baile Maravilha”, “Lps da Semana”.
89
CARLOS, Edward. Edward de Carlos: depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de Janeiro.
Entrevista concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda para Ronald Jarbas.
80
Figura 10 – Edward Gagana
Em 1967, um programa de destaque na Rádio Siderúrgica, era o “Passeando pela
Discoteca” que ia ao ar todos os domingos com apresentação do radialista Dirceu Gonçalves.
O locutor realmente abria as portas da rádio e direto da discoteca fazia o programa, dando a
liberdade para que os ouvintes pudessem visitar as instalações da emissora para ver e ouvir o
a apresentação. Dirceu Gonçalves conta como era o programa:
O programa que eu trouxe lá de Minas, que era o Passeando pela Discoteca, o
programa esse que eu fazia de portas abertas, e muitas pessoas iam à rádio para ver
se realmente eu estava dentro de uma discoteca, e as pessoas iam lá. Aliás,
aconteceu até um fato interessante. Na época as pessoas pediam a música, estava no
auge, era “Cadeira de Rodas”, com Fernando Mendes. E no domingo deu mais de 60
pedidos daquela música, então eu combinei com o Celso, anunciei todos os nomes
direitinhos, fulano oferecendo para beltrano, e tudo mais e tal, e depois, começou a
tocar a música, o Celso abriu o microfone, e eu joguei umas cadeiras no chão,
derrubei uns objetos, e falei, olha a cadeira de roda desceu aqui a 60, quebrou
todinha, então a partir de hoje, eu não toco mais “Cadeira de Roda” com Fernando
Mendes. Foi o único modo de ficar livre daquela música e apenas mais uma
brincadeira com o público. (GONÇALVES, Dirceu. Dirceu Gonçalves. Depoimento
[8 de agosto de 2007] ao programa Memória do Rádio da Web Rádio da Fundação
CSN.
Um dos locutores da Rádio Siderúrgica que fez carreira internacional foi Ricardo
André Gardeazabal (figura 11). Ele morreu com 69 anos, no dia 8 de dezembro de 2008. Foi
locutor da Rádio NHK, do Japão, Voz da América, nos Estados Unidos e na África do Sul.90
90
Ricardo André – as informações foram do Jornal Foco Regional. Um semanário que circula na cidade de Volta
Redonda.
81
Figura 11 – Ricardo André, locutor que fez carreira internacional
Ubirajara Ramos foi o primeiro narrador esportivo da Rádio Siderúrgica em Volta
Redonda. Ele trabalhou em várias emissoras e jornais da região Sul Fluminense. O locutor
morreu em 2007. Sempre bem humorado, escreveu de próprio punho a sua nota de
falecimento, com espaço para ser inserido o dia e horário. Muito respeitado por todos os
profissionais da época, Ubirajara Ramos fez história na Rádio Siderúrgica com suas
transmissões esportivas. Pela emissora, ele anunciou, em 1975, a criação do Volta Redonda
Futebol Clube, time que disputaria o Campeonato Estadual representando a cidade do aço.
O redator das radionovelas da Rádio Siderúrgica foi Dario Azevedo. Ele escrevia os
roteiros do programa Clube do Estudante. Com o fim da emissora, Dario foi contratado pela
Rádio Sul Fluminense de Barra Mansa, onde ainda apresenta um programa de variedades.
O radialista Manuel Alves foi considerado um profissional que atuou praticamente em
todos os setores da emissora. Ele foi operador, redator, narrador esportivo, programador e
apresentador de programas. Manuel Alves foi considerado um dos programadores que mudou
o estilo da emissora no início da década de 1970, o que motivou ainda mais a sua
popularização. Ele trabalhou ainda na Rádio do Comércio e Rádio Sul Fluminense.
Um exemplo interessante da relação do ouvinte com a emissora de rádio é a trajetória
do radialista Uiara Araújo (figura 12). Ele era ouvinte da rádio Siderúrgica Nacional e um dia
tomou a decisão de ir à emissora para pedir emprego. Uiara não tinha experiência em rádio e
mesmo assim conseguiu ser funcionário da emissora. Em entrevista ao programa memória do
Rádio, o radialista explicou como foi a transformação de ouvinte em funcionário:
A minha entrada na rádio Siderúrgica Nacional é foi um fato assim que raramente
alguém vai iniciar a carreira como eu iniciei, eu era ouvinte, eu gostava de ouvir a
Sul Fluminense, e gostava de ouvir à tarde da Rádio Siderúrgica Nacional. E um dia
eu resolvi que estava na hora de tomar uma decisão na vida, uma infância difícil,
nada que me causasse nenhum tipo de trauma não, muito pelo o contrário. Eu
procurei o Dário de Paula que era o gerente da rádio Siderúrgica Nacional e ele me
82
disse: pois não. Ai eu disse que queria trabalhar aqui, ele me perguntou o que você
sabe fazer? Eu respondi: nada. Eu nunca entrei numa emissora de rádio. Ele disse:
então o que você quer? Me explica que eu não entendi. Eu falei que eu queria
aprender. Eu queria aprender para poder trabalhar. Eu nunca esqueci as palavras
dele. “Eu nunca neguei serviço a quem pede serviço. Se você quer trabalhar, você
acaba de ser contratado”. Ai ele me levou e eu comecei a trabalhar como operador
de áudio, sem nunca ter visto uma mesa de áudio na minha vida. (ARAÚJO, Uiara.
Uiara Araújo. Depoimento [20 de agosto de 2007] ao programa Memória do Rádio,
da Web Rádio da Fundação CSN.
Figura 12 – Uiara Araújo, ex-funcionário da Rádio Siderúrgica
O radialista Uiara Araújo conta que para crescer no rádio o profissional deveria passar
por todas as funções na emissora. Ele deveria conhecer o funcionamento da programação para
que depois pudesse ganhar um programa que levasse o seu nome. Segundo o radialista, essa
foi uma das maneiras que o rádio encontrou para ultrapassar uma de suas maiores crises com
o surgimento da televisão e em seguida das emissoras com Freqüência Modulada, as
chamadas FM´s:
O rádio tinha e até mantém essa característica, você tinha que passar por todos os
degraus para chegar a ter um programa que pudesse levar o seu nome. Eu acho isso
tão importante, tão bonito, que formou os profissionais que mantiveram o rádio
vivo, e que conseguiram passar o período mais crítico e difícil que foi o advento da
televisão e das emissoras de Frequência Modulada, que obviamente tem uma
qualidade de som superior, e o Rádio AM (Amplitude Modulada) se manteve
exatamente na base desse trabalho, porque nós passamos por todas as etapas que o
rádio permite você passar. (ARAÚJO, Uiara. Uiara Araújo. Depoimento [20 de
agosto de 2007] ao programa Memória do Rádio, da Web Rádio da Fundação CSN.
Sobre sua paixão com o rádio Uiara Araújo retrata como é a relação do locutor com o
veículo:
O rádio é essa paixão, você se aborrece, você briga, você fala que não vai voltar
nunca mais, ta na hora de aposentar... e basta acender a luz vermelha e você
descobre que é um apaixonado, é alma, é coração, é pele. O rádio é minha vida.
(ARAÚJO, Uiara. Uiara Araújo. Depoimento [20 de agosto de 2007] ao programa
Memória do Rádio, da Web Rádio da Fundação CSN.
83
A equipe da Rádio Siderúrgica era fundamentalmente formada por funcionários da CSN,
que já executavam outras tarefas na empresa. A Rádio Siderúrgica Nacional mantinha um
setor financeiro.
3.6 – O esvaziamento e o fim da Rádio Siderúrgica Nacional
Iremos agora analisar de forma crítica sobre os principais motivos que podem ter
contribuído para o esvaziamento e fim da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda.
José Madureira foi o locutor da inauguração oficial da Rádio Siderúrgica e também
ficou o responsável em fazer a última transmissão da emissora da CSN, no dia 30 de
dezembro de 1980. Nesse dia, ele se emocionou e chorou no ar em seu discurso, marcando o
término das transmissões Rádio Siderúrgica, depois de 25 anos de atividades.
As respostas para os reais motivos que levaram o fechamento da emissora são
variadas. Alguns dizem que o fim da Rádio Siderúrgica pode estar ligado ao crescimento da
televisão, e também ao aparecimento de outras emissoras AM91 e FM92, que disputavam a
audiência do mesmo público. Outro grupo defende que o que fez a empresa desativar a
emissora foi principalmente o fato de a CSN ter o interesse em reduzir os seus setores
deficitários. O produto simbólico transmitido pela emissora não gerava lucro. Ela pode ter
sido fechada, já que havia uma redução constante para a possível privatização. A CSN queria
ter todos os seus trabalhadores dedicados ao seu propósito principal que é produzir aço,
fazendo-os acreditar que eram co-responsáveis pelo desenvolvimento da nação. Com o passar
dos anos, a função da Rádio Siderúrgica de construir um sentimento de comunidade em torno
da empresa foi se perdendo, sobretudo, a partir dos anos 1970 e 1980. A relação trabalhadorempresa foi se redefinindo a partir da criação do Fundo de Garantia do Trabalhador Segurado,
FGTS, em 1966, e de conquistas através do sindicato. Nesse período, a CSN não precisava
mais ser um exemplo de empresa para a nação.
O aumento da dívida externa e a estagnação econômica fizeram da década de 1980 um
período perdido. Sobre isso, Santos (2003) explica que (2003):
A década de 1980 é conhecida como “a década perdida” porque não houve
crescimento econômico, inviabilizado pela “crise da dívida externa”, eclodia em
1982. A partir de então, o mercado financeiro externo se fechou para novos
empresários e ocorreu uma inversão dos fluxos financeiros, que se dirigiram dos
países desenvolvidos aos periféricos ou “economias emergentes”. (SANTOS, 2003,
p. 219).
91
92
AM – Emissoras de Amplitude Modulada
FM - Emissoras de Frequência Modulada
84
Essa crise econômica ocasionou a queda na renda dos trabalhadores do Estado do Rio
de Janeiro, como destaca Santos (2003):
Verifica-se que a diminuição de renda média fluminense foi quase três vezes
superior à observada no país: enquanto no estado do Rio de Janeiro o declínio
correspondeu a 21,33%, no Brasil o recuo foi de 8,4%. (...) Ou seja, a crise na
economia fluminense afetava muito mais negativamente os trabalhadores
fluminenses do que a crise nos demais estados do Sudeste e nos outros estados do
país afetava seus trabalhadores. (131,). (SANTOS, 2003, p. 131).
Com os efeitos gerados pela estagnação econômica, os trabalhadores da Companhia
Siderúrgica Nacional passaram a seguir uma tendência dos sindicatos do ABC Paulista e
adotaram, a partir dos anos 1980, medidas mais ousadas contra as condições precárias de
trabalho existentes nesse período. Rodrigues (2007) afirma que:
Os metalúrgicos de Volta Redonda acompanhariam pari passu a conjuntura
sindical nacional. Em fins dos anos 1970, eles começaram a tentar romper tanto com
uma prática sindical passiva, marcada pela liderança de setores “pelegos”, à frente
de sua entidade no pós -1964; quanto com as políticas da CSN, que em muito
prejudica os trabalhadores, sujeitando-os às condições de trabalho degradantes.
Será na década de 1980 que setores progressistas conquistam o sindicato,
modificando sua trajetória. Segundo relato de um dos militantes daquele período,
“nós não queríamos um sindicalismo de ficar distribuindo panfleto na porta da presa,
queríamos um sindicalismo de reunião, de contato com a base, então os ativistas
passaram a fazer o trabalho dentro da empresa... reunião nos locais de trabalho”
(RODRIGUES, 2007, p. 151).
Foi a partir da mudança no perfil dos líderes sindicais, por um lado, e o abandono do
trabalhismo e do nacional-estatismo pela ditadura civil-militar, por outro, que possibilitaram
com que os metalúrgicos adotassem novas ações em prol da conquista de benefícios e direitos.
Rodrigues (2007) cita que:
Foi com este tipo de perspectiva que a Oposição Sindical ganha o sindicato e passa a
geri-lo, ampliando a organização dos metalúrgicos acabou por desaguar em
sucessivos movimentos grevistas na luta por melhores condições salário e trabalho,
colocando o sindicato entre os mais ativos e aguerridos do interior do sindicalismo
da CUT. Não demoraria, inclusive, para que as diferentes concepções do que seria
“a melhor maneira de conduzir o trabalho sindical” se estabelecesse no interior da
chapa vitoriosa, promovendo um “racha” entre o que seriam “moderados” – que
foram afastados da diretoria, mas continuaram seu trabalho na base. De todo modo,
será essa gestão, que assume em meados dos anos 1980, aquela que realizaria a
primeira greve da história da CSN. (RODRIGUES, 2007, p. 151).
Como a década de 1980 foi marcada pela falta de crescimento econômico, os
movimentos sociais em Volta Redonda ganharam força principalmente em busca de direito à
moradia e à melhoria da qualidade de vida. Rodrigues (2007) conta que:
Entre tais movimentos encontramos o de moradia, de posseiros, de direitos
humanos, de associações de moradores etc. De marcada pujança política e
econômica frente aos demais movimentos populares, bem como de forte presença na
85
cidade, não tardou para que o sindicato dos metalúrgicos de Volta Redonda
assumisse proeminência e centralidade em termos dos movimentos sociais locais. A
própria conquista do sindicato por setores progressistas já aparecia como uma
ferramenta importante para os demais. (RODRIGUES, 2007, p. 151).
Em conjunto, esses movimentos sociais passaram a ter uma inserção maior e mais
profunda na cidade. As lideranças metalúrgicas utilizaram a estrutura que tinham para sediar
reuniões e encontros de organizações, para recurso de mobilização e divulgação etc. Eles
recebiam o apoio em termos de logística para suas operações específicas, como as sucessivas
greves que marcaram a cidade na época e mesmo no país. Tanto que nos anos 1980 formou-se
um fórum permanente que articulava todos os movimentos da cidade, com uma reunião na
Cúria Diocesana. Santana (2006) afirma que:
O sensível Ascenso sindical e popular dos anos 1980 pode ser representado de
diversas maneiras tanto nas sucessivas greves de metalúrgicos, quanto na vitória de
Juarez Antunes, que fora presidente do Sindicato e deputado federal, para a
prefeitura da cidade, como um dos mais votados da história do local. (SANTANA,
2006, p. 6)
3.7 – A situação econômica do município de Volta Redonda
A crise dos anos 1980 pesou de modo mais intenso sobre o setor público, já que ele
estatizou grande parte da dívida externa. O declínio da rentabilidade dos trabalhadores foi
registrado em Volta Redonda, que forma com o município de Barra Mansa uma base
econômica, constituindo o pólo metal-mecânico do Vale do Paraíba. Sobre isso Santos (2003)
destaca que:
As empresas estatais sofreram de modo particularmente grave no período
considerado. Nessas condições, os indicadores do empobrecimento observado em
Volta Redonda e em Barra Mansa refletem a crise, pois a CSN, sendo uma grande
empresa estatal de um setor tradicional, liderava a economia local, ativando-a nos
períodos de expansão, mas debilitando-a quando perdia dinamismo. (SANTOS,
2003, p. 131).
É curioso observar que o melhor e o pior desempenho em termos de nível médio de
renda foram produtos de impactos derivados da presença de entidades públicas, uma vez que
tanto a Petrobras quanto a CSN eram empresas estatais na década de 1980. A primeira,
entretanto, gozava de uma autonomia administrativa e financeira que não era desfrutada pela
segunda. Essa autonomia, associada à situação conjuntural que implicava a contradição de
importações das circunstâncias. Santana (2003) cita que:
A década de 1980, caracterizada pela abertura política e pela transição democrática,
pode ser considerada um período de ressurgimento, mobilização e ascensão do
movimento dos trabalhadores, reintroduzindo este importante ator na cena política
nacional. Como é mostrado em diversos estudos sobre este período, o pioneirismo
86
deste movimento se deve aos operários do ABC paulista. A famosa greve de 1978,
na região industrial mais importante do país, abriu caminho para diversas outras
paralisações e semeou a mobilização dos trabalhadores nas outras regiões
(SANTANA, 2003, p. 1).
Após a greve de 1978, no ABC Paulista, tornaram-se possíveis outras mobilizações,
em um processo que se consolida e amplia com as greves de metalúrgicos em 1979 e 1980, às
quais, em volume ainda maior que a anterior, se incorporam outras categorias (bancários,
petroleiros, professores, etc.) em todo o país, em uma verdadeira ascensão da classe
trabalhadora brasileira (SANTANA, 2003).
Há uma grande quantidade de estudos publicados sobre este movimento social na
região de São Paulo, dada sua importância e precedência. Desde seu surgimento, despertou a
curiosidade de pesquisadores que produziram uma extensa bibliografia sobre o tema. Alguns
estudos dão conta deste processo no Estado do Rio de Janeiro. Um dos movimentos mais
importantes ocorreu em Volta Redonda com os trabalhadores da Companhia Siderúrgica
Nacional (CSN).
3.8 – A trajetória da rádio e os impactos que podem ter contribuído para o fim da RS
Uma das expectativas da Rádio Siderúrgica em 1955 era o fenômeno que aparecia na
época, o rádio a pilha, que estaria muito mais próximo das pessoas como destaca a reportagem
do Jornal O Lingote:
Trata-se de uma penetração diferente, porém, condicionada por fatores novos de
vivência. Quem já não observou o fenômeno do rádio de pilha? No Maracanã, por
exemplo, dezenas de milhares de espectadores vão assistir a uma pugna de futebol
mas não dispensam o rádio a pilha, que trazem colocado ao ouvido. O hábito de ouvi
rádio em família, de antigamente, deslocou-se para a praça pública, às vezes para o
local de trabalho ou para atividades transitórias, tais como viajar de automóvel,
repousar em casa de campo, fazer piquenique, etc. A RSN encara este fenômeno
como de suma importância para as suas atividades. (O Lingote. Volta Redonda,
1965)
A Rádio Siderúrgica Nacional divulgava principalmente as ações da CSN e, por isso,
foi necessário que a emissora adaptasse seu estilo com programas de utilidade pública. Ainda
nas décadas de 1950 e 1960, ela era o principal veículo de comunicação com os operários.
Nunes (2000) explica que:
A “época de ouro” do rádio entraria em declínio com o surgimento da televisão no
Brasil, em meados dos anos 50. Os anos 60 se caracterizaram pela luta que o rádio
travou com a televisão para não desaparecer da cena pública. As principais
características deste período foram os programas de utilidade pública e ampliação do
rádio “vitrolão”, ou seja, emissoras que tocavam apenas música. Aliás, data dos 60 o
87
surgimento das primeiras emissoras em FM, 93 que deram prioridade, inicialmente, à
música ambiente. (NUNES, 2000, p. 61)
Com o avanço da televisão na década de 1960, o rádio perde os seus principais
anunciantes que migram para a televisão. Cyro CESAR (2005) destaca que:
“Com a perda de prestígio por parte do veículo na década de 1960, provocada em
parte pelo advento da TV, que passa a disputar parcelas significativas do bolo
publicitário, e também por causa da queda no padrão de qualidade técnica das rádios
AM, o meio radiofônico vive um período de estagnação”. (CESAR, 2005, p. 201)
Com essa crise, os donos das emissoras ficaram preocupados com as perdas de
recursos no faturamento. “A situação incomodava a maioria dos empresários, acostumados a
obter lucros com estratégias gerenciais intuitivas que, até então, haviam garantido o sucesso
das emissoras. O início da década foi marcado pelo desânimo e pessimismo dos empresários
de radiodifusão, que ainda deixavam o rádio no fundo do poço – mas os proprietários de
emissoras de rádio redescobrem o veículo.” CESAR (2005, p.201) O que pode ter sido um
estímulo para o rádio nesse período é que os produtores passam a desenvolvê-lo para o
coletivo, mas com personalidade individual.
O outro indicador da popularização do rádio na década de 1960, ou até mesmo da
banalização da sua presença nos grandes centros urbanos, pode ser visualizado em
uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Opinião Pública (Ibope) sobre o potencial
efetivo dos mercados carioca e paulista para as utilidades domésticas. Nessa
pesquisa, o rádio foi simplesmente excluído: foram apuradas a existência de
aparelhos de TV, colchões de mola, máquinas de lavar roupa, refrigeradores,
liquidificadores e enceradeiras, ou seja, como o rádio já era presença constante nos
lares brasileiros, não servia como indicador de renda. Da mesma forma, ainda em
1960, o Ibope realizou uma pesquisa sobre a forma por meio da qual os habitantes
de Belo Horizonte conhecerem a loja Ducal e 73% dos entrevistados responderam
que tal conhecimento havia sido por anúncios de rádio, seguido de 18% que o
fizeram por jornais e 12% pela televisão. CESAR (2005, p.203)
Na década de 1970 surgem as primeiras emissoras em FM. Havia uma busca pela
interiorização do rádio, que só poderia ser feita com novas emissoras com alcance restrito a
cidades. CESAR (2005, p. 203) esclarece esse processo:
A década de 1970 começa marcada por um fato novo: o interesse do governo militar
em interiorizar o rádio, a fim de cobrir as chamadas zonas de silêncio. A ação
governamental, no entanto, foi orientada por objetivos políticos. A FM fazia parte de
uma estratégia de interiorização da radiodifusão. O alcance reduzido de suas ondas
possibilitava a instalação de emissoras em todos os municípios, principalmente em
áreas às quais as rádios AM não chegavam. Essa idéia foi recebida com certa
resistência por parte dos empresários de comunicação, pois tratava-se de uma
freqüência de alcance territorial limitado e, conseqüentemente, de público bastante
reduzido. (CESAR, 2005, p. 203)
93
Até então, o rádio só operava através das freqüências de onda média (AM).
88
Os países chamados à época de Terceiro Mundo estavam consumindo cada vez mais
música pop comercial, o que pode ter contribuído com o crescimento das emissoras FM na
década de 1970. Hobsbawm (1995) define que:
Da década de 1960 em diante, as imagens que acompanhavam do nascimento até a
morte os seres humanos no mundo ocidental – e cada vez mais na urbanização do
Terceiro Mundo – eram as que anunciavam ou encarnavam o consumo ou as
dedicadas ao entretenimento comercial de massa. Os sons que acompanhavam a vida
urbana, dentro e fora de casa, eram os da música pop comercial. (HOBSBAWM,
1995, p. 495).
Havia carência de aparelhos de rádio receptores que pudessem ser adquiridos pela
população. Os aparelhos na maioria das vezes eram caros e importados. Mas essa visão foi
modificada em relação à política de distribuição e liberação do governo. CESAR (2005, p.
203) justifica que:
A frequência modulada teria fracassado no Brasil se a indústria não tivesse
contribuído com a produção de equipamentos transmissores e receptores mais
baratos. Isto fez que o Brasil chegasse ao final da década com mais de 85% da
população brasileira tendo fácil acesso ao rádio, marca sequer atingida no seu
período de maior prestígio. A FM abre um novo e vastíssimo campo para a expansão
do rádio com a pioneira experiência da Difusora FM, em São Paulo. (CESAR, 2005)
O aumento da concorrência com os demais meios de comunicação e o próprio
fenômeno da FM obriga o rádio a criar novas alternativas de programação. “O rádio descobre,
com nitidez, que sua grande opção é a segmentação em todos os níveis: geografia, de público
consumidor, de gênero de programa. O sucesso começa novamente a visitar o rádio”.
(CESAR, 2005, p. 203)
Cresce a quantidade de estações em todo o Brasil, e, já na segunda metade dos anos
1970, uma nova fase de grande incremento começa a ser vivida pelo rádio brasileiro com a
enorme expansão das emissoras FM e o contínuo e acelerado processo de reestruturação da
programação, além da busca pela segmentação. CESAR (2005, p. 205) esclarece esse
processo:
O governo Geisel deu início à fase de abertura do país, chamada distensão lenta e
segura. O país entrou em um período de democracia social, idealizado e gerenciado
pelo General Golbery do Couto e Silva. Em 1975 o Ministério das Comunicações
detectou a existência de 101 emissoras transmitindo em FM no país, das quais 37
não tinham licença para atuar. De 1975 a 1980 a indústria nacional produziu 22
milhões de aparelhos de rádio, sendo 6 milhões com faixa de FM. (CESAR, 2005, p.
205).
89
O Ministério das Comunicações em 1975, durante o governo do presidente Ernesto
Geisel abre espaço para o surgimento das emissoras FM94, o que poderia indicar o início da
crise das emissoras AM, já que o som dessas emissoras tem qualidade reduzida. A Rádio
Siderúrgica Nacional funcionou em freqüência 940 Mhz, em AM. As novas emissoras em FM
não davam destaques para as notícias e se dedicou mais a tocar músicas, sem muitas
intervenções dos locutores.
Durante a ditadura militar, o rádio mudaria inteiramente de perfil. Com a expansão
do rádio FM a partir dos anos 70, e a censura imposta pelo autoritarismo vigente, o
rádio tornou-se um veículo voltado preponderantemente para o entretenimento e o
lucrativo negócio musical, coordenado pelas gravadoras nacionais e estrangeiras. A
informação já não era mais prioridade. O rádio comercializou-se , empobreceu,
perdeu espaço no cenário político. (NUNES, 2000, p.5)
A tendência preponderante, nos anos 70, foi a formação de redes de emissoras
comerciais de rádio e a intensificação da especialização, com a segmentação do mercado
(ORTRIWANO, 1985: 24 a 28). As emissoras passaram a ter como público alvo
determinadas faixas socioeconômico-culturais, procurando dirigir-se a elas e buscando sua
linguagem nos próprios padrões das classes que desejavam atingir como segmentos de
mercado.
O rádio no Brasil começa a se transformar ainda mais na década de 1980. Influenciado
pelo modelo popular norte-americano, surgiram locutores mais descontraídos, cativando ainda
mais o público. O rádio em FM era mais do que uma variação tecnológica, a freqüência
modulada revolucionou o rádio brasileiro a partir do momento em que consegue ganhar a
atenção dos jovens, que resgatou novamente os recursos financeiros ao rádio, que perdia
espaço para a TV na disputa por verbas publicitárias.
Na década de 1980, as rádios FM passaram a receber 80% dos recursos publicitários
de agências destinadas ao rádio. As perspectivas de segmentação apresentaram-se
mais exploradas e asseguram um extraordinário potencial de crescimento para o
meio. O domínio cada vez maior da melhor linguagem do rádio produzia programas
mais atrativos, que não se limitavam a tocar três, quatro ou cinco músicas seguidas e
anunciá-las com voz impessoal. O rádio começava a se estruturar em associações e
redes, unindo forças, somando talentos, maximizando investimentos,
compartilhando experiências, crescendo de importância. (CESAR, 2005, p. 206).
Mesmo com o crescimento do rádio nessa freqüência não houve transparência nos
processos de concessão e distribuição de emissoras no país, Cesar (2005) revela que:
94
FM – Frequência Modulada – A radiodifusão em freqüência modulada sucedeu a declaração de Armstrong em
1936, na qual ele demonstrava que a FM tinha muitas vantagens sobre o AM para fins de radiodifusão. Consiste
num sistema que requer considerável largura de faixa por canal e não poderia, portanto, ser usadas nas faixas
então existentes. Por conseguinte, é possível a operação de canal comum desde que os transmissores sejam
espaçados geograficamente entre si. Ou seja, as cidades poderiam ter várias emissoras FM prejudicando assim a
concorrência com as emissora AM que tem o som com qualidade ruim.
90
No entanto, o processo de concessões de canais nessa época começa a assumir uma
mentalidade de natureza polêmica: o critério político de sua distribuição. O método
utilizado pelos governos militares e pelos presidentes da Nova República levou os
radiodifusores a dividirem-se em dois grupos: os empresários, que viviam para
autopromoção ou divulgação de suas crenças.
Esse passou a ser um dos problemas mais relevantes do rádio durante essa década,
pois as concessões passaram a beneficiar pessoas que não pertenciam ao ramo da
comunicação, que não possuíam o menor compromisso com a função social das
emissoras. A concessão de novos canais foi transformada em moeda corrente no
Congresso Nacional, circulando entre protegidos do poder e políticos. Foi
amplamente usada como meio de cooptação política ou mesmo em negociatas que
envolviam benefícios e privilégios durante o governo dos presidentes João
Figueiredo e José Sarney. (CESAR, 2005, p. 206).
Entretanto, esse método também teve seu lado positivo para o veículo, na década de
1980, possivelmente foi a maior expansão do rádio em toda a sua história.
Mesmo com todo o crescimento do rádio, ficou cada vez mais difícil disputar com a
televisão. Justamente na década em que a Rádio Siderúrgica foi fechada a televisão cresceu
fortemente. Eric Hobsbawm (1995) explica a força da televisão:
A televisão jamais se tornou tão prontamente portátil quanto o rádio – ou pelo
menos perdeu muito mais, comparativamente, com a redução que o som -, mas
domesticou a imagem em movimento. Além disso, embora um aparelho de TV
continuasse sendo mais caro e fisicamente desajeitado que um rádio, logo se tornou
quase universal e constantemente acessível mesmo para os pobres de alguns países
atrasados, sempre que existia uma infra-estrutura urbana. Na década de 1980, cerca
de 80% de um país como o Brasil tinha acesso à televisão. (HOBSBAWM, 1995, p.
484)
Fizemos até aqui uma apresentação da evolução do veículo no país que de alguma
forma influenciou no enfraquecimento da Rádio Siderúrgica Nacional. Ela que era uma
emissora AM perdia força com os concorrentes que chegavam principalmente com som de
qualidade e estilo de locutores mais soltos.
3.9 – O fim da Rádio Siderúrgica Nacional
No dia 31 de dezembro de 1980, a Companhia Siderúrgica Nacional enviou
comunicado para a equipe da Rádio Siderúrgica para que fosse anunciada o fim das
transmissões da emissora. Para os locutores, provavelmente esse fato foi o mais difícil de ser
noticiado. Para analisar como foi esse impacto para esses profissionais e moradores da cidade
de Volta Redonda, analisamos o depoimento dos radialistas que trabalharam na emissora.
Marialva Barbosa (2008) define essa difícil tarefa do historiador:
Ao reconstruir no presente, a partir do rastro que o passado deixou como marca,
coloca-se também em cena a questão memorável. Haverá sempre algo esquecido e
algo lembrado nesse passado reatualizado. Mais do que a questão do objeto
91
memorável, há que se pensar, pois, na dimensão do esquecimento que essas
emissões evocam. (BARBOSA, 2008, p. 94)
A nota de encerramento da Rádio da CSN não explicou os motivos reais que levaram
o fim da emissora. Vemos claramente a preocupação do locutor de que a emissora caísse no
esquecimento. A leitura da nota foi feita pelo radialista José Madureira:
Mais um ano se avizinha. Todas as esperanças se renovam em busca de dias
melhores. De muitas realizações. No entanto todos nós da Rádio Siderúrgica não
podemos comungar dessa mesma esperança, porque a partir de amanhã, nosso
prefixo não mais ressoará para os nossos ouvintes. (MADUREIRA, José. José
Madureira: depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de Janeiro.
Entrevista concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta
Redonda para Ronald Jarbas).
Barbosa (2008), citando Ricoeur (2000), define os tipos de esquecimentos que
existem:
Por outro lado, há que se considerarem as múltipas possibilidades de esquecimento o
que faz com que alguns autores proponham uma tipologia do esquecimento
(pragmática), estabelecendo níveis diferenciados, mesmo em relação ao chamado
esquecimento profundo: esquecimento por apagamento de restos; por persistências
de restos; e em decorrência da memória. A uma memória impedida corresponderia o
esquecimento produto da narrativa; e aos usos e abusos da memória corresponderia
o esquecimento comandado, numa dimensão institucional. (BARBOSA, 2008, p. 95)
A fala de José Madureira é ainda mais valorizada, já que ele também foi o responsável
em ler a nota de abertura da emissora em 1955 e tinha assim uma ligação muito forte com a
Rádio pela função desempenhada durante esses anos na emissora. Uma mensagem que caiu
em um esquecimento de muitos ouvintes que viveram esse momento e ficou registrada em
áudio. A nota segue da seguinte forma:
Como é triste a despedida, pois é um pedaço da gente que se vai, nós que
partilhamos dessa rádio, vivemos como se fosse a nossa própria vida. Tanto nos
momentos de alegria e tristeza, daquilo que falamos com entusiasmo e felicidade, e
também dando as informações que muitos ouvintes não desejavam ouvir, no entanto
éramos obrigados a fazer. Cumprimos com o nosso dever e sem falsa modéstia,
podemos afirmar com a maior dignidade, respeito e sempre com espírito
profissional.
Agradecemos a Deus a oportunidade que recebemos por essa onda amiga da RS. Em
conhecermos pessoas, em aumentar o nosso relacionamento, uns pessoalmente,
outros que apenas se mantiveram restritos através do rádio, porém o suficiente para
sentirmos que cumprimos o nosso papel de comunicador. Nesse momento que já se
tornou saudade, iremos enviar a todos que ao longo desses anos nos prestigiaram,
com sua audiência principalmente no esporte, todo o nosso afeto, e elevando o nosso
pensamento ao bom Deus, que derrame suas bênçãos sobre todos os lares,
procurando abrir os corações para brotar mais amor entre as pessoas. Buscando
suplantar o egoísmo e a inveja tão maléficos nos nossos dias. Deixamos aqui o nosso
abraço fraterno e do fundo do coração, o nosso muito obrigado, apenas sentido em
não poder encerrar os nossos trabalhos repetindo, até amanhã se Deus assim o
permitir. (MADUREIRA, José. José Madureira: depoimento [31 de dezembro de
1980]. Volta Redonda, Rio de Janeiro).
92
O texto faz referência a uma “onda amiga da RS”, ou seja, os locutores resumem nessa
mensagem final que havia um clima harmônico entre os ouvintes da emissora e esse processo
terminaria com o fim das transmissões da Rádio Siderúrgica. O que pode ter impactado ainda
mais a todos aqueles que estavam envolvidos com a emissora foi o período em que aconteceu
o término das transmissões, justamente no último dia do ano, uma quarta-feira, que tinha o
clima de renovação com a chegada do novo. O radialista Mauro Tanury estava no momento
em que a emissora foi fechada, enfatizou: “Eu estou perplexo, tenso e até decepcionado com
esse presente de fim de ano, presente de grego” 95, a CSN havia dado um presente de mau
gosto para um grupo extenso formado por metalúrgicos-ouvintes96, locutores e principalmente
o público em geral. A edição do jornal Diário do Vale, de 8 de agosto de 2010, tenta explicar
um dos motivos para o fechamento da emissora que seria a inicialização do processo de
privatização da empresa:
José Madureira teve uma carreira repleta de episódios notórios. Na última
transmissão da Rádio Siderúrgica, que acabou desativada em 1980, quando a CSN
iniciava o processo para sua privatização, Madureira chegou a chorar durante sua
locução. (Reportagem do jornal Diário do Vale. Volta Redonda, 8 de agosto de
2010).
Mauro Tanury, radialista que também trabalhou na emissora, expõe sua revolta com a
desativação da rádio da CSN:
Parece mentira, é duro de acreditar, depois de 17 anos como radialista, 10 anos na
Rádio Siderúrgica Nacional eu tenha que ocupar esse microfone agora, para o último
contato com você ouvinte, e o que é pior, por força da desativação desse veículo.
97
Não sou eu que estou lhe deixando ouvintes, é a rádio que depois de 27 anos de
prestação de serviços à comunidade é que está nos deixando, a mim e a você.
(TANURY, Mauro. Depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de
Janeiro).
Mauro Tanury estava certo. Ele, os ouvintes e os demais componentes da emissora não
aceitavam o término das transmissões da Rádio Siderúrgica. Mas mesmo com toda a revolta
por aquele episódio, eles não conseguiram convencer a direção da empresa voltar e rever a
decisão de finalizar as transmissões.
A ouvinte Neiva Carvalho, hoje com 70 anos, fala sobre o fim das transmissões da
Rádio Siderúrgica Nacional:
95
TANURY, Mauro. Mauro Tanury: depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de Janeiro.
Entrevista concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda para Ronald Jarbas.
96
Metalúrgico-ouvinte – utilizaremos esse termo para falar especificamente do público alvo da emissora, o
operário da CSN.
97
27 anos – A informação de Mauro Tanury está incorreta. A rádio funcionou durante 25 anos, prestação de
serviços à comunidade, de 1955 a 1980.
93
Foi uma mudança muito radical quando acabou essa rádio, foi muito triste
principalmente para os ouvintes, nós tínhamos hábito de ligar na rádio. Sempre
gostei muito de ouvir, porque naquele tempo tinha aqueles discos, e ali a Rádio não,
você vai direto, você vai trabalhando, tudo que você vai fazendo e a rádio vai
anunciando, dando notícia, e também entrando com as músicas que é muito bom
para gente. (CARVALHO, Neiva. depoimento [14 de dezembro de 2011]. Volta
Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pela ouvinte Neiva de 70 anos, da
Rádio Siderúrgica Nacional)
A decisão da CSN em fechar à emissora gerou um sentimento de indignação dos
locutores, como não poderia ser diferente, eles que não entendiam porque a empresa deveria
extinguir a rádio. Edward de Carlos fala sobre a lembrança98 que tem de como surgiram os
boatos sobre o fechamento da Rádio Siderúrgica Nacional:
Essas coisas começam de zum zum zum. Estão falando que vão fechar a rádio. Vão
fechar não é de interesse mais, a rádio agora, a CSN não se interessa mais, o futuro
da CSN é produzir aço. E começou assim até que chegou a época, se não me engano
o presidente da CSN era o Jorge Leonardo, se não me falha a memória. E ai foi
nesse período que falaram, vai fechar mesmo, não há o interesse mais, e outras
emissoras estão aí. A companhia está sendo preparada para mudar completamente.
Apesar dos apelos ninguém... ouviu. (CARLOS, Edward. Edward de Carlos.
depoimento [4 de dezembro de 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista
concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda).
Além do conceito de “família siderúrgica”, a rádio divulgava também que os ouvintes
faziam parte da “família RS”, que era possivelmente composta pelos integrantes da equipe da
Rádio Siderúrgica. Para analisar essa idéia temos a citação de Mauro Tanury99, que destacou
“você ouvinte também membro dessa família, família RS, tenho certeza que também não se
conforma com essa triste realidade. A Rádio Siderúrgica Nacional vai nos deixar”.
No dia 1 de janeiro de 1981, a emissora iniciou uma programação sem intervenção de
locutores, apenas transmitindo músicas. Se realmente o fim da emissora estiver ligado ao
processo de privatização da CSN, os políticos e demais autoridades da cidade e região que
apoiavam a idéia não iriam se envolver para evitar fim da Rádio Siderúrgica. Esse ponto
também foi apresentado por Mauro Tanury:
Outra grande decepção, poucas foram as pessoas, autoridades principalmente e
políticos da região que poderiam fazer alguma coisa, que lutaram em favor da
permanência desse prefixo, poucas foram as pessoas que realmente demonstraram
essa vontade, a maioria assistiu de braços cruzados o fim uma rádio que dentro
desses 27 anos procurou informar veiculando notícias, músicas e prestando serviços.
98
Lembrança: Maria Barbosa citando Ricoeur (2000) “A lembrança é sempre uma espécie de imagem que se
produz sobre o passado, completada pela imaginação que remonta formas que escapam nessas imagens. Lembrar
é sempre atualizar, vivenciar uma imagem. O que leva ao passado é o que se imagina como imagem desse
passado no presente”. (BARBOSA, 2008, p. 94)
99
TANURY, Mauro. Mauro Tanury: depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de Janeiro.
Entrevista concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda para Ronald Jarbas.
94
Assistiram de braços cruzados, e friamente a cidade perder sua voz. (TANURY,
Mauro. Depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de Janeiro).
As manifestações dos ouvintes contra o fechamento da rádio aconteceram, mas não
conseguiram fazer a CSN recuar com a decisão de terminar com os serviços da emissora.
Edward de Carlos, afirma que:
Quando a rádio saiu do ar em 80, se não me falha a memória, nós tivemos assim
muitas manifestações de pessoas que ligaram para lá, puxa vida. Pessoas que
tentaram interceder junto à direção da empresa para que mudasse, não fechasse a
rádio. Porque a rádio tinha audiência ainda até no último dia. A rádio competia de
igual para igual com as outras emissoras. (CARLOS, Edward. Edward de Carlos.
depoimento [4 de dezembro de 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista
concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda).
Outro motivo sobre o fim da Rádio Siderúrgica foi apresentado pelo radialista Edward
de Carlos, chefe da equipe de esportes da rádio. Para o radialista, a rádio havia perdido a sua
finalidade, por isso, foi fechada:
A finalidade da rádio siderúrgica era entretenimento. Foi por esta razão que depois
ela veio a ser desativada. Vieram outras emissoras, vieram televisões, então ela
perdeu a sua finalidade. Ela não tinha fins lucrativos. Ela tinha fins e finalidades
sociais. Então acabou a finalidade social, a empresa passou a se interessar mais pelo
lado financeiro porque ia ser privatizada. E ela foi finalizada. (CARLOS, Edward.
Edward de Carlos. depoimento [4 de dezembro de 2011]. Volta Redonda, Rio de
Janeiro. Entrevista concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de
Volta Redonda).
O depoimento de Edward de Carlos é coerente já que a emissora em 1955 não
disputava audiência com outros veículos. Com o passar dos anos foram surgindo outros
meios. A televisão principalmente na década de 1980, tinha uma audiência muito forte, por
isso, a Rádio da CSN pode ter perdido eficácia e não tinha mais motivos para a empresa
manter em funcionamento um veículo sem expressão junto à direção da empresa e ao público.
O ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional Manuel Alves comenta como foi o
processo que levou o fim das transmissões da emissora:
Até que a CSN iniciou o processo de privatização na década de 1980, e assim
começaram a definhar o fim da rádio. O fim da rádio tem um nome, General Odir,
esse general veio para a empresa na época, porque iniciava-se um enxugamento da
empresa. Então o que ele fez. Fez um trabalho dentro da Companhia Siderúrgica
Nacional extinguindo todos os departamentos deficitários, e deixando apenas
aqueles produtivos, para que a empresa começa-se a ser enxugada para que
futuramente ser privatizada. Então quando ele viu lá, DRD, era o departamento que
não tinha lucro, apenas gastava. Ele sem saber, não sei se ele não sabia. Ele resolver
extinguir o DRD, só que o era o Departamento de Rádio Difusão. Então acabou-se a
rádio. (ALVES, Manuel. Manuel Alves. Depoimento [31 de dezembro de 1980].
Volta Redonda, Rio de Janeiro).
95
Uma das indagações que podemos fazer sobre o fim da radio é a questão levantada
pelo ex-funcionário Manuel Alves de que a rádio foi fechada porque não dava lucro. Será que
o DRD – Departamento de Rádio Difusão foi fechado pela direção da empresa sem o
conhecimento prévio de que se tratava da emissora de rádio da CSN? É bem provável que
não, já que para uma emissora ser fechada, era necessário ter a autorização do DENTEL,
Departamento Nacional de Telecomunicações. Mas mesmo assim a CSN, no dia 31 de
dezembro 1980 neutralizou as ações do DRD, impossibilitando o funcionamento da emissora.
Desprestigiada pela direção da CSN a partir de meados da década de 1970, a Rádio
Siderúrgica - constituída como um departamento dentro da empresa - entrou em
declínio. Deficitária, acabou sendo fechada pela CSN estatal. A empresa se
ressentiria da medida justamente na época da privatização da companhia, por não
dispor de um canal direto com seus empregados. Roberto Procópio Lima Netto,
presidente que conduziu a empresa na passagem do estado para a iniciativa privada,
certa vez chegou a declarar: "O fechamento da rádio foi uma das maiores burrices já
cometidas na CSN". (Reportagem do jornal Foco Regional de 10 de abril de 2006)
Em 31 de dezembro de 1980, a cidade do aço se transforma em uma cidade
emudecida. Em um depoimento marcante Mauro Tanury define o sentimento de como ficaria
Volta Redonda, a partir daquele momento triste para a história do município:
Eu vou ficando por aqui para evitar as lágrimas. Como diz o compositor João
Donato, numa uma de suas composições “Até um dia não é, até talvez, até quem
sabe, gente bacana de Volta Redonda, que passa ser, a partir desse dia 31, uma
cidade emudecida. Vejam só uma cidade emudecida. Tchau. (TANURY, Mauro.
Depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de Janeiro).
Vemos claramente a revolta do funcionário Mauro Tanury e sua preocupação com a
questão do esquecimento que a emissora enfrentaria por ter saindo do ar. Mais uma vez
recorrendo a Ricoeur (2000) Marialva Barbosa apresenta a questão da memória:
A questão da memória mostra que o esquecimento é um dever da memória e,
portanto, a categoria memória só existe no esquecimento. Ao lembrar algo, tira-se
esse algo do esquecimento para a memória. Só há memória porque há esquecimento.
Enquanto a memória é sempre apresentada como ambição à fidedignidade, o
esquecimento, em contrapartida, apresenta-se como uma espécie de defeito.
Portanto, o que está em foco no jogo memorável é o grau de profundidade do
esquecimento e o seu estatuto epistemológico. (BARBOSA, 2008, p. 94)
Não poderia ser diferente o depoimento dos funcionários que haviam recebido a
notícia sobre a desativação da emissora. Dalmir que trabalhou na secretaria da rádio fez da
seguinte forma a sua despedida:
Boa noite, meus amigos ouvintes da RS, aqui eu deixo a minha despedida, a última
despedida, no caso. Queria desejar a vocês um feliz ano novo. Que estiveram aqui
conosco durante esse tempo todo. E agradeço a vocês, enfim foi assim, né, não teve
outro jeito, a desativação da rádio, encerrou ontem. Então o que eu posso desejar a
vocês é um feliz natal e próspero ano novo. (_______, Dalmir. Depoimento [31 de
dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de Janeiro).
96
Gilson responsável pelos contratos de publicidade da emissora também deixou a sua
mensagem para o público:
Bom o que eu tenho a dizer é que essa rádio marcou muito a minha vida.
Evidentemente, eu entrei na rádio Siderúrgica como porteiro, logo a seguir passei, a
auxiliar de escritório, e logo a seguir assumir o cargo aqui de controlador, de chefe
de propaganda e publicidade. Então com essa oportunidade, realmente eu tive que
me integrar com a nossa equipe, tive que participar diretamente de toda a parte
comercial da rádio. É lamentável que hoje a rádio é desativada, ainda não sei para
onde eu devo ir, provavelmente devo voltar para o departamento de origem que é o
departamento de visita, não sei, não tem nada acertado. E aproveitando o ensejo,
quero deixar uma mensagem, a todos àqueles colegas meus que colaboraram, me
entenderam, me compreenderam embora saindo de porteiro, depois tive que é,
praticamente, é, orientar e exigir um pouco dos meus colegas. Mas, o que eu tenho
que agradecer a eles, que eles participaram comigo, colaboraram e aceitaram todo o
meu ponto de vista. Por mais é só isso, que numa situação dessas a gente não tem
condições de falar muito, é só isso o que eu tenho a dizer. (_______, Gilson.
Depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de Janeiro).
O operador de áudio Flávio Botelho trabalhou durante 25 anos na emissora registrou
como foi o fim da rádio siderúrgica:
Realmente durante 25 anos e 8 meses, eu labuto aqui na Rádio Siderúrgica Nacional
diante de nossos amigos aqui, todos eles, muito bons amigos. E eu quero dizer que
só conquistei amigos aqui. E é realmente lamentável o desaparecimento de nossa
RS. Mas isso, o barco vai para frente. De forma que eu só quero agradecer, a
presença dos nossos amigos, de ter trabalhado durante esse tempo todo com todo
vocês. E de forma que realmente é lamentável o que está acontecendo, o que
aconteceu, né. Mas no mais vamos esperar 81, com toda a felicidade para todos, é o
que eu espero que 81 aguarde a todos da mesma forma. (BOTELHO, Flávio.
Depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de Janeiro).
O depoimento do radialista Edward de Carlos mostra que a emissora marcou a vida da
cidade de Volta Redonda, porque fazia uma programação diferenciada, por isso, ela ainda
continua presente na memória dos locutores:
A Rádio Siderúrgica acabou? Não! A Rádio Siderúrgica não acabou, ela continua na
memória daqueles que vivenciaram, que conheceram. Hoje nós temos outras
emissoras, não querendo desfazer ou nem fazendo comparação. Mas igual à Rádio
Siderúrgica, não. Porque a Rádio Siderúrgica era um tipo de rádio, as rádios de hoje
são outro tipo. (CARLOS, Edward. Depoimento [29 de maio de 2011]. Volta
Redonda, Rio de Janeiro).
O ex-prefeito de Volta Redonda Iran Natividade Pinto fez uma afirmação de como a
CSN poderia ter mantido a emissora no ar, assim como fez com o seu hotel que apesar da
privatização ela manteve a instalação em funcionamento:
Ela podia até fazer um trabalho igual fez com o Hotel Bela Vista, a rádio podia estar
aqui na mão de terceiros, porque era uma rádio excelente, local muito bom, tudo
bom naquela rádio. Eu tenho saudade das coisas boas que acabaram em Volta
Redonda, entre elas a Rádio Siderúrgica Nacional que pra mim ela já era patrimônio
da cidade. (PINTO, Iran. Iran Pinto: depoimento [5 de dezembro de 2011]. Volta
97
Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pelo ex-prefeito de Volta Redonda
no período de 21/11/72 a 31/01/73).
Para o ex-funcionário da emissora Edward de Carlos existem dois fatores que podem
ter levado ao fim da emissora, a privatização da empresa e o surgimento de novas emissoras.
Para o radialista, diversas mudanças estavam ocorrendo na empresa que queria manter o foco
na produção de aço, e que a emissora ficou ultrapassada. Edward explica que:
Primeiro porque ai ela já estava vendo o lado financeiro, a companhia começou a
mudar. Essa é uma das causas que fez com que a rádio viesse a fechar. Já se pensava
em privatização, a companhia já estava eliminando tudo que não fosse ligado à
siderurgia. Já havia outras emissoras de rádio, como a rádio de Barra Mansa que já
tinha e outras que foram surgindo. A rádio não perdeu o seu valor. Mas ela não
poderia competir com as outras emissoras, que iam evoluindo e a rádio não. Já não
havia muito interesse da companhia em investir muito em rádio. (CARLOS,
Edward. Edward de Carlos. depoimento [4 de dezembro de 2011]. Volta Redonda,
Rio de Janeiro. Entrevista concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica
Nacional de Volta Redonda).
Uma parcela dos moradores de Volta Redonda possivelmente era a favor da
privatização por desconhecer as suas conseqüências. A ouvinte a Rádio Siderúrgica, Neiva
Carvalho destacou em depoimento que era:
[...] também muito leiga no assunto, era muito a favor da privatização, eu achava
porque tinha conhecidos que iam para a CSN abriam o ponto domingo só para
ganhar hora extra e ficavam na feira na Vila, em frente ao Escritório Central
papeando. No final do mês vinha aquele pagamento gordo, entendeu. Então eu
achava que tinha que privatizar, mas eu achei péssima coisa, hoje eu acho que foi
um mau negócio. (CARVALHO, Neiva. depoimento [14 de dezembro de 2011].
Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pela ouvinte Neiva de 70 anos,
da Rádio Siderúrgica Nacional)
Edward de Carlos em depoimento gravado um dia depois do fechamento da emissora,
tenta explicar porque a rádio foi fechada:
Porque a rádio não tinha fins lucrativos. Quando ela foi criada, a finalidade era
entretenimento e lazer. Então ela foi nesse segmento até muitos anos. Porque a rádio
não era para dar lucro. Era para proporcionar alegria, proporciona satisfação aos
seus funcionários. E para a nossa surpresa essa emissora foi desativada, de uma
maneira até triste, com os homens dizendo, aqueles que dirigem que comandam que
são superiores dizendo que a emissora não cumpriu a evolução, que a emissora não
acompanhou o progresso e é que estava superada, isso pra gente foi uma punhalada
no coração, porque não era a realidade dos fatos, a emissora não estava superada, ela
estava em dia, a emissora estava acompanhando a evolução dentro de sua
capacidade de interior. Além de perder aquilo que a gente mais gostava, nós saímos
praticamente desmoralizados, porque estávamos realizando um trabalho bonito, um
trabalho correto e sério, atual. Enfim aqueles que não entendem de rádio, aqueles
que não acompanham o rádio, não sabiam o que era o rádio local, anunciar que a
rádio estava superada. Mas de qualquer maneira a luta continua, essa porta, essa
janela se fecha, mas muitas outras portas se abrirão, E muitos outros companheiros
que aqui conosco estiveram, lutando, trabalhando, tentando fazer o rádio verdadeiro,
o rádio para a coletividade, infelizmente esse trabalho foi encerrado no dia 30 de
dezembro. A família Volta-redondense neste meio de comunicação, um dos mais
eficientes do mundo ainda, que é o rádio. Nem a televisão quando veio, que todos
98
pensaram que iria suplantar o rádio, não conseguiu, porque o rádio é o momento. O
rádio é aquilo que acontece. A televisão vem sempre depois do rádio. O rádio nunca
será superado. Em qualquer lugar onde houver uma pessoa estará um rádio presente,
porque o rádio de pilha, hoje acompanha todo mundo. (CARLOS, Edward. Edward
de Carlos. depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de Janeiro.
Entrevista concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta
Redonda).
O empresário tabelião Dauro Peixoto Aragão, de 80 anos, participou de um grupo que
tinha o interesse de comprar a emissora da CSN, sobre o fato afirma que:
Quando começaram os boatos de que ela ia fechar, vários grupos se propuseram a
comprá-la, inclusive eu mesmo fiz parte de um que não foi a frente depois. Éramos
eu, Wandir Carvalho, Benevenuto dos Santos Neto, que foi prefeito depois, mais
outras pessoas, que nós estávamos formando um grupo para comprar a rádio, mas
depois entrou o Leonardo Mollica, que sempre foi uma potência financeira
econômica de Volta Redonda, eu acho que ficou com o Leonardo, não
me lembro mais como foi o negócio. A siderúrgica depois privatizou, então acabou
né, virou um emagrecimento total com grande prejuízo para a cidade. (ARAGÃO,
Dauro. depoimento [12 de dezembro de 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro.
Entrevista concedida pelo empresário tabelião aposentado nomeado em 1953 pelo
governador Amaral Peixoto).
A programação musical continuou tocando já que a outorga de funcionamento da
emissora ainda estava válida. Sobre esse fato o ex-funcionário da RS, revelou:
A rádio ficou na época em 1980 ela saiu do ar e permaneceu quase um ano só
tocando a música. Porque na época o ministério das comunicações, que na época era
DENTEL, não permitiu que a rádio saísse do ar, porque a rádio tinha a função
social, ela não era uma emissora rentável, não era usada para gerar recurso (ALVES,
Manuel. Manuel Alves. Depoimento [25 de maio de 2011]. Volta Redonda, Rio de
Janeiro).
O Jornal do Brasil publica uma reportagem destacando o acervo musical da Rádio
Siderúrgica. Podemos ver o descaso da CSN em relação a tudo o que tem haver com a
emissora, já que a empresa iria leiloar os discos da extinta emissora. Apesar da CSN ainda
como estatal ter o interesse de resgatar o acervo da emissora, foi somente em 2006, já como
organização privada é que os discos foram catalogados. A reportagem do Jornal do Brasil
registra que:
Os boleros, foxtrotes, tangos, sambas e canções italianas que embalaram os sonhos
dos arigós – migrantes atraídos nos anos 40 à Cidade do Aço – vão voltar as vitrolas.
Postos à venda em leilão, em agosto, 12 mil discos remanescentes da extinta
emissora de rádio da Companhia Siderúrgica Nacional, desativada em 1980, serão
preservados no arquivo sonoro que a empresa instalará em Volta Redonda, no
Médio Vale do Paraíba. Da condição de sucata, o acervo passou a status de relíquia,
por causa de muitas raridades de 78 rotações. (Jornal do Brasil, reportagem
divulgada no caderno Cidades, Rio de Janeiro, Quinta-feira, 26 de dezembro de
1991)
99
O fim da rádio Siderúrgica marca também um período de mudanças no rádio da região
Sul Fluminense, os profissionais que trabalharam na emissora buscaram espaço em rádios de
cidades como: Barra Mansa, Resende e Barra do Piraí.
Em 15 de junho de 1982, com a presença do Ministro das Comunicações – Haroldo
Corrêa de Mattos, dos diretores da RADIOBRÁS, das autoridades públicas e dos
representantes do empresariado local foi inaugurada a Rádio Nacional de Volta Redonda que
veio a funcionar nas antigas instalações da Rádio Siderúrgica.
O acervo da Rádio Siderúrgica era extenso, após o encerramento da Rádio Siderúrgica
Nacional, em 1980, sua discoteca ficou indisponível. Depois de alguns anos parte desse
acervo foi resgatado, higienizado e preservado para o acesso da comunidade. Através da Lei
de Incentivo à Cultura e em 11 de abril de 2006, foi inaugurada a Fonoteca do Centro Cultural
da Fundação CSN. Segundo os dados da Fonoteca da Fundação CSN aproximadamente 16
mil discos e os estilos musicais estão à disposição da população:
São diversos estilos: Carmem Mirada, Emilinha Borba, Carlos Galhardo, Francisco
Alves, Ademilde Fonseca, Barros de Alencar, LyrioPanicali, e seus internacionais de
Cole Porter, Duke Ellington, Frank Sinatra, Doris Day, Elvis Presley, Rolling
Stones, The Who e outros. Esse acervo da Fundação CSN conta ainda com 3 mil
partituras históricas da Banda de Música da Companhia Siderúrgica Nacional, sendo
a maioria em manuscritos e cópias raras de obras de grandes nomes do cenário
musical brasileiro, como Carlos Gomes, Villa-Lobos, Ernesto Nazareth, Chiquinha
Gonzaga e Radamés Gnatalli. No ano de 2008, foi inaugurada a Rádio Web
Fundação CSN com o objetivo de divulgar o acervo da Fonoteca e disponibilizar o
catálogo para a comunidade. (Catálogo da Fonoteca Fundação CSN 2009-3)100.
Mesmo com a criação do catálogo de alguns discos há ainda muito que ser feito, já que
grande parte dos vinis que tem discursos, programas e comerciais ainda não foram
catalogados.
Buscamos apresentar com os depoimentos o olhar dos radialistas, ouvintes, políticos
sobre as questões que levaram ao fechamento da emissora. Vimos que é uma tarefa árdua
tentar definir porque a emissora foi desativada, por isso, ainda é importante continuar em
outras pesquisas para que possamos percorrer outros caminhos e buscar novas respostas.
100
Catálogo de músicas e arquivos fonográficos da Fonoteca Fundação Companhia Siderúrgica Nacional publicado no ano
de 2009.
100
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A realização dessa dissertação de mestrado permitiu uma busca por fontes que
revelassem como a emissora da CSN realizou os seus trabalhos durante os seus 25 anos de
existência. Sem o aporte teórico era muito complexo construir análises sobre a trajetória da
emissora na cidade de Volta Redonda. Com a pesquisa em História isso foi possível, porque
ela prevê um embate entre as fontes e a historiografia sobre período analisado e com isso,
possivelmente conseguimos reunir um material de pesquisa mais completo sobre a emissora.
O veículo de comunicação da CSN agregava à sua volta diferentes manifestações culturais e
colaborou para uma formação do gosto musical dos operários.
A emissora conseguiu através da divulgação das informações, transmissão de eventos,
divulgação de inaugurações da empresa, participar do cotidiano dos operários da CSN e
promover o trabalhismo durante o período democrático. Formou-se assim uma comunidade de
ouvintes, dentro de casa, no comércio e dentro da usina siderúrgica. A Rádio Siderúrgica foi
assim companhia marcante e referência cultural para os milhares de moradores de Volta
Redonda.
A sociabilidade mediada pelo rádio, mencionado como um companheiro instituiu
vínculos de afetividade entre público e a emissora da CSN.
Figura 13 – Sede da Rádio Siderúrgica Nacional – (Arquivo da Fonoteca da Fundação CSN. Não há referência de ano
e de quem foi o autor da fotografia)
A Rádio Siderúrgica Nacional (figura 13) é desativada no dia 30 de dezembro de
1980, um veículo que de alguma maneira contribuiu para o crescimento cultural e social da
cidade de Volta Redonda. Concluímos que ela foi fechada porque realmente perdeu o seu
intuito, que era formar a imagem de um trabalhador modelo para a CSN.
101
Ao fim desta pesquisa ainda há diversas questões que devem ser exploradas, e
esperamos que outros pesquisadores possam explorar através de outros olhares a trajetória
dessa emissora.
Para finalizar ficamos com duas frases a primeira é a do ex-funcionário Edward de
Carlos101 “A Rádio Siderúrgica acabou? Não! A Rádio Siderúrgica não acabou, ela continua
na memória daqueles que vivenciaram, que conheceram”. (CARLOS, Edward. Edward de Carlos.
depoimento [4 de dezembro de 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro. Entrevista concedida pelo ex-funcionário
da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda).
A segunda frase é de Mauro Tanury:
Eu vou ficando por aqui para evitar as lágrimas. Como diz o compositor João
Donato, numa uma de suas composições “Até um dia não é, até talvez, até quem
sabe, gente bacana de Volta Redonda, que passa ser, a partir desse dia 31, uma
cidade emudecida. Vejam só uma cidade emudecida. Tchau. (TANURY, Mauro.
Mauro Tanury: depoimento [31 de dezembro de 1980]. Volta Redonda, Rio de
Janeiro. Áudios extraídos de um cd do arquivo da emissora.)
Apesar de a Rádio Siderúrgica ter ficado emudecida no dia 30 de dezembro de 1980,
foi possível com essa pesquisa explorar as fontes para se fazer uma análise de trajetória de
comunicação social.
101
CARLOS, Edward. Depoimento [29 de maio de 2011]. Volta Redonda, Rio de Janeiro).
102
FONTES
Jornal “O Lingote, edição do ano de 1965.
Catálogo de músicas e arquivos fonográficos da Fonoteca Fundação Companhia Siderúrgica
Nacional publicado no ano de 2009.
Catálogo Fonoteca. Volta Redonda: Editora Fundação CSN, 2008.
CD com depoimentos dos ex-funcionários da emissora [31 de dezembro de 1980]. Entrevista
concedida pelo ex-funcionário da Rádio Siderúrgica Nacional de Volta Redonda para Ronald
Jarbas.
Áudios do arquivo da Fonoteca da Fundação CSN
Jornal Foco Regional - Reportagem do jornal Foco Regional de 10 de abril de 2006.
Jornal do Brasil, reportagem divulgada no caderno Cidades, Rio de Janeiro, Quinta-feira, 26
de dezembro de 1991.
Diário Oficial
Diário Oficial da União – número 4.616, terça-feira, dia 17 de março de 1953.
103
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