CARTOGRAFIA DE RISCO DE INCÊNDIO NO PARQUE NACIONAL DA PENEDA-GERÊS E GESTÃO ADEQUADA DOS RECURSOS FLORESTAIS E SISTEMAS NATURAIS Ana M. P. Fernandes Fontes1 ([email protected]), António José Bento Gonçalves2 ([email protected]) Palavras-Chave: Cartografia de Risco de Incêndio, Parque Nacional da Peneda-Gerês, Plano de Ordenamento, Prevenção de Incêndios. Resumo A problemática dos incêndios florestais em Portugal, tem vindo a assumir uma importância crescente, sobretudo devido à tomada de consciência dos impactes negativos dos incêndios sobre os recursos naturais, assumindo uma importância acrescida nas áreas protegidas do nosso país. O facto de este problema constituir actualmente uma das grandes preocupações por parte das entidades responsáveis pela gestão da floresta nacional, tendo em conta que em 2003 se registou a maior área ardida de sempre, e a projecção do problema na sociedade em geral veiculada pela divulgação dos grandes incêndios através dos “media”, tem colocado esta questão nos pontos altos da agenda política nacional. Reforçando esta preocupação, nos últimos anos têm-se verificado nas nossas Áreas Protegidas perdas irreparáveis nos sistemas naturais, devido à ocorrência de incêndios de grandes proporções. Propomo-nos assim, apresentar um trabalho de investigação onde se elaborou a Cartografia de Risco de Incêndio no Parque Nacional da Peneda-Gerês, baseada na recente legislação publicada sobre o tema, perspectivando-se a sua inclusão nos elementos de base da Revisão do Plano de Ordenamento em curso. Este trabalho constitui por isso uma peça fundamental e imprescindível à gestão adequada dos recursos florestais e sistemas naturais no Parque, assentando numa política de prevenção de incêndios, suprindo desta forma a lacuna existente actualmente sobre esta temática nos instrumentos de planeamento em vigor, nomeadamente no Plano de Ordenamento do PNPG, em fase de revisão, no qual o Risco de Incêndio foi considerado 1 2 Geógrafa, Parque Nacional da Peneda-Gerês (ICN), Av. António Macedo, 1704 – 538 Braga. Núcleo de Investigação em Geografia e Planeamento (NIGP), ICS, Universidade do Minho, Campus de Azurém, 4810 Guimarães. na definição da Zona de Protecção aos Recursos e Sistemas Naturais, apenas baseado num conhecimento empírico das zonas mais sensíveis ao fogo, por parte de técnicos florestais e guardas do Parque, dado que, até à data o PNPG não possui uma Carta de Risco de Incêndio que abrangesse toda a área, existindo apenas dois trabalhos resultantes de estágios em Engenharia Florestal, para a Delegação de Terras de Bouro. Propomos assim uma metodologia que cumpra o disposto no Decreto-Lei nº 156/2004 de 30 de Junho e a Portaria nº 1185/2004, de 15 de Setembro, adaptada à realidade do PNPG, baseada numa análise prévia da relação espacial existente entre as áreas ardidas e as condições biofísicas e humanas, aferindo desta forma o grau de importância e respectiva valoração de cada um dos factores de risco enunciados, na ocorrência de incêndios. Introdução Os actuais espaços florestais portugueses, resultantes da longa e continuada dialéctica entre o Homem e o meio ambiente, pelos seus atributos naturais configuram, simultaneamente, importantes recursos mas também parcelas do território dotadas de vulnerabilidade em matéria ambiental, especialmente num país que quer do ponto de vista sócio-económico quer dos ambientes naturais, apresenta um território profundamente fracturado – o litoral relativamente ao interior, o norte face ao sul, a bipolarização... Nos processos de ordenamento e planeamento do uso do solo, assume importância relevante a inventariação e o estudo dos recursos e processos, quer de carácter biofísico, quer sócio-económico, que intervêm na diferenciação dos diferentes padrões da organização do território, nomeadamente a avaliação dos usos, depleção e capacidade de renovação dos recursos naturais indispensáveis aos referidos processos. A actual floresta portuguesa ocupa um papel importante no contexto dos recursos naturais, tanto em termos territoriais, como em termos sócio-económicos, o que determina a necessidade de se conhecer em maior pormenor a sua dinâmica, para que se possam tomar as medidas mais correctas na sua gestão e ordenamento. A gestão silvícola tem-se orientado, principalmente, para a produção de madeira e outros produtos florestais de interesse industrial. Hoje deverá promover-se uma abordagem holística que considere os espaços florestais como suporte de ecossistemas compreendendo uma grande variedade de elementos interdependentes que produzem bens e serviços. Isto inclui o uso e a gestão da madeira, cortiça, caça, pesca e outros produtos, bem como o assegurar de funções ambientais, culturais, estéticas, sociais e recreativas (Plano de Desenvolvimento sustentável da Floresta Portuguesa - PDSFP, Resolução do Conselho de Ministros nº 27/99 de 8 de Abril; Declaração de Rectificação nº 10-AA/99 de 30 de Abril). No entanto, a nível sócio-económico ocorrem certos problemas estruturais que dificultam o correcto desenvolvimento e evolução do sector florestal, nomeadamente a estrutura de propriedade florestal, a sua reduzida dimensão, o “desinteresse” dos proprietários sobre a gestão da floresta, a falta de emparcelamento e associativismo rural, a generalizada falta de informação e de formação, …. Para além de constituírem uma barreira à gestão e ordenamento florestal na sua globalidade, tais problemas estruturais dificultam grandemente a prevenção e o combate aos fogos florestais que se têm tornado um flagelo no nosso país. Muito embora o fogo seja um elemento desde sempre presente nos ecossistemas mediterrâneos, os incêndios descontrolados constituem uma ameaça ao desenvolvimento (sustentável) da floresta em Portugal. Quando se analisa a distribuição espacial dos incêndios bem como a sua história pirileológica (número de fogos e extensão das áreas ardidas), verifica-se que todo o território apresenta um elevado risco de incêndio florestal. No entanto existem diferenças significativas relativamente à sua repartição espacial e temporal, quer em termos do risco de eclosão, quer em termos do risco de propagação. Quando se investigam as causas, verifica-se que a esmagadora maioria se deve a actos de negligência3 (uso do fogo ou acidentais) ou a criminalidade/vandalismo (estruturais ou incendiarismo), ou seja, a mão humana está quase sempre presente. Modelação do Risco de Incêndio no PNPG Embora urja a implementação e/ou consolidação de medidas de curto prazo (informação, silvicultura preventiva, gestão de combustíveis, vigilância, detecção, combate, fiscalização, …), médio prazo (sensibilização, formação, investigação, ordenamento florestal, …) e longo prazo (educação, requalificação e re-dinamização do mundo rural, ordenamento do território…), é imprescindível, de forma complementar, dotar os diferentes territórios de instrumentos/ferramentas de apoio à gestão, quer do território, quer das situações de risco e crise. 3 Segundo o Código Penal Português, “quem provocar incêndio de relevo, nomeadamente pondo fogo a edifício ou construção, a meio de transporte, a floresta, mata, arvoredo ou seara” (nº 1, Artº 272) é “punido com pena de prisão até 5 anos, caso a conduta tenha sido praticada por negligência” (nº 2, Artº 272), ou seja, se tiver sido por “actuação descuidada, desatenta e com ligeireza do agente, isto é, sem atender aos deveres de cuidado que o homem médio, comum, está obrigado a observar” (Artº 15º). Nesse sentido, elaborou-se a Modelação do Risco de Incêndio no Parque Nacional da Peneda-Gerês, baseada na recente legislação publicada sobre o tema, perspectivandose a sua inclusão nos elementos de base da Revisão do Plano de Ordenamento em curso. Localização O Parque Nacional da Decreto-Lei nº 187/71, de 8 de Maio, é a única Área Protegida nacional com estatuto PO RT UG AL Peneda - Gerês, criado pelo de Parque Nacional, reconhecido pela UICN (União Internacional para a Conservação da Natureza), pelo alto valor do seu património natural e cultural, MELGACO ARCOS DE VALDEVEZ PONTE DA BARCA MONTALEGRE TERRAS DE BOURO conjugado com objectivos dirigidos para a conservação, LEGENDA 0 10 20 Km Concelhos da área do PNPG Área do PNPG estudo e gestão sustentável dos recursos naturais. Fig. 1 – Localização geográfica e enquadramento administrativo do PNPG Localiza-se no norte de Portugal, na zona de transição entre o Minho e Trás-osMontes. Está inserido na NUT II – Norte, sendo confinado pelos meridianos 8º 25’ e 7º 53’ W e pelos paralelos 41º 41’ e 42º 05’ N (Fig. 1) e cupa uma área de 69 692,9 ha, distribuídos por 5 concelhos: Melgaço, Arcos de Valdevez e Ponte da Barca do distrito de Viana do Castelo, incluídos na NUT III – Minho - Lima, Terras de Bouro, do distrito de Braga, NUT III – Cávado e Montalegre, do distrito de Vila Real, NUT III – Alto - Trás-os-Montes. A Floresta no Parque Nacional - Situação Actual 4 A floresta autóctone do PNPG inclui sobretudo bosques de folha caduca, carvalhais e bosques ripícolas e é predominantemente constituída por quercineas (carvalho roble e carvalho negral), associados a outras espécies como o azevinho, o teixo, o vidoeiro, o padreiro, a faia, o sobreiro, o castanheiro, o azereiro, e o medronheiro, entre outras com menor expressão. 4 Adaptado da proposta apresentada no âmbito da Revisão do Plano de Ordenamento do PNPG, elaborada pelo sector florestal do Parque. A conservação dos carvalhais na área do Parque resulta essencialmente de uma exploração sustentável dos mesmos, essencialmente para lenha. No entanto, o desordenamento de práticas silvopastoris, aliadas ao contínuo uso do fogo não controlado e a falta de limpeza dos povoamentos florestais, permitindo a acumulação de biomassa vegetal, potencia a frequência e a intensidade dos incêndios florestais, originando o recuo do carvalhal. O bosque ripícola caracteriza-se pela associação de teixo, amieiro e freixo. Estes bosques têm vindo a ser sucessivamente fragmentados, dando lugar a lameiros em prados de regadio. Esta prática, aliada ao corte abusivo, constitui a principal ameaça ao bosque ripícola. Quanto aos matos, que representam uma área significativa na área do Parque Nacional, predominam os tojais, os urzais, os matos de altitude e os matos higrófilos. O crescente abandono da actividade agrícola e a tendência para a diminuição do efectivo pecuário, motivado por um decréscimo populacional crescente na área do PNPG, leva ao aumento das áreas ocupadas por matos, por falta de maneio, sendo sujeitas a um pastoreio desordenado e sem acompanhamento de pastores, afecta fortemente a regeneração natural e compromete o sucesso de projectos de arborização implementados pelo Parque. Por outro lado, a renovação de pastos é tradicionalmente efectuada recorrendo a queimadas não controladas, efectuadas muitas vezes em condições climáticas e locais indevidos, sendo muito frequentemente responsáveis pela deflagração de incêndios com consequências muito negativas para a biodiversidade do Parque, e também responsáveis pela crescente decréscimo do coberto florestal da área ao longo das últimas décadas, potenciando, simultaneamente, a invasão de espécies exóticas invasoras. Destas, a mimosa (Acácia dealbata) atinge já no PNPG características de praga, impedindo a ocorrência de outras espécies, apesar de um persistente investimento no seu combate ao longo dos últimos anos, sem que até hoje se vislumbrem resultados animadores no controle desta espécie invasora. Além da floresta autóctone, cerca de 45% da floresta do parque é constituída por resinosas (pinheiro bravo e pinheiro silvestre), correspondendo a floresta de produção. Evolução Recente da Floresta no Parque Segundo o inventário florestal recentemente realizado (RODRIGUES, 2002), a área florestal actual do PNPG totaliza 10 925 hectares, representando 15,68% da sua área total. Destes, 4 619 hectares são de folhosas, 4 393 hectares de resinosas, 1 187 hectares de povoamentos mistos de folhosas, 550 hectares de povoamentos mistos de resinosas e 175 hectares de povoamentos mistos de folhosas e resinosas. Assim, em termos percentuais, verifica-se a dominância do carvalho alvarinho e carvalho negral e do pinheiro bravo, representando 73,4% do total da área florestal, registando-se, comparando estes valores com os do inventário florestal efectuado em 1971 por A. Sampaio, um decréscimo da área florestal de cerca de 5 000 hectares. Esta diminuição deve-se sobretudo à acção do homem: os incêndios florestais, o pastoreio livre e desordenado, a introdução de espécies exóticas invasoras e uma gestão florestal insuficiente. Entre 1991 e 2003 o Parque Nacional promoveu diversas acções de arborização, com uma área aproximada de 3000 hectares, com uma percentagem de sucesso de 60%, recorrendo a diversos programas comunitários. Estas acções, privilegiaram essencialmente o aproveitamento de situações de regeneração natural e a arborização com espécies folhosas, visando a compartimentação de povoamentos, como medida de prevenção de incêndios florestais, criando a descontinuidade de combustível e, simultaneamente, promovendo a diversificação da paisagem. Prevenção e Combate Nos últimos anos, face à ocorrência de incêndios de dimensão considerável em zonas extremamente sensíveis do ponto de vista da conservação da natureza, o Parque Nacional tem vindo a fazer um grande esforço no sentido de controlar e minorar o risco de ocorrência de incêndios na sua área, apesar da persistente escassez de meios e verbas, dispondo desde 2003, da intervenção directa no terreno de Brigadas de Sapadores dos Conselhos Directivos de Baldios, que desenvolvem, ao longo de todo o ano, acções de silvicultura preventiva, manutenção e beneficiação de caminhos e pontos de água e de vigilância. Também a recente aprovação de quatro candidaturas AGRIS veio reforçar a capacidade de resposta do Parque nesta área de intervenção, sobretudo na questão da PREVENÇÃO, estando previstas diversas acções, que contemplam a criação e/ou manutenção da rede principal e permanente de caminhos florestais, operações de silvicultura preventiva e a construção e/ou beneficiação de pontos de água. Desde finais dos anos noventa, a “Carta de Prioridade de Intervenção em Incêndios Florestais” é uma ferramenta de gestão actualizada anualmente, estabelecendo uma hierarquia de prioridade de intervenção, conjugando a valoração de áreas prioritárias para a Conservação da Natureza, do risco de ocorrência de incêndios e a rede de acessos. São ainda referidas a localização dos postos de vigia, do heliporto existente na área e a localização dos pontos de água, distinguindo-os quanto à sua capacidade para abastecer meios aéreos ou terrestres. Modelos de Risco de Incêndio Um dos pressupostos metodológicos do presente trabalho, foi considerar o histórico de áreas ardidas entre o ano de 1993 e 2003, registadas pelo Parque Nacional, como ponto de partida para selecção e valoração dos factores biofísicos e humanos intervenientes nos incêndios ocorridos nesse período, permitindo dessa forma a elaboração de uma matriz dos factores e variáveis para a construção da cartografia de risco de incêndio que, devido à escala de análise e respondendo ao disposto no Dec.-Lei nº 256/2004, apenas foram considerados os incêndios com área igual ou superior a 5 hectares. Entre 1993 e 2003 no Parque Nacional foram registados 147 incêndios, relativos a Ano LEGENDA Limite PNPG Área ardida Área ha) ( Nº incêndios uma área ardida de 8 600 hectares, com uma 1993 373,9 5 1994 82,4 6 forte incidência no sector 1995 735,4 19 central e oriental da área 1996 1181,7 22 do PNPG destacando-se 1997 189,3 11 1998 1981,6 23 1999 192,6 8 2000 1019,1 18 de área ardida e um 2001 619,5 8 número 2002 2000,1 20 mais elevados. 2003 212,3 7 Total 8 587,9 os anos de 1998 e 2000, que registam os valores de incêndios 147 Fig. 2 – Áreas ardidas e nº de incêndios ocorridos no PNPG no período de 1993 a 2003 Fonte: SIG/PNPG A modelação do risco de incêndio, baseou-se numa análise multi-critério, através de um cálculo simples aditivo ponderado dos diversos factores e variáveis, seguindo dois pressupostos conceptuais distintos, dando origem a dois modelos de risco, permitindo uma avaliação da metodologia e resultados mais abrangente. A matriz de ponderação dos factores e variáveis de risco (Quadro 1) expressa os pressupostos enunciados. Factores e Variáveis dos Modelos de Risco Para a elaboração dos modelos de risco de incêndio no Parque Nacional foram utilizados três grandes grupos de factores. Um primeiro grupo de natureza biofísica, que enquadra o RELEVO, nas variáveis Declive e Exposição Solar e a Rede Hidrográfica, um segundo grupo associado à HUMANIZAÇÃO, nas variáveis de Densidade Demográfica, Densidade de Pastoreio e Ocupação do Solo. Foi ainda considerado um terceiro grupo de INFRAESTRUTURAS, nas variáveis Distância à Rede Viária e Visibilidade dos Postos de Vigia. Quadro I - MATRIZ DE PONDERAÇÃO E VALORAÇÃO DAS VARIÁVEIS DE RISCO Modelo de Risco 1 Variável Ponderação Declive 2 Exposição solar Distância às linhas de água Densidade populacional 2 1 Classes 0-8% 8-15% 15-30% 30-45% Modelo de Risco 2 Valor 2 4 5 3 Ponderação Declive 2 Uso Proximidade à rede viária 2 3 1 1 > 45% 5 1 Horizontal 1 Norte 2 Sul 3 Este Oeste 4 5 Buffer de 30 m Dentro 1 Fora 5 Exposição solar Distância às linhas de água Densidade populacional 2 1 1 Norte 2 Este 3 Sul Oeste 4 5 Buffer de 30 m Dentro 1 Fora 5 Nº habit./km2 1 0-50 5 51-1000 1 51-1000 1 >1000 5 >1000 5 0-50 5 Nº efectivos/km2 1-10 1 11-20 5 21-30 3 31-40 4 > 40 2 Densidade de pastoreio 2 1-10 1 11-20 2 21-30 3 31-40 4 > 40 5 Agrícola 2 Agrícola 2 Carvalho Outras folhosas Pinheiro bravo Outras Arbust. / matos 3 1 3 1 5 Carvalho Outras folhosas Pinheiro bravo Outras Arbust. / matos 4 4 5 5 5 Rocha/matos 3 Uso 3 4 Rocha/matos Até 50m 1 Até 50m 5 50-100m 2 50-100m 4 100-150m 3 100-150m 3 150-200m 4 150-200m 2 > 200m Visibilidade Valor 1 2 3 4 Horizontal Nº efectivos/km2 Densidade de pastoreio Classes 0-8% 8-15% 15-30% 30-45% > 45% Nº habit./km2 1 Variável Proximidade à rede viária 1 5 > 200m 1 Oculta 3 Oculta 5 Visível (1 pv.) 5 Visível (1 pv.) 3 Visível (+2pv.) 1 Visível (+2pv.) 1 Visibilidade 1 O Modelo de Risco 1 resulta de uma análise prévia da relação espacial existente entre a área ardida e as condições biofísicas e humanas, permitindo a valoração das classes das variáveis consideradas. No Modelo de Risco 2, independente das áreas ardidas, a valoração das mesmas classes foi atribuída segundo um padrão sequencial de grau de risco em função do grau de susceptibilidade relativamente ao risco de incêndio. Recorrendo a software SIG (Arc View 3.3 – Spatial Analyst), a informação vectorial relativa às diferentes variáveis foi rasterizada, em formato GRID, permitindo simplificar as operações de “overlay” das diferentes variáveis componentes do modelo. Perspectivando-se a integração dos resultados, após discutidos e validados, no processo de Revisão do Plano de Ordenamento do Parque Nacional, houve a preocupação de adaptar as características da informação resultante à metodologia previamente estabelecida. Assim, todas as “grids” foram construídas com a mesma dimensão, tendo como referência os limites do PNPG, com uma resolução de “pixel” de 5 metros. Como base do modelo foram consideradas cinco classes de risco: REDUZIDO, MODERADO, ELEVADO, MUITO ELEVADO e MÁXIMO, resultando em matrizes com valores entre 1 e 5. Este método permitiu a reclassificação dos valores resultantes da adição ponderada das variáveis em cinco classes, por quebras naturais, obtendo-se desta forma em cada matriz valores constantes de 1 a 5. Modelo de Risco 1 Este modelo resulta do cálculo aditivo ponderado das oito matrizes obtidas com base nas áreas ardidas registadas no PNPG, segundo a seguinte fórmula de cálculo: (3.AsGrid * [Osolopn]) + (2.AsGrid * [Declivpn]) + (2.AsGrid * [Exposicpn]) + (2.AsGrid * [Pastoreiopn]) + [Redhidpn] + [Denspopn] + [Redevipn] + [Visibilitypn]) Osolopn – matriz da Ocupação do Solo Redhidpn – Hidrográfica matriz do Declivpn – matriz do Declive Denspopn – matriz do Densidade Populacional Exposicpn – matriz da Exposição Solar Redevipn – matriz do Distância à Rede Viária Pastoreiopn – matriz da Densidade de Pastoreio Visibilitypn – matriz da Visibilidade Fig. 3 – Fórmula de cálculo do Modelo de Risco 1. Distância à Rede Histograma do grau de R isco % 32 29 23 11 5 0 LEGENDA RISCO DE INCÊNDIO 0 4 8 12 Km Reduzido Moderado Elevado Muito elevado Máximo Fig. 4 – Modelo de Risco de incêndio segundo áreas ardidas registadas no PNPG entre 1993 e 2003 Modelo de Risco 2 Assim, este modelo resulta também do cálculo aditivo ponderado das oito matrizes, independentemente da expressão espacial nas áreas ardidas, segundo a seguinte fórmula de cálculo: (3.AsGrid * [Osoloparque]) + (2.AsGrid * [Declive]) + (2.AsGrid * [Exposic]) + (2.AsGrid * [Pastoreio]) + [Disthidparque] + [Densiparque] + [Disredevi] + [Visibilidade] Osoloparque – matriz da Ocupação do Solo Disthidparque – matriz do Distância à Rede Hidrográfica Declive – matriz do Declive Densiparque – matriz do Densidade Populacional Exposic – matriz da Exposição Solar Disredevi – matriz do Distância à Rede Viária Pastoreio – matriz da Densidade de Pastoreio Visibilidade – matriz da Visibilidade Fig. 5 – Fórmula de cálculo do Modelo de Risco 2. Histograma do Grau de Risco % 34 30 19 12 5 0 LEGENDA RISCO DE INCÊNDIO 0 4 8 12 Km Reduzido Moderado Elevado Muito elevado Máximo Fig. 6 – Modelo de Risco de Incêndio não considerando as áreas ardidas entre 1993 e 2003 Análise Comparativa dos Resultados Da análise dos dois modelos construídos evidenciam-se algumas diferenças significativas na distribuição do grau de risco o que, tendo em conta que a metodologia apresentada visa a modelação do mesmo tema, o RISCO DE INCÊNDIO para o mesmo território, suscita a necessidade de uma abordagem reflexiva sobre os preceitos metodológicos aplicados mas também sobre a informação de base utilizada na modelação. Assim, entre o Modelo de Risco 1 e o Modelo de Risco 2, registam-se diferenças significativas, tanto nos valores totais de distribuição das classes de risco, como na sua distribuição espacial. Comparando os resultados dos dois modelos, expressos nos histogramas das Figs. 4 e 6 constata-se que, os valores de grau de risco mais representativos são o Máximo, Muito Elevado e Elevado que representam, em termos percentuais valores muito aproximados, 84% e 83% da área, no Modelo de Risco 1 e Modelo de Risco 2, respectivamente. No entanto é de notar que a distribuição destes valores nos dois modelos é consideravelmente diferente, devido essencialmente à diferença de 10 pontos percentuais na classe de risco Máximo, de subvalorizada no Modelo de Risco 1, em detrimento da classe de risco Elevado, mais representativa no Modelo de Risco 2. A classe de risco Muito elevado apresenta valores percentuais muito aproximados. Quanto às classes de risco mais baixo, Reduzido e Moderado, representam o mesmo valor percentual nos dois modelos. Estas diferenças a nível da distribuição percentual das classes de risco são acompanhadas de diferenças muito evidentes a nível da sua distribuição espacial. Relativamente ao Modelo de Risco 1, o Modelo de Risco 2 reflecte uma relação directa com a ponderação e valoração das classes de Ocupação do Solo. Constata-se a forte coincidência dos graus de Risco Máximo e Muito Elevado com a distribuição de manchas de floresta de resinosas, especialmente no Vale do Gerês e margem direita das albufeiras de Caniçada e Salamonde, e grandes mancas de coberto com matos e vegetação arbustiva, nos Planaltos, Serra do Soajo e Serra Amarela. Este efeito é, pontualmente “perturbado” por influência, mais uma vez da densidade de pastoreio, como é exemplo da subvaloração do risco na área da freguesia de Lindoso, em plena Serra Amarela, onde predominam os matos e com baixa densidade de pastoreio e de Pitões das Júnias e Ermida, com forte incidência de Risco Máximo, devido à influência desta variável. A influência das classes de uso do solo é também significativa em toda a Serra do Gerês, que neste modelo apresenta maioritariamente um grau de risco Elevado, em detrimento do risco Muito Elevado e Máximo predominante no Modelo de Risco 1 que, com a Serra da Peneda, representam zonas de predominância de rocha com mato, classe valorada na matriz respectiva com nível 3, sendo no Modelo de Risco 1 uma das classes de uso mais representativas nas áreas ardidas. Quanto aos graus de risco Reduzido e Moderado, coincidem nos dois modelos essencialmente com as áreas mais humanizadas, linhas de água e albufeiras, destacandose apenas a área da freguesia de Campo do Gerês, com forte incidência de valores reduzidos a médios de risco, neste caso mais uma vez por influência da densidade de pastoreio muito reduzida. Complementando a análise comparativa dos modelos de risco de incêndio e a título de aferição dos resultados, pareceu-nos interessante perceber qual a relação dos níveis de risco expressos nos dois modelos de risco com as áreas ardidas posteriores ao ano de 2003, nomeadamente incêndios ocorridos nos anos de 2004 e 2005, na área do Parque. Espacialmente, estes incêndios ocorreram maioritariamente no sector oriental do Parque, existindo apenas casos isolados no sector ocidental, porém, com áreas ardidas de alguma relevância. Da intersecção destas áreas ardidas com os dois Modelos de Risco construídos, o resultado, expresso por histogramas do grau de risco ( Fig. 7) foi o seguinte: 37 % 33 40 % 1 2 29 23 23 7 8 0 1 0 0 RISCO DE INCÊNDIO Reduzido Moderado Elevado Muito elevado Máximo 1 Segundo o Modelo de Risco 1 2 Segundo o Modelo de Risco 2 Fig. 7 – Expressão do grau de risco nas áreas ardidas registadas no PNPG em 2004 e 2005 Analisando o resultado da incidência dos diferentes graus de risco constata-se que, para os dois modelos de risco, os incêndios ocorridos em 2004 e até Agosto de 2005 registados pelo PNPG, ocorreram em áreas com grau de risco maioritariamente Elevado, Muito Elevado e Máximo, predominando os dois últimos, sendo a sua expressão em áreas de risco Reduzido e Moderado muito pouco relevantes. Não sendo conclusivo em termos de validação dos modelos, evidenciando apenas ligeiras diferenças entre eles, resultantes da diferente distribuição espacial já enunciada, não deixa de ser um bom indicador, sobre eficácia da metodologia adoptada para a modelação do risco de incêndio efectuada. Lacunas do Modelo de Risco de Incêndio Após terminado o processo de modelação do risco de incêndio no Parque, e reflectindo sobre os resultados obtidos, torna-se importante apontar algumas lacunas na concepção do modelo de risco que, obviamente interferem no resultado final obtido. Identificamos como principais lacunas, de ordem biofísica e humana, factores climáticos, temperatura, humidade relativa e vento devido à insuficiência de dados disponíveis compatíveis com a escala de análise efectuada, informação sobre o estado dos povoamentos florestais relativamente à biomassa, a forma generalista como foram tratados os dados da densidade populacional, com base nos Censos do INE, não contemplando a população “flutuante” resultante do turismo na área e a identificação das zonas de conflito entre as populações do Parque e ainda a forma “grosseira” como os dados de densidade de pastoreio foram integrados na modelação, artificializando de forma marcada a distribuição do grau de risco de incêndio. Reflexões Finais Sendo o Parque Nacional da Peneda-Gerês uma área protegida de referência, caracterizado por condições biofísicas e humanas muito particulares, procedemos a uma caracterização física e humana detalhada, que nos permitisse identificar os factores determinantes para o risco de ocorrência de incêndios. Enquanto região de características montanhosas, predominam os fortes declives, associados a um coberto vegetal rico e complexo, com predominância de vegetação arbustiva e matos associados a manchas florestais onde predominam o carvalho e o pinheiro bravo. A estas características biofísicas associam-se dinâmicas populacionais complexas, de regressão progressiva, gerando rupturas no sistema rural tradicional. A crescente falta de maneio das áreas de pastagem e o recurso ao fogo para renovação de pastos, suprindo a falta de acompanhamento dos rebanhos, propicia situações de descontrole do comportamento do fogo, gerando incêndios por vezes de grandes proporções. Assumindo como função principal a conservação dos recursos e sistemas naturais e face à situação de risco elevado expressa neste estudo, a identificação das zonas de maior risco de incêndio é um elemento fundamental no processo de planeamento e gestão da área protegida. Nesse sentido, o exercício agora realizado pretende cobrir essa lacuna importante na informação. Enquadrando variáveis biofísicas como os declives, a exposição solar, a distância às linhas de água, e humanas como a ocupação do solo, a densidade populacional e de pastoreio, a distância à rede viária e ainda considerando o grau de visibilidade a partir dos postos de vigia, os modelos de risco de incêndio obtidos registam níveis de risco de incêndio elevados para a área do Parque. Osdois modelos de risco de incêndio elaborados, independentemente das diferenças que os separam, sugerem predominância dos riscos Elevado, Muito Elevado e Máximo, associados a áreas de coberto vegetal predominante de matos e arbustivas, preferencialmente utilizados para o pastoreio, sobre os riscos Reduzido e Moderado, restringindo-se estes últimos às áreas mais humanizadas, aglomerados populacionais e áreas agrícolas e ainda às zonas próximas das linhas de água. No entanto, tratando-se apenas de modelos, os resultados obtidos carecem de uma validação técnica, em primeiro lugar e no terreno à posteriori, tanto mais quanto foram identificadas lacunas importantes que importa suprir. A associação de dados climáticos, a avaliação dos povoamentos vegetais quanto à biomassa constituem as lacunas mais importantes do ponto de vista biofísico. Do ponto de vista humano, associar dados da carga de população visitante do Parque, aproveitando dados existentes relativos ao Turismo à densidade de população residente, torna-se importante na determinação do impacte real do homem sobre o meio. Ainda a identificação de zonas de conflito entre as populações, poderiam fornecer elementos importantes quanto ao incremento do risco de incêndio no território. Finalmente, a questão do pastoreio, cuja distribuição espacial deve ser reequacionada, com base na recente delimitação das áreas de pastoreio no âmbito do Plano Zonal. Assim, a inclusão dos resultados obtidos só deverão integrar o processo de revisão do Plano de Ordenamento a a gestão dos Planos de Prevenção Contra Incêndios do Parque Nacional, após uma fase prévia de avaliação e validação dos resultados. Bibliografia LOURENÇO, L. (1993) – O uso da cartografia como indicador de risco de incêndio florestal, “Simpósio sobre Catástrofes naturais: estudo, prevenção e protecção”, LNEC, 8 a 10 de Novembro, Lisboa, pp. 37-46; PLANO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DA FLORESTA PORTUGUESA (1998), Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, DGF, Lisboa, pp. 1-13; REY GRAÑA, J.M. (2001) – Relatório dos trabalhos desenvolvidos e elaboração da cartografia temática - caracterização física do território do PNPG – produzida no âmbito do Projecto de Revisão do Plano de Ordenamento do Parque Nacional da Peneda-Gerês, policopiado, PNPG, Braga. RODRIGUES, N. T. (2002) – Inventário Florestal do Parque Nacional da Peneda-Gerês, Relatório de Estágio, PNPG, Braga, 43 pp.; SERRÃO, M. (2005) – A Política Florestal e o Desenvolvimento Sustentável, Comunicação integrada no “IV Encontro de Geografia Física e Ambiente: Recursos Naturais, Desenvolvimento e Sustentabilidade, Núcleo de Investigação em Geografia e Planeamento/GeoPlanum, Universidade do Minho; SISTEMA DE INFORMACIÓN GEOGRÁFICA PARA EL TERRITORIO RURAL DE GALICIA-NORTE DE PORTUGAL (2004), Secretaria Xeral de Planificación e Desenvolvemento Comarcal, 81 pp.