A importância da Ciência das Religiões como
disciplina referencial no curso de Pedagogia
Maria Efigênia Daltro Coelho
Bacharel em Teologia. Licenciada em Filosofia. Mestra em Teologia-Educação Comunitária Infância e Juventude.
E-mail:[email protected]
Resumo
Focaliza a importância da Ciência das Religiões como instrumento para a ampliação do
conhecimento dos vários grupos religiosos. O objetivo deste artigo é levar à reflexão sobre o papel
do educador para a religiosidade, assim como pontuar a necessidade desta área do conhecimento
nos processos educativos como fator do desenvolvimento escolar na realização do Ensino
Religioso. A Ciência das Religiões como disciplina empírica, que investiga de forma sistemática, a
religião em todas as suas manifestações, servirá de subsídio para o entendimento do fenômeno
religioso através do conhecimento das culturas e tradições religiosas presentes no convívio social
dos educandos, com a finalidade de entre eles construir o diálogo cultural e a reverência ao
Transcendente. Trabalhar com a diversidade religiosa com tolerância ajudará na compreensão dos
pré-conceitos em relação ao desconhecido, ao diferente.
Palavras-chave: Religião. Ciência da Religião. Ensino religioso. Cultura.
The importance of Science of Religions as a reference discipline in the
Faculty of Education
Abstract
This article seeks to focus the importance of the science of religions as a tool for extending
knowledge of the various religious groups. The aim of this paper is to lead to reflection on the
role of educator for religiosity, as well as scoring the need for this area of knowledge in the
educational processes as a factor in the achievement of school development of Religious
Education. The Science of Religions as empirical discipline, which investigates in a systematic
way, religion in all its manifestations, will serve as input to the understanding of religious
phenomenon through the knowledge of cultures and religious traditions in social life of
students, in order to including building cultural dialogue and reverence to the Transcendent.
Working with religious diversity with tolerance will help in understanding the preconceptions
about the unknown, the different.
Keywords: Religion. Science of Religion. Religious Education. Culture.
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INTRODUÇÃO
Dentro da multiplicidade populacional histórica, objeto de afirmações contundentes a
favor ou contra a liberdade de religião e de expressão, buscamos entender a interferência ou
influência religiosa na integração e relação entre docentes e discentes na compreensão do
Ensino Religioso.
Partindo deste princípio, faz-se necessário a apreensão da realidade dessa composição
populacional, marcada pela pluralidade cultural, étnica e religiosa, em que a experiência, a
tolerância e o respeito sejam valorizados e compreendidos, com superação dos pré-conceitos
em relação ao outro e ao desconhecido, entendendo que cada um possui suas próprias
experiências e convicções de vida religiosa e cultural, observando tolerância e ética como
princípios básicos. Assim, conhecer o universo religioso, delimitando as próprias crenças em
relação às crenças diferentes, admitindo que todas elas têm valor intrínseco, e procurar um
diálogo saudável entre as diversas tradições pode fazer o ser humano situar-se no mundo de
forma muito mais segura e fraterna.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional abre espaço para um ensino
interconfessional, assegurando o respeito à diversidade cultural e religiosa do Brasil, vedadas
quaisquer formas de proselitismo (BRASIL, 2007). Entendemos a religiosidade como
autêntica dimensão humana, sendo necessário seu cultivo para a plena realização do ser
humano, daí contemplarmos este aspecto na proposta de sua educação.
O Ensino Religioso é uma preocupação constante para todos nós. Ele visa a educação
plena do educando, à formação de valores fundamentais através da busca do Transcendente e
da descoberta do sentido mais profundo da existência humana. Ao ignorá-lo, estaríamos
desprezando e violentando o direito a uma educação completa e o respeito à liberdade do ser
humano.
Um ensino religioso, sem nenhum propósito doutrinador de uma determinada visão
religiosa, de maneira respeitosa e reverente, deve incentivar e desencadear no educando um
processo de conhecimento e vivência de sua própria religião, mas também um interesse por
outras formas de religiosidade, ampliando seu universo cultural.
O que entendemos como religião pode ser definido como o elo entre o ser humano e o
sagrado. O termo “sagrado” é básico para entender uma tradição religiosa que tem se
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manifestado no decorrer da história, em todas as partes do mundo, com diversidades e
diferenças múltiplas, cumprindo funções individuais e sociais.
Ao refletirmos sobre a formação do educador de Ensino Religioso em nível Superior,
encontramos inúmeros desafios e vislumbramos inúmeras perspectivas para uma formação
mais sólida, profunda e qualificada no estudo do fenômeno religioso e a construção de uma
cultura do diálogo, pois sem ele não há comunicação e sem esta não há verdadeira educação.
O diálogo é uma exigência existencial. Ele é o encontro solidário entre o refletir e o agir dos
sujeitos endereçados ao mundo a ser humanizado e transformado; logo não pode reduzir-se a
um ato de depositar ideias de um sujeito no outro, nem tornar-se simples troca de ideias a
serem consumidas pelos permutantes:
O pluralismo constitui-se no novo tipo humano emergente. O pluralista não é
aquele que abdica de suas convicções, nem tampouco aquele que impõe suas
convicções a outros, mas é aquele que se serve do diálogo para enriquecer e
renovar suas convicções. O esquema que estrutura o diálogo não é umdepois-do-outro, mas um-com-o-outro. O tomar parte em uma conversação
devolve-nos a nós mesmos, ao mesmo tempo em que nos manifestamos sem
dominar e nos abrimos sem auto-anular-nos, na disposição em receber a
palavra que vem a nós pelo outro. No diálogo autêntico não somos nem
espectadores passivos tampouco assistentes indiferentes ou membros
dominadores, mas parceiros, de forma que a verdade se põe num terceiro
termo colocado pelos dialogantes. (GUIMARÃES, 2004).
IMPORTÂNCIA DA CIÊNCIA DAS RELIGIÕES NO ENSINO RELIGIOSO
A Ciência das Religiões fundamenta-se na investigação sistemática da história das
religiões, segundo seu desenvolvimento externo e suas características essenciais internas. A
história das religiões deve não só esboçar a evolução externa e apresentar suas práticas e
ideias fundamentais, mas também tornar visível seu lado inteiro, a saber, a fé que nelas se
expressa e determina a piedade de indivíduos e dos portadores em sua totalidade (SMITH,
1979). Entretanto, ela não pode operar sem critérios de valoração. Ao distinguir, por exemplo,
entre crescimento vivo e enrijecimento externo ou entre aprofundamento místico e
superficialização racional, ela coloca acentos que estão determinados de modo especial pela
personalidade do historiador. Uma história das religiões puramente objetiva não é possível,
mas permanece a exigência de que seus resultados sejam verificáveis:
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O mundo das religiões é visível para todos. Os historiadores da religião
explicam-no como guias turísticos de um castelo ou guardas-florestais de
uma floresta. Representantes da Ciência Sistemática da Religião enxergam
alguma coisa além do que os outros vêem. Compreendem algo que foge da
atenção, tanto dos seguidores de uma religião, quanto dos historiadores que
pesquisam sobre ela. Os representantes da Ciência Sistemática da Religião
descobrem algo geral naquilo que é específico. (GRESCHAT, 2005).
O objetivo da Ciência das Religiões é inventariar, abrangentemente, os fatos do mundo
religioso investigando suas inter-relações com outras áreas da vida, a partir de um estudo de
fenômenos religiosos concretos. A Ciência das Religiões tem uma estrutura multidisciplinar.
Trata-se de um campo de intersecção de várias sub-ciências e ciências auxiliares. As mais
referidas são: a História da Religião, a Sociologia da Religião e a Psicologia da Religião.
Mesmo conhecido como um campo religioso, extremamente dinâmico, são poucas as
instituições, no Brasil, preocupadas com um saber detalhado sobre a história e a situação
religiosa atual, que incluíram em sua matriz curricular o Curso de Licenciatura Plena em
Ciência das Religiões, ou como disciplina referencial no Curso de Pedagogia.
Hoje, o estudo da Ciência das Religiões propõe o conceito de religião como um
elemento independente na existência humana, vinculado aos fatores psicológicos e sociais,
mas também dotado de estrutura própria. É difícil, entretanto, encontrar um conceito de
religião que se adapte a todos os grupos humanos que professam uma fé e realizam seus
cultos.
As diversas religiões não são todas comparáveis entre si e torna-se difícil colocá-las sob
um único referencial. Justamente, porque há adeptos religiosos que afirmam ser a sua forma
de fé a única religião verdadeira, o que exclui valores e sentido em todas as outras; uns
denominam as outras de ilusórias ou, no melhor dos casos, incompletas. Há cientistas das
religiões que preferem estudá-las singularmente, individuando-as no seu contexto cultural e
histórico.
O problema aparece quando se pretende fazer analogias ou aproximações que resultam
de interpretações com critérios diversos: alguns as consideram como produto de encontros e
influências entre grupos populacionais, assim, as ideias de fé e culto seriam transmitidas como
os conhecimentos culturais. Outros procuram, através de confrontos, descobrir o que distingue
o conceito de religião em si.
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O Ensino Religioso, na escola, tem como finalidade acompanhar e complementar uma
etapa de crescimento do ser humano, quando os aspectos internos e externos estão mais
pungentes. Mudar mentalidades, superar o preconceito e combater atitudes discriminatórias
são finalidades que envolvem lidar com valores de reconhecimento e respeito mútuos. A
escola tem um papel importante a desempenhar nesse processo porque é um dos espaços em
que se dá a convivência entre educandos de origens diferentes, com costumes diferentes
daqueles que cada um concebe, com visões de mundos diversos daquela que cada um
compartilha em família.
O tema aqui proposto é a evolução efetiva no conhecimento e reconhecimento do outro,
em sua identidade religiosa. Ninguém precisa “sacrificar” a sua identidade religiosa em
benefício de outra. Reconhecer a identidade do outro não envolve imolação da própria
identidade; trata-se de um ato de reconhecimento solidário. É preciso um diálogo interreligioso, proveitoso, para o aprendizado sobre outras tradições de fé.
O diálogo interreligioso é uma nova forma de estudar o próprio fenômeno religioso. Ao
longo do desenvolvimento das ciências humanas e sociais, diferentes especialistas vêm
estudando as religiões, a partir de suas especialidades. Os sociólogos pesquisam o papel da
religião na sociedade, os antropólogos estudam as práticas, os rituais e os comportamentos
religiosos, e na mesma linha vão os fenomenólogos, procurando compreender as
manifestações religiosas no cotidiano.
Hoje, de mais a mais, está havendo um despertar para a necessidade de um estudo mais
conjunto, envolvendo os diferentes cientistas e também pensadores do próprio meio religioso.
O diálogo inter-religioso presente no espaço acadêmico, é, sem dúvida, um importante
caminho para isso e, quem sabe, um testemunho fecundo e revelador da transdisciplinaridade.
A prática da transdisciplinaridade e o diálogo inter-religioso fazem parte do conjunto de
movimentos que ajudam a recuperar culturas perdidas e revalorizam aspectos da humanidade
presentes e passados que são fundamentais, na reinvenção do humano.
A disciplina Ciência das Religiões deve ensinar não somente teorias, mas a
aproximação existencial do educando com o transcendente. Deve-se trabalhar a pluralidade
religiosa para que os educandos conheçam todas as religiões, suas tradições, seus rituais, seus
modos de adoração e ligação à Transcendência, excluindo, assim, qualquer forma de
proselitismo.
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Por todas essas necessidades, a Ciência das Religiões não quer apenas só revestir-se de
uma formalidade acadêmica, mas, também, deseja fornecer a oportunidade de momentos
vivenciais como forma de experienciar-se o que racionalmente será discutido, defendendo
valores e ideias com respeito e tolerância à diversidade religiosa, que é própria das múltiplas
culturas humanas.
FORMAÇÃO E PRÁTICAS DOCENTES: INFLUÊNCIAS E INTERFERÊNCIAS
Entendendo os princípios e práticas da metodologia de ensino de Paulo Freire, quando
ele dizia tratar-se mais de uma Teoria do Conhecimento, ou melhor, ainda mais um método de
aprender que um método de ensinar, Paulo Freire cria uma concepção de educação popular
em que consolidou um dos paradigmas mais ricos da pedagogia contemporânea, rompendo
radicalmente com a educação elitista. Freire dá sua efetiva contribuição para a formação de
uma sociedade democrática ao construir um projeto educacional radicalmente democrático e
libertador.
Ao longo de sua militância educacional, social e política, Freire jamais deixou de lutar
pela superação da opressão e desigualdades sociais entendendo que um dos fatores
determinantes para que ela se dê é o desenvolvimento da consciência crítica, através da
consciência histórica. Seu projeto educacional sempre contemplou essa prática, construindo
sua teoria do conhecimento, com base no respeito pelo educando, na conquista da autonomia
e na dialogicidade como princípios metodológicos. Esse pensar crítico e libertador que
permeia sua obra serve como inspiração para educadores do mundo inteiro que acreditam ser
possível unir pessoas numa sociedade com equidade e justiça.
Segundo Harmon (1975), a pedagogia proposta por Freire é fundamentada numa
antropologia filosófica dialética cuja meta é o engajamento do indivíduo na luta por
transformações sociais. Sendo assim, para Freire (1987), a base e relação da pedagogia é o
diálogo. A atitude dialógica é, antes de tudo, uma atitude de amor, humildade e fé nos
homens, no seu poder de fazer e de refazer, de criar e de recriar.
Entre educador e educando não há mais uma relação de verticalidade, em que um é
sujeito e o outro objeto. Agora, a pedagogia é dialógica, pois ambos são sujeitos do ato
cognoscente. É o “aprender ensinando e o ensinar aprendendo”. O diálogo, em Freire, exige
um pensar verdadeiro, um pensar crítico. Este não dicotomiza homens e mundo, mas os vê em
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contínua interação. Como seres inacabados, os homens se fazem e refazem na interação com
mundo, objeto de sua práxis transformadora (BOUFLEUER, 1991). A prática pedagógica
passa a ser uma ação política de troca de concretudes e de transformação.
É, no debate da diversidade cultural e na perspectiva de uma educação humanista, que a
religiosidade tem que ser considerada tema de uma questão pedagógica fundamental de
preocupação e de formação dos educadores. Um dos problemas atuais é o da científica e
didática do educador de religião, figura profissional que não deve ser confundido com a do
catequista.
Paulo Freire explica que ensinar exige: aceitação do novo; rejeição a qualquer forma de
discriminação; consciência de inacabamento; respeito à autonomia do educando; bom senso;
humildade; e tolerância. Freire também nos mostra que a educação é ideológica. Portanto,
para modificar o quadro de intolerância, faz-se necessário que a educação tenha uma
ideologia pró-tolerância, pró-respeito, pró-alteridade. Entre o que pregamos e o que
efetivamente vivenciamos, é preciso haver coerência, constância, exemplificação e assunção.
A implementação do Ensino Religioso, nas escolas públicas, passa pelo grave problema
da falta de bons profissionais, capazes de transmitir conceitos gerais sobre todas as religiões,
sem deixar prevalecer suas próprias ideias, ou ideias da religião que representam. Um docente
formado em uma Licenciatura em Ciências da Religião estaria qualificado para um ensino
religioso numa perspectiva plurirreligiosa, enfocando o fenômeno religioso, como construção
sociocultural construtor de valores éticos.
Toda proposta para a realização do Ensino Religioso deve ser baseada na transmissão
dos fundamentos das maiores religiões existentes no Brasil, com ênfase nos aspectos que lhes
são comuns: práticas de boas ações, busca do bem comum, aprimoramento do caráter humano
etc.
Sabe-se que o fator regular da educação é a capacidade que o ser humano tem de
aprender experiências e a maior parte de suas ações está determinada pelo comportamento
adquirido. Com isso, a educação proporciona um harmonioso desenvolvimento da
personalidade do ser humano, ajustando-o ao meio em que vive para que saiba aceitar,
compreender e reagir adequadamente às circunstâncias físicas, sociais, religiosas e culturais
de seu ambiente.
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Temos a necessidade de uma educação em que o “religioso” seja conhecido e
trabalhado como uma dimensão historicamente indissociável das culturas, como um dos
maiores meios de acesso para a interpretação da história humana:
Passando à descoberta do outro, necessariamente, pela descoberta de si
mesmo, e por dar à criança e ao adolescente uma visão ajustada do mundo,
a educação, seja ela dada pela família, pela comunidade ou pela escola,
deve antes de mais ajudá-los a descobrirem-se a si mesmos. Só então
poderão, verdadeiramente, pôr-se no lugar dos outros e compreender as suas
reações. DELORS, 1999).
O perfil do educador de Ensino Religioso deve estar vinculado ao compromisso de
respeito às diferenças presentes na vida da escola, um profissional que, em tese, tenha sua
sensibilidade aperfeiçoada, para que esteja apto a transmitir as ideias e tradições das
principais religiões com um grau relativo de isenção; esta é a razão que justifica um Ensino
Religioso conduzido pela perspectiva da Ciência das Religiões.
A escola, sendo um espaço de construção de conhecimento e de socialização dos
conhecimentos historicamente produzidos e acumulados, assumirá a tarefa de educar do ponto
de vista religioso, colocando o conhecimento religioso à disposição de todos os que quiserem
acessá-lo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Entendemos que toda ação educacional parte do pressuposto de que o ser humano se
encontra num caminho de busca, humanamente infindável: busca da verdade e busca de uma
pessoa em quem se pode confiar. O Ensino Religioso, fundamentado em elementos de razão e
fé, vem em sua ajuda, dando-lhe possibilidade concreta de ver realizado o objetivo dessa
busca.
A religiosidade jamais será extinta do coração do ser humano e sempre expressará sua
força na medida em que existir e prosseguir.
A constante busca humana de salvar a vida e de sobreviver entre as
perplexidades do tempo histórico, repleto de inseguranças, incertezas e
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desafios. É o desejo humano esperar alguém no qual pode confiar
incondicionalmente. (ASSMANN, 1998).
O Ensino Religioso denota a preocupação da sociedade em aprofundar questões
históricas, culturais e sociais, resgatando valores que deveriam ser intrínsecos à pessoa
humana, como as virtudes, os valores morais e éticos e o engajamento na luta pela vida e pela
qualidade de vida para todos.
Perceber o Ensino Religioso como uma área do conhecimento preocupada em
desenvolver a capacidade do educando em dialogar consigo, com o outro, com o diferente e
com o transcendente, não é das tarefas a mais fácil. A grande tendência verificada é um
ensino catequético, rodeado de dogmas da religião que, por muitas décadas, “dominou” a
escola. Valorizar as diferentes crenças e culturas, respeitar os variados ritos, expressão dos
fenômenos religiosos de cada educando, aceitar suas crenças, muitas vezes ingênuas, sem
qualquer fundamentação teológica. É atribuição essencial do educador de Ensino Religioso.
Conhecer o universo religioso, delimitando as próprias crenças em relação às crenças
diferentes, admitindo que todas elas possuem valores, e procurar um diálogo saudável entre as
diversas tradições é atribuição essencial do educador de Ensino Religioso.
A escola, sendo um espaço de construção de conhecimentos e de socialização dos
conhecimentos historicamente produzidos e acumulados, assumirá a tarefa de educar do ponto
de vista religioso, colocando o conhecimento religioso à disposição de todos os que queiram
acessá-lo. A metodologia do Ensino Religioso garantirá que todos os educandos tenham a
possibilidade de estabelecer um diálogo aberto e permitirá que, na sala de aula, educador e
educandos realizem um intercâmbio, um respeito profundo à alteridade.
O perfil desejado do educador de Ensino Religioso é de alguém disponível para o
diálogo, capaz de articulá-lo a partir de questões suscitadas no processo de aprendizagem. O
professor deve ser o interlocutor entre a escola e a comunidade, mediando os conflitos;
alguém que naturalmente vive a reverência da alteridade e leva em consideração que família e
comunidade religiosa são espaços privilegiados para a vivência religiosa e para a opção de fé.
Assim, o educador coloca seu conhecimento e sua experiência pessoal a serviço da liberdade
do educando.
Percebe-se, enfim, pelas muitas tentativas, que não se pode em poucas palavras definir
conclusivamente religião, devido à grande diversidade cultural e religiosa de nosso país,
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talvez, nem mesmo em muitas palavras isto seja possível. O que esperamos é a indução de
uma educação inclusiva, com integração de diversos saberes, colaborando assim, contra o
racismo, discriminações e intolerâncias e que a riqueza cultural seja considerada na sua
diversidade étnica e racial presente em todo o Brasil, com um fazer pedagógico mais criativo
e humanitário. Em situações de confusão cultural e religiosa, a atitude de proselitismo, seja
esta explícita ou implícita, seria antieducativa e devastadora, e se transformaria em atitude
negativa e discriminatória. “Quebrar preconceitos, buscar o respeito às diferenças de todos os
tipos não significa homogeneização, unificação. É justamente quando nos despimos de nossos
olhares preconceituosos que podem ser diferentes e aceitar a diferença na outra pessoa.”
É preciso resignificar nossas práticas, ampliar nossa visão de ser humano e de mundo,
rever conceitos e preconceitos e assim estabelecermos modelos de relacionamentos humanos
em que os vínculos entre realidade, respeito e afabilidade sejam responsáveis para um
ambiente de paz:
Uma sociedade onde caibam todos só será possível num mundo no qual
caibam muitos mundos. A educação se confronta com essa apaixonante
tarefa: formar seres humanos para os quais a criatividade e a ternura sejam
necessidades vivenciais e elementos definidores dos sonhos de felicidade
individual e social. (ASSMANN, 1998).
O ser humano é, por natureza, um ser social. A educação que não aponta para o outro é,
no mínimo, aniquiladora. Aniquila a possibilidade do encontro. Os indivíduos têm a
capacidade de influir uns no comportamento dos outros, modificando-se mutuamente, no
processo de interação social. Não vale somente estar presente no mundo [sociável] com
desejos pessoais [personalizados] é preciso que haja busca, nesse contexto, da transformação.
Uma transformação que nasça do desejo constante de doação plena, atuante e realizadora.
Essa doação só é possível quando exercitada pelo amor.
Espera-se do educador de Ensino Religioso, um aprimoramento dos conhecimentos
teóricos sobre as religiões e um aperfeiçoamento de sua sensibilidade, ante o rico patrimônio
espiritual de que são portadoras as tradições religiosas. E que a apresentação do fenômeno
religioso aos educandos, seja feita de forma digna e honesta.
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REFERÊNCIAS
ASSMANN, Hugo. Reencantar a educação: rumo à sociedade aprendente. Petrópolis:
Vozes, 1998.
BRASIL. Lei n. 9.394 de 20 de dezembro de 1996. Art. 33. Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional. Disponível em :
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03LEIS/l9394.htm. Acesso em: 17 abr. 2007.
DELORS, Jaques (Org.). Educação: um tesouro a descobrir. 2. ed. São Paulo: Cortez;
Brasília: MEC/UNESCO, 1999.
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 38. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
GRESCHAT, Hans-Jürgen. O que é Ciência da Religião? São Paulo: Paulinas, 2005.
GUIMARÃES, Marcelo Rezende. Um novo mundo é possível. São Leopoldo: Sinodal, 2004.
Artigo recebido em 19/12/2011 e aceito para publicação em 29/11/2012.
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