1 LINGUAGEM E IDENTIDADE CULTURAL: UMA ABORDAGEM SOCIOLINGUÍSTICA LANGUAGE AND CULTURAL IDENTITY: AN APPROACH SOCIOLINGUISTICS Marcilene de Assis Alves Araújo1 RESUMO Nesse trabalho, pretende-se estudar textos de músicas regionais para identificar as marcas culturais do povo tocantinense, evidenciadas pelos mecanismos linguísticos utilizados nesses textos. Dessa maneira, busca-se analisar as variações linguísticas, demonstradas nos processos de metaplasmos quanto à supressão, acréscimo e substituição de fonemas ou sílabas. Nesse sentido, esse estudo desenvolve-se de acordo com a Teoria Sociolinguística, a partir de uma análise quantitativa e qualitativa dos processos apresentados. É demonstrado, também, o contexto histórico, geográfico e sociocultural, mostrando suas diversidades e as mudanças, responsáveis pela constante evolução da comunicação. Portanto, o corpus de análise dessa pesquisa consta das letras de canções interpretadas por representantes da cultura tocantinense. Dessa forma, o trabalho com as variações linguísticas, por meio de textos musicais, torna-se uma estratégia de reconstrução teórica, seja de aspectos linguísticos, seja da cultura como um todo. A linguagem e tema presentes na letra selecionada para análise aproximam o sujeito leitor do meio vivencial da comunidade tocantinense, caracterizando sujeitos da cultura sertaneja. Desse modo, esse trabalho visa contribuir para adequação do uso da língua de forma espontânea numa perspectiva intercultural como uma estratégia de valorização dos usos e costumes do Tocantins. Palavras-Chave : Sociolinguística, Cultura, Identidade. ABSTRACT In this work, it’s intended to study texts of regional songs to identify the cultural standard of tocantinense folk, evidenced by the linguistic mechanisms utilized in these texts. This way, it’s searched to analyze the linguistic variations showed in the metaplasms processes about the suppression, increasement and substitution of phonemes or syllables. In this way, this study is developed according to the Sociolinguistic Theory, from a quantitative and qualitative analysis of the presented processes. It’s shown, also, the historic context, geographic, and sociocultural, showing its diversities and the changes, responsible for the constant evolution of communication. Therefore, the corpus of analysis of this search consists of the lyrics of songs interpreted by tocantinense culture. This away, the work with the linguistic variations , through the musical texts, it becomes an theoric reconstruction strategy, either the linguistic aspects, or the culture as itself. The language and the theme present in the selected lyric for analysis approach the reader subject from the living environment of the tocantinense culture, characterizing subjects of the country culture. This way, this work aims at contributing to the adaptation of the use of the language in an spontaneous way in an intercultural perspective as an strategy of valorization of uses and habits from Tocantins. Keywords: Sociolinguistic, Culture, Identity INTRODUÇÃO O homem, desde os tempos mais remotos, comunica-se com seus semelhantes, por meio de desenhos, gestos, sinais e sons, diferenciando-se dos outros seres. Sendo assim, o ser humano esteve e continua em constante evolução social, mental, psicológica, espiritual e 1 Mestre em Letras pela Universidade Presbiteriana Mackenzie – SP. Professora do Centro Universitário UNIRG-TO e Diretora Acadêmcia do Instituto Específico de Ensino Pesquisa e Pós-Graduação – IEP. 2 outras. Nesse sentido, torna-se imprescindível que a educação também evolua nas suas propostas pedagógicas e reconheça que a evolução do homem e suas mudanças sociais merecem estudos e aprofundamentos. Nesse contexto, pretende-se com esse artigo demonstrar aos leitores que a língua portuguesa tem um papel de extrema relevância para a formação dos indivíduos brasileiros, tanto na vida profissional como no aspecto social, mostrando-lhes a importância e a necessidade de se compreender o significado da variação linguística e as possibilidades de usos delas para o ensino da língua portuguesa, bem como as responsabilidades da escola, com essa aprendizagem. Sendo assim, é importante que alunos e professores tenham maior acesso aos conhecimentos da abordagem Sociolinguística, de modo a possibilitar aos jovens uma aprendizagem mais efetiva da língua, falada e escrita, sem desvalorizar sua linguagem espontânea, justificando-se, uma vez que a linguagem constitui um dos mais poderosos instrumentos de ação e transformação social. Desse modo, esse trabalho visa contribuir para adequação do uso da língua de forma natural, estudando, identificando e descrevendo as variações linguísticas em um texto regional, do gênero canção. Propõe-se com base na Sociolinguística e suas variações apresentar uma estratégia de aula, utlizando a música como metodologia nas aulas de língua portuguesa, tornando-as mais atrativas, envolventes e, consequentemente, propiciando aos participantes do processo de ensino/aprendizagem integração e interesse nas atividades desenvolvidas. Dessa forma, a Sociolinguística contribui para o desenvolvimento e reflexões desses jovens, tornando-os capazes de compreender que são responsáveis pelas mudanças sócio-política, ideológica e cultural, despertando a importância do ensinar e aprender, estimulando a participação e permanência em sala de aula. Desse modo, por meio do estudo de textos musicais, espera-se propiciar a construção de um ambiente dialógico, cujos estímulos facilitam a aprendizagem. Nesse sentido, esse trabalho utiliza a música como linguagem que se comunica e expressa à diversidade sóciocultural dos indivíduos, além de ser uma estratégia que permite o estudo das variedades geográficas, históricas, sociocultural, concentrando-se nos aspectos fonológicos, buscando a compreensão das formas escritas e rítmicas do texto. 2 DESENVOLVIMENTO 3 Esse trabalho desenvolve-se, por meio de pesquisa bibliográfica, na qual são estudados os autores que fundamentam e possibilitam a interpretação do significado dos dados e fatos levantados. O método utilizado será o da pesquisa Sociolinguística, tendo como corpus de análise a letra musical “Nóis é Jeca Mais é Jóia” interpretada por Genésio Tocantins. 2.1 SOCIOLINGUÍSTICA A Sociolinguística estuda as conexões entre linguagem e sociedade e o modo como usamos a linguagem em diferentes situações sociais. Ela geralmente reflete a realidade do discurso humano e mostra como um dialeto pode descrever a idade, o sexo, e a classe social do falante, sendo uma codificação da função social da linguagem. Desse modo, a Sociolinguística abrange desde o estudo comparativo entre a variedade de dialetos através de uma região até análise entre os modos de falar de homens e mulheres, jovens, ricos e pobres, letrados e iletrados. Para os sociolinguistas, nas comunidades de fala, frequentemente, existirão formas linguísticas em variação. Em toda comunidade de fala são frequentes as formas linguísticas em variação. A essas formas em variação dá-se o nome de variantes. Variantes linguísticas são diversas maneiras de se dizer a mesma coisa em um mesmo contexto e com o mesmo valor de verdade. A um conjunto de variantes dá-se o nome de variável linguística. (TARALLO, 1997, p.8). A fala é baseada em convivências social e cultural, levando em consideração esse fato observa-se que as regras que foram atribuídas na comunicação tornaram o ensino de português diferenciado. As formas diferentes de falar nunca foram tão notadas e apreciadas como atualmente, visto que o domínio pode ser à base de projetos de vida bem sucedidos e no campo profissional pode fazer a diferença entre emprego e desemprego, pois socialmente um indivíduo que expressa bem, é visto como culto. A Sociolinguística aplicada ao ensino de língua portuguesa reflete as variações no convívio social, suas alterações e as diferenciações de cada grupo social, mais de forma objetiva clara. De acordo com Calvet, (2002, p.140) A Sociolinguística [...] esclarece as diferentes convicções e os diferentes comportamentos no que se refere à língua de grupos inteiros ou de classes inteiras da sociedade. 4 2.2 VARIAÇÃO LINGUÍSTICA A variação linguística é herança sociocultural e segundo Murrie, (2004, p.15), “[...] é a seiva que mantém a língua viva e de que é impossível impedi-la, por mais que tente fossilizar a língua, ditando regras a serem seguidas, ela sempre surpreende com sua diversidade”. Para Leite e Callou (2002), a variação linguística é um retrato da vivencia social dos indivíduos, e a sua comunicação depende do meio em que ela vive. Tornando a linguagem como centro da evolução humana. Dessa forma a linguagem abrange todo contexto de evolução do ser, tornando-a representação e diferenciação do povos. Para Bentes e Mussalim (2005, p. 60) A diversidade linguística não se restringe a determinações motivadas por origem sociocultural e geográfica. Um mesmo individuo pode alterar entre diferentes formas linguísticas de acordo com a variação das circunstâncias que cercam a interação verbal, incluindo-se o contexto social, propriamente dito, o assunto tratado, a identidade social do interlocutor etc. Segundo Murrie, (2004), pode-se analisar o fenômeno da variação linguística de diversos modos, dentre eles o cultural e o comunicativo. Culturalmente, a língua representa a experiência humana de modo específico, sendo atualizada pela linguagem como um recorte comum da realidade interiorizada pelos falantes, que precisam da língua para construir seus referenciais mínimos de convivências; a relação entre língua e cultura. No aspecto comunicativo, a língua representa a instituição de regras que determinam e demonstram as possibilidades comunicativas, pois cada ato verbal resulta de um processo intencional de ação, visando transformar pensamentos e ações. Murrie, (2004) classifica as variações linguísticas: 2.2.1 Estilística Não há falantes/escritor que fale/escreva da mesma forma. Inicialmente, temos, um estilo próprio que expressa nosso ponto de vista sobre o mundo e a sociedade; ele é a bagagem que acumulamos com nossas experiências pessoais e únicas. Essas experiências se manifestam no nosso vestuário, andar, comportamentos e, lógico, na nossa fala e escrita. São nossas escolhas pessoais da estrutura geral da língua: a gramática. A gramática é entendida aqui como um conjunto de regras, uma determinada combinação de elementos que se articulam em um sistema comum a todos os falantes. Por exemplo, o determinante a em “A menina saiu” tem um sentido e um lugar determinado 5 gramaticalmente, não podendo ser deslocado (para depois do substantivo, por exemplo). Pode-se alterar o sentido ao escrever “A senhora saiu”, mas não a ordem estrutural do determinante, apresentando, nesse caso, uma alteração semântica. Ao articular a fala e a escrita, o sujeito faz mais escolhas da ordem do significado (semântica) que escolhas morfológicas e sintáticas. Portanto, as seleções pessoais estão interligadas, normalmente, com as situações de uso da língua. Um médico em uma conferência fará escolhas linguísticas diferentes daquelas que usa quando conversa com os filhos. 2.2.2 Sociocultural Extremamente interligada à variação estilística está à variação social cultural. Destacam-se os usos diferentes por faixa etária, principalmente os das crianças, dos jovens (a gíria) e dos idosos (esses com termos e formas que vão caindo em desuso). Exemplo Os jovens em busca de sua identidade, costumam criar formas próprias de expressão, transformando o significado dos termos ou criando uma sintaxe própria. Assim, entre os jovens, temos as tribos dos surfistas, dos skatistas, dos rappers, dos mauricinhos, das patricinhas, dos punks, e assim por diante. 2.2.3 Geográfica Além da mudança de língua de uma região para outra do planeta, temos as variações dentro de um mesmo país que fala uma mesma língua. A língua portuguesa mostra diferenças de fala e escrita em Portugal e no Brasil temos região que apresentam marcas especificas principalmente na fala. Essas variações também são denominadas regionalismo, dialetos ou falares locais. Essas diferenças se mostram mais claramente na pronúncia das palavras, nas construções sintáticas, nos significados de determinadas expressões e no léxico. A pronúncia é claramente identificada pelos falantes. Na região nordestina, nota-se a abertura sistemática da vogal pretônica, ocorrência, regularmente, fechada em outras regiões. Na região gaúcha a realização do /e/ e do /o/ átonos finais, produzidos com grau médio de abertura, não acontece como em São Paulo, em que a forma é reduzida. No sertão nordestino, as consoantes /t/ e /d/, quando antes de /i/ vogal ou semivogal, palatalizam-se, em transcrição fonética [ts] e [dz]: [noitsi] “noite”, [odzu] “ódio”. 6 As ocorrências morfossintáticas também marcam as regiões, como em Rio Branco (Acre), em que o substantivo greve assume a função do verbo grevar. As especificidades vocabulares das regiões têm seus registros nos dicionários e, também, na literatura. Dessa forma, a palavra dama pode significar meretriz em uma região, e mulher da alta sociedade em outra região. A variação geográfica representa fatos sociais de uma determinada região e é interiorizada por todos os falantes e sua aprendizagem ocorre basicamente no ambiente familiar como marca de identidade do grupo social. Entretanto, os limites de uma comunidade linguística não devem ser confundidos com os limites políticos de um Estado, região ou país. 2.2.4 Histórica A língua não se diversifica apenas no espaço social, pessoal ou interpessoal; ela se diversifica também no tempo. Nesse contexto, um processo amplamente estudado são os metaplasmos que para Ilari (2002) são alterações fonéticas que ocorrem nas palavras devido à evolução da língua. Essas mudanças são apenas mudanças fonéticas, conservando a mesma significação da palavra. Os metaplasmos podem ocorrer por acréscimo; por supressão ou por transposição e substituição de fonemas. No portugues atual percebe-se, bastante, a modificação de /e/ em /i/ que o torna foneticamente parecido ou igual a ele como em leite > leiti. De acordo com Bassetto (2001) no português brasileiro contemporâneo, ocorre uma particularização da epêntese, denominada anaptixe, que consiste em se desfazer um encontro consonantal pela intercalação de vogal: pneu, advogado > p(i)neu ou p(e)neu, ad(i)vogado ou ad(e)vogado. Uma variante divulgada por um grupo social, em determinada época, pode ser abandonada no transcorrer do tempo, ficando sua marca somente no registro escrito. Palavras, expressões ou construções não mais usadas são denominadas arcaísmos. Neologismos são adotados e propagados por grupos sociais de prestígios e acabam se juntando à língua como variantes aceitas e reconhecidas. Em tempos de tecnologia, palavras vão sendo assimiladas, como os termos específicos da informática; e outras vão adquirindo novos significados, como o verbo digitar. 2.2.5 Modalidades Um dos processos mais discutidos é o da variação entre as modalidades da linguagem verbal: a fala e a escrita, as quais devem ajustar-se às intenções de seu uso 7 informal e formal. A segunda, por sua natureza de registro permanente, tem regras menos flexíveis que a primeira, mas nem por isso deixa de apresentar seus gêneros discursivos, os tipos de textos, que impõem certa ordem à relação linguística. 2.3 VARIAÇÃO LINGUÍSTICA EM SALA DE AULA Muitos professores, atualmente, não se atentam para as formas de correção quando os alunos falam ou escrevem “errados”, ou ainda o faz coibindo-os, em muitos casos por não terem acesso a uma formação adequada, continuada, ou por não saber a forma e o momento correto. Nesse sentido, a Sociolinguística mostra por meio de estudos que essa deficiência necessita de um ensino, enfocando a variedade linguística para dar entendimento de situações que ocorrem no dia a dia dos docentes e discentes. Bortoni-Ricardo (2004, p.38) relata que: Uma pedagogia que é culturalmente sensível aos saberes dos educandos está atenta às diferenças entre a cultura que eles representam e a da escola, e mostra ao professor como encontrar formas efetivas de conscientizar os educandos sobre essas diferenças. Na prática, contudo, esse comportamento é ainda problemático para os professores, que ficam inseguros, sem saber se devem corrigir ou não, que erros devem corrigir ou até mesmo se podem falar em erros. Nota-se que os conteúdos e o currículo escolar não trazem a evolução que o mundo globalizado oferece, ou seja, a educação continua a mesma de vários anos passados. O grande desafio para os educadores é fazer com que esses alunos voltem a ter interesse e que os conteúdos sejam expostos de forma dinâmica, atrativa e envolvente, sentindo participantes dessa evolução social. As variações existentes são dependentes uma das outras, manifestandose em todos os níveis de funcionamento da linguagem. Os alunos que chegam à escola falando “nós cheguemu”, “abrido” e “ele drome”, por exemplo, têm que ser respeitados e ser valorizadas as suas peculiaridades linguítico-culturais, mas têm o direito inalienável de aprender as variantes do prestígio dessas expressões. Não se lhes pode negar esse conhecimento, sob pena de se fecharem para eles as portas, já estreitas, da ascensão social. O caminho para uma democracia é a distribuição justa de bens culturais, entre o quais a língua é o mais importante. (BORTONI-RICARDO, 2005, p.15). É necessário estudar as variações em função dos emissores, dos receptores e dos diversos fatores, como região, faixa etária, classe social e profissão, pois em uma mesma comunidade linguística, certamente, coexistem usos diferentes, não existindo um padrão de linguagem que possa ser considerado superior. O que determina a escolha de tal variedade é a 8 situação concreta de comunicação, e a possibilidade de variação da língua expressa a variedade cultural existente em qualquer grupo. Nenhuma língua permanece a mesma em todo o seu domínio e, ainda num só local, apresenta um sem-número de diferenciações. [...] Mas essas variedades de ordem geográficas, de ordem social e até individual, pois cada um procura utilizar o sistema idiomático da forma que melhor lhe exprime o gosto e o pensamento, não prejudicam a unidade superior da língua, nem a consciência que têm os que a falam diversamente de se servirem de um mesmo instrumento de comunicação, de manifestação e de emoção. (MOLLICA, 2003, p. 43) Os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio (PCNEM), de língua portuguesa propõem que a linguagem na escola, se torne objeto de reflexão e análise, permitindo ao aluno a superação e/ou a transformação dos significados veiculados. Visto que, deve-se estudar toda a experiência já construída, estabelecendo relações com o presente, ou seja, o conhecimento socialmente instituído. O conhecimento, a análise e o confronto de opiniões sobre as diferentes manifestações da linguagem devem levar o aluno a respeitá-las e preservá-las como construções simbólicas e representações da diversidade social, histórica e cultural. As linguagens utilizam-se de recursos expressivos próprios e expressam na sua atualização, o universal e o particular. Pertencer a uma comunidade, hoje, é também estar em contato com o mundo todo. As práticas sociais deverão estar cada vez mais próximas da unidade para os fins solidários. (BRASIL, 2007, p.42). A diversidade sócio-cultural pode ser considerada uma questão imprescindível para entender a natureza da vida, dos sentimentos, manifestações culturais e sociais. Partindo desse pressuposto, o estudo sociolinguístico deve contribuir para entendimentos da língua falada nas suas diferentes manifestações, bem como para as tendências de mudanças em um determinado contexto social. Nesse contexto, estudar as variações da língua, por meio de textos musicais, torna-se uma maneira de despertar a capacidade evolutiva do aluno, estabelecendo paralelos com a cultura e suas vivencias sociais. 2.4 GÊNEROS TEXTUAIS Gênero textual são formações discursivas que se constituem como textos em determinadas situações comunicativas que se integram funcionalmente nas culturas em que se desenvolvem e devem ser contemplados em seus usos sócio-pragmáticos. Os gêneros correspondem a situações de interação verbal típicas da comunicação social e, como tal, 9 apresentam, na sua constituição a finalidade e as condições da esfera ao qual pertencem. Segundo Bakhtin (2003, p. 307) “Em qualquer esfera existem e se aplicam os seus próprios gêneros, que respondem a condições específicas de uma esfera dada; aos gêneros lhes correspondem diferentes estilos”. Nesse sentido, são as funções e as condições determinadas e específicas para cada situação comunicativa discursiva que geram determinados gêneros, desse modo, tem-se uma variedade grande de gêneros porque as possibilidades da atividade humana são inesgotáveis. O trabalho com gêneros necessita do entendimento conceitual de texto que, segundo Bakhtin, (2003) é uma realidade imediata, cuja existência requer a presença de pensamentos e vivência. A compreensão de um texto sempre é um correto reflexo do reflexo. Um reflexo através do outro no sentido do objeto refletido. Nenhum fenômeno da natureza tem “significação”, só os signos (inclusive as palavras) têm significado. Por isso, qualquer estudo dos signos, seja qual for o sentido em que tenha avançado, começa obrigatoriamente pela compreensão. O texto é o dado (realidade) primário e o ponto de partida de qualquer disciplina nas ciências humanas. [...] Da alusão ao objeto real é necessário passar a uma delimitação precisa dos objetos da investigação científica. O objeto real é o homem social (inserido na sociedade), que fala e exprime a si mesmo por outros meios. Pode-se encontrar para ele e para a sua vida (o seu trabalho, a sua luta, etc.) algum outro enfoque além daquele que passa pelos textos de signos criados ou a serem criados por ele? Pode-se observá-lo e estudá-lo como fenômeno da natureza, como coisa? [...] Por toda parte há o texto real ou eventual e a sua compreensão. (BAKHTIN, 2003, p.319). O gênero textual além de ser abrangente é aprendido e desenvolvido no dia-a-dia nas atividades culturais e sociais, mas é questionado pela sua diversidade. Umas das alegações dos que não o adotam, seria porque não teria um critério formal para o seu ensino. Mas, nota-se que falta é conhecimento por grande parte de professores que não tem um conhecimento linguístico, ficando presos somente às gramáticas. Mas por outro lado tem um significativo número de professores que se baseiam em conceituados estudiosos, e percebem as possibilidades e a importância de se adotar os gêneros. As propostas para o trabalho com o gênero permitem uma análise do dinamismo funcional e contextual. A diversidade de gêneros [...] em diferentes épocas e em diferentes gêneros dá se a formação da linguagem. [...] Os elementos da língua dentro do sistema da língua ou dentro do “texto” (no sentido rigorosamente linguístico) não podem entrar em relações dialógicas. As línguas, dialetos (territoriais, sociais, gírias), estilos de linguagem (funcionais), digamos o discurso familiar do cotidiano e a linguagem cientifica, podem entrar naquelas relações dialógicas, Istoé, conversar entre si? Só sob a condição de um enfoque linguístico, isto é, de serem transformados em “visões de mundo” (ou em certas visões de mundo centradas na linguagem ou no discurso), em “pontos de vista”, em “vozes sociais”, etc. (BAKHTIN, 2003, p. 325). 10 2.5.1 Gênero Canção O gênero canção é a combinação de letras, ritmo e melodia, nesse sentido, torna-se essencial uma abordagem híbrida dos aspectos da fonologia, morfologia, sintaxe e semânticopragmático, pois o estudo desses aspectos de maneira isolada o tornaria semelhante ao da poesia, e não da música. Nesse sentido, a escolha do gênero canção é de suma importância para amostragem do nosso trabalho, pois o estudo dessa letra musical além de mostrar a diversidade cultural, os sentimentos, experiências pessoais, interpretação coletiva e comunicação social reflete o dinamismo e a variabilidade do meio sociocultural, e, conforme Snyders, (1997, p. 98) “a música como linguagem é sem dúvida mais diretamente comovente do que linguagem propriamente dita”. 2.5 MÉTODO DE ABORDAGEM E DELIMITAÇÃO DO CORPUS 2.6.1 Método de Abordagem A Sociolinguística é uma ciência que permite estudar a língua e a relação com a sociedade, baseado nesse pressuposto ela aborda a linguagem comunicativa e suas variações. Nesse sentido, esse trabalho busca na Sociolinguística suporte analítico para estudar as variantes linguísticas em texto do gênero canção, buscando motivar os jovens para os estudos da linguagem. 2.6.2 Corpus de Análise O corpus de análise dessa pesquisa consta da letra da canção “Nóis é Jeca mais é jóia”, composição interpretada por Genésio Tocantins, um representante da cultura rural tocantinense. Propõe-se retratar as variações linguísticas expressas nesse texto, buscando identificar as marcas dos sujeitos presentes no texto, além de despertar o interesse dos jovens para uma aprendizagem contextualizada, levando ao entendimento plural da cultura, valorizada nos usos e costumes da região. Dessa forma, a concepção de identidade abordada nesse estudo considera os sujeitos textuais como construções sociais e discursivas, os quais interagem com o outro, no seu cotidiano por meio da linguagem. O estado do Tocantins caracteriza-se por ser uma ilha linguística, a qual absorve e reflete processos socioculturais, regional e nacional. Nesse contexto, essa letra serve como 11 amostragem de sedimentos da cultura tocantinense, que historicamente traz influência da cultura rural, pois tem como bases de renda o extrativismo rural e a agropecuária. Portanto, foram analisadas nessa letra as variações geográficas, sociocultural e histórica, além do levantamento dos metaplasmos quanto aos processos de acréscimo, supressão e substituição de fonemas nos vocábulos. 2.6 PROCEDIMENTOS PARA ANÁLISE TEXTUAL 2.6.1 Canção 01: Nóis é Jeca Mais é Jóia Compositor: Juraildes da Cruz Cantor: Genésio Tocantins Se farinha fossi americana mandioca importada banqueti di bacana era farinhada (2x) nóis num gosta di mintira nóis tem vergonha na cara Andam falando qui nóis é caipira qui nossa onda é montar a cavalo qui nossa calça é amarrada com imbira qui nossa valsa é brigá di galo Andam falando que nóis é caipora qui nóis tem qui aprender inglêis qui nóis tem qui fazê xuxéxu fóra dexe de bestáge nóis nem sabi o portuguêis nóis somo caipira pop nóis entra na chuva e nem móia meu ailóviú nóis entra na chuva e nem moía meu ailóviú nóis é jeca mais é jóia Andam falando que nóis é butina mais nóis num gosta di tramóia nóis gosta é das minina nóis é jeca mais é jóia mais nóis num gosta di jibóia nóis gosta é das minima nóis é jeca mais é jóia Se farinha fossi americana ... (2x) Andam falando qui nóis é caipira qui nóis tem cara de milho di pipoca qui nosso roqui é dançá catira qui nossa flauta é feita di taboca nóis gosta di pescar traira vê a bichinha gemendo na vara nóis num gosta di mintira nóis tem vergonha na cara vê a bichinha chorando na vara Se farinha fossi americana ... (2x) Tiru bicho di pé cum canivete mais já tô na internet nóis é jeca mais é jóia Tiru bicho di pé cum canivete mais já tô na internet nóis é jeca mais é jóia Farinhá, farinha, farinha, farinha, Mandioca i mieu (3x) Se farinha fossi americana ... (10x) 2.7.1.1 Contexto Histórico: A música “Nóis é Jeca Mais é Jóia” tem como objetivo reforçar a identidade do homem tocantinense e reafirmar sua personalidade por meio da língua, desmistificando a visão deturpada que outras pessoas têm sobre esse homem. O texto é composto por Juraildes da Cruz 12 e tornou-se conhecido após seu intérprete “Génesio Tocantins” ter sido classificado para a final do prêmio “Festival Novos Talentos”, promovido pela Rede Globo de televisão, em 2000. A letra, com melodia em ritmo de forró, perpassa por temas que vai do lúdico ao satírico, destacando assuntos do cotidiano do povo tocantinense. No texto, é possível notar o retrato do Tocantins, um estado embrionário, tendo como fonte de sustentabilidade econômica a pecuária, a agricultura, o extrativismo e um amplo potencial hídrico. No ápice da música, o Tocantins passava a ser conhecido também por sua riqueza cultural, quando um grupo de artistas e pesquisadores, historiadores, poetas, inicia um movimento de busca e expansão de identidade da cultura tocantinense. Esse grupo buscava conteúdo próprio para dialogar com outros estados desmistificando a visão reduzida de que no Tocantins só tem índios, desconhecendo a ampla riqueza que a sociedade indígena representa para o Brasil. A música “Nóis é Jeca mais é Jóia” demonstra um paralelo entre um Estado essencialmente rural, ligado aos usos e costumes do campo com um Tocantins de perspectiva urbana com todos os signos de um Estado que se moderniza e entende perfeitamente os traços de uma sociedade Pós-Moderna em franco processo de globalização. 2.7.1.2 Identidade dos sujeitos do texto. O sujeito da letra musical é expresso nos vocábulos “Nóis”, no caso, retratando todos os Tocantinenses, e “Jeca” que representam o homem rural, o sertanejo, o típico caipira com linguajar desfavorecido, rústico no seu jeito de vestir e falar tem o rosto áspero, uma pele maltratada pela exposição ao sol muito quente. Nas suas tradições carrega a herança do forró, da dança catira, do montar a cavalo, da calça amarrada com imbira. Nesse contexto, é possível notar a presença de um sujeito forte, rústico, machão, verdadeiro, honesto, simples, porém adaptável à vida moderna. 2.7.1.3 Variações: Geográfica, Histórica e Sociocultural na Letra “Nóis é Jéca Mais é Jóia” As variantes linguísticas presentes na música “Nóis é Jeca Mais é Jóia” denotam que ao aderir ao uso de palavras como: “mandioca”, cujas denominações estão bastante vinculadas à região do falante: “macaxeira”, “aipim”, e além de representar um item básico na alimentação, representa aspectos de geração de renda do tocantinense. 13 As expressões “qui nóis é caipira”; “qui a nossa onda é montar a cavalo” representam a linguagem desse povo, evidenciadondo, também, os costumes e a cultura regional. Essas variações assumem um papel de demarcação linguística, rítmica e melódica, conforme Tatit (apud Jebaili; Pereira Junior, 2008, p.16) “A intenção das letras nas canções é retratar falas e não gramáticas normativas, e as exigências da composição tomam o primeiro plano. Há fatores do próprio processo de criação que não raro ‘pedem’ desvios da norma culta, como a tentativa de encontrar uma rima”. As expressões “qui a nossa calça é amarrada com imbira”; “qui a nossa valsa é briga de galo” remetem para um costume muito frequente de quem vive no campo, na fazenda, para o “caipira” que pega o talho do buriti coloca para secar, e, depois de seco, trança e usa-o como cinto na sua calça. O compositor propõe-se em dialogar sobre a cultura e o modo vivencial do homem rural, seu gingado frente às adversidades e maneira de viver e agir num ambiente mais natural. Nesse contexto, atém-se para um uso linguístico típico da região “que nóis é butina”, que semanticamente liga-se a um processo de desvalorização sociocultural, no qual seus integrantes são considerados bobos, roceiros, caretas, rudes, grosseiros, e despido de conhecimento erudito. Após confrontar essas características desse povo, procura amenizar suas intenções comunicativas “mais nóis num gosta de tramóia”, demonstrando que essa cultura é simples, mas é honesta, verdadeira, não utiliza da mentira para favorecer sua cultura ou uma negociação. O uso da expressão “nóis gosta é das minina” caracteriza uma civilização composta por homens machos, que gostam de mulheres, evidenciando destaque para a masculinidade do tocantinense. O título e refrão do texto “Nóis é Jeca mais é Jóia” remetem-nos a uma formação identitária de um povo de costumes simples, em condições de atraso para convivência com uma sociedade pós-moderna. Uma comunidade rural, mas que não é burra, pois traz conhecimentos e experiências de vida, demonstrado, fatores, também, evidenciados em “nóis tem vergonha na cara” quando o autor reforça a construção de um sujeito verdadeiro e sem maldades. A expressão “qui nóis tem cara de milho de pipoca” destaca alguns traços dos tocantinenses, com pele áspera, maltratada, devido à exposição ao sol, com temperaturas bastante elevadas e a baixa umidade, ou seja, a vida sofrida do sertanejo, no campo. No trecho “qui o nosso roque é dançar catira” tem-se a representação da cultura desse povo carregada da tradição folclórica da dança catira, costume bastante regionalizado. Em “qui nossa flauta é feita de taboca” nota-se a sonoridade e alguns instrumentos musicais artesanais, contrapondo o industrialismo vs. naturalismo, a partir da construção de instrumentos utilitários ao meio social do sertanejo. 14 Em “nóis gosta de pescar traira” o compositor demonstra uma atividade típica dos tocantinenses que presenteados pelas leis da natureza tem em seu ecossistema abundância de rios, lagos e represas, o que favorece a atividade da pescaria. Esse verso pode, também, demonstrar de forma simbólica um sujeito malandro, esperto que gosta da vida mansa; Para a variante “andam falando que nóis é caipora” o autor rebate outras culturas quando afirmam que os tocantinenses são pessoas, matutas, rústicas ou interioranas. O caipora na linguagem regional é muito utilizado para os casos de roda onde de forma folclórica e fantasmagórica, fazem-se alegorias a rituais e assombrações, perpassando do lúdico ao sagrado. Através dessa tradição são passados de geração à geração os usos, costumes e valores dessa sociedade. Nos versos, “qui nóis tem qui aprender ingrês” “nóis nem sabe o portuguêis”, o autor faz uma intertextualidade com a expressão utilizada pelo então presidente na época Fernando Henrique Cardoso, quando o mesmo relatou que os brasileiros não sabem nem o português, quanto mais o inglês. Foi então que o autor mencionou na sua letra musical que o Tocantins não é um estado desvalorizado ele está contextualizado com a realidade nacional brasileira. O autor, também, se posiciona em relação à situação linguística do povo brasileiro. No verso “qui nóis tem fazê xuxéxu fóra” Juraildes demonstra um Tocantins repleto de riquezas cultural, social, industrial, comercial, hidroelétrica, dentre outras e necessita divulgar esse potencial. No trigésimo oitavo verso “nóis entra na chuva e nem moía” o autor demonstra que o tocantinense e inteligente, esperto, atento. No quadragésimo segundo “mais já to na internet” o autor relata que no Tocantins já se utilizam das inovações tecnológicas, buscando a integração com outras localidades para aperfeiçoamento das tecnologias e rapidez na transmissão de informações. Quanto à variação histórica, há a presença de vocábulos como: “farinha” com etimologia indígena; “caipira” é uma palavra tradicional muito recorrente no falar dos fazendeiros e ainda se usa com o mesmo significado, e o autor utilizou para demonstrar que é uma pessoa do mato, roceira, matuto, acanhado, tímido; “milho de pipoca” que ao mesmo tempo em que remete a algo consistente, forte e de características explícitas é capaz de transformar-se, recriar-se em novas formas de representatividade social; “pescar” é uma palavra histórica que tem o mesmo significado de semear, cultivar, seduzir, atingir um objetivo; “canivete” é ao mesmo tempo um instrumento de trabalho ou de caça e traz na sua simbologia usos e costumes do caipira. Para a variante sociocultural encontra-se no próprio título “Nóis é Jeca mais é Joia” uma expressão bastante estigmatizada pelos tocantinenses em todas as faixas etárias, após a classificação no prêmio “festival de novos talentos”, sendo uma gíria muito usada na região. No 15 vocábulo “bichinha” tem-se uma variante utilizada no grupo de jovens e adultos, principalmente na cultura rural, e urbana do Tocantins e até de outros estados como o da Bahia, ao relacionar o termo com questões ligadas à sexualidade. Note-se, ainda as expressões “nóis num gosta de mentira”; “nóis tem vergonha na cara”; “caipora” relacionando características de uma pessoas roceira, tímida dentre outras. Os vocábulos “xuxéxu” e “pop” mostram o recurso da intertextualidade, na qual o compositor aborda de maneira cômica a substituição dos fonemas fazendo referências fonéticas da expressão com o nome da apresentadora “Xuxa”. Nesse texto o autor dialoga com as próprias condições de exaltação e fama de personalidades como a Xuxa e cantores de ritmo pop conquistaram em todo o país, reforçando a ideia do resultado esperado quando do contexto de produção da música. 2.7.1.4 Aspectos Fonológicos do texto A estatística dos dados fonológicos está apresentada no Quadro 01. Supressão Acréscimo Substituição Ocorrências /r/ “brigá; dançá, vê; fazê” /mos/ “gosta; sabe; entra; móia” /os/ “tem, somu” /m/ “bestage” / r / “fazê” /u/ “to” /s/ “minina” /es/ “to” 29 / i / “nóis”; “portuguêis”; “mais”; 35 / e / por / i / “qui” /a/ por /e/ “nem” /ã/ por /m/ “num” /o/ por /u/ “num” /lh/ por /i/ “moía” Total 95 159 Quadro 01: Demonstração dos dados fonológicos evidenciados no texto: “Noís é Jeca mais é Jóia” Conforme o quadro 01, na música “Noís é Jeca mais é Jóia”, o compositor utilizou o recurso dos metaplasmos por acréscimo, substituição e supressão. Conforme descrição abaixo, houve uma incidência significativa do acréscimo do fonema /i/ no meio da palavra nós, e na palavra português, o qual pode ser caracterizado como epêntese. Esse acréscimo de fonemas ocorre por vinte e quatro vezes no decorrer do texto. Quanto ao processo de substituição dos fonemas destacam-se as trocas do /e/ pelo /i/ caracterizado como assimilação, ocorrendo por doze vezes; do /l/ pelo /r/, caracterizado por 16 rotacismo, ocorrendo uma vez e /lh/ pelo /i/, denominado de assimilação, transformação ocorrida de acordo com Lausberg apud Bagno (2006) devido à proximidade e a comodidade maior de pronunciar o “i”, ocorrendo por uma vez. No processo de supressão fonêmica, o texto apresenta, na palavra “bestage” a supressão do fonema /m/, nos vocábulos “fazê, dançá” há a supressão do fonema /r/. No vocábulo “to”: um no início, caracterizado como aférese; e outro no final do mesmo vocábulo denominado apócope, nesse caso ele utilizou para ritmar, sintonizar a música. Além do processo de desnasalização da vogal postônica em “bestage”, fato ocorrido pelo processo de apócope. 2.8 RESULTADOS E DISCUSSÕES Para sistematizar a análise fonológica na letra da música “Nóis é Jeca mais é Jóia” segue abaixo a representação gráfica dos processos de supressão, acréscimo e substituição dos fonemas nos vocábulos usados no texto. Gráfico 01: Sistematização das ocorrências de metaplasmos no texto “Nóis é Jeca mais é Jóia” O gráfico evidencia que para um total de 159 ocorrências observam-se a presença de 59,75% para a substituição, 22,01% para o acréscimo de fonemas, em seguida, e, por último, o processo de supressão com 18,24%. Desse modo, a presença desses processos se valida, não somente para dar melodia e ritmo, mas, também para enfatizar a linguagem caipira e sertaneja, propiciando intercâmbio rítmico, melódico e de sintonia. Esses recursos começam a são utilizados em todo o texto. Dessa forma, o autor aproxima o leitor da cultura do povo tocantinense, destacando a linguagem rural, como uma forma de identificação de um sujeito 17 “caipira”. Nesse contexto, o compositor procura retratar a cultura sertaneja, mostrando que a vida no campo também traz referencial de vida, que mesmo sendo de uma cultura diferente seus integrantes trazem conhecimento. 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS Esse estudo possibilitou a realização de leituras e visualizações da diversidade da língua portuguesa, por meio dos textos do gênero musical. As músicas regionais desempenham papéis de suma importância e relevância para a formação dos indivíduos, tanto na vida profissional quanto no aspecto social, evidenciando a importância e a necessidade de se compreender a variação linguística, com isso preservar e difundir os valores da cultura local. Dessa forma, a Sociolinguística contribuiu para os fundamentos de leitura e qualificação efetiva da língua, falada e escrita, sem desvalorização da linguagem, justificando-se, uma vez que a linguagem constitui um dos mais poderosos instrumentos de ação e transformação social. Nesse sentido, o presente trabalho contribuiu para possíveis adequações do uso da língua, por meio de um estudo, no qual se identificou e descreveu-se as ocorrências de variações linguísticas como uma forma para a interpretabilidade do texto. Nesse contexto, esse trabalho expôs, através da sociolinguística e suas variações, que a música e suas letras são suporte atraente e possibilita inúmeras leituras interpretativas mostrando costumes, cultura, evolução da linguagem e contraste sociais. Expondo suas riquezas metodológicas e reconhecendo que devem ser consideradas nas aplicações das aulas de língua portuguesa, tornando-a atrativas, envolventes e, consequentemente, fazer com que esses jovens sejam participantes do seu processo de ensino/aprendizagem, formando cidadãos críticos, integrados e interessados no saber contínuo. Nesse estudo das variações nas letras musicais foi constatado os recursos linguísticos que são usados pelos autores para ritmar e dar melodias para o texto. A linguagem trabalhada de forma dinâmica e flexível torna-se relevante no ensino de língua portuguesa, em sala de aula. Desse modo, as letras musicais destacam-se como suportes atraentes e envolventes pois são textos que permeiam desde a infância a qualquer fase da vida do ser humano. Nesse contexto, um trabalho dessa natureza, além de abordar a análise das variantes, propicia um ambiente dialógico, cujos estímulos facilitam a aprendizagem. Essa pesquisa demonstrou que o trabalho com as variações linguísticas utilizando a letras musicais como suporte, instiga leituras que destacam mudanças sociais, culturais, e estabelecer cenários prospectivos de 18 tendências da evolução de um povo em dado espaço e tempo. Nesse sentido, esse trabalho utilizou a música como uma linguagem que se comunica e expressa a diversidade sociocultural dos indivíduos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal: introdução e tradução do russo Paulo Bezerra; prefácio à edição francesa Tzvetam Todorov. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003. 476 p. BASSETTTO, Bruno Fregni. Elementos de filologia Românica. São Paulo: USP, 2001. 381 p. BENTES, Anna; MUSSALIM, Fernanda. Introdução à linguística: domínios e fronteiras. v. 1, 5. ed. São Paulo: Cortez, 2005. 294 p. BORTONI-RICARDO, Stella Maris. Educação em língua materna: a sociolinguística na sala de aula, São Paulo: Parábola, 2004, 108 p. ______. 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