UNIVERSIDADDE FEDERAL DA BAHIA MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO Autor: Vicente Macêdo de Aguiar RESENHA 01 França Filho, Genauto C. “Para um olhar epistemológico da administração: problematizando o seu objeto”, In: Santos, Reginaldo S. (org.), A administração política como campo do conhecimento, objeto” São Paulo Salvador: Mandacaru, 2004. O que é administração? Podese dizer que na tentativa de problematizar esta esta questão, Genauto França Filho propõem uma reflexão sobre o caráter das idéias e a natureza do conhecimento elaborado sobre a Administração. Partindo desde o senso comum até uma análise epistemológica mais aprofundada, o autor estrutura seu texto em três grandes momentos. Num primeiro olhar, França Filho analisa o conjunto do conhecimento disponível em Administração distinguindoos em três grandes corpos de idéias: as técnicas ou metodologias gerenciais, as áreas funcionais e a teoria das organizações – também conhecida como estudos organizacionais. Sobre as metodologias gerenciais, para o autor, estas incorporam um sentido muito prático e aplicado, estando sempre direcionadas ao auxílio do trabalho de um gerente, mas sempre com a pretensão de uma suposta validade universal. Ressaltase ainda que tais técnicas e modelos de gerência estão sempre subordinados a parâmetros clássicos de uma racionalidade funcional. “Tal racionalidade ignora todo tipo de questionamento sobre a validade ética da ação, isto é, o sentido mesmo dos fins propostos, importando apenas sua construção” (FRANÇA FILHO,2004, p. 55). Em termos de exemplos ao longo da história da administração, o autor cita o exemplo da famosa organização racional do trabalho (ORT) desenhada por F. Taylor no século XIX, passando pela administração por objetivos (APO) desenvolvida por P. Drucker nos anos 50 e as “ondas” dos downsizing, “qualidade total” e reengenharias atuais. Nesta perspectiva, a produção do conhecimento acaba então assumindo uma natureza plenamente prescritiva e instrumental, tornado se foco dos chamados “modismos” em administração, tendo como único compromisso os resultados econômicos do empreendimento. Em relação as áreas funcionais, isto é, as subáreas de especialização da prática administrativa (marketing, finanças, gestão da produção e a gestão de pessoas), França Filho ressalta que estas também compartilham com o sentido pragmático e utilitário do conhecimento desenvolvido sobre as técnicas gerenciais. Além disso, o autor resgata a gênese na desta área funcional na própria origem dos conhecimentos produzidos no campo da administração por maio da noção de divisão do trabalho (horizontal e vertical) proposta por Fayol, no início do século XX, como princípio universal. Atualmente, com o advento das novas tecnologias e da informática, estão surgindo outras áreas funcionais (como gestão do conhecimento e gestão da informação) assim como outras estão alterando seu termo de definição, como “gestão de recursos humanos” para “gestão de pessoas” tratandose muitas vezes de simples eufemismo, desacompanhado de uma efetiva mudança na realidade gerencial. “Em todo caso, o que importa sublinhar neste momento é o fato de que, para muitos, as áreas funcionais encerram o próprio sentido de ser da administração hoje, devendo este profissional necessariamente especializarse em uma delas” (FRANÇA FILHO, 2004, p.56). No campo dos estudos organizacionais ou campo das Teorias das organizações, segundo o autor, a natureza do conhecimento tende a abandonar o caráter prescritivo e instrumental característico da áreas anteriores. O conhecimento gerado passaria, assim, de um enfoque eminentemente técnico e funcional para uma perspectiva explicativa e interpretativa. No entanto, França Filho ressalta que não se deve confundir o campo dos estudos organizacionais – que para este autor tem como marco inicial o livro “As Funções do Executivo” de Chester Barnard escrito em 1938 com a teoria geral da administração (TGA) que só nascerá de fato em meados dos anos 50 nos EUA, iniciandose com a Escola Clássica e indo até a chamada Escola Contingencialista. Na teoria das organizações encontrase, portanto, como eixos fundantes os estudos do comportamento organizacional, também conhecidos como abordagem comportamentalista das organizações, herdeira da tradição da psicologia dominante nos EUA que privilegiará o tratamento de temas como motivação, liderança e tomada de decisão no universo organizacional; e os trabalhos ligados a chamada sociologia das organizações (ou abordagem estruturalista das organizações) que é influenciada, sobretudo, por sociólogos americanos de inspiração funcionalista (A. Gouldner, P.Selzinick, R. Merton), que realizaram estudos sobre a burocracia e os sistemas sociais. França Filho ainda alerta que, em ambos os casos, apesar delas considerarem as organizações como objeto de estudo, permanece mais uma vez o compromisso com um conhecimento de natureza prescritivo apesar de se desenvolverem também uma série de abordagens, chamadas por alguns de “estudos críticos” das organizações, que se preocuparam em revelar algumas dimensões da análise organizacional não percebida pelo viés funcionalista. Para frança Filho, a partir deste primeiro olhar sobre uma classificação do conhecimento produzido em Administração, é possível perceber, de certa forma, uma pluralidade de interpretações sobre a questão basilar do texto: “o que administração?” Em razão desta suposta pluralidade, o autor dar continuidade ao texto analisando três possibilidades de resposta, ou seja, três maneiras de interpretação sobre o que é afinal a administração. A primeira é aquela que considera a administração enquanto arte, “a arte de administrar” : uma ação , um fazer se que exercita à medida que se pratica. “ A idéia é comparar a figura do administrador com aquela de um artista no sentido em que, ambos, seja o administrador na gestão de um a organização, seja um artista na produção de uma obra, teriam um pendão natural para o que fazem, sua profissão” (FRANÇA FILHO, 2004, p.59). Tal concepção encontra em estórias e historias de sujeitos considerados “grandes empresários” (mitos que servem para alimentar uma cultura empreendedora) uma fonte de inspiração para sua ação ideológica, sem contextualizar a real trajetória destes sujeitos e levar em consideração os casos que não tiveram êxito. Outra interpretação, na visão do autor, seria aquela que não assume o pressuposto de admitir a gerência de empresas como uma ação neutra, sem uma dimensão política ou função ideológica. Dentro desta perspectiva, a administração é entendida em contexto de luta de classes, isto é, num universo caracterizado por uma relação de conflito entre sujeitos que são donos do capital enquanto meio de produção (burgueses) e outros que vendem a sua força de trabalho (assalariados ou proletários). A administração, nesta interpretação, estaria então sempre a favor dos interesses dos donos do capital, aparecendo mais como um sistema de dominação e menos como uma ação humana cooperativa. Segundo o autor, isto se torna mais perceptivo quando analisamos aetimologia do termo “Administração”: Ad do latim, que quer dizer direção ou tendência para, e no sufixo minister também no latim, quer dizer mais baixo, inferior ou subordinado. Além disso, quando se analisa o termo em inglês, do verbo to manage, percebese que tal palavra vem do latim manus, que significa mão ou o substantivo manipulação, pois o termo fora muito usado na Idade Média na Inglaterra para referirse ao ato de cavalgar segurando as rédeas. “Uma tal apreciação etimológica do termo da administração, além dessa própria perspectiva mais geral de entendimento, não nos parece se limitar a induzir uma desconfiança generalizada acerca de tudo que se produz em nome da administração. Ela fornece, por outro lado, um meio instrutivo de discernimento crítico acerca do conteúdo que se vincula em nome da administração, dos novos discursos e seus modismos” (FRANÇA FILHO, 2004, 61). França Filho fecha está reflexão, trazendo como terceiro eixo de interpretação a noção de administração como ciência. Ou seja, a reconhece enquanto uma área do conhecimento científico – o que para ele (autor) não significa retomar a idéia dos clássicos em Administração como F. Taylor e H. Fayol, que propuseram tornar a administração uma ciência vinculada a produção de conhecimento de natureza eminentemente prescritiva e técnica. Entretanto, ao considerar a administração como um campo disciplinar de estudos e pesquisas, o autor traz uma sutil controvérsia epistemológica: seria o objeto dessa ciência a gestão enquanto prática ou as próprias organizações enquanto fenômeno? “Consideramos que, enquanto campo disciplinar, a administração ocupase principalmente com o estudo das organizações como um fenômeno social” (FRANÇA FILHO, 2004, p.63). Desse modo, a gestão representaria uma outra variável do universo organizacional. Compreender tal fenômeno em sua complexidade, na visão do autor, implicaria então em dialogar com outras disciplinas científicas como a Sociologia, Psicologia, Economia e a Antropologia, por exemplo. Por fim, a autor conclui seu trabalho trazendo um perspectiva plural sobre diferentes formas de organizações que se relacionam com diversas modalidades de gestão. Com base nas três esferas institucionais centrais ( A sociedade civil, o estado e o mercado) o autor articula diferentes formatos organizacionais com diferentes tipos genéricos de gestão. Desta forma, considerase, de um lado, as empresas atuando no mercado por meio de uma gestão privada, orientada segundo uma lógica fundamentalmente econômica e utilitária. De outro, o Estado onde se aplicaria a gestão pública, regida por uma lógica do poder burocrática, devendo – em princípio buscar o bem estar público dos cidadãos. E, por fim, considerase um amplo universo de organizações associativas privadas, que estão vinculadas a uma gestão social, tendo como finalidade e projeto político original a atuação no espaço público da sociedade.