Mecânica Quântica I Ano lectivo 2008/2009 Semestre ímpar Docente: Alfred Stadler Slides 1 Departamento de Física da Universidade de Évora A equação de Schrödinger Comparação de descrição clássica e quântica: Consideremos o movimento duma partícula (massa m) a uma dimensão (variáveis x, t) num campo de força F(x,t) ∂V ( x, t ) F ( x, t ) = − ∂x função da energia potencial (“o potencial”) Mecânica Clássica: determinar x(t) ! (contem toda a informação) Uma vez conhecida a função x(t), podemos calcular qualquer outra grandeza que interessa: velocidade momento linear energia cinética v(t ) = dx(t ) dt Como obter x(t)? Resolver a equação de Newton! p(t ) = m dx(t ) dt F = ma = mx(t ) dx d 2x Notação: x ≡ , x ≡ 2 dt dt T= 1 dx(t ) m 2 dt x(t ) = etc. 2 F ( x, t ) m Equação diferencial (2ª ordem) Mecânica Quântica: determinar Ψ ( x, t ) ! (contem toda a informação) a “função de onda” Como determinar Ψ ( x, t ) ? Resolver a equação de Schrödinger! (Faz o papél da equação de Newton) h … constante de Planck Equação diferencial 1ª ordem em t 2ª ordem em x Ψ ( x, t ) uma vez conhecido para um instante t determinado para todos os t Sabemos o que significa x(t) Mas o que significa Ψ ( x, t ) ??? A interpretação estatística da função de onda partícula – localizada onda – espalhada como pode uma onda representar uma partícula? Interpretação de Max Born: a probabilidade de encontrar a partícula, no instante t, entre x=a e x=b Ψ ∈C 2 Ψ ∈R muito provável pouco provável Há um elemento de indeterminação (ausente da Mecânica Clássica): Ψ contem toda a informação sobre o sistema, mas não permite prevêr o resultado de uma experiência (medição) com certeza. Ψ permite fazer previsões probabilísticas para uma (1) experiência (medições), ou previsões estatísticas para um número elevado de experiências idênticas Exemplo concreto: medição da posição da partícula dá x=C Pergunta: onde é que a partícula estava imediatamente antes da medição? Existem várias interpretações da MQ, com respostas diferentes • A interpretação realista: (Einstein,...) a partícula estava em C já antes da medição (mas não sabíamos) → a MQ é uma teoria incompleta! Para completar: “hidden variable theories” • A interpretação ortodoxa (interpretação de Copenhaga): (Bohr,...) a partícula não estava em lado nenhum! A medição “forçou a partícula decidir” • A “interpretação” agnóstica: recusa dar resposta! A pergunta não faz sentido... (como podemos saber se a resposta está certa ou não antes da medição? Metafísica!) ...e muitas outras... • A desigualdade de Bell • John Stuart Bell (1964) descobriu que faz uma diferença observável se a partícula tenha uma determinada posição antes da medição ou não! (elimina a posição agnóstica) (É preciso saber mais da MQ para compreender o argumento de Bell → fica para mais tarde...) • A experiência confirmou a posição ortodoxa (de Copenhaga) da MQ, e excluiu o realismo de Einstein! (Bem, há sempre uma saida: ainda possíveis são teorias não locais com “hidden variables”, por exemplo a teoria de David Bohm. E há outras: “many worlds interpretation”, …) • O que é que se obtem duma segunda medição imediatamente após ter encontrada a partícula na posição x=C ? Aqui não há interpretações diferentes: outra vez em C (sem incerteza!) O “colapso” da função de onda Antes da medição de x o processo da medição altera a função de onda Após a medição de x Dois regimes da evolução da função de onda: • regime “normal”: Ψ evolui de acordo com a equação de Schrödinger • regime de medição: colapso (discontínuo e instantâneo) de Ψ Elementos de probabilidade e estatística 1. Variáveis discretas Exemplo: determinar idades de pessoas numa sala o resultado: número de pessoas com idade j anos Histograma N(outros j)=0 Distribuição das idades número total de pessoas Informação na distribuição • Probabilidade de obter a idade j quando uma pessoa é escolhida ao acaso Por exemplo: Probabilidade de obter ou 15 ou 16 anos = Probabilidade de obter qualquer idade = (normalização) • Qual é a idade mais provável? R: o j para o qual P(j) = máximo • A mediana: No exemplo: 25 No exemplo: 23 • A média: No exemplo: Em MQ, a média é também chamada valor esperado ou valor espectável (“expectation value”) • A média dos quadrados: Atenção: em geral • A média de uma função de j: Nota: a média (ou o mediano) não tem de ser um resultado possível • A variância e o desvio padrão: duas distribuições com a mesma mediana, a mesma média, e o mesmo valor mais provável Como medir a diferênça das distribuições? Mais plausível: considerar os valores de mas não funciona: Melhor: variância desvio padrão Útil para o cálculo na prática: 2. Variáveis contínuas Agora podemos generalizar o exemplo sobre as idades de pessoas: uma idade (i.e., um intervalo de tempo) varia na verdade continuamente • Escolher uma pessoa aleatoriamente. Q: qual é a probabilidade de ela ter exactamente 22 anos 3 meses 20 dias 6 horas 33 minutos e 24,33333333333… segundos ? R: É zero. (a Q não faz sentido assim) • Q: qual é a probabilidade de ela ter uma idade entre 22 e 23 anos (ou entre 22,2345 e 22,2346 anos, etc.) intervalo suficientemente pequeno → probabilidade é proporcional ao intervalo (= prob. constante no intervalo) probabilidade dum valor escolhido aleatoriamente cair entre x e x+dx = densidade de probabilidade às vezes simples mas incorrectamente “a probabilidade de x” intervalo infinitesimal Generalização das regras de distribuições discretas para contínuas: probabilidade de x entre a e b normalização média de x média duma função de x variância de x Normalização da função de onda é a densidade de probabilidade uma condição necessária para a interpretação estatística É compatível com a equação de Schrödinger? ∀Ψ(x,t) solução → AΨ(x,t) também é solução • Escolher A assim que a condição de normalização está satisfeita (“normalizar a função de onda”) Caso que não existe factor A para normalizar Ψ(x,t) i.e., a função de onde não é normalizável ou Ψ(x,t) tem de ser “de quadrado sumável” Uma vez Ψ é normalizada para t=0, temos de normalizar para outros t também? derivada parcial Da equação de Schrödinger diferenciação dum produto e da equação conjugada substituir e então mas (senão, Ψ não seria normalizável) a normalização mantem-se! Momento linear Partícula no estado Ψ valor médio da posição Significa: a média de medições de x num ensemble de um grande número de sistemas identicamente preparadas (o mesmo Ψ) (1 medição por sistema) Não significa: a média de um grande número de medições repetidas de x no mesmo sistema (a primeira medição já altera a função de onda!) muda com o tempo, porque Ψ depende de t integração por partes dá mais uma integração por partes dá termo igual ao primeiro O resultado é O que significa? Não é o mesmo que a velocidade da partícula! Para já, um postulado: é a média da velocidade (demonstração mais tarde) Mais utilizado é o momento linear: Como definir “velocidade” em MQ? A partícula nem tem uma posição bem definida (antes da medição)! Podemos escrever os valores espectáveis da posição e do momento linear numa forma mais sugestiva: operador da posição operador do momento linear A estrutura é sempre: uma “sandes” dum operador entre Ψ* e Ψ Operador: uma instrucção – “faça qualquer coisa com Ψ” Todos os outros operadores (clássicos) podem ser exprimidos em termos da posição e do momento linear. Por exemplo: Valor espectável da energia cinética: O princípio de incerteza Onde é que está esta onda: (mas λ rel. bem definido) Qual é o comprimento de onda: (mas a posição rel. bem definida) Vale para todos os fenómenos ondulatórios: ou a posição ou o comprimento de onda está bem definido, mas não os dois simultaneamente. (→ análise de Fourier para demonstração) de Broglie: relacionado com o comprimento de onda de Ψ incerteza em λ → incerteza em p (σp … desvio padrão de p) Quantitativamente: o princípio de incerteza de Heisenberg (demonstração mais tarde) Cuidado com a interpretação! • Uma medição de x ou de p num sistema dá um único resultado bem definido • Medições de x ou de p em outros sistemas identicamente preparados (i.e., com o mesmo Ψ) em geral não dão o mesmo resultado ∀σx e σp referem-se à distribuição das medições num ensemble de sistemas, cada sistema descrito por Ψ ∀σx pequeno → σp grande, e vice versa • não há limite superior para as incertezas A equação de Schrödinger independente do tempo 1. Estados estacionários Como determinar Ψ(x,t) ? Admita que V=V(x) parece muito restritivo, mas a partir destas soluções é possível construir as soluções gerais Procurar soluções da forma (separação de variáveis) Equação de Schrödinger: dividir por depende só de t depende só de x É possível satisfazer esta equação para todos os x e t só quando ambos os lados da equação são constantes Equação de Schrödinger independente do tempo solução geral (constante multiplicativa absorver em ψ) Porque soluções separáveis? Não todas as soluções são desta forma… (1) Soluções da forma representam estados estacionários depende de t não depende de t valores espectáveis também não dependem de t i.e, são constantes é constante, “nada acontece” em estados estacionários A dependência de t desaparece → podemos deixar fora o factor e usar em vez de Muitas vezes chama-se correcto sem o factor a função de onda, embora não é rigorosamente (2) Soluções da forma têm uma energia total bem definida Hamiltoniano (Mecânica Clássica) substituição “canónica” operador Hamiltoniano Com isso, a equação de Schrödinger independente do tempo pode ser escrita como: Valor espectável da energia total Também e a variância de H não há incerteza! Todas as medição da energia total resultam no mesmo resultado E (3) A solução geral é uma combinação linear de soluções separáveis Soluções da Eq. de Schrödinger indep. de t: Constantes de separação associadas: número infinito para cada energia possível há uma função de onda Importante: cada combinação linear de soluções é outra solução da Eq.Schr. das soluções separáveis podemos construir soluções mais gerais Qualquer solução da Eq.Schr. pode ser escrita desta forma! O problema consiste em encontrar as constantes cn de maneira que a função de onda Ψ(x,t) satisfaz as condições iniciais ou as condições de fronteira apropriadas Estratégia para o problema genérico • Dados são um potencial V(x) e uma função de onda inicial Ψ(x,0); Procura-se Ψ(x,t) para t > 0 • Resolva-se primeiro a Eq.Schr. indep. do tempo → e energias • Para reproduzir Ψ(x,0) determina-se a combinação linear • Para construir Ψ(x,t) multiplicam-se os respectivos factores da dependência do tempo é sempre possível encontrar estes cn’s! As soluções separáveis representam estados estacionários, mas a solução geral não é estacionária (em geral, depende de t)