Contribuição climática para o deslizamento de encosta na falésia do Cabo Branco Rosa, Conrad Rodrigues (Acadêmico de Geografia- UFPB-1) Araujo, Kallianna Dantas (Acadêmica de Geografia UFPB- 1) Pazera Jr., Eduardo (Prof. UNIPE) Rosa, Paulo Roberto de Oliveira (Prof. UFPB- 1) E-mail: [email protected] Palavras-chave: Clima, Deslizamento, Solo Abstract Climatic contribution for the landsliding of the cliff of Cabo Branco Key-words: Climate, Landsliding, Soil. Being still a relief whose marine erosion is very active, the cliff of the Cabo BrancoPB presents movements of soil materials in its steep slope (approximately of 75 degrees). That movements seemed, on a first glance, as a consequence of the marine abrasion, connoting a collapse. However, a study, whose axis was moved from the abrasion to the study of the porous environment of the soil, showed that there was a landsliding due to the lack of consolidation of the slope.. The porous parts of the soil are usually filled by the water originating from the rain After the delimitation of the area we mapped the elements contained in this space and there we located the occurrence of the phenomenons. After several collections of data we infered that the low amount of rain, associated to the low vegetation density, and the anthropogenic action done by the intense traffic of vehicles provoked the landslide.The climatic study was necessary to to identify the lack of water as the cause of the landslide. The collections of the data were made by means of reliable instruments as: the windsock, the analogical anemometer and documents as reports and climatic maps, so it was possible to collect data of wind direction, precipitation, heatstroke, perpendicularity of the irradiation and evaporation. The analysis and its correlation allowed us to perceive that the climatic incidence on the cliff is a reality, because the low rainfall that happened in the months before the accident is extremely significant for the event. During the last three months of 1998 and in the first month of 1999, the medium rainfall was of 17mm. This caused the dryness of the soil, allowing its porousity indeed. This soil, exposed to the solar irradiation due to the low vegetation density, allows a high evaporation. Therefore, the soil of the cliff in this time was with a low humidity and little vegetation. Some few meters from the cliffy slope there are a road and the movement of vehicles is elevated in the the summertime. These elements were decisive for the soil materials to move and to fall over the coastal plain. Introdução É conveniente ressaltar que o Cabo Branco, juntamente com a Ponta do Seixas constituem os pontos mais orientais das Américas estabelecendo uma relação de localização referencial. Neste sentido nota-se que há, por parte das autoridades locais, uma preocupação sobre as condicionantes degradantes desse ambiente. Em novembro de 1998 houve um movimento de massa nesta falésia, o que chamou a atenção tanto da opinião pública quanto das autoridades locais. Assim o Ministério Público foi acionado para tomar uma providência jurídica sobre o possível descaso do poder executivo em relação à dinâmica do lugar. O que foi vinculado pela imprensa e por alguns segmentos técnico-científicos é que essa situação ocorrida na data citada é resultado de um desmoramento por conta da ação abrasiva na base da falésia. Tal afirmativa nos leva a uma outra leitura na qual detectamos outros elementos geográficos, de aparência insignificante, mas que se tornaram mais fortes e consequentemente apontavam outras situações que estavam sendo negligenciadas. O Cabo Branco é um acidente geográfico que está inserido sobre o relevo dos baixos planaltos sedimentares costeiros, litologicamente constituído por argilas e quatzos. Esses baixos planaltos têm a sua linha de superfície interrompida por um corte abrupto, o que forma um penhasco com angulação superior a 50º cuja linha de base está em contato direto com o mar. Este fenômeno recebe a denominação geográfica de falésia, e no caso de haver a ação abrasiva do mar é considerada ativa ou viva. Porém, quando esta base não está sofrendo abrasão é porque o mar retrogradou ficando a falésia desativada ou morta. Este fato é decorrente do grande estoque de suprimentos sedimentares que estão sendo depositados na base, formando assim uma planície costeira. No Cabo Branco, por ser uma falésia ativa, a abrasão marinha ainda é manifesta e constante (ver Fig. l). No entanto esta abrasão é um agente degradante, pois a nosso ver não chega a danificar radicalmente a estrutura da falésia a ponto de ter sido essa abrasão o agente responsável pela movimentação daquele material, detectado em novembro de 1998. Nas nossas observações constatamos que o que permite a progradação tem sido não o avanço do mar, mas sim a falta de suprimentos sedimentares trazidos pelos rios tributários. Estes rios, no caso o Gramame e seus afluentes, encontram-se com barragens em seu leito, impedindo assim a movimentação dos sedimentos em direção ao mar. Fig. l -Penhasco como Falésia ( / /1999) Numa análise, ainda que elementar, verificamos que a abrasão marinha mais significativa ocorre nas marés mais elevadas 2,7m e 2,6m, e estas, consideradas de sizígia, ocorrem mais na época que antecede e sucede ao solstício de verão, ou seja, dezembro. Porém a maior intensidade está entre os meses de janeiro e fevereiro. Estas observações nos levam a considerar que a dinâmica marinha tem um comportamento diferenciado em relação aos outros meses do ano. Assim como o fenômeno das marés, há também a direção e intensidade dos ventos. Neste sentido, passamos a nos preocupar com os fatores e elementos do clima, e para isso foi inevitável a leitura de fatores climáticos como translação, rotação e vegetação, e também de elementos climáticos como insolação, temperatura e umidade. O clima passou a ser, para esse evento, o agente processual fundamental, o que nos leva a ler a paisagem sob outro ponto de vista e chegar a conclusão de que o fenômeno responsável pelo movimento do material não fora a maré mas sim o agente antrópico. Esta parte da falésia, a barreira do Cabo Branco, encontra-se em uma área delicada por estar recebendo o grande impacto de forças externas como: alta insolação, desmatamento, abrasão marinha, ventos e tráfego intenso de veículos. Separando cada fato, passamos a buscar a causa e a influência de cada fenômeno sobre o evento deslizamento ocorrido em novembro de 1998. O impacto marinho ou abrasão marinha sucedida no sopé da barreira, não chegou a causar danos significativos pois é um impacto lento, mas à medida de sua constância, ele poderá acarretar danos futuros. Como processo acelerado desse deslizamento, notamos que ele vinha sendo corroborado com a afirmação de que a área estava sendo desmatada, ficando livre para os processos climáticos agirem mais constantemente. Os eventos climáticos começam a atingir a barreira, e com a baixa pluviosidade houve o ressecamento do solo, pois quando houve o deslizamento o sol encontrava-se perpendicular à barreira. Por último, como fenômeno finalizador do eventodeslizamento, corroboramos com a hipótese das vibrações no solo causada pelos veículos; desse modo montamos uma cadeia onde todas as hipóteses se uniam. Com o desnudamento do solo houve alto índice de ressecamento e em decorrência também da baixa pluviosidade e alta evaporação, o espaço entre os minerais, que era preenchido pela água, criou um vácuo, ficando sensível ao impacto das vibrações no solo, acarretando o desprendimento de seus elementos formadores da barreira, o que resultou no deslizamento. Metodologia Este trabalho tem um caráter mais técnico que científico, pois o tempo de coleta de dados foi muito exíguo. Mesmo assim, nos preocupamos em estabelecer uma denotação mais científica possível, procurando evitar imposturas, pois o resultado de nossas interpretações serviriam de base para o convencimento do Ministério Público para tomar as providências mais pertinentes ao fato. Inevitavelmente nos preocupamos também para alertar que, junto à natureza, o insignificante acumulado pode surgir em lugares e tempos inesperados, e nossa leitura é apenas uma aproximação sem pretensões de chegar a uma exatidão daquilo que foi efetivamente o agente causador de tal evento. Procuramos ler a paisagem sem nos afastar do evento, e para nos aproximarmos ao máximo possível das causas lançamos mão da análise enquanto método, cuja indução, a nosso ver, é fundamental para a leitura da paisagem como um todo. As técnicas às quais utilizamos para a execução do trabalho iniciam-se pelo levantamento bibliográfico pertinente à composição tópica da estrutura da paisagem. Também realizamos o levantamento de documentos ortográficos e iconográficos referentes à área em observação. Foram feitas visitas à área em estudo afim de estabelecermos ações de observação e coleta direta de dados, de forma que, com o auxílio de referências e de instrumental específico, o grau de rigor foi sendo ampliado no que refere às coletas dos dados através das medições dos elementos componentes da paisagem. Inicialmente, estabelecemos um cronograma a partir da tabela de marés (4 anos antecedentes), pois precisávamos verificar as afirmativas trazidas a público; por isso foram feitas visitas sistemáticas ao local. Simultaneamente, fizemos leituras virtuais da paisagem através de documentos primários e secundários como imagens de satélite, aerofotos, ortofotocartas, cartões postais e de cartas topográficas (1945 e 1972), assim como o aprofundamento em literatura vinculada à Geomorfologia Costeira (Muehe in Guerra e Turekian). A Partir destes documentos fizemos leituras específicas de forma amostral e elementar sobre marés e ondas e a partir destas informações, iniciamos nossos estudos verificando o valor do clima sobre a dinâmica da paisagem. Inicialmente foi necessário leitura mais apurada sobre a translação, pois o Cabo Branco encontra-se nas seguintes coordenadas 7°08’57”S - 34°47’50”W sendo estas determinadas pela geodésica cujo ponto de partida é o movimento da Terra em relação ao Sol. Neste sentido o Cabo Branco na transição do Equinócio para o Solstício de verão sofre um ataque maior de insolação, aproximadamente, nos dias 17 de outubro, e dias 13 de fevereiro, pois estes são os dias em que há a perpendicularidade da incidência dos raios solares sobre aquele ambiente (ver Fig. 2), inevitavelmente aumentando a temperatura. Fig. 2 - Diagrama que demonstra a incidência solar sobre o Cabo Branco Deste momento em diante passamos a verificar a direção dos ventos, tanto a indicada no Atlas Geográfico da Paraíba, quanto da leitura das ondas indicada pelas aerofotos de 1972 e de 1985. Para aumentar o volume de dados, verificamos in loco, com biruta, essa direção confirmando assim o indicado nos documentos. A direção dos ventos indicada pela aerofoto permite também a inferência sobre a rugosidade do mar, ou seja, a intensidade e magnitude das ondas, sendo que estas são decorrentes da ação dos ventos, o que nos leva a concluir que a velocidade do vento é o principal vetor dessa rugosidade. Para medir a velocidade do vento usamos tanto as informações já documentadas pelo referido Atlas como também diversas medições feitas in loco, com anemômetro, em áreas fixas (sopé e topo da falésia) e em tempos diferenciados, sendo que estes foram pensados a partir dos movimentos da maré. Após as coletas desses dados realizamos a observação sobre a colonização vegetal no topo da falésia. Ou seja, a população vegetal que fora anteriormente domínio florestal e/ou arbustivo, estava totalmente alterada e o que estava presente era uma população herbácea. Por isso foi necessária uma leitura mais técnica envolvendo planimetria in loco seguida de dendrometria, só assim pudemos inferir melhor sobre o tipo de cobertura vegetal e consequentemente sobre a área de sombreamento ou de exposição à incidência solar. Alguns dados em relação ao comportamento do lugar foram obtidos através de entrevistas à população local, cuja topofilia foi capaz de estabelecer uma relação cultural com o ambiente, fazendo com que a população acionasse as autoridades para que se tomassem providências ante o evento deslizamento. Situando o Olhar Sobre a Paisagem Como já foi realçado, o Cabo Branco é um acidente Geográfico que traz em si peculiaridades naturais e culturais, pois é juntamente com a Ponta do Seixas o acidente que determina o Ponto mais Oriental das Américas. Esse fenômeno acaba por determinar também uma questão de ordem cultural, pois estabelece uma referência nacional e neste sentido surge uma preocupação sócio-política que é caracterizada pela visão de manutenção patrimonial, reafirmando a idéia de que não se pode perder este acidente geográfico (falésia do Cabo Branco), pois ele é um patrimônio cultural. O Cabo Branco não deve ser visto como um acidente geográfico isolado e sim como mais um elemento de um todo, daí é que nos preocupamos em trabalhar o evento do deslocamento do material do topo da falésia não de forma isolada, mas sim de forma integrada com uma diversidade de outros acidentes geográficos, daí o trabalho ganhou a dimensão Regional. Neste sentido, procuramos delimitar a área regional que envolve a paisagem natural mais marcante. O Cabo Branco é circundado pelos seguintes elementos geográficos: ao sul a planície costeira que contém as praias da Penha e do Seixas, a leste o oceano, ao norte as praias da enseada do Cabo Branco. No topo da falésia, que é efetivamente o Cabo Branco, há uma bacia hidrográfica que define o escoamento superficial da rede de drenagem. Este último elemento geográfico é ocultado primeiramente pela vegetação, que apesar de se encontrar profundamente alterada pela ação efetiva de antropismos, ainda mantém uma cobertura vegetal percebida apenas sob olhar mais acurado tanto in loco quanto por análise através de fotointerpretação. Para definirmos a área com região nos balizamos na rede de drenagem como elemento primordial. Essa região como todas as outras sobre a superfície da Terra está sujeita a ação efetiva da dinâmica natural. Porém, neste caso, foi verificado que além da ação da natureza, tomando como referência a abrasão marinha e o ataque da insolção em períodos bem distintos, foi verificado também a presença da ação humana indadequada ao sistema natural, pois a cobertura vegetal foi alterada e em alguns lugares substituída por construções de rodovias, sendo que estas passam bem junto ao topo da falésia, e para aumentar a gravidade, estas cortaram o sistema de drenagem natural que há sobre a superfície do Cabo Branco (ver Fig. 3). Fig. 3 - Rodovia sobre o Cabo Branco Fonte: Cartão Postal do Cabo Branco A leitura da paisagem sob o ponto de vista regional não inibiu que a leitura tivesse a abordagem sistêmica, por isso passamos a observar as interligações com outros sistemas, já que a questão do material que se movimentou na falésia, a nosso ver estava relacionada à falta de observação efetiva dos elementos geográficos que compõem o lugar. Por isso passamos a observar quais tinham sido as alterações fundamentais ocorridas em outras regiões e quais poderiam estar definindo a dinâmica nesta região. Aparentemente o mar está avançando, sendo esse fenômeno o que mais contribuiu para a visão elementar de que a abrasão marinha foi a responsável por aquele evento da movimentação de material. Porém, inferimos que o mar não está avançando, mas sim que não há mais suprimentos sedimentares devido aos barramentos que foram estabelecidos nos rios tributários o que contribui para que a erosão marinha no seu trabalho contínuo, estabeleça novas fontes de ação abrasiva, pois o que era área de sedimentação passou a ser de erosão, daí é que a leitura imediata apenas interpreta as situações mais superficiais. O antropismo, mesmo em lugares distantes como é o caso dos barramentos nos rios Gramame e Mamuaba (a aproximadamente 30km), ou antropismo próximo à falésia, como o estabelecimento de equipamentos turísticos ou ainda, áreas de estacionamento e a construção da estrada no topo da falésia, são agentes que se somam de forma muito acentuada para a total alteração do sistema natural do lugar. A construção da estrada junto ao topo da falésia deixou marcas possivelmente irreversíveis na paisagem, pois a vegetação foi alterada e em alguns pontos acabou por ser substituída, ou seja, o que era arbusto ou floresta acabou por tornar-se campo, permitindo a presença de gramíneas e estas se alastram num processo de competição acentuada com as outras formações vegetais impondo uma nova fisionomia ao lugar (ver Fig. 4). Fig. 4 - Vegetação herbácea sobre a falésia do Cabo Branco A fisionomia da área ocupada pela vegetação herbácea no topo da falésia do Cabo Branco, exatamente acima de onde ocorreu o evento que foi denominado inicialmente de desmoronamento1, é uma área que se apresenta de forma frágil e vulnerável ao ataque constante da ação dos fatores e elementos pertinentes ao clima. Como já foi demonstrado, as coordenadas geográficas destes pontos corroboram, que esta é uma área onde a insolação é elevada em dois momentos significativos na translação. O primeiro momento é quando a Terra no seu percurso do Equinócio para o Solstício de dezembro tem a incidência perpendicular da energia luminosa no lugar, o que ocorre no dia 17 de outubro; o segundo momento é que há maior incidência (após a Terra ultrapassar o momento do solstício e do periélio), no dia 13 de fevereiro. Sob esse ponto de vista passamos a verificar que a temperatura do solo aumenta de forma significativa, devido à exposição deste à recepção da energia luminosa de forma direta devido à ausência de vegetação. 1 “Desmoronamento - é o deslocamento rápido de um bloco de terra, quando o solapamento criou um vazio na parte inferior da vertente.” (Christofoletti, 1980: 29) Possíveis Elementos que tenham Provocado o Fenômeno A falésia do Cabo Branco é um ponto que se tornou patrimônio cultural e consequentemente turístico. Neste sentido há um interesse muito grande pela visitação ao lugar, portanto, não há como negligenciar tal fato e explorá-lo de forma econômica. Contudo se não forem levados em consideração alguns elementos geográficos, inevitavelmente poderão ocorrer desastres, como foi o caso do deslizamento2, ocorrido no final de 1998. A nosso ver este fenômeno tem todas as características do deslocamento do bloco no sentido de cima para baixo. O fenômeno do deslizamento envolve uma série de outros elementos, porém o que nos chamou muito a atenção é que o lugar é de alta recepção de energia luminosa. A incidência desta atua significativamente sobre a temperatura do ambiente. O lugar tem uma cobertura vegetal rarefeita e o solo é predominantemente composto de areias quartzosas-argilosas, sendo que a composição destas acaba por interferir na condução do calor, tanto na forma horizontal como na vertical, ou seja, a temperatura do solo aumenta devido ao tipo de material que se encontra disposto no solo. Somando a esse fator surge um outro componente climático de elevada importância para as nossas observações: o clima teve um comportamento atípico, ou seja, houve uma incidência mais elevada da estiagem, e a precipitação acumulada mensalmente foi muito baixa, como podemos conferir através desse dados: novembro 14mm, dezembro 10mm, janeiro 27mm. INMET - Climatologia Gráficos Climatológicos Evaporação (mm) em João Pessoa no período 1998 Precipitação (mm) em João Pessoa no período 1998 2 “Deslizamentos – são deslocamentos de numa massa do regolito sobre um embasamento ordinariamente saturado de água. A função de nível de deslizamento pode ser dada or uma rocha sã ou por um horizonte do regolito possuidor de maior quantidade de elementos finos, de siltes ou argilas, favorecendo atingir de modo mais rápiddo o limite de plasticidade e o de fluidez” (Christofoletti, 1980: 29). Insolação (H) em João Pessoa no período 1998 Temperatura Máxima (ºC) em João Pessoa no período 1998 Fonte: http://www.inmet.gov.br/index.html/ A baixa precipitação passa a ser um indicativo de que o estoque de umidade na subsuperfície está sendo diminuído devido tanto à incidência luminosa quanto aos ventos que não param de castigar o front da falésia. Com o solo areno-argiloso com escassez de umidade e temperatura elevada, surge neste lugar, um micro ecossistema frágil e vulnerável conforme aponta Drew (1986: 26) “todos os sistemas naturais possuem um elo fraco na cadeia de causa e efeito: um ponto em que o mínimo de acréscimo de tensão (...) traz consigo alterações no conjunto do sistema” (1986: 26), esse lugar está pronto para qualquer intervenção que o altera de forma drástica. O solstício de verão cuja incidência de energia luminosa é mais atuante notadamente, no litoral paraibano, havendo nele uma insolação mais significativa (diferente ao interior do Estado) provoca uma mudança sócio-econômica intensa nas cidades litorâneas, pois o verão é que define melhor a procura a esses lugares por turistas. Com essa nova variável o evento deslizamento começa a ter sentido, pois associando à idéia de que o Cabo Branco é o ponto mais oriental das Américas cria-se também uma cultura patrimonial em torno desta situação, e por isso o ponto foi estabelecido como um equipamento turístico de referência (ver Fig. 5). Fig. 5 - Farol do Cabo Branco como ponto Turístico Fonte: Cartão postal da Paraíba Com o ponto turístico estabelecido, foi criado um sistema viário que permite acesso não só aos turistas, mas também estas vias passaram a servir de interligação entre os bairros, e consequentemente, o ir-e-vir de veículos de todos os portes, inclusive caminhões. É sabido pela engenharia de estradas que o rolamento de veículos por uma superfície causa vibrações e estas podem provocar o movimento de massas. Neste sentido, Maciel Filho (1994: 198) aponta como possíveis causas de Movimentos de Massa: “Efeito de oscilações térmicas Oscilações térmicas diárias ou sazonais provocam variações volumétricas em massas rochosas, podendo conduzir a destaque de blocos(...). Efeitos de vibrações Agentes como terremotos, bater de ondas, explosões, tráfego pesado (...) transmitem, invariávelmente, vibrações ao substratos” Tomando esses postulados como parâmetros passamos a observar que, além dos fenômenos naturais que envolveram a relação do clima com a falésia, havia ainda a presença significativa do elemento antrópico, ou seja, a ação sócio-econômica viria a ser o fator determinante para que aquele bloco fosse desprendido e deslizasse sobre a planície costeira (ver Fig. 6). Fig. 6 - Deslizamento de bloco areno-argiloso na falésia do Cabo Branco - novembro/1998 Reunindo os fatos climáticos que envolveram o lugar na época do deslizamento do bloco, como o baixo nível de precipitação 17mm (média), alta incidência solar com perpendicularidade da energia luminosa, temperatura se elevando, escassez de umidade no solo, ventos atacando diretamente o front da falésia e para completar o verão com aumento significativo de turistas que somados ao fluxo intenso do tráfego com veículos que variavam de motos até caminhões, e ainda o tráfego de ônibus urbano, passamos a transformar todas essas variáveis em uma expressão que nos levou a considerar que o abatimento do bloco sobre a planície costeira foi desencadeado pela presença do elemento sócio-econômico. Este, inadvertidamente foi somado ao componente climático, cuja aparência insignificante foi o principal elo entre a ação antrópica e o evento deslizamento do bloco. Considerações finais Por precaução procuramos não concluir o trabalho, pois estabelecer com certeza os fenômenos contidos na natureza é concorre para postular, em muitos casos, em impropriedades. Porém, com essa cautela, sugerimos ao Ministério Público que tomasse algumas providências no sentido de comunicar às autoridades municipais e estas alertassem à população de que poderiam ocorrer novos deslizamentos, pois o material naquele lado da falésia é bastante inconsolidado. Além disso havia, na época outros blocos se desprendendo do topo (ver Fig. 7). Sugerimos ainda, que fossem alteradas as vias de acesso ao lugar e que houvesse um maior disciplinamento do trânsito, bem como que fosse feita uma tentativa de estabelecimento de uma nova colonização vegetal na tentativa de minimizar o fenômeno da insolação direta. Fig. 7 - Bloco se desprendendo no topo da falésia - novembro/1998. Bibliografia BELLA, Vitor e BIDONE, Edison D. Rodovias, recursos naturais e meio ambiente. 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