A Teoria do Caos na Economia
Marcos Cintra*
Doutor em Economia pela Universidade de
Harvard (EUA), vereador da cidade de são Paulo
pelo PL e professor titular da Fundação Getulio
Vargas (SP). Foi secretário do Planejamento e de
Privatização e Parceria do Município de São
Paulo (administração Paulo Maluf)
A Teoria do Caos, analisada em recente publicação do Instituto Liberal – “Caos,
Administração e Economia: As implicações do Pensamento Não-Linear”, de D.
Parker e R. Stacey (125 págs.) – está causando uma revolução no pensamento
econômico. Seus postulados básicos, que se aplicam também nas Ciências Naturais,
dizem que o mundo não se caracteriza pela ordem, mas sim pelo caos. O desiquilíbrio é
a norma, e não a exceção.
Isto não significa a inexistência de relações causais, mas sim que elas são
altamente complexas para poderem ser tratadas por meio de relações lineares como as
que são utilizadas em economia. Em sistemas não-lineares, não-aditivos, e altamente
dependentes das condições iniciais, a Teoria do Caos nos ensina que pequenos
distúrbios podem causar grandes perturbações. Além disso, a não-linearidade implica
que um dada causa ou ação pode ter mais de um efeito ou resultado, diferentemente das
relações lineares onde cada causa tem um, e apenas um efeito.
Em outras palavras, vivemos em um mundo caracterizado pela desordem dentro
da ordem. Por exemplo, não conseguiremos jamais prever com exatidão as condições
meteorológicas de uma dada semana janeiro da cidade de São Paulo, que sempre
mostrará um comportamento imprevisível e caótico. Porém, podemos ter certeza que
jamais cairá neve.
Em sistemas caóticos, pequenas e imprevisíveis mudanças nas “condições
iniciais” podem causar grandes perturbações. Uma borboleta batendo asas em Tóquio
pode causar um furacão em Nova Iorque, sem que ninguém seja capaz de traçar o
caminho de volta do furacão até a borboleta japonesa.
Se os sistemas humanos pertencem ao tipo caracterizado pela Teoria do Caos,
torna-se evidente a impossibilidade do planejamento a longo prazo. Raramente as
previsões econômicas logram sucesso, ainda que elaboradas com a ajuda de complexos
sistemas de centenas de equações simultâneas. O sonho da programação econômica
socialista, bem como o hiperativismo macroeconômico que caracterizou a era
keynesiana, igualmente encontram sérios obstáculos e enormes contraindicações. Em
realidade, uma dada política pode ter um resultado inesperado e, não raro, até mesmo
contrario ao inicialmente planejado. É só nos lembrarmos da contribuição de Milton
Friedman ao estudo das causas da crise de 29 – quando apontou que a crise resultou de
erros na política monetária norte-americana – para verificarmos o enorme risco
implícito na adoção de políticas macroeconômicas para definir os rumos da economia.
Outro exemplo dramático vem do sistema tributário brasileiro. Trata-se de
sistema altamente complexo, burocrático, ainda que possa ser caracterizado como capaz
de maximizar as qualidades desejadas de eficiência e equidade. Contudo, para que o
processo de maximização seja efetivado há que se considerar as condições iniciais do
sistema. Neste ponto o sistema entra em colapso.
Erros e desvios, mesmo que minúsculos, nas especificações do sistema, como
evasão, a sonegação e os custos de arrecadação, se propagam e se ampliam, podendo
levar a resultados totalmente divergentes daqueles inicialmente esperados. Daí a grande
atratividade de propostas como a do Imposto Único, que dependem menos das
condições iniciais, da especificação do sistema e do planejamento tributário burocrático,
e muito mais da capacidade auto-organizativa da sociedade e da liberdade das
instituições econômicas.
A evolução do pensamento econômico tem se baseado na premissa de um
processo de realimentação negativa expressa por meio de equações lineares e
defasagens simples. Assim, os mercados se movem suave e rapidamente em direção a
um equilíbrio, lá permanecendo até que ocorra algum distúrbio. Mas, em realidade, a
realimentação econômica pode ser positiva e não-linear, causando considerável
instabilidade.
Mas se a economia é regida por regras caóticas como estas, não cairemos no
total imobilismo ou fatalismo? Há algo a ser feito para se buscar o crescimento
econômico e a estabilidade de preços?
Certamente que sim. O dinamismo das relações econômicas e sua constante
evolução fazem com que a capacidade de adaptação a novas circunstâncias, a
criatividade e as inovações sejam mais importantes do que a busca da ordem, do
equilíbrio e da estabilidade. A regulamentação, o planejamento e a rigidez institucional
não são respostas adequadas a sistemas caóticos. Nestas circunstancias, a excessiva
intervenção estatal, o monopólio e a tributação elevada reduzem a capacidade de
adaptação de auto-regulação dos agentes econômicos.
O que vale, portanto, é a adaptação espontânea a novas e imprevisíveis
circunstancias, que surgem a todo momento. O futuro será determinado não pela
evolução das instituições. A política correta é o fomento da liberdade de mercado, além
de políticas que preservem a agilidade institucional para mudanças. O livre mercado,
como sistema criativo e auto-organizado, mostra-se mais adequado para responder aos
desafios emergentes do que a rigidez dos sistemas planejados.
É por isto que, mais do que nunca, o liberalismo se coloca como a alternativa
adequada para a definição das normas de política econômica. E se torna cada vez mais
atual o discurso da escola austríaca, com sua visão institucionalista, hoje resgatada por
economistas modernos como Coase, Buchnan e North.
A teoria do Caos não questiona a teoria econômica convencional. “O que ela
questiona é a ideia de que essas relações podem ser quantificadas com exatidão
suficiente para permitir a previsão de um resultado preciso. A incapacidade de
entender a diferença entre compreensão ou explicação, de um lado, e precisão, dou
outro, está por trás das deficiências no ensino de economia hoje em dia. Ela também
ajuda a explicar o fracasso dos governos em suas tentativas de amortecer os ciclos
econômicos por meio de sintonia fina”.
Outro corolário importante da Teoria do Caos é seu questionamento dos
fundamentos da escola das expectativas racionais. “A teoria aceita a informação
imperfeita, mas o caos sugere que as pessoas não possuem um modelo coerente do
mundo, e, na presença da verdadeira incerteza, as expectativas serão divergentes.”
Onde existe o caos, os agentes econômicos não podem aprender com precisão, e não
pode haver antevisão perfeita.
Conclui-se também que o “Estado não tem o conhecimento necessário para
adotar as medidas (macroeconômicas) corretas. Na medida em que é extremamente
baixa a probabilidade de se alcançar um estado desejado em um mundo caótico, é
difícil enxergar como o governo poderia especificar uma política para atingir esse
objetivo, a não ser por acaso”. Vê-se, portanto, porque a intervenção estatal, em vez de
amortecer os ciclos econômicos, pode agrava-los.
A Teoria do Caos na economia nos deixa muitas recomendações importantes.
Entre elas a de que diferentemente da economia neoclássica, o caos reforça a rejeição de
um futuro conhecível e critica a previsão macroeconômica, o planejamento estatal e a
administração da demanda. Mostra que a política econômica deve ter por alvos os
meios, e não os fins, como meio de criar condições para o surgimento de instituições
capazes de evolução auto-organizada e que permitam aos agentes econômicos de
adaptarem tão rápida e suavemente possível às mudanças econômicas imprevisíveis.
Torna-se essencial um sistema econômico que premie a flexibilidade e a inovação.
O caos nos mostra que uma economia competitiva, que encoraje a mudança e a
criatividade, é mais capaz de enfrentar um futuro caótico e desconhecido.
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