Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP
Instituto de Matemática e Computação Científica - IMECC
Gabarito da Lista 1 de Anéis e Corpos
Professor: Dr. Fernando Torres
Exercício 1.
a) Seja A um anel associativo. Prove que A é um anel de divisão se, e
somente se, para todo a ∈ A\ {0}, e para todo b ∈ A, existe x ∈ A tal que ax = b.
(⇒) Se b = 0, basta tomar x = 0. Se b 6= 0, tome x = a−1 b.
(⇐) Mostremos iniciamente que se a, b ∈ A s4o tais que ab = 0 e b 6= 0, então a = 0.
Como b 6= 0, então para todo c ∈ A, existe x tal que bx = c, logo ac = (ab)x = 0,
para todo c ∈ A.
Seja agora e ∈ A solução de ax = a, claro que e 6= 0. Além disso, ae = a implica
a(e2 − e) = 0, logo e2 = e.
Assim, para todo x ∈ A, temos (xe−x)e = xe−xe = 0, logo xe = x. Analogamente,
ex = x, e temos e = 1.
Por fim, para todo a ∈ A não nulo, existe x ∈ A onde ax = 1, então existe y ∈ A
onde xy = 1. Assim, a = a1 = axy = 1y = y. Portanto, x = a−1 .
b) Seja A um anel associativo com 1. Prove que A é um anel de divisão se, e somente
se, para cada a ∈ A\ {0}, existe um único b ∈ A tal que aba = a.
(⇒) Tome b = a−1 .
(⇐) Seja a ∈ A\ {0}. Seja r ∈ A tal que ar = 0, afirmamos que r = 0. De fato,
a(b + r)a = (ab + ar)a = aba, logo b + r = b, e assim r = 0. Como aba = a,
temos a(ba − 1) = 0 e portanto ba = 1. Analogamente, ra = 0 implica r = 0 e
assim ab = 1. Portanto todo elemento não nulo de A é unidade, e assim A é anel
de divisão.
c) Seja A um anel associativo com 1. Prove que se a ∈ A\ {0} tem mais que um inverso
pela direita, então a tem uma infinidade de inversos pela direita.
Seja b ∈ A tal que ab = 1. Então para cada n ∈ N defina bn := b + an − ban+1 .
Observe que abn = 1. Além disso, se n 6= m, então bn 6= bm . De fato, suponha que
bn 6= bm para n 6= m. Sem perda de generalidade podemos supor n > m, assim
n = m + t, com t > 0, e temos:
bn = bm+t = b + am+t − bam+t+1 = bm = b + am − bam
⇒ am+t − bam+t+1 = am − bam ⇒ (1 − ba)am+t = (a − ba)am ,
e multiplicando por bm pela direita, temos ((a − ba)at ) = 1 − ba, que nos resulta
(b + (1 − ba)at−1 )a = 1, pois t > 0.
Portanto a é uma unidade de A, gerando uma contradição, pois se a é unidade de
A, então a possui um único inverso pela direita.
Exercício 2. Seja A um anel associativo tal que a3 = a para todo a ∈ A. Provar que A
é comutativo.
Observe inicialmente que:
1
(I) x + y = (x + y)3 = x3 + xyx + yx2 + y 2 x + x2 y + xy 2 + yxy + y 3 , logo xyx + yx2 +
y 2 x + x2 y + xy 2 + yxy = 0.
(II) x − y = (x − y)3 = x3 − xyx − yx2 + y 2 x − x2 y + xy 2 + yxy − y 3 , logo −xyx − yx2 +
y 2 x − x2 y + xy 2 + yxy = 0.
Fazendo (I)-(II), temos:
(III) 2(x2 y + xyx + yx2 ) = 0.
Fazendo agora x(III) e (III)x, temos:
(IV) 2(xy + x2 yx + xyx2 ) = 0 e
(V) 2(x2 yx + xyx2 + yx) = 0.
Tomando (IV)-(V), segue que 2xy − 2yx = 0.
Além disso temos 3(a + a2 ) = 0, para todo a ∈ A, pois a + a2 = (a + a2 )3 = 4(a + a2 ).
Então tomando a = x + y, temos:
(VI) 0 = 3(x + y + (x + y)2 ) = 3xy + 3yx ⇒ 3xy = −3yx.
Veja ainda que para todo a ∈ A temos 2a = (2a)3 = (2a2 )(2a) = 8a, e fazendo
a = xy, temos 6xy = 0. Logo, por (VI):
3xy − 3yx = 3xy + 3xy = 6xy = 0.
Portanto 2xy − 2yx = 0 e 3xy − 3yx = 0, e segue que xy − yx = 0.
Exercício 3. Sejam G um grupo e R um anel associativo com 1. Seja R[G] o conjunto
das funções f : G → R tal que f (a) = 0 salvo um conjunto finito de elementos de
G. Mostre que
P este conjunto é um anel com as operações (f + g)(a) = f (a) + g(a) e
(f · g)(a) =
bc=a f (b)g(c). Mostre que se R é comutativo, então R está contido no
centro de R[G]. Descrever esse anel explicitamente quando R = F2 e G é um grupo de
ordem 3.
Considere o homomorfismo de anéis ϕ : r ∈ R 7→ fr ∈ R[G], onde fe = r e fr (g) =
0, ∀g ∈ G\ {e} (e denota aqui o elemento neutro de G). Temos que este homomorfismo é
injetor, assim, salvo isomorfismo, podemos dizer que R está contido em R[G].
Seja agora f ∈ R[G] arbitrário. Observe que:
(f fr )(e) = f (e)fr (e) = f (e)r = rf (e) = (fr f )(e),
(f fr )(g) = f (g)fr (e) = f (g)r = rf (g) = (fr f )(g), ∀g ∈ G.
Logo R está contido no centro de R[G].
Exercício 4. Seja A um anel associativo com 1. Denote por Mn (A) o anel das matrizes
n × n com entradas em A. Para um ideal J ⊆ A, seja Jn = {(aij ) ∈ Mn (A); aij ∈ J}.
Provar que Jn é um ideal de Mn (A) e que, de fato, todo ideal de Mn (A) é desta forma.
Em particular, os únicos ideais de Mn (A) são os triviais se A for anel de divisão.
2
(I) Jn é ideal de Mn (A).
Como a some de matrizes é feita entrada a entrada e J é fechado para a soma em
A (pois é ideal), temos que Jn é fechado para a soma em Mn (A).
Além disso, o produto de duas matrizes (aij ) ∈ Jn e (bij ) ∈ Mn (A) tem entradas
que são combinações lineares de elementos de J com coeficientes em A à direita, ou
à esquerda, dependendo da posição das matrizes no produto. Assim, como J é ideal
de A, segue que Jn é fechado para a multiplicação externa em Mn (A).
(II) Todo ideal de Mn (A) é desta forma.
Seja J um ideal de Mn (A). Defina:
I := {x ∈ A; ∃(aij ) ∈ J com a11 = x} .
É fácil mostrar que I é um ideal de A.
Afirmamos que J = In .
Defina a matriz Epq (x) := (aij ), onde apq = x e as demais entradas são nulas.
Seja (bij ) ∈ J e E1p (1), Eq1 (1) ∈ Mn (A), então veja que E11 (bpq ) = E1q (1)(bij )Ep1 (1) ∈
J, logo bpq ∈ I, ∀p, q. E, assim, J ⊆ In .
Seja agora (aij ) ∈ In , então para cada entrada i, j ∈ {1, ..., n} existe uma matriz
ij
ij
(bij
pq ) ∈ J tal que b11 = aij . Assim Ei1 (1)(bpq )E1j (1) = Eij (aij ) ∈ J.
P
Portanto, (aij ) = i,j Ei1 (1)(bij
pq )E1j (1) ∈ J, logo In ⊆ J.
Exercício 5. Seja A um anel associativo comutativo e com 1. Seja f = a0 + a1 x + ... +
an xn ∈ A[x]. Prove que f é uma unidade de A[x] se, e somente se, a0 é unidade de A e
a1 , ..., an são elementos nilpotentes de A.
Se n = 0, o resultado segue de forma trivial.
Então podemos supor n > 0.
P
i
b
(⇒) Se f é unidade de A[x], seja g = m
i=0 i x o seu inverso, então temos:
1 = fg =
n+m
X
ck xk , ck =
k=0
X
ai bj .(??)
i+j=k
Seja 0 ≤ r ≤ m, mostremos que ar+1
n bm−r = 0. (?).
Indução sobre r: Quando r = 0, temos de (?) a expressão an bm , que por (??) é o
coeficiente que acompanha xn+m .
Como n > 0, então n + m > 0 e então por (??), cn+m = 0, logo an bm = 0.
Aplicando agora a hipótese de indução: aj+1
n bm−j = 0, ∀j ≤ r − 1. Mostremos que
r+1
an bm−r = 0.
Em (??) consideremos cn+m−r , como antes, temos cn+m−r = 0, e assim:
an bm−r + an−1 bm−r+1 + ... + an−r bm = 0
⇒ arn (an bm−r + an−1 bm−r+1 + ... + an−r bm ) = 0
r
r−1
⇒ ar+1
an b m = 0
n bm−r + an−1 an bm−r+1 +... + an−r an
| {z }
| {z }
=0
=0
3
⇒ ar+1
n bm−r = 0.
Mostremos agora que a0 é unidade e a1 , ..., an são nilpotentes.
Como a0 b0 = 1 por (??), segue que a0 é unidade, e b0 também.
= 0 e portanto an é nilpotente.
b0 = 0, assim am+1
Fazendo m = r em (?), temos am+1
n
n
n
Defina fn := an x − f . Como an é nilpotente em A, então an xn é nilpotente em A[x],
assim, como f é unidade, temos qye fn é unidade, e procedendo de forma análoga ao feito
com f , concluímos que an−1 é nilpotente.
Portanto, recursivamente, comcluímos que a0 é unidade e a1 , ..., an são nilpotentes.
(⇐) Como a1 , ..., an são nilpotentes em A, temos que a1 x, ..., an xn são nilpotentes em
A[x]. Assim a1 x + ... + an xn é nilpotente em A[x].
Por hipótese, a0 é unidade, portanto a0 + a1 x + ... + an xn = f é unidade de A[x].
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