ARTE, TRANSMÍDIA E REALIDADE AUMENTADA1 Anderson dos Santos Paiva2 José Fernão Bastos Paim3 Resumo: A relação entre arte, ciência e tecnologia vem ganhando uma dimensão cada vez mais ampla através da apropriação pelos artistas dos recursos, técnicas e procedimentos de outras áreas como da Ciência da Computação em que a Realidade Aumentada (RA) figura como uma linha de pesquisa em pleno desenvolvimento. Neste artigo apresentamos uma abordagem sucinta das questões que envolvem as “poéticas imersivas” e a transmídia discutindo alguns conceitos e características destes processos híbridos para em seguida abordar os artistas que dela fizeram uso com o objetivo de repensar as questões inerentes ao potencial artístico e imersivo da transmídia para as artes visuais contemporâneas. Palavras-chave: Artes Visuais; Tecnologias contemporâneas; Interatividade. Absctract: The relationship between art, science and technology is gaining an ever wider scale through the appropriation of resources by the artists, techniques and procedures as other areas of Computer Science at the Augmented Reality (AR) appears as a line of research in full development. In this paper we present a succinct approach to issues involving "immersive poetic" and transmedia discussing some concepts and characteristics of these hybrid processes and then approaches the artists who made use of it in order to rethink the inherent artistic potential and immersive issues transmedia for contemporary visual arts. Keywords: Visual Arts; Contemporary technologies; Interactivity. 1. Introdução A produção artística contemporânea tomará cada vez mais conhecimento do termo “Arte Tecnológica” mediante o acesso e apropriação dos sistemas de Realidade Virtual e Aumentada a partir dos anos 1990. Contudo, os avanços rumo a expansão da arte no encontro com a ciência e a tecnologia já era sentido desde muito antes com o advento das redes telemáticas4. SAÇASHIMA (2011) estabelece como obra inaugural “Hole in Space”, de Kit Trabalho apresentado no Seminário Temático “Tecnologia e o Ensino nas Redes”, durante a I Jornada Internacional GEMInIS, realizada entre os dias 13 e 15 de maio de 2014, na Universidade Federal de São Carlos. 2 Bacharel em Artes Plásticas, Mestre em Artes Visuais pela Universidade Federal da Bahia e Doutorando em Arte Contemporânea pela Universidade de Coimbra. Professor Assistente do Curso de Artes Visuais da Universidade Federal de Roraima e líder do grupo de pesquisa ARTEFACTO - Grupo de Estudos e Pesquisas em Arte e Tecnologia. Email: [email protected] 3 Bacharel em Artes Plásticas e Mestre em Artes Visuais pela Universidade Federal da Bahia. Professor Auxiliar do Curso de Artes Visuais da Universidade Federal de Roraima e pesquisador do ARTEFACTO - Grupo de Estudos e Pesquisas em Arte e Tecnologia. Email: [email protected] 4 Telemática é o conjunto de tecnologias da informação e da comunicação resultante da junção entre os recursos das telecomunicações (telefonia, satélite, cabo, fibras ópticas etc.) e da informática (computadores, periféricos, softwares e sistemas de redes), que possibilitou o processamento, a compressão, o armazenamento e a 1 Galloway e Sherrie Rabinowitz, de 1980, que uniu moradores de Los Angeles e Nova Iorque, conectados através da interação em tempo real possibilitada pela tecnologia telemática com a transmissão e projeção das imagens em espaços públicos. No contexto brasileiro, diversos autores apontam como uma das mais relevantes experiências em arte telemática seria a exposição “Arte pelo telefone: Videotexto”, realizada por Julio Plaza no Museu da Imagem e Som (São Paulo, 1982) e na 17a Bienal Internacional de São Paulo (São Paulo, 1983). Este e outros eventos que se seguiriam foram marcados sobretudo pela interatividade na absorção das Novas Tecnologias da Comunicação. É inclusive Julio Plaza quem propõe os três graus de abertura de interatividade em relação aos elementos que compõem a poética imersiva5 (autor, obra e recepção): A abertura de primeiro grau, fortemente marcada pelo conceito Bakhtiano de intertextualidade como o “inacabamento de princípio” e “abertura dialógica”;a abertura de segundo grau, com as “noções de ambiente” e “participação do espectador” suplantando a obra que passa a ser situação perceptiva (re-criação); a abertura de terceiro grau, onde os novos processos de criação artística e exploração estética são operados através de interfaces e recursos computacionais que possibilitam uma maior interatividade com os espectadores (FANG LI, 2011, p.36-37). A interatividade assumiu condição indispensável para compreensão do campo expandido da arte no encontro com os sistemas de Realidade Virtual e Realidade Aumentada. Isso porque, com a popularização e acessibilidade cada vez crescente dos dispositivos eletrônicos portáteis e o fácil acesso aos múltiplos processos computacionais, tornou-se possível a exploração de novos meios de representação baseadas na virtualização e simulação de universos singulares através das “poéticas imersivas” mediadas pelas tecnologias, como apontado por Diana Domingues, e se concretizaram, nos projetos dos artistas, as diversas formas de produção de experiências inseridas nos três graus de interatividade propostos por Julio Plaza. comunicação de grandes quantidades de dados (nos formatos texto, imagem e som), em curto prazo de tempo, entre usuários localizados em qualquer ponto do planeta. 5 Segundo Diana Domingues, ‘”os ambientes imersivos gerados pelos artistas exploram a virtualidade em seu sentido poético,em lugares e durações geralmente subvertidos se pensados em bases de realismo e assim, buscam desestabilizar a noção de escala, tempo, espaço, cor, brilho, grav idade,dinâmica, materialidade. Interessam os graus de fantasia e a capacidade de estimular experiências sensoriais como algo acontecendo, em processos experienciais, fora dos limites do r e a l . ” 2. Arte e Interatividade Entendendo a Realidade Aumentada (Augmented Reality) como um sistema que suplementa o mundo real com objetos virtuais gerados por computador parecendo coexistir no mesmo espaço, do modo estabelecido por Ronald Azuma, podemos entender que as propriedades da Realidade Aumentada vão além da interatividade. Para sua caracterização se faz necessário também o processamento de objetos virtuais em tempo real, o fator tridimensional e o somatório dos elementos reais e virtuais em um mesmo ambiente. Embora a Realidade Aumentada corresponda a uma determinada linha de pesquisa da Ciência da Computação, ela tem possibilitado aos artistas de todo o mundo explorarem seu potencial para a criação de instalações imersivas, performances, obras site-specific dentre outras possibilidades no campo da arte tecnológica. No que diz respeito ao ambiente de que se apropriam estes artistas na utilização da Realidade Aumentada (RA) em suas construções poéticas, ainda podemos apreender muito do que dispõe seu fundamento básico: Um ambiente de realidade virtual com RA apresenta três características: imersão, que leva o usuário a sentir-se ‘fisicamente’ dentro do ambiente virtual; interação, que permite ao usuário executar ações no ambiente; e navegação, através da qual o usuário explora o ambiente. Ainda com a adição de outros elementos, como sons, por exemplo, o que torna o ambiente ainda mais real” (KIRNER; TORI, 2006, p. 24). Essas características fundamentais da RA são compreendidas como produtoras de sentido e construtoras de novas e distintas realidades a partir da ação do interator no contexto da obra, pois está em jogo a simulação de distintas realidades alimentadas por imagens, sensações e experiências complementadas pela intuição e imaginário. A Realidade Aumentada é aplicada a todos os sentidos possíveis: audição, tato, força, cheiro, etc. E não somente à visão. Esta concepção possibilita experimentação com outros sentidos, abrindo margem, também, para a multisensorialidade integrada às tecnologias contemporâneas e inclusão (BORN, 2012 apud AZUMA, 2011). Desta forma, há uma conexão entre a criatividade e a sensibilidade do interator, levando-o também ressignificar a experiência interativa. Isso ocorre de modo diferente na Realidade Virtual e na Realidade Aumentada, uma vez que a primeira é uma “interface avançada do usuário” e a segunda é um “ambiente real” com uma interface que possibilita a visualização e manipulação de objetos virtuais sem necessariamente haver uma experiência imersiva6. Kirner e Tori estabelecem uma distinção entre uma e outra quando afirmam que a Realidade Virtual trabalha unicamente com a virtualidade ao transferir o usuário para o ambiente virtualizado e prioriza as características de interação do usuário. Já a Realidade Aumentada dá ênfase a qualidade das imagens e a interação do usuário e possuiria um mecanismo em que são combinados o mundo real e o mundo virtual, mas permitindo ao interator manter o “senso de presença” (2006, p.24). Essas diferenças são importantes para se compreender como se opera a interatividade e como dela fazem uso os artistas. Diana Domingues chega a tratar deste ponto quando se refere ao “campo de possibilidades” partindo da escolha pelo programas de dispositivos e variáveis do sistema, com tecnologias sempre mutantes (1997, p.16). Na Realidade Virtual a interatividade tem forte relação com a visualização que pode ser imersiva (dispositivos combinados com CAVEs7) ou não-imersiva (por meio de capacetes ou múltiplas projeções). Contudo, através da Realidade Aumentada, a corporeidade presentificada (tempo real) pode suscitar outras questões artísticas. Nas Artes Visuais, percebemos que os recursos do sistema de Realidade Aumentada possibilitam aos artistas elaborar propostas para incorporar o interator às obras. Esta incorporação gera a sensação de “se estar nas” obras e não apenas a de se ver as obras. Além disso, através, por exemplo, dos trabalhos de Phil Worthington e Mark Cypher, percebemos que os recursos do sistema de Realidade Aumentada permitem criar poéticas que trabalham com as extensões do corpo: as sombras dos interatores podem ser ampliadas em figuras significativas nos trabalhos destes artistas, por exemplo (SAÇASHIMA, 2011, p. 88). 6 Kirner e Siscoutto apresentam em Realidade Virtual e Aumentada: conceitos, projeto e aplicações (2007), uma publicação com diversos autores, estas e outras relações com grande clareza sobre as características e possibilidades da RV/RA. 7 CAVE (Cave Automatic Virtual Environment) é um ambiente físico onde são projetados gráficos em 3 dimensões, em suas paredes, podendo ser visualizadas através de um dispositivo, em ações de exploração e interação entre pessoas, objetos e outros na simulação de um ambiente virtual. Essa relação entre a imersão e interatividade na experiência da “visualização” dos objetos virtuais da Realidade Aumentada pode ser classificada pelo modo como o usuário vê o mundo em sobreposição. Assim, a visão direta (imersiva), corresponde a fixação direta dos olhos para as posições reais com cena óptica ou por vídeo, e, a visão indireta (não imersiva), em que o usuário vê o mundo através de algum dispositivo (monitor ou projetor), sem relação com as posições reais. A tecnologia dos visualizadores é também adotada como um critério de classificação dos sistemas de Realidade Aumentada: visão óptica direta, visão direta baseada em vídeo, visão baseada em monitor e visão baseada em projetor (KIRNER; TORI, 2006. p. 28). Mas, se por um lado esses visualizadores são fundamentais para a combinação de realidades (real e virtual), por outro lado os artistas podem explorar outros aspectos da Realidade Aumentada através das formas clássicas de interação8 por navegação, seleção e manipulação, sem ter necessariamente que se comprometer com todas dimensões deste sistema. O artista da comunicação e a sua obra interativa só existem pela interação do público. Nas artes da interatividade, o destinatário potencial ou interator, ou seja, aquele que colabora em um processo dialógico com a obra, se torna coautor e a obra em questão torna-se um campo aberto a múltiplas possibilidades (FANG LI, 2011, p. 42). É esse pois o desafio atual imposto pelas tecnologias contemporâneas de “colocar o usuário dentro de um espaço preenchido com dados dinâmicos e contextuais, com os quais o usuário pode interagir”, como propõe Santaella (2007, p. 277) e, ao mesmo tempo, alterar sua condição de espectador e usuário. O aspecto principal da relação entre arte e realidade aumentada é, portanto, elevar o papel do interator ao de co-autor, construindo em pleno sentido uma “poética imersiva”. 3. Arte e Realidade Aumentada 8 Segundo Louise Poissant, até o aparecimento das novas tecnologias, a atividade artística estava associada à criação de formas. Diante do abandono gradual dos materiais sólidos e “o declínio do objeto”(POPPER apud POISSANT, 2009) em prol do que Lyotard chamou de “imateriais”, a ênfase foi se deslocando progressivamente do processo para a experimentação de dispositivos que convidavam o espectador a se conectar em um outro nível e, por fim, interagir com a obra de arte e seu ambiente. Muitos artistas têm conseguido avanços significativos para tornar a experiência em RA o elemento central da prática artística contemporânea. Em “AR in Art: an evaluation” (2011), Sunjoy Prabakaran, apresenta uma relação dos diversos artistas envolvidos com questões comuns à RA. Encontra-se primeiramente listado o artista australiano Jeffrey Shaw, com as instalações “sculpture” (1981) e “cube” (1982), apresentadas em Amsterdam e Breda, na Holanda, onde os espectadores poderiam visualizar através de um sistema óptico alguns objetos virtuais no espaço expositivo do museu. Também nos anos 80 o artista Myron Krueger apresentou uma instalação em RA no Museu de História Natural de Connecticut, EUA (1988) dispondo de tela de projeção e câmera de vídeo em que as imagens dos visitantes eram combinadas com imagens gráficas. Depois ele mesmo desenvolveu um sistema de computador para melhorar o reconhecimento e análise das imagens dos visitantes permitindo, após seu aprimoramento a exploração até 25 padrões de interação9. Ulrike Gabriel, com sua “Perceptual Arena” (1993) também trabalhou com a interatividade, contudo ampliando a dimensão imersiva com os interatores utilizando visores para manipular formas abstratas geradas por computador e projetadas em uma tela grande. E ainda nos anos 1990, Charlotte Davies, desenvolveu “Osmose” (1995), um ambiente de realidade virtual imersiva e interativa com sistema de computação gráfica 3D e som interativo com rastreamento de movimento em tempo real para explorar a percepção e consciência dos interatores. Obra que assinala o início da Arte Virtual, segundo Oliver Grau. Osmose cultiva o parâmetro usuário-interface – um parâmetro essencial na arte virtual – em um grau que ainda não pôde ser igualado; seria possível escrever um tratado todo sobre esse aspecto. Osmose é uma simulação, tecnicamente avançada e visualmente impressionante, de uma série de espaços textuais e naturais amplamente ramificados: uma esfera mineral-vegetal inatingível (GRAU, 2007, p.220). Nos primeiros anos do século XXI o projeto “CoExistence” (2001), de Rebecca Allen, despontou como uma instalação de arte interativa em RA, apresentada no Instituto de Design de Interação de Ivrea, na Itália. O trabalho consistiu em uma experiência 9 Diana Domingues refere-se a Myron Kruger como o primeiro a falar dos responsive environments. Nesses ambientes de Realidade Aumentada, ocorre um controle das imagens pelas ações do corpo através de interfaces que permitem a captura e processamento de gestos. compartilhada entre interatores com sensores e visores que exploravam a respiração e outras sensações tácteis, demonstrando os aspectos de subjetividade surgidos na interdependência entre os seres humanos e as interfaces computacionais. Logo depois surgiram outros trabalhos na dimensão da RA como do artista Ken Rinaldo com “Augmented Fish Reality”, apresentado em Lille, França (2004), com imagens de peixes geradas por computador, tigelas projetadas e sensores infravermelho responsáveis pelo movimento desses seres virtuais, permitindo uma boa interação com os visitantes. Já o grupo Blast Theory apresentou seu trabalho “FLYPAD” (2006) na Galeria Pública de West Bromwich, na Inglaterra, como um misto de realidade aumentada e site specific para criar uma experiência colaborativa semelhante a imersão em jogos eletrônicos. Através desta obra os interatores criaram avatares que dinamizaram o lugar expositivo através da interação proporcionada por 11 terminais colocados no átrio central da galeria. No Brasil, Chan Fang Li (2011), cita os experimentos artísticos em RA como a obra “VR Aquarium” de Diana Domingues e Grupo Artecno, apresentada no Museu de Ciências Naturais da UCS em que ocorre a interação de peixes reais e virtuais modelados em programa computacional. Outra artista citado por Fang Li é Sanders Veenhof, com sua obra intitulada “A Primeira Flashmob de Realidade Aumentada do Mundo”, realizada na praça Dam de Amsterdam (Holanda) no ano de 2010, com a disposição de marcadores para captura dos interatores através de dispositivos móveis (celulares e iphones). E a obra <Body> de Camila Hamdan, realizada em 2008, que explora o potencial do corpo com marcadores que possibilitam a visualização de tatuagens em RA de modo a diluir a linha tênue entre real e virtual corpóreo mediante uma atividade exógena e endógena. Uma obra que possui grande destaque no cenário nacional devido aos avanços empreendidos em RA é o Projeto OPE_RA, das artistas Daniela Kutschat e Rejane Cantoni, constituído de um ambiente imersivo-interativo que se assemelha a um mundo virtual onde ocorre a interação humano-computador na produção de experiências multisensoriais. O projeto é uma pesquisa em processo, desenvolvido desde 1999, conquistando diversos prêmios nacionais e internacionais ao longo dos anos com a criação de várias instalações imersivas. O desenvolvimento de interfaces humano-computador desenhadas para possibilitar interação simbiótica entre agentes humanos e artificiais é uma parte fundamental de nossa pesquisa. Até o presente, essa estratégia nos levou a desenhar e desenvolver sistemas de rastreamento alternativos e a experimentar tecnologias de ambientes imersivos e interativos (sistemas de realidade virtual). Exemplos são: OP_ERA: HYPERVIEWS, OP_ERA: HAPTIC WALL, OP_ERA: HAPTIC INTERFACE e OP_ERA: SONIC DIMENSION (HANNS; CANTONI, 2006, p.356). Outro artista brasileiro cujo trabalho dialoga com a Realidade Aumentada na criação de instalações imersivas é Gilbertto Prado com o projeto denominado “Acaso 3052”, que provocou uma discussão sobre a violência na cidade do Rio de Janeiro, com destaque para a chacina ocorrida no ano de 2005, mesmo ano de realização do projeto. A interação nesta obra ocorre pela operacionalização de eventos mediante o deslocamento do corpo do interator no espaço imersivo10. O interator, ao pisar num tapete todo azul feito a mão pelas mulheres de presos, aciona um dispositivo que gera um evento: imagens de um corpo nu em agonia são projetadas no chão e um vento forte bate na parede frontal. O artista tem clara intenção de fazer da aproximação do interator uma ação geradora de eventos. O artista utilizou como dispositivo de entrada vários 'tapetes de dança' cobertos pelo tapete azul. No teto, um projetor fixado num suporte giratório projeta imagens em um dos vários espelhos fixados no teto e que projeta a imagem no chão (SAÇASHIMA, 2011, p.72). Esta e outras obras citadas tratam da interatividade e imersão pelo agenciamento corpóreo no que concerne mais particularmente as artes visuais, uma vez que na Realidade Aumentada para que se produza uma experiência de imersão é necessário que ela se faça por meio da mediação da interface gráfica e na utilização de equipamentos como luvas de dados, óculos estereoscópicos e capacetes HDM, dentre outros. 4. Transmídia e sua interação com a arte e realidade aumentada Um importante ponto de convergência da potência transformadora de processos interativos entre a Arte e a Realidade Aumentada tem sido a Transmídia enquanto meio de cruzamento de projetos e media diversas. 10 Silvia Regina Guadagnini apresenta em sua pesquisa de mestrado uma ampla leitura do trabalho de Gilbertto Prado e suas relações com a imersão tecnológica. A Transmídia pode ser entendida como “o além de” ou “através de” múltiplas mídias em que a imersão decorre do universo narrativo criado com certas regras para facilitar o maior envolvimento das pessoas na história que é contada, geralmente seguindo uma regra quase clássica de apresentação, conflito e desfecho. A ampliação da narrativa recaí na denominada Transmedia Storytelling, um termo presente na obra Cultura da Convergência de Henri Jenkings, e diz respeito as formas de se contar essa história tendo por suporte medias tão diferenciadas. Mas como pode a transmídia somar-se aos aspectos imersivos da confluência da arte com as tecnologias digitais comuns à Realidade Aumentada? As amplas possibilidades de interação por si somente já garantem parte da imersão do usuário/interator perante estímulos corpóreos. A excitação corporal, no caso das interacções performativas ancoradas no espaço físico, aliada à experiência háptica, no caso das interacções on-line, não apelam à interpretação semântica mas mobilizam o participante/jogador de forma sensual. Poder-se-ia dizer que a técnica, os operadores técnicos e a tecnologia tomam o comando na hierarquia das artes e do design e, neste contexto, a produção cultural torna-se acima de tudo um problema técnico de programação de emoções (GOUVEIA, 2010, p.4). Muitas artistas ultimamente têm buscado explorar essas relações. Um exemplo de destaque no cenário atual é Biermann, um artista especializado em utilizar da Realidade Aumentada para fazer intervenções com transmídia em espaços públicos. Um importante projeto desenvolvido por ele foi Re+Public, com parceria com outros atores da relação RA/Transmídia, como Ean Mering e Jordan Seiler. Este projeto estabeleceu uma série de aplicativos móveis com muitos aspectos interativos que desde 2011 deu origem a vários aplicativos beta em que usuários interagem com outdoors e prédios em importantes centros de cidades americanas e européias. 5. Considerações finais As Artes Visuais vem continuamente se apropriando das tecnologias da comunicação e informação desde a reprodutibilidade técnica proporcionada pelos meios eletrônicos, seguido pelo advento da telemática e multimídia até as novas formas de interação e imersão proporcionada pela Realidade Virtual, Realidade Aumentada e pela Transmídia. Os artistas contemporâneos buscam nas práticas imersivas facilitada por esses sistemas, construir novos cenários, ambientes e universos em que o interator torna-se co-autor do projeto transformado em obra, com a sua presença e agenciamento corpóreo intercambiada por sensores e demais aparatos tecnológicos remodeladores do espaço. Assim as Artes Visuais, por intermédio do uso criativo da tecnologias e poéticas imersivas, produzem uma renovação do seu campo de atuação e se lança ao desafio sempre contemporâneo de “levar ao paroxismo a sensibilidade liberada dos condicionamentos dos mundos da matéria. Geram mundos não para imitar a vida, mas para expandi-la” (DOMINGUES, 2003). Referências BORN, Rodrigo M. “Do simulacro às novas mídias no ensino de arte”. Disponível em <http://www.nest.ceart.udesc.br/wp-content/uploads/2013/03/artigo-Rodrigo-Born.pdf>. Acesso em: 20/02/2014. DOMINGUES, Diana. “A arte no século XXI: a humanização das tecnologias”. São Paulo: UNESP, 1997. DOMINGUES, Diana. “Poéticas imersivas e realismo virtual”. In: LEÃO, Lúcia (Org.) “Cibercultura 2.0”. São Paulo: U.N. Nojosa, 2003. FANG LIN, Chan. “AR|RA: a arte em realidade aumentada”. 2011. 95fl. Dissertação (Mestrado em Artes) – Curso de Pós Graduação em Artes, Instituto de Artes, Universidade Estadual Paulista. São Paulo-SP, 2011. 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