OS RESTAURANTES FAST-FOOD ENQUANTO ELEMENTO DA OFERTA TURÍSTICA: UMA QUESTÃO DE FAMILIARIDADE OU DISTANCIAMENTO Nilton Henrique Peccioli Filho[1] Resumo Este trabalho tem como objetivo analisar a importância dos restaurantes do tipo fastfood enquanto elemento da oferta turística. Envolve a elaboração de pesquisa exploratória com a finalidade de verificar a pré-disposição de turistas freqüentar restaurantes fast-food em férias na cidade de Salvador. Analisa a rede de alimentação de um destino turístico e estuda a pré-disposição dos turistas na escolha de pratos da culinária local ou comer algo familiar. Palavras-Chaves: Oferta turística, restaurante fast-food, culinária local. Abstract This paper aims to analyse the importance of fast-food restaurants as a part of tourist offer. It involves theplanning of an exploratory research to verify the tourist predisposition to frequent fast food restaurants during a vacation in Salvador city. It analyses the net of food of a tourist destination and studies the predisposition of the tourists when choosing between local culinary and more familiar dishes. Key-words: Tourist offer, fast-food restaurant, local culinary. Introdução “Viajar é uma maneira deliciosa e desconfortável de ver o mundo. Deliciosa porque permite conhecer, comer e experimentar coisas novas” (TRIGO, 2002, p.07).. O relacionamento turismo gastronomia e/ou culinária, de maneira geral, mesmo sendo um aspecto importante dentro do turismo, ainda é um assunto não muito estudado ou até mesmo valorizado no Brasil. Alguns países da Europa já têm esse nicho de mercado, o turismo culinário, bastante desenvolvido. Este estudo procura verificar a importância ou o peso dos restaurantes do tipo fast-food enquanto elemento da oferta das destinações turísticas, bem como, verificar a decisão de escolha dos turistas no que tange a sua alimentação em férias, ou seja, se o restaurante fast-food é um fator de direcionamento do fluxo turístico dentro do destino visitado. A gastronomia e, em particular, a culinária é um dos elementos que caracteriza a sociedade, é a expressão de uma cultura, de um modo de vida, de uma resposta a um meio ambiente específico e seus recursos. Para Cascudo: O alimento representa o povo que o consome numa imagem imediata e perceptiva. Dá a impressão confusa e viva do temperamento e maneira de viver, de conquistar os víveres, de transformar o ato da nutrição numa cerimônia indispensável de convívio humano (CASCUDO, 1983, p. 435). Em alguns exemplos a culinária local pode representar uma característica relevante na atratividade de um destino. A estrutura de restaurantes e bares é freqüentemente um componente vital de sedução dos turistas e representa um montante substancial na atração total. Em muitos países europeus e asiáticos há uma forte tradição gastronômica e isso representa um importante elemento na tomada de decisão do direcionamento do turista. Se a tradição gastronômica é forte, isso significa que o estilo de vida e a participação dos habitantes na manutenção de seus estilos de vida se refletem em sua apreciação da comida tradicional. Tradições gastronômicas profundamente enraizadas devem ajudar a manter a qualidade e a autenticidade. É importante pensarmos sobre a origem das comidas. Muitos comem determinado tipo de prato sem sequer saber de onde eles são originários, o trade turístico precisa se envolver neste processo educacional, que é necessário. O turismo realmente precisa valorizar a culinária local das destinações. Movimentos como o Citta-Slow e o Slow-Food são importantes nesse processo, pois buscam preservar a tradição de tranqüilidade e da qualidade gastronômica nas pequenas cidades. O coordenador e idealizador do movimento, Paolo Saturnini, diz que o movimento busca a preservação da identidade local (WASSERMAN, 2000). Este movimento contava, em 2000, com 34 cidades que, para serem aceitas ao movimento, seguiram uma série de requisitos, desde a preocupação ambiental até políticas de proteção ao pequeno comércio e a restaurantes tradicionais. O símbolo do movimento é um escargô que, segundo Saturnini, além de um símbolo da lerdeza é um refinado item da culinária mediterrânea. A questão da qualidade da alimentação é uma das principais preocupações doCittaslow,e o movimento nasceu a partir de outro, com os mesmos ideais, chamado de Slow Food,[2] destinado a combater o avanço das cadeias de fast-food e a padronização culinária. Queremos lutar contra a invasão das grandes redes de distribuição e de franquias, principalmente no setor de alimentação. Não podemos impedir as grandes cadeias de alimentação de se estabelecerem na cidade, mas esperamos que as pessoas que vêm à cidade não queiram comer aqui o mesmo hambúrguer que elas podem comer em Londres, Paris ou Melbourne. (WASSERMAN, 2000). Esses movimentos defendem uma alimentação mais saudável, com receitas regionais e ingredientes clássicos. Segundo porta voz do movimento: Há cinco anos, a educação alimentar de jovens e crianças vem sendo conduzida por entidades da sociedade civil (...), estamos mostrando que todo alimento tem uma história (...). e afirma que por muito tempo, nossa luta parecia a de um grupo de idealistas que enfrentava o que parecia inevitável. Hoje vemos algum resultado (...). (CHADE, OGLIARI, 2002, p.A9). O movimento, presente no Brasil desde o ano passado, possui grupos ativos em Porto Alegre, Rio e Belo Horizonte, e encontra-se em formação em São Paulo e Salvador. De acordo com Vianna - líder do movimento em Porto Alegre - “Nosso objetivo é recuperar as coisas boas que se perderam, inclusive os sabores” (CHADE, OGLIARI, 2002, p.A9). Para o turismo essas iniciativas são interessantes, pois valorizam a culinária dos locais além de oferecer um diferencial dentro da rede de alimentação turística. Ainda representam a defesa do direito ao prazer contra a velocidade. As cadeias de restaurantes fast-food são criticadas por diversos autores. Porém, durante observações em campo, percebemos que para o turismo elas são bastante interessantes, pois podem representar um sinal de familiaridade no que tange ao produto a ser consumido, seu preço, além do aspecto limpeza e higiene das instalações físicas e equipamentos. Percebemos que isso é forte, principalmente quando a culinária e os costumes locais são bastante exóticos para determinada demanda de turistas, pois de acordo com Cascudo: “(...) os costumes alheios são sempre estranhos e os nossos normais e lógicos (...), o que nos distancia dos alimentos nativos dos povos longínquos é unicamente a nossa cultura” (CASCUDO, 1983, p.446). Como exemplo do que estamos discutindo, podemos citar a preocupação da Federação Internacional de Futebol Amador (FIFA) – Entidade Máxima do Futebol – com relação à culinária dos países sede da Copa Mundial de 2002, Japão e Coréia. Para os brasileiros e equipes de outros países, comer carne de cachorro não seria uma coisa normal, agradável. Joseph Blatter - dirigente da FIFA - devido a pressões, entrou em contato com o Comitê Organizador da Coréia do Sul para expressar o seu desapontamento com a crueldade que é feita com cães e gatos, o que sem dúvida causou certo mal estar, “primeiro porque é uma questão cultural”, afirmou Yung Jung Im, tradutora do Consulado da Coréia em São Paulo (ASSUMPÇÃO, 2001). Como resposta à FIFA, o Comitê Organizador da Coréia do Sul, representado por Yun-taek, disse que cada um terá a opção de comer o que quiser. A cozinha coreana é internacional. Com certeza, o turista estrangeiro terá muitas opções diferentes. Nesse contexto, o fast-food, enquanto componente da rede de alimentação turística tem um papel importante com relação ao turismo, ele representa sinal de familiaridade. A questão da familiaridade que representa os restaurantes fast-food, difundidos no mundo todo, é o eixo temático desse estudo e justifica um entendimento mais profundo, se constituindo, portanto, como hipótese deste trabalho: assim, os turistas procuram os restaurantes fast-food porque eles representam um sinal de familiaridade no que diz respeito ao produto, preço, higiene e limpeza. Elementos da Oferta Turística: Rede de Alimentação Com relação a oferta turística, Beni diz: Pode-se definir a oferta básica como o conjunto de equipamento, bens e serviços de alojamento, de alimentação, de recreação e de lazer, de caráter artístico, cultural, social ou de outros tipos, capaz de atrair e assentar numa determinada região, durante um período determinado de tempo, um público visitante. (BENI, 2000, p.159). Verifica-se, na citação acima, que os serviços de alimentação são um dos elementos que compõe a oferta turística básica, daí nosso interesse em estudar a rede de alimentação à disposição dos turistas como um significativo elemento da atração turística e, em particular, verificar o peso dos restaurantes fast-food como elemento da oferta. Ainda para BENI: “A oferta em turismo pode ser concebida como o conjunto dos recursos naturais e culturais que, em sua essência, constituem a matéria-prima da atividade turística porque, na realidade, são esses recursos que provocam a afluência de turistas”. (BENI, 2000, p.159). Provavelmente a gastronomia no geral e a culinária em particular podem não ser o motivo preponderante de uma viagem e sim um agregado maior da oferta. Mesmo assim, ela merece atenção como serviço turístico de uma destinação. Segundo Ansarah o produto turístico é composto da oferta primordial e da complementar (ANSARAH, 2001, p.24). Dentro desta última, encontramos diversas facilidades, entre elas, a rede de alimentação. Para a autora, essas facilidades podem não gerar fluxos turísticos, mas a falta delas pode impedir o turista de retornar. Para entendermos a importância e a complexidade da gastronomia, da culinária em se tratando de oferta turística, precisamos esclarecer que a rede de alimentação de um destino consiste não somente de restaurantes e bares, mas também de serviços da alimentação durante os percursos da viagem e daqueles serviços oferecidos nas ruas. A oferta de restaurantes e bares locais é composta por uma gama de estabelecimentos que incluem: restaurantes típicos; restaurantes de especializados em determinados pratos, como churrascarias, pizzarias, cantinas; fusion food[3]; restaurantes temáticos; unidades de fast-food[4]; coffe-shop[5]; restaurantes internacionais; praças de alimentação em shopping centers; além dos chamados “casual dinning” que se preocupam em oferecer uma atmosfera agradável, com atendimento bastante informal e um cardápio que utiliza elementos de diversas culturas, possuindo as características de um coffe-shop mesclado com fusion foode grill[6]. Os restaurantes e bares podem ser independentes ou fazer parte de um sistema de franquias, suas cozinhas podem ser de origem étnica, internacional ou local. Quanto a sua localização, eles ainda podem estar dentro de meios de hospedagem, independentes, em praças de alimentação dentro ou fora de shopping centers e nos mercados. O serviço de alimentação durante o percurso das viagens consiste na operação de alimentos e bebidas em hotéis e motéis, bem como restaurante auto-estrada para viajantes que utilizam o transporte rodoviário, além de todo serviço de alimentação em aviões, trens e navios ou ainda em aeroportos. Quanto aos serviços de rua consistem de vendedores ambulantes, barracas fixas, quiosques instalados em pontos determinados, máquinas automáticas de venda de bebidas e petiscos. Vale lembrar que essas máquinas, acionadas por uma moeda, dispensam o serviço no momento do consumo. Entendemos que todos os diferentes segmentos que trabalham com alimentos e bebidas são bastante complexos e necessitam de cuidados especiais, tanto na administração como na operação e no serviço. Restaurantes Fast-Food e Turismo O fast-food é uma das expressões (existem outras) do movimento de aceleração da vida. Nesse sentido, quando McDonald´s migra para outros países, não devemos compreendê-lo como um traço cultural que se impõe à revelia dos valores autóctones. Ele exprime a face interna da modernidade do mundo. (ORTIZ, 2000, p.86). É importante a valorização da culinária local, regional de um núcleo. Porém, há de se considerar que as cadeias de restaurantes fast-food hoje são realidade principalmente nos grande centros onde as pessoas possuem pouco tempo para se alimentar, o que significa dizer que a rotina diária muito agitada faz com que essas pessoas busquem esse tipo de serviço. Entendemos que a vida moderna exige maior praticidade e isso não favorece a escolha dos alimentos melhor preparados ou dos restaurantes mais sofisticados, por isso o fast-food tornou-se uma potência em diversos países e, como o nome sugere, não só o tempo de preparo, bem como o atendimento do cliente é feito muito rápido. Muitas pessoas, não só no Brasil, utilizam os fast-food em vez de restaurantes onde a comida leva mais tempo de preparo e é mais cara. E não adianta acusar a América, mãe da fórmula do fast-food que arrasta multidões, de Dês Moines, pátria do MacDonald´s, a Paris, Moscou e Pequim, cidade onde prospera o maior estabelecimento desse tipo no mundo. Se a fórmula é bem sucedida, é porque corresponde a certas necessidades. (PITTE, 1998, p.762). O negócio de alimentos e bebidas vem crescendo, especialmente o segmento de restaurantes fast-food que, com as franquias, se desenvolveram bastante. Um dos fatores que levou a esse crescimento é o alto custo de outros operadores de serviço alimentício. As franquias controlam os fast-food em que hambúrgueres, frangos, bifes e pizzas dominam o negócio. Em 1970, os americanos gastaram cerca de 6 bilhões de dólares em fast-food; em 2000, foram mais de 110 bilhões de dólares gastos com esse tipo de comida. Os norte-americanos gastam agora mais dinheiro com fast-food do que com ensino superior, computadores, programas de computadorou carros novos. Gastam mais com fast-food do que com cinema, livros, revistas, jornais, vídeos e discos combinados. (SCHLOSSER, 2001, p.15). As cadeias de fast-food obtiveram grande sucesso. Em parte, porque limitaram seus cardápios, o que lhes dá maior força de vendas, menor desperdício, maior controle das porções, e, a importância para o consumidor, menor custo de operação. Eles são líderes em produtividade no negócio de restaurantes. Muitas operações de fast-food usam papel descartável e plástico, e o alto custo destes materiais é compensado com a economia nos materiais tradicionais e com mão de obra para lavagem e conservação dos pratos. As operações de fast-food também aproveitam as vantagens da especialização. Eles se tornaram especialistas nos itens dos seus cardápios, na simplificação do trabalho e na operação dos sistemas. Franquias têm sido usadas muito no campo de restaurantes e meios de hospedagem como um sinônimo para conseguir rápido crescimento. Usando o capital da franquia e do empreendedor, pode-se conseguir penetrar no mercado muito mais rápido. Ainda que o segmento de fast-food seja um dos que mais cresce na rede de alimentação, o de slow-food, ou de alta qualidade não pode ser subjugado pelo turismo. Existem negócios que são baseados na procura dos clientes, ou seja, numa demanda que procura uma oferta especial e diferenciada para comer. Hoje mundialmente. o termo McDonaldização usado por Ritzer é conhecido McDonaldização é conceito que engloba muito mais do que o alto grau de racionalização desenvolvido pela empresa McDonald´s. Tomando-a como paradigma do processo de maximização da produtividade, George Ritzer identifica suas manifestações nos mais variados setores da atividade humana: sistema bancário, educação, atendimento médico-hospitalar, turismo, recreação, comunicações. (FRANCO, 2001, p.230). Alguns autores analisados identificam diversos fatores negativos com relação às cadeias de fast-food e a McDonaldização dos serviços de alimentação, tais como: propaganda enganosa, desritualização da refeição, maus hábitos alimentares, emprego de mão-de-obra jovem e barata dentre outros. Schlosser, em seu livro “O País Fast-Food”, faz acusações graves contra as cadeias de fast-food através de uma análise bastante minuciosa e consciente sobre o que está por trás da aparência inocente de um hambúrguer com fritas do McDonald´s ou de outra rede de fast-food. Não é objetivo nos aprofundarmos nesta questão, que sem dúvida é extremamente interessante. Todavia, reconhecemos o papel do fast-food para as comunidades que vivem nos grandes centros, e também para os turistas como sendo um sinal de familiaridade e, nem por isso, discordamos dos movimentos Citta-Slow e SlowFood. Também esperamos que as pessoas busquem a culinária dos núcleos visitados, mas para isso é preciso uma maior valorização por parte das pessoas do local. Procedimento da Pesquisa Nossa pesquisa foi realizada em 2002, na cidade de Salvador. O instrumento de coleta de dados foi entrevista fechada respondida pelo entrevistado e anotada por nós, pela razão de que alguns não dominavam o nosso idioma, perguntávamos sobre a procura por restaurantes fast-food durante a sua estadia. Os entrevistados foram escolhidos e agregados em dois grupos distintos: o primeiro, composto de turistas brasileiros e o segundo, de turistas estrangeiros. Os turistas que estavam visitando Salvador naquele período foram escolhidos aleatoriamente nos diversos pontos turísticos, como o Pelourinho, o Mercado Modelo e nos hotéis da cidade. Dentre os turistas brasileiros foram entrevistados trinta e três pessoas, em sua maioria, paulistas, mineiros e cariocas. Enquanto entre os turistas estrangeiros foram entrevistados quinze pessoas, sendo Uruguaios, Argentinos, Colombianos, Franceses, Alemães e Ingleses. Desenvolvimento O quadro abaixo mostra o grupo de entrevistados divididos em duas categorias: turistas brasileiros e estrangeiros. Nele, realiza-se uma síntese dos dados obtidos através das entrevistas. Basicamente todos responderam que não procuram os restaurantes fast-food pois os mesmos fazem parte de sua rotina diária e, em férias, procuram conhecer pratos locais. QUADRO 1.0 – GRUPO DE ENTREVISTADOS CATEGORIAS NÚMEROS A Turistas Brasileiros 33 B Turistas Estrangeiros 15 TOTAL 48 Analisando os dados obtidos através da pesquisa percebemos que tanto os turistas brasileiros como os estrangeiros procuram conhecer a culinária baiana, pois sua variedade, sua diversidade de cores e o tempero são fatores de atração. Porém, todos preferem mesclar a comida local com a internacional, pois muitos consideram seu tempero bastante marcante e, por isso, preferem mesclar com pratos mais leves e saladas. A grande maioria dos entrevistados não procura os fast-food e os motivos apresentados foram que eles fazem parte de suas vidas e, em férias, estão fugindo da rotina diária. Um dos entrevistados estrangeiros disse que nunca come em fast-food e nem toma coca-cola. Apenas um entrevistado disse que precisa ir ao McDonald’s graças a seus filhos que adoram e fazem questão de freqüentar. Os dados obtidos confirmam constatação que fizemos na cidade de Salvador na semana de inauguração de um restaurante da rede Habib´s – fast-food especializado em comida árabe – que ficava em nosso trajeto para o hotel. Durante três dias verificamos uma enorme quantidade de pessoas em filas de espera fora do restaurante. Constatamos que não existiam turistas na fila, apenas residentes. Após a análise do conteúdo dos dados obtidos, verificamos nossa hipótese: os turistas procuram os restaurantes fast-food porque eles representam um sinal de familiaridade no que tange ao produto, preço, higiene e limpeza. Entendemos que nossa hipótese mereça uma análise mais abrangente, pois diversos aspectos estão relacionados com a questão, o que a torna bastante complexa, mas levando em consideração as entrevistas, de maneira geral, constatou-se que nossa hipótese não se confirma, ou seja, os turistas não procuram os restaurantes fast-food, pois fazem parte de suas rotinas e, em férias, procuram conhecer os pratos locais. Talvez os baianos que se encontravam na fila do restaurante Habib´s, se estivessem em férias, não estariam aguardando para ser atendido em um fast-food, e isso comprova o papel dos restaurantes fast-food nos grandes centros onde as pessoas quase não possuem tempo para a alimentação. Nossa pesquisa constatou que os restaurantes fast-food correspondem a determinadas necessidades, principalmente nos grandes centros e que a vida moderna exige maior praticidade. Porém, no que tange ao turismo, eles não representam um elemento importante da oferta turística; são apenas elementos a mais de desfrute da estadia. Contudo, entendemos que o assunto é bastante complexo e envolve uma pesquisa mais elaborada, pois o perfil do turista e sua motivação para a viagem são fatores importantes, que merecem ser levados em consideração, bem como a escolha do destino a ser visitado. Para os turistas entrevistados, fora de seu cotidiano, de sua rotina de trabalho, e em busca do prazer, constatou-se que possuíam mais tempo para as refeições e podiam comer e beber em paz, com o ritual que convém a essas ocasiões: sentados à mesa, com toalha, talheres e copos, sem a urgência de sair correndo para um compromisso. Daí a decisão de escolher restaurantes com cozinha local e/ou internacional e não os fast-food. A busca pelo exótico, a vontade de experimentar pratos locais divulgados pelo turismo, também explica a escolha dos turistas. Apenas um entrevistado disse que freqüentava fast-food mesmo em férias por causa dos filhos. Particularmente, acreditamos que os jovens são bastante influenciados pela propaganda das grandes redes de fast-food. Considerações Finais Conforme mencionamos no início deste trabalho, o relacionamento turismo gastronomia e/ou culinária, de maneira geral, mesmo sendo um aspecto importante dentro do turismo, ainda é um assunto não muito estudado. Os planejadores do turismo, as destinações turísticas precisam dar mais atenção à gastronomia e, em particular, à culinária, pois verificamos, neste estudo, que os turistas procuram conhecer os pratos da cozinha local das destinações. Há sinais claros de que a sociedade está começando a perceber este problema e está pensando num modo de mudar. O aumento da atenção dada à gastronomia e a culinária na mídia é um forte indicador disso, basta lembrarmos os programas de culinária na televisão, publicações, revistas e jornais e ainda festivais com ênfase em comida e vinhos. Tudo isso é muito positivo porque, de acordo com Naisbitt: “quanto mais nos expomos a outras culturas, outros idiomas e outras paisagens maior é o desejo de experimentá-los pessoalmente” (NAISBITT, 1994, p.115). A mídia, ao dar atenção à gastronomia, à culinária, estará divulgando os pratos de determinado local e isso provocará nas pessoas o desejo de conhecer e provar determinada culinária. Com esse trabalho, entende-se que o relacionamento turismo, gastronomia e culinária é um assunto bastante complexo e merece mais reflexão, tanto por parte dos acadêmicos como dos profissionais que atuam na área. Novas pesquisas precisam ser feitas no que tange aos diversos aspectos deste relacionamento, o que permitirá subsidiar o próprio segmento de novas vertentes. Fica evidente a necessidade de mais pesquisas. Apresentaremos algumas oportunidades para futuros estudos tratando do relacionamento turismo, gastronomia e/ou culinária: Estudar as atitudes do turista com relação à culinária local e à cozinha internacional, como por exemplo: onde, quando e se os turistas querem uma distinção entre culinária local, cozinha internacional e fast-food como componentes de uma interessante e prazerosa experiência cultural. Verificar se as influências econômicas pesam sobre as chances e oportunidades de experimentar e descobrir novas culinárias. Outra área a ser explorada pode ser a relação entre o “background” do turista e a comida que ele pede em férias. Que tipos de turistas são inclinados a escolher comer algo familiar ou não; o que motiva a escolha; se esta escolha é motivada por medo de indigestão ao desconhecido; como nós ajustamos o desejo por autenticidade e extrema diversidade quando visitamos uma região específica. Com a internacionalização dos alimentos, os ingredientes ficaram disponíveis no mundo, como uma síndrome. Precisamos avaliar se essa influência é benéfica ou não sobre a preservação da culinária local e sobre o turismo. Pesquisar se a uniformização dos gostos causa a perda de diversidade na aproximação de assuntos culinários. Precisamos ver se nós, como anfitriões, devemos ajustar nossa culinária para adequarmos ao paladar dos turistas ou devemos encontrar um “meio termo” entre os gostos. Investigar o quanto nós empobrecemos nossa herança cada vez que satisfazemos os pedidos dos turistas procurando por comida familiar. O imperialismo cultural norte-americano impacta fortemente em outras culturas, e em relação à comida não seria diferente. Portanto, a valorização, a preocupação com culinária local deve ou não ser considerada como uma resposta à explosão de restaurantes do tipo fast-food no mundo? Esses restaurantes podem reduzir a culinária local a uma atividade obsoleta de uma geração mais velha? Pode a área de alimentos e bebidas, como um todo, incrementar o produto turístico? Ela representa um aspecto importante na comunicação cultural entre residente e turista? Bibliografia ANSARAH, M.G.R. (org.). Teoria geral do turismo. In: --------. Turismo, como aprender, como ensinar. 2. ed. São Paulo: SENAC, 2001. v. 2. , p. 11 – 36. ASSUMPAÇÃO, J. C. Culinária da Copa 2002 preocupa FIFA. Folha de São Paulo, 25 nov. , 2001. BENI, M.C. Análise estrutural do turismo. 3. ed. rev. e ampl., p. 159. São Paulo: SENAC, 2000. CASCUDO, L.C. História da alimentação no Brasil. São Paulo: USP, 1983. 2. v. CHADE, Jamil. OGLIARI, Elder. Um contra ataque aos restaurantes fast-food. O Estado de São Paulo, p. A9, 30 out. 2002. FRANCO, A. De caçador a gourmet: uma história da gastronomia. São Paulo: SENAC, 2001. p.230. NAISBITT, J. Paradoxo global. Rio de Janeiro: Campus, 1994. p.115. ORTIZ, R. Mundialização e cultura. São Paulo: Brasiliense, 2000. p. 86. PECCIOLI FILHO, N. H. A culinária baiana como atrativo turístico: um estudo de caso em Salvador. 2003 - Dissertação (Mestrado em Turismo). Centro Universitário Ibero-Americano, São Paulo. PITTE, Jean-Robert. Nascimento e expansão dos restaurantes. In: FLANDRIN, J.L.; MONTANARI, M. História da alimentação. Tradução de Luciano Vieira Machado, Guilherme J.F.Teixeira. São Paulo: Estação Liberdade, 1998. p. 762. SCHLOSSER, Eric. País fastf food: o lado nocivo da comida norte-americana. Tradução de Beth Vieira. São Paulo: Ática, 2001. p. 15. TRIGO, Luiz Gonzaga Godoi. América e outras viagens. Campinas: Papirus, 2002, p.7. WASSERMANN, Rogério. Contra estresse, Itália lança Citta Slow. Folha de São Paulo, 13 ago. 2000. [1] Bacharel em Turismo e especialista em administração de empresas / FAAP, mestre em Turismo UNIBERO, docente e coordenador do Curso de Turismo da Faculdade Estácio de Sá de Ourinhos. E-mail: [email protected]. [2] Ver site na Internet www.slowfood.it onde o movimento difunde suas idéias. Nestes restaurantes acontece a mescla entre elementos de diversas culturas. Esses elementos podem ser diversos, como métodos de cocção, apresentação dos alimentos, molhos e ingredientes. [4] Oferecem cardápios limitados de diversas características, possui muita rapidez no serviço e todos os processos são ágeis e fáceis. Os clientes fazem seus pedidos em um balcão, escolhendo em um cardápio em forma de quadro luminoso afixado acima e ao fundo, ornamentado com fotografia dos itens e a logomarca da rede ou restaurante. [5] Restaurantes com cardápios de fácil preparação e apresentações simples, normalmente estão localizados em hotéis e aeroportos e funcionam 24 horas. [6] Casa especializada em grelhados, é uma churrascaria diferenciada, no ambiente, no serviço e no corte das carnes. [3]