Ações praticadas em disciplina de graduação como elemento motivador Solange dos Santos Nieto (MACKENZIE) [email protected] Célia Mendes Carvalho Lopes (MACKENZIE) [email protected] Alcides Ferreira da Silva (MACKENZIE) [email protected] Resumo: O século XXI é considerado como o início da era do conhecimento. O curso de Engenharia de Produção prioriza em seus profissionais as funções a nível gerencial e de liderança, além das funções técnicas. Neste trabalho apresentamos nossa preocupação com o processo de ensino aprendizagem das disciplinas referentes à área de Matemática, em específico a disciplina de Cálculo Diferencial e Integral IV, deste curso, em que se trabalha o tópico das Equações Diferenciais. Acreditamos que o ensino de Matemática, para o nível superior promove o desenvolvimento do estudante contemporâneo, nesse sentido, sugerimos que o estudo das Equações Diferenciais seja mais orientado para a Modelagem Matemática e menos dependentes de fórmulas. Palavras-chave: Equações Diferenciais; Projetos de Trabalho; Ações Metodológicas. 1. Introdução O mercado de trabalho, para os engenheiros, considerando-se a situação atual, está em plena expansão. Assistimos diariamente nossos alunos sendo requisitados pelo mercado de trabalho sem um amadurecimento necessário, por outro lado o setor das indústrias reclama da falta de profissionais em áreas específicas da engenharia. Sob este cenário o mercado para o engenheiro de produção apresenta-se mais favorável, pois além da sólida formação científica, necessária para todas as áreas da engenharia, também faz parte de sua formação preparar-se para funções de liderança administrativa e gerenciais. A definição clássica da Engenharia de Produção adotada tanto pelo American Institute of Industrial Engineering (A.I.I.E.) como pela Associação Brasileira de Engenharia de Produção (ABEPRO) é: Compete à Engenharia de Produção o projeto, a implantação, a melhoria e a manutenção de sistemas produtivos integrados, envolvendo homens, materiais e equipamentos, especificar, prever e avaliar os resultados obtidos destes sistemas, recorrendo a conhecimentos especializados da matemática, física, ciências sociais, conjuntamente com os princípios e métodos de análise e projeto da engenharia. O Curso de Engenharia de Produção, iniciado em janeiro de 2003, oferecido pela Escola de Engenharia da Universidade Mackenzie, prepara seus alunos para desenvolver as suas atividades profissionais em consonância com as exigências do mercado de trabalho. Preocupados com a concepção trabalhada no processo ensino aprendizagem de matemática de uma forma essencialmente teórica e abstrata e não como uma produção cultural e social, nós, professores do curso de engenharia de produção, estamos trabalhando na disciplina Cálculo Diferencial e Integral IV – no item de Equações Diferenciais – com leis, 1 funções, equações originadas da vida real, da tecnologia, da economia, das necessidades da realidade. Para D’Ambrosio (1986), Talvez mais do que qualquer outra manifestação do conhecimento humano, a matemática seja universal. Assim sendo, permite uma análise crítica sobre seu papel na melhoria da qualidade de vida, com inúmeras interpretações sobre o que representa ciência para o bem-estar do homem. Para Polya (1997), Resolver problemas é a realização específica da inteligência, e a inteligência é o dom específico do homem. A capacidade de contornar um obstáculo, empreender um caminho indireto, onde nenhum caminho direto se apresenta, coloca o ser inteligente acima do estúpido, coloca o homem muito acima dos mais inteligentes animais e homens de talento acima de seus próximos. Diante destas considerações, é fundamental adequar o ensino de matemática para as engenharias. 2. Abordagem do problema Em participações em outros eventos e em conversas com colegas de outras instituições, percebemos que a atuação do docente no Curso de Engenharia, referente ao ensino de Matemática, necessita de um direcionamento metodológico. As afirmações citadas acima de D’Ambrosio e Polya nos mostram que os docentes envolvidos diretamente nesses cursos, em específico na área de Matemática, deveriam trabalhar no sentido de fazer com que o acadêmico desenvolva capacidade de interpretar, analisar e resolver as situações às quais ele enfrentará ao longo de sua vida universitária e profissional. Mas, esta tarefa proposta ao professor, não é fácil. O ensino tradicional em que o conhecimento matemático é fornecido sob regras, técnicas, uso de softwares gera a passividade e a dependência do aluno, inibindo-o a decidir quando necessário. Por outro lado, em discussões com colegas ouvimos que é difícil pedir aos alunos que estudem um assunto nos livros, criando assim independência, autonomia na descoberta. De modo geral, a resposta que ouvimos dos alunos é que “não dá para entender esse livro”. É exatamente neste ponto que gostaríamos de avançar nosso pensamento e lembrarmos-nos de quantas vezes transmitimos assuntos que acompanham nosso dia-a-dia, que assumimos com naturalidade. Para ilustrar vamos citar um exemplo que é muito freqüente para os professores que ministram a teoria de Equações Diferencial. Inicia-se esta teoria com a definição de uma equação diferencial passando em seguida para suas soluções. Exemplo 1 Mostre que a função f(t) = 5.e 2 t é solução da seguinte equação diferencial y ' 2 y 0 . 2 Exemplo 2 Mostre que a função f(t) = 1 t sen (3t ) é solução da seguinte equação diferencial 9 y '' 9 y t . Para o professor que ministra este assunto, estas duas soluções são triviais, pois ele está utilizando um resultado proveniente de um processo que, na maioria das vezes, demorou muitos anos para ser descoberto. Mas, e para o aluno, como convencê-lo? Várias outras situações passam despercebidas em nossa vida, como estas, e, normalmente, nós nunca as questionamos. Nesta situação, sob o ponto de vista pedagógico, estamos simplesmente transmitindo aquilo que vimos sem darmos sua verdadeira compreensão. Contudo, é importante ressaltar que ao pedirmos os alunos testarem a solução fornecida, estamos trabalhando o conceito de equação e do é solução de uma equação e mostrando quais são os tipos de soluções que surgirão à medida que desenvolvermos o assunto. Mas continuamos ensinamos de forma descontextualizada de problemas reais e significativos. Para Bassanezi (2006), A matemática não deve ser considerada importante simplesmente por alguma definição arbitrária ou porque mais tarde ela poderá ser aplicada. Sua importância deve residir no fato de poder ser tão agradável quanto interessante. Nessa nova forma de encarar a matemática, a modelagem – que pode ser tomada tanto como um método científico de pesquisa quanto como uma estratégia de ensino-aprendizagem – tem se mostrado eficaz. A modelagem matemática consiste na arte de transformar problemas da realidade em problemas matemáticos e resolvê-los interpretando suas soluções na linguagem do mundo real. 3. Contribuição para o problema Buscando minimizar os problemas de ensino-aprendizagem, em particular, no estudo das Equações Diferenciais e sabendo que o tema propicia uma abordagem para despertar no aluno a curiosidade e motivação em busca de novos conhecimentos de forma natural e agradável, é que sugerimos que, ao iniciarmos o estudo das Equações Diferenciais, este seja direcionado para situações reais e, quando possível, incentivar o aluno à criação de modelos matemáticos. A Figura 1 ilustra esta prática. Figura 1 – Ciclo de motivação. Fonte: adaptado de Bronson (2008). 3 Exemplo 3 A relação entre o lucro líquido P e as despesas de propaganda x é tal que a taxa de aumento do lucro líquido, à medida que as despesas de propaganda aumentam, é proporcional a uma constante menos o lucro líquido. Ache a relação entre o lucro líquido e as despesas de propaganda se P = P0 quando x = 0. (WEBER, p.460, 1986) dP k.(a P) dx dP k.dx aP ln(a P) k.x C 0 ln(a P) k.x C1 a P e k . x C1 P a C.e k. x Sabendo-se que P = P0 quando x = 0 tem-se: P0 a C.e k.0 P0 a C C a P0 e P a (a P0 ).e k. x Portanto o lucro líquido, sem despesas de propaganda, é P0 e aumenta quando as despesas de propaganda aumentam para um máximo (assintótico) a. Figura 2 – Gráfico de uma aplicação de solução de Equações Diferenciais. Fonte: adaptado de Weber, 1986. Exemplo 4 Resolva a equação dy k.(a y) , a e k constantes com valor inicial y(0) y 0 . dx dy k.(a y ) dx 4 dy k.dx ay ln | a y | k.x C 0 ln | a y | k.x C1 a y e k. x C1 y a C.e k. x para y(0) y 0 y 0 a C C a y 0 e y a (a y 0 ).e k. x Quando, em aula, o Exemplo 4 é fornecido o que se está trabalhando é puramente técnica. No Exemplo 3 apresenta-se o mesmo problema, mas contextualizado. Enquanto o Exemplo 4 é fornecido de forma tradicional, o exemplo 3 proporciona aos alunos oportunidade de levantar questões sobre coisas que parecem intocáveis. A forma de como abordar um problema é que faz a diferença. Exemplo 5 Uma população de protozoário, se desenvolve com uma taxa de crescimento relativo constante de 0,7944 por membro por dia. No dia zero a população consiste em dois membros. Ache o tamanho da população depois de 6 dias. dP 0,7944.P dt dP 0,7944.dt P ln P 0,7944 t C P e 0, 7944 t C P Ae 0,7944 t para t 0 P 2 2 A.e 0 A 2 P 2.e 0,7944 t após 6 dias P 2.e 0,7944.6 P 234 Exemplo 6 Considere o problema de valor inicial dy 0,7944 y com y(0) = 2. Encontre y(6). dt dy 0,7944.y dt 5 dy 0,7944.dt y ln y 0,7944 t C y e 0, 7944 t C y Ae 0,7944 t para t 0 y 2 2 A.e 0 A 2 y 2.e 0,7944 t para t = 6 y 2.e 0,7944.6 y 234 Exemplo 7 Vamos resolver este exemplo utilizando a transformada de Laplace, verifica-se que se trata de um exemplo muito técnico e que o assunto em questão já foi abordado em aula em capítulos anteriores. (OGATA, p.216, 2003) Considere o sistema mecânico mostrado na figura abaixo, onde m = 1kg, b = 3 Ns/m e k = 2 N/m. Suponha que em t = 0 a massa m seja puxada para baixo, de modo que x(0) = 0,1m e x´(0) = 0,05m/s. O deslocamento x(t) é medido a partir da posição de equilíbrio antes que a massa seja puxada para baixo. Obtenha o movimento da massa sujeita à condição inicial. (Considere a inexistência de uma força externa). A equação do sistema é: mx ' ' bx ' kx 0 x ' ' 3x ' 2 x 0 (1) A transformada de Laplace da equação (1) é: s2£ {x(t)} – sx(0) – x´(0) + 3[s£{x(t)} – x(0)] + 2£{x(t)} = 0 (s2 + 3s + 2) £{x(t)} – 0,1s – 0,05 – 3(0,1) = 0 £{x(t)} = 0,1s 0,35 s 2 3s 2 Assim, o deslocamento da massa é dado por 0,1s 0,35 t 2t x(t) = £-1 x(t) = 0,25e 0,15e 2 s 3s 2 6 Exemplo 8 Neste exemplo o assunto é de interesse geral pois trata-se da poluição das águas que pode afetar os organismos aquáticos além dos usuários deste recurso hídrico. (BOYCE, p.5, 2002) Um pequeno lago contém, inicialmente, 1.000.000 de galões de água, e uma quantidade desconhecida de um produto químico indesejável. O lago recebe água contendo 0,01grama dessa substância por galão a uma taxa de 300 galões por minuto. A mistura sai à mesma taxa, de modo que a quantidade de água no lago permanece constante. Suponha que o produto químico está distribuído uniformemente no lago. a) Escreva uma equação diferencial cuja solução é a quantidade de produto químico no lago em um instante qualquer. b) Qual a quantidade do produto químico que estará no lago após um período muito longo de tempo? Essa quantidade limite depende da quantidade presente inicialmente? Solução: a) Considere t: tempo (em horas) Q(t): quantidade do produto químico (em gramas) no tempo t Q´(t) (derivada de Q(t)): fornece a variação da quantidade Q(t) por unidade de tempo Entram 300 galões de água com 0,01grama da substância, ou seja, entram 300x0,01 = 3 g/h da substância. Saem os mesmos 300 galões (só que misturados com a substância), ou seja, saem 300xQ(t)/1.000.000 da substância. A variação da quantidade Q(t) por unidade de tempo é a diferença do que entra com o que sai, ou seja, dQ Q 3Q 300 0,01 300 3 dt 1000000 10000 ou seja, dQ 3Q 3 , cujo fator integrante é dt 10000 3 I( t ) e 1000 dt 3t 1000 e . 3t 3t d 1000 Portanto, e Q 3e 1000 . dt Logo, b) 3t Q( t ) 10000 C e 1000 . Fazendo Q E 10000 gramas . dQ 3Q 3 0 dt 10000 encontramos a solução de equlíbrio Para um período “muito longo” de tempo, tem-se 7 lim Q( t ) lim t t 3 t 1000 10000 C e 10000 Note que esta quantidade limite não depende de C e, portanto, também não depende da quantidade presente inicialmente. 3. Considerações Finais Com base nesses argumentos, podemos elencar algumas variáveis que podem interferir no processo ensino-aprendizagem: interpretação e compreensão na leitura dos problemas formulados, resolução de problemas, projetar um modelo através da aplicação das equações diferenciais pois foge da rotina do ensino tradicional. Para cada um dos exemplos citados poderíamos comentar prós e contras em suas aplicações. Vamos utilizar como referência o Exemplo 8: a) é muito mais fácil pedir ao aluno que resolva uma equação diferencial pronta do que pedir que ele deduza a equação; b) na aula tradicional, o professor é o centro, isto é, ele é o transmissor de conhecimentos. Neste exemplo, o aluno passa a ser o centro, é ele quem vai deduzir a equação para que em seguida encontre a solução; c) a mudança de foco mencionada no item “b” em que o professor passa a ter o papel de orientador, pode causar outros problemas: c1) a aula passa a ser muito mais lenta e existe um programa a ser cumprido; c2) os alunos que não estão conseguindo formular o problema podem perder o interesse e aguardarem a solução de um outro colega ou grupo; c3) os exemplos que escolhemos neste trabalho são de diferentes áreas, o que também pode criar obstáculos ao professor de matemática. Todavia, o registro dessas dificuldades – pouco otimista – têm como objetivo auxiliar o professor a planejar novas estratégias e intervenções pedagógicas. Precisamos nos conscientizar de uma nova realidade, isto é, ensinar conteúdos de matemática relevantes e adequados a cada situação que contribuam para a melhoria da qualidade de nossas vidas. Na definição clássica do Curso de Engenharia de Produção, mencionada na introdução deste trabalho, no que se refere às suas competências são: o projeto, prever e avaliar os resultados, capacidade de liderança, conhecimentos de relações humanas, novas tecnologias, meio ambiente, mercado e finanças. Cabe então aos professores que ministram as disciplinas chamadas de formação básica dos cursos de engenharia capacitar seus alunos a relacionar as situações reais aos conceitos matemáticos, pois talvez esteja nessa relação a competência técnica para o profissional de engenharia. 8 Referências BASSANEZI, C.R.. Ensino-aprendizagem com modelagem matemática: uma nova estratégia. 3 ed. São Paulo: Contexto, 2006. BOYCE, W.; DiPRIMA, R. Equações Diferenciais Elementares e Problemas de Valores de Contorno. Tradução: Valéria de Magalhães Iório. 7 ed. Rio de Janeiro: LTC, 2002. BRONSON, R. Equações diferenciais. Tradução: Fernando Henrique Silveira. 3 ed. Porto Alegre: Bookman, 2008. D’AMBROSIO, U. Da realidade à ação: reflexões sobre a educação e matemática. São Paulo: Summus; Campinas: Ed. Da Universidade Estadual de Campinas, 1986. OGATA, K. Engenharia de Controle Moderno. Tradução: Paulo Alvaro Maya. 4 ed. São Paulo: Prentice Hall, 2003. POLYA, G. Sobre a resolução de problemas de matemática na high school. In: KRULIK, S.; REYS, R. (Org.). A resolução de problemas na matemática escolar. Tradução: Hygino H. Domingues e Olga Corbo. São Paulo: Atual, 1997. WEBER, J.E. Matemática para Economia e Adminstração. Tradução: Seiji Hariki. 2 ed. São Paulo: Harbra, 1986. 9