Literatura Brasileira Professor Márcio Moraes Literatura Parnasiana (1882) Teófilo Dias – Fanfarras (1882) Alberto de Oliveira – Versos e rimas (1895) Raimundo Correia – Sinfonias (1883), Poesias (1898) Olavo Bilac – Poesias (1888), Tratado de versificação (1910) www.marcioadrianomoraes.com Vaso grego As pombas Esta, de áureos relevos, trabalhada De divas mãos, brilhante copa, um dia, Já de aos deuses servir como cansada, Vinda do Olimpo, a um novo deus servia. Vai-se a primeira pomba despertada ... Vai-se outra mais ... mais outra ... enfim dezenas De pombas vão-se dos pombais, apenas Raia sanguínea e fresca a madrugada ... Era o poeta de Teos que a suspendia Então e, ora repleta ora esvazada, A taça amiga aos dedos seus tinia Toda de roxas pétalas colmada. E à tarde, quando a rígida nortada Sopra, aos pombais de novo elas, serenas, Ruflando as asas, sacudindo as penas, Voltam todas em bando e em revoada... Depois. Mas o lavor da taça admira, Toca-a, e, do ouvido aproximando-a, às bordas Finas hás de lhe ouvir, canora e doce, Também dos corações onde abotoam, Os sonhos, um por um, céleres voam, Como voam as pombas dos pombais; Ignota voz, qual se da antiga lira Fosse a encantada música das cordas, Qual se essa a voz de Anacreonte fosse. No azul da adolescência as asas soltam, Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam, E eles aos corações não voltam mais... (Alberto de Oliveira) (Raimundo Correa) www.marcioadrianomoraes.com www.marcioadrianomoraes.com 1 Literatura Brasileira Professor Márcio Moraes Profissão de Fé Não quero o Zeus Capitolino Hercúleo e belo, Talhar no mármore divino Com o camartelo. [...] Torce, aprimora, alteia, lima A frase; e, enfim, No verso de ouro engasta a rima, Como um rubim. Invejo o ourives quando escrevo: Imito o amor Com que ele, em ouro, o alto relevo Faz de uma flor. [...] Quero que a estrofe cristalina, Dobrada ao jeito Do ourives, saia da oficina Sem um defeito: [...] Imito-o. E, pois, nem de Carrara A pedra firo: O alvo cristal, a pedra rara, O ônix prefiro. Porque o escrever - tanta perícia, Tanta requer, Que oficio tal... nem há notícia De outro qualquer. Por isso, corre, por servir-me, Sobre o papel A pena, como em prata firme Corre o cinzel. [...] Assim procedo. Minha pena Segue esta norma, Por te servir, Deusa serena, Serena Forma! [...] (Olavo Bilac) www.marcioadrianomoraes.com Literatura Simbolista (1893) Tristezas da lua Divaga em meio à noite a lua preguiçosa; Como uma bela, entre coxins e devaneios, Que afaga com a mão discreta e vaporosa, Antes de adormecer, o contorno dos seios. No dorso de cetim das tenras avalanchas, Morrendo, ela se entrega a longos estertores, E os olhos vai pousando sobre as níveas manchas Que no azul desabrocham como estranhas flores. Se às vezes neste globo, ébria de ócio e prazer, Deixa ela uma furtiva lágrima escorrer, Um poeta caridoso, ao sono pouco afeito, No côncavo das mãos toma essa gota rala, De irisados reflexos como um grão de opala, E bem longe do sol a acolhe no seu peito. (Charles Baudelaire, Flores do mal 1857) Carlos Schwabe - A morte do escavador (1890) www.marcioadrianomoraes.com www.marcioadrianomoraes.com 2 Literatura Brasileira Professor Márcio Moraes Antífona O assinalado Ó Formas alvas, brancas, Formas claras De luares, de neves, de neblinas! Ó Formas vagas, fluidas, cristalinas... Incensos dos turíbulos das aras [...] Tu és o louco da imortal loucura, O louco da loucura mais suprema. A Terra é sempre a tua negra algema, Prende-te nela a extrema Desventura. Visões, salmos e cânticos serenos, Surdinas de órgãos flébeis, soluçantes... Dormências de volúpicos venenos Sutis e suaves, mórbidos, radiantes... [...] Mas essa mesma algema de amargura, Mas essa mesma Desventura extrema Faz que tu'alma suplicando gema E rebente em estrelas de ternura. Flores negras do tédio e flores vagas De amores vãos, tantálicos, doentios... Fundas vermelhidões de velhas chagas Em sangue, abertas, escorrendo em rios... Tu és o Poeta, o grande Assinalado Que povoas o mundo despovoado, De belezas eternas, pouco a pouco... Tudo! vivo e nervoso e quente e forte, Nos turbilhões quiméricos do Sonho, Passe, cantando, ante o perfil medonho E o tropel cabalístico da Morte... Na Natureza prodigiosa e rica Toda a audácia dos nervos justifica Os teus espasmos imortais de louco! (Cruz e Sousa, Broquéis 1893) (Cruz e Sousa, Broquéis 1893) www.marcioadrianomoraes.com A Cabeça de Corvo Ismália Na mesa, quando em meio à noite lenta Escrevo antes que o sono me adormeça, Tenho o negro tinteiro que a cabeça De um corvo representa. Quando Ismália enlouqueceu, Pôs-se na torre a sonhar... Viu uma lua no céu, Viu outra lua no mar. A contemplá-lo mudamente fico E numa dor atroz mais me concentro: E entreabrindo-lhe o grande e fino bico, Meto-lhe a pena pela goela a dentro. No sonho em que se perdeu, Banhou-se toda em luar... Queria subir ao céu, Queria descer ao mar... E solitariamente, pouco a pouco, Do bojo tiro a pena, rasa em tinta... E a minha mão, que treme toda, pinta Versos próprios de um louco. E, no desvario seu, Na torre pôs-se a cantar... Estava perto do céu, Estava longe do mar... E o aberto olhar vidrado da funesta Ave que representa o meu tinteiro, Vai-me seguindo a mão, que corre lesta. Toda a tremer pelo papel inteiro. E como um anjo pendeu As asas para voar... Queria a lua do céu, Queria a lua do mar... Dizem-me todos que atirar eu devo Trevas em fora este agoirento corvo, Pois dele sangra o desespero torvo Destes versos que escrevo. As asas que Deus lhe deu Ruflaram de par em par... Sua alma subiu ao céu, Seu corpo desceu ao mar... (Alphonsus de Guimaraens) (Alphonsus de Guimaraens) www.marcioadrianomoraes.com www.marcioadrianomoraes.com 3