POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA: AÇÕES
GOVERNAMENTAIS QUE PRECISAM SER MATERIALIZADAS
Leize Barbo Nemit, Sheila de Oliveira Goulart, Taísa Maria Rossato
Instituto Federal Farroupilha – Reitoria - Graduanda em Ciências Contábeis, UFSM;
Especialista em Gestão Pública Municipal, UFSM; Mestranda em Gestão de Organizações Públicas,
UFSM
Introdução
A educação brasileira tem diante de si o desafio de viabilizar o acesso e a
permanência dos alunos com necessidades educacionais especiais na escola, na
perspectiva inclusiva. As inúmeras vertentes de abordagens e questões que
envolvem as políticas públicas se inserem num contexto amplo e muito complexo.
A educação tem um caráter que é permanente, não há seres educados e não
educados, estamos todos constantemente nos educando, em uma formação
continua, processual. O homem em sua natureza é um ser inacabado, não sabe de
maneira absoluta (FREIRE, 2001). Ainda, a educação tem a importante função para
a sociedade, porém sozinha não transforma a sociedade, sem ela também pouco a
sociedade muda. Nesse sentido, cabe à educação uma importante função para
todos que dela permeiam (FREIRE, 1996).
Toda educação nos faz refletir sobre a importância e necessidade de
vivermos com plenitude enquanto pessoas e cidadãos envolvidos na sociedade. Não
obstante, o paradigma educacional atual requer políticas educacionais que atendam
aos anseios exigidos nas diversas áreas da educação, focando no seu essencial, o
ser humano. Diante disso, a implementação de políticas públicas de educação
inclusiva, flexíveis e mutáveis, no âmbito educacional, fará a diferença, pois
contribuirá com processos educativos e valorização dos direitos humanos.
Nesse cenário, Ball e Maiardes (2011, p. 14) menciona que toda proposta de
política educacional não é definida como sendo fixa e imutável:
[...] podem ser sujeitas a interpretações e traduções e compreendidas
como respostas a problemas da prática. As políticas estão sempre em
algum tipo de fluxo, no processo de se tornarem algo mais. Esse é,
fundamentalmente, o caso atual da educação, que flui ao lado da política
(declarações, demandas e expectativas)
As políticas públicas inclusivas idealizam a formação de uma escola de
qualidade para todos, frente a uma filosofia inclusiva, a qual é almejada por muitos
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gestores, professores, alunos, pais e sociedade. Contudo, essa utopia exige
modificações profundas nos sistemas de ensino, partindo de uma política pública
efetiva de educação inclusiva, devendo ser gradativa, contínua, sistemática e,
principalmente, planejada com o objetivo de possibilitar aos alunos com
necessidades educacionais especiais uma educação de qualidade que proporcione
na prática, na ação docente, na aprendizagem e nas relações intersociais a
superação de toda e qualquer dificuldade que se interponha à construção de uma
escola acessível, de qualidade, epistemológica e com ações democráticas
contínuas.
Nesse contexto, segundo (BALL, MAINARDES, 2011), a política educacional
só terá sentido quando democraticamente construída por uma identidade coletiva e
não individual e singular, pois:
O Estado é um dos principais lugares da política e um dos principais atores
políticos. Em seu sentido mais simples, a política é uma declaração de
algum tipo – ou ao menos uma decisão sobre como fazer coisas no sentido
de “ter” uma política -, mas que pode ser puramente simbólica, ou seja,
mostrar que há uma política ou que uma política foi formulada.
Na mesma linha de pensamento, Mantoan (2006, p. 35), menciona que:
é inegável que as ferramentas estão aí para que as mudanças aconteçam e
para que reinventemos a escola, desconstruindo a máquina obsoleta que a
dirige, assim como os conceitos sobre os quais ela se fundamenta, os
pilares teórico-metodológicos em que ela se sustenta.
E para reinventar a escola, é preciso ter conhecimentos sobre os aspectos
legais no que se refere às políticas públicas de educação especial inclusiva.
Aspectos Legais
Conhecer a construção das políticas públicas educacionais de inclusão, à luz
da lei, destinadas a assegurar os direitos humanos fundamentais, requer observar
os conceitos que expressam o pensamento político de uma determinada época.
Nesse sentido, Arendt (1995) expõe que o exercício do pensamento político se move
entre o passado e o futuro, contém tanto experimentos como crítica; os
experimentos não tratam de desenhar algum sonho de um futuro utópico e a crítica
ao passado, aos conceitos tradicionais, não os pretende demolir.
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As políticas públicas de educação especial inclusiva tiveram como marco
inicial a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a qual apresenta
como um de seus objetivos fundamentais, o compromisso político brasileiro com a
educação de forma a estabelecer a igualdade no acesso à escola, sendo dever do
Estado proporcionar atendimento educacional especializado aos portadores de
deficiência 1, preferencialmente na rede regular de ensino.
A atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394/96, no
art. 58 § 1º, garante que haverá, quando necessário, serviços de apoio
especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades dos educandos
com necessidades especiais. Neste artigo da Lei, há a afirmação do dever do
Estado de fornecer, quando necessário, serviços de apoio especializado na escola
regular, visando atender às necessidades específicas dos alunos, sabendo que a
efetivação desses serviços deve ser permanente, tendo em vista as próprias
peculiaridades dos alunos da educação especial. Ainda, o art. 59 preconiza que os
sistemas de ensino devem assegurar aos alunos com necessidades educacionais
especiais currículo, métodos, recursos e organização específicos para atender às
suas necessidades.
A Resolução CNE/CEB nº 2/2001, que institui Diretrizes Nacionais para a
Educação Especial na Educação Básica, no art. 1º, em seu Parágrafo único,
determina que o atendimento escolar desses alunos tenha início na educação
infantil, nas creches e pré-escolas, assegurando-lhes os serviços de educação
especial sempre que se evidencie, mediante avaliação e interação com a família e a
comunidade, a necessidade de atendimento educacional especializado. Além disso,
em seu art. 2º, institui que os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos,
cabendo às escolas organizar-se para o atendimento aos educandos com
necessidades educacionais especiais, assegurando as condições necessárias para
uma educação de qualidade para todos.
No ano de 2008, Decreto n.186 aprova o texto da Convenção sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu protocolo facultativo assinados, em
Nova Iorque, em 30 de março de 2007. Esse documento reconhece a deficiência
como um conceito em evolução resultante da interação entre portadores de
1
Enquanto na CF 88 a expressão de referência era “portadores de deficiência”, logo novos
documentos surgem com o uso da expressão “necessidades educacionais especiais”, como consta
no art. 1º da Resolução nº 2/2001.
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deficiência e as barreiras que impedem a sua plena e efetiva participação na
sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.
O decreto, em seu art. 24, transcreve que os Estados assegurarão sistemas
educacionais inclusivos em todos os níveis, bem como o aprendizado ao longo de
toda a vida, com as seguintes diretrizes que asseguram que: a) as pessoas com
deficiência não sejam excluídas do sistema educacional geral sob a alegação de
deficiência; b) possam ter acesso ao ensino primário inclusivo, de qualidade e
gratuito, e ao ensino secundário, em igualdade de condições com as demais
pessoas na comunidade em que vivem; c) sejam providenciadas adaptações
razoáveis de acordo com as necessidades individuais; d) recebam o apoio
necessário, no âmbito do sistema educacional geral, com vistas a facilitar sua efetiva
educação; e) medidas de apoio individualizadas e efetivas sejam adotadas em
ambientes que maximizem o desenvolvimento acadêmico e social, de acordo com a
meta de inclusão plena.
A maioria dos documentos legislativos, anteriormente citados, apresenta
como princípio o direito do aluno com necessidades educacionais especiais à
educação, ao acesso e permanência na escola, a formação e qualificação dos
professores, currículo, métodos, recursos, organizações e infraestrutura adequada
para constituir uma educação satisfatória. Porém, como menciona Mantoan (2006, p.
24):
[...] a resistência das instituições especializadas a mudanças de qualquer
tipo; a neutralização do desafio à inclusão, por meio de políticas públicas
que impedem que as escolas se mobilizem para rever suas práticas
homogeneizadoras, meritocráticas, condutistas, subordinadoras e, em
consequência, excludentes; o preconceito, o paternalismo em relação aos
grupos socialmente fragilizados, como o das pessoas com deficiência.
Diante disso, percebe-se o grande desafio, pois sempre existirão entraves
políticos e sociais para operacionalizar os ditames legais.
Considerações Finais
No campo da inclusão educacional no Brasil, observa-se que ainda há um
longo caminho a ser percorrido para romper a dicotomia entre palavras e efetivas
ações de políticas públicas educacionais.
A inclusão escolar tem sido mal compreendida, principalmente no seu apelo a
mudanças nas escolas comuns e especiais. Entretanto, essas mudanças não
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garantem a condição de que nossas escolas receberem, indistintamente, a todos os
alunos, oferecendo-lhes condições de prosseguir em seus estudos, segundo a
capacidade de cada um, sem discriminações nem espaços segregados de educação
(MANTOAN, 2006, p. 23).
Na construção humana, o fato de ter consciência, é poder distanciar-se das
coisas, para que assim estas possam se fazer presentes. É a mudança do
comportamento humano no mundo onde ele vive, podendo afetar este de alguma
forma, de modo a transformá-lo e, também, transformando-se enquanto humano
(FREIRE, 1998).
Enquanto não aprimorarmos nossa consciência de que se não aplicarmos as
políticas públicas educacionais efetivas que respeitem o ser humano em suas
diferenças, que possibilitem a eles estar na escola, interagir, socializar-se e
aprender, não poderemos afirmar que as políticas públicas educacionais de
inclusão, estão cumprindo o seu papel primordial.
Somente a partir dessa reflexão, poderemos almejar o surgimento de outras
políticas na perspectiva inclusiva, reformas e propostas que possam ser discutidas,
não de forma segregada, reinventadas, emancipadas, compartilhadas e que sejam
bem sucedidas no cenário educacional inclusivo. A escola tem como uma de suas
tarefas a formação de sujeitos críticos, reflexivos. É importante instigar a curiosidade
dos educandos e, de modo algum, deve-se deixá-la inativa, domesticada. Pois, é
necessário que o educando assuma uma postura ativa, enquanto sujeito produtor de
conhecimento e de sua própria inteligência, ele não se constitui enquanto sujeito de
modo recebedor, passivo (FREIRE, 1998).
Por fim, percebe-se que não basta ofertar o aumento das matrículas em
escolas comuns e em classes especiais, pois isso não substitui o atendimento
especializado que devem ser proporcionados a esses alunos, urge também, a
qualidade dessa educação a fim de formar sujeitos críticos e reflexivos, aptos a
produzir ciência e conhecimento.
Referências
ARENDT, H. O que é política? Fragmentos das obras Póstumas compilados por
Úrsula Ludz.Rio de Janeiro: Editora Betrand Brasil, 1995.
BALL, Stephen J.; MAINARDES, Jefferson. (Org.). Políticas educacionais: questões
e dilemas. São Paulo: Cortez, 2011.
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BRASIL. Constituição Federal. Constituição da República Federativa do Brasil.
Brasília, DF: Senado, 1998.
___. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de
Educação Básica. Parecer n.13/2009. Aprovado em 05 de outubro de 2009. Brasília:
MEC/CNE/CEB, 2009.Disponível em www.mec.seesp.gov.br
___. Resolução nº 4, de 5 de Outubro de 2009. Brasília: MEC/CNE/CEB, 2009.
Disponível em www.mec.seesp.gov.br
___. MEC. Secretaria de Educação Especial. Política Nacional de Educação
Especial na Secretaria da Educação Especial. Diretrizes Nacionais para a Educação
Especial na Educação Básica. Brasília: CNE/CEB, 2001. Disponível em
www.mec.seesp.br. Acesso em 25/08/2013.
___. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: MEC/SEESP, 1996.
FREIRE, Paulo. Educação e mudança. São Paulo: Paz e Terra, 2001.
___. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998.
___. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo:
Paz e Terra, 2006.
MANTOAN, Maria Teresa Eglér. Igualdade e diferenças na escola: como andar no
fio da navalha. In: ___; PRIETO, Rosângela Gavioli. Inclusão escolar: pontos e
contrapontos. São Paulo: Summus, 2006, p. 15-29.
___. Inclusão escolar: o que é? por quê? como fazer? São Paulo: Moderna, 2006.
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