TRATAMENTO FISIOTERÁPICO NA ESCOLIOSE
Adriane Lopes Alves1
George Schayer Sabino2
Raphael Borges de Oliveira Gomes3
Diogo Carvalho Felício4
RESUMO: Através de uma revisão sistemática, o objetivo do presente trabalho foi buscar informações relativas aos tratamentos fisioterápicos empregados no
manejo da escoliose idiopática. Foram utilizadas as bases de dados: Pubmed, Medline, Bireme, Lilacs, Scielo e PEDro. Foram extraídos de cada estudo dados
sobre: tipo de intervenção, duração da intervenção, características da amostra e alterações no ângulo de Cobb. Foram incluídos no estudo 18 artigos. Em
média ocorreu uma melhora de -6,8° (±5,71º) no ângulo de Cobb. Diversos métodos e técnicas fisioterapêuticas, aparentemente tem o potencial de reduzir a
curvatura escoliótica. São necessários estudos mais elaborados para aumentar a força dessa evidência.
PALAVRAS-CHAVE: Escoliose, Fisioterapia, Reabilitação.
INTRODUÇÃO
musculares no tronco, tornando a muscu­latura do lado côncavo
A escoliose é um desvio postural da coluna vertebral, carac-
retraída, e mais alongada no lado convexo, o que irá caracteri-
terizada por uma curvatura anormal no plano frontal, superior a
zar um problema de disposição muscular, com consequentes
10º, asso­ciada ou não à rotação dos corpos vertebrais nos pla-
sobrecargas assimétricas (KISNER, COLBY, 2005). Isto poderá
nos transverso e sagital (REAMY, SLAKEY, 2001; KANE, 1977).
levar ao aparecimento de outras patologias como a osteoartrite
Esse tipo de alteração na postura da coluna pode ser classi-
(CONOLLY et al, 1998) e a hérnia de disco (PINTO et al, 2002).
ficada em estrutural e não-estrutural. Uma escoliose estrutural
Abrangendo, dessa forma, questões posturais e musculoes-
envolve uma curvatura lateral irreversível com rotação fixa das
queléticas, o tratamento da escoliose idiopática (EI) envolve es-
vértebras. A escoliose não-estrutural, também denominada de
sencialmente procedimentos fisioterápicos. Existem vários méto-
escoliose funcional ou postural, é reversível e pode ser alterada
dos fisioterápicos citados para o trata­mento da escoliose, como:
com mudanças de posição (KISNER, COLBY, 2005).
Reeducação Postural Global (RPG) (SOUCHARD, OLLIER, 2001),
A escoliose está presente em 1 a 3% dos adolescentes,
Isostretching (REDONDO, 2001), Osteopatia (RIBEIRO, 2007),
sendo as meninas as mais afetadas, numa proporção de apro-
Cadeias Muscula­res (BUSQUET, 2001), Pilates (RODRIGUES et
ximadamente 4/1 (VELEZIS et al, 2002). Diversos fatores são
al, 2010), método Klapp (FISCHINGER, 1984), método Schroth
mencionados como possíveis causas para o desenvolvimento
(SCHROTH, 1992) e Mézières (MÉZIÈRES, 1984).
da escoliose (BADARO et al, 1995), entretanto, o tipo mais co-
Entretanto, a conduta de tratamento, ou mesmo a eficácia da
mum na população é a idiopática, aonde a causa é desconheci-
intervenção sobre essa disfunção, ainda são pouco conhecidas
da (STOKES et al, 1998) .
e por vezes muito questionadas (SEGUNDO-MOZO et al, 2009;
A maioria das escolioses idiopáticas adolescente é assin-
ROMANO, NEGRINI, 2008). Dessa forma, o objetivo deste estudo
tomática antes de atingir grandes angulações, normalmente
foi realizar uma busca abrangente na literatura científica atual a
produzindo sintomas acima de 40° Cobb (TORREL et al, 1981).
respeito dos diferentes tipos de tratamentos fisioterápicos empre-
Afetando o sistema musculoesquelético da região torácica, a es-
gados na conduta de pacientes com EI e relatar seus resultados.
coliose, nesses casos mais graves, poderá levar a restrições da
função pulmonar (BADARO et al, 1995).
MATERIAL E MÉTODO
Todavia é importante observar a presença da escoliose pre-
A procura dos artigos foi realizada através das bases de da-
viamente ao aparecimento de sintomas, pois a detecção preco-
dos: Pubmed, Medline, Bireme, Lilacs, Scielo e PEDro em busca
ce irá aumentar em três vezes a chance de sucesso com o tra-
de artigos relacionados ao tratamento fisioterapêutico para a es-
tamento conservador (TORREL et al, 1981). Além disto, mesmo
coliose nos idiomas inglês, português e espanhol. A busca foi feita
assintomática a escoliose poderá alterar a distribuição de forças
a partir da palavra chave: escoliose; combinada com: tratamento
e a atividade muscular na coluna predispondo a seu desgaste
conservador, reabilitação, fisioterapia, reeducação postural global,
precoce (CONOLLY et al, 1998; PINTO et al, 2002). Basicamen-
cadeias musculares, pilates, quiropraxia, manipulação, massagem,
te, a escoliose conduz a desequilíbrios de força e comprimento
mobilização, terapia manual, manipulação terapêutica, osteopatia e
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seus similares na língua inglesa e espanhola, sem restrições quanto
procedimentos a utilização de um grupo controle e um grupo
à data de publicação. Também foram observadas referências bi-
experimental, a alocação de forma aleatória entre os grupos e
bliográficas dos próprios artigos e de livros da área.
que, por fim, relataram o pré e o pós tratamento. Foram conside-
Considerando que o objetivo principal do trabalho foi anali-
rados estudos Quase-experimental os estudos que apresenta-
sar o efeito do tratamento fisioterápico para amenizar ou melhorar
vam grupos de tratamento, mas que não relataram alguma das
de forma conservadora a escoliose, foram excluídos os artigos
características citadas acima. São Estudos de Caso os trabalhos
que abordavam cirurgias e também o uso de coletes, mesmo que
que apresentavam apenas a descrição da intervenção para o
nesses casos tenham sido realizados anteriormente, posterior-
tratamento conservador da escoliose em um ou mais pacientes.
mente ou em conjunto técnicas ou exercícios fisioterápicos.
Dada a heterogeneidade das condições clínicas e das in-
Foram extraídos de cada artigo o tipo de intervenção, o tem-
tervenções observadas nos diversos trabalhos, optou-se por
po de duração da intervenção, as características da amostra e
agrupar seus resultados classificando-os apenas como positivo
os resultados. A fim de padronizar a comparação dos resultados
ou negativo, a partir da melhora ou não do ângulo de Cobb ob-
foi escolhido como desfecho da intervenção a medida do ângu-
servada após a intervenção. Por se tratar de uma medida con-
lo de Cobb. O ângulo de Cobb é uma medida feita através da
tínua e suscetível a erros, só foram consideradas melhoras no
intersecção de linhas traçadas no bordo superior e inferior das
ângulo de Cobb quando a alteração nessa medida foi superior
vértebras limites da curva vertebral (COBB, 1948; DICKSON, LEA-
ao desvio médio das alterações de todos os trabalhos incluídos,
THERMAN, 1998). É um método válido e confiável (GSTOETTNER
ou seja, quando a evolução foi superior à variância da amostra.
et al, 2007) e é o método mais mencionado na literatura para a
avaliação da escoliose. O ângulo de Cobb pode ser utilizado tanto
para documentar a progressão da curva como para selecionar e
avaliar a efetividade de um tra­tamento (CUNHA et al, 2009).
Para comparação metodológica e análise do nível de evidência os artigos foram classificados em Ensaio Clínico Aleatorizado (ECA), Quase-experimental e Estudo de Caso. Foram
classificados como ECA os trabalhos que relatavam em seus
RESULTADOS
A partir da busca pré determinada foram selecionados
18 artigos, dos quais 8 nas línguas inglesa e espanhola e 10
em língua portuguesa, os dados desses artigos encontram-se
expressos nas tabelas 1 e 2.
A classificação dos artigos quanto a seu formato se encontra exposta no Quadro 1.
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A partir dos dados apresentados é possível perceber que a
tivos para o tratamento da escoliose. Cinco estudos (ROWE et
amplitude das variações no ângulo de Cobb foi de uma redução
al, 2006; BORGHI et al, 2008; BONORINO et al, 2007; FREGO-
do ângulo de -18,5º (NEGRINI, A et al, 2008) a um aumento do
NESI et al, 2007; OLIVEIRAS, SOUZA, 2004) não apresentaram
ângulo de +6° (MANHÃES et al, 2009). Em média ocorreu uma
melhoras homogêneas no ângulo de Cobb superior ao desvio
melhora de -6,8° com desvio padrão de ± 5,71º. Cinco estudos
pré determinado e foram assim classificados de forma negativa
não se enquadram nestes resultados citados acima, pois três es-
(sem melhora).
tudos não utilizaram a medida do ângulo de Cobb para avaliar a
Além do ângulo de Cobb, foram avaliados nos artigos: a
efetividade do tratamento (LASLETT, 2009; ARAÚJO et al, 2010;
dor, a flexibilidade, a força e retração muscular, o alinhamento
IUNES et al, 2010); um estudo não relatou os valores do ângulo
das curvas (lordoses e cifoses), o equilíbrio, o ângulo de rotação
de Cobb mesmo citando sua melhora (MANHÃES et al, 2009) e
vertebral, a simetria corporal, a expansibilidade torácica, os sin-
um estudo não relatou os valores do ângulo de Cobb em graus,
tomas respiratórios (dispnéia e infecção de repetição) e a quali-
expressando-o em dados percentuais (NEGRINI, S et al, 2008).
dade de vida, as quais foram observadas para citação, mas não
Oito estudos (BROOKS et al, 2009; NEGRINI, A et al, 2008;
analisadas no presente estudo.
MONSALVE et al, 2007; MORNINGSTAR, WOGGON, LAWREN-
O tempo médio da intervenção nos estudos foi de 21 se-
CE, 2004; MORNINGSTAR, STRAUCHMAN, GILMOUR, 2004;
manas, sendo que 2 estudos (BROOKS et al, 2009; MARQUES,
GESSER et al, 2007; MOLINA, CAMARGO, 2003; MARQUES,
1996) não apresentaram esta informação. O tempo empregado
1996) relataram melhora do ângulo de Cobb maior que 5,71º e
em relação à utilização de cada técnica utilizada se encontra
foram assim classificados como apresentando resultados posi-
descrito na Tabela 3.
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O total de participantes incluídos nos estudos abordados foi
respeito de uma intervenção particular, mas que apresenta um
de 191 indivíduos, destes, 124 são do sexo feminino, sendo que
grau de evidência limitado para extrapolação de seus achados.
2 estudos incluídos não forneceram esta informação (MORNIN-
O grande número de estudo de casos sobre escoliose (9 artigos)
GSTAR, WOGGON, LAWRENCE, 2004; MANHÃES et al, 2009).
catalogados em bases de dados de qualidade (Pubmed, Bireme,
Em 3 estudos a amostra apresenta indivíduos com idade igual
Lilacs, e PEDro), nos mostra que é comum o tratamento fisiote-
ou maior que 40 anos (BROOKS et al, 2009; LASLETT, 2009;
rápico conservador dessa condição e que seus resultados são
MORNINGSTAR, WOGGON, LAWRENCE, 2004). Nos outros 15
promissores, considerando a melhora média dessa condição e
estudos, os indivíduos apresentam idade igual ou menor que 25
que nenhum desses relatou efeitos colaterais ou complicações
anos, sendo que em 10 destes estudos os indivíduos apresen-
significativas. Todavia, para se aumentar a certeza dessa afirma-
tam idade igual ou menor que 18 anos.
ção estudos mais bem elaborados metodologicamente são necessários, e não temos como escapar dessa afirmação. Ou seja,
DISCUSSÃO
pôde-se observar que a escoliose é uma condição presente na
Houve uma melhora média de -6,8° no ângulo de Cobb
clínica de fisioterapia, na qual o tratamento apresenta-se, aparen-
nos estudos selecionados. Tal melhora é superior ao desvio
temente, promissor, apesar de não se ter certeza disso com base
mínimo predeterminado. Todavia, alguns pontos merecem
nos níveis de evidência disponíveis na literatura atual.
ser observados.
Existem diversos tipos de intervenções diferentes que
A inclusão na presente revisão de apenas dois ECAs cor-
podem ser empregadas no tratamento da EI. É possível que
robora com os aspectos previamente discutidos na introdução
uma técnica não seja melhor que outra e elas sejam, sim,
sobre o desconhecimento e, portanto, razoáveis questionamen-
complementares ou específicas para condições diferentes.
tos a respeito do tratamento conservador da escoliose. Todos os
A intenção principal do presente trabalho não foi determinar
tipos de estudo têm sua importância literária, todavia, determi-
qual seria a técnica mais eficiente ou não, e sim averiguar
nadas metodologias são mais apropriadas para se determinar a
quais seriam as diversas possibilidades descritas na literatura
real eficácia de uma intervenção, como no caso dos ECAs.
para lidar com a EI. Dessa maneira, segue abaixo (Tabela 4)
O trabalho atual não se ateve à seleção de ECAs apenas. Ao
uma descrição sucinta para elucidar a respeito das diversas
incluir diversos tipos de trabalhos (como os estudos de caso), o
técnicas catalogadas. O leitor que se interessar por determi-
presente estudo optou por considerar todas as evidências dis-
nada técnica deve buscar livros específicos sobre tal forma de
poníveis. Estudo de caso é um tipo de intervenção importante,
intervenção, bem como os artigos referenciados no presente
a qual norteia o profissional, pois aborda aspectos específicos a
trabalho.
PÓS EM REVISTA l 279
O tempo médio da intervenção fisioterápica analisada nos es-
da amostra) e cinco artigos foram classificados como negativos
tudos foi de 21 semanas, sendo que um estudo (MANHÃES et al,
ou sem alteração (38% da amostra), o que nos indica que o tra-
2009) realizou a intervenção por apenas 4 semanas e três estudos
tamento fisioterapêutico para a EI é próspero, mesmo levando
(NEGRINI, S et al, 2008; NEGRINI, A et al, 2008; FREGONESI et
em consideração para essa classificação índices conservadores
al, 2007) apresentaram o tempo máximo de intervenção entre os
como a variância da amostra.
artigos selecionados, totalizando 48 semanas de intervenção (um
A opção do presente trabalho de selecionar apenas a medi-
ano). Vale observar que, para que a melhora da condição mus-
da do ângulo de Cobb também pode ser considerada distinta e,
culoesquelética se mantenha após o tratamento, é necessário
portanto, polêmica. Essa opção teve como propósito certificar-
que o paciente mantenha bons hábitos de vida e, recomenda-se,
-se, através de uma medida precisa, a real evolução do trata-
também, que ele continue sendo acompanhado periodicamente.
mento. Essa opção acarretou a ausência da análise de alguns
Os artigos estudados apresentam em sua amostra 65% de
dados importantes apresentados nos estudos. Todavia, mesmo
indivíduos do sexo feminino e 71% com idade igual ou menor
sem explicitar seus resultados, os estudos foram incluídos para
que 18 anos, demonstrando coerência quanto à seleção da
que sua forma de intervenção fosse apresentada e divulgada.
amostra a partir da prevalência dessa condição na população
Os autores do presente trabalho não preconizam a obrigatorie-
(VELEZIS et al, 2002).
dade do uso do ângulo de Cobb para o acompanhamento tera-
Este estudo apresentou 18 artigos sendo que 5 destes não
pêutico da EI, porém é importante ressaltar que quaisquer que
apresentaram resultados numéricos em graus quanto ao ângulo
sejam as medidas empregadas elas deverão ser confiáveis e
de Cobb, restando 13 artigos que contém esta informação. Oito
válidas, sob risco de colocar em dúvida todas as conclusões a
artigos foram classificados como tendo resultado positivo (62%
respeito de um tratamento.
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CONCLUSÃO
Diversos métodos e técnicas fisioterapêuticas, mesmo
sem estarem associadas ao uso de coletes ou a realização
de procedimentos cirúrgicos, podem reduzir a curvatura da
escoliose idiopática. Porém, são necessários estudos com
desenhos metodológicos mais elaborados para aumentar a
força dessa afirmação.
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NOTAS DE RODAPÉ
1 Discente de Fisioterapia da Faculdade Pitágoras Betim. Email: [email protected]
2 Mestre em Ciências da Reabilitação pela UFMG. Docente da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais e do Centro Universitário
Newton Paiva. Email: [email protected]
3 Fisioterapeuta especialista em Ortopedia e Esportes. Docente de Fisioterapia da Faculdade Pitágoras Betim. Email: raphaborges82@yahoo.
com.br
4 Mestrando em Ciências da Reabilitação pela UFMG. Docente Faculdade Pitágoras Betim. Email: [email protected]
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