mt-,mv.jfjmfíu>, MMM Há uma armadilha liberal no caminho quer demanda e qualquer direito. £ a velha história de que a vontade geral O processo em direção à Assem- é uma soma das vontades particulableia Nacional Constituinte já foi res. Em segundo lugar, uma Constideslanchado e tende a colocar-se tuinte e sua consequência, deve como prioridade absoluta. Está nos representar o jogo de interesses e de jornais cotidianamente, está nos par- suas forças em sentido estático, uma tidos, nas universidades, nos sindica- espécie de coagulação das mudanças tos e nos movimentos sociais. A já realizadas, apenas a letra da lei correspondência história entre forças que expressa o que já se fez. Em políticas e sociais e formas da terceiro lugar, e o que é mais institucionalização já está estabele- perigoso, a Constituinte deverá marcida; no passado mais recente, ainda car o terreno dos interesses individuquando já fosse gritante a defasagèm ais, segundo a velha fórmula liberal entre a forma institucional e as novas de que o "meu direito termina onde relações sociais, uma parte impor- começa o seu". tante da sociedade ainda não se tinha Uma Constituinte e sua consequênposto a campo para lograr aquela cia maior não deve ser a coagulação correspondência. das relações societárias já estabeleMas convém não ser ingénuo no cidas; ela é antes de tudo um que respeita aos interesses que traba- instrumento para criar novas relalham pela Constituinte. De início, um ções societárias, um espaço aberto tremendo esforço será necessário onde o direito à contestação, à para lograr-se uma Constituinte re- desestabilização, à construção de almente representativa: sabemos novas formas, e mesmo, em última que a eleição de um simples vereador instância, o direito de ultrapassar o já constitui hoje um "tour de force" "status quo" tem prioridade sobre em termos económicos, e o custo de quaisquer outros. Deste ponto de uma eleição para a Constituinte vista, a Constituição que se elabora poderá vir a ser acessível apenas aos pela Constituinte não pode ser uma nababos, o que seria trágico. vontade geral que é uma simples Do modo como se está pondo a soma das vontades particulares, mas questão da Constituinte, há uma uma vontade geral que é a negação armadilha liberal no caminho: em das vontades particulares; uma primeiro lugar, tende-se a vender a Constituição que regule o presente ideia de que uma Constituinte é um abrindo-se para o futuro. E por isso processo (e sua consequência — uma ela não pode ficar no terreno do Constituição) neutro, em que a forma direito liberal de que "o meu termina jurídica abre-se para acolher qual- onde o seu começa ", mas adotar uma FRANCISCO DE OLIVEIRA Especial para a Folha concepção hodierna do direito de que produto social para prover necessi"o meu direito é perpassado pelo seu, dades gerais e particulares. Esta é ou de que o meu direito é interpene- uma concepção antiquada, que estrado pelo seu", isto é, um instru- conde o que o fundo público é: um mento de reconhecimento do "alter" campo de luta social onde se decide a do outro. Na prática, por exemplo, o maior parte dos conflitos sociais. Se o direito de greve não poderá ser Estado, como foi provado durante o apenas o de que a greve é um período autoritário, decide rebaixar instrumento de reivindicação de ope- as quotas das despesas sociais para rários e assalariados, que é a postura destiná-las à subvenção ao capital, liberal mais avançada, mas o de que na tradição liberal parece ser apenas a greve faz parte do processo de o exercício do direito do Estado, constituição da identidade dos assa- constituído como aquela vontade gelariados e portanto, de sua própria ral emanada das vontades particulaalteridade vis-a-vis" o patronato; res. O que isto esconde, por trás alargando a exemplificação, o direito desse direito do Estado, é a negação de greve perpassa o direito do do direito de outros grupos e classes proprietário do capital no sentido de sociais. A presença do fundo público que a força de trabalho é uma é insubstituível e irreversível no riqueza social que não pode ser capitalismo contemporâneo, pese aos malgastada ou desgastada pelos ca- arreganhos autoritários dos "Reaprichos de um proprietário individu- gans e "Thatchers" da vida. Sem al. regulação do fundo público, què é a peça-chave para a própria regulação No processo da Constituinte e de do sistema capitalista, toda ordem sua Constituição, um campo privile- democrática naufragará em meio às giado para a construção de regras brilhantes tiradas constitucionalissocietárias modernas e democráti- tas. Pela regulação do fundo público cas, é sem dúvida o da gestão do se demarcará o projeto do futuro da fundo público. Este é uma riqueza sociedade. Ele é o fulcro da concepsocial, que financia tanto a reprodu- ção moderna, pois é o "locus" do ção do capital quanto a reprodução embricamento dos direitos, do "meu da força de trabalho, em particular, direito perpassado pelo seu''. ou mais genericamente, o bem-estar da população. As regras das Constituintes liberais em gerai, tratam do FRANCISCO MAMA CAVALCANTI DE OLIVEIRA, 51, fundo público de um ângulo sobretu- sociólogo, é pesquisador do Centro Brasileiro d e e Planejamento (Cebrap) e professor do curso do fiscal/orçamentário, do angulo do Análise d e p ó s - g r a d u a ç ã o e m Economia d a Pontifícia direito do Estado utilizar parte do Univirsidade Católica (PUC), de São Paulo.