Janeiro foi uma amostra da volatilidade que marcará 2010 As economias mundial e brasileira deverão ter um bom ano. Provavelmente será confirmada a retomada em escala global, deixando para trás as dúvidas sobre depressão e recessão. A discussão a partir de agora é mais positiva e está centrada no fôlego do crescimento. Esse poderia ser um sinal bom também para os mercados financeiros. Mas, infelizmente, não deve ser o caso. Há motivos para que o ano traga muita volatilidade. É natural que processos de valorização de ativos sejam pontuados por realizações periódicas de lucros. Desde março de 2009, houve pelo menos quatro momentos em que as bolsas norte-americanas mostraram quedas temporárias. Janeiro não foi diferente. Essa realização veio após um longo período de ganhos e em um momento sazonalmente desfavorável - o início do ano historicamente não é bom para a bolsa dos Estados Unidos. Além disso, alguns eventos como a política monetária na China, dificuldades na Europa e regulação bancária nos Estados Unidos foram usados como gatilho e refletem um ambiente de incertezas ainda elevadas. Não há, de fato, indicadores que mostrem uma piora inequívoca dos fundamentos globais, revertendo o ciclo de otimismo vivido até aqui. Esse, no entanto, não é o ponto mais importante quando se olha 2010. É provável alguma frustração de investidores, mesmo com a retomada global. Após os preços dos ativos terem incorporado o cenário de recuperação, novas valorizações dependem do ritmo e força do crescimento a partir de agora. O perigo, nesse caso, está no otimismo. Vale lembrar que o mercado de trabalho deve mostrar recuperação nos Estados Unidos, mas isso não implica aumento de renda. Indica apenas que o pior já passou. Da mesma forma, não parece razoável supor que ocorra uma rápida recuperação do crédito nas economias desenvolvidas. Sem renda e crédito, sobra o efeito estatístico e os gastos do governo para impulsionar os números de PIB. Ou seja, apesar do alívio global, o cenário de recuperação é arriscado demais para se manter o otimismo vigente nos mercados. Outra fonte de incertezas é a reorientação de política econômica. Ainda que a recuperação em curso seja tímida e cercada de dúvidas, o tamanho dos estímulos fiscais e monetários terá de ser revisto. No caso fiscal, os eventos recentes na Grécia mostram quão sensíveis estão os participantes de mercado com as trajetórias explosivas de dívida. Isso reforça a visão de que a magnitude corrente dos incentivos não se sustenta. Na área monetária, da mesma forma, taxas de juros historicamente baixas não parecem mais compatíveis com a presente recuperação. Adicione-se a isso o medo global com o surgimento de novas bolhas, dada a liquidez excessiva. Faz sentido, portanto, que o Federal Reserve inicie um processo gradual de normalização da política monetária, com os juros correntes voltando lentamente a seus patamares históricos. Historicamente, reorientações de políticas não costumam ser neutras para os preços de ativos. Uma alta da taxa de juros nos Estados Unidos, em especial, implicará uma reorientação de carteiras, afetando de maneira direta os mercados de juros, moeda e bolsa. Reforçará, além disso, as preocupações mencionadas quanto ao fôlego da retomada. O mercado brasileiro deverá ser amplamente dominado por essas questões globais, mas com um ingrediente local: o ciclo político. Há incentivos para que as eleições não mudem o regime econômico. Além de a agenda macroeconômica - baseada em superávits fiscais, câmbio flexível e metas de inflação - estar socialmente consolidada, há a percepção de que responsabilidade econômica conduz a um maior crescimento e, portanto, favorece a popularidade do presidente. Mas o discurso de certos partidos faz com que o mercado financeiro - por dever de ofício - considere alguma probabilidade de ruptura econômica. Somando, portanto, as dúvidas quanto à força do crescimento global, as incertezas que normalmente acompanham as mudanças de orientação de política e o ciclo político no Brasil é natural que 2010 seja um ano de volatilidade, mesmo em um ambiente macroeconômico bem melhor que o do ano passado. Neste caso, é razoável que a tendência dos preços dos ativos seja de valorização ao longo do ano, mas com muitas surpresas pelo caminho. Janeiro foi uma boa amostra. Roberto Padovani - Estrategista-chefe do Banco WestLB. Artigo publicado no jornal Valor Econômico em 09/02/10.