Uma História dos Livros de Matemática
Leituras, Intrigas e Evolução Editorial
Adilson Longen
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©2015 Adilson Longen
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L852 Longen, Adilson.
Uma História dos Livros de Matemática: Leituras, Intrigas e Evolução
Editorial/Adilson Longen. Jundiaí, Paco Editorial: 2015.
464 p. Inclui bibliografia.
ISBN: 978-85-8148-761-8
1. Algacyr Munhoz Maeder 2. Estudo e ensino de Matemática 3. Livro
didático 4. Pedagogia I. Longen, Adilson
CDD: 371
Índices para catálogo sistemático:
Livro didático
371.32
Matemática – Estudo e ensino
510.07
IMPRESSO NO BRASIL
PRINTED IN BRAZIL
Foi feito Depósito Legal
Sumário
Apresentação......................................................................................7
Introdução.......................................................................................11
Capítulo 1 – Uma leitura dos livros escritos por Maeder.........41
1. Preliminares de uma leitura.................................................42
2. Álgebra elementar.................................................................51
3. Lições de matemática..........................................................85
4. Curso de Matemática – curso ginasial.............................163
5. Curso de Matemática – ciclo colegial...............................222
6. Matemática – Curso Comercial Básico...........................265
7. Conclusões de uma leitura................................................291
Capítulo 2 – Tribunas de educadores.......................................295
1. Tribuna 1: Revista Brasileira de Matemática..................300
2. Tribuna 2: Gazeta do Povo...............................................308
3. Tribuna 3: Companhia Editora Nacional.......................339
4. Serebrenick versus Maeder...............................................341
5. Conclusões de discussões em tribunas............................360
Capítulo 3 – Ilustrações em livros didáticos de
matemática.....................................................................................363
1. Ilustrações em lições de Matemática: 1ª série.................373
2 Ilustrações em lições de Matemática: 2ª série.................393
3. Ilustrações em lições de Matemática: 3ª série.................403
4. Ilustrações em lições de Matemática: 4ª série...............413
5. Ilustrações em lições de Matemática: 5ª série...............424
6. Conclusões sobre o uso de ilustrações............................432
Capítulo 4 – Livros didáticos de Algacyr Munhoz Maeder
sob um olhar da educação matemática......................................437
Referências......................................................................................451
APRESENTAÇÃO
Como é escrever um livro didático de Matemática?
Considerando que você, caro leitor, queira ser um autor na
disciplina de Matemática, essa é uma pergunta que necessariamente precisa ser feita. Qualquer tentativa de resposta conduzirá
a uma diversidade de indagações e reflexões: O que é Matemática? Quais transposições didáticas precisam ser feitas para compor
um livro-texto da disciplina de Matemática? Qual é o programa
da disciplina de Matemática, se é que existe? Quais conteúdos são
considerados essenciais? O livro deverá ter demonstrações? Qual
o tratamento a ser dado para as fórmulas, as propriedades, os
conceitos, os contextos e as ilustrações? Haverá indicativos sobre
a utilização de calculadoras ou ferramentas computacionais? E
o método a ser utilizado no encaminhamento dos conteúdos? A
história dos conteúdos, dos personagens que construíram o que
hoje chamamos de Matemática, terá alguma abordagem ao longo
dos capítulos em que o livro será dividido? Será leitura complementar ou fará parte do desenvolvimento dos conceitos?...
No Brasil, atualmente, a elaboração de um livro didático
passa por profundas transformações não apenas em relação
aos conteúdos, métodos de abordagem, concepções de ensino
e aprendizagem. Estamos em plena era digital e poderemos testemunhar em poucos dias a extinção do livro físico. O apelo
das multimídias, dos objetos digitais e tantos outros recursos
conduzem a essa conclusão. Vivemos numa década de transição
em que continuamente presenciamos a morte de objetos que,
há poucos dias, jamais imaginávamos que deixariam de existir.
Pense no objeto calculadora! O que é a calculadora atualmente? Qualquer celular, iphone, computador apresenta um aplicativo com a calculadora. Pense no relógio de pulso! Verifique um
grupo de estudantes do Ensino Médio, por exemplo. Examine
quantos deles têm relógio de pulso. O que irá acontecer com o
livro didático diante de tantas mudanças?
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Adilson Longen
Bem, as reflexões acima foram abordadas com o objetivo
de apresentar este livro que, de alguma forma, tem a pretenção
não apenas de contar a história do livro didático de matemática
em nosso país. Essa história tem início nos finais dos anos 1920,
ainda na época dos chamados compêndios, atravessa as décadas
de 1930, 1940, 1950 e vai até as portas da ditadura militar, já
na década de 1960. Mas não é a história de diversos autores de
livros didáticos de Matemática, mas a visão de um autor apenas.
Esse autor tem seu trabalho iniciado ainda quando se ensinava
Geometria e Aritmética, por exemplo, como disciplinas isoladas,
vê nascer a disciplina Matemática unificando seus vários ramos,
passa pelo surgimento dos ensinos ginasial, colegial e comercial.
Atravessa, portanto, quatro décadas como autor. Sendo assim,
esse autor, por meio de suas obras, nos dá uma ideia de como
responder à pergunta inicial.
Algacyr Munhoz Maeder é esse autor. Somente a leitura
criteriosa dos livros de Maeder já seria suficiente para envolver
todos aqueles que exercem a incomparável e tão pouco valorizada profissão de fazer matemática com seus alunos. Observar
criticamente, a partir do trabalho de um autor, a história dos
conteúdos, a formação de uma disciplina, os tipos de atividades
propostas, as demonstrações, os chamados programas oficiais,
os níveis de escolarização sendo delineados para organizar o
ensino e tantos outros aspectos que fazem parte de uma área
do conhecimento humano chamada Matemática. Entretanto, à
medida que a pesquisa foi sendo realizada, outros estudos se
fizeram necessários.
Um deles refere-se ainda à época dos compêndios escolares.
Maeder escreve o livro Álgebra elementar – 3ª edição, pela Tipografia João Haupt e Cia, de Curitiba, em 1933. Esse livro, por sua
vez, é então duramente criticado na Revista Brasileira de Matemática
por Salomão Serebrenick, diretor da revista ao lado do também
diretor Mello e Souza (Malba Tahan). Essa crítica faz surgir um
intenso debate via jornais. É a tribuna do educador, em que além
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de Maeder escrever rebatendo as críticas, outros personagens se
juntam ao autor paranaense e criticam seriamente o papel da
Revista Brasileira de Matemática. Entre eles, Jacomo Stávale, numa
publicação da Companhia Editora Nacional, do mesmo ano.
Surgiu assim uma da primeiras “brigas” editoriais no nosso país.
Mas essa disputa pelo mercado de venda de livros didáticos
vê surgir novas editoras. Em São Paulo, a Edições Melhoramentos, tendo como autor Maeder, começa a tomar o espaço
das editoras do Rio de Janeiro, então capital brasileira. Se por
um lado surgem intrigas, por outro podemos constatar a evolução na arte de se confeccionar um livro. A editoração dos anos
1930 até 1960 dos livros de Maeder ainda é em preto e branco,
mas as capas exibem cores. As ilustrações utilizadas nos desenvolvimentos dos conteúdos, mesmo sendo em preto e branco,
são de qualidades inquestionáveis ainda hoje. Isso nos levou a
também direcionar um estudo especial que faz parte deste livro
que aqui apresentamos.
Temos aqui um convite aos professores de Matemática: conhecer a história recente da disciplina ao longo de algumas décadas, a partir do olhar de um autor.
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INTRODUÇÃO
Para uma sociedade que está cheia de confusão em relação
ao presente e perdeu a fé no futuro, a história do passado parecerá uma mistura sem sentido de acontecimentos
sem relação. Se nossa sociedade recuperar seu domínio do
presente e sua visão do futuro, ela também, em virtude do
mesmo processo, renovará sua compreensão do passado.
Edward Hallet Carr
As recomendações para escrita de um trabalho científico,
conforme normalmente se divulgam, orientam o autor para a utilização da forma impessoal dos verbos. Também, conforme essas
mesmas normas, há ainda a possibilidade da utilização da forma
pessoal na escrita de teses e dissertações que são apresentadas
à Academia. Nessas, a primeira pessoa do singular se apresenta
no sentido de assumir a produção científica correspondente. Ao
lermos trabalhos apresentados com essa conjugação verbal, podemos ter mais clareza dos posicionamentos dos pesquisadores,
observando-se ainda de forma direta o debate entre quem produz
o texto e as fontes que são utilizadas. Enfim, o autor se apresenta
dando ao trabalho o tom pessoal, assumindo de forma decisiva
suas posições, suas verdades, mesmo sabendo que possam ser
transitórias. Não importa se suas verdades não são irrefutáveis. O
que interessa é o seu posicionamento, pois é a sua pesquisa.
A partir desse ponto, utilizo no presente estudo a primeira pessoa do singular. Acredito que, ao proceder dessa maneira,
assumo responsabilidades ainda maiores perante a comunidade
acadêmica quanto ao posicionamento que faço como pesquisador na elaboração deste texto. Uma justificativa de tal posicionamento refere-se à ligação existente entre a minha atual ocupação
profissional1 e o objeto de minha pesquisa: sou autor de livros
1. Não acredito que a ocupação profissional seja relevante para que a pesquisa seja
mais bem considerada. Considero que tal ocupação tenha sido um dos fatores que
motivaram o presente estudo e, sendo assim, compartilho com o leitor.
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Adilson Longen
didáticos de Matemática e falarei de livros didáticos de Matemática, daí a utilização da primeira pessoa ao ouvir as vozes do
passado, descrevendo, comentando, posicionando e questionando uma parte da história do livro didático de Matemática produzido no Brasil ao longo de aproximadamente quatro décadas
do século XX. Essa fração de nossa história tem início em finais
dos anos 1920, vê passar toda a era Getúlio Vargas e termina às
portas do golpe de 1964.
No presente capítulo, pondero sobre os motivos que me
conduziram à pesquisa, além de evidenciar o tema deste texto,
o objeto de estudo, as fontes que utilizarei para compô-lo, as
minhas hipóteses e questões que coloco como principais motivadoras, bem como as dificuldades observadas que vão desde a
escolha do tema até a elaboração da obra como um todo.
1. Motivos e dúvidas
A escolha de um tema de pesquisa e sua justificação, como
indicam Cardoso e Brignoli (2002)2, pode ter diversos critérios,
entre os quais o interesse pessoal pelo tema, a importância do
tema, a originalidade e a presença de uma documentação disponível a ser utilizada como fonte para o desenvolvimento da pesquisa. Acredito que, quando um pesquisador decide qual será o
seu tema, certamente há, inicialmente, uma motivação pessoal.
Com o avançar do estudo, outras motivações acabam surgindo. A
necessidade de delimitação do problema, as diversas leituras que
são feitas a respeito do tema, o contato com as fontes e o estudo
a respeito do objeto acabam conduzindo o pesquisador a outras
motivações e, muitas vezes, alterando o caminho antes esboçado.
A escolha do tema desta obra surgiu em uma conversa com
o meu orientador Carlos Roberto Vianna: “Já que você é um autor de
livros de Matemática, por que não pesquisar sobre eles? Há um autor para2. Autores do livro Os métodos da história – introdução aos problemas, métodos e técnicas da
história demográfica, econômica e social, editora Graal, 2002.
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naense de livros didáticos de Matemática chamado Algacyr Munhoz Maeder,
você conhece?” Essas teriam sido algumas perguntas que acabaram
me conduzindo à investigação sobre quais seriam esses livros didáticos de Matemática e quem de fato teria sido esse autor paranaense. Assim, após algumas incursões em bibliotecas e sebos
existentes, descobri que já estava envolvido com o tema, mesmo
que ainda não tivesse clareza sobre o que exatamente pesquisar.
O conhecimento a respeito de Maeder3 que acabei tendo,
conforme a necessidade de pesquisar sobre os seus livros, conduziu-me a uma grande curiosidade sobre a sua história de vida.
É um personagem intrigante pela capacidade de gerenciar diversas atividades quase que simultaneamente e pelo interesse que
teve em sua vida com relação a conhecimentos diversos (assim
como escrevia livros de Matemática, proferia palestras sobre a
Teoria da Relatividade, conforme arquivos pessoais da família).
Além de participações em congressos, exerceu diversas funções,
entre as quais destaco: diretor do Gymnasio Paranaense (atual Colégio Estadual do Paraná) de 1928 a 1930; prefeito de Curitiba4
em 1946 (ficou aproximadamente um ano no cargo); reitor da
Universidade Federal do Paraná de 1971 a 1972; e membro5 do
Conselho Federal de Educação.
3. Passo a designar como Maeder o autor Algacyr Munhoz Mäder. Observo que,
na certidão de nascimento, há trema na escrita de seu sobrenome. Nos livros didáticos escritos por ele pela Tipografia João Haupt e Cia., de Curitiba, o nome completo
aparece conforme a certidão de nascimento. Já nos livros produzidos pela Edições
Melhoramentos, de São Paulo, o sobrenome aparece como Maeder. Ao questionar a
filha de Maeder sobre esse fato, ela diz se tratar de um erro cometido pela editora
em São Paulo e que, como saiu dessa forma nos primeiros volumes, preferiram
(autor e editora) não alterar em livros posteriores.
4. Durante seu mandato de prefeito houve a doação de uma grande área, por parte
da prefeitura de Curitiba, para a construção do atual Centro Politécnico da Universidade Federal do Paraná. Conforme decreto-lei número 134 de 21/06/1946: “Fica a
Prefeitura Municipal de Curitiba autorizada a doar um terreno com a área de 500.000
(quinhentos mil) metros quadrados, no Cajuru, a Universidade Federal do Paraná”.
5. Maeder estava em Brasília, exercendo a sua função de conselheiro no Conselho
Federal de Educação, quando não passou bem de saúde. Foi transportado para
Curitiba, aonde veio a falecer no dia 29 de dezembro de 1975.
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Considero que o fato de conhecer um pouco mais sobre a
trajetória6 de Maeder acabou motivando muito o presente estudo, além de proporcionar um emaranhado de dúvidas a respeito do que, de fato, seria a minha pesquisa. Em determinado
momento, confesso, a motivação pessoal pela pesquisa sobre o
livro didático produzido por Maeder cedeu lugar a uma curiosidade em querer contar a história do autor, principalmente pela
quantidade de funções que exerceu, títulos conquistados e palestras proferidas não apenas sobre Matemática, mas sobre Física
e Educação, de um modo geral. O foco começou a ficar difuso.
Comento isso, pois assim como Bloch7, acredito que todo pesquisador em História deva ter uma preocupação em falar de suas
fraquezas, suas dificuldades e suas dúvidas quando na construção do texto.
6. A família de Maeder forneceu uma cópia do curriculum vitae do “Prof. Algacyr
Munhoz Maeder”, a partir do qual faço algumas citações.
7. Marc Bloch é autor de Apologia da história ou o ofício de historiador. É desse livro que
tiro a seguinte lição: “Todo livro de história digno desse nome deveria incluir um
capítulo ou, caso se prefira, inserir nos pontos de reviravolta do desenvolvimento,
uma sequência de parágrafos que se intitularia algo como: ‘Como posso saber o
que vou dizer?’. Estou convencido de que, ao tomar conhecimento dessas confissões, mesmo os leitores que não são do ramo sentiriam um verdadeiro prazer
intelectual. O espetáculo da busca, com seus sucessos e reveses, raramente entedia.
É o tudo pronto que espalha o gelo e o tédio” (Bloch, 2001, p. 83).
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FIGURA 1. FOTOGRAFIAS DE MAEDER EM CINCO MOMENTOS
Um outro ponto que considero como fator de motivação
para o presente estudo foi a busca dos livros didáticos produzidos por Maeder. Como um garimpeiro em busca de suas
preciosidades, encontrar os livros desse autor representou uma
ocupação que alternava momentos de otimismos com outros
de pessimismos. Por mais que existam pessoas exemplarmente
preocupadas com a preservação da memória, particularmente
aquelas que trabalham em bibliotecas, isso não me parece ser suficiente. Encontrar páginas de livros do início do século passado
rasuradas e cortadas é algo comum e, em minha opinião, só não
é pior do que observar que páginas inteiras foram arrancadas.
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