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II Congresso Nacional de Formação de Professores
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Trabalho Completo
A PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO DO TUTOR VIRTUAL EM UMA PERSPECTIVA
NEOLIBERAL
Rita De Cássia Guedes De Brito, Elisabete Da Silva Dutra
Eixo 8 - Educação a distância na formação de professores
- Relato de Pesquisa - Apresentação Oral
A partir uma revisão bibliográfica foi possível construir esse texto com vários enfoques sobre
a discussão do trabalho do tutor virtual, que atua na Educação a Distância (EAD) e que
exerce a docência, tendo atribuições de professor. A utilização dessa metodologia é
pertinente, pois, através dela é possível uma análise sobre o que já foi produzido
relacionado a esse tema e assim permitir uma nova sugestão de encaminhamento da
questão. O tutor virtual na modalidade de ensino a distância está vinculado a uma maior
precarização do trabalho, isso constatado a partir de estudos que relatam como ele vem
sendo submetido à condições de trabalho incompatíveis com a docência como profissão,
que são, por muitas vezes precárias e que podem ser expressas também em relação à sua
remuneração, ausência de vínculo com a instituição a qual trabalha e falta de direitos
trabalhistas. Sem pretensão de esgotar o tema, procurou-se nesta reflexão destacar a
precarização das relações de trabalho na EAD, em especial do tutor virtual, frente às
interferências e implicações do neoliberalismo na política educacional do país. As reflexões
aqui apresentadas sugerem a necessidade do debate e da criação de uma regulamentação
específica das condições de trabalho docente - tutor virtual que é foco desse texto- que atua
na Educação a Distância da Universidade Aberta do Brasil (UAB). Palavras-chave:
educação a distância; neoliberalismo; tutor virtual
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Ficha Catalográfica
A PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO DO TUTOR VIRTUAL EM UMA
PERSPECTIVA NEOLIBERAL
Elisabete da Silva Dutra. UCP; Rita de Cássia Guedes de Brito. UFJF.
Introdução
A Educação a Distância no Brasil (EaD) não é um tema novo, mas tendo em vista o
grande avanço tecnológico nas últimas décadas, especificamente a partir da década de
90. Após a propagação da internet, da educação continuada, da política de inclusão
digital e social a partir de incentivos do governo federal, a EaD reaparece como
possibilidade de democratização do conhecimento.
Nessa direção, a Educação a distância é definida como uma modalidade
educacional na qual a “mediação didático-pedagógica no processo de construção dos
conhecimentos ocorre com a utilização de meios e tecnologias de informação e
comunicação, com alunos e professores desenvolvendo atividades educativas em
lugares ou tempos diversos” (BRASIL, 2007, p.21). Além disso, é necessário ressaltar
que a tutoria a distância e presencial desempenha um papel fundamental no processo de
aprendizagem de cursos superiores a distância.
Nessa modalidade de ensino, um aspecto relevante que merece ser destacado é a
precarização do trabalho do tutor virtual, objeto das reflexões deste trabalho. Este
desempenha o papel de docente na Educação a Distância na Universidade Aberta do
Brasil (UAB). Para compreender o processo de precarização do trabalho do tutor virtual,
fez-se necessário tornar mais clara a definição de EAD e o cenário educacional do país a
partir da década de 90 onde ela encontra-se inserida sob as influências do ideário
neoliberal. Em seguida, procura-se contextualizar o tutor virtual na modalidade EAD.
1-
A EAD no sistema educacional
Os primeiros marcos regulatórios da EaD no Brasil são a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação - LDB (Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996), o Decreto nº 2.494, de 11
de fevereiro de 1998, e a Portaria Ministerial nº 301, de 7 de abril de 1998.
1
11594
Atualmente o Decreto nº 5.622 de 19 de dezembro de 2005 (BRASIL, 2005) nos
fornece uma serie de definições que elucidam o atual cenário da EaD no Brasil. A EaD é
definida como “modalidade educacional na qual a mediação didático-pedagógica nos
processos de ensino e aprendizagem ocorre com a utilização de meios e tecnologias de
informação e comunicação [...]” (BRASIL,2005). Ele ainda regulamenta o artigo 80 da
LDB e revoga os Decretos 2.494/98 e 2.561/98. Além disso, traz que a EAD poderá ser
ofertada nos níveis e modalidades educacionais: educação básica, educação de jovens e
adultos, educação especial, educação profissional, educação superior (graduação,
especialização, mestrado e doutorado). Este decreto explicita também a necessidade dos
professores utilizarem à mediação pedagógica nos processos de aprendizagem, como
também, a interação nos ambientes virtuais de aprendizagem.
A formação de professores e a EAD estão contempladas de forma ampla na
LDB/1996. Em seu artigo 62, a LDB deixa claro que a “formação de docentes para atuar
na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação
plena [...]”. A Educação a Distância, no sistema educacional é definida nos seguintes
termos: “O Poder Público incentivará o desenvolvimento e a veiculação de programas de
ensino a distância, em todos os níveis e modalidades de ensino e educação continuada”
(art.80). Sendo assim, este artigo consolida o primeiro passo de inserção da EAD no
sistema educacional brasileiro.
Pode-se verificar que o estudo da educação na modalidade a distância constitui
uma tendência das políticas públicas contemporâneas, como objeto de investigação tanto
para os sistemas políticos econômicos quanto para os sistemas educativos e sociais.
Com a homologação da Portaria 2.253/2001 do MEC que foi substituída pela
Portaria 4.059/2004 foi oficializada a oferta de até 20% de disciplinas, na modalidade
semipresencial, nos cursos regulares das Instituições de Ensino Superior (IES). De
acordo com Segenreich (2006, p. 03) “a substituição de uma Portaria pela outra implicou,
por um lado, em definições mais específicas e uma clara opção pela alternativa
semipresencial, avaliações presenciais e presença de tutores qualificados”. Nessa
mesma Portaria, podemos também verificar a concepção de tutoria para os cursos de
formação de professores.
§ Único. Para os fins desta Portaria, entende-se que a tutoria das
disciplinas ofertadas na modalidade semi-presencial implica na
existência de docentes qualificados em nível compatível ao previsto no
projeto pedagógico do curso, com carga horária específica para os
momentos presenciais e os momentos a distância.
2
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Pode-se corroborar que a atividade do tutor deverá ser exercida por docentes
qualificados em nível compatível ao previsto no projeto pedagógico do curso e que isso
se remete a qualidade de ensino ministrado por este tutor.
Em relação à qualidade da educação, faz-se necessário refletir sobre as
interferências, as implicações do capitalismo, suas repercussões no aparelho estatal e o
impacto dessas ações no contexto educacional, especificamente, na modalidade de
ensino a distância.
No cenário brasileiro educacional, podemos perceber os efeitos da política
neoliberal a partir da década de 1990, período caracterizado pelo modelo gerencial que
visa o atendimento a lógica do mercado competitivo e empresarial. Este projeto neoliberal
de sociedade e educação transforma as políticas educacionais, provocando a dicotomia
entre uma educação para cidadania e a formação científica. Além disso, o Estado exige
maior eficiência, eficácia e produtividade na condução das políticas, sobretudo as
políticas sociais a partir dos critérios estabelecidos pelos setores privados, prevalecendo
os interesses da classe burguesa.
É importante registrar que alguns autores apresentam trabalhos críticos em relação
à modalidade de ensino a distância. Destacamos Lima (2004), que analisa os principais
elementos das políticas promovidas pelos órgãos internacionais do capital, como a
Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura/UNESCO e o
Banco Mundial. Para essa autora, o incentivo à Educação a Distância, impulsionada pelo
desenvolvimento das inovações tecnológicas vem sendo um aspecto fundamental do
crescimento do empresariado na educação do país. Nessa direção, Lima (2004, p. 02)
aponta que
É neste contexto, marcado pelo processo de mundialização do capital,
do papel central exercido pelos estados nacionais e pelas inovações
tecnológicas, que se apresenta no Brasil o discurso sobre a utilização
das novas tecnologias como via de “democratização” da educação, que
atravessou o Governo neoliberal de FHC e, não somente permanece,
mas se aprofunda no Governo “neoliberal requentado” de Lula da Silva.
Nessa direção, o governo do presidente Lula implementou a mesma pauta
apresentada pelas agências internacionais na qual se torna clara sua articulação com um
mercado educativo global, tendo como uma das principais estratégias a “abertura do
setor educacional, especialmente da educação superior, para a participação das
empresas e grupos estrangeiros, através da educação superior a distância” (LIMA, 2004,
p.4).
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11596
Desta forma, destaca-se sobretudo do Banco Mundial e a Organização das Nações
Unidas para a Educação e Ciência e Cultura (UNESCO) como agentes influentes nos
aspectos
educacionais,
culturais,
econômicos
e
políticos.
Estes
organismos
estabeleceram uma relação entre a qualidade da educação e a formação de professores.
O sentido empresarial de qualidade passa a influenciar a gestão da educação como
modelo a ser seguido para alcançar a qualidade do ensino público. Assim, de acordo com
Oliveira (2011, p.94)
A educação orientada principalmente pelo BM e pela UNESCO, teve um
papel fundamental na formação do novo intelectual urbano-o professorresponsável, na escola, pela difusão dos novos modos de ser, pensar e
agir. A formação de professores tornou-se estratégia para garantir tanto
a formação da cultura cívica quanto para capacitar os trabalhadores. A
EAD e a formação em serviço consolidam-se como estratégias
fundamentais para a formação de professores.
É importante destacar que todo esse contexto político que influencia a educação de
modo geral, também tem influenciado de forma específica a EAD e suas relações de
trabalho, como a precarização do trabalho do tutor, ausência de direitos trabalhistas e a
fragmentação do trabalho pedagógico.
2-
O tutor virtual no contexto da EAD
O Ministério da Educação, em 2007, apresentou um documento denominado
Referenciais de Qualidade para a Educação Superior a Distância, elaborado a partir de
discussões realizadas por especialistas e pela sociedade em geral. Neste documento,
são definidos princípios, diretrizes e critérios a serem observados como referenciais de
qualidade para as instituições que ofereçam cursos nessa modalidade. Embora esse
documento não tenha força de lei, ele serve como norteador para subsidiar atos legais do
poder público no que se referem aos processos específicos de regulação, supervisão e
avaliação da modalidade citada.
De acordo com o documento Referencial de Qualidade para a Educação Superior a
Distância, a tutoria exerce papel essencial no processo educacional dos cursos
superiores a distância, uma vez que as atividades desenvolvidas a distância e
presencialmente contribuem para o desenvolvimento dos processos de ensino e de
aprendizagem, acompanhamento a avaliação do projeto pedagógico. Dessa forma, o
tutor participa efetivamente da prática pedagógica.
4
11597
A tutoria a distância atua a partir da instituição, mediando o processo
pedagógico junto a estudantes geograficamente distantes, e
referenciados aos pólos descentralizados de apoio presencial. Sua
principal atribuição deste profissional é o esclarecimento de dúvidas
através fóruns de discussão pela Internet, pelo telefone, participação em
videoconferências, entre outros, de acordo com o projeto pedagógico. O
tutor a distância tem também a responsabilidade de promover espaços
de construção coletiva de conhecimento, selecionar material de apoio e
sustentação teórica aos conteúdos e, freqüentemente, faz parte de suas
atribuições participar dos processos avaliativos de ensino-aprendizagem,
junto com os docentes (BRASIL, 2007, p.21).
Dessa forma, a relação didático-pedagógica se constitui com dois atores
fundamentais na EAD: o professor responsável pela disciplina e elaboração do material
didático e o tutor virtual que acompanha diretamente os alunos, sendo responsável
também por mediar a relação professores e alunos.
Segundo Pimentel (apud Barbosa, 2006) o tutor, na quase totalidade de modelos de
educação a distância, é o elemento essencial quando se pensa na
estruturação do
sistema de EaD que organizará o desenvolvimento de cursos. Ele fecha o ciclo e compõe
a tríade (professor, alunos e tutor) como um dos sujeitos responsáveis pelo processo de
ensino e de aprendizagem, considerando-se, que na Educação a Distância o
acompanhamento pedagógico se constitui como um sistema, um processo, e não de
forma isolada dada por um único ator.
Conforme propõe Gonzalez (2005), o tutor é responsável por mediar todo o
desenvolvimento do curso. Além disso, ele deve responder aos questionamentos dos
alunos no que diz respeito ao conteúdo da disciplina ofertada, como também, mediar a
participação nos chats, fóruns, estimulá-los à participação, cumprir suas tarefas e avaliar
a participação de cada um. Dessa forma, espera-se que o tutor, além de domínio da
política educativa da instituição na qual trabalha e conhecimento atualizado das
disciplinas de sua responsabilidade, exerça uma atuação pedagógica adequada no
processo de ensino e aprendizagem.
Faz-se necessário enfatizar que o tutor enfrenta também dificuldades com relação à
administração da flexibilização tempo e espaço no contexto da vida particular, pois esse
tempo e espaço de lazer transformam-se em horário de trabalho no ambiente virtual de
aprendizagem. Assim, o acompanhamento de um curso online requer do tutor
disponibilidade de tempo para acompanhamento das tarefas do aluno no ambiente virtual
de aprendizagem, mediações nos fóruns, leituras do material, devolutivas das tarefas e,
sobretudo, a busca de estratégias para que o aluno se envolva efetivamente no curso
evitando assim o abandono do mesmo.
5
11598
É oportuno trazer outra questão recorrente na EAD que é a formação do professor
com perfil coletivo, denominado polidocente. Esta polidocência, de acordo com Mill
(2010), se refere ao coletivo de trabalhadores que tem funções e formação diversas
(tutor,
professor-conteudista,
professor
formador
etc),
sendo
responsável
pela
aprendizagem e tendo em seu contexto várias implicações positivas ou não. Dentre estas
implicações, há um aspecto fundamental que deve ser considerado: a precarização das
relações trabalhistas, incluindo o trabalho do tutor virtual.
Nessa direção, existem riscos trabalhistas que envolvem os programas em EAD
tais como: o aumento da carga de trabalho dos docentes, as novas exigências impostas
pelo uso das tecnologias digitais, o empobrecimento da mediação pedagógica por meio
da atuação da tutoria, precarização do trabalho em termos de condições de trabalhos,
entre outros.
De acordo com Mill (2010), na literatura existente há uma confirmação de que na
EAD os aspectos de desvalorização do trabalhador configuram-se em maiores
proporções devido à insegurança, à intensificação e à precarização do trabalho docente.
Neste sentido, o professor é afetado, como profissional, por um processo de
proletarização, fragmentação e divisão do espaço de trabalho.
Assim, a EAD reflete a visão capitalista do processo, uma vez que tem também
como objetivo a racionalização do trabalho pedagógico. Na mesma direção, Belloni
(2001, p.81) aponta que
Considerando que, de modo geral, os sistemas de EAD lidam com
grande número de estudantes, fica clara a necessidade de um processo
de trabalho racionalizado e segmentado. A maioria destas funções faz
parte do trabalho cotidiano do professor do ensino presencial, só que
organizadas de forma artesanal e intuitiva e trabalhando com grupos
reduzidos de alunos.
Como aponta Mill (2010), o processo de trabalho é fragmentado tanto no presencial
quanto na EAD, porém o número de fragmentos do trabalho pedagógico virtual é
infinitamente maior. O que acontece, no entanto, é uma organização do trabalho de forma
coletiva, distanciando a forma de trabalho dos interesses dos trabalhadores. Uma das
causas para esse estímulo à fragmentação do trabalho é a redução de custos e/ou
otimização dos ganhos financeiros.
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11599
3-
A Universidade Aberta do Brasil e a precarização do trabalho docente
O Ministério da Educação instituiu o Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB)
por meio do Decreto 5.800, de 8 de junho de 2006, tendo em vista a oferta de cursos e
programas de educação continuada superior, na modalidade a distância, pelas
universidades públicas brasileiras. Nesse Decreto, em seu artigo 1º, “fica instituído o
Sistema de Universidade Aberta do Brasil – UAB, voltado para o desenvolvimento da
modalidade de educação à distância, com a finalidade de expandir e interiorizar a oferta
de cursos e programas de educação superior no País”.
A UAB, em relação ao modelo de Educação a Distância, tem sua organização com
polos presenciais em diversos municípios; tutores presenciais e a distância nas
instituições de ensino superior; coordenadores e professores. A UAB é um programa que
congrega secretarias do MEC e de órgãos auxiliares, como a Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (CAPES) e o que propõe é um
sistema de Universidade Aberta pela articulação entre as universidades
já existentes, possibilitando o acesso ao ensino público superior em
municípios que não possuem ensino público superior ou naqueles que
possuem, mas não em quantidade suficiente para todos os cidadãos
(MEC, 2013).
No contexto da UAB, os tutores não ingressam através de concursos e não há
estabilidade. Além disso, não há contrato de trabalho e nem registro em carteira, os
tutores apenas assinam um documento se declarando bolsistas. Já nas Instituições de
Ensino Superior privadas há contratos por causa do SINAES (Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Superior). O SINAES “avalia todos os aspectos que giram em
torno desses três eixos: o ensino, a pesquisa, a extensão, a responsabilidade social, o
desempenho dos alunos, a gestão da instituição, o corpo docente, as instalações e vários
outros aspectos” (MEC/Inep/2004). Dessa forma, pode-se afirmar que os tutores “são
objetos de uma estratégia de terceirização ou subemprego que exime as instituições de
pagarem e honrarem os compromissos trabalhistas que deveriam ser assumidos também
no caso destes profissionais” (TONETTI, 2012, p.7).
No campo de atuação do trabalho do tutor virtual e pela dinâmica do mercado,
podemos também evidenciar a precarização do trabalho visto que é exigido um número
elevado de horas de trabalho, contratações temporárias, participação em diversas
atividades da instituição, falta de vínculo profissional e ausência de direitos trabalhistas
mínimos.
7
11600
Nessa perspectiva, Kuenzer (2007) aponta que na chamada produção flexível
convivem formas distintas de emprego de mão de obra. O que determina a inserção de
um trabalhador na cadeia produtiva é a demanda do próprio processo produtivo e não o
seu nível de qualificação. A autora denomina de exclusão includente a inserção dos
trabalhadores no mercado em postos precarizados e que possibilitam para estes uma
forma de exclusão em relação à vivência social, uma vez que os direitos trabalhistas e
sociais, acesso aos bens materiais e não materiais é negada a esse grupo social. Há,
portanto, a exclusão do trabalhador no mercado formal, como por exemplo o tutor que é
incluído de forma precarizada. Como destaca Kuenzer (2007, p.1167)
Consequentemente, os arranjos flexíveis, em substituição à polarização
de competências, não podem ser compreendidos como mera oposição,
rígida e formal, entre os que têm formação científico-tecnológica
avançada, e por isso se incluem, e a grande massa de trabalhadores
precariamente escolarizados, cuja força de trabalho é consumida
predatoriamente em trabalhos desqualificados, ou é excluída. São
combinações que ora incluem, ora excluem trabalhadores com diferentes
qualificações, de modo a constituir corpos coletivos de trabalho
dinâmicos, por meio de uma rede que integra diferentes formas de
subcontratação e trabalho temporário, e que, ao combinar diferentes
estratégias de extração de mais-valia, asseguram a realização da lógica
mercantil.
Assim, a contribuição de Kuenzer (apud Leda, 2006) analisa a nova dialética entre
o mundo do trabalho e a educação que se traduz em duas lógicas que se articulam
dialeticamente: a “exclusão includente”, que exclui o trabalhador do mercado formal para
incluí-lo de forma precarizada; e a “inclusão excludente”, direcionado para o campo
educacional e tem relação com as estratégias de inclusão nos mais variados níveis e
modalidade de ensino, uma vez que exclui estudantes do mundo do trabalho. Segundo
Leda (2006) a implantação da educação a distância, através da Universidade Aberta do
Brasil, é um exemplo de “inclusão excludente”, de massificação sob a aparência de
democratização.
Pode-se observar que o professor universitário de instituições privadas e federais
que trabalha com UAB e com a modalidade presencial também já encontra-se incluído
nessa precarização do trabalho docente, uma vez que recebe um complemento salarial,
uma bolsa para cumprir sua função. Assim, é notório perceber que fica mais barato pagar
bolsistas do que contratar um professor legalmente registrado.
Neste sentido, a Resolução nº 8, de 30 de abril de 2010, do Conselho Deliberativo
do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) define os valores pagos a
cada profissional que atua na modalidade da EAD na UAB. De acordo com o artigo 9º
dessa Resolução pode-se verificar a remuneração do tutor na UAB.
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11601
VI - Tutor: profissional selecionado pelas IPES vinculadas ao Sistema
UAB para o exercício das atividades típicas de tutoria, sendo exigida
formação de nível superior e experiência mínima de 1 (um) ano no
magistério do ensino básico ou superior, ou ter formação pós-graduada,
ou estar vinculado a programa de pós-graduação. O valor da bolsa a ser
concedida é de R$ 765,00(setecentos e sessenta e cinco reais) mensais,
enquanto exercer a função. Cabe às IPES determinar, nos processos
seletivos de tutoria, as atividades a serem desenvolvidas para a
execução dos Projetos Pedagógicos, de acordo com as especificidades
das áreas e dos cursos.
Desta forma, o tutor é um bolsista, sem vínculo com a instituição com a qual
trabalha, sem contrato formal de trabalho e nenhum direito trabalhista. Sua bolsa é paga
pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (Capes),
instituição federal de fomento à pesquisa no país. O pagamento dessa bolsa está
diretamente atrelado ao tempo de duração de um determinado curso através de contratos
precários. Nessa direção, Pretto e Lapa (2010, p. 91) afirmam que
A docência, no entanto, está distribuída em diferentes papéis, entre os
quais o de professor e o de tutor (a distância e presencial), estando
definidos, em resoluções que enquadram esses profissionais como
bolsistas, não lhes dando nem mesmo o direito a declaração de trabalho
mencionando a função “professor”, evitando com isso a consolidação de
vínculos empregatícios e a sua inserção na categoria simbólica de
profissionais da educação. Em síntese, nessas condições, o que se tem
é uma enorme precarização do trabalho docente, que se desdobra, na
prática, entre outras coisas, por meio da baixa remuneração, que acaba
por excluir profissionais qualificados, e da falta de reconhecimento
profissional.
Nesse cenário, Barros (2008) aponta que é necessário elaborar normas específicas
em relação ao trabalho do docente virtual tendo em vista sua qualificação profissional.
Com base em discussões e negociação de entidades sindicais ela sinaliza algumas
diretrizes, dentre as quais: o contrato de trabalho por tempo indeterminado; o professor
contratado para uma jornada fixa ou de acordo com os limites impostos pela convenção
coletiva; recebimento do valor da hora-aula previsto na Instituição de Ensino; adicional de
hora-atividade pela correção de atividades; horas extras quando a jornada de trabalho
extrapolar a carga horária originalmente contratada; atendimento aos alunos, seja na
forma presencial ou virtual, ocorrendo na própria Instituição de Ensino.
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11602
Considerações Finais
No contexto da Educação a Distância da Universidade Aberta do Brasil - o tutor
virtual - considerado professor efetivo nesse trabalho, é um profissional que não é
legalmente registrado como professor, excluído de direitos trabalhistas e de plano de
carreira e que recebe uma bolsa irrisória para atuar na docência online.
Pode-se verificar que, a profissionalização do tutor é um dos aspectos que devem
ser discutidos e equacionados na modalidade de ensino a distância. Além disso, a
profissionalização, em especial do tutor virtual é uma meta que deve ser atingida, com
vistas a uma formação de qualidade, condições de trabalho adequadas e uma
remuneração condizente que possibilite o acesso desse profissional aos bens culturais.
Vale destacar que o neoliberalismo no contexto educacional na modalidade de
ensino presencial ou a distância, exerce influência constante no trabalho docente e nas
políticas educacionais implementadas nos últimos anos. Tendo em vista esta lógica
neoliberal, são impostas competências para a formação de professores em favor das
demandas do mercado. Nessa perspectiva neoliberal, os sistemas educativos passaram
a necessitar de eficácia, mas com um menor custo para o setor público, além de uma
lógica de qualidade vinculada a uma visão empresarial de eficiência e produtividade.
Constata-se que é necessária uma regulamentação específica das condições de
trabalho docente, seja na modalidade de ensino a distância ou presencial, tendo em vista
garantir melhores condições de trabalho e profissionalização adequada aos profissionais
que atuam nessas modalidades citadas.
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II Congresso Nacional de Formação de Professores XII Congresso