A COMPATIBILIZAÇÃO DO ENSINO TRADICIONAL
DE DESENHO COM AS NOVAS TECNOLOGIAS
Silvana Rocha Brandão Machado
UVA - Universidade Veiga de Almeida– Ciclo Básico das Engenharias
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Resumo
Este trabalho tem como objetivo propor uma metodologia para o ensino de
desenho técnico, integrando recursos tradicionais e informatizados nos
cursos de engenharia do ciclo básico em uma universidade particular no
Rio de Janeiro. São abrangidos os programas aplicativos de softwares
CAD, além dos esboços técnicos nos quais os alunos desenham no papel
em malhas (cartesianas e isométricas sem muito rigor de traçado e
precisão) e em seguida passam os mesmos desenhos para a outra
ferramenta. A metodologia hibrida é importante, uma vez que as novas
gerações resistem a trabalhar com métodos tradicionais que, são tão
importantes quanto os informatizados, pois estimulam a criatividade,
percepção e a coordenação motora. Entretanto, muitas vezes, alguns
docentes trabalham com os softwares gráficos 2D, apenas ensinando o
aprendizado de comandos, mas nem sempre esta metodologia trabalha de
forma adequada o raciocínio espacial dos alunos, permitindo que eles
percebam como o objeto é visto no espaço. É possível através da
ferramenta digital estimular a percepção, mostrando o objeto de forma
tridimensional sob vários ângulos, ou mesmo gerando os planos que o
seccionam, revelando os cortes necessários para a compreensão do seu
interior.
Palavras-chave: softwares CAD, métodos tradicionais, raciocínio
espacial.
Abstract
This paper aims to propose a methodology for teaching technical drawing,
integrating traditional and computerized resources in engineering courses
of the basic cycle in a private university in Rio de Janeiro. The application
of CAD software programs is covered, in addition to the technical sketches
in which students draw on paper in meshes (isometric and cartesian
without much rigour in trace and precision) and then transfer the same
drawings to the other tool. The hybrid methodology is important since the
young generations resist working with traditional methods, which are as
important as the computerized ones because they stimulate creativity,
perception and motor coordination. However, some teachers work with 2D
graphics software teaching only the learning commands, but this
methodology does not always work the spatial reasoning of the students
properly, which would allow them to understand how the object is seen in
space. It is possible through the digital tool to stimulate perception, showing
the object of three-dimensional shape under various angles, or even
generating the plans for the slice up, revealing the sections necessary for
an understanding of its inside.
Keywords: CAD software, traditional methods, spatial reasoning.
1 Introdução
O ensino de expressão gráfica nas universidades de engenharia vem sofrendo uma
desvalorização devido à falta de aplicação de conteúdos de desenho no ensino
fundamental e médio. Além disso, passa por outras restrições, como a redução na
carga horária por causa da fusão dos métodos convencionais com os digitais (criação
de laboratórios de informática) e a falta de espaço para pranchetas em algumas
instituições particulares, que optam por colocar um número maior de alunos em sala
de aula. “Por causa da difusão dos sistemas CAD, o ensino de desenho precisou
adaptar-se às transformações que esta adoção trouxe ao cotidiano da sala de
aula/laboratório (Oliveira, 2002)”.
A disciplina Expressão Gráfica é ministrada na Universidade Veiga de Almeida no
curso de Engenharia do ciclo básico (Produção, Civil, Petróleo, Elétrica, Computação e
Ambiental), para alunos do terceiro ou quarto período.
Foi realizada entre as escolas de engenharia uma pesquisa com um grupo de 30
alunos na qual se constatou que a maioria (65%) nunca havia estudado desenho
(tradicional ou digital), conforme mostra a Figura 1.
Figura 1: Resultado da pesquisa sobre estudo prévio de desenho
Com os fundamentos teóricos de desenho geométrico e geometria
descritiva reduzida, os docentes das disciplinas de desenho no
ensino superior optaram por eleger alguns tópicos mais relevantes da
ementa anterior, visando adicionar os conteúdos para o ensino dos
programas de desenho (VELASCO, 2010).
Com o advento de novas tecnologias aplicadas ao ensino, houve uma falsa
impressão de que os softwares gráficos resolveriam completamente os problemas de
desenho. Porém, alguns alunos chegam à universidade com deficiência na
visualização do objeto no espaço. Para suprir essa deficiência, o professor precisa
mudar a metodologia de ensinar desenho, aproveitar as possibilidades que a
tecnologia oferece, mas sem se acomodar na crença de que os programas gráficos
irão solucionar todos os problemas.
Para Velasco (2010),
existem quatro motivos que encorajam a adoção de novos recursos
didáticos: primeiro, atender às restrições de carga horária, que
diminui a cada dia em relação ao conteúdo a ser ministrado; segundo,
atender à mudança do perfil dos alunos, que passam pelo ensino
médio e fundamental e chegam à universidade sem as informações
básicas e sem terem a visualização desenvolvida; terceiro, saber que
o trabalho gráfico fornece ao aluno mais possibilidades de estratégias
de raciocínio, desenvolvendo seu potencial intelectual; quarto, é a
constatação de que o uso das possibilidades que a informática nos
fornece, auxilia a superar dificuldade encontrada na verbalização dos
procedimentos gráficos.
2
Novas estratégias pedagógicas
“Novas estratégias pedagógicas se apresentam aos educadores, porém eles devem
levar em conta que é necessária uma avaliação crítica da adequação dos meios às
suas práticas e os seus objetivos” (VELASCO, 2010).
Até 2008 somente o método instrumental era adotado na Universidade Veiga de
Almeida. Porém, a partir de 2009 houve uma fusão dos dois métodos de ensino de
desenho e a transformação da sala com mesas de desenho em laboratório de
informática.
Na pesquisa elaborada foram aplicados questionários, para que fossem
analisados junto aos alunos que já cursaram a disciplina os aspectos favoráveis e
desfavoráveis da mistura de métodos. Os alunos que participaram da pesquisa se
dividiram em 59% que preferiam o desenho digital, e 41% o desenho convencional
(Figura 2).
Preferência do método
60%
40%
Figura 2: Resultado da pesquisa sobre a preferência de métodos de ensino de desenho.
Os conteúdos que os entrevistados mais gostaram, de acordo com a ementa
foram: Planta baixa e corte no CAD com 39% (Figura 3).
Figura 3: Resultado da pesquisa sobre a preferência de conteúdo que mais gostaram
Os conteúdos em que mais tiveram dificuldade com 19% foram corte total de uma
peça e com 15% ficaram as vistas ortográficas, a cotagem e a planta baixa e corte no
CAD (Figura 4).
Figura 4: Resultado da pesquisa sobre os conteúdos da disciplina que tiveram mais dificuldade
2.1 Desenhando com as malhas
Por causa da falta de espaço para pranchetas nos laboratórios, desde 2009 fomos
desafiados a inserir o desenho auxiliado pelo computador, juntamente com as técnicas
manuais de representação, sem aumentar a carga horária da disciplina de expressão
gráfica. Para isso, orientamos os alunos a trazerem suas malhas impressas (em casa
ou adquirida na Xerox da própria universidade), com uma prancheta formato A4, para
prender suas folhas. Em sala de aula, os desenhos são feitos com auxílio de lapiseira,
esquadros, borracha etc. As turmas têm aproximadamente vinte e cinco alunos, e o
laboratório vinte máquinas (com licenças educacionais do software AutoCAD versão
2011), o que obriga alguns alunos revezarem o uso do computador durante a aula. No
entanto, na parte da aula em que o conteúdo é de desenho nas malhas, cada aluno
faz sua atividade individualmente.
Existem dois tipos de malhas que podem ser utilizados para auxiliar o desenho
instrumental: a malha cartesiana e a malha isométrica, que podem ser adquiridas pelo
aluno no site: http://www.printfreegraphpaper.com.
2.1.1 Malhas Cartesianas
As malhas cartesianas no formato A4 auxiliam o aluno a desenhar esboços de vistas
ortográficas em escala, cortes, plantas baixas e praticar cotagem dos objetos antes da
utilização do software de desenho. O usuário pode escolher o espaçamento mais
adequado ao desenho, pois o programa oferece espaçamentos de malhas de 1 mm,
2mm, 5mm e 10 mm (Figuras 5 a 7).
Figura 5: Tela do site gerador de malhas cartesianas A4 com 5 mm
Figura 6: Malha cartesiana gerada em arquivo PDF
Figura 7: Exercício de vistas ortográficas executado na malha cartesiana pelo aluno
2.1.2 Malhas Isométricas
As malhas isométricas no formato A4 auxiliam o aluno a desenhar perspectivas
isométricas dos objetos antes do uso do software de desenho (Figuras 8 a 11).
Figura 8: Tela do site gerador de malhas isométricas A4 com 5 mm
Figura 9: Malha isométrica gerada em arquivo PDF com o esboço de uma perspectiva
Figura 10: Perspectiva isométrica executada no AutoCAD após o esboço na malha
Na mesma aula em que são aplicados os fundamentos teóricos de desenho
técnico, com suas normas da ABNT, é utilizada a ferramenta computacional. O aluno
utiliza as duas ferramentas: primeiramente desenhando na malha cartesiana ou
isométrica no espaço do modelo (model space), dependendo do tipo de exercício; e,
na outra parte da aula, ele repete o mesmo desenho, utilizando o software AutoCAD,
configurando a grade (grid) do programa para retangular ou isométrica.
Figura 11: Tela de configuração de malha no AutoCAD
3 Ementa da disciplina
A disciplina de Expressão Gráfica na Universidade Veiga de Almeida é ministrada no
terceiro período e contempla conteúdos de desenho técnico tais como:

Desenho de linhas
Tem como objetivo mostrar os instrumentos de desenho e familiarizar o aluno com
o uso deles: os esquadros, escalímetro, régua, lapiseira, borracha, compasso; fazer o
aluno traçar linhas de várias espessuras e escrever caligrafia técnica com letra bastão.

Desenho de linhas com coordenadas (x e y) na malha cartesiana
Neste item o propósito é fazer o aluno praticar desenho com AutoCAD,
exercitando-se em coordenadas absolutas, relativas, polares e diretas com os
comandos linha e polilinha.

Perspectivas
Neste tema, o aluno receberá noções de perspectivas cavaleiras e isométricas
com exercícios de esboço técnico de perspectiva isométrica na malha de papel. No
CAD, ele aprenderá a configurar a malha isométrica ativando o grid isométrico, e o
desenho das mesmas peças esboçadas no papel milimetrado no CAD com o comando
linha.

O desenho projetivo
O objetivo deste tópico não deve ser obrigar o aluno a fazer “épuras” complicadas,
mas sim dar noções elementares de desenho projetivo: projeção, planos de projeção
horizontal e vertical e levá-lo a conceber e situar os objetos e os planos no espaço,
além de ensiná-lo a visualizar os movimento deles com relativa clareza, através de
pontos, retas e desenho de peças no primeiro diedro, com as vistas ortográficas e os
tipos de linhas (contínua, tracejada e de centro).
Na primeira parte da aula, o aluno aprende os fundamentos teóricos das vistas
ortográficas e desenha na malha cartesiana de 5 mm em escala natural (1:1).
Depois de desenhadas as vistas ortográficas, são ensinadas as normas de
cotagem de acordo com a NBR 10126.
Na segunda parte da aula de AutoCAD, o aluno faz as mesmas vistas que
desenhou na malha, trabalhando os comandos de desenho e de edição. Após a
montagem das vistas com seus respectivos layers (peça, tracejado, cotas e textos),
ele aprende a fazer a cota padrão (sem configuração de escala ainda) de cotas
lineares, alinhadas, raios e diâmetros para, a seguir, escrever os nomes das vistas
com os comandos de texto do programa.

Cortes
Corte total em dois sentidos: longitudinal e transversal.
O objetivo deste conteúdo é fazer o aprendiz compreender a importância da
representação em corte de conjuntos complexos de uma peça, para obtenção de
maiores detalhes internos do objeto estudado.
É importante estabelecer as relações existentes entre o corte de conjuntos
complexos e as linhas contínuas largas para arestas e contornos visíveis e as
tracejadas estreitas para contornos não visíveis. Ao mesmo tempo, é importante
reconhecer aspectos relevantes dos diversos tipos de corte e hachuras, simulando
materiais tais como: a madeira, o ferro, o concreto, o tijolo etc.
Para este exercício é necessária a utilização da malha cartesiana, quando o aluno
executa os cortes de uma peça.
No AutoCAD são desenhados os mesmos cortes e são ensinadas hachuras de
linhas predefinidas e definidas pelo usuário, assim como as hachuras degradê com
cores.

Escala
O objetivo deste fundamento é desenvolver a noção de escala: escalas de 1/10,
1/20, 1/25, 1/50, 1/100 etc. de acordo com a NBR 8196
O desenho técnico projetivo terá sempre uma relação entre distância gráfica (D) e
distância natural (N) do objeto que está sendo representado: peça, equipamento,
instalações, etc. Esta relação, que vamos chamar de escala do desenho, tem como
norma a NBR 8196. São utilizados exercícios com os três tipos de escala: natural, de
ampliação e de redução.
O aluno faz um esboço em escala diretamente na malha cartesiana, de acordo
com uma escala definida. Porém, quando se trabalha no computador, a definição da
escala é feita no preparo para a impressão (paper space ou layout), logo após o
desenho ser concluído no model space.

Desenho de Edificação
No desenho de edificação são aplicados os fundamentos teóricos para se
desenhar plantas, cortes e fachadas de uma residência de um pavimento. Ali são
apresentas, de forma sintética, as normas e convenções usuais para representação de
um projeto arquitetônico, de acordo com a norma NBR 6492, como os formatos de
pranchas e hachuras específicas, espessuras de linhas, simbologias e cotagem.
Na utilização dos instrumentos digitais seguem os padrões de camadas (layers),
cores das linhas, texto etc. da ASBEA (Associação Brasileira de Escritórios de
Arquitetura).
Após a fundamentação teórica do desenho de edificação, ainda na primeira parte
da aula, o aluno desenha uma planta baixa de um pequeno ambiente na malha
cartesiana ou em papel milimetrado, onde são exigidas portas, janelas, paredes,
projeções, cotas, textos e simbologias na escala 1:50. Após a conclusão do desenho
instrumental, o aluno faz a mesma planta no computador, primeiramente configurando
seu arquivo com seus layers, estilos de cotas, textos e formatos de prancha no padrão
ASBEA, para finalmente, após a conclusão do trabalho, passar para o layout, criando
as janelas de impressão nas escalas adequadas ao formato de prancha.
4 Habilidades de computador versus habilidades de desenho
Com a finalidade de ganharem mais produtividade nos trabalhos, conseguindo assim
qualidade na apresentação, os profissionais que trabalham com desenho (arquitetos,
engenheiros, designers, etc.) e alunos destes cursos estão cada vez mais atentos na
busca de representações gráficas que facilitem a forma de expressarem graficamente
seus projetos. O docente tem aí o importante papel de motivar e desenvolver o
potencial intelectual e o raciocínio espacial do aluno, para habilitá-lo a cursar as
disciplinas posteriores.
As novas gerações dominam melhor o computador, (graças aos sites
na Internet, kits multimídia, aprendizado à distância de programas
gráficos via web, etc.) e muitas vezes resistem um pouco mais em
desenhar à mão livre ou com instrumentos convencionais de desenho
(MACHADO, 2009).
As malhas cartesianas e isométricas auxiliam o esboço à mão livre, porém em
escala, despertando no aluno a possibilidade de formar a imagem mental sem a
preocupação com a precisão e o paralelismo, mais rígidos quando se desenha sem
elas e com os instrumentos de desenho.
5 Conclusão
As experiências desenvolvidas com a fusão dos métodos de desenho instrumental,
auxiliado pelas malhas e a utilização dos fundamentos teóricos, vêm permitindo ao
aprendiz adquirir mais segurança no trato com o desenho computacional, favorecendo
a compreensão dos conteúdos ensinados e suas aplicações.
Após 60 horas de aula em sala/laboratório, percebe-se que o aluno aprende os
comandos básicos 2D do desenho digital, assim como desenvolve o raciocínio
espacial, com os fundamentos teóricos do desenho técnico, que são fundamentais
para que ele leia e interprete corretamente um projeto. Entretanto, boa parte dos
alunos prefere o aumento da carga horária (muitos se queixam da grande quantidade
de conteúdo), pois acreditam que uma quantidade maior de exercícios facilitaria mais
a fixação dos conteúdos.
Agradecimentos
Este trabalho contou com a participação voluntária dos alunos dos cursos de
engenharia do ciclo básico da universidade Veiga de Almeida que já cursaram a
disciplina de Expressão Gráfica I e colaboraram, gentilmente, respondendo a um
questionário que serviu para apontar alguns dados deste artigo.
Referências
MACHADO, Silvana Rocha Brandão. A Tecnologia como atalho de desenho para
desenvolvimento e apresentação de projetos. Bauru: artigo In: GRAPHICA 2009,
SP, 2009.
OLIVEIRA, Márcia Maria Pinheiro. A formação profissional em representação
gráfica frente às novas tecnologias atende às expectativas do mercado?
Proposta de um modelo de ensino. Rio de Janeiro: UFRJ. Faculdade de Arquitetura
e Urbanismo, 1999. Dissertação de mestrado.
OLIVEIRA, Márcia Maria Pinheiro. Fundamentos Teóricos e educacionais em
desenho auxiliado por computador. Apostila da disciplina de Técnicas Gráficas do
curso de arquitetura da UFF. Niterói, 2002.
VELASCO, Angela Dias. Um ambiente Multimídia na área de expressão gráfica
básica para Engenharia. Revista de Ensino de Engenharia, v. 29, n.1, p. 51-64–
ISSN 0101-5001 , 2010.
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A compatibilização do ensino tradicional de desenho com as novas