INCLUSÃO E CIDADANIA: UMA QUESTÃO DE DIREITO MARIA DA GLÓRIA DE SOUZA ALMEIDA [email protected] INSTITUTO BENJAMIN CONSTANT RESUMO A educação inclusiva somente se efetivará, quando de fato, a Escola abrir-se para receber todos os alunos em igualdade de condições. A inclusão não pode ser vista meramente como um dispositivo legal. A inclusão é um movimento interno que tem de apoiar-se numa visão humanística onde o direito não seja percebido como ato de doação. A inclusão educacional clama pela instrumentalização do professor, pela consciência dos gestores, pela largueza e aprimoramento das políticas públicas. As práticas inclusivas devem pauta-se, por tanto, na qualificação do corpo docente, no acesso ao conhecimento, na reforma dos pressupostos pedagógicos, no aparelhamento das escolas, na busca da acessibilidade em diferentes áreas, desde a adequação dos prédios, passando por material didático especializado, tecnologia assistiva e, principalmente, no acolhimento desse aluno por parte de toda comunidade escolar. PALAVRAS-CHAVE: Educação inclusiva – Qualificação docente – Direito – Acessibilidade – Acolhimento. 1 Uma sociedade inclusiva exige a formação de cidadãos que compreendem o papel que exercem na dinâmica da ordem vigente. Fala-se exaustivamente de cidadania, mas o que se observa na prática, é o uso dessa palavra circunscrito a um conceito subjetivo cuja motivação particular, pode transformá-la em instrumento de manipulação política que não alcança sua verdadeira essência: a afirmação maiúscula do homem. A cidadania pressupõe dar-se a todos um tratamento igualitário. É uma forma de se abrirem oportunidades parelhas, ainda que para aqueles que pareçam “diferentes”. A cidadania forja-se na consciência do EU, sedimenta-se nos deveres e valores herdados, fortifica-se no exercício de direitos conquistados, amplia-se na inserção do indivíduo no espaço social que lhe pertence. Um cidadão pleno é aquele que se reconhece como um ser inteiro, como um ser capaz a despeito da possível “falha” ou “déficit” que carrega, estejam no âmbito físico, intelectual, social, cultural ou econômico. A pessoa com deficiência, tanto quanto outros indivíduos que integram grupos vítimas da exclusão em diferentes manifestações, não se pode deixar amesquinhar pela deficiência que a afeta, antes, precisa estar consciente das próprias possibilidades, precisa aprender a enfrentar obstáculos, precisa aceitar desafios, precisa entender e conviver com limites e impedimentos. A construção da cidadania enfeixa em si uma gama variada e rica de questões complexas e estruturais que urge serem discutidas. Banaliza-se o termo e esvazia-se o conceito. As ações, em sua maioria, tornam-se estéreis e, por essa razão, vemos o discurso sempre extremamente teórico, muitas vezes, dissociando-se da realidade efetiva. Vemos ainda a exclusão adquirindo vários perfis, sufocando os anseios de muitos e proibindo a ascensão de tantos outros. A educação é a via mais segura para garantir-se o crescimento global do ser humano. Educar é rasgar horizontes, é apontar probabilidades, é projetar metas, é trabalhar ideias, é respeitar a criança em relação ao meio do qual provém e às 2 condições que a rodeiam. Como nos revela a raiz da palavra, educar é conduzir. Não entendamos “conduzir” com sentido de arbitrariedade, mas como uma atitude de orientação e busca por situações favoráveis à aprendizagem. A ação docente nesse processo de desenvolvimento é de suma importância. A atuação do professor deve estar em consonância com a responsabilidade que lhe é conferida. Assim, faz-se imperativo o preparo desse profissional. A Educação Especial, por longos períodos, trabalhou sob a inspiração de modelos onde o aluno era percebido como um aprendiz condicionável cuja evolução era medida pelo volume de habilidades e comportamentos adquiridos por meio de treinamentos reiterados e cansativos. As correntes comportamentalistas ganharam forças e ditaram normas. Os valores intrínsecos, a bagagem sócio-cultural e o poder criativo desse sujeito em formação, eram postos à margem; não havia lugar para eles naquela visão educacional. Tal postura pedagógica, através dos tempos, perdeu espaço. Já na segunda metade do século XX, contudo, vemos mudanças claras acontecerem. É importante ficarmos atentos e revermos constantemente nossas práticas em sala de aula, avaliando objetivos e estratégias educativas. É necessário, por tanto, que se reflita sobre o momento histórico por que passamos. A inclusão chega como um signo de reparação. Impõe-se como um direito. Para que possamos lograr êxito nesse projeto humanístico-educacional, é imprescindível que a Escola aprofunde seu olhar para que se estabeleçam novos rumos e outras práticas pedagógicas. É uma questão polemica e delicada. Estão os professores aptos para encetar essa caminhada? Estão os professores imbuídos do desejo da mudança? A educação brasileira vive graves problemas. O magistério debate-se no caos da desmotivação e fica a mercê do esvaziamento da carreira. O ensino da Rede Pública espelha a falta perspectivas para professores e alunos. Na esfera da educação inclusiva, vê se ainda uma carência bastante significativa de profissionais realmente qualificados para atenderem a alunos com necessidades educativas especificas. Os cursos de formação de professores não suprem a diversificação desse alunado. A procura pela Rede Regular de Ensino cresce, no entanto, o professor sente-se 3 desconfortável diante de uma situação nova; diante de uma realidade um tanto desconhecida ainda. É fundamental que se discuta a formação do profissional de ensino a fim de que não recaia sobre ele a responsabilidade negativa de uma atuação equivocada ou com cunho de rejeição. Capacitá-lo para o exercício do seu mister deve ser obrigação de todas as esferas que estabelecem e implementam as políticas públicas na área educacional. É hora de mudar atitudes, é hora de rever postulados, é hora de firmar novos compromissos. O desenho da sociedade de nossos dias reflete um perfil altamente competitivo. O conhecimento veicula-se rápido e quase sem controle. O professor desses novos tempos precisa estar instrumentalizado para cumprir sua tarefa maior: conduzir o aluno na via do saber, levar o aluno a construir sua identidade, incentivar o aluno a interagir com o mundo que o cerca, fazer o aluno perceber-se produtivo e com autonomia para desenvolver suas potencialidades, trabalhar o aluno a fim de sentir-se digno perante si mesmo e perante a sociedade. É um projeto ousado, todavia, fundamental. A inclusão está diretamente ligada à aceitação do OUTRO. Somente um professor que entenda, em profundidade esta questão, poderá seguir em frente. O professor tende estar aberto ao novo, disponível para a discussão consciente das práticas inclusivas, consolidando-as na vivência diária do seu discurso e da sala de aula, alargando-as no convívio estreito com seu aluno. A Educação Especial no decurso do seu desenvolvimento e avanço foi mobilizada, basicamente, por três linhas de ação: • Normalização – Maneira de encarar a pessoa com deficiência dentro de um padrão de “normalidade”. A Educação atua sobre o sujeito, fazendo com que o aluno adquira comportamentos considerados “normais” e afetos a alunos videntes, quando se refere à deficiência visual. 4 • Integração – Maneira de encarar o aluno com deficiência já preparado para integrar-se à escola e a sociedade, uma vez que já fora “normalizado” • Inclusão – Maneira de perceber a sociedade e a escola prontas para receber o aluno com deficiência. A sociedade e a educação se abrem para cumprirem o papel de agentes formadores na construção da cidadania desse novo sujeito que se forja. Inclusão e cidadania: duas palavras, dois conceitos, um direito, jamais uma concessão. 5